ENERGIA SOLAR:
CONCEITOS BASICOS
Uma introdução objetiva dedicada a estudantes interessados em tecnologias de
aproveitamento de fontes renováveis de energia.
1. INTRODUÇÃO: 1.1. O SOL
1.1.1. Noções gerais
O Sol é a estrela mais próxima de nós.
Basicamente, é uma enorme esfera de gás incandescente, em cujo núcleo, através de reações termo-nucleares, é produzida a energia que emite.
Apesar de seu brilho ― o Sol tem magnitude aparente de -26,7 ― sua magnitude absoluta é apenas +4,83.
Sirius, a estrela mais brilhante no céu noturno, vista da Terra, tem magnitude aparente de -1,45 e é aproximadamente 23 vezes mais luminosa do que o Sol, enquanto Canopus, a segunda estrela mais brilhante do céu noturno, com uma magnitude aparente de -5,53, é aproximadamente 14.000 vezes mais luminosa do que o Sol. Apesar de Canopus ser muito mais luminosa do que Sirius, esta parece mais brilhante, porque está a somente 8,6 anos-luz da Terra, enquanto Canopus está muito mais distante, a 310 anos-luz.
Figura 1.1: Brilho aparente das estrelas Sirius e Canopus.
O brilho aparente de uma estrela* é medido pela sua magnitude aparente, que é o brilho da estrela considerando a luminosidade, a distância da Terra e a alteração da luz da estrela quando passa pela atmosfera da Terra.
* A relação entre as magnitudes aparentes entre estrelas, atualmente é definida por
onde I é a luminosidade aparente da estrela (W/m2).
Assim uma diferença de uma unidade na magnitude corresponde a uma variação no brilho de cerca de 2,5 vezes
( ) ( ) ( )
Isso significa que uma estrela de primeira grandeza (+1,00) é cerca de 2,5 vezes mais brilhante que uma de segunda grandeza (+2,00)
Para uma diferença de cinco unidades na magnitude (por exemplo entre estrelas de primeira e sexta grandezas) teriamos:
( ) ( ) ( )
ou seja, Isto significa que uma estrela de primeira grandeza (+1,00) é cerca de 100 vezes mais brilhante que uma estrela de sexta grandeza (+6,00).
Adotando como referência a estrela Vega teremos a Tabela 1.1.:
Tabela 1.1: Algumas magnitudes aparentes
OBJETO CELESTE MAGNITUDE APARENTE
Sol -26,74
Lua -12,00
Sírius (a estrela mais brilhante no
céu noturno) -1,45
Limite do olho humano* +6,00
* As estrelas mais fracas visíveis a olho nu em boas condições de visibilidade são de magnitude +6,00.
Em relação à luminosidade, as magnitudes absoluta (M) e aparente (m) não são equivalentes para uma estrela: por exemplo, a estrela Sirius tem magnitude absoluta de +1,41, mas uma magnitude aparente de -1,45.
A magnitude absoluta está diretamente relacionada à luminosidade da estrela e corresponde à magnitude aparente que a estrela teria se sua distância para a Terra fosse de 10 parsec (1 parsec≈ 3,3 anos-luz). Portanto, nesse contexto, o Sol é uma estrela bastante comum. Suas principais características são:
Tabela 1.2: Algumas características físicas do Sol.
Massa M = 1,989 x 1030 kg Raio R = 695 500 km = 109 RTerra Densidade média m = 1409 kg/m3 Densidade central c= 160 000 kg/m 3 Distância 1 UA = 149 600 000 km Luminosidade L=3,9×1026 watts=3,9×1026 J/s Temperatura efetiva Tef = 5785 K Temperatura central Tc = 15 000 000 K
Composição química principal (N)
Hidrogênio = 91,2 % Hélio = 8,7% Oxigênio = 0,078 % Carbono = 0,043 %
Período rotacional no equador 25,67 d
É importante saber que algumas das propriedades listadas acima são obtidas a partir de medições ou processos diretos. Por exemplo, a distância do Sol à Terra, chamada Unidade Astronômica, é medida por ondas de radar direcionadas a um planeta em uma posição favorável de sua órbita (por exemplo Vênus, quando Terra e Vênus estão do mesmo lado do Sol e alinhados com ele). O tamanho do Sol é obtido a partir de seu tamanho angular e da sua distância. A massa do Sol pode ser medida a partir do movimento orbital da Terra (ou de qualquer outro planeta) usando a terceira lei de Kepler. Sabendo então sua massa e seu raio temos a densidade média do Sol.
Outras características são determinadas a partir da proposição de modelos. Por exemplo, a equação de equilíbrio hidrostático, permite determinar a pressão e a temperatura no centro do Sol, supondo que elas têm que ser extremamente altas para suportar o peso das camadas mais externas.
