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EXPERIÊNCIAS DA SEPARAÇÃO CONJUGAL: MULHERES E AS RELAÇÕES DE GÊNERO NO ASSENTAMENTO NOVA VIDA (UPANEMA-RN)

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PRÓ-REITORIA DE GRADUAÇÃO

DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS HUMANAS - DCH

CURSO DE LICENCIATURA INTERDISCIPLINAR EM EDUCAÇÃO DO CAMPO – LEDOC

TALITA MARQUES SENA

EXPERIÊNCIAS DA SEPARAÇÃO CONJUGAL: MULHERES E AS RELAÇÕES DE GÊNERO NO ASSENTAMENTO NOVA VIDA (UPANEMA-RN)

MOSSORÓ 2019

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EXPERIÊNCIAS DA SEPARAÇÃO CONJUGAL: MULHERES E AS RELAÇÕES DE GÊNERO NO ASSENTAMENTO NOVA VIDA (UPANEMA-RN)

Monografia apresentada a Universidade Federal Rural do Semi-Árido como requisito para obtenção do título de Licenciado em Educação do Campo, com habilitação em Ciências Humanas e Sociais.

Orientadora: Profª. Drª. Kyara Maria De Almeida Vieira

MOSSORÓ 2019

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S474e Sena, Talita Marques.

Experiências da separação conjugal: Mulheres e as relações de gênero no Assentamento Nova Vida (Upanema-RN) / Talita Marques Sena. - 2019.

77 f.: il.

Orientadora: Kyara Maria de Almeida Vieira. Monografia (graduação) - Universidade Federal Rural do Semi-árido, Curso de Educação do Campo, 2019.

1. Separação conjugal. . 2. Mulheres. 3. Identidade. 4. Assentamento. 5. Oeste

Potiguar. I. Vieira, Kyara Maria de Almeida, orient. II. Título.

ata. A mesma poderá servir de base literária para novas pesquisas, desde que a obra e seu (a) respectivo (a) autor (a) sejam devidamente citados e mencionados os seus créditos bibliográficos.

O serviço de Geração Automática de Ficha Catalográfica para Trabalhos de Conclusão de Curso (TCC´s) foi desenvolvido pelo Instituto de Ciências Matemáticas e de Computação da Universidade de São Paulo (USP) e gentilmente cedido para o Sistema de Bibliotecas da Universidade Federal Rural do Semi-Árido (SISBI-UFERSA), sendo customizado pela Superintendência de Tecnologia da Informação e Comunicação (SUTIC) sob orientação dos bibliotecários da instituição para ser adaptado às necessidades dos alunos dos Cursos de Graduação e Programas de Pós-Graduação da Universidade.

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Dedico este trabalho a minha mãe e meu pai, a meu esposo e ao meu filho, que são base de tudo na minha vida.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço primeiramente a Deus por todas as bênçãos concedida a mim, por chegar até aqui, por ter vencido tantas dificuldades e por não ter desanimando em meio ao caminho desse tão sonhado momento.

Agradeço a minha mãe e ao meu pai que, com toda humildade e simplicidade, ensinaram-me a ser uma pessoa decente, a respeitar meus semelhantes e buscar meus sonhos de forma honesta ainda que seja com muito trabalho, mas sem nunca passar por cima dos sonhos de ninguém.

Agradeço a minha família por estar ao meu lado todo esse tempo, me dando força, em especial minha avó materna e minha sogra pelo apoio e confiança.

Ao meu marido Luiz Antonio que me compreendeu e me apoiou nessa trajetória até aqui.

Agradeço aos professores (as) do curso Licenciatura Interdisciplinar em Educação do Campo-LEDOC, pois sem a colaboração de vocês talvez eu não estivesse onde estou hoje.

Agradeço as minhas colaboradoras por permitir que suas histórias fizessem parte desse trabalho.

Agradeço a minha orientadora pela paciência e contribuição, compartilhando seus conhecimentos, que me ajudaram a construir este trabalho, aprendizados que levarei para toda a vida.

Agradeço a Banca Examinadora, Professoras Janaiky Almeida e Arleide Meylan, por aceitarem participar desse momento e darem sua contribuição para meu trabalho.

Agradeço às minhas amigas, que ao longo desses cinco anos estiveram comigo em momentos bons e ruins: Eva Siqueira, Antonia Taizi, Ana Paula, Sara, Suzana Medeiros, Socorro Moura, Silvanete, Isla Maiara, Tassiana Marques, Salete Marques, Joelma Pinto, Jocasta e Polyana por estarem sempre comigo nos trabalhos em grupo, quando mesmo com ideias diferentes, sempre chegávamos a uma conclusão favorável a todas.

A todos aqueles que contribuíram direta ou indiretamente para a realização desse trabalho.

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RESUMO

Este trabalho surgiu da curiosidade de conhecer as experiências das mulheres separadas do Projeto de Assentamento Nova Vida. O objetivo geral da pesquisa foi analisar como as mulheres do Assentamento se constituíram enquanto sujeito após a separação conjugal. Os objetivos específicos foram: (A) Identificar os efeitos da ruptura conjugal das mulheres do Assentamento Nova Vida; (B) Verificar a (re) configuração familiar após separação em relação aos aspectos sociais, culturais e econômicos; (C) Analisar as práticas da sexualidade e os afetos das mulheres pesquisadas após a separação. Quanto ao percurso metodológico, trata-se de uma pesquisa exploratória, com pesquisa de campo, de natureza qualitativa. A coleta de dados foi realizada por meio de entrevistas semiestruturadas, com a pesquisa 10 (dez) mulheres do P.A Nova Vida (Upanema- RN). Para contribuir e enriquecer o trabalho dialogamos com alguns teóricos que nos permitiu compreender conceitos chaves para a produção deste trabalho, como: Zarias (2010), Silva (2008), Souza; Beleza; Andrade (2012), Coutinho; Menandro (2010), Lamela (2010), Hack, (2010) e Vieira (2005) que discorrem sobre a temática de família e divórcio. Oliveira (2003), Munanga (2013) discutem sobre etnia e identidade. Para discussão de gênero nos embasamos em Rago, (1998); para tratar da metodologia da pesquisa, Richardson e Peres (2010). Com esse estudo é possível afirmar que, desejada ou não, a separação muda completamente à organização familiar nos aspectos sociais, culturais e econômicos dos/as que nela estão envolvidos/as. Conclui-se, assim, por meio dos relatos das participantes dessa pesquisa, que os relacionamentos conjugais são marcados por dilemas, nos quais o desejo de uma relação sólida e a possibilidade de vivenciar a mobilidade nesses arranjos causam essa aproximação entre o casamento e o divórcio. Entretanto, é válido lembrar as limitações de tal parecer, pois diz respeito a um universo restrito de pessoas, limitado a um determinado contexto social.

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ABSTRACT

This work has as its object of study the women separated from the Nova Vida Settlement Project. The general objective of the research was to analyze how women from the Settlement constituted themselves as subjects after marital separation. The specific objectives were: (A) To identify the effects of the marital disruption of the Nova Vida Settlement women; (B) Verify family (re) configuration after separation from social, cultural and economic aspects; (C) Analyze the practices of sexuality and the affections of women surveyed after separation. As for the methodological approach, it is an exploratory research, with field research, of qualitative nature. Data collection was performed through semi-structured interviews with 10 (ten) women from P.A Nova Vida (Upanema-RN). To contribute and enrich the work we dialogue with some theorists that allowed us to understand key concepts for the production of this work, such as: Zarias (2010), Silva (2008), Souza; Beauty; Andrade (2012), Coutinho; Menandro (2010), Lamela (2010), Hack, (2010) and Vieira (2005) discuss the theme of family and divorce. Oliveira (2003), Munanga (2013) discuss about ethnicity and identity. For gender discussion we refer to Rago(1998); to address the research methodology, Richardson and Peres (2010). With this study it is possible to state that, whether desired or not, the separation completely changes the family organization in the social, cultural and economic aspects of those involved in it. Thus, it is concluded from the reports of the participants of this research that marital relationships are marked by dilemmas, in which the desire for a solid relationship and the possibility of experiencing mobility in these arrangements causing this approximation between marriage and divorce. . However, it is worth remembering the limitations of such an opinion, as it concerns a restricted universe of people, limited to a particular social context.

