• Nenhum resultado encontrado

Imprensa e processo penal : a influência da mídia e a tutela do direito fundamental à imagem

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "Imprensa e processo penal : a influência da mídia e a tutela do direito fundamental à imagem"

Copied!
38
0
0

Texto

(1)

UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO

BRUNA KARINE BREZOLINI LORDELLO

IMPRENSA E PROCESSO PENAL: A INFLUÊNCIA DA MÍDIA E A TUTELA DO DIREITO FUNDAMENTAL À IMAGEM

NITERÓI 2013

(2)

IMPRENSA E PROCESSO PENAL: A INFLUÊNCIA DA MÍDIA E A TUTELA DO DIREITO FUNDAMENTAL À IMAGEM

Monografia apresentada ao Curso de Direito da Universidade Federal Fluminense, como requisito parcial à obtenção do título de Bacharel em Direito.

Orientador:

Prof. MANOEL MARTINS JÚNIOR

NITERÓI 2013

(3)

Universidade Federal Fluminense Superintendência de Documentação

Biblioteca da Faculdade de Direito

L867 Lordello, Bruna Karine Brezolini.

Imprensa e processo penal : a influência da mídia e a tutela do direito fundamental à imagem / Bruna Karine Brezolini Lordello. – Niterói, 2013. 37 f.

Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Direito) – Universidade Federal Fluminense, 2013.

1. Liberdade de imprensa. 2. Meios de comunicação de massa. 3. Processo penal. 4. Princípio da dignidade da pessoa humana. 5. Direito à própria imagem. I. Universidade Federal Fluminense. Faculdade de Direito, Instituição responsável II. Título.

(4)

IMPRENSA E PROCESSO PENAL: A INFLUÊNCIA DA MÍDIA E A TUTELA DO DIREITO FUNDAMENTAL À IMAGEM

Esta monografia foi julgada adequada à obtenção do título de Bacharel em Direito e aprovada em sua forma final pelo Curso de Direito da Universidade Federal Fluminense.

Aprovada em 21 de março de 2013.

BANCA EXAMINADORA

________________________________________ Prof. e Orientador Manoel Martins Júnior

Universidade Federal Fluminense - UFF

________________________________________ Prof. Cláudio Brandão de Oliveira

Universidade Federal Fluminense - UFF

________________________________________ Prof. Índio do Brasil Cardoso

(5)

NITERÓI 2013

Dedico este trabalho à minha família, aos verdadeiros amigos e a uma pessoa muito especial que esteve ao meu lado quando eu mais precisei nesta etapa da minha vida e que eu

(6)

AGRADECIMENTOS

Agradeço a Deus por todas as bênçãos em minha vida. Obrigada, Senhor, por sempre me mostrar que tudo é possível, basta ter iniciativa, determinação e fé.

Aos meus pais, Maria Elizabete Brezolini Lordello e José Maria Reboças Lordello Filho, por todo amor, carinho, dedicação e orientações que me deram. E, principalmente, pelo esforço sem medidas para me proporcionar uma educação de qualidade.

À minha irmã, Anna Karoline Brezolini Lordello, por toda cumplicidade e parceria que só o amor fraterno nos permite compartilhar.

Às minhas avós, Maria da Graça Pimentel Brezolini e Isélia Tavares Lordello, e aos meus avôs, Atiglio Masenclever Brezolini e José Maria Reboças Lordello (in memoriam), por todo apoio que sempre me ofereceram para que eu pudesse dar continuidade às atividades relacionadas com a minha formação profissional.

Aos meus filhotes, Bellinha, Toddynho e Robinho (in memoriam), que sempre preencheram o meu coração com muito amor e carinho, que nunca me deixaram desanimar ao me receberem com toda felicidade do mundo e permanecerem perto de mim em todos os momentos.

Aos amigos que fiz na Fundação Getulio Vargas, Fernanda Badolati e Henrique Reis, por cada sorriso estampado em minha face. A alegria que vocês trazem para a minha vida é imensurável.

Ao meu orientador, professor Manoel Martins Júnior, pelo conhecimento compartilhado e pela dedicação a este trabalho.

Por fim, agradeço a todos os amigos e familiares que de alguma forma estiveram presentes e compreenderam o momento de concentração e foco.

(7)

RESUMO

A presente pesquisa tem por objetivo condensar as informações suficientes para a compreensão do tema. Através de uma análise doutrinária, do direito positivo existente e de uma investigação crítica, a influência da mídia no Processo Penal será explorada com a finalidade de detectar quais são os efeitos do comportamento inconsequente dos profissionais responsáveis pela divulgação de informações de interesse público. Serão discutidos os conceitos fundamentais relacionados ao estudo, como a liberdade de imprensa e a liberdade de expressão. Outro aspecto a ser abordado é o conflito entre direitos fundamentais que se apresenta: liberdade de informação jornalística e direito à imagem do acusado. Serão analisadas as consequências mais relevantes em relação ao desrespeito à dignidade da pessoa do acusado. Os principais pontos serão debatidos a fim de esclarecer como a questão pode ser solucionada.

Palavras-chave: Liberdade de imprensa. Meios de comunicação de massa. Processo penal. Princípio da dignidade da pessoa humana. Direito à própria imagem.

(8)

The following research aims to condense sufficient information for the comprehension of the studied theme. It shall analyze the current doctrine, the existing positive law and critical investigation regarding the influence of the media in Brazilian Criminal Proceedings will be analyzed in order to detect which are the effects of the influence of professionals responsible for the divulgation of public interest information. The fundamental concepts and definitions related to this topic will be discussed, such as freedom of speech and freedom of press. Another aspect that shall also be addressed is a famous conflict of fundamental rights: the freedom of press reports and the image rights of the plaintiff. The most relevant consequences of regarding the disrespect of the accused`s dignity and human rights. The most important topics will be debated with the objective of clearing how this matter can be solved.

Keywords: Freedom of press. Mass means of mass communication. Criminal procedures. Dignity of the human being. Image rights.

(9)

Sumário

1. INTRODUÇÃO 9

2. EVOLUÇÃO DA LIBERDADE DE IMPRENSA 10

2.1 TRANSFORMAÇÕES 10 2.2 A LIBERDADE 13 2.3 IMPRENSA 14

2.4 MEIOS DE COMUNICAÇÃO DE MASSA 16 2.5 BREVE NOÇÃO DE OPINIÃO PÚBLICA 17

2.6 LIBERDADE DE INFORMAÇÃO X LIBERDADE DE EXPRESSÃO 18 2.7 ANÁLISE CONSTITUCIONAL 20

3. ABUSOS NA LIBERDADE DE IMPRENSA E A INLFUÊNCIA NO PROCESSO

PENAL 22

3.1 VISÃO GERAL 22

3.2 A INFORMAÇÃO VEICULADA A PARTIR DA LIBERDADE DE IMPRENSA 23

3.3 IMPRENSA E PROCESSO PENAL 26 3.4 BREVE NOÇÃO CONSTITUCIONAL27

4. DA DIGNIDADE DA PESSOA DO ACUSADO E DA FUNDAMENTALIDADE DO

DIREITO À IMAGEM 30

4.1 O PROCESSO PENAL E O ACUSADO 30 4.2 A MÍDIA E O ACUSADO 31

5. CONCLUSÃO 34

(10)

INTRODUÇÃO

É possível observar de forma clara que, nos últimos tempos, a mídia é onipresente. Não há um fato sequer que consiga escapar dos olhares curiosos dos jornalistas. Eles sempre chegam à informação, basta saber se a mesma será útil para incrementar as notícias de modo a exacerbar o sensacionalismo característico da imprensa.

A disseminação dos meios de comunicação de massa permitiu ainda mais o descontrole. Rádios, televisões, jornais, revistas, sites, e-mails, enfim, são infinitas as formas de transmissão de informações. Isso ocorre o tempo todo. A cada segundo é possível visualizar novas notícias constantemente atualizadas, que tratam dos mais diversos assuntos: celebridades, comissões parlamentares de inquérito, descobertas tecnológicas, desastres naturais ou causados pelo homem, crimes que chocam a sociedade, etc.