A primeira determinação quantitativa da composição química da atmosfera solar foi obtida em 1929 por Henry Norris Russel (1877-1957), baseada em estimativasa partir da observação das intensidades das linhas no espectro solar.
1.1.2. A Estrutura do Sol
Em nossa discussão vamos admitir o Sol como uma enorme massa esférica (de raio da ordem de 109 m – 1,39 . 109 m) composta de gases ionizados a alta temperatura (plasma) à distância de 1,499.1011 m da Terra (essa distância é chamada Unidade Astronômica - UA)*.
* A distância entre Sol e Terra foi determinada em 1673.
A estrutura do Sol é analisada por regiões: o núcleo solar é uma esfera que compreende a região correspondente a 23 % de seu raio a partir de seu centro, o que corresponde a 15 % de seu volume. Apesar disso o núcleo do Sol concentra cerca de 40 % de sua massa e gera 90 % da energia produzida. Essa região do Sol apresenta temperatura da ordem de 107 K e densidade 105 Kg/m3*.
* A densidade da água 103 Kg/m3; e do chumbo 104 Kg/m3.
Acima do núcleo está a zona radioativa (entre 23 % e 70 % do raio solar) por onde a energia produzida no núcleo solar se propaga por radiação e onde, em seu limite, a temperatura cai para 105 K e a densidade para 102 Kg/m3.
Logo acima dessa zona radiativa se localiza a zona convectiva se estendendo por cerca de 70 % a 100 % do raio solar, que apresenta temperatura que varia entre 5000 K e 6000 K e sua densidade decresce até 10-5 Kg/m3.
A camada externa a essa região recebe o nome de fotosfera e é admitida como a superfície solar por ser constituída de uma região opaca (não permite a passagem de radiação), com cerca de 330 km de espessura, a partir da qual é emitida a maior parte da radiação solar.
Figura 1.2: Estrutura elementar do Sol.
Sobre a fotosfera, basicamente transparente, há a ocorrência de gases que constituem a atmosfera solar composta de cromosfera e coroa solar que de forma análoga ao que ocorre na Terra vai se rarefazendo até confundir-se com o espaço interplanetário.
Embora a temperatura da região interna do Sol seja da ordem de 107 K, em sua região mais externa (fotosfera) a temperatura efetiva do Sol (calculada pelo modelo de radiação do corpo negro) é 5762 K. É interessante saber que outros modelos de calculo da temperatura da fotosfera solar apontam para o valor de 6300 K.
Como é possível medir a energia que a Terra recebe do Sol por m2: 1400 joules por segundo, ou seja, uma potência de 1400 watt (que poderia alimentar simultaneamente 14 lâmpadas de 100 watt), e conhecida a distância entre Sol e Terra, determina-se sua luminosidade, ou potência emitida, em 4.1026 watt, ou 4.1026 J/s.
Essa quantidade de energia corresponderia à combustão de 2.1020 galões de gasolina por minuto, mais de 10 milhões de vezes a produção anual de petróleo na Terra.
Portanto essa quantidade de energia não poderia ser produzida por combustão: por esse processo de produção de energia, o Sol se manteria ativo por apenas 10 mil anos ― evidências geológicas indicam que a idade do Sol é da ordem de bilhões de anos. Outros modelos, como o de produção da energia Solar com origem gravitacional ― apresentado pelo físico alemão Hermann Ludwig Ferdinand von Helmholtz (1821-1894) em 1854 ― explicam a longevidade do Sol em apenas 20 milhões de anos, o que não justifica as evidências experimentais.
A fonte hoje aceita para a energia do Sol foi proposta por Hans Albrecht Bethe, em 1937 e propõe que a energia produzida no Sol tem origem em reações termonucleares, onde quatro prótons são fundidos em um núcleo de hélio, com liberação de grande quantidade de energia.
Figura 1.3: Ilustração das reações termonucleares que ocorrem no Sol.
Nestas reações ocorre a conversão da massa solar em energia conforme a equação de Einstein de conversão de massa:
onde:
E= energia produzida; m= massa convertida;
c= velocidade da radiação eletromagnética no vácuo. Assim a conversão de 1 kg de matéria produz...
Comparando com a energia consumida em uma residência durante 1 mês:
⁄ ⁄ portanto ⁄
A composição do Sol é 92,1 % hidrogênio, 7,8 % hélio, 0,061 % oxigênio, 0,039 % carbono e 0,0084 % nitrogênio.
Com esta composição, o Sol tem hidrogênio suficiente para alimentar essas reações por bilhões de anos. À medida que diminui a quantidade de hidrogênio, aumenta a de hélio no núcleo.