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LISTA DE IMAGEM

Imagem 1- Desenho da planta do P.A Nova Vida. Imagem 2- Imagem de satélite do P.A Nova Vida.

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LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 1 – Etnia.

Gráfico 2 – Escolaridade. Gráfico 3 – Profissão.

Gráfico 4 – Taxa Bruta de Natalidade por mil habitantes – Brasil – 2000 a 2015. Gráfico 5 - Gráfico da população projetada Rio Grande do Norte – 2010 a 2060. Gráfico 6 - Benefícios Sociais.

Gráfico 7 - Decisão da separação. Gráfico 8 – Preconceito.

Gráfico 9 - Novo relacionamento após a separação. Gráfico 10- Formas de lazer.

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

PROGRAD - Pró Reitoria de Graduação.

UFERSA - Universidade Federal Rural do Semi-Árido. CCSAH - Centro de Ciência Sociais Aplicadas e Humanas. LEDOC - Licenciatura Interdisciplinar em Educação do Campo. RN - Rio Grande do Norte.

IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística.

INCRA Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária. P. A - Projeto de Assentamento.

MMC- Movimento de Mulheres Camponesas.

MST- Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra.

PRONAF- Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar. CF8- Centro Feminista 8 de Março.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ... 11

2. LOCAL DE ESTUDO ... 14

2.1. Perfil das mulheres ... 16

3. FAMÍLIA E CASAMENTO NO BRASIL: BREVE HISTÓRICO ... 31

3.1. Rupturas: “Quando eu casei eu casei pra viver a vida inteira, só que não deu” ... 35

4. RECONFIGURAÇÃO FAMILIAR APÓS SEPARAÇÃO: “EU NUNCA DEIXEI DE ACREDITAR NESSA COISA QUE AS PESSOAS CHAMAM DE AMOR” ... 52

4.1 Feminismo e sua contribuição para a autonomia das mulheres ... 62

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 68

REFERÊNCIAS ... 70

APÊNDICE (A) Roteiro para entrevista com as Mulheres separadas do Assentamento Nova Vida. ... 75

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1 INTRODUÇÃO

Nas últimas décadas percebe- se cada dia mais o aumento da separação/ divórcio no Brasil. Esses dados foram percebidos nos resultados de pesquisa do (IBGE 2010) que apontam que os brasileiros vivem em torno de 13 a 16 anos entre casamento e o divórcio. A importância de estudar sobre essa temática se dá em razão dos impactos sociais e econômicos que o divórcio provoca para as partes envolvidas.

A inquietação por esse estudo partiu de uma observação durante uma reunião na Associação Comunitária do Projeto de Assentamento (P. A.) 1 Nova Vida (Upanema- RN), tendo em uma das pautas o recadastramento do Garantia Safra (benefício social) que exige a apresentação de documentos pessoais e do/a cônjuge. Muitas das mulheres presentes questionaram que não teria como apresentar essa documentação, relataram seu estado civil como separadas/divorciadas. Durante esse processo constatamos um número significativo de mulheres “separadas” na referida comunidade.

Diante dessa observação surgiu o interesse de nosso estudo em verificar como as mulheres do P. A. Nova Vida se inserem nessa estatística. O tema do presente trabalho é: Experiências da Separação Conjugal: Mulheres e Relações de Gênero no Assentamento Nova Vida (Upanema- RN).

Em vista dessas circunstâncias, procurou-se, como objetivo geral, analisar como as mulheres do Assentamento Nova Vida se constituíram enquanto sujeito após a separação conjugal. Sendo os objetivos específicos: A) Identificar os efeitos da ruptura conjugal para as mulheres do Assentamento Nova Vida; B) Verificar a (re) configuração familiar após separação em relação aos aspectos sociais, culturais e econômicos; C) Analisar as práticas da sexualidade e os afetos das mulheres pesquisadas após a separação.

Para a dinâmica da investigação, adotou-se o método qualitativo fazendo um estudo teórico sobre as experiências da separação conjugal entre as mulheres e as relações de gênero no Brasil, realizando-se um estudo de caso com as mulheres separadas do Assentamento Nova Vida, localizado a 23 quilômetros da cidade de Upanema- RN. Conforme defendido por Fraser e Gondim (2014, p.140) a pesquisa qualitativa, valoriza os entrevistados, e contribui para uma melhor compreensão da realidade pesquisada, proporcionando a/ ao pesquisador/ a conhecer mais a fundo como seus entrevistados veem o mundo.

1

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Utilizando-se uma variedade de técnicas de coleta de dados e não apenas o formato de perguntas e respostas previamente estruturadas, a pesquisa de campo foi realizada com dez (10) mulheres, com idades variando de dezoito (18) a oitenta e quatro anos (84) anos, separadas legalmente ou não. A escolha das mulheres se deu da seguinte forma: primeiro foi feita uma lista com possíveis colaboradoras; em seguida foi feito o primeiro contato. A partir de uma visita a cada uma colaboradora explicando nossa pesquisa e as convidando a colaborar conosco. Para a coleta de dados, foram feitas entrevistas semiestruturadas seguindo um roteiro de 15 perguntas (Apêndice A).

As entrevistas foram realizadas nas residências das mesmas. Antes de cada entrevista foram feitas a leitura e solicitação da assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (Anexo 1) onde se solicita a autorização de gravação da entrevista e a usar suas falas nesse trabalho. Sendo crucial fazer sempre perguntas abertas, que não podem ser simplesmente respondidas com um “sim” ou “não”, permitindo que outros questionamentos pudessem surgir à medida que a entrevista fosse acontecendo. No momento da transcrição optamos por usar pseudônimos para preservar a identidade das mesmas e fazer as transcrições das falas tais quais foram ditas pelas colaboradoras. Por fim, foi feita a transcrição e tematização das referidas entrevistas.

Segundo Richardson e Peres (2010, p. 207): “A entrevista é uma técnica importante que permite o desenvolvimento de uma estreita relação entre as pessoas. É um modo de comunicação no qual determinada informação é transmitida de uma pessoa A para uma pessoa B”. É importante que antes de qualquer coisa que formos fazer, envolvendo outras pessoas, considerarmos o lugar dessas outras pessoas. Por esta razão a escolha pela entrevista semiestruturada, pois a mesma nos dá a liberdade de aprofundar em cada ponto pré-estabelecido em um roteiro, da forma como achar mais conveniente no seguimento da entrevista, com vista a fortalecer os aspectos abordados sobre o tema pesquisado.

Escrever sobre essas histórias significa refletir sobre o mundo contemporâneo e a participação das mulheres que tem ocupado espaços, cada vez mais distintos. Tentar-se-á, então, responder à seguinte problemática: Como as mulheres do Assentamento Nova Vida se constituíram enquanto sujeito após a separação conjugal?

Para aprofundar meu conhecimento sobre o tema dialogamos com alguns teóricos que nos permitiram compreender conceitos chaves para a produção deste trabalho, como: Zarias (2010), Silva (2008), Souza; Beleza; Andrade (2012), Coutinho; Menandro (2010), Lamela (2010), Hack, (2010) e Vieira (2005) discorrem sobre a temática de família e divórcio. Oliveira (2003) e Munanga (2013) discutem sobre etnia e identidade. Para discussão de

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gênero embasei-me em Rago (1998); para tratar da metodologia da pesquisa, Richardson e Peres (2010), como também Fraser e Gondim (2014).

O presente trabalho está organizado em capítulos. No primeiro capítulo, a introdução, onde traçamos o caminho percorrido na construção do trabalho. No segundo capítulo analisamos aspectos referentes ao local de estudo e o perfil das colaboradoras. No terceiro capítulo discorremos sobre família, casamento, divórcio. No quarto capítulo trataremos sobre reconfiguração familiar após separação. Finalizando o trabalho, apresentaremos as considerações finais.

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2. LOCAL DE ESTUDO

O meu lugar é sorriso,

É paz e prazer. O seu nome é doce dizer.2

O trecho da música composta por Arlindo Cruz e Mauro Diniz representa o significado que poderemos dar aos lugares que habitamos, vivemos. É o que buscamos apresentar no nosso local de estudo.

O Projeto de Assentamento Nova Vida está localizado a 23 quilômetros do município de Upanema- RN, não é apenas o lugar que vivemos por muitos anos; é também o recorte espacial da nossa pesquisa.

