• Nenhum resultado encontrado

REPOSITORIO INSTITUCIONAL DA UFOP: Clonagem e expressão do cDNA codificante para a toxina do veneno de Lasiodora sp, LTx2, em vetor de expressão pET11a.

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2019

Share "REPOSITORIO INSTITUCIONAL DA UFOP: Clonagem e expressão do cDNA codificante para a toxina do veneno de Lasiodora sp, LTx2, em vetor de expressão pET11a."

Copied!
102
0
0

Texto

(1)

DISSERTAÇÃO DE MESTRADO

Clonagem e expressão do cDNA codificante para a toxina do veneno de Lasiodora sp, LTx2, em vetor de expressão pET11a.

Alexandre A. de Assis Dutra Ouro Preto, Julho de 2006

Universidade Federal de Ouro Preto Núcleo de Pesquisa em Ciências Biológicas

(2)

Universidade Federal de Ouro Preto Núcleo de Pesquisa em Ciências Biológicas

Programa de Pós-graduação em Ciências Biológicas

Clonagem e expressão do cDNA codificante para a toxina do veneno de Lasiodora sp, LTx2, em vetor de expressão pET11a.

Alexandre A. de Assis Dutra

ORIENTADOR: PROF. DR. IESO DE MIRANDA CASTRO

(3)
(4)

D978c Dutra, Alexandre A. Assis.

Clonagem e expressão do DNA codificante para a toxina do veneno de Lasiodora sp, LTx2, em vetor de expressão pET11a: [manuscrito]. / Alexandre A. Assis Dutra. - 2006.

xi, 87f.: il., color; graf.; tabs.

Orientador: Prof. Dr. Ieso de Miranda Castro.

Área de concentração: Biologia molecular.

Dissertação (Mestrado) - Universidade Federal de Ouro Preto. Instituto de Ciências Exatas e Biológicas. Núcleo de Pesquisas em Ciências Biológicas.

1. Clonagem - Teses. 2. Biologia molecular -Teses. 3. Toxinas - Teses. 4. Aranha - Veneno - Teses. I.Universidade Federal de Ouro Preto. Instituto de Ciências Exatas e Biológicas. Núcleo de Pesquisas em Ciências Biológicas. II. Título.

(5)

Agradecimentos

Agradeço ao professor Ieso pela oportunidade de trabalho, pela confiança depositada em mim e pela orientação séria e comprometida;

Lucas, Milene e André, por dividirem as dúvidas, frustrações e as conquistas nesse trabalho; Aos professores Juliana Fietto e Luciano Fietto por todos os conselhos e sugestões para sempre contornar, com serenidade, os problemas que surgiam;

À Maria José Trópia, por estar sempre pronta e disposta para me tirar do sufoco com boa vontade e bom humor;

Aos amigos do LBCM que fizeram os momentos difíceis parecerem até um pouco cômicos, especialmente Aninha, Lisvane, Mel, Fernanda, Luiza, Renata, Gil, Ju, Ronny, Murilo;

Aos amigos dos outros laboratórios que foram de importância indispensável para a conclusão deste trabalho. Dentre os quais: LIP e Laboratório de Bioquímica e Biologia Molecular;

Um agradecimento especial aos amigos do Laboratório de Venenos e Toxinas Animais – ICB – UFMG; pela ajuda nas análises de dados e purificações, além de sempre me ajudar a manter o bom humor;

Aos professores Adriano Pimenta e Milton Guerra pelas sugestões e discussões sempre muito proveitosas;

À minha família em BH por sempre estar presente, mesmo quando eu não sabia que precisava tanto deles ou não dava o devido valor;

Aos amigos que, mesmo não estando envolvidos diretamente na realização do trabalho, me ajudaram a manter a calma e esquecer dos problemas, quando estes pareciam maiores do que realmente eram;

(6)

Resumo

O veneno de cobras, escorpiões, aranhas e outros animais venenosos é uma fonte rica em toxinas.

Uma característica importante de algumas toxinas é o fato de serem espécie específicas. Neste

trabalho, nós realizamos a clonagem da seqüência codificante para a toxina LTx2 da aranha

Lasiodora sp. no vetor de expressão pET11a. Esta toxina foi previamente identificada, através da

varredura de uma biblioteca de cDNA da glândula de veneno desta aranha. A análise de

similaridade, feita com o programa de alinhamento local BLAST, mostrou que esta toxina

apresenta similaridade com as toxinas huwetoxina-II e huwetoxina-VII da aranha Selenocosmia

huwena, bem como com as toxinas LTx1 e LTx3 da Lasiodora sp. Após a clonagem no vetor de

expressão, nós sequenciamos o produto da clonagem pelo método de Sanger e verificamos que o

mesmo foi inserido no frame correto. A indução da expressão da toxina recombinante foi feita

usando IPTG na concentração de 0,6 mM, por 3-4 horas. Através de ensaios imunoquímicos, nós

constatamos que neste sistema a proteína recombinante é expressa sobretudo na forma de corpos

de inclusão. Definimos então, uma estratégia para obter a toxina solúvel renaturada. Utilizando

uma solução contendo uréia na concentração de 6 M realizamos a desnaturação dos corpos de

inclusão, e procedemos a renaturação da proteína recombinante através de diálise em um tampão

de renaturação. A amostra foi então submetida a uma cromatografia líquida de alta pressão em

coluna de fase reversa. Através de eletroforese e Western Blotting, nós observamos que a

estratégia de purificação foi eficiente. Realizamos então um ensaio antimicrobiano, onde

observamos que a toxina recombinante, na concentração de 400 mg/mL. inibiu o crescimento

dos microrganismos Escherichia coli, Salmonella Agona e Staphylococcus epidermidis. A

expressão e recuperação da proteína recombinante em maior quantidade permitirá a realização de

(7)

Abstract

The venom from snakes, scorpions, spiders and other venomous animals is a very rich source of

potent toxins. An interesting feature of some toxins is their remarkable species specificity. In the

present work we cloned a sequence which codifies for the toxin LTx2 from the venom of the

spider Lasiodora sp, in the expression vector pET11a. This toxin was previously identified in the

screening of the cDNA library of the total venom. This toxin, when submitted to the local

alignment tool, BLAST, shown similarity with the toxins huwetoxina-II and huwetoxina-VII,

from the venom of the spider Selenocosmia huwena, as well as with the toxins LTx1 and LTx3

from Lasiodora sp. venom. After cloning in expression vector we verified if the fragment was

inserted in the correct frame using the Sanger DNA sequencing method. The expression of the

target protein was made by adding 0,6 mM IPTG to the media followed by a 3 to 4 hours

incubation. With the assistance of immunochemical assays, we were able to detect that the target

protein was been expressed in the form of inclusion bodies. Then we defined a strategy to

recover the soluble refolded protein. Using a solution containing 6 M urea we proceed the

solubilization of the inclusion bodies. The refolding of the soluble protein was made by the

dialysis method in refolding buffer. The sample was, then, submitted to high pressure liquid

chromatography, in a reversed phase column, to purify the protein. The purifying process was

efficient, as shown by the Western Blotting and electrophoresis results. After that, we made an

anti microbial assay, where we could see that the target protein, in the concentration of 400

mg/mL, inhibited the growth of the organisms used in the test. The expression and recovery of

larger amounts of the target protein will allow tests with this toxin in other organisms and

(8)

Índice

Resumo………...…….………….. III

Abstract………..….….…….. IV

Abreviaturas importantes………..….…………IX Lista de Figuras………...…………. X Lista de Tabelas... XI Apêndice...XII

1 – Introdução... 1

1.1 – Aspectos gerais...1

1.2 – Estudo de venenos animais ...4

1.3 – Estudo de venenos de aranhas...6

1.3.1 – Composição dos venenos de aranhas...6

1.3.2 – Ação dos venenos em canais iônicos...9

1.3.2.1 - Toxinas de aranha e canais de Ca2+...10

1.3.2.2 - Toxinas de aranha e canais de Na+...13

1.3.2.3 - Toxinas de aranha e canais de K+...17

1.3.2.4 - Toxinas de aranha e receptores de glutamato...19

1.3.3 – Toxinas inseticidas...21

1.3.4 - Atividade bactericida de venenos de aranhas...22

1.4 – Varredura de uma biblioteca de cDNA preparado a partir do mRNA obtido da glândula de veneno da aranha Lasiodora sp...23

2 – Objetivos...25

2.1 – Objetivo geral...25

2.2 – Objetivos específicos...25

3 – Materiais e Métodos...26

3.1Microrganismos, vetores e condições de cultivo utilizados nos experimentos...26

(9)

3.1.2 – Vetores utilizados nos experimentos...26

3.1.3 – Meios de cultura...27

3.1.3.1 - Meio LB...27

3.1.3.2 - LB agar...27

3.1.3.3 – Meio SOC...27

3.1.4 – Condições de cultivo...28

3.2 - Extração de DNA plasmidial em pequena escala (Método CTAB)...28

3.3 – Reações da polimerase em cadeia (PCR)...29

3.4 - Clonagem da seqüência codificante para LTx2 no vetor pBluescript II SK (+/-)...29