Sendo assim, é válido ressaltar que dificilmente alguém ou alguma instituição escapa desse ataque. Com o Poder Judiciário não é diferente, principalmente no que diz respeito ao processo penal, tendo em vista o modo como os crimes praticados pelos indivíduos são tratados e expostos pelos profissionais da imprensa. As informações genuínas são transformadas de forma a tornar o assunto mais instigante.

Buscando o seu objetivo máximo – divulgar os fatos da maneira mais lucrativa possível, a mídia, por diversas vezes, acaba ultrapassando limites quase que invisíveis. Existe o entendimento de que o direito de alguém termina quando começa o de outra pessoa. E é exatamente assim que deve funcionar também entre as instituições e os indivíduos, ou seja, não há espaço para excessos e abusos.

Entretanto, não é isso que tem sido observado. O que ocorre é precisamente o contrário. Os crimes são relatados pelos jornalistas de maneira agressiva, muitas vezes fantasiosa, gerando, assim, um prejuízo irreparável para aquele que ainda é considerado acusado. É possível afirmar inclusive que, dependendo do caráter do profissional e da sua noção de ética, a notícia sobre o crime pode trazer diversas especulações, não pontuadas desta forma, bem como dados inverídicos.

Diante disso, percebe-se que o tema da influência da mídia no processo penal abrange diversos pontos de discussão, havendo até mesmo intensos conflitos entre princípios presentes na Constituição Federal de 1988. O que se nota é a dificuldade de saber qual deles deve prevalecer diante de uma situação fática.

(11)

10

O objeto de estudo surge quando se observa a influência exercida pelos órgãos da mídia através das informações divulgadas sem limites, que alcançam os indivíduos de forma indiscriminada. Ao influenciar o povo, provoca o clamor público. Já com relação aos sujeitos do processo (aqueles que atuam de forma a dar seguimento até chegar ao julgamento – ex.: delegado da polícia, perito, juiz, promotor de justiça, etc), pode levar até mesmo a uma decisão injusta, seja por uma condenação excessiva ou por culpar um inocente.

Complementa-se, ainda, com o estudo da tutela do direito fundamental à imagem do acusado, além de outros direitos constitucionalmente previstos que são inerentes ao homem, independente da sua condição no processo penal. O respeito à dignidade da pessoa do acusado é essencial em um Estado Democrático de Direito.

A relevância da pesquisa está na contemporaneidade do tema bem como na necessidade de reconhecer os problemas que acometem a sociedade e que se intensificam com a diversificação cada vez maior dos meios de comunicação de massa e a carência de regulamentação apropriada. A partir da exposição e análise das informações apresentadas, é possível estabelecer sugestões que contribuam para a melhora da vida em comunidade.

2 EVOLUÇÃO DA LIBERDADE DE IMPRENSA 2.1 TRANSFORMAÇÕES

A liberdade de imprensa apresenta-se como um direito consolidado principalmente por estar prevista no artigo 5º, incisos IX e XIV, da Constituição Federal de 1988. Entretanto, o processo de consolidação não foi tão rápido e simples.

O forte marco para o acesso à informação foi a aprovação da Declaração Universal dos Direitos Humanos em 1948 na Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU). Tal documento visava a defesa das liberdades fundamentais dos seres humanos.

Porém, outros documentos que antecederam a referida declaração introduziram a liberdade de expressão e de imprensa em sua forma embrionária, são eles: a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 26 de agosto de 1789, França, na qual o artigo 11 prevê que “a livre comunicação dos pensamentos e das opiniões é um dos mais preciosos direitos do Homem; todo o cidadão pode, portanto, falar, escrever, imprimir livremente, respondendo,

(12)

todavia, pelos abusos desta liberdade nos termos previstos na Lei”1; e a Declaração de

Direitos dos Estados Unidos, que em 15 de dezembro de 1791, com a Primeira Emenda à Constituição, trouxe a seguinte redação no Artigo I: “O Congresso não fará lei alguma referente à implantação de uma religião ou proibindo o culto de qualquer uma delas; nem lei que restrinja a liberdade de palavra, ou de imprensa; nem o direito do povo de reunir-se pacificamente; nem o de dirigir-se ao governo em demandas para a reparação de situações consideradas injustas”.

O homem, ao integrar um Estado Democrático de Direito, possui direitos e deveres. A liberdade de imprensa, uma questão pautada na democracia, pode ser analisada sob dois aspectos: o direito de levar informações fidedignas para o público e o direito que a população tem de ser informada.

É possível reafirmar essa ideia com o seguinte entendimento do professor José Afonso da Silva: “Liberdade de informação compreende a liberdade de informar e a liberdade de ser informado. O acesso de todos à informação, resguardado o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional, é assegurado no art. 5º, XIV”.2

Deste modo, evidencia-se a necessidade de participação dos indivíduos ativa ou passivamente. É justamente este movimento de liberdade que resguarda a democracia. Para melhor avaliar a importância de uma sociedade livre e participativa, é fundamental fazer uma breve comparação entre o período da Ditadura Militar (1964-1985) passado pelo Brasil e o regime democrático hoje vivido.

O regime militar tentou silenciar o país. Aconteciam as mais absurdas atrocidades e os indivíduos eram compelidos a não se manifestarem. Apesar do esforço do governo no sentido de conter qualquer tipo de comunicação e acesso à informação, através da censura intensa, muitos contrariaram o sistema e foram presos, torturados e expatriados.

A censura atingiu os mais diversos meios de comunicação: livros, periódicos, revistas, programas de televisão, poesias, músicas, produções cinematográficas, dentre outros. Os militares oprimiam qualquer tipo de informação que prejudicasse a imagem do governo brasileiro.

1 Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789. Disponível em:

<http://pfdc.pgr.mpf.gov.br/atuacao-e-conteudos-de-apoio/legislacao/direitos-humanos/ declar_dir_homem_cidadao.pdf>. Acesso em: 12 fev. 2013.

(13)

12

Por outro lado, o regime democrático tem forte preocupação com a transparência das decisões e acontecimentos no que diz respeito à coisa pública. A imprensa fica responsável pela divulgação das informações para a sociedade de forma a permitir que todos fiquem cientes dos fatos ocorridos tanto no âmbito político como em qualquer outro.

Além da liberdade de imprensa, existem outros tipos como a de expressão e de informação. Vale ressaltar que muitas formas de liberdade foram extremamente limitadas no período da Ditadura Militar e isso foi feito através da censura. A Constituição Federal de 1988 trouxe valores que introduziram a democracia no Brasil.

O direito à liberdade recebeu respaldo constitucional e alguns incisos do art. 5º da Carta Magna especificamente abordam as liberdades relacionadas ao tema em pauta, são eles:

Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

[...]

IV – é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato; [...]

IX – é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença; [...]

XIV – é assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional; [...]

O art. 220 do referido diploma legal também deve ser mencionado, pois trata claramente da liberdade de informação jornalística e da proibição à censura.

Art. 220. A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição.

§1º - Nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social, observado o disposto no art. 5º, IV, V, X, XIII e XIV.

§2º - É vedada toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística. [...]

§6º - A publicação de veículo impresso de comunicação independe de licença de autoridade.

(14)

A conquista da liberdade de informação é tão expressiva e relevante que alguns autores, como Luis Gustavo Grandinetti Castanho de Carvalho, compreendem que qualquer restrição a esse direito deve ser evitada.

A afirmação da liberdade de informação como direito fundamental e sua marcada importância no regime democrático implica se evitar ao máximo qualquer restrição para a circulação da informação. Nesse sentido, o órgão judicial deverá adotar como regra outras medidas, se possíveis e suficientes, como a condenação civil e a determinação de publicação da resposta – devidamente reestruturada e coerente com um novo direito de informação.3

Porém, ao verificar a existência de conflitos de interesse entre direitos fundamentais previstos constitucionalmente, sugere que seja executada, dentre outros procedimentos, a ponderação de bens.