1.2. Um rápido olhar na relação Terra Sol
A energia solar ― radiação eletromagnética produzida no Sol ― é a principal fonte de energia do sistema Terra – atmosfera aproveitada nos processos biológicos, químicos e físicos que ocorrem na natureza.
Figura 1.4: Ilustração da interação Sol Terra (a Terra está mergulhada num “campo energético” que tem como origem o Sol).
Como consequência, a variação do fluxo de radiação solar incidente resulta em alterações em todos os processos que ocorrem Terra, especialmente climáticos e meteorológicos.
Diversos processos podem produzir variações do fluxo de radiação solar incidente: tais como a atividade
solar, como os movimentos da Terra ao redor do Sol, e de seu próprio eixo, por exemplo.
(a) (b) (c)
Figura 1.5: (a) Ilustração mostrando a variação a atividade solar; (b) Ilustração mostrando a mudança da posição da Terra em relação ao Sol (translação e rotação); (c) Ilustração mostrando a mudança da posição da Terra em relação ao Sol (Precessão e Nutação).
Além de fatores externos, temos que a formação de nuvens assim como as características físicas da superfície, tais como relevo e vegetação, sobre a qual a radiação solar incide também desempenham um papel importante no balanço de radiação do sistema.
Há ainda que considerar que a atmosfera da Terra, que é constituída por gases e partículas de aerossóis e que a radiação solar interage de diversas formas com a atmosfera.
Figura 1.6: Ilustração da interação entre a radiação solar e a atmosfera terrestre.
Assim, alterações, por exemplo, nos constituintes da atmosfera (composição química e concentração de gases e partículas de aerossóis, quantidade e características das nuvens) que interagem com a radiação eletromagnética podem afetar o perfil de temperatura e, por conseguinte, o perfil de pressão. Por sua vez, a alteração da distribuição vertical e horizontal da pressão atmosférica afeta a velocidade e a direção do vento.
A radiação eletromagnética afeta também a concentração de alguns gases na atmosfera a partir de reações fotoquímicas.
Percebemos, portanto, que assim como o padrão de radiação eletromagnética produzida no Sol que atinge a Terra pode provocar variações na atmosfera terrestre, por sua vez a atmosfera terrestre afeta o padrão de radiação eletromagnética que atinge a Terra, produzida no Sol e assim por diante. Esses processos são chamados de processos de realimentação do sistema (do inglês feedback processes).
Por isso, a compreensão do processo como um todo somente pode ser efetuada a partir da elaboração de modelos dinâmicos que se ajustem a essas variações.
Para tanto necessitamos criar variáveis significativas capazes de descrever os fenômenos. Esse é nosso próximo estágio.
2. O CONCEITO DE RADIAÇÃO 2.1. RADIAÇÃO
Admite-se que todo corpo à temperatura maior que zero absoluto (0 K= -273,15 °C) emite energia na forma de ondas eletromagnéticas. Neste contexto definimos como radiação à emissão, ou propagação, dessa energia (na forma de ondas eletromagnéticas). Essa energia não ocorre de forma contínua, ela é
transmitida em quantidades discretas de energia (“pacotes de energia”) denominados fótons (ou quantas
de energia).
Figura 2.1: Corpo emitindo fótons. 2.2. A ENERGIA DE UM FÓTON (U)
A energia (U) de um fóton é diretamente proporcional à sua frequência ( ) de oscilação conforme onde h= constante de Planck=6,62606957 . 10-34 J.s= 6,62606957 . 10-34 m2.kg/s e como onde
c= velocidade da radiação eletromagnética no vácuo (2,998 . 108 m/s) = o comprimento de onda associado ao fóton (radiação eletromagnética) então
Em espectroscopia é frequente operar, também, com uma grandeza chamada número de onda (k) que é definida como o inverso do comprimento de onda ( ) e que indica o número de ondas por metro. Assim:
e portanto, podemos escrever também que
2.3. ESPECTRO DE RADIAÇÃO ELETROMAGNETICA 2.3.1. O Espectro eletromagnético
O espectro eletromagnético é a distribuição da intensidade da radiação eletromagnética com relação ao seu comprimento de onda ou frequência.
2.3.2. Regiões do Espectro Eletromagnético
O espectro eletromagnético pode ser dividido em várias bandas ou intervalos espectrais (também ilustrado na Figura 2.2):
Raios-gama: radiação com comprimento de onda menor que 1 nm; Raios-X: radiação com comprimento de onda entre 1 e 10 nm; Ultravioleta: região compreendida entre 10 < < 400 nm;
Visível ou radiação fotossinteticamente ativa (PAR, do inglês photosynthetically active radiation)*:
400 nm < < 700 nm;
Infravermelho próximo: 0,7 μm < < 3,5 μm; Infravermelho térmico: 3,5 μm < < 100 μm;
Microondas: radiação com comprimentos de onda entre 3 mm e 300 mm ou frequências entre 1 e 100
Ghz;
Ondas de rádio: radiação com comprimentos de onda maior que 300 mm.