3.5 - Clonagem da seqüência codificante para LsTx2 no vetor de expressão pET11a...31

3.5.1 – Excisão do plasmídeo pBluescript II SK – LTx2...31

3.5.2 - Recuperação do inserto correspondente à seqüência codificante para LTx2...32

3.5.3 - Corte e defosforilação do vetor pET11a...33

3.5.4 – Recuperação do vetor excisado em gel de agarose...35

3.5.5 – Ligação do fragmento codificante para LTx2 no vetor pET11a...35

3.6 - Transformação das bactérias...36

3.6.1 - Preparo de células competentes – Método de Cloreto de Cálcio...36

3.6.2 - Transformação das células competentes...36

3.7 - Obtenção de DNA plasmidial e análise dos transformantes...37

3.8 – Sequenciamento...37

3.8.1 - Reação de sequenciamento...37

3.8.2 - Precipitação da reação de sequenciamento...38

3.8.3 – Análise das seqüências de nucleotídeos obtidas...38

3.9 - Transformação das células BL21 (DE3)...39

3.10 – Análise dos plasmídeos extraídos das células BL21 (DE3)...39

3.11 - Indução da LTx2 recombinante e análise do perfil eletroforético dos extratos livres de células...39

(10)

3.11.2 - Lise das células...40

3.11.3 – Preparo e coloração dos géis SDS – PAGE...40

3.11.3.1 – Preparo dos géis de poliacrilamida...40

3.11.3.2 - Coloração dos géis de poliacrilamida pelo método da prata...41

3.12 - Western Blotting - Método ECL...41

3.13 – Desnaturação dos corpos de inclusão e renaturação das proteínas...42

3.13.1 - Solubilização dos corpos de inclusão...42

3.13.2 - Renaturação das proteínas...43

3.14 - Purificação da proteína recombinante LTx2...43

3.15 - Western Blot...43

3.16 - Dosagem de proteínas...44

3.17 - Análise da seqüência de aminoácidos da LTx2 no programa BLASTp...44

3.18 - Análise da conformação secundária da LTx2...44

3.19 - Ensaios Biológicos...44

3.20 – Reagente e soluções...45

4 – Resultados...47

4.1 - Clonagem da seqüência codificante para LTx2 no vetor de expressão pET11a...46

4.2 - Análise da seqüência...49

4.3 – Transformação de células BL21(DE3) competentes e indução da toxina recombinante LTx2...49

4.3.1 – Análise das células competentes BL21(DE3) transformadas com a construção pET11a – LTx2 ...49

4.3.2 - Análise do perfil eletroforético dos extratos livres de células...51

4.3.3 – Confirmação da presença da LTx2 recombinante por Western Blotting - Método ECL...53

4.4 – Purificação da toxina recombinante LTx2 em sistema HPLC...54

4.5 – Análise da fração eluída da coluna de fase reversa...56

4.5.1 – Eletroforese da fração eluída da coluna de fase reversa...56

4.5.2 – Western Blotting da fração eluída na coluna de fase reversa...57

(11)

4.7 - Análise da conformação secundária da LTx2...58

4.6 – Ensaios biológicos...60

4.6.1 – Teste de atividade antimicrobiana...60

5 – Discussão...63

6 – Conclusões...73

7 – Perspectivas...74

(12)

Abreviaturas importantes

Aah: Toxinas isoladas do veneno do escorpião Androctonus australis hector

AMPA: α-amino-3-hidroxi-5-metil-D-aspartato

BLAST: Basis Local Alignment Search Tool

cDNA: DNA complementar

dNTP: Desoxiribonucleotídeos

D.O.: Densidade Óptica

EDTA: EthyleneDiamineTetrAcetic acid (ácido etilenodiamino tetra-acético)

ELISA: Enzyme Linked Immunosorbent Assay (Ensaio de Imunoabsorvente ligado à enzima)

GABA: Gamma-aminobutyric acid (Ácido Gama-aminobutírico)

HPLC: High Pressure Liquid Chromatography (Cromatografia Líquida de Alta Performance)

HWTX: Huwetoxina. Toxina isolada da aranha Selenocosmia huwena.

ICK: Inhibitor Cistine Knot (Nó-de-cistina inibidor)

iGlur: Receptores ionotrópicos de glutamato

IPTG: Isopropil- β- D-thiogalactopyranoside

Kda: Kilo Dáltons

Lqh: Toxinas isoladas do veneno do escorpião Leiurus quinquestriatus hebraeus

mRNA: RNA mensageiro

nAChr: Receptores nicotínicos de acetilcolina

NMDA: N-metil-D-aspartato

PAGE: Polyacrilamide Gel Electrophoresis (Eletroforese em gel de poliacrilamida)

PCR: Polymerase Chain Reaction (Reação em cadeia da polimerase)

PhTx: Toxinas isoladas da aranha Phoneutria nigriventer

PMSF: Phenylmethylsulphonylfluoride (Fenil-Metil-Sulfonil-Fluorido)

TTX: tetrodotoxina

VWF: Von Willebrand Factor (Fator de Von WIllerand)

T.E: Tris / EDTA

TFA: Trifluor acetic acid (ácido trifluoracético)

(13)

Lista de figuras

Figura 1 - Esquema representando o motivo estrutural “nó-de-cistina”...8

Figura 2 – Modelo de canais de Ca2+ dependentes de voltagem...11

Figura 3 – Organização transmembrana das subunidades dos canais de Na+...14

Figura 4 – Estrutura dos canais de potássio...18

Figura 5: Tradução da seqüência de nucleotídeos que codifica para a toxina LTx2 utilizando o programa SIXFRAME...30

Figura 6 – Mapa do vetor de expressão pET11a...34

Figura 7: Eletroforese em gel de poliacrilamida dos produtos de PCR mostrando a inserção de um fragmento de aproximadamente 150 pares de bases...48

Figura 8 – Eletroforese em gel de agarose com o PCR de colônia dos DNAs plasmidiais extraídos das células competentes BL21(DE3) transformadas com a construção pET11a – LTx2...50

Figura 9: Eletroforese em gel SDS-PAGE, mostrando os níveis de expressão da proteína recombinante (LTx2) após indução com IPTG...52

Figura 10 - Resultado do Western Blotting método ECL...53

Figura 11 – Perfil cromatográfico obtido com a purificação da toxina LTx2 recombinante...55

Figura 12 - Eletroforese com o material recolhido do HPLC...56

Figura 13 - Resultado do Western Blotting do pico recolhido do HPLC...57

Figura 14 – Alinhamento das seqüências de aminoácidos das toxinas LTx2, LTx3, LTx1, HWTX-II e HWTX-VII...58

Figura 15 – Predição da estrutura secundária adotada pela LTx2, segundo o programa PELE...59

Figura 16 – Predição de estrutura secundária para a LTx2 segundo o programa GOR4...59

Figura 17 - Ensaio antimicrobiano...61

(14)

recombinante pelo promotor T7 lac...67

Lista de tabelas

(15)

1 - Introdução

1.1 - Aspectos gerais

As aranhas pertencem ao filo Artropoda, subfilo Chelicerata, classe Aracnida, ordem

Aranea (Ruppert 1994). A ordem Aranea pode ainda ser dividida em 2 subordens: Mesothelae,

que compreende uma única família de aranhas primitivas (Liphistiidae) com 85 espécies

documentadas. As aranhas da subordem Mesothelae são caracterizadas por apresentarem o

abdômen segmentado, enquanto que as aranhas da outra subordem, Opisthothelae, não

apresentam segmentação externa do abdômen. A subordem Opisthothelae é dividida em duas

Infra-ordens: Labdognatha e Orthognatha. A maioria das Labdognathas respira através de um par

de pulmões libriformes e um par de traquéias, que permitem uma troca gasosa mais eficiente,

permitindo que sejam menos sedentárias que as Orthognathas. As Labdognathas possuem

quelíceras diaxiais, que se movimentam de um lado para o outro e sintetizam a seda para a

construção de teias. As Orthognathas possuem quelíceras paraxiais, que se movimentam de cima

para baixo, e normalmente sintetizam a seda apenas para construir a ooteca e linhas de reboque.

Com algumas poucas exceções, não constroem teias elaboradas (King 2000). Este grupo inclui as

maiores aranhas conhecidas.

Hoje são conhecidas cerca de 40.000 espécies de aranhas e estima-se que existam

aproximadamente 100.000 espécies ainda não caracterizadas. Entretanto, somente a minoria

dessas representa algum perigo para o homem (Escoubas et. al. 2000, Lucas 1988). Em geral as

aranhas têm de 0,5 mm a 9,0 cm de comprimento corporal, podendo atingir um tamanho de 25

cm da ponta de uma perna à outra, como no caso das caranguejeiras gigantes (King 2004). A

diferença mais evidente entre os machos e as fêmeas está no pedipalpo. Os da fêmea são curtos e

se assemelham com as pernas; já os do macho possuem o último segmento modificado em órgão

copulador, apresentando uma forma dilatada na ponta (Platnick 1971).