[...] Analisar casuisticamente a hipótese para determinação de qual direito fundamental deve ceder para preservar o outro. Isso não é censura. É legítima atividade jurisdicional mediante o dentro devido processo legal, com ampla defesa. A censura é ato arbitrário, sem pautas predefinidas, sem obediência ao devido processo legal e sem possibilidade recursal (ibid., p. 143).4

Com a consolidação do regime democrático, tornou-se evidente a necessidade de análise do caso concreto pela autoridade judiciária a fim de determinar qual interesse deve prevalecer. Cabe ressaltar que toda e qualquer medida a ser tomada deve ser razoável e proporcional ao que o caso exige.

2.2 A LIBERDADE

Conforme consta no inciso I, do art. 3º, da Constituição Federal de 1988, a construção de uma sociedade livre é um dos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil. A liberdade é um direito previsto constitucionalmente, inclusive aparecendo no preâmbulo da referida Constituição, e deve ser respeitado de forma significativa.

Entretanto, como todo e qualquer direito existente em um Estado Democrático, a liberdade não é absoluta. As limitações aparecem de acordo com o caso concreto e devem ser analisadas de forma cuidadosa pela autoridade competente. É válido mencionar o seguinte brocardo: “O seu direito acaba quando começa o do outro”. Se os indivíduos tivessem

3 CARVALHO, Luis Gustavo Grandinetti Castanho de. Liberdade de informação e o direito difuso à

informação verdadeira. Rio de Janeiro: Renovar, 2003, p. 142.

(15)

14

consciência da funcionalidade desta sentença, certamente as relações sociais seriam bem mais fáceis.

Em razão da natureza deste trabalho, é relevante mencionar a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão (1789), que obteve espaço com a Revolução Francesa. Este documento serviu de inspiração para os demais que se sucederam, como a Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948)5, já mencionada anteriormente.

Os artigos X e XI da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão (1789) são de extrema importância para o reconhecimento da liberdade de expressão e comunicação como um direito:

Art. X. Ninguém pode ser incomodado por causa das suas opiniões, mesmo religiosas, contato que não perturbem a ordem pública estabelecida em lei.

Art. XI. A livre comunicação de pensamento e opinião é um dos direitos mais preciosos do homem; todo cidadão pode, pois falar, escrever, imprimir livremente, salvo quando tiver de responder do abuso desta liberdade nos casos previstos em lei.

A leitura destes artigos permite a percepção de que sempre existiram os abusos na esfera da comunicação e é justamente este aspecto que deve ser trabalhado. Um indivíduo não pode ter uma liberdade de forma ilimitada. A vida em sociedade é composta por relações interpessoais que devem ser respeitadas de forma a permitir uma coexistência pacífica.

Por exemplo, ainda que a imprensa realize a sua atividade de divulgar os fatos, ela deve respeitar os envolvidos, trabalhar cuidadosamente com as palavras para que não sejam mal interpretadas, desenvolver um senso de busca pela verdade, com repúdio ao sensacionalismo. Desta forma, seria mais fácil evitar os abusos e os prejulgamentos.

2.3 IMPRENSA

O vocábulo “imprensa” pode ser interpretado de forma restrita ou ampla, dependendo do contexto em que está sendo analisado. Ana Lúcia Menezes Vieira destrincha as duas possibilidades:

[...] era usado antigamente, de maneira restritiva, somente para os jornais; os jornalistas, igualmente, eram somente os profissionais ligados aos periódicos. A

5 COSTA, Renata. Como surgiu a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão?. Disponível em:

<http://revistaescola.abril.com.br/historia/fundamentos/como-surgiu-declaracao-direitos-homem-cidadao-494338.shtml>. Acesso em: 2 fev. 2013.

(16)

própria Constituição Federal de 1988 adotou esta diferenciação no artigo 222: ‘a propriedade de empresa jornalística e de radiodifusão sonora e de sons e imagens (...)’. Por outro lado, [...] é comumente usado como gênero dos veículos de informação, abrangendo também as rádios e as TVs, cujos profissionais são tidos também como jornalistas.6

Luis Gustavo Grandinetti Castanho de Carvalho demonstra que houve uma notável evolução conceitual da palavra “imprensa”. Inicialmente, compreendia-se “[...] o conceito de imprensa, lato sensu, como sendo todos os produtos de impressos, abrangendo não só os jornais e revistas, mas os livros, panfletos, cartazes, prospectos etc. Stricto sensu, define os jornais e periódicos de grande circulação”.7

Entretanto, o ilustre autor esclarece que o conceito adotado tornou-se inadequado e, em seguida, faz uma breve análise da nova forma de compreensão do termo.

Imprensa hoje significa informação, jornalismo, independentemente do processo gerador, seja a prensa ou seja a radiodifusão de sons.

Neste conceito podemos incluir como imprensa a atividade jornalística dos jornais, revistas, periódicos, televisão, rádio e a internet. O que prepondera é a atividade e não o meio empregado para divulgá-la.8

É válido ressaltar que o presente trabalho se utilizará do termo na sua versão moderna e ampla.

O conceito de imprensa compreendido como é hoje se consolidou no século XVII, segundo Sérgio Ricardo de Souza,

[...] momento em que a troca de informações ultrapassa a necessidade do intercâmbio de mercadorias e, as próprias notícias começam a se tornar “mercadorias”, possibilitando a sedimentação do processo de profissionalização do jornalismo, bem como a institucionalização da atividade como ramo empresarial, submetida, paulatinamente, às mesmas leis do mercado.9

Observa-se, assim, que o foco da imprensa sempre estará mudando conforme o que demanda a sociedade. Entretanto, diante dos direitos já conquistados, espera-se que o controle das atividades dos nossos representantes seja um aspecto imutável da sua função.

6 VIEIRA, Ana Lúcia Menezes. Processo Penal e Mídia. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p.

28/29.

7 CARVALHO, Luis Gustavo Grandinetti Castanho de. Liberdade de informação e o direito difuso à

informação verdadeira. Rio de Janeiro: Renovar, 2003, p. 36.

8 Ibidem.

9 SOUZA, Sérgio Ricardo de. Controle judicial dos limites constitucionais à liberdade de imprensa. Rio de

(17)

16

2.4 MEIOS DE COMUNICAÇÃO DE MASSA

Para que o assunto seja inicialmente compreendido, as lições de Ana Lúcia Menezes Vieira são absolutamente pertinentes:

É possível dizer que a comunicação de massa é o processo de informação que se realiza entre os comunicadores e a massa de audiência, heterogênea e anônima, por meio de instrumentos que são os canais da comunicação. E os meios de comunicação, [...], são instrumentos a serviço da informação.10

A princípio, a comunicação de massa se estabelecia através de meios muito simples, como jornais e panfletos. A intensificação do êxodo rural, em razão da Revolução Industrial, permitiu o crescimento desses meios escritos. Algumas mudanças consideráveis ocorreram no século XX: o rádio e a televisão foram as grandes novidades da época.

No Brasil, em particular, onde grande parte da população não era alfabetizada e, portanto, não compreendia as informações que eram divulgadas nos meios escritos, o rádio fez grande sucesso. O aparelho foi um verdadeiro difusor de mensagens, pois possibilitou o alcance de muitos. Além disso, após um tempo, veio a questão da sua portabilidade, que propagou ainda mais o acesso.

Ainda no século XX, a televisão aparece com a realização das transmissões ao vivo, trabalhando com sons e imagens. Em seguida, é possível observar a internet em seus aspectos embrionários. Em nada se compara com o mundo de possibilidades que hoje está disponível para o usuário.

Foi justamente a partir do desenvolvimento desta tecnologia que os fatos importantes puderam ser divulgados e relatados a nível mundial, o que acabou por colaborar com certa conexão entre os países, de forma a possibilitar uma troca de informações a fim de lutar pelos direitos comuns a todos os seres humanos, resultando, por exemplo, na Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948).

Fica claro que o potencial de comunicação se tornou muito mais amplo com o advento da internet e a cada ano há o seu aperfeiçoamento. Obviamente, tornou-se um dos principais meios de mobilização social. Atualmente, até mesmo assinaturas de petições online de caráter público são solicitadas, permitindo, assim, a propagação do espírito da democracia.

