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Rap e identidade social: um estudo de caso

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Academic year: 2017

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UNIVERSIDADE CATÓLICA DE BRASÍLIA PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU EM PSICOLOGIA

RAP E IDENTIDADE SOCIAL: UM ESTUDO DE CASO

PATRÍCIA OLIVEIRA BARBOSA

ORIENTADOR: Prof. Dr. AFONSO CELSO TANUS GALVÃO

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PATRÍCIA OLIVEIRA BARBOSA

RAP E IDENTIDADE SOCIAL: UM ESTUDO DE CASO

Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Psicologia da Universidade Católica de Brasília, como requisito parcial à obtenção do título de Mestre em Psicologia.

Orientador: Dr. Afonso Celso Tanus Galvão

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TERMO DE APROVAÇÃO

Dissertação de autoria de Patrícia Oliveira Barbosa, intitulada “Rap e identidade social: um estudo de caso”, requisito parcial à obtenção do título de mestre do Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Psicologia da Universidade Católica de Brasília. Examinada e aprovada pela banca:

___________________________________________________ PROFESSOR DOUTOR AFONSO CELSO TANUS GALVÃO

ORIENTADOR

_________________________________________ PROFESSORA DOUTORA DEISE MATOS DO AMPARO

MEMBRO INTERNO

_________________________________________ PROFESSORA DOUTORA LIANA FORTUNATO COSTA

MEMBRO EXTERNO

____________________________________________________________ PROFESSORA DOUTORA KÁTIA CRISTINA TAROUQUELLA RODRIGUES BRASIL

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GRATIDÃO

Depois de tanto tempo eu continuo em pé Depois de tanto tempo me voltou a fé Que eu tinha perdido em mim Eu sei que é difícil Nem tão simples assim Eu não conseguia respirar Parecia meu fim eu ia me afogar Sozinho eu não ia conseguir Você mostrou o caminho por onde dava pra ir Me ajudou a levantar depois que eu caí Me ajudou a levantar depois que eu caí Tem dias que parecem conspiração Portas se fecham Todos dizem não E nada faz passar a dor De se sentir só Só mais um perdedor Sozinho eu não ia conseguir Você mostrou o caminho por onde dava pra ir Me ajudou a levantar depois que eu cai Me ajudou a levantar depois que eu cai Às vezes acho que é perseguição Não ter nada, vivendo em solidão Por isso fiz essa canção Parece bobagem, mas é gratidão... Sozinho eu não ia conseguir Você mostrou o caminho por onde dava pra ir Me ajudou a levantar depois que eu caí Me ajudou a levantar depois que eu caí

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À Francisco Valdenor Barbosa,

meu papai e grande amigo, in memorian.

À Zelinha de Deus, minha mamãe querida.

À Palloma, meu presente de Deus,

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AGRADECIMENTOS

À Deus, por sua misericórdia e amor infinitos.

Ao Professor Doutor Afonso Celso Tanus Galvão, pela compreensão e maestria em conduzir-me no campo do conhecimento científico e pela sabedoria com a qual me acompanhou nessa nova etapa de minha vida, especialmente na gestação e nos procedimentos do parto deste trabalho.

À Professora Doutora Liana Fortunato Costa, pela escuta e preciosa contribuição em orientação no início e ao longo da realização desta pesquisa.

À Professora Doutora Deise Matos do Amparo, por sua atenção freqüente no desenvolvimento deste trabalho e pela participação na banca de defesa desta dissertação.

À Professora Doutora Kátia Cristina Tarouquella Rodrigues Brasil, pela gentileza em aceitar o convite para participar da banca de defesa desta dissertação.

Aos Rappers, pela confiança e colaboração em compartilhar suas experiências de vida e me ensinar um pouco mais sobre a realidade da periferia.

À Francisco Valdenor Barbosa, meu querido Papai, que me ensinou a lutar pela vida e me fez acreditar que poderia chegar até aqui.