Suas terras foram ocupadas no ano de 1996; participaram da ocupação cerca de noventa homens e duas mulheres3. Em 1998 começou a construção das casas de alvenaria, no total de cento e quatorze casas construídas pelo INCRA (Instituto Nacional de colonização e Reforma Agrária), divididas em doze ruas. Como pode ser visto na imagem 1 e 2. Atualmentehá cerca de dezessete casas de filhos de colonos construídas de forma independente.

2 Trecho da musica “Meu lugar”, Compositores: Arlindo Cruz/ Mauro Diniz, interpretada por Arlindo Cruz.

2012. Disponível em: https://www.letras.mus.br/arlindo-cruz/1131702/#radio:arlindo-cruz. Acessado em 29 de julho de 2019.

3 Muitas mulheres não participam das ocupações, por terem as demais responsabilidades domésticas e por uma

suposta “proteção” do homem em possíveis situações de conflitos. Como trataremos mais a frente com mais detalhes.

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Imagem 1: Desenho da planta do P. A. Nova Vida Autora: Isla Maiara, 2017.

Imagem 2

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A população do P. A está estipulada em seiscentos habitantes; a economia da localidade é movida por corte de lenha, agricultura familiar, criação de ovinos, caprinos, bovinos, suínos, aves, corte de palha de carnaúba, pedreiro (construção civil); além de servidores públicos como professores/as, ASG (auxiliar de serviços gerais), vigilantes, motoristas escolares, aposentados e pensionistas do INSS (Instituição Nacional Seguro Social); Este é o nosso local de estudo onde passaremos a observar os arranjos familiares e como os mesmos são vistos na comunidade.

2.1. Perfil das mulheres

Dizem que a mulher é o sexo frágil Mas que mentira absurda! Eu que faço parte da rotina de uma delas Sei que a força está com elas.4

A música citada acima, composta e interpretada por Erasmo Carlos, sugere que as mulheres podem até ser/parecerem frágeis, mas são também guerreiras e lutam uma guerra todos os dias para sobreviver nessa sociedade.

As mulheres nos últimos anos passaram a ser mais vistas pela sociedade e exercem cada vez mais um papel de protagonista, embora ainda hajam heranças históricas do sistema social patriarcal5em seu cotidiano, onde prevalece a divisão desigual entre homem e mulher. Com o tempo, e graças às lutas promovidas pelos feminismos e pela persistência, as mulheres vêm conseguindo aumentar sua presença nos espaços sociais, e no meio rural não seria diferente. Elas estão se organizando e ocupando espaços tidos antes como ambiente/ atividade exclusiva de homens.

As dez mulheres colaboradoras desta pesquisa residem no P. A. Nova Vida, com idades entre 18 a 84 anos. Desde cedo aprenderam o peso de ser mulher nessa sociedade ainda machista, e continuam lutando contra todas as formas de opressão e preconceito por terem sido ou estarem separadas. Veremos a seguir alguns gráficos do perfil dessas mulheres.

4 Trecho da música “Mulher (Sexo Frágil)” Composição e interpretação Erasmo Carlos. 1981. Disponivél em:

https://www.letras.mus.br/erasmo-carlos/67612/. Acessado em 29 de julho de 2019.

5 O patriarcado é um sistema de organização, determinado e com base em critérios de divisão desigual das

tarefas entre homens e mulheres e a alocação de espaços e atividades específicas de forma naturalizada Disponível em: http://repositorio.unb.br/bitstream/10482/23974/1/2017_JanaikyPereiradeAlmeida.pdf

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Gráfico 1

Diante dos resultados obtidos pela análise dos dados, 30% das colaboradoras consideram-se brancas, 40% morena6, 10% negra, 10% parda e 10% amarela. Algumas dúvidas que cercam a escolha da etnia nas afirmações das colaboradoras. Apenas duas das colaboradoras nos questionaram sobre o que é etnia? Quando explicamos do que se tratava logo se colocaram como branca, por estar escrito no seu registro de nascimento. Como percebemos a maioria segue o que está escrito no seu registro civil, descrita como cor “morena”. Sendo que poderiam se autodeclarar da maneira que se identificasse melhor. Afirmaram gostar de sua cor e que respeitam as diferenças que existem entre as cores da pele. Nunca se ouviu falar tanto em raça e racismo no Brasil – ou pelo menos não se ouviu falar tanto nos últimos 50 anos. Como sabemos hoje, “raça” foi um termo corriqueiro na boca de grande parte das elites brasileiras que desde meados do século XVIII, onde a cor da pele passa a ser o divisor de águas entre as chamadas raças, que se dividem até hoje como branca, negra e amarela tanto no imaginário coletivo quanto na termologia científica. Sobre as divisões raciais que ainda prevalecem em nossa sociedade apesar das transformações, afirma Munanga (2013, p. 3):

6 Sabemos que na cultura brasileira ainda é muito difícil tratar da questão racial e com a miscigenação as pessoas

preferem usar a cor “morena” para declarar uma cor de pele que não é branca. Trata-se do eufemismo onde se usa outros adjetivos, por não aceitar e não se reconhecer como negra/o.

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Ora, a cor da pele é definida pela concentração da melanina. É justamente o grau dessa concentração que define a cor da pele, dos olhos e do cabelo. A chamada raça branca tem menos concentração de melanina, que define sua pele branca, cabelos e olhos mais claros que a negra que concentra mais melanina e por isso tem pele, cabelo e olhos mais escuros que a amarela numa posição intermediaria que define a sua cor de pele que por aproximação é dita amarela, ora, a cor é um critério relativamente artificial. Apenas menos de 1% dos genes que constituem o patrimônio genético de um indivíduo são implicados na transmissão da cor da pele, dos olhos e cabelos.

Atualmente essas denominações vêm sendo modificadas pela autoafirmação, deixando de ser uma denominação meramente pela cor da pele, mas também a partir dos valores culturais da sociedade onde a pessoa está inserida. Essa mudança vem ocorrendo, pois há tempos o movimento negro busca debater em diversos espaços sobre a igualdade racial e a valorização da identidade negra. Mas, essa autoafirmação nem sempre ocorreu devido a falta de informação ou por não se aceitar como é, preferindo-se usar do eufemismo por medo do preconceito e racismo presentes frequentemente em todos os espaços sociais.

Como podemos perceber na fala de Oliveira (2003, p.120) com relação a assumir uma identidade:

A identidade contrastiva parece se constituir na essência da identidade étnica, i.e., à base da qual esta se define. Implica a afirmação do nós diante dos outros. Quando uma pessoa ou um grupo se afirmam como tais, o fazem como meio de diferenciação em relação a alguma pessoa ou grupo com que se defrontam. É uma identidade que surge por oposição.

Segundo o autor a autoafirmação surge da oposição, onde cada pessoa ou grupo se afirma de maneira diferente do outro; essa autoafirmação surge quando aceitamos as diferenças sem medo de sermos julgados por nossas escolhas, e perpassa os costumes culturais que vivenciamos cotidianamente.

Outro aspecto levantado em nossa pesquisa para elaborar o perfil das colaboradoras foi o grau de escolaridade. Pensando no contexto histórico da educação do campo, Medeiros; Aguiar (2015. p.10), Santos (2017. p. 211) apontam que a educação do campo foi esquecida durante muito tempo: seguia-se um modelo pedagógico urbanista onde as escolas do campo deveriam seguir o calendário escolar e as cartilhas trazidas da cidade; professores/as também “entravam no pacote”, muitas vezes nem tinham ouvido falar da região onde iam ministrar suas aulas. Não havia a preocupação de formar para a cidadania, bastava saber assinar o nome. Isso ocasionou um alto índice de analfabetismo e um baixo nível escolar no Brasil.

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No gráfico a seguir podemos perceber esse déficit a partir das respostas de nossas colaboradoras.

Gráfico 2

Diante a análise de dados das entrevistas observa- se que 40% das mulheres têm o ensino fundamental incompleto, 20% ensino fundamental completo, 20% o ensino médio completo, 10% o ensino médio incompleto e 10% ensino superior incompleto.