(18)

2.5 BREVE NOÇÃO DE OPINIÃO PÚBLICA

A expressão “opinião pública” é compreendida por Fábio Martins de Andrade como o “juízo coletivo adotado e exteriorizado no mesmo direcionamento por um grupo de pessoas com expressiva representatividade popular sobre algo de interesse geral”.11

Para que a opinião pública possa surgir, é necessário que os cidadãos recebam as informações dos órgãos da mídia e estejam aptos para discuti-las de forma consciente. Acontece que, atualmente, o excesso de notícias veiculadas é tão grande que acaba sobrecarregando os indivíduos, impedindo que estejam devidamente preparados para o debate dos assuntos.

Ao receber determinada informação, o indivíduo tende a absorvê-la da forma como chega para ele, sem realizar qualquer juízo de contestação ou análise. Sabe-se que a função inicial da mídia era de divulgar notas de maneira imparcial e objetiva, visando fornecer as informações que são de interesse público.

Entretanto, o quadro mudou a partir do momento em que a imprensa adotou uma postura diferente: as notícias agora não só são informadas, como também recebem uma carga intencional de crítica do emissor da mensagem. Deste modo, em razão de tudo o que foi esclarecido anteriormente, “a opinião pública reduziu-se à opinião publicada pelos órgãos da mídia” (ibid., p. 47).12 Cabe destacar, ainda, que a opinião pública difere da expressão “clamor

público” que será abordada no momento oportuno.

2.6 LIBERDADE DE INFORMAÇÃO X LIBERDADE DE EXPRESSÃO

Há uma diferença bastante importante entre essas duas formas de liberdade que se determina basicamente pelos conceitos de “informação” e “expressão”. A liberdade de informação está ligada à comunicação, veiculação de fatos, portanto, a narração deve ser feita

11ANDRADE, Fábio Martins de. Mídia e Poder Judiciário: A influência dos órgãos da mídia no processo

penal brasileiro. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007, p. 45.

(19)

18

de acordo com a realidade, de modo objetivo e imparcial. Quando se trata de liberdade de expressão, não existem essas limitações, tendo em vista que uma opinião é sempre revestida de parcialidade e subjetividade.

O ensinamento de Luis Gustavo Grandinetti Castanho de Carvalho esclarece a necessidade de distinção entre os dois termos:

Porque se afigura imprescindível distinguir informação de expressão? Porque o recebedor da informação necessita do fato objetivamente ocorrido para estabelecer sua cognição pessoal e para que possa elaborar a sua percepção sobre o mesmo fato, de modo a formar sua convicção sem qualquer interferência. Já a divulgação de uma opinião é necessariamente parcial, pessoal, de modo que o recebedor da opinião deve recebê-la, não como matéria-prima para seu pensamento, mas como matéria já trabalhada por outrem, já resolvida à luz dos fatos objetivamente recolhidos pelo conhecimento daquele. No primeiro caso, o recebedor elaborará seu próprio pensamento; no segundo, aderirá ou não ao pensamento já formulado.13

Outro trecho de Luis Gustavo Grandinetti Castanho de Carvalho permite uma compreensão ainda mais satisfatória:

[...] é preciso não confundir as duas essências: informação e expressão. Elas quase sempre coexistem em um mesmo veículo, com maior ou menor interação, mas devem ser examinadas sob pontos de vista diametralmente opostos: uma é imparcial; outra é parcial; uma tem a função social de contribuir para a elaboração do pensamento, a outra tem a função social de difundir um pensamento ou um sentimento já elaborado. São fronteiras tênues, mas existentes, e que não devem ser ultrapassadas (ibid., p. 26).14

Apesar desta análise, é necessário considerar que, ainda que a intenção seja veicular um fato de modo objetivo e imparcial a fim de divulgar a informação, dificilmente a mensagem estará absolutamente isenta da opinião do seu emissor.

Além disso, a liberdade de informação deve ser compreendida como um direito que o indivíduo tem de ser informado. É através deste acesso aos acontecimentos que ele poderá formar seus juízos de valor em relação aos mais diversos setores da sociedade, estando apto para fazer suas escolhas.

Como é possível perceber nas explicações anteriores, a verdade deve estar presente quando se tratar da liberdade de informação. Entretanto, em razão da alta velocidade na

13 CARVALHO, Luis Gustavo Grandinetti Castanho de. Direito de Informação e Liberdade de Expressão.

Rio de Janeiro: Renovar, 1999, p. 24/25.

(20)

veiculação dos fatos, cada vez mais acelerada por causa das novas tecnologias, não é razoável trabalhar com a ideia de uma verdade absoluta, incontestável. Os profissionais da imprensa têm a responsabilidade e o dever ético de acompanhar o andamento dos acontecimentos para não desviar do foco que é a busca da verdade.

Para que os especialistas da área possam atuar de acordo com essas exigências, é necessário viabilizar o seu acesso às informações e garantir o sigilo da fonte (art. 5º, XIV, Constituição Federal/88), tendo em vista que este é considerado um direito fundamental, de acordo com a Carta Magna. Os fatos noticiáveis devem estar disponíveis para que sejam explorados com o devido respeito à imagem dos envolvidos.

É válido mencionar algumas hipóteses de limitação ao livre acesso às fontes de informação que estão previstas nos incisos do art. 5º, da Constituição Federal de 1988, por exemplo: quanto aos fatos que dizem respeito à intimidade dos indivíduos, ou seja, estão relacionados à esfera da vida privada (X); quanto às informações que estão em poder dos órgãos públicos, quando o sigilo for imprescindível à segurança da sociedade e do Estado (XXXIII); quanto aos atos processuais em sentido amplo, quando o interesse social ou a defesa da intimidade exigir exceção ao princípio da publicidade (LX).

Neste momento é possível observar um verdadeiro embate entre princípios constitucionais. A liberdade de informação jornalística, bem como a liberdade de expressão, se contrapõe ao direito à intimidade, à vida privada, por exemplo. Mostra-se fundamental a atuação do Poder Judiciário para dirimir eventuais conflitos. É necessário que seja feita uma análise de acordo com o caso concreto para que a decisão seja apropriada.

A influência da imprensa e da mídia repercute em toda a sociedade, inclusive naqueles que atuam executando os julgamentos. Portanto, é cabível o estudo sobre os reflexos da ligação existente entre a mídia avassaladora e sensacionalista e as autoridades competentes para julgar o acusado de praticar um crime.

Há outro ponto de vista a respeito da relação entre as duas expressões em pauta. Compreende-se que, para que outras liberdades sejam exercidas, é necessário que a liberdade de expressão se manifeste antes. Esse é o entendimento de Celso Ribeiro Bastos ao abordar o tema no seguinte trecho:

A liberdade de pensamento, ou de opinião, é qualificada por alguns autores como simultaneamente primária e primeira, isto pelo fato de aparecer cronológica e logicamente antes de outras liberdades que não são senão um consectário seu. A

(21)

20

própria liberdade de imprensa permite, por outro lado, a comunicação das opiniões. Aqui, a liberdade secundária amplifica a primeira ao mesmo tempo em que sobre ela se funda (BASTOS, 1997 apud VIEIRA, Ana Lúcia Menezes. Processo Penal e

Mídia. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p. 24). 15

2.7 ANÁLISE CONSTITUCIONAL

Os conflitos existentes entre princípios constitucionais devem ser dirimidos com base em uma análise substancial do caso concreto. Ao examinar as hipóteses de limitação ao livre acesso às fontes de informação, é possível identificar diversos focos de atritos. Entretanto, há situações muito esclarecidas ou sem qualquer evidência de conflito.

Quando uma pessoa física ou jurídica tem fatos errôneos ou inverídicos publicados a seu respeito, surge então “o direito de resposta, proporcional ao agravo”, além da possibilidade do acusado ou ofendido receber indenização, dependendo da gravidade do dano. A Lei nº 5.250/67 regula a liberdade de manifestação do pensamento e de informação e o seu art. 29 estipula uma medida baseada no senso de justiça que permite que o indivíduo ofendido possa legitimamente se defender da publicação injuriosa com o respaldo da Constituição (art. 5º, V).