Uma das características mais distinta das aranhas é a produção de seda. Uma única espécie

pode conter até oito fiandeiras, cada uma produzindo seda com uma característica diferente

(King 2004). As aranhas construtoras de teias produzem uma variedade de fibras com

propriedades mecânicas ímpares na natureza e comparáveis com as melhores fibras produzidas

pelo homem, em termos de resistência mecânica (Gosline 1999). Já foram encontradas espécies

fósseis do Devoniano com fiandeiras perfeitamente identificáveis (Shear et. al. 1989). A seda das

(16)

As aranhas, como a maioria dos outros aracnídeos, são predadoras e se alimentam

principalmente de insetos. De acordo com uma avaliação de Bristowe (1958) as espécies que

habitavam a Grã-Bretanha naquela época devoravam por ano uma quantidade de insetos maior

que o peso da população humana da ilha, o que ilustra também a importância das aranhas no

equilíbrio ecológico. Entretanto, as aranhas são também presas de alguns insetos e vertebrados.

Como exemplo alguns grupos de vespas, que utilizam aranhas como alimentos para suas larvas,

paralisam a aranha com um ferrão e põem os ovos (Evans & Eberhard 1970, Steiner 1986).

No Brasil as aranhas que causam acidentes de maior gravidade são as Araneomorphas do

gênero Phoneutria Perty 1833, Loxosceles (Heinecker and Lowe, 1833) e Latrodectus Walckenaer 1805 (Lucas 1987). O gênero Phoneutria Perty 1833, que pertence à família

Ctenidae, tem os olhos distribuídos em três fileiras. A primeira mais próxima às quelíceras com

dois olhos, a segunda com quatro olhos e a terceira com dois olhos (Lucas 1987). As aranhas

desse gênero são popularmente conhecidas pelo nome de “Armadeira” ou

“aranha-das-bananeiras”. Elas apresentam hábitos crepusculares, erráticos e não constroem teias, caçando

suas presas ativamente dominando-as com o veneno. A Phoneutria pica com freqüência e é

bastante agressiva. Não costumam fugir quando provocadas e acompanham o movimento do

agressor sempre tentando ficar na frente do mesmo. O veneno possui efeito neurotóxico

periférico e central causando dor imediata e intensa. A maioria dos casos de acidente com

aranhas deste gênero é de evolução benigna e não costuma ser fatal em adultos (Secretaria de

Estado da Saúde, Ins. Butantan 1982).

As aranhas do gênero Loxosceles são pequenas, com no máximo três centímetros de

comprimento de uma perna à outra. Possuem seis olhos dispostos em três pares. São conhecidas

popularmente como “aranha-violino” ou “aranha-marrom”. Normalmente elas não chamam a

atenção e podem até ser confundidas com outras espécies menos perigosas (Lucas 1987). Elas

aparecem em ambientes domésticos, porões, sótãos, garagens e entulhos (Lucas 1987). Não são

aranhas agressivas e normalmente só picam quando comprimidas contra o corpo, situação que,

normalmente, causa a morte das mesmas. O veneno tem ação hemolítica e proteolítica. Na

maioria das vezes a picada não é percebida pela vítima e após 24 horas aparecem edemas no

local da picada, indisposição e algumas vezes febre. A ulceração da pele, apesar da soroterapia,

evolui vagarosamente e deixa cicatrizes.

As aranhas do gênero Latrodectus são caracterizadas por um abdômen dilatado em forma

de globo, exibindo no lado ventral uma cor vermelho-alaranjada. Os olhos são distribuídos em

duas fileiras com quatro olhos cada uma. São conhecidas popularmente como “Viúvas-negras”.

(17)

mm de comprimento. Estes, normalmente morrem após o acasalamento. A fêmea faz de 3 a 5

ootecas em um intervalo de poucos dias. Os filhotes são espalhados pelo vento e podem se

dispersar por quilômetros. As aranhas deste gênero não são agressivas e quando perturbadas

deixam-se cair da teia e fingem-se de mortas. Picam somente quando comprimidas contra o

corpo (Lucas 1987). O veneno desta aranha é, provavelmente, um dos venenos naturais mais

tóxicos. O quadro clínico da picada é caracterizado por espasmos musculares dolorosos. Pode ser

de alto risco para crianças, idosos e pessoas com doenças cardiovasculares. O tratamento, quando

necessário, é feito com anti-soro específico (Rauber 1983). Os venenos de todas as aranhas deste

gênero apresentam modo de ação semelhante e parecem ser compostos das mesmas toxinas

(Escoubas et. al. 2000).

Quanto às caranguejeiras, pensava-se que estas eram aranhas perigosas por causa do seu

tamanho (Bücherl 1971). Mas não há, no Brasil, relatos de acidentes graves causados pelas

aranhas da infraordem Orthognatha (Lucas 1987). Em recentes casos de picadas de

Theraphosiideos na América do Sul (Lucas et. al. 1994) e Ásia/África (Schmidt 1989) e

Austrália (Isbister et. al. 2003) ficou provado que o veneno desta aranha é inócuo para humanos,

resultando, na maioria dos casos, apenas em dores locais moderadas, coceiras e rigidez no local

da picada. Em casos mais severos podem ocorrer espasmos musculares que podem persistir por

várias horas (Escoubas & Rash 2004). A dor causada pela picada desta aranha é resultante

principalmente pelo ferimento provocado pelas quelíceras, pelo pH baixo do veneno, efeitos das

histaminas, serotoninas e ATP (Schanbacher et. al. 1973 a,b; Chan et. al. 1975; Odell et. al.

1985, 1987). A principal forma de defesa dos Theraphosideos não é o veneno, e sim os pêlos

urticantes presentes no abdômen dessa aranha, em uma concentração de 10 mil a 20 mil pêlos

por mm (Pickard-Cambridge 1897). Quando o animal se sente ameaçado ele raspa as pernas

posteriores no abdômen e lança esses pêlos urticantes no agressor, causando irritação na pele e

mucosas. Entretanto, os casos de acidentes com a Mygalomorpha australiana Atrax robustus, da

família Hexathelidae, são normalmente graves e antes do desenvolvimento de um anti-veneno

eficiente podiam causar até a morte da vítima, como já foi relatado na literatura médica (Hartman

(18)

1.2 – Estudo de venenos animais

Os animais que possuem ou que utilizam toxinas, como cobras, escorpiões, Conus, insetos

e aranhas contam com a maquinaria genética para a produção destes compostos (Mebs 2001,

Escoubas & Rash 2004). A síntese de toxinas envolve a expressão de um gene que acarreta

diretamente na toxina e a síntese de compostos secundários com atividade biológica envolve vias

metabólicas constituídas de numerosas etapas (Mebs 2001).

Já a algum tempo os venenos de origem animal têm sido alvo de grande atenção. O que

inicialmente despertou atenção foi o modo de ação desses venenos e a importância médica

relativa aos danos que estas substâncias podem causar ao organismo. Recentemente, o interesse

por moléculas de origem animal aumentou devido ao fato de elas apresentaram um potencial

valor econômico, relacionado ao desenvolvimento de novos fármacos e/ou inseticidas e como

sondas específicas úteis para o estudo de canais iônicos e receptores de membranas, fornecendo

ferramentas para a investigação de funções celulares bem como drogas úteis no estudo de

neuropatologias (Jovem et. al. 1980a, Courad et. al.1982, Budd et. al. 1988, Jackson &

Usherwood 1988, Cruz et. al. 1985, Grishin et. al. 1986, DeLima & Martin-Eauclaire 1995,

Pimenta et. al. 2001a).

O estudo do mecanismo de ação de venenos de origem animal mostrou que moléculas

isoladas destes venenos podem revelar muito acerca do processo fisiológico nos quais elas

interferem (Escoubas & Rash 2004). Uma das propriedades mais importantes das toxinas de

origem animal é a alta especificidade por certos subtipos de canais iônicos ou receptores de

membrana. Esta propriedade, quando combinada com a alta potência que geralmente as toxinas

possuem, faz delas uma ferramenta de valor inestimável em experimentos para elucidar o papel

fisiológico ou patologias relacionadas aos receptores ou canais, já que poucas drogas têm ação

específica sobre os mesmos (Harvey 1998).

As picadas de serpente causam cerca de 2,5 milhões de acidentes anualmente em todo o

mundo, dos quais mais de 100.000 levam à morte (White 2005). A importância clínica dos

venenos de serpente é, em parte, responsável pela atenção que já vem sendo dada há muito

tempo a este veneno, o que resultou na descoberta de drogas importantes sintetizadas com base

na composição do mesmo. Para citar um exemplo de sucesso, o potenciador de bradicinina,

captopril, foi desenvolvido a partir do veneno de Jararaca (Harvey et. al. 1998) e hoje é usado

como anti-hipertensivo em todo o mundo.