Podemos perceber na fala da colaboradora Alfazema7 (2019):

Mulher, só a carteirinha do ABC antiga, você acredita? E não foi nem toda. Não tinha as carteirinhas, de primeiro? Pois, foi meu estudo só, foi aquela carteirinha de ABC que chamava e nem terminei nem ao menos por isso que não aprendi nem terminei, só trabalhando (...) acho que eu tive um ou dois professor por isso que não aprendi porque não tinha professor não, na minha época. Também os pais naquela época não ligava [sic] de ir atrás pra butar [botar] os filhos na escola; a gente aprendia porque aprendia

7 Alfazema, 70 anos, nasceu no Sítio Urucuri, Município de Campo Grande-RN, em 26 de janeiro de 1949.

Estudou até a primeira série do ensino fundamental, passou sua infância e adolescência na mesma comunidade. Casou aos 24 anos, tem 4 filhos. Após alguns anos mudou-se para a cidade de Campo Grande- RN, onde passou a ser lavadeira para manter seus filhos na escola. Anos depois ficou sabendo da ocupação da terra no Município vizinho, Upanema- RN, e conseguiu o tão sonhado pedaço de terra para viver da agricultura, como se identifica atualmente. Separou-se após 30 anos de casamento. Hoje é aposentada, reside há 27 anos no assentamento, mora com dois filhos e um neto. Colaboradora, em entrevista concedida a discente Talita Marques Sena, no dia 14/01/2019. Sendo preservada sua identidade por pseudônimo.

Escolaridade

Ensino fundamental completo Ensino funamental incompleto Ensino Medio completo Ensino Medio incompleto Ensino superior incompleto

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mermo[mesmo], os que aprenderam foram porque aprenderam mesmo por conta própria, os pais nesse tempo não ligava. Escola era o trabalho, nera? (...) por isso que eu pelejo com meus fie [Filho] pra aprender por causo [causa] que é muito difícil, quem não sabe ler e escrever, é muito difícil eu acho muito difícil porque tem dificuldades: tudo que vou fazer é os outro [outros] que faz [fazem], se vou pron [para um] canto tem que levar acompanhante, daí eu tenho muito desgosto disso porque sou assim, mas é isso mesmo, estou vivendo. (Alfazema, 2019)

De acordo com a fala da colabora percebe-se que ela atualmente sofre por não ter tido acesso a uma educação adequada, por falta de profissionais e porque a família, na sua idade escolar achava que o trabalho seria mais importante que os estudos. Mesmo com muita dificuldade ela afirma que fez e faz tudo para que seus filhos estudem, pois não deseja que eles sofram o mesmo que ela, pois não tem sequer liberdade de sair sozinha por não saber ler.

Para compreendermos o processo da educação rural trazemos uma análise dos autores Júnior e Netto (2011):

No que se refere à educação no meio rural, observamos que foi historicamente relegada a espaços marginais nos processos de elaboração e implementação das políticas educacionais na realidade brasileira. Uma das possíveis interpretações para esse aspecto - embora não seja a única – diz respeito às sólidas fronteiras entre o espaço urbano e o espaço rural marcadas por construções culturais hegemônicas do meio urbano que tende a inferiorizar, estereotipar e segregar as identidades e subjetividades do meio rural.

Ao refletirmos sobre a temática percebemos que o discurso dos autores dialogam com a fala da Alfazema, onde, a educação rural era trazida de forma descontextualizada, professores sem qualificação para exercer tal atividade, isso quando se tinha professores/as, pois em muitas áreas rurais estudantes precisavam se deslocar para outras comunidades ou até mesmo para cidade, onde muitos não permaneciam na escola por dificuldades na aprendizagem, econômica, os preconceitos sofridos por serem do campo.

Outra colaboradora nos conta sua trajetória da comunidade rural até a escola na cidade:

Eu, depois que cheguei no Nova Vida, antes não tinha carro, não. Quando começou a ter carro eu comecei do quinto ano, aí comecei, fiz até o nono ano. Aí parei, aí depois comecei de novo, fiz o EJA; aí terminei, terminei igual com minha filha caçula (...). No período de inverno era muito difícil porque os carros se atolava, a gente tinha noite que chegava em casa não sei

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que horas. Sofrendo, empurrando, desatolando carro, foi muito difícil o começo (Margarida8, 2018)

Segundo Margarida, para concluir o ensino fundamental e médio passou por muitas dificuldades, realidade vivenciada por diversas pessoas que residem em áreas rurais devido a falta de escolas, professores e de políticas voltadas para a educação do campo. Precisar se deslocar da comunidade para a cidade mais próxima, muitas vezes fazendo uma longa caminhada até chegar ao ponto de encontro do transporte que, de início, era um pau de arara, sem segurança. No período das chuvas essas dificuldades aumentavam, pois sem nenhuma proteção chegavam muitas vezes molhados e cheios de lama na sala de aula, isso quando chegavam. Já que as estradas eram de terra e de péssima condição. Essa rotina ainda permanece presente em muitas comunidades, principalmente quando se trata do acesso ao ensino médio.

Contudo, existem os/as aqueles/as que conseguem quebrar as barreiras impostas para os povos do campo, conseguindo chegar à Universidade, como Orquídea9:

Ensino superior10 incompleto, porque eu ainda estou matriculada na universidade, né? Cursando o curso de Licenciatura Interdisciplinar em Educação do Campo. Apesar de ter me afastado por motivo de doença, mas me considero, sim, uma aluna da UFERSA! Se deus quiser, espero retornar, esse é meu grau, né? Espero daqui uns dias já ter concluído. (Orquídea, 2019).

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Margarida, 49 anos, nasceu no Sítio Condado, Município de Campo Grande- RN, em 14 de novembro de 1970. Tem Ensino médio completo. Passou sua infância na mesma comunidade. Na adolescência foi morar na cidade para estudar, onde conheceu seu ex-marido. Casou-se aos 17 anos, grávida de sua primeira filha. Após quatro anos, retorna ao Sítio Condado, já com sua segunda filha, onde passou a trabalhar na agricultura junto com seu esposo. Depois de alguns anos participando da associação comunitária da comunidade é informada da ocupação da terra no Município vizinho, Upanema- RN. Seu esposo participou da ocupação e conseguiu que a família fosse beneficiada com a reforma agrária, sendo umas das primeiras famílias a morar no acampamento, hoje o P. A. Nova Vida, onde, mora há 28 anos. Separou-se após 28 anos de casamento. Hoje mora sozinha e se mantem economicamente com a bolsa família, produção de remédios fitoterápicos e da agricultura familiar. Colaboradora, em entrevista concedida a discente Talita Marques Sena, no dia 18/10 /2017. Sendo preservada sua identidade por pseudônimo.

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Orquídea, 44 anos, nasceu sítio Oiteiro, Município de Campo Grande-RN, em 15 de maio de 1975. Passou sua infância na mesma comunidade, na adolescência foi morar em Campo Grande-RN com a família. Teve seu primeiro filho aos 15 anos, porém, não conviveu com o pai do filho. Aos 22 anos mãe solo e grávida de seu segundo filho, ficou sabendo da ocupação da terra no município vizinho Upanema- RN. Seu pai e seu irmão participaram da ocupação, porém não permitiram que ela participasse por estar grávida. Mas, acompanhou todo o processo pela rádio e pelas conversas dos vizinhos. Seu pai ajudou a conseguir terra. Ela participava de todas as reuniões na casa paroquial, mas no exato momento da ocupação, não pode participar por estar grávida. Após a posse da terra, trabalhou na agricultura e como artesã para o sustento da família. Teve sua terceira filha. Com Ensino superior incompleto, mora há 27 anos na comunidade. Colaboradora, em entrevista concedida a discente Talita Marques Sena, no dia 15/01/2019. Sendo preservada sua identidade por pseudônimo.

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Entre 2003 e 2014 foram criadas 18 novas universidades federais e 173 campus universitários, praticamente duplicando o número de alunos. Disponível em: https://pt.org.br/confira-as-universidades-e-institutos-federais-criados-pelo-pt/. Acessado em 01 de agosto de 2019.

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Ao contrário do que muitas pessoas acreditam, chegar à universidade não é fácil; a educação vigente no campo torna esse acesso restrito a poucos/as, principalmente para as mulheres que enfrentam muitas barreiras como: educação de péssima qualidade, família, dificuldade financeira e muitas vezes problemas de saúde, como a Orquídea retrata em sua fala.