O escopo da possibilidade de defesa, que se relaciona com o direito de resposta, é a elucidação dos fatos para que a opinião pública possa conhecer os argumentos do ofendido. A resposta deve ser proporcional para que seja justa e adequada. O art. 34 da Lei nº 5.250/67 traz as situações em que o direito de resposta não é cabível.

É importante frisar que a Lei nº 5.250/67 foi recepcionada pela Constituição Federal de 1988, em razão da compatibilidade do seu conteúdo com o art. 5º, inciso V, da Carta Magna e, obviamente, por não ir de encontro a qualquer dos princípios constitucionais. Deve-se enfatizar que o direito de resposta, no entendimento das normas brasileiras, não é um direito exclusivamente voltado para o indivíduo ofendido. É, também, um instrumento para esclarecer os fatos perante o público.

Outro ponto interessante a ser observado é a relevância do tratamento explícito à censura no texto constitucional. Isso porque o Brasil viveu vinte anos de repressão e silêncio no período marcado pela Ditadura Militar. Assim, é possível verificar a reiteração do tema em dois pontos da Constituição Federal/88 (art. 5º, IX e art. 220, §2º). A censura estabelece que

15 BASTOS, Celso Ribeiro. A liberdade de expressão e a comunicação social. Cadernos de Direito

(22)

uma informação, antes de ser veiculada, deve passar por certo tipo de controle, baseado em critérios de ordem moral ou política. Ao evitar que determinada ideia ou informação circule, o Estado estaria coibindo a liberdade de expressão, o que é inadmissível no Estado Democrático de Direito.

Ainda que a censura não mais seja admitida, existem outras formas de controle que se mostram razoáveis. A existência de limitações torna possível a convivência em sociedade. Não se trata de uma punição ao exercício da liberdade de expressão, mas sim um modo de balizar os excessos, por exemplo, através dos incisos V e X, do art. 5º, da Constituição Federal de 1988.

É fundamental ter a consciência de que conflitos entre princípios constitucionais sempre existirão. Para que as decisões sejam cada vez mais acertadas, é necessário que o caso concreto seja analisado de acordo com as suas peculiaridades, e que parâmetros mínimos sejam estabelecidos para nortear a resolução do conflito.

Ao tratar da influência da mídia e da imprensa no Processo Penal, é possível notar alguns princípios em conflito com a liberdade de expressão e de informação jornalística, são eles: o princípio da imparcialidade do juiz; da presunção de inocência; da proibição da prova ilícita; do devido processo legal; da verdade processual, dentre outros.

Deste modo, fica evidente que, apesar da liberdade de informação estar vinculada ao interesse público16, o acusado tem o direito a um julgamento justo, que fatalmente ficará

comprometido pelo sensacionalismo agressivo dos veículos difusores de informações. O que se trata aqui não é sobre a defesa de um ou outro indivíduo, mas sim a ponderação de valores para verificar qual princípio precisa ser resguardado em uma situação específica.

Para melhor compreensão da discussão, é válido citar o trecho da obra de Ana Lúcia Menezes Vieira que desenvolve a importância do tema:

Os excessos que envolvem a informação nos meios de comunicação, cobertos pelo manto da liberdade de imprensa, podem causar danos irreparáveis ao direito de defesa e à presunção de inocência do acusado, à pretensão punitiva estatal e às garantias fundamentais, relacionadas na Carta Magna, que dizem respeito à dignidade de cada indivíduo.17

16 “Somente o interesse público caracteriza a liberdade de informação como direito fundamental. Não qualquer

interesse do público, porque o público tem interesses às vezes menos dignos daquela liberdade. A mera curiosidade, o prazer pela desgraça alheia, a fofoca, não podem ser considerados como informação jornalística”. CARVALHO, Luis Gustavo Grandinetti Castanho de. Direito de Informação e Liberdade de

Expressão. Rio de Janeiro: Renovar, 1999, p. 88.

(23)

22

Por essa razão, mostra-se absolutamente fundamental atingir o ponto de equilíbrio. A mídia deve divulgar as informações de forma consciente, sem agredir os envolvidos na notícia ou denegrir suas imagens, abstendo-se de uma postura investigativa, acusadora e julgadora, respeitando os limites éticos de sua atividade (ibid., p. 20).18

Sendo assim, deve ficar claro que não só o acusado ou ofendido pode ter a sua honra e dignidade afetadas com o comportamento inconsequente da imprensa. Também as testemunhas e a vítima podem sofrer uma exposição agressiva e desnecessária, tendo em vista a exploração de todos os ângulos do caso. Para evitar danos irreparáveis, é fundamental o estabelecimento de diretrizes para nortear a atuação da mídia na divulgação dos atos referentes ao Processo Penal.

3 ABUSOS NA LIBERDADE DE IMPRENSA E A INFLUÊNCIA NO PROCESSO PENAL

3.1 VISÃO GERAL

No que diz respeito à fase do inquérito policial, o Superior Tribunal de Justiça19

reconhece a necessidade do sigilo da investigação. É fundamental observar que existe diferença entre a fase de instauração do inquérito e a de persecução penal. Inicialmente, a autoridade policial busca reunir indícios e provas de que existem elementos suficientes para que a ação penal seja proposta.

Além do entendimento jurisprudencial, há também previsão no art. 20 do Código de Processo Penal20 neste mesmo sentido. Os princípios constitucionais também vão ao encontro

da necessidade de preservação da imagem e da honra do suspeito ou indiciado. Ao ser considerado presumidamente inocente, o indivíduo somente deveria ter a sua identidade divulgada publicamente com a sua prévia autorização. Entretanto, isso não é uma prática observada pelas autoridades policiais que seriam as responsáveis por zelar pela discrição neste momento de investigação.

18 VIEIRA, ibid., p. 20.

19 STJ. ROMS 15167/2002-PR. Relator: Min. Félix Fischer. Publicado: DJ 10 mar. 2002, p. 253.

20 Decreto-Lei nº 3.689/1941. Art. 20. A autoridade assegurará no inquérito o sigilo necessário à elucidação do

(24)

Cabe ressaltar que o mesmo não é válido para os atos processuais, que têm uma natureza pública, exceto nas hipóteses previstas em lei. Neste caso, a imprensa tem o dever de informar a sociedade, de modo que os indivíduos possam acompanhar os fatos que os cercam. Inclusive, é fundamental reafirmar o papel essencial da mídia no Estado Democrático de Direito. Através da sua atuação, as informações circulam livremente alcançando públicos ilimitados e há a divulgação de acontecimentos de forma transparente.

O problema surge quando a liberdade de imprensa ultrapassa os limites do razoável. Ao tentar manifestar determinado ponto de vista, acaba se excedendo e expondo certas pessoas e situações de maneira indevida. Uma abordagem sensacionalista normalmente acaba por ferir princípios constitucionais que deveriam ser fortemente amparados, como o da presunção da inocência ou mesmo o direito à imagem e à preservação da honra.

Outro aspecto de influência da mídia no Processo Penal que pode ser analisado é o fato de que o clamor público, muitas vezes gerado e desenvolvido por notícias tendenciosas, pode pressionar os magistrados no sentido de tomar determinada decisão, normalmente desfavorável ao acusado.

Sendo assim, é possível constatar que a atuação da imprensa deve ser comedida. Não há que se falar em controle direto por parte do Estado, pois, deste modo, corre-se o risco de que tal prática seja confundida com a censura. Sugere-se a elaboração de leis que regulamentem a forma como os profissionais da mídia devem exercer o seu ofício de acordo com a ética e a moral, delimitando situações em que seja necessário o controle e, havendo excessos, estabelecendo penas para aqueles que descumprirem as determinações legais.

3.2 A INFORMAÇÃO VEICULADA A PARTIR DA LIBERDADE DE IMPRENSA

A informação é fundamental para a sociedade que vive uma democracia. É possível afirmar inclusive que se o exercício da liberdade de informação estiver prejudicado, outros direitos previstos constitucionalmente, como a igualdade e a busca por uma sociedade participativa, estarão comprometidos.