Outro exemplo da utilidade das toxinas está no estudo de receptores muscarínicos no

(19)

disponíveis até então só eram capazes de distinguir três subtipos: M1, M2 e M3. Além de não

serem seletivos o bastante para cada subtipo, as ferramentas farmacológicas disponíveis não

permitiam estudar o envolvimento de cada um desses subtipos em um processo particular

(Harvey et. al. 1998). Entretanto, no veneno da serpente Mamba Negra (Dendroapsis polylepis)

foram encontradas toxinas que, por experimentos de competição, se mostraram específicas para

certos tipos de receptores muscarínicos (Jerusalinsky et. al. 1992). De forma que se pôde

demonstrar, por exemplo, que o bloqueio do receptor M4 causa amnésia em camundongos. No

veneno desta mesma serpente também foi encontrada uma das poucas toxinas com ação

específica para canais de cálcio do tipo-L, a calciseptina.

Outra utilidade prática encontrada para o estudo de venenos animais tem sido a pesquisa

com inibidores de agregação plaquetária. O fator Von Willebrand (VWF) não interage com

plaquetas em condições normais. Entretanto, certos componentes de venenos de serpente, como

botrocetina e bitiscetina induzem a aglutinação plaquetária in vitro, mesmo em condições

normais (Matsui & Hamako 2005). Para superar as limitações dos indutores de coagulação

disponíveis na prática clínica, Read et.al. (1978) procuraram e encontraram, em 5 dos 73

venenos estudados, atividade de agregação plaquetária mediada pelo VWF.

Bem como os venenos de aranhas e escorpiões, os venenos de vespas possuem várias

substâncias bioativas (Konno et. al. 2001). Não obstante, eles têm sido negligenciados nos

estudos de venenos animais e são pouco conhecidas as substâncias que os compõem. Os venenos

de vespa são peculiares por possuírem um efeito paralítico, não-letal, de longa duração (Hisada

et. al. 2005), uma vez que elas utilizam a presa paralisada para alimentar suas larvas (Konno et. al. 2001). No veneno da vespa Philantes triangulum foram encontradas philantotoxinas, que são moléculas bloqueadoras do receptor pós-sináptico do glutamato (Piek & Spanjer 1986, Piek et al.

1988, Eldefrawi et. al. 1988). Konno e colaboradores (2001) encontraram no veneno das vespas

solitárias Anoplius samariensis e Batozonellus maculifrons uma série de toxinas peptídicas a que

denominaram pompilidotoxinas (PMTXs). Esses peptídeos apresentaram ação tanto em sistema

nervoso de invertebrados como em sistema nervoso central de mamíferos. Também no veneno da

vespa solitária Anoplius samariensis, Konno e colaboradores (2001) encontraram o peptídeo

anoplina. Esse peptídeo, composto por apenas 10 resíduos de aminoácidos, apresentou atividade

antimicrobiana, e é o primeiro relato de substância com esse tipo de ação encontrada em veneno

de vespas.

Os venenos de escorpião possuem grupos de neurotoxinas que agem em mamíferos ou

insetos. São toxinas polipeptídicas de cadeia longa, com 61 – 76 resíduos de aminoácidos,

(20)

(Karbat et. al. 2004). Estas toxinas peptídicas podem ser classificadas em duas categorias principais, toxinas α e β, com base no modo de ação e nas propriedades de ligação em sítios dos

canais de sódio dependentes de voltagem (Gurevitz et. al. 1998, Wu et. al. 2000, Cestèlle &

Catterall 2000, Karbat et. al. 2004). As toxinas α, o grupo que foi mais estudado, causam

principalmente um retardo na inativação dos canais de sódio, prolongando o potencial de ação

(Catterall 1995, Catterall 2000, Denac et. al. 2000, Gordon & Gurevitz 2003, Sun et. al. 2003).

Este grupo pode ainda ser dividido em três subgrupos: Grupo α clássico, ativo em cérebro de

mamíferos, como a Aah2 (isolada do veneno do escorpião Androctonus australis hector) e a

Lqh2 (isolada do veneno do escorpião Leiurus quinquestriatus hebraeus), que se ligam com alta

afinidade em canais de sódio dependentes de voltagem de cérebro de rato, mas que praticamente

não são tóxicas em insetos (Karbat et. al. 2004); inseto-toxina α, como a LqhαIT, que tem alta

afinidade em canais de sódio dependentes de voltagem de insetos (Karbat et. al. 2004), e o grupo

α-like, ativo em sistema nervoso central de mamíferos e insetos (Gordon & Gurevitz 2003, Karbat et. al. 2004) mas incapaz de se ligar em preparação sinaptossomal de rato (Sun et. al. 2003). As toxinas β tornam mais negativa a voltagem necessária para a ativação do canal de

sódio, diminuindo a amplitude do pico de potencial de ação (Cestèlle & Catterall 2000).

1.3 – Estudo de venenos de aranhas

1.3.1 - Composição dos venenos de aranhas

Dentre os diferentes grupos de animais venenosos, o das aranhas é provavelmente o menos

explorado no aspecto relativo a composição do veneno (Escoubas et. al. 2000). Tal como

venenos de outros animais, venenos de aranhas são uma rica fonte de toxinas de complexidade

ainda não completamente elucidadas, incluindo peptídeos neuroativos, que são capazes matar ou

paralisar a presa através de mecanismos moleculares variados. Os venenos de aranha são uma

mistura de peptídeos de baixo peso molecular, neurotoxinas, toxinas dermonecróticas, enzimas

(Hash & Hodgson 2002). Também fazem parte da composição de venenos de aranhas uma

variedade de fatores humorais com propriedades inflamatórias, poliaminas livres, nucleotídeos,

sais inorgânicos, aminoácidos livres, polipeptídeos com mais de 1000 resíduos de aminoácidos e

fatores que podem modificar vários componentes da circulação sangüínea, acilpoliaminas e

neurotransmissores. (Welsh & Batty 1963, Hash & Hodgson 2002). A função desses

(21)

estar relacionados com a ação das neurotoxinas ou que sejam produtos da degradação de outros

constituintes do veneno (Escoubas et. al. 2000).

As acilpoliaminas, junto com as proteínas e os peptídeos, são os componentes mais

estudados e diversificados dos venenos de aranha (Beleboni et. al. 2004). Acilpoliaminas e

peptídeos podem ser separados por cromatografia líquida de fase reversa, sendo que as

acilpoliaminas são eluídas antes que os peptídeos. Este padrão de eluição já foi demonstrado

outras vezes na literatura e parece ser apresentado por todos os venenos de caranguejeiras

(Escoubas et. al.1995).

As acilpoliaminas, derivados naturais de poliaminas, são moléculas pequenas e potentes

que antagonizam várias classes de receptores, como receptores nicotínicos de acetilcolina

(nAChr) e receptores ionotrópicos de glutamato (iGlur). Esses componentes possuem também a

capacidade de interagir com canais iônicos dos sistemas nervosos, central e periférico (Olsen et.

al. 2004). Elas podem ser divididas em dois grupos: acilpoliaminas que contêm aminoácidos e acilpoliaminas que não contêm aminoácidos. Os dois grupos agem de maneira semelhante

bloqueando o receptor de glutamato, receptores nicotínicos e incorporam a mesma família de

grupos acil aromáticos terminais (para revisão ver McCormik e Meinwald 1995 e Blagbrough et.

al. 1994). Em um estudo com a acilpoliamina AR636, isolada do veneno da aranha Argiope aurantia, Herold & Yaksh (2005) observaram que a AR636 provoca paralisia flácida dose-dependente bem como efeito anestésico, quando injetada em ratos através de um cateter espinhal.

As acilpoliaminas agem também em canais de Ca2+ (McCormick et. al. 1993), e parecem ser

também os responsáveis pela rápida paralisia observada em insetos durante a predação (Osborne

1996).

Os principais componentes dos venenos de aranha são polipeptídeos com massa

molecular de 3000 a 8000 Da que dependem de várias pontes de disulfeto para manter sua

conformação. Esses polipeptídeos possuem também modificações amino ou carboxi terminais,

ou mesmo ambas, que mantêm a estabilidade da molécula in vivo (Norton & Pallaghy, 1998).