Outro ponto abordado nas entrevistas foi sobre a profissão exercida pelas mulheres. No campo não existe muitas opções de trabalho assalariado, mas mesmo assim elas exercem várias jornadas de trabalho e, na maioria das vezes, não tem seu trabalho reconhecido como trabalho produtivo, e sim, como uma ajuda, e que o dever de cuidar da casa e dos filhos é somente delas. Como afirma Lopes e Butto (2008, p. 23):

O trabalho nas comunidades rurais organiza-se a partir da divisão sexual do trabalho. As mulheres responsáveis pelo trabalho reprodutivo e pelos cuidados domésticos, os homens no trabalho gerador de rendas monetárias, apenas este reconhecido como produtivo.

O trabalho da mulher é invisibilizado culturalmente, mesmo trabalhando na roça com o companheiro, seu trabalho não é valorizado devidamente, considerado uma ajuda, sendo que essa ajuda só deve vir da parte feminina, pois os homens, ao chegarem em casa, estão muito “cansados” para ajudar suas companheiras a cuidarem da casa e dos filhos (quando se tem). Deixando tudo isso a cargo da esposa, por achar que seu trabalho é mais pesado mesmo trabalhando menos horas que a mulher, muitos homens se consideram superiores por manterem a renda monetária da família, como se isso fosse possível sem o trabalho da mulher, que é a “responsável” por todo o trabalho de cuidados: casa, família, filhos/as.

Por isso tem-se lutado tanto para quebrar essa barreira que se coloca em torno do trabalho feminino. Depois de muitas lutas, o movimento feminista conseguiu alcançar várias mulheres no campo e na cidade, mostrando a importância da valorização das atividades desenvolvidas por elas.

A seguir no gráfico 3, podemos observar a porcentagem das profissões e atividades desenvolvidas por nossas colaboradoras.

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Gráfico 3

Segundo a análise dos dados das entrevistas observa- se que 80% das mulheres se afirmaram agricultoras, 10% dona de casa e, 10% artesã. Todas as entrevistadas nunca trabalharam de carteira assinada. Como diz Orquídea (2019):

Eu nunca, não sei nem explicar, mas nunca senti vontade de trabalhar de carteira assinada. Eu achava que trabalhar de carteira assinada era uma escravidão muito grande. Não sei porque eu pensava dessa forma, ou sei e não explico. Como eu cresci, como já disse, muito livre, eu achava que trabalhar de carteira assinada seria como uma prisão, e eu não aceitava. Eu trabalhei a vida toda: trabalhei como doméstica, depois de doméstica trabalhei para algumas cooperativas mesmo solto, com contratos.

Trabalho de carteira assinada por muito tempo foi negado aos trabalhadores/as rurais, e por muito tempo esse direito foi tido como prisão. Será que alguém ganhava com isso? Ou isso era por falta de conhecimento do/a trabalhador/a? Que achava que por limitar hora de entrada e saída do trabalho se tornaria escravo/a do trabalho.

Isso é algo a ser pensado: até que ponto o/a trabalhador/a sentia- se explorado ou simplesmente queria viver sua vida tranquila, sem dar satisfação a terceiros sobre o que ou quando desenvolver suas atividades?

O que pode parecer algo impossível (não querer trabalhar de carteira assinada) pode ser entendido como uma forma de resistência às relações de exploração do capitalismo. Não

Profissão

Agricultora Artesã Dona de casa

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ter direitos trabalhistas era visto por Orquídea como algo menos importante de que sua liberdade diante dos trabalhos realizados.

Outra colaboradora nossa retrata sua experiência como agricultora:

Agricultora mermo [mesmo], que foi o que fiz desde menina, né não? Plantando essas coisas, morando, na agricultura mermo [mesmo], trabalhando. É o que eu considero, é isso. Não posso dizer que tenho um emprego que eu nunca tive, nunca trabalhei de carteira assinada, minha carteira é limpa, nunca assinei uma carteira. (Alfazema, 2019).

Percebemos o quanto de atividades nossa colaboradora desenvolveu (ainda desenvolve) no decorrer da sua vida; atividades estas que não lhe trouxeram nem um auxílio ou direitos, como: férias, seguro desemprego, décimo terceiro, salário maternidade, entre outros. Nossa colaboradora afirma que nunca teve um emprego, considerando sua carteira de trabalho limpa (nunca foi assinada) a ter tido ou não emprego. Mas, se considerarmos o emprego como força de trabalho, Alfazema não só trabalhou e foi empregada na agricultura, mas fez isso desde muito cedo.

Questão tão importante e presente na vida das mulheres do campo (começar a trabalhar cedo), mesmo com a conquista de alguns direitos, as mulheres ainda permanecem com longas jornadas de trabalho, justamente por não haver divisão de trabalho equânime em seus lares. Aquelas que escolhem ter uma vida profissional precisam conciliar vida profissional com sua vida particular, muitas vezes abrindo mão de suas horas de descanso, pois enquanto todos dormem, ela está adiantando algum trabalho para o dia seguinte. Como que diz Faria (2009, p.18):

A presença das mulheres no trabalho assalariado ou no campo não alterou em nada a responsabilidade quase exclusiva pelo trabalho doméstico e o cuidado. Para as mulheres a realização do trabalho doméstico e de cuidados coloca-se como parte de sua identidade primária, uma vez que a maternidade é considerada seu lugar principal.

O acesso à profissionalização trabalhista das mulheres foi uma grande vitória, porém, ele não exclui as obrigações domésticas que as mulheres realizam diariamente em seus lares. Culturalmente, a sociedade cobra que mulher dê conta da casa, da família, pois se não tem capacidade de cuidar de sua casa, não deveria trabalhar. Isso torna a jornada de trabalho ainda mais longa. Como afirma Lírio11:

11

Lírio, 84 anos. Nasceu na Várzea Grande, Município de Lucrécia- RN, em 26 de dezembro de 1935. Estudou até a terceira série do ensino fundamental. Agricultora, casou-se aos 25 anos e teve 10 filhos. Sempre trabalhou no campo. Separou- se aos 60 anos. Após a separação, optou por não manter outros relacionamentos amorosos. Hoje mora com um dos filhos e uma neta no Projeto de Assentamento Nova Vida há quatro anos. Colaboradora,

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Olhe, se eu for contar a você o que eu já fiz: eu já trabalhei em baixa de arroz, trabalhei quebrando milho, apanhei [colhi] algodão, apanhei [colhi] feijão, fiz cerca, trabalhei até em curtume fazendo sola, eu curtia o couro pra fazer a sola, até isso eu fiz. E trabalhei muito com meu marido, fazia alpercata, fazia cela, nós fazia [fazíamos] tudo. Então eu posso considerar que sou agricultora. (Lírio, 2018).

Embora reconheça o quanto já trabalhou durante a vida, Lírio minimiza aparentemente seu trabalho ao dizer-se agricultora. Das incontáveis tarefas que faz, é na relação com a terra que localiza sua identidade.

No que concerne ao tema, Faria (2009. p. 19) aponta “No campo essa divisão sexual do trabalho também se estrutura entre o que é realizado no âmbito da casa e no roçado. Dessa forma, historicamente muitas das atividades produtivas realizadas pelas mulheres são consideradas uma extensão do trabalho doméstico”. As mulheres muitas vezes não se atentam para essa desvalorização por ser tão enraizado essa questão que é dever somente da mulher cuidar do marido, dos filhos e dos afazeres domésticos e ainda tendo que contribuir nas atividades do roçado, pois é sua obrigação, já que o que vai ser produzido é para o consumo da família. Conforme Santos (2012, p. 151):

O trabalho doméstico no meio rural compreende as atividades de cuidados com a família: cozinhar, lavar roupa, limpar a casa, cuidar das crianças e dos idosos, mas vai, além disto, pois, para realizar essas tarefas da melhor forma possível, a camponesa do semiárido tem que buscar água para abastecer a casa, plantar verduras, frutas, plantas medicinais e temperos; no quintal, criar pequenos animais como galinhas, porcos, caprinos e ovinos para melhorar a alimentação da família, quando os filhos e filhas são pequenos/as. Retirar o leite da cabra também faz parte de suas atividades.

Fica a cargo das mulheres as tarefas do cuidar. Historicamente as mulheres foram conduzidas a se tornarem a mais frágil, a mais doce, a que cuida de todos sem reclamar, pois esse é seu dever. Porém, sabemos que muitas mulheres não se identificam com esse papel da que serve, da que sempre estará disponível para cuidar.