À Zélia Oliveira Barbosa, minha querida Mamãe, pelo incentivo e dedicação em oração nos momentos mais difíceis desse percurso.

À Palloma Barbosa, minha filhota, por várias vezes vir dormir ao lado do computador pra não deixar a mamãe sozinha digitando.

À Márcio, Marcello e Maurício Barbosa, meus irmãos queridos, pela torcida incondicional.

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Aos meus Amigos queridos Heloisa e Reinaldo Vieira (Trinity e o Escolhido) e Maria Aparecida Martins de Abreu (Oráculo), pela resignação, pelas horas de estudo no QG, pelo companheirismo, pelas incansáveis conversas acerca da pesquisa e pela presença lado a lado.

Às queridas Ana Cristina Dantas de Melo e Danielle Bayer, pelo incentivo constante, o carinho e o privilégio de tê-las como amigas.

À Betânia Alencar, minha querida amiga e ajudadora, que se doou para cuidar de minha filha e de meus interesses, enquanto estive ocupada com os afazeres do mestrado.

À Sandra Maria Gadelha, minha coordenadora e amiga, pelo carinho, compreensão e apoio integral nos momentos de maior necessidade.

Às minhas amigas Francimá Camilo, Isabel Xavier, Aline de Cássia Teixeira Santos e demais colegas de trabalho, por torcerem e acreditarem em meu potencial.

Ao querido amigo, aluno, agente social e interlocutor comunitário, Fernando – ELOM, por toda dedicação, boa vontade, Carinho e desprendimento em me inserir em sua comunidade e pela confiança e o interesse depositado nesse trabalho.

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RESUMO

O presente trabalho visa a investigar a expressão da identidade social do jovem da periferia de Brasília, por meio do Rap. O Rap – Ritmo & Poesia - é uma modalidade musical que faz parte do movimento Hip-Hop. Consiste numa tendência cultural que divulga uma visão social de mundo nas periferias das grandes cidades brasileiras. É composto por quatro elementos: o Break Dance, o Graffiti, o MC e o Rap. Trata-se de um estudo de caso de um jovem Rapper, morador da cidade de

Ceilândia - Distrito Federal. O principal instrumento utilizado na coleta de dados foi a entrevista semi-estruturada individual e uma sutil observação participante. Baseado na análise do discurso do Rapper e de uma das letras de sua autoria, buscou-se o entendimento do sistema de valores que sustenta tal processo de construção singular e social, com o objetivo de identificar a visão de mundo dessas comunidades jovens, por intermédio de suas retratações musicais. Para tanto, esta pesquisa teve como referencial teórico a teoria da identidade social, apoiada na psicologia social e influenciada pela teoria das representações sociais. Resultados sugerem que a música Rap, além de ser um instrumento de denúncia do jovem da periferia, também propõe mecanismos de proteção para criar alternativas de convivência possíveis, em meio à violência e à criminalidade, presentes na periferia.

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ABSTRACT

This work aims at investigating the expression of social identity of Brasília suburban youths by means of Rap music. Rap – rhythm and poetry – is a musical style which is part of the Hip-Hop movement. It is a cultural tendency that brings about a social view of the world in the suburban areas of Brazilian big cities. It is made up of four elements: Break Dance, Graffiti, MC and Rap. This piece of research constitutes a case study that focus on a young Rapper who lives at the city of Ceilândia – DF. The research participant was interviewed at length and subtly observed. Based on the analysis of the Rapper discourse and of the text of one of his songs, it was explored the system of values that supports the building up of an unique social process and identify how they see the world through their musical pictures. The theoretical background that oriented this investigation included social identity theory, which was supported by social representations theory. Results suggest that Rap music, besides being a vehicle for putting forward suburban youngsters’ claims, is also a protecting veil which can create ways for achieving a more qualified social life, even considering the violence and criminality that surround them.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 12