Essas toxinas têm essencialmente como alvo os vários tipos de canais iônicos de membrana e

podem bloquear a liberação de neurotransmissores interrompendo a exocitose dos mesmos

pelas membranas pré-sinápticas (Escoubas et. al.2000). Muitas das toxinas que agem em canais

iônicos possuem um motivo estrutural chamado de cistina” (Figura 1). O

“nó-de-cistina” é um motivo em que um “anel”, sustentado por duas pontes disulfeto, é cruzado por

uma terceira ponte disulfeto (Craik et. al. 2001). Em 1994 uma conformação, encontrada em

inibidores de proteases de plantas e neurotoxinas de Conus e aranhas, foi caracterizada por dois

(22)

chamado de “Nó-de-cistina Inibidor” (ICK) é formado por uma folha-β tripla antiparalela

estabilizada por um nó de cistina (Zhu et. al. 2003). Os dados encontrados por Escoubas &

Rash (2004) sugerem que as toxinas com o motivo ICK possuem um espectro de ação

farmacológica muito ampla, podendo exercer atividade em várias classes de canais iônicos.

Até o momento aproximadamente 400 proteínas e peptídeos (1,2 – 27 Kda) já foram

isoladas e purificadas, dentre as quais mais de 100 já tiveram a seqüência de aminoácidos

determinada completa ou parcialmente (Richardson 2006). Essas toxinas têm essencialmente

como alvo os vários tipos de canais iônicos de membrana e podem bloquear a liberação de

neurotransmissores interrompendo a exocitose dos mesmos pelas membranas pré-sinápticas

(Escoubas et. al.2000).

Figura 1. Esquema representando o motivo estrutural

“nó-de-cistina”. O “anel” estabilizado pelas pontes

disulfeto representadas em amarelo (VI - III e V – II) é

cortado por uma terceira ponte disulfeto, mostrada em

vermelho (I – IV).

Fonte: http://knottin.cbs.cnrs.fr

Entre as proteínas encontradas nos venenos de aranha estão incluídas neurotoxinas de alto

peso molecular e enzimas como proteases, hialuronidases, esfingomielinases, fosfolipases e

isomerases. Entretanto, com exceção do veneno da aranha Loxosceles, que possui uma ação

dermonecrótica peculiar, a presença de enzimas em venenos de aranha deve ser observada com

cautela (Schanbacher et. al. 1973a, Schanbacher et. al. 1973b), principalmente quando a extração

(23)

anteriores, podendo levar a uma contaminação do veneno com saliva ou fluidos digestivos

(Escoubas et. al. 2000).

Em um estudo recente, Pimenta et. al. (2005) utilizaram de técnicas de espectrometria de

massa para caracterizar estruturalmente peptídeos lineares com atividade antimicrobiana e

vasoativas presentes no veneno da aranha Phoneutria nigriventer. Neste estudo foram

encontradas 15 isoformas contendo de 7 a 15 resíduos de aminoácidos. São peptídeos

normalmente negligenciados nos estudos de veneno em detrimento àqueles com mais

toxicidade e presentes em maior quantidade, mas que entretanto podem possuir importantes

aplicações em biotecnologia. O fato de não dependerem de pontes disulfeto para manter a

conformação nativa favorece a expressão de proteínas ativas tanto por hospedeiros procariotas

como eucariotas (Pimenta e De Lima 2005).

1.3.2 – Ação dos venenos em canais iônicos

As toxinas peptídicas de venenos de aranha têm sido de grande utilidade no estudo da

eletrofisiologia e farmacologia de canais iônicos. Canais iônicos são proteínas de membrana que

permitem o fluxo de íons através da membrana celular, regulando o potencial de membrana e

balanço iônico da célula. Como moduladores do potencial de membrana os canais podem regular

funções importantes como contração, secreção de hormônios e neurotransmissores e expressão

gênica. Com o avanço nos estudos de toxinas, os pesquisadores ganharam uma importante

ferramenta que permite uma investigação mais refinada do papel fisiológico dos canais iônicos,

permitindo também o mapeamento de sítios específicos nos receptores que podem ser de

interesse como alvos para novas drogas (Escoubas et. al. 2000).

Vários estudos de caracterização dos venenos de outras aranhas já foram descritos, mas

pouco se sabe a respeito das toxinas que compõem o veneno das aranhas do gênero Lasiodora.

Recentemente foram descritas ações farmacológicas do veneno dessa aranha, tais como bloqueio

do canal de Ca2+ do Tipo-L e alteração da cinética e voltagem de canais de Na+ (Kushmerick et.

al. 2001).

A interação entre as toxinas peptídicas de caranguejeiras e seus respectivos receptores

ainda não é muito bem compreendida em nível molecular. Faltam estudos que definam o papel

de determinados resíduos de aminoácidos na afinidade ou seletividade da toxina para

determinados subtipos de canal. Seletividade esta que não é sempre absoluta. Uma toxina que

(24)

classes de canais permeáveis a outros íons. Essa não distinção por certas toxinas reforça o

conceito de um sítio de ligação conservado no sensor de voltagem dos canais de cálcio, sódio e

potássio (Escoubas & Rash 2004).

1.3.2.1 - Toxinas de aranha e canais de Ca2+

A importância dos níveis de Ca2+ em vários processos celulares já foi apontada por vários

autores. Os canais de Ca2+ dependentes de voltagem permitem a entrada do Ca2+ na célula, em

resposta à despolarização da membrana, de forma que esses íons possam exercer suas funções

sobre processos fisiológicos tais como a secreção de hormônios e neurotransmissores, regulação

da atividade de canais iônicos, controle da secreção de enzimas, expressão gênica, proliferação e

morte celular e apoptose (Beleboni et. al. 2004). Uma variedade de canais iônicos dependentes

de voltagem estão envolvidos na homeostase de cálcio. Esses canais são membros de uma

superfamília de proteínas transmembrana que incluem também canais de K+ e Na+ dependentes

de voltagem (Ertel et. al. 2000).

Os canais de Ca2+ que dependem de altos níveis de despolarização para serem ativados e

não apresentam inativação estão envolvidos essencialmente na liberação de neurotransmissores e

são divididos em canais do tipo-L, tipo-N, tipo-P, tipo-Q e tipo-R. Os canais de Ca2+ do tipo-L

são encontrados nos músculos liso, esquelético e cardíaco e células endócrinas, onde são

responsáveis pelo início da secreção. Esse tipo de canal é o alvo de drogas usadas no tratamento

de patologias cardiovasculares e são bloqueados por antagonistas orgânicos de canais de Ca2+ do

tipo-L, como dihidropiridinas, fenilalquilaminas e benzotiazepinas (Ertel et. al. 2000). Canais de

Ca2+ do Tipo-N, Tipo-P e Tipo-Q são encontrados em dendritos e terminais nervosos; e canais do

Tipo-R são encontrados em neurônios. Estes não podem ser bloqueados por antagonistas de

canais de Ca2+ do tipo-L, mas o são por toxinas polipeptídicas de Conus e aranhas (Ertel et. al.

2000).

Os canais de Ca2+ tipo-T são ativados por pequenas despolarizações, apresentam inativação

rápida e são encontrados em uma grande variedade de células, onde são responsáveis pelos

disparos repetitivos (Bean 1898, Caterral 2000, Ertel et. al.2000).

Todos os canais de Ca2+ ativados por voltagem são heterômeros formados por uma

subunidade α1 tetramérica, que é a subunidade formadora do poro, e por várias subunidades

reguladoras (α2, β, γ e a δ que é encontrada apenas no músculo esquelético) que são responsáveis

(25)

a responsável pelo transporte do íon e pela sensibilidade do canal à voltagem. É nesta subunidade

que se ligam drogas e toxinas (Beleboni 2004, Escoubas 2000). A grande diversidade de

correntes de cálcio é resultado principalmente da quantidade de genes que codificam para

isoformas distintas da subunidade α1 (Catterall 2000).

Figura 2 – Modelo de canais de Ca2+ dependentes de voltagem. Este modelo é uma modificação do modelo original de canais de Ca2+ dependentes de voltagem de músculo esquelético. As α-hélices estão representadas como cilindros.

FONTE: Catterall et. al. 2005.

Algumas toxinas de aranha permitiram a caracterização e classificação de diferentes

correntes de Ca2+ em células do sistema nervoso, bem como a descoberta, por Newcomb e

colaboradores (1998), dos canais de Ca2+ do Tipo-R, que eram insensíveis a todas as toxinas

conhecidas até então. Várias toxinas polipeptídicas provenientes de venenos de aranha

apresentam ação inibidora nas funções dos canais de Ca2+ dependentes de voltagem. Essas

toxinas foram inicialmente denominadas de forma genérica como ω-toxinas (Grishin 1999).

As ω-Agatoxinas e acilpoliaminas FTX foram as primeiras moléculas isoladas da aranha

(26)

Ca2+ nos canais dos tipos L, N e P, respectivamente. A ω-Agatoxina do tipo III é menos seletiva

e bloqueia tanto canais de Ca2+ do tipo-N quanto do tipo-L, com a mesma potência (Escoubas

2000).