Através da divulgação dos atos praticados pelo Poder Público, os indivíduos sentem a segurança de que os tempos difíceis do regime militar não retornarão. A conquista da liberdade de imprensa após o referido período foi árdua. Muitos foram torturados, exilados,

(25)

24

ou até mesmo assassinados. Por isso, mostra-se tão essencial garantir que essas liberdades (de imprensa, de informação e de expressão) possam ser efetivamente exercidas.

Para que os indivíduos possam se manifestar perante as condições sociais que enfrentam, é necessário que tenham acesso às informações de interesse público. Através do conhecimento gerado pela consolidação dos fatos e formação de opinião têm a oportunidade de reivindicar direitos e se proteger de situações que se tornam mais claras com a divulgação promovida pela imprensa.

Deste modo, fica evidente que a liberdade de imprensa é uma grande conquista. Porém, também é necessário tomar conhecimento dos abusos e excessos praticados pelos profissionais da mídia. Normalmente, compreende-se que a simples transmissão da informação não causa prejuízo, exceto quando for necessário o consentimento prévio daquele que estiver sendo exposto. Entretanto, é possível observar que a imprensa acaba denegrindo a imagem de alguns indivíduos e fazendo com que passem por situações vexatórias cujo dano em muitos casos pode ser irreparável.

O problema ocorre principalmente por conta da mídia sensacionalista. O foco é o lucro, a venda de notícias, a comercialização de matérias que despertem o interesse e/ou a curiosidade da sociedade. Ou seja, a informação passou a ser um produto. E, diante de tais circunstâncias, os abusos ocorrem frequentemente. Ignacio Ramonet reitera este entendimento em sua obra ao afirmar que:

A mídia está sujeita a uma concorrência cada vez mais feroz; as pressões comerciais se intensificam. Muitos quadros dirigentes da mídia vêm doravante do universo empresarial e não mais do mundo jornalístico. Eles são menos sensíveis à veracidade da informação. Aos olhos deles, o new business, o mercado da informação, é antes de tudo um meio de gerar lucros [...]21

Cabe ressaltar que a imprensa tem uma função social bastante relevante que fica muito comprometida com o comportamento inadequado de alguns profissionais da área. Transmitir informações que correspondem à realidade e são efetivamente de interesse público deveria ser o foco e o objetivo da atividade. Ao atuar de forma correta e ilibada, a mídia assume o papel de instrumento da prestação de contas entre o Poder Público e a sociedade.

21 RAMONET, Ignacio. A tirania da comunicação. 3ª ed. Trad. de Lúcia Mathilde Endlich Orth. Petrópolis-RJ:

(26)

Não se trata de uma necessidade inventada. É possível, inclusive, afirmar que o leitor tem o direito à informação verdadeira. Neste sentido, Luis Gustavo Grandinetti Castanho de Carvalho se manifesta:

Uma vez optando o órgão da imprensa pela publicação da matéria jornalística, surge para o leitor um direito: o direito à informação verdadeira. [...]

Esclareça-se que a acepção de informação, empregada aqui, é a transmissão de acontecimentos, de fatos, é a história presente. Os fatos acontecem, não são criados pela imaginação humana. Sendo a transmissão meramente de fatos, a informação deve cingir-se a eles, de forma verídica e autêntica.22

Por outro lado, em diversas situações, é possível observar que até mesmo a privacidade e a honra de determinados indivíduos são invadidas por razões absolutamente desnecessárias e de maneira injustificada. A jurisprudência apresenta entendimentos no sentido da inviolabilidade desses direitos:

Liberdade de informação e divulgação e inviolabilidade à honra e vida privada:

STJ – “Se, de um lado, a Constituição assegura a liberdade de informação, certo é que, de outro, há limitações, como se extrai no § 1º do art. 220, que determina seja observado o contido no inciso X do art. 5º, mostrando-se consentâneo o segredo de justiça disciplinado na lei processual com a inviolabilidade ali garantida” (3ª Turma – RMS nº 3.292-2/PR – rel. Min. Costa Leite – Ementário STJ, 12/254)

Lei de imprensa e proteção constitucional à livre manifestação de pensamento:

STJ – “A Constituição considera livre a manifestação do pensamento, proíbe o anonimato, e assegura o direito de resposta, a inviolabilidade da intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, o que não derroga a chamada Lei de Imprensa, a qual continua em vigor naquilo em que não contraria a Carta Magna” (5ª Turma – RHC nº 3.296-0/SC – rel. Min. Jesus Costa Lima – Ementário STJ, 09/712) (grifo nosso)

Acesso à informação (CF, art. 5º, XIV) e inviolabilidade à honra: STJ - “Não

responde civilmente o órgão de divulgação que, sem ofender a vida privada dos figurantes de fatos, noticia crimes, apurados em inquérito policial”. (4ª Turma – REsp nº 42.844-0/SP, rel. Min. Dias Trindade – Ementário STJ, 09/232)

Como o enfoque do presente trabalho está relacionado ao Processo Penal, a análise do tema estará voltada para o indiciado e o acusado.

3.3 IMPRENSA E PROCESSO PENAL

22 CARVALHO, Luis Gustavo Grandinetti Castanho de. Liberdade de informação e o direito difuso à

(27)

26

Antes de tratar da relação específica entre a mídia e o Processo Penal, é necessário observar que a imprensa tem um papel muito claro no que diz respeito à fiscalização da atuação do Poder Judiciário de uma forma geral. O Estado Democrático de Direito requer a transparência nas atividades, o que faz com que seja fundamental uma aproximação entre o Poder Judiciário e a sociedade. Através da publicidade das decisões e dos atos judiciais, os cidadãos podem fazer o devido controle do Estado, que tutela a liberdade das pessoas.

Entretanto, é possível notar que a função social precípua da mídia muitas vezes se perde por causa da obsessiva busca pelo lucro. A partir do momento em que a informação passou a ser encarada como mercadoria, perdeu um pouco da sua qualidade de veraz. A manipulação dos fatos para que se tornassem mais comerciáveis foi se tornando prioridade no mundo dos negócios.

A liberdade de imprensa é um direito fundamental previsto na Constituição Federal de 1988 e jamais deve ser vedado. Não significa dizer que possa ser exercido de forma descontrolada e abusiva. Todo cidadão tem o direito de receber as informações de interesse público, mas estas devem chegar isentas de argumentos tendenciosos.

O leitor deve ter a oportunidade de apreciar os fatos noticiados de maneira objetiva para então elaborar a sua própria opinião. Não é razoável que a mídia fabrique uma massa supostamente pensante que compartilha exatamente as mesmas opiniões.

Analisando a partir do que é veiculado nos meios de comunicação de massa, é possível perceber que a criminalidade ocupa grande parte dos temas abordados pelos noticiários. Não poderia ser diferente, até porque atinge indiscriminadamente as grandes cidades do Brasil, bem como municípios do interior do país.

Além disso, há um forte interesse do público neste assunto que instiga a curiosidade e faz com que a sociedade sinta a necessidade de investigar junto com o trabalho exercido pelas autoridades policiais, além de ter interesse em acompanhar a punição dos responsáveis pelos crimes.

Alguns casos são acompanhados pela imprensa do início ao fim. A publicação de notícias tendenciosas referentes a determinado fato criminoso pode gerar forte clamor público. Tal situação pode acabar constrangendo o magistrado a tomar uma decisão desprovida de imparcialidade. O juiz pode ter receio da repercussão negativa, por exemplo, de uma absolvição do réu.

(28)

Retrocedendo ligeiramente a linha de raciocínio, a mesma lógica pode ser considerada para a fase de instauração e desenvolvimento do inquérito policial. Entretanto, há um diferencial bastante significativo que deve ser apreciado: legalmente, a referida fase exige o sigilo para que os resultados sejam mais eficientes. A condução de procedimento investigativo necessita do componente surpresa. Para que se possa alcançar a fase de propositura da ação penal, é fundamental que os elementos essenciais para elucidação do fato criminoso e de sua autoria sejam colhidos nesta etapa anterior.