Trata-se da região espectral solar responsável pela ocorrência da fotossíntese; A representação gráfica do espectro eletromagnético é mostrada na figura abaixo.
Figura 2.2: O espectro eletromagnético pode ser dividido em várias bandas ou intervalos espectrais.
A Tabela abaixo dá os valores aproximados em comprimento de onda, frequência e energia para regiões selecionadas do espectro eletromagnético.
Tabela 2.1: Valores aproximados em comprimento de onda, frequência e energia para regiões selecionadas do espectro eletromagnético.
2.3.3. O Espectro Solar
Figura 2.3: Distribuição aproximada do espectro solar.
A maior parte da energia radiante do sol está concentrada na região do espectro visível e próximo do visível. A região do visível representa aproximadamente 43 % do total emitido, a região do
infravermelho 49 % e a região do ultravioleta 7 %. Menos de 1 % da radiação solar é emitida como raios
X, raios gama e ondas de rádio.
3. O CORPO NEGRO 3.1. Conceito geral
Todo corpo à temperatura maior que 0 K (zero Kelvin, zero absoluto) emite radiação num espectro contínuo de frequências, ou seja, não existem “espaços vazios” no espectro.
Todo o corpo absorve e emite radiação.
Quando a temperatura do corpo é maior que a do ambiente a seu redor, a taxa de emissão é maior que a taxa de absorção. Quando a temperatura do corpo é menor que a do ambiente a seu redor, a taxa de emissão é menor que a taxa de absorção.
3.2. Corpo negro (CN)
Define-se como corpo negro o meio ou substância que absorve toda a radiação incidente sobre ele, independentemente do comprimento de onda, direção de incidência ou estado de polarização. Nenhuma componente da radiação incidente é refletida ou transmitida.
Figura 3.1: Ilustração de corpo negro perfeito à temperatura 0 K.
Para entender o conceito, imagine um corpo isolado do seu meio externo, com paredes isolantes. Como não há trocas com o meio externo, dizemos que o corpo se encontra em equilíbrio termodinâmico, isto é, o corpo se apresenta em:
Equilíbrio térmico: Não há gradientes de temperatura. A temperatura do corpo é constante e homogênea;
Equilíbrio mecânico: Não há forças líquidas ou tensões, isto é, a pressão é constante em todas os pontos do corpo;
Equilíbrio radiativo: O campo de radiação dentro do corpo é constante, isto é, o fluxo de radiação que entra no corpo é igual ao que sai;
Equilíbrio químico: As taxas de todas as reações químicas são balanceadas por suas reações inversas, tal que a composição química é a mesma em todo o corpo;
Suponha agora que esse corpo apresenta uma pequeníssima abertura. Toda a radiação incidente nesta abertura é absorvida e retida em seu interior, visto que a probabilidade de ser refletida dentro do corpo de forma a voltar pelo mesmo orifício é muito pequena. Por essa razão, a abertura é perfeitamente absorvedora ou “negra”.
A radiação que eventualmente saia pela abertura alcançou equilíbrio térmico com o material que constitui o corpo. Essa radiação emitida pela abertura é denominada radiação de corpo negro e apresenta as seguintes características:
é isotrópica; não polarizada;
independe da constituição e da forma do corpo em questão;
Figura 3.2: Ilustração de um corpo negro à temperatura T> 0 K.
Observa-se experimentalmente* o aumento da intensidade das radiações de maior frequência emitidas com o aumento com a temperatura do corpo emissor, ou seja, quanto maior a temperatura do corpo emissor maior abundância de radiação de alta freqüência emitida pelo corpo considerado.
Corpos a temperaturas mais altas tendem a emitir radiação na região do visível, enquanto corpos a temperaturas mais baixas emitem radiação na região do infravermelho.
Da necessidade de análise dessas observações surgiu o estabelecimento da grandeza Radiância espectral L( ) definida com rigor posteriormente. Observe a Figura 3.3:
Figura 3.3: Ilustração da variação da Radiância espectral do corpo negro em função da frequência de radiação.
Note que quanto mais alta for a temperatura do corpo negro mais alta é a frequência da radiação de Radiância máxima no espectro. Dessa forma é possível determinar a temperatura de um corpo negro em função da distribuição de sua Radiância espectral.