Outro exemplo da especificidade em canais de Ca2+ se refere a acilpoliamina CNS2103 da

aranha Dolomedes akefinokesis, que bloqueia reversivelmente canais de Ca2+ do tipo-L e tipo-R,

sem afetar canais do Ca2+ do tipo-T ou qualquer canal de Na+ ou K+ (Kobayashi et. al. 1992,

Stromgaard et. al. 2001). A toxina peptídica SNX-325, da aranha asiática Segestria florentina se

mostrou seletiva no bloqueio de canais de Ca2+ do tipo-N, na concentração de 10nM (Newcomb

et. al. 1995).

A ação mais evidente do veneno total das aranhas do gênero Phoneutria é em canais de

Na+. Entretanto, o fracionamento do veneno permitiu observar a ação de toxinas isoladas em

outros canais iônicos. De fato, o segundo alvo principal do veneno total da aranha Phoneutria

nigriventer são os canais de Ca2+ dos vários tipos. O bloqueio desses canais é responsável pela paralisia flácida causada por esse veneno (Cassola et. al. 1998, Leão et. al. 2000, Revisão por

Gomez et. al. 2002). Seis diferentes toxinas, Tx3-1 a Tx3-6, foram isoladas da fração PhTx3 do

veneno de P. nigriventer. Dentre essas toxinas, três apresentaram atividade de bloqueio do

influxo de Ca2+ em terminais nervosos. São elas a Tx3-3, Tx3-4 e Tx3-6, que foram classificadas

como ω-toxinas devido ao seu efeito em canais de Ca2+ (Gómez et. al. 2002).

Kushmerick e colaboradores (2001) testaram o efeito do veneno total de Lasiodora em

células GH3 na presença de tetrodotoxina (TTX), que bloqueia canais de Na+ sensíveis a TTX,

para observar o efeito desde veneno em canais de Ca2+. O veneno bloqueou as oscilações dos

níveis intracelulares de Ca2+. Quando testado na ausência de TTX, o veneno causou lento

aumento do Ca2+ intracelular. Esse efeito sugere que o veneno bloqueie os canais de Ca2+ do

Tipo-L. Neste mesmo trabalho foi testado o efeito do veneno na presença de nifedipina ou Cd2+,

ambos bloqueadores de canais de Ca2+ do Tipo-L. Como não houve aumento de Ca2+

intracelular, foi sugerido que esse aumento depende da disponibilidade de canais de Na+ e canais

de Ca2+ do Tipo-L. Kushmerick e colaboradores (2001) sugeriram, então, que o veneno causa

aumento de Ca2+ intracelular através da abertura de canais de Na+. Essa abertura causa uma

despolarização da membrana e a entrada de Ca2+ através dos canais de Ca2+

voltagem-dependentes.

Uma toxina isolada do veneno da caranguejeira Grammostola spatula, a ω-grammotoxina,

bloqueia os canais de Ca2+ dos tipos N, P e Q, mas não tem efeito nos canais do Tipo-L (Sutton

(27)

1.3.2.2 - Toxinas de aranha e canais de Na+

Canais de Na+ dependentes de voltagem estão presentes nas membranas da maioria das

células excitáveis, onde são responsáveis pela geração e propagação do potencial de ação

(Beleboni et. al. 2004). Os canais de Na+ são proteínas transmembrana compostas de uma subunidade α de aproximadamente 260 KDa e de pelo menos 3 subunidades β auxiliares. As

subunidades β são responsáveis pela cinética de abertura e dependência de voltagem do canal. A

subunidade α é composta de quatro domínios homólogos, nomeados de I a IV, cada um deles

composto de seis regiões transmembrana nomeadas de S1 a S6 (Figura 3). Todos os agentes

farmacológicos que agem em canais de sódio possuem sítios receptores na subunidade α (Cestèle

& Catterall 2000). A região S6 é a responsável pela ativação do canal, funcionando como um

sensor de voltagem. Entre os domínios III e IV existe uma região com a função de inativação do

(28)

Figura 3 – Organização transmembrana das subunidades dos canais de Na+. Os cilindros representam as α-hélices preditas e as linhas representam as cadeias polipeptídicas de cada subunidade. Os sítios prováveis de N-glicosilações

estão marcados com Ψ. O P está mostrando os sítios onde ocorrem fosforilações por proteína cinase A (círculos) e proteína cinase C (losango). O motivo isoleucina-fenilalanina-metionina-treonina (IFMT), que é crucial para a inativação,

está representado por um h em um círculo sombreado. Sítios de ligação para toxinas α e β de escorpião estão indicados. FONTE: Catterall et. al. 2005.

Uma variedade de isoformas de canais de Na+ dependentes de voltagem foi caracterizada

com a ajuda de técnicas de eletrofisiologia e bioquímica (Goldin 2001). Para auxiliar na

identificação dos canais de sódio dependentes de voltagem já caracterizados, uma nomeclatura

foi desenvolvida. Esta nomeclatura utiliza um sistema numérico para definir as subfamílias e

subtipos com base em similaridades nas seqüências de aminoácidos dos canais. Neste sistema o

nome individual do canal é o símbolo químico do principal íon a que ele é permeável (Na); o

(29)

no subscrito (NaV1) se refere à subfamília do gene que codifica para o canal. Atualmente existe

somente uma subfamília para os canais de sódio. O número após o ponto representa a isoforma

específica do canal, por exemplo, NaV1.1. Com base em sua seqüência de aminoácidos e

sensibilidade à tetrodotoxina, os canais de sódio podem ser classificados em dois grupos:

isoformas do grupo Nav1, que são 9 homólogos sensíveis à tetrodotoxina e denominados de

NaV1.1 a NaV1.9, e o grupo NaX, que é insensível à tetrodotoxina e difere estruturalmente do

primeiro grupo em regiões críticas do canal, como na região S4, a região responsável pela

inativação, e na região formadora do poro (Goldin et. al. 2000). Os canais do grupo NaV1

encontram-se principalmente nos neurônios, coração, gânglios nervosos e músculo esquelético.

Os canais do tipo NaX são provavelmente responsáveis pelo transporte e absorção de Na+,

dependem da concentração de Na+ no meio (Watanabe et. al. 2000), e são encontrados

principalmente no coração e neurônios sensoriais (Escoubas et. al. 2000).

Catterall e Beneski (1980) observaram que os sítios de ligação das neurotoxinas em canais

de Na+ apresentavam comportamento alostérico, podendo haver uma alteração conformacional

no canal e no balanço entre os estados fechado / inativo, o que também acarretaria mudanças na

afinidade da ligação de toxinas com outros sítios onde elas também podem se ligar.

Já foram descobertas diversas toxinas que bloqueiam ou alteram as funções dos canais de

Na+ dependentes de voltagem. Algumas delas já estão sendo utilizadas como ferramenta para o

estudo destes canais (Strichartz et. al. 1987, Catterall 1995). As principais moléculas ativas em

canais de Na+ são isoladas dos venenos de Agelenopsis aperta, Phoneutria nigriventer, Atrax robustus e Hadroniche versuta. O veneno de A. aperta foi o primeiro veneno no qual foram encontradas toxinas ativas em canais de Na+. Um grupo de toxinas peptídicas com ação em

canais de Na+ foi isolado do veneno desta aranha, as quais foram denominadas μ-agatoxinas (μ

-Aga I a μ-Aga VI) (Skinner et. al.1989). As μ-agatoxinas possuem ação semelhante às toxinas de

escorpião com ação em insetos, induzindo a uma mudança na cinética de ativação do canal de

Na+ de insetos para potenciais mais negativos (Grishin 1999, Beleboni et. al. 2004, revisão). A

hainatoxina-IV (HnTx-IV) isolada do veneno da aranha Seleconosmia hainana não exerceu

nenhum efeito na cinética das correntes de sódio. Entretanto esta toxina bloqueou as correntes de

sódio sensíveis à TTX em neurônios de mamíferos, sugerindo que a mesma age de forma

diferente da μ-Agatoxina (Xiao & Liang 2003). Outras duas toxinas (HwTxIV e HnTxV) foram

isoladas do veneno da aranha Selescomia huwena e S. hainana. Essas duas últimas toxinas se

mostraram seletivas para os canais de Na+ neuronais sensíveis à TTX, porém apresentaram um

modo de ação diferenciado, bloqueando o poro sem alterar a cinética das correntes de sódio. Foi

(30)

entrada do poro, e desta forma bloqueiam a passagem do íon. Se confirmado esse modo de ação,

poder-se-á concluir que estas toxinas atuam de forma distinta de todas as outras toxinas de

aranha com atividade em canais Nav descritas até o momento (Peng et. al. 2002, Liu et. al. 2003,

Xiao & Liang 2003). Essas três toxinas são, também, as primeiras com motivo ICK isoladas do

veneno de caranguejeira que não modificam a cinética do canal, mostrando uma diversidade

adicional desses venenos (Escoubas & Rash 2004).

A fração PhTx2 do veneno da aranha Phoneutria nigriventer diminuiu a inativação dos

canais de Na+ e facilitou a sua ativação (Araújo et. al. 1993). A PhTx2 também aumentou a

entrada de Na+ em sinaptosomas, aumentou o influxo de Ca2+ e a liberação de glutamato

(Romano-Silva et. al. 1993).