Percebe-se, então, que é necessário fazer essa distinção no momento de análise da atuação da imprensa. Cada fase exige uma postura diferenciada dos profissionais da mídia, porém nenhuma delas afasta a essencialidade de uma conduta de acordo com os valores pautados na ética e na moral.

3.4 BREVE NOÇÃO CONSTITUCIONAL

O Brasil vive um Estado Democrático de Direito que zela pela participação do povo nas decisões do governo23 com base no princípio constitucional da soberania popular. Isso

significa dizer que o acesso à informação é essencial para que esse direito possa ser exercido amplamente. O exercício do poder popular é tão fundamental quanto fica claro no entendimento de José Afonso da Silva:

A democracia que o Estado Democrático de Direito realiza há de ser um processo de convivência social numa sociedade livre, justa e solidária (art. 3.º, I), em que o poder emana do povo, e deve ser exercido em proveito do povo, diretamente ou por representantes eleitos (art. 1.º, parágrafo único); participativa, porque envolve a participação crescente do povo no processo decisório e na formação dos atos de governo; pluralista, porque respeita a pluralidade de idéias, culturas e etnias e pressupõe, assim, o diálogo entre opiniões e pensamentos divergentes e a possibilidade de convivência de formas de organização e interesses diferentes da sociedade; há de ser um processo de liberação da pessoa humana das formas de opressão que não depende apenas do reconhecimento formal de certos direitos individuais, políticos e sociais, mas especialmente da vigência de condições econômicas suscetíveis de favorecer o seu pleno exercício.24

A necessidade de transparência nos atos e decisões governamentais se encontra em todas as esferas de poder (Poder Legislativo, Poder Judiciário e Poder Executivo). Entretanto, no que concerne ao presente trabalho, apenas o Poder Judiciário será analisado.

23 Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Art. 1º. Parágrafo único. Todo o poder emana do

povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.

24 SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 18. ed. São Paulo: Malheiros, 2000, p.

(29)

28

Sendo assim, em relação ao exercício da função jurisdicional pelo Poder Judiciário, é indispensável considerar outro princípio constitucional de suma importância: o da publicidade. Encontra-se previsto no art. 37, caput, da Constituição Federal de 198825. O

referido princípio, ao ser respeitado e seguido corretamente, permite que a sociedade acompanhe as atividades jurisdicionais do Estado que se desenvolvem através dos atos processuais.

A mídia aparece como um forte instrumento de divulgação desses atos e seria bastante adequado se os profissionais respeitassem os limites da sua atuação. Como exemplo, é fundamental citar algumas das exceções ao princípio da publicidade previstas em incisos do art. 5º da Constituição Federal de 1988:

Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

[...]

XIV – é assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional; [...]

XXXIII – todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado; [...]

LX – a lei só poderá restringir a publicidade dos atos processuais quando a defesa da intimidade ou o interesse social o exigirem; [...]

Cabe frisar que a publicidade promovida pela imprensa em geral não é oficial, de acordo com decisão do STF ao julgar o Recurso Extraordinário 71.652. No entanto, deve ficar claro que este é um aspecto muito relacionado aos atos processuais e não contesta qualquer argumentação que tenha sido exposta até o presente momento quanto à atuação indevida da mídia.

Outro princípio constitucional que merece atenção é o da legalidade, que acaba por evitar a arbitrariedade das autoridades judiciárias na condução do processo penal. Isso é fundamental para o justo andamento do processo para o acusado, que deve ter os seus direitos garantidos. Neste sentido, Ana Lúcia Menezes Vieira se manifesta:

25 Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Art. 37. A administração pública direta e indireta de

qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte [...]

(30)

O princípio da legalidade é imperativo constitucional que limita o poder estatal. Assim como não existe poder sem limites, no tocante ao exercício da jurisdição, os princípios constitucionais do processo são verdadeiros escudos contra o arbítrio da autoridade judicante.

O Estado, na manifestação de seu poder jurisdicional, de aplicar o direito objetivo aos fatos concretos, cumpre sua função repressiva ao punir o autor de um fato criminoso. O ato de punir é exigido pela sociedade que se pretende estável, dentro de regras de convivência. [...]

A lei processual, contudo, não apenas persegue aqueles que são acusados da prática de infrações penais, visando à aplicação da pena, mas também os protege do arbítrio da autoridade judiciária. Sob esse aspecto, o processo é entendido como garantia do réu, de sua liberdade, diante da pretensão punitiva estatal. [...]

Especialmente no processo penal no qual está em questão a liberdade do indivíduo – bem inviolável assegurado no art. 5.º, caput, da CF/1988 -, os limites à atividade jurisdicional devem ser impostos para garantir não só os direitos processuais do réu, mas também o direito a uma decisão justa de interesse geral do público, destinatário da Justiça.26

Compreende-se, então, que o réu é um cidadão como outro qualquer e, nesta condição, possui todos os direitos fundamentais pertinentes ao homem. Obviamente que cada situação específica deverá ser analisada com as suas peculiaridades para que sejam tomadas as medidas cabíveis. Porém, tal análise deve se restringir à consecução do devido processo legal com observância a todos os princípios constitucionais que o regime democrático de direito assegura aos indivíduos.

4 DA DIGNIDADE DA PESSOA DO ACUSADO E DA FUNDAMENTALIDADE DO DIREITO À IMAGEM

4.1 O PROCESSO PENAL E O ACUSADO

O processo penal, quando de acordo com o princípio do devido processo legal e os demais princípios constitucionais, deve ser compreendido como um instrumento através do qual o Estado, na esfera do Poder Judiciário, pode elucidar um fato delituoso e aplicar as devidas penas sem, contudo, violar as garantias e os direitos daquele que está sendo acusado pela prática delitiva.

26 VIEIRA, Ana Lúcia Menezes. Processo Penal e Mídia. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p.

(31)

30

O objetivo do processo não deve ser de forma alguma a exposição do réu. A preservação da sua dignidade, privacidade e honra deve ter prioridade no decurso do processo penal, tendo em vista o atendimento ao princípio constitucional basilar da presunção de inocência. A essência do referido princípio encontra-se no inciso LVII, do art. 5º, da Constituição Federal de 198827.

Depreende-se do texto da norma citada que todos devem ser considerados inocentes até que o contrário seja provado. A prova categórica consiste no trânsito em julgado de sentença penal condenatória. Apenas quando não mais couber recurso da decisão, o réu pode ser considerado culpado ou inocente em relação à prática de infração penal.

Expor um indivíduo acusado significa estigmatizá-lo de criminoso pelo resto de sua vida, ainda que, ao ser julgado, seja absolvido, inocentado. A sociedade passa a enxergá-lo com um olhar discriminatório, o que pode gerar transtornos irreparáveis para a vida deste indivíduo.

Cabe ressaltar que o processo penal é, principalmente, instrumento garantidor da liberdade do acusado e da pretensão punitiva estatal. Com o desenvolvimento regular do processo, conforme as normas e os princípios constitucionais, o resultado será a elucidação do fato e da sua autoria de forma justa e equilibrada, preservando os valores difundidos no Estado Democrático de Direito.

Neste sentido, Ana Lúcia Menezes Vieira sustenta que:

O Estado, pelo processo, ao aplicar o direito objetivo na solução da lide, deve fazê-lo, portanto, dentro de parâmetros legais. O magistrado, ao atuar no processo, deve guiar-se por normas e regras contidas na Constituição, nos códigos processuais e nas leis de organização judiciária, visando, sempre, à salvaguarda não só dos direitos das partes, mas também da regularidade formal do processo.28 (grifo nosso)

Deste modo, fica evidente que há uma preocupação no sentido de proteger a dignidade da pessoa do acusado bem como a sua imagem. Porém, a mídia, em geral, desrespeita qualquer orientação no sentido de como deve pautar o seu trabalho, fazendo uma divulgação e exibição descontrolada e exacerbada dos fatos e das partes do processo.

27 Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Art. 5º, LVII. Ninguém será considerado culpado até

o trânsito em julgado de sentença penal condenatória.