No meio rural, essa atribuição de papeis não é diferente. Segundo Silva (2019, p. 2096), há “[...] a divisão sexual do trabalho que se traduz na desvalorização do trabalho agrícola exercido pela mulher e que historicamente vem se perpetuando em sociedade.” A naturalização dessas tarefas definidas como atividade feminina, torna a jornada de trabalho

em entrevista concedida a discente Talita Marques Sena, no dia 31/05/2018. Sendo preservada sua identidade por pseudônimo.

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das mulheres ampliada: trabalha no campo o dia inteiro, no sol igualmente o trabalho produzido pelo homem e não se tem uma valorização do mesmo como produtivo ela é meramente ajudante de um homem que é o provedor da renda e mantimentos da casa.

Sobre essa temática, Alfazema fala de suas atividades no campo:

Trabalhava, ganhava apanhando feijão nos cercados, alhei [alheio], algodão no tempo que o povo apanhava algodão, fazendo aquelas rede de pescar de linha, nalho [nylon], trabalhei muito com aquilo. Era com que comprava minhas coisas, era fazendo aquelas redes de pescaria. A gente vivemo [vivemos] a vida toda fazendo isso, com a lamparina acesa de noite, nem energia tinha, acabei minha vista. Eu acho que é por isso que sou ceguinha, acabei minha vista trabalhando de noite com a linha pra puder ter o dinheirinho pra comprar as coisas da gente, as roupas; era difícil, não é como hoje não. (Alfazema, 2019)

Entendesse na fala de Alfazema que as mulheres realizavam todas as atividades com mais dificuldades que atualmente. Se pensarmos no contexto político da época, para os conhecedores tecer uma rede de pescaria utilizando linha nylon requer habilidades e Alfazema as tinha desenvolvido durante toda sua vida, desafiada pela falta de uma claridade adequada para sua atividade á noite, visto que muitas eram suas atribuições; em apanhar feijão ficando curvada sobre a colheita dessa lavoura, colocando sobre seu corpo toda produção característica do trabalho enchendo bisacos (sacos grandes de 30 k) de feijão, de algodão.

Outra questão que está presente na fala da colaboradora por exercer continuamente um trabalho em condições inapropriadas, surge sequelas em seu corpo que leva para o resto de suas vidas. Neste sentido as políticas públicas para as mulheres do campo e para as melhorias de sustentabilidade para as famílias camponesas vem responder as dificuldades relatadas, no ano de 2003 a 2014 aconteceu um conjunto de medidas públicas desde o programa de eletrificação rural12 conhecido como luz para todos objetivando erradicar a lamparina dos lares rurais, o incentivo a produção das mulheres e a renda com programas de crédito13 específicos para as mulheres.

12

Em 1999, surge o Programa Luz no Campo por meio de decreto presidencial. O Programa tinha por objetivo levar energia elétrica a 1 milhão de domicílios rurais, no prazo de quatro anos. Mas havia um empecilho: o agricultor interessado em ter acesso à energia elétrica deveria arcar com todo o ônus, desde a construção da rede elétrica até a instalação residencial. Com o desafio de promover a inclusão de milhões de cidadãos brasileiros, do meio rural, no acesso à energia, o Governo Federal criou, em novembro de 2003, o Programa Luz para Todos. Sua meta implicava em levar energia elétrica a 10 milhões de moradores do meio rural, correspondendo à soma dos habitantes dos estados do Piauí, do Mato Grosso do Sul, do Amazonas e do Distrito Federal. Para isso, seria preciso adequar a infraestrutura local existente para atender à demanda que seria criada. Uma das orientações do presidente Lula era, por meio da execução do Programa, estimular a geração de emprego local, tanto pela contratação de pessoal para realizar as obras, quanto pela fabricação de postes para a construção da rede.

13

O Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF). É um programa do Governo Federal criado em 1995, com o intuito de atender de forma diferenciada os mini e pequenos produtores rurais

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Quando falamos que as mulheres desenvolvem todos os trabalhos da mesma forma que o homem não queremos generalizar, verificamos que nas falas de nossas colaboradoras mais de 50% trabalham e desenvolve atividades nos roçados que vão desde o plantio a colheita de suas produções ou em produções dos vizinhos. Outra questão que está presente é que por exercer continuamente um trabalho em condições inapropriadas, surgem sequelas em seus corpos que levam para o resto de suas vidas.

No que concerne aos números filhos de nossas colaboradoras podemos verificar que 50% das mulheres tem de dois a três filhos, 20% de quatro a cinco, 10% de dez a treze filhos e 10% um filho ou está grávida novamente. Todas criaram seus filhos com dificuldades, mas nunca pensaram em dar seus filhos para outras pessoas criarem.

Conforme a análise percebeu-se que as mulheres com mais idade tiveram um número maior de filhos e que ao passar do tempo esse número vem diminuindo, de acordo com os resultados obtidos. O que esta de acordo também com a média de natalidade no Brasil, como pode ser visto no gráfico abaixo:

Gráfico 4

Taxa Bruta de Natalidade por mil habitantes – Brasil – 2000 a 2015

Fonte: IBGE, Projeção da População do Brasil - 2013.

que desenvolvem suas atividades mediante emprego direto de sua força de trabalho e de sua família. Disponível em: http://www.ceplac.gov.br/radar/Artigos/artigo26.htm. Acessado em 01 de agosto de 2019.

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Segundo o IBGE (2010), o cálculo da taxa de natalidade é feito através da quantidade de nascimentos/ sobreviventes em um determinado país ou região, o resultado deste cálculo dá-se da contagem de nascimento por cada mil habitantes.

No Brasil, nota- se a diminuição de natalidade nos últimos anos. A população de jovens, adultos e idosos está aumentando, mas as porcentagens de crescimento estão caindo, especialmente por causa da queda nas taxas de natalidade. O Rio Grande do Norte também compõe essa estatística; o gráfico a seguir mostra que no nosso Estado a taxa de natalidade ainda é significativo, não percebemos essa diminuição significativa. Porém, prevê-se que ao longo dos anos ela vai ser percebida.

Gráfico 5

Gráfico da população projetada Rio Grande do Norte – 2010 a 2060

Fonte: do IBGE, Projeção da População Rio Grande do Norte (2010).

Alguns aspectos são apontados como causa da diminuição da natalidade como: o uso de métodos contraceptivos, planejamento familiar, casamento tardio, a mulher que se insere no mercado de trabalho, acesso à educação e saúde, entre outros.

Nesse viés não poderia ficar de fora a questão econômica dessas mulheres e dentro dessa ótica percebemos a contribuição dos benefícios sociais na vida das mesmas. Os programas sociais foram e são de grande importância para o combate a pobreza, criados para diminuir as desigualdades sociais produzidas pelo sistema capitalista. Como podemos observar no gráfico a seguir:

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Gráfico 6

Conforme a análise de dados das entrevistas, observa- se que 30% são beneficiadas com o bolsa família14, 30% são aposentadas15 por idade, 20% são beneficiadas com o seguro safra16, 10% são pensionista do INSS17 e 10% já foram beneficiada com algum programa governamental. Faria (2009) diz:

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O programa Bolsa Família foi criado pela Lei nº 10.836/2004, quando se pensou um Estado pós-neoliberal, após os governos considerados neoliberais da década de 1990, no sentido do Poder Público intervir para fomentar o desenvolvimento econômico e promover a distribuição de renda por meio de políticas públicas. Para uma análise completa acesse: https://www.franca.unesp.br/Home/Pos-graduacao/-planejamentoeanalisedepoliticaspublicas/iisippedes2016/artigo-sippedes-bolsa-familia.pdf.

O relatório do mês de janeiro do programa Bolsa Família aponta que o número de famílias beneficiadas foi reduzido em 381 mil em relação a dezembro de 2018. O corte, segundo o Ministério da Cidadania, é fruto de procedimentos que geram cancelamentos por "inadequações" e desligamentos voluntários. Veja mais em:

https://noticias.uol.com.br/politica/ultimas-noticias/2019/01/27/cortes-bolsa-familia-primeiro-mes-governo-bolsonaro.htm?cmpid=copiaecola.

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A aposentadoria rural é devida a todo trabalhador atuante no campo, para o sustento próprio ou sustento da família. No Brasil, os trabalhadores rurais conquistaram a igualdade previdenciária na Constituição Federal de 1988, quando o legislador equiparou os trabalhadores rurais aos urbanos, reconhecendo a vida difícil dos povos do campo e o beneficiando com redução de cinco anos para se aposentar em relação os trabalhadores urbanos.