CAPÍTULO 1 – REVISÃO DE LITERATURA 17

1.1) Cultura e Identidade Social: Um Breve Histórico 17

1.1.1) A Cultura Jovem a partir dos anos 50 22 1.2) Identidade Social e Música: Aspectos Conceituais 27

1.3) Música: Arte e Expressão das Minorias 33

1.3.1) A música como Linguagem 35

1.3.2) O Rap: Ritmo e Poesia 40

1.3.3) O Rap em Brasília 43

1.3.4) A juventude e o Jovem de Periferia 46

1.3.5) Conceituando a exclusão social 50

CAPÍTULO 2 – NATUREZA DA PESQUISA E MÉTODO 54

2.1) O Problema 54

2.2) Justificativa 55

2.3) Objetivos 56

2.3.1) Objetivo Geral 56

2.3.2) Objetivos Específicos 56

2.4) Questões de Pesquisa 56

2.5) Contextualizando a Pesquisa 57

2.6) Participantes 60

2.6.1) Aproximação ao Campo 60

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2.6.3) Estudo de Caso 63

2.6.4) Análise da Letra de Rap 64

2.7) Instrumentos 64

2.8) Procedimentos 65

2.9) Estratégia de Análise de Dados 67

CAPÍTULO 3 – RESULTADOS 69

3.1) Significações do Rap 69

3.2) Impacto na Vida do Rapper 74

3.3) Rap e Identidade Social 78

3.4) Rap e Inclusão Social 82

3.5) Funções Sociais do Rap 86

3.6) Análise do Rap 88

CAPÍTULO 4 – DISCUSSÃO E CONCLUSÕES 94

REFERÊNCIAS 106

ANEXOS 112

Anexo I – 1º Roteiro de Entrevista – Individual 112 Anexo II – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido 114

Anexo III – Entrevista do Rapper 116

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INTRODUÇÃO

É significativo o poder que a música exerce sobre os seres humanos, animais e plantas. Acredita-se que tal poder, aliado a procedimentos técnico-científicos, seja capaz de explicitar e traduzir padrões de comportamento social e de consumo em diversos níveis de complexidade (Hargreaves & North, 1997). Estudos realizados com populações urbanas devotadas a audiência da música country nas rádios americanas, por exemplo, indicam correlação entre essa prática e a taxa de suicídio, divórcio, pobreza e acesso a armas de fogo, dada a influência de determinado ritmo musical na vida cotidiana dos ouvintes.

No Brasil, quando a referência se concentra no estudo do comportamento de jovens de periferia, é inevitável o encontro com a música e, em especial, o Rap que emergiu nas grandes metrópoles brasileiras, com maior presença em meados dos anos 80, e hoje tem reconhecimento e status nacional de veículo de expressão contundente que dá voz e formato ao imaginário de massas jovens, face ao sistema e contexto social nos quais estão inseridos. Sua difusão é diretamente proporcional à explosão do movimento Hip-Hop. Surgido como forma de contestação nos Estados Unidos da América nos anos 70, o movimento Hip-Hop é composto por quatro elementos: a breakdance (dança de rua), o Graffiti, o MC (Mestre de Cerimônias) e o Rap (Sansone,1995). No Distrito Federal, a vertente que parece mais popular é a

dança, embalada pelas batidas do Rap, conduzidas pelos chamados: DJs (Disk Jockeys), a julgar por reportagens de periódicos de grande circulação na cidade

(Correio Braziliense, 26 de Setembro de 2004).

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ocidental a partir da década de 60, mas se afirmou como ritmo musical com a chegada dos anos 80. Originário da Jamaica, o Rap logo obteve identificação com as populações periféricas do bairro do Bronx, na cidade norte-americana de Nova York. Consiste na arte de cantar falando por meio de rimas, seguindo a batida de bases instrumentais que podem ser executadas por um “Mestre de Cerimônia” (MC) ou por um “Disk Jockey” (DJ) – a pessoa que comanda os equipamentos de som e cria a melodia, operando tecnicamente a aparelhagem ou “software”, com o uso da agulha sobre o disco de vinil no sentido contrário ao usual, o “scratch” (Rose, 1994).