(32)

4.2 A MÍDIA E O ACUSADO

O invento da máquina fotográfica trouxe novidades para o sistema jurídico. A partir da metade do século XIX, mostrou-se um cuidado maior com a imagem dos indivíduos, pressuposto para o surgimento do direito à imagem29.

Assim como qualquer direito, este sofre limitações, portanto, não é absoluto. Alguns doutrinadores, inclusive, indicam os principais fatores que restringem o direito em questão como, por exemplo, quando se tratar de pessoa pública, acontecimento público ou de assunto de interesse público.

A mídia, ao verificar a ocorrência de um crime, que é um acontecimento público, deve informar à sociedade os detalhes necessários para que os indivíduos possam se resguardar e se proteger dos criminosos.

Entretanto, cabe frisar que durante o andamento do inquérito policial ou mesmo após a propositura da ação penal, não é possível determinar e declarar a culpa de alguém. Somente a partir do trânsito em julgado de sentença penal condenatória é legítimo revelar quem é o culpado pela prática de certa infração penal e utilizar o referido termo.

Sendo assim, deve haver uma necessidade ou escopo essencial para que o suspeito ou o acusado tenham suas imagens divulgadas pela imprensa. Um exemplo importante é a divulgação das imagens das câmeras de segurança de determinado local de acontecimento público para tentar identificar e localizar o suspeito de um crime.

Nesta situação, é possível notar que o interesse social prevalece sobre o particular. Através da ponderação de interesses, observa-se que a divulgação é fundamental para a manutenção da ordem pública. É necessário ressaltar que esta é uma exceção ao que está previsto no art. 20 do Código de Processo Penal, que trata do sigilo durante a fase do inquérito policial.

Percebe-se, assim, que o direito à imagem do acusado não é ilimitado, mas deve ser resguardado sempre que possível. Muitas vezes, a grande responsável pelo desrespeito a esse direito é a própria autoridade policial. Talvez com a finalidade de enaltecer o seu trabalho de

29 CARVALHO, Luis Gustavo Grandinetti Castanho de. Processo Penal e Constituição: Princípios

(33)

32

investigação e captura, aproveite-se da vulnerabilidade da pessoa do suspeito para tornar o desenrolar da elucidação dos fatos um verdadeiro espetáculo.

Em sentido semelhante, manifesta-se Luis Gustavo Grandinetti Castanho de Carvalho:

[...] divulgação da imagem pela polícia: nesse caso, somente é legítima a divulgação da fotografia de suspeitos ou indiciados quando ela for justificável para desvendar crimes ou para localizá-los e, não, como um graciosismo da administração pública à imprensa.30

É fundamental compreender que a divulgação de imagens deve se restringir ao estritamente necessário. Neste mesmo sentido, tramita o Projeto de Lei nº 2.961/97 que visa alterar alguns dispositivos da Lei nº 4.898/65. O projeto foi recentemente aprovado pela Câmara dos Deputados. Encaminhado ao Senado, encontra-se na Comissão de Justiça, tendo como relator o Senador Romeu Ruma31.

As principais mudanças propostas, que coincidem com o conteúdo do presente trabalho, são as enunciadas na inclusão das alíneas “j)” e “l)” no art. 4º da Lei nº 4.898/65, versando sobre o tema da seguinte forma:

Art. 4º. Constitui também abuso de autoridade: [...]

j) revelar o magistrado, o membro do Ministério Público e membro do Tribunal de Contas, a autoridade policial ou administrativa, ou permitir, indevidamente, que cheguem ao conhecimento de terceiro ou aos meios de comunicação fatos ou informações de que tenha ciência em razão do cargo e que violem o sigilo legal, a intimidade, a vida privada, a imagem e a honra das pessoas;

l) dispensar tratamento indigno a quem esteja sob custódia de autoridade policial ou permitir a exposição pública de acusado em processo criminal ou administrativo, em detrimento da intimidade, da honra e da dignidade da pessoa humana.32

Luis Gustavo Grandinetti Castanho de Carvalho magistralmente conduz o assunto, permitindo a perfeita compreensão do entendimento mais razoável:

Está certo que a divulgação da imagem do suspeito, especialmente pela polícia, pode causar grande constrangimento quando se tratar de um inocente. Mas a divulgação da fotografia de um condenado procurado, de um suspeito, ou mesmo de alguém que foi preso em flagrante é, muitas vezes, altamente saudável do ponto de vista da defesa social, pois outras vítimas podem denunciá-lo. A sociedade tem direito de conhecer quem são os supostos autores de crimes para deles se precaver. O projeto,

30 CARVALHO, Luis Gustavo Grandinetti Castanho de. Processo Penal e Constituição: Princípios

Constitucionais do Processo Penal. 4. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006, p. 68.

31 Disponível em: <http://www.apmp.com.br/juridico/cidadania/projlei.htm>. Acesso em: 11 mar. 2013. 32 Ibidem.

(34)

contudo, visa proibir qualquer divulgação da imagem de suspeitos, indiciados e réus, até mesmo daqueles que estão sendo procurados por força de mandado de prisão. Por isso, um temperamento da proibição poderia ser feito. Talvez um critério fosse a autorização para a divulgação apenas das imagens das pessoas que estejam com prisão decretada (preventiva ou temporária) e condenadas criminalmente, mediante ordem judicial, mas, em ambos os casos, com o fim de proteção social e, não, de execração pública, como o caso de reiteração da imagem de condenados como forma de propaganda do governo, por exemplo. O limite da exposição pública – repita-se – seria a defesa social.33 (grifo nosso)

No que diz respeito à dignidade da pessoa do acusado ou indiciado, é necessário que algumas formalidades sejam observadas, de acordo com os seguintes incisos do art. 5º da Constituição Federal de 1988, para garantir a tutela deste direito:

Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

[...]

LVIII – o civilmente identificado não será submetido a identificação criminal, salvo nas hipóteses previstas em lei; [...]

LXII – a prisão de qualquer pessoa e o local onde se encontre serão comunicados imediatamente ao juiz competente e à família do preso ou à pessoa por ele indicada; LXIII – o preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado, sendo-lhe assegurada a assistência da família e de advogado;

LXIV – o preso tem direito à identificação dos responsáveis por sua prisão ou por seu interrogatório policial; [...]

Deste modo, depreende-se que para garantir os direitos do indiciado ou acusado é necessária a observância das normas que foram instituídas para regulamentar o processo penal. Além disso, é imprescindível que os conflitos de interesses entre princípios constitucionais sejam analisados pela autoridade judiciária com base nas condições da situação fática. Fica evidenciada a relevância da tutela do direito à imagem e à dignidade da pessoa do acusado em um Estado Democrático de Direito.

5 CONCLUSÃO

33 CARVALHO, Luis Gustavo Grandinetti Castanho de. Processo Penal e Constituição: Princípios

Referências

Documentos relacionados

Nesse contexto, o presente trabalho tem como objetivo realizar testes de tração mecânica e de trilhamento elétrico nos dois polímeros mais utilizados na impressão

Os principais objectivos definidos foram a observação e realização dos procedimentos nas diferentes vertentes de atividade do cirurgião, aplicação correta da terminologia cirúrgica,

Como parte de uma composição musi- cal integral, o recorte pode ser feito de modo a ser reconheci- do como parte da composição (por exemplo, quando a trilha apresenta um intérprete

O relatório encontra-se dividido em 4 secções: a introdução, onde são explicitados os objetivos gerais; o corpo de trabalho, que consiste numa descrição sumária das

psicológicos, sociais e ambientais. Assim podemos observar que é de extrema importância a QV e a PS andarem juntas, pois não adianta ter uma meta de promoção de saúde se

Em primeiro lugar, sinto-me uma privilegiada por ter escolhido como “casa de formação” a Faculdade de Ciências Médicas (FCM) da Universidade Nova de

Finally,  we  can  conclude  several  findings  from  our  research.  First,  productivity  is  the  most  important  determinant  for  internationalization  that 

A democratização do acesso às tecnologias digitais permitiu uma significativa expansão na educação no Brasil, acontecimento decisivo no percurso de uma nação em