Quatro peptídeos inseticidas foram isolados por Corzo e colaboradores (2000) do veneno

de Paracoelotes luctuosus e foram denominados δ-palutoxinas IT1 – IT4. A δ-palutoxina IT1 é a

mais seletiva e potente dentre as δ-palutoxinas e age interferindo na inativação dos canais de

Na+.

O veneno total de Lasiodora não afetou a ativação dos canais Na+, mas retardou a cinética

de despolarização e causou o surgimento de uma corrente que permanecia mesmo após o

processo de despolarização. Ao contrário das tetrodotoxinas, isoladas do peixe Baiacu (Tetrodon

sp), as toxinas de aracnídeos não interferem com a abertura dos canais, mas retardam a inativação ou alteram a voltagem de ativação, inativação ou ambos. O principal efeito do veneno

de Lasiodora foi retardar e tornar incompleta a inativação dos canais de Na+. O veneno tornou

mais negativa a voltagem necessária para a ativação. Dessa forma, essas toxinas abrem os canais

de Na+ em condições que eles estariam normalmente fechados ou inativos (Escoubas et. al.

2000). Em coração de rato, o veneno da Lasiodora causou um aumento na liberação de

acetilcolina na extremidade dos nervos parassimpáticos por ativar canais de Na+ insensíveis a

TTX. O veneno, em uma dose de 100μg, causou bradicardia, distúrbios rítmicos e parada

cardíaca transitória. Kalapothakis e colaboradores (2003) sugeriram então que o veneno de

Lasiodora provavelmente age sobre canais de Na+ insensíveis à TTX já que 200 nM desta substância não foi suficiente para suprimir os efeitos do veneno.

Os canais de Na+ dependentes de prótons são a forma mais simples de canal dependente de

ligante. Eles estão presentes nos neurônios e possuem um papel importante na transdução de

sinal e em patologias como isquemia cerebral ou epilepsia. A toxina peptídica PcTx1, isolada do

veneno bruto da caranguejeira Psalmopoeus cambridgei, exerce um bloqueio seletivo em

(31)

1.3.2.3 - Toxinas de aranha e canais de K+

Os canais de K+ são os canais iônicos mais abundantes e ubíquos, e possuem papéis

importantes em neurônios e células musculares. O potássio atua em processos de sinalização,

participa na geração do potencial de membrana, na excitabilidade dos neurônios e na secreção de

neurotransmissores (Beleboni et. al. 2004, Escoubas et. al. 2000).

Até o momento três classes principais de canais de K+ foram identificadas: uma delas inclui

os canais de K+ retificadores do potencial de repouso através de correntes que saem da célula

para o meio externo (outward-rectifier) e, portanto dependentes de voltagem (Kv) e os canais de

K+ ativados por Ca2+ (KCa). Os canais de K+ dependentes de voltagem regulam o potencial de

repouso da membrana, a duração e freqüência do potencial de ação e a secreção de

neurotransmissores. Estes canais são constituídos de tetrâmeros, cada um formado de seis

segmentos transmembrana (Figura 4). A outra classe de canais de K+ é composta pelos

retificadores do potencial de repouso através de correntes que entram na célula (inward-rectifier)

ou Kir. A função destes canais é a estabilização do potencial de repouso da membrana próximo

ao potencial de equilíbrio do K+ (Nichols & Lopatin 1997, Terlau & Stuhmer 1998). Estes canais

são constituídos de tetrâmeros compostos por subunidades que possuem apenas dois segmentos

(32)

Figura 4 – Estrutura dos canais de potássio. A - Estrutura aberta e fechada dos poros dos canais de potássio. A região responsável pela seletividade está em laranja, a hélice externa (M1) se encontra adjacente à

bicamada lipídica. A hélice interna (M2) tem o seu resíduo de glicina conservado marcado em vermelho. Este

resíduo é importante para permitir o dobramento da hélice M2 na conformação aberta do poro. B - Estrutura tridimensional de um canal Kv1.2 tetramérico. No centro está a região do poro S5-P-S6 das subunidades 1 e 3.

À esquerda, S1 a S4 da subunidade 4 formando o lado proximal do poro e que se projetam para frente do

plano da figura. Na direita, S1 a S4 da subunidade 2 formam o lado distal do poro e se projetam para trás do

plano da figura. O domínio sensor de voltagem composto pelos segmentos S1 a S4 está posicionado de forma

(33)

Uma série de toxinas animais já foi utilizada para elucidar os subtipos, funções e estrutura

dos canais de K+. Dois subtipos de canais outward-rectifier (Kv2 e Kv4) foram caracterizados

graças ao uso de toxinas de aranha (Dolly & Parcej 1996, Kukuljan et. al. 1995). Ao contrário

das toxinas de escorpião, que agem bloqueando o poro do canal, as toxinas de aranha se ligam a

sítios localizados fora do poro do canal para afetar suas propriedades.

Uma acilpoliamina, isolada da aranha Argiope sp., denominada Argiotoxina636 (Arg636),

é um inibidor de canais de K+ dependentes de ligantes e inibe também canais dependentes de

voltagem (Lee et. al. 1999). Hanatoxinas (HaTx 1 e HaTx2) isoladas do veneno da aranha

Grammostola spatulata bloqueiam canais de K+ Kv2.1 alterando a dependência de voltagem do canal (Swartz & MacKinnon 1997). Essa foi a primeira toxina isolada de venenos de aranha que

é ativa em canais de K+ Kv2.1 dependentes de voltagem (Escoubas et. al. 2000). Uma toxina

peptídica denominada stromatoxina (ScTx1) foi isolada por Escoubas e colaboradores (2002) do

veneno da caranguejeira africana Stromatopelma calceata, e foi caracterizada como um potente

inibidor dos canais de K+ dos subtipos Kv4.2 e Kv2.2. Dois inibidores dos canais de K+ foram

isolados do veneno da caranguejeira Heteroscodra maculata. A heteroscodratoxina 1 inibe o

subtipo Kv4 e foi o primeiro peptídeo com ação nos canais Kv4.1. A heteroscodratoxina 2 é

específica para os canais do subtipo Kv2 (Escoubas et. al. 2002).

1.3.2.4 - Toxinas de aranha e receptores de glutamato

O L-glutamato é considerado o neurotransmissor mais importante em sistemas nervoso

central de mamíferos e em sistemas periféricos de insetos (Beleboni et. al. 2004). O glutamato

está envolvido em várias funções importantes do cérebro de mamíferos, como cognição,

memória e aprendizado (Fonnum 1984, Collingridge & Lester 1989).

Os receptores de glutamato estão agrupados em duas classes de acordo com o seu

mecanismo de transdução de sinal, sendo elas: receptores metabotrópicos (mGluRs) e receptores

ionotrópicos (iGluRs) (Ozawa et. al. 1998, Coutinho & Knopfel 2002). Os receptores de

glutamato metabotrópicos utilizam a proteína G para mediar suas funções e são divididos em oito

classes funcionalmente distintas: mGluRs1 a mGluRs8 (Pin & Duvoisin 1995, Conn & Pin

1997). Os receptores de glutamato ionotrópicos utilizam íon para exercer suas funções e são

subdivididos em N-metil-D-aspartato (NMDA), α-amino-3-hidroxi-5-metil-D-aspartato (AMPA

ou receptor quisqualato) e o receptor de kainato. Cada uma dessas proteínas é um canal iônico

(34)

kainato tem sido um desafio à parte devido à dificuldade de estudar suas subunidades e à falta de

drogas que o distingam do receptor AMPA (Bear et. al. 1996). Até o momento não foram

relatadas ações de toxinas em receptores metabotrópicos.

A liberação do glutamato envolve a síntese, empacotamento em vesículas sinápticas,

secreção por exocitose e reabsorção do glutamato. Não há evidência de enzimas que degradem

ou inativem o glutamato na fenda sináptica, logo, a única forma de findar a sua ação é através da

reabsorção. O contato prolongado do glutamato com os neurônios resulta em ativação excessiva

dos receptores de glutamato, que estão envolvidos em várias doenças neuro-degenerativas

crônicas, como Alzheimer, Parkinson, isquemia e epilepsia (Reis et. al. 1999). O

desenvolvimento de antagonistas de subtipos específicos de receptores de glutamato pode ser de

grande importância no desenvolvimento de terapia para essas doenças (Beleboni et. al. 2004).

Os venenos das aranhas Argiope trifasciata e Araneus gemma foram caracterizados por

Usherwood e colaboradores, que encontraram substâncias que agem como antagonistas do

receptor de glutamato em junção neuromuscular de gafanhotos. Os resultados encontrados

demonstram que as toxinas só agem quando o receptor do canal de glutamato está ativado por

um agonista (Usherwood et. al. 1984).