A música da vida, o retrato cantado da realidade de periferias, aliada à dança e à arte do Graffiti, formam um movimento predominantemente juvenil que é marcado pela luta contra a segregação e exclusão social. Muito mais do que batidas eletrônicas, frases de efeito, rimas, contorcionismo, acrobacias e desenhos de rua, esse segmento que a sociedade se nega a enxergar buscou o caminho mais digno em prol de sua sobrevivência. São sonhos, dramas, esperanças e histórias que vão além da música, da dança e da pintura, traduzidas por meio da arte.

Segundo Rose (1994), são histórias de jovens anônimos que encontraram nas ruas, praças e becos, a força e estratégia para continuarem vivos, de cabeça e olhar erguido, longe dos crimes, da vida bandida, das drogas e da morbidade da periferia. Encontraram ritmo e poesia por meio do Rap e mais colorido e movimento, com o Graffiti e a breakdance.

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nas ruas, em escolas e nos próprios espaços comunitários onde os jovens se reúnem em prol de objetivos comuns, identificando-se não só pelo modo de vestir, de tendências e ritmos musicais afins, como também pelas expressões verbais (códigos próprios, gírias) e maneira de conceber o mundo (Chagas, 1997).

O universo cultural neste cenário constitui-se num palco de representações, símbolos, ritos e práticas com as quais os jovens interagem e manifestam suas indagações, seus interesses e sua identidade. Diante disso, Said (1992) afirma que os jovens apresentam-se como atores sociais e protagonistas de sua história, ou seja, posicionando-se ativamente no meio em que vivem, exercendo sua subjetividade. E, neste contexto, a música destaca-se como um elemento que acompanha essa construção, ocupando um papel significativo entre a juventude ao promover um espaço privilegiado de envolvimento e mobilização, tornando-se responsável pelo fomento de uma cultura de identidade jovem que demarca e dita padrões de comportamento, gostos e tendências.

Por meio dessa apropriação de identidade, têm surgido grupos musicais dos mais diferentes ritmos e preferências, percorrendo tanto a composição de suas produções como a chegada ao lançamento das músicas e apresentações em bares, festas e shows, favorecendo a ampliação dos recursos culturais em comunidade, bem como oferecendo oportunidade para sua inserção no mercado musical (Charlot, 2000).

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invadido o seio de comunidades de baixa renda, tornando-se um elemento fundamental na afirmação e no estabelecimento de experiências, trocas, afetos e aptidões.

Assim sendo, este estudo pretende investigar os significados atribuídos ao Rap e suas possíveis funções, com base na expressão da identidade social de Rappers (pessoas que apreciam o ritmo e fazem Rap) da periferia de Brasília. A partir da sistematização do discurso do Rap, buscou-se o entendimento do sistema de valores que sustenta tal processo de construção singular e social, com o objetivo de identificar a visão de mundo dessas comunidades jovens, pela perspectiva de suas retratações musicais.

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CAPÍTULO 1 – REVISÃO DE LITERATURA

1.1) Cultura e Identidade Social: Um breve histórico

O homem se distingue dos demais animais pela capacidade de instituir raciocínio lógico, articular idéias e, sobretudo, pelo caráter criador que lhe é inerente. Ao produto da junção dessas habilidades humanas, dá-se o nome de Cultura (Brandão e Duarte, 1990).

A Cultura, segundo as considerações de Brandão e Duarte (1990), origina-se das relações que a humanidade estabelece entre si e o ambiente em que vive. Consiste num produto do trabalho, aliado aos fatores que intermedeiam o convívio social, tais como faixa etária, sexo e condições socioeconômicas. Compreendem também aspectos materiais de um modo geral, e bens não-materiais como as representações simbólicas, os conhecimentos, as crenças, os sistemas de valores e o conjunto de normas que regem a vida em sociedade. Sua gênese configura-se pela junção dos fatores estruturalmente ligados à essência humana, tais como a disposição em elaborar ações, a capacidade criadora, a habilidade na ordenação de pensamentos e transmissão de experiências às gerações futuras, as quais impulsionam as manifestações e produções que resultarão no fomento de sua própria história. O homem caracteriza-se, portanto, como ser produtor e produto da cultura e por meio dela se manifesta, refletindo o seu conhecimento e visão de mundo (Brandão e Duarte, 1990).