Para maiores informações acesse:

http://www.ambito-juridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=19039&revista_caderno=20.

16

O Garantia Safra foi criado em 2002 e está vinculado à Secretaria Especial de Agricultura Familiar e do Desenvolvimento Agrário. Esse benefício social garante ao agricultor familiar o recebimento de um auxílio pecuniário, por tempo determinado, caso perca sua safra em razão do fenômeno da estiagem ou do excesso hídrico. Disponível em: http://www.caixa.gov.br/poder-publico/programas-uniao/area-rural/garantia-safra/Paginas/default.aspx.

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Essa pensão é garantida à família de um trabalhador que veio a falecer por causas naturais ou acidentais. Para que os dependentes do falecido tenham esse direito, é preciso verificar se a pessoa cumpriu todos os requisitos para o órgão antes de morrer. Disponível em https://aposentadoriainss.net/pensionista-inss.html.

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No Brasil, a vigorosa organização e mobilização de mulheres trabalhadoras rurais ganha destaque no processo da Constituinte, no final dos anos 1980, com a ampliação do direito à seguridade social por meio da garantia da aposentadoria no valor de um salário mínimo. Essa conquista representou a mais importante medida de distribuição de renda das últimas décadas. As trabalhadoras rurais conquistaram reconhecimento, embora a efetivação dos seus direitos seja demorada e não altere automaticamente a relação familiar e sua responsabilização pelo trabalho doméstico.

Esses programas contribuíram muito para a sobrevivência dessas mulheres, pois a partir do acesso a eles aconteceram melhorias no sistema de saúde, melhorando também a alimentação, acesso à escola, vestimenta das famílias e, consequentemente, dando às mulheres uma autonomia que a maioria não tinha.

Após apresentar o local de estudo e o perfil de nossas colaboradoras no capítulo a seguir discutiremos sobre família, divórcio e reconfiguração familiar após separação.

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3. FAMÍLIA E CASAMENTO NO BRASIL: BREVE HISTÓRICO

Fogo na fogueira

Seu beijo e o desejo em seu olhar As flores no altar Véu e grinalda Lua de mel Chuva de arroz E tudo depois Dama de honra Pega o buquê Ninguém mais feliz Que eu e você18

A música retrata um pouco do casamento, tema que discutiremos nesse capítulo, trazendo um pouco dos rituais e de como muitos/as imaginava/ vivenciaram o casamento. Este que é considerado, por muitas pessoas, o ponto de partida para se constituir uma família, tendo como base aquela formada por pai, mãe e filhos (família nuclear), feito com base em um contrato. Sendo que, para que se oficialize necessita, além da vontade do casal, da intervenção de uma autoridade (representante da igreja ou cartório), legitimando o casamento e declarando os cônjuges marido e mulher.

No Brasil Colônia de Portugal, as estruturas familiares representavam o poder: eram elas que controlavam a Igreja, o Estado e as instituições econômicas locais. A estrutura patriarcal, em linhas bem gerais, aponta para a centralidade da família no movimento de colonização portuguesa na América. Nesse período, os casamentos eram realizados por interesse em manter o patrimônio e o status da família.

A religião dominante era o catolicismo, que era muito rígida no que se refere ao casamento e aos bons costumes das famílias coloniais:

A Igreja apropriou-se também da mentalidade patriarcal presente no caráter colonial e explorou relações de dominação que presidiam o encontro entre os sexos. A relação de poder já implícita no escravismo, presente entre nós desde o século XVI, reproduzia-se nas relações mais íntimas entre maridos, condenando a esposa a ser uma escrava doméstica exemplarmente obediente e submissa. (RASPANTI, 2013).

18 Trecho da música “Aliança”, compositção: Arnaldo Antunes, Carlinhos Brown, Marisa Monte, Pedro Baby,

Pretinho da Serrinha e interpretada por Tribalista. 2017. Disponível em: https://www.vagalume.com.br/tribalistas/alianca.html, Acessado em 26 de junho de 2019.

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Seguindo os ensinamentos da igreja, o pai escolhia os pretendentes das filhas que, na maioria das vezes, pertenciam ao mesmo círculo familiar; eram muito comuns, por exemplo, casamentos entre primos, sobrinhos e outros parentes. As mulheres, segundo os valores culturais, não deveriam reclamar das escolhas feitas pelo pai, não se casaria por amor, e sim por obrigação de manter o nome da família. Após o casamento, as mulheres ficariam confinadas ao ambiente doméstico, onde exerceriam inúmeras funções como prover alimentos e vestimenta para o consumo doméstico da família. Deveriam ser exemplo de submissão, está disposta a obedecer a seus maridos a todo o momento, tanto nas atividades domésticas como sexuais.

Com o avanço econômico entre os séculos XVII e XIX, obtêm- se uma grande transformação no Brasil e no estilo de vida e novas crenças das famílias que aqui reside. As cidades começam a ser formadas e os costumes se modificar.

De acordo com Aklander (2012. p. 21- 22):

Houve mudanças também no contexto do casamento: a decisão de casar-se transferiu- se dos pais para os próprios noivos, tornando-se uma questão individual e não grupal. A finalidade do casamento passou a ser não mais a manutenção de propriedades, bens ou alianças políticas, e sim a celebração de um vínculo de amor e felicidade, a satisfação de impulsos afetivos e sexuais.

Ocorreram muitas mudanças no cotidiano das famílias brasileiras, as mulheres passaram a trabalhar fora dos seus lares19, e com isso tem-se um mínimo de liberdade que antes era negado. No casamento não seria diferente: começam a escolher seus pretendentes sem necessidade da escolha absoluta do pai. Porém, em muitos lares, ainda é forte a influência da família na escolha dos cônjuges dos seus filhos/as.

Ainda há uma série de condutas a seguir como: se o/a escolhido/a é de boa família, trabalhador, se tem vícios, características essas que são consideradas importantes para um bom casamento. O amor passa a ser a peça chave na escolha do futuro companheiro/a, o que importa agora é a paixão, a felicidade dos cônjuges, os bens matérias agora ficam em segundo plano. Porém, como diz Coutinho; Menandro (2010. p. 84/85):

Apesar de muitas vezes concebida como instituição natural, a família nem sempre teve a configuração atual. Sua constituição histórico-social foi negligenciada por décadas, o que permitiu que o formato da família nuclear,

19

Até a década de 1950, mesmo que informalmente, muitas precisavam da autorização do marido. Esta realidade é diferenciada a partir das questões relacionadas à situação econômica e a raça.

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marcado pelo número reduzido de membros, pela intimidade e afetividade, viesse a ser considerado modelo universal.

A família culturalmente tida como a primeira instituição social, historicamente pregada como deveria ser pela religiosidade, onde era baseado no modelo nuclear: a família perfeita aos olhos de Deus. Essa influência religiosa excluía qualquer outro modelo, a família passou a se constituir com um número menor de filhos/as, quanto mais rica, menos filhos/as.

Após o casamento civil ser implantado no Brasil, o casamento religioso passa a ser de interesse individual de cada casal, consolidando-se o hábito de celebrar o casamento civil paralelamente ao religioso, duplicidade ainda cultivada pelos hábitos atuais. De acordo com Zarias (2010, p. 66):

No Código Civil de 1916, não há outra definição possível de família senão referindo-se ao casamento civil: “Art. 229 – Criando a família legítima, o casamento legitima os filhos comuns [...].”. Desse modo, outras formas de relações sociais, que também poderiam constituir relações de “família”, num sentido mais amplo, não seriam objetos legais; são “ilegítimas”.

Percebe- se que a definição de família em 1916 era uma definição fechada, onde qualquer relação fora do padrão traçado pela lei era ilegítima20. Mesmo com a mudança de oficialização da realização do casamento do domínio religioso para o domínio do Estado ainda continuam várias restrições, desconhecendo outros arranjos que não estivessem de acordo com o exigido como família legal perante o Estado.