Adams e colaboradores (1987) encontraram no veneno da aranha Argiope aurantia uma

mistura de componentes de baixo peso molecular, denominadas argiotoxinas, que bloqueiam a

transmissão neuromuscular causando paralisia reversível em insetos (Adams et. al. 1987). Os

componentes foram identificados como um resíduo de arginina e uma asparagina ligadas a uma

acilpoliamina. Jackson e Parks (1989) demonstraram que acilpoliaminas com aminoácidos em

sua estrutura possuem modo de ação similar em junções neuromusculares de invertebrados,

causando uma inibição não-competitiva dos receptores sensíveis a AMPA. A acilpoliamina

argiotoxina-636 é capaz de bloquear receptores NMDA (Draguhn et. al. 1991). Essa mesma

toxina também bloqueia a abertura dos canais AMPA (Herlitze et. al. 1993).

A toxina peptídica PnTx4(5-5) isolada do veneno da aranha Phoneutria nigriventer inibe

reversivelmente as correntes geradas pelo receptor NMDA em neurônios do hipocampo de

cérebro de ratos. Esta toxina é também tóxica para insetos (De Figueredo et. al. 2001).

Reis et. al. (1999), em um trabalho com a toxina Tx3-4, isolada do veneno da aranha Phoneutria nigriventer, demonstraram que esta toxina progressivamente inibe a liberação de glutamato estimulada por KCl. Os autores também concluíram que esta toxina inibe a liberação

de glutamato independente de Ca2+ e exerce inibição não competitiva na reabsorção de

(35)

1.3.3 – Toxinas inseticidas

Após a Segunda Guerra Mundial os principais programas de erradicação de pragas

agrícolas contavam com a utilização de inseticidas químicos. O DDT em especial foi utilizado

tanto em lavouras como em programas bem sucedidos de erradicação da malária (Attaran et. al.

2000). Entretanto, o fato de a maioria destes inseticidas químicos agirem em apenas um, de um

total de quatro alvos do sistema nervoso de insetos – canais de sódio dependentes de voltagem,

receptor nicotínico de acetilcolina, canal dependente de GABA e acetilcolinesterase – facilitou,

por parte das pragas alvo, o desenvolvimento de tolerância sítio específica. Como conseqüência

houve o surgimento de resistência cruzada a vários tipos de inseticidas (Brogdon & MacAllister

1998). Este fato levou os agricultores e outros usuários de inseticidas a aumentar a dosagem

utilizada, agravando os problemas de resistência e agravando os riscos de contaminação

ambiental e de saúde pública. Como resultado, o DDT e outros organoclorados, foram banidos

do uso agrícola nos anos setenta. O desenvolvimento de resistência aos inseticidas pelas pragas

agrícolas, somado à proibição do uso de algumas famílias de inseticidas químicos, aumentou a

necessidade da identificação de novas substâncias eficientes e seguras tanto no combate às

pragas agrícolas como a vetores de doenças (Tedford et. al. 2004).

Os venenos de aranha são misturas complexas especializadas em matar ou paralisar suas

presas. Como a grande maioria das aranhas não apresenta risco ao homem, é grande a

possibilidade da descoberta de componentes nesses venenos com ação específica em insetos

(Tedford et. al. 2004). Dentre os componentes, com possível ação sobre insetos, estão as poliaminas, que são inibidoras pós-sinápticas capazes de bloquear reversivelmente canais de

cálcio, canais sensíveis ao glutamato e canais de músculos locomotores, levando a paralisia

(Atkinson et. al. 1992). Já os polipeptídios constituintes desses venenos agem

pré-sinapticamente, quase sempre de maneira irreversível, induzindo ou inibindo a liberação de

neurotransmissores (Atkinson et. al. 1992).

Uma toxina com atividade inseticida foi isolada do veneno da aranha Segestria florentina e

foi denominada SIT. Esta toxina causou paralisia irreversível em baratas (Periplaneta

americana) (Lipkin et. al. 2002). Figueredo e colaboradores (1995) isolaram uma toxina neurotóxica da fração PhTx4 do veneno da aranha Phoneutria nigriventer, a qual denominaram

Tx4(6-1). Esta toxina é um polipeptídeo de cadeia simples com 48 resíduos de aminoácidos e

apresentou atividade específica para mosca (Musca domestica) e baratas (P. americana).

Toxinas inseticidas ativas em canais de Ca2+ também foram isoladas dos venenos das

(36)

(Branton et. al. 1987). Posteriormente, em um trabalho com uma nova toxina chamada PnTx4-3,

isolada da fração PhTx4 do veneno de Phoneutria nigriventer, Oliveira et al (2003) observaram

que esta toxina exercia efeito excitatório imediato quando injetada em tórax de mosca doméstica

(Musca domestica) e barata (Periplaneta americana). A toxina também inibiu de maneira

dose-dependente a reabsorção de glutamato em preparação sinaptosomal de rato.

A principal vantagem no uso de inseticidas biológicos é a capacidade de algumas toxinas

animais serem seletivas entre canais iônicos de insetos ou mamíferos e mesmo entre diferentes

classes de canais iônicos (Karbat et. al. 2004), o que resulta em uma especificidade para a praga

alvo, não atuando em outros insetos polinizadores, bem como em plantas e outros animais

(Bergmann et. al. 2001). Vários peptídeos neurotóxicos com atividade exclusiva em insetos têm

sido estudados a fim de tornar mais claro o modo de ação dessas substâncias, o que possibilitaria

uma melhor avaliação do uso potencial dessas toxinas para o controle de pragas.

1.3.4 - Atividade bactericida de venenos de aranhas

A busca por peptídeos com atividade bactericida em veneno de aranhas tem sido

impulsionada pelo surgimento de bactérias resistentes a antibióticos. O mecanismo de ação

desses peptídeos, mais bem conhecido, é através de sua inserção na membrana celular causando

destruição ou permeabilização da mesma, levando o microrganismo à morte. Alternativamente,

os peptídeos antimicrobianos podem se ligar a um receptor de membrana levando a uma perda

específica de sua função. Além disso, ao se translocarem através da membrana, essas moléculas

com propriedade antibiótica podem atuar intracelularmente, impedindo a síntese de metabólitos

importantes para o microrganismo (Lohner, 2001).

Em 1989, Xu & Qu encontraram um peptídeo antibiótico no veneno da aranha Lycosa

singoriensis. Recentemente, Yan & Adams (1998) descreveram a existência de peptídeos com ação inseticida e bactericida no veneno da aranha Lycosa carolinensis, denominados licotoxinas.

Kuhn-Nentwig et. al. (1998) publicaram a estrutura de um peptídeo com ação inseticida e bactericida, denominado CSTX-4, do veneno da aranha errante Cupiennius salei. Dois anos

depois, Haeberli et. al.. (2000) caracterizaram com maiores detalhes a atividade microbiana dos

peptídeos do veneno desta mesma aranha. Budnik et. al. (2004) encontraram no veneno da

aranha Lycosa singoriensis 3 peptídeos com atividade antimicrobiana aos quais denominaram lycocitina 1, 2 e 3. As lycocitinas 1 e 2 apresentaram estruturas que ainda não haviam sido

Imagem

Figura 1. Esquema representando o motivo estrutural
Figura 2 – Modelo de canais de Ca 2+  dependentes de voltagem. Este modelo é uma modificação do modelo original de  canais de Ca 2+  dependentes de voltagem de músculo esquelético
Figura 3 – Organização transmembrana das subunidades dos canais de Na + . Os cilindros representam as α-hélices  preditas e as linhas representam as cadeias polipeptídicas de cada subunidade
Figura 4 – Estrutura dos canais de potássio. A - Estrutura aberta e fechada dos poros dos canais de potássio
+7

Referências

Documentos relacionados

Durante o desenvolvimento do projeto consegue-se inferir que as crianças se tornam cidadãos responsáveis pela saúde própria e coletiva, realizando ações permanentes

(viii) Seguradoras: como forma de mitigar os riscos relacionados com a realização dos investimentos privados, a concessionária deverá contratar os seguros chamados bid

Dado que no teor de sólidos solúveis a interacção entre o ano e a data de sementeira não se revelou significativa, na Figura 4 representam-se apenas a média e o desvio

A farmácia comunitária é uma unidade de saúde onde são prestados serviços de intervenção farmacêutica com elevada diferenciação técnico-científica e de

The Anti-de Sitter/Conformal field theory (AdS/CFT) correspondence is a relation between a conformal field theory (CFT) in a d dimensional flat spacetime and a gravity theory in d +

Os principais objectivos definidos foram a observação e realização dos procedimentos nas diferentes vertentes de atividade do cirurgião, aplicação correta da terminologia cirúrgica,

Na entrevista a seguir, Capovilla revisita a própria trajetória intelectual, debate a sua passagem pelo Centro Popular de Cultura de São Paulo e as críticas que escreveu para

Atualmente, a política indigenista se configura pela centralização de ações específicas na Funai e na Funasa/Sesai e pela orientação de inclusão do público indígena