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que o homem tem vivenciado e promovido, explicitando que esta apresenta formas e características dinâmicas, as quais se diferem com o tempo e o espaço.

Em meados do século XIV e XV, emergiu na Itália o Renascimento, movimento cultural fortemente impulsionado pela burguesia (grupo de comerciantes que visavam à supremacia nos lucros por meio do comércio de especiarias provenientes do Oriente). Tal segmento da sociedade destacou-se não apenas por conquistar novos espaços sociais, como também por resgatar e fazer renascer conhecimentos outrora desprezados, advindos da cultura greco-romana. Desde sua origem, a burguesia preocupou-se com a transmissão daquele conhecimento aos seus pares e descendentes, promovendo, desta forma, a criação de instituições de ensino superior, bem como as academias de incentivo às produções científicas e ordens profissionais (advogados, médicos, engenheiros e outros) (Brandão e Duarte, 1990).

Entretanto, com o passar dos séculos, a cultura, tendo conquistado um status de “cultura de elite”, foi se distanciando da maioria da população, o que

permitiu a formação de uma nova modalidade cultural que se identificasse com o senso comum e se aproximasse dos anseios da maioria, sem que houvesse a necessidade de técnicas racionalizadas e científicas. Neste momento, surge então a “cultura popular”. Uma cultura que se transmitia, em geral, oralmente, refletindo as tradições, os costumes de tal grupo social, alcançando formas artísticas tão expressivas e significativas quanto as produzidas pela cultura erudita (Hall, 2000).

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fotografia e disco, passando a atingir uma gama maior de pessoas, originando assim, a “cultura de massa”. A partir desse período, passou-se a transmitir cultura de forma industrializada a um público generalizado, de diferentes camadas socio-econômicas, atraído por um novo mercado, que oferecia produtos apresentados pela indústria cultural, formatando assim a origem da chamada sociedade de consumo (Brandão e Duarte, 1990).

Atualmente a nova sociedade que se configura descreve-se como uma sociedade de massa, tecnológica e industrializada, que possui uma identidade totalitária, isto é, que se relaciona com o todo e sofre influência direta deste todo que se constrói a partir da interação entre as partes (Gadotti, 1983).

Desta forma a identidade, vista sob a ótica do pós-modernismo, é entendida como totalidade, cuja característica predominante é a multiplicidade. Nesta perspectiva, os papéis sociais são impostos ao indivíduo, desde a sua concepção até a sua assunção, na medida em que se comporta com a expectativa da sociedade. Por exemplo: o homem, na presença do filho, relaciona-se como pai; na presença de seu pai, se relaciona-se como filho e assim por diante. A cada personagem materializado, a identidade tem assegurado sua manifestação enquanto totalidade, porém uma totalidade que não se esgota nem tão pouco se resume à concretização de personagens. Os personagens configuram-se como partes constitutivas dessa identidade e, ao mesmo tempo, constituem um todo que se cria a si mesmo como fenômeno de uma totalidade concreta (Gadotti, 1983).

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indivíduo determinar-se-á pelas condições históricas do grupo social no qual estará inserido. Na relação com os outros homens, o indivíduo comparece como portador de diversas combinações de papéis, compondo uma totalidade contraditória, múltipla e mutável, influenciado por elementos biológicos, psicológicos, sociais, simbólicos e culturais (Ciampa, 1984).