As instituições família e casamento no Brasil passaram por várias mudanças e, as leis, não poderiam deixar de acompanhar essas transformações da sociedade, esta que hoje se configura por diversos arranjos familiares. Como discorre Zarias (2010, p. 66):

No Brasil, o marco dessa transformação é a Constituição Federal de 1988. Nosso Código Civil de 2002 adequou as antigas normas do direito de família, que estavam em vigência desde 1917, às atuais disposições constitucionais. Dessa maneira, a noção oficial de família, que antes dizia respeito tão somente à “família legítima”, constituída pelo casamento civil, também passou a abranger as unidades familiares formadas pela união estável heterossexual e pelos grupos monoparentais.21

20

Na Constituição Federal de 1988, continua da mesma forma. Disponível em: http://www.senado.leg.br/atividade/const/con1988/con1988_07.05.2015/art_226_.asp.

21

A partir desta quinta-feira (16/5) cartórios de todo o Brasil não poderão recusar a celebração de casamentos civis de casais do mesmo sexo ou deixar de converter em casamento a união estável homoafetiva, como estabelece a Resolução n. 175, de 14 de maio de 2013, aprovada durante a 169ª Sessão Plenária do Conselho

Nacional de Justiça (CNJ). Disponível em:

https://www2.stf.jus.br/portalStfInternacional/cms/destaquesNewsletter.php?sigla=newsletterPortalInternacional Destaques&idConteudo=238515.

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Nesse sentido, percebe- se que ao longo dos anos se busca colocar em leis as transformações que acontecem na sociedade, buscando a inclusão de outras nomenclaturas de família que antes eram negadas social, cultural e legalmente.

Na contemporaneidade as conceituações de família e de arranjos familiares vão além da união estável heterossexual e pelos grupos monoparentais permitindo assim diversas configurações que precisam ser postas em vigência em nosso Código Civil, pois um único conceito torna-se insuficiente para abranger tanta diversidade.

As inúmeras mudanças e transformações dos séculos XX e XXI produziram reflexos nas relações familiares, intensificando novos e variados arranjos familiares, bem como as concepções de conjugalidade e parentalidade. Na contemporaneidade, o que vai identificar a família já não é mais a celebração do casamento ou do envolvimento de caráter sexual, e sim o afeto que permeia o relacionamento. A afetividade será o principal sentimento a sustentar a formação dos relacionamentos conjugais (SOUZA; BELEZA; ANDRADE, 2012, p. 110).

De acordo com os autores, os arranjos familiares se transformaram ao longo dos séculos. Atualmente não se segue o padrão estabelecido pela sociedade patriarcal, já que é a afetividade que sustenta a relação conjugal. O amor que lemos nos romances e tão almejado por muitos casais não é garantia para a durabilidade do casamento.

Oliveira (2009, p. 37), em pesquisa da mesma temática, discorre:

Devido às transformações existentes na sociedade, nem sempre a família tem o seu início através de um casamento. Muitos iniciam a união pelo fato de estarem dispostos a constituírem uma vida em comum, seja através do amor existente entre ambos, ou de um sentimento forte que os une, como também em decorrência da própria história que foi sendo construída. Pode ser que a união que ocorre atualmente na sociedade não seja aquela na qual a sociedade considera como ideal e seja diferente do modelo considerado “correto”. Porém, não há como voltar atrás, pois as mudanças vão ocorrendo com o desenvolvimento da sociedade, assim como no interior de cada família.

São nítidas as diversas mudanças que ocorreram no contexto de família e casamento até chegar aos conceitos atuais. Uma dessas mudanças se refere à estrutura familiar, pois não começa necessariamente uma família pelo casamento. Essa união pode estar ligada a vários fatores como: desejo de ter uma vida em comum, status, liberdade, entre outros. Mesmo não sendo um modelo tido como correto por algumas pessoas, essas uniões estão cada dia mais presentes na cultura brasileira.

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Na família conjugal moderna, não há distinção entre os papeis do homem e da mulher, ambos têm os mesmos direitos e deveres. A mulher divide com o marido a responsabilidade pela manutenção da casa, bem como pela educação e cuidados dos filhos. O casal age e toma decisões conjuntamente, não havendo a superioridade do homem sobre a mulher e os filhos. (ALVES, 2000, p. 8)

O que Alves nos aponta é realidade vivida por poucos casais, pois sabemos que na maioria dos lares, recai sobre a mulher toda a responsabilidade na manutenção dos afazeres domésticos, educação dos filhos. Enquanto o homem diz ser o provedor da economia familiar, e por passar o dia fora de casa ao fim do dia estar “cansado” para participar de qualquer atividade em seu lar, muitos acreditam que isso é o bastante para manter sua família unida e feliz. Porém, muitas vezes não é o suficiente e aliados a outros fatores, causa um desgaste no relacionamento.

No próximo tópico, falaremos das experiências conjugais de nossas colaboradoras.

3.1. Rupturas: “Quando eu casei, eu casei pra viver a vida inteira, só que não deu” Melhor assim

A gente já não se entendia muito bem E a discussão já era a coisa mais comum E havia tanta indiferença em teu olhar Melhor assim

Pra que fingir se você já não tem amor Se teus desejos já não me procuram mais Se na verdade pra você eu já não sou ninguém22

A música “Separação”, interpretada por Simone, fala sobre um casal que esta passando pelo processo de separação. A mulher que se ver vivendo com um estranho e que sofre em deixar o companheiro ir-se, mas decide pela separação como sendo o melhor caminho para os dois serem felizes novamente.

Ao encontro da música vem a fala de nossa colaboradora que fala da sua experiência conjugal:

Quando eu casei, eu casei pra viver a vida inteira, só que não deu. Não foi assim, eu não tenho muita coisa boa do casamento, não. Eu pensava que

22

Trecho da música “Separação”, composição de José Augusto e Paulo Sérgio Valle, interpretada pela cantora Simone. 1988. Disponível em: https://www.vagalume.com.br/simone/separacao.html. Acessado em 26 de junho de 2019.

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casar, já que eu era presa, eu pensava que se eu casasse ia mim [me] libertar (...). No início foi muito difícil porque casei grávida, e ele não mim [me] levava pos [para] cantos [lugares]; eu ficava em casa chorando, ele dizia que mulher grávida não tinha pra onde ir. Às vezes mandava eu sair com minhas amigas, mas eu disse a ele que sou casada com você, né [não é] com minhas amigas. (Margarida, 2018)

As mulheres, culturalmente são ensinadas desde cedo, a serem boas mães e boas donas de casa, para cuidar dos maridos e filhos. Exemplo disso é que as meninas se presenteia com bonecas, conjuntinhos de cozinha, vassouras para irem se acostumando com a realidade que as espera futuramente. Pais e mães antes prendem suas filhas para que elas não se “percam” ou fiquem “faladas” na comunidade. A manutenção da virgindade é tida como condição para um bom casamento, para manutenção da honra da família. Diante disso, mulheres idealizam o casamento como uma válvula de escape, achando que isso a trará a liberdade que não tem na casa de sua família. Porém, muitas se decepcionam ao perceber que ela apenas mudou de casa, mas, continua presa no modelo que a sociedade as impõe: mulher recatada e do lar, que deve obediência ao marido como tinha com seu pai.

Percebendo na fala de Margarida como ela se culpa pelas dificuldades enfrentadas no início de seu casamento por estar grávida e como isso dificultou sua adaptação em seu novo “lar”, o marido ainda permanecia com os hábitos de solteiro, saindo para as festas, deixando- a em casa sozinha, pois o mesmo aponta que lugar de grávida é em casa, atribuindo a responsabilidade da gravidez apenas ela. Ao mesmo tempo, algumas vezes, ele a mandava sair com as amigas, acreditando que os espaços que estariam não seriam de festas.

O desejo do casamento perfeito até que a morte o separe nem sempre é cumprido. Essa é uma realidade de muitas Margaridas.

Presente nas diversas classes sociais, o divórcio vem se tornando frequente nas últimas décadas. Mas, para que ele se tornasse amparado por Lei foi necessário um longo processo.

O divórcio ganhou diferentes significados ao longo da história da sistematização legal no Brasil. Durante o império, o divórcio foi uma prerrogativa da igreja Católica, mas produzia efeitos civis até mesmo entre aqueles que não professavam essa religião. Na república, significava somente a dissolução da sociedade conjugal e não de seu vínculo; era o desquite: casais separados dessa maneira não podiam contrair novo casamento civil. Essa figura legal perdurou até 1977, quando foi aprovado o divórcio a vínculo. Por meio dele, um novo casamento civil tornou-se possível. (ZARIAS, 2010,p.65).

Referências

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