Não obstante a existência de um número considerável de teorias que abordam o comportamento social, este pode ser adequadamente explicado pelos mecanismos do indivíduo, uma vez que os processos psicológicos não se alteram com as mudanças dos contextos não sociais para os sociais. Assim, os contextos sociais são considerados como uma outra classe de estímulos, aos quais as pessoas respondem com processos psicológicos, independentemente de mediação social. Cabe à psicologia social, portanto, a tarefa de aplicação dos princípios do comportamento individual às condições ambientais complexas (Tajfel, 1979).

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resolver um problema e, para tal, priorizam a ação coletiva em detrimento da ação individual. Para Toch (1966), os movimentos sociais são um esforço, realizado por um grande número de pessoas, para a resolução de um problema comum.

Assim, uma perspectiva teórica capaz de explicar tais concepções, de forma promissora, origina-se da teoria da identidade social.

A teoria da identidade social, segundo alguns de seus precursores, Tajfel (1978), Brown e Turner (1981), demonstra a distinção psicológica entre o comportamento interpessoal e intergrupal e permite uma melhor compreensão de certas similaridades do comportamento social, relações entre grupos, processos de discriminação entre grupos e pessoas, formação e cooperação intra e entre grupos.

Para Tajfel (1979), a apreensão da realidade social é obtida pela capacidade que o indivíduo tem de estruturar para si aspectos como linguagem, trabalho, opções de lazer, poder e status. Para este autor, precursor da teoria da identidade social, a realidade social pode ser analisada em termos de estrutura socioeconômica, histórica ou política, uma vez que essa apreensão, pelos indivíduos, inevitavelmente poderá engatilhar manifestações significativas afetas ao seu comportamento, que, por sua vez, incorporar-se-ão ao seu sistema de crenças.

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desenvolvida pela filiação do indivíduo a diversos grupos sociais, contribuindo para a formação de sua identidade social; e) a interação social entre dois ou mais indivíduos em um dado momento, podendo ser determinada, dentre outros fatores, pelas características da filiação categórica em termos de identidade social.

A definição de movimentos sociais consiste em esforços realizados por um grande número de pessoas, que se definem e são freqüentemente definidas como um grupo, para deliberar coletivamente e resolver problemas que sentem em comum, percebidos como emergindo de suas relações com outros grupos (Tajfel, 1979).

Sobre o comportamento coletivo, o autor afirma que, em algumas circunstâncias, muitas pessoas agem e sentem da mesma maneira em relação a uma situação, um evento ou sobre outras pessoas. As características que distinguem os movimentos sociais de outras ações coletivas consistem na duração do evento coletivo; no número significativo de pessoas de um ou mais grupos sociais; e num sistema de crenças compartilhadas.

1.1.1) A cultura jovem a partir dos anos 50

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O reflexo desse comportamento jovem e as suas tendências foram expressas maciçamente na arte e, principalmente, na música. E, mesmo se configurando uma cultura “desviante” ou inconformada com as disposições vigentes, foi integralmente introduzida e assimilada pela indústria cultural, passando a ser divulgada pelos meios de comunicação de massa que a universalizaram (Said, 1992).

Tais padrões, incorporados pela juventude ocidental a partir dos anos 50, caracterizaram-se pela negação contundente a sociedade moderna e seus valores e pelo desenvolvimento de um novo estilo de vida alternativo e coletivo, oponente ao consumismo exacerbado; à industrialização indiscriminada; ao preconceito e segregação racial, de classe, de credo religioso e, sobretudo, contrário às guerras (Said, 1992). Mais tarde, essa reação jovem configurou-se também como um movimento que se contrapunha às disposições culturais vigentes, sendo simbolizado pelos chamados Hippies e Geração Beat, como também influenciados pelo “Rock and Roll” e o “Rhythm & Blues” norte-americanos; pelos Beatles e Rolling Stones britânicos e pelo balanço da Bossa-Nova no Brasil.

Para Brandão e Duarte (1990), tais manifestações juvenis também foram cenário para a eclosão de novas temáticas pouco discutidas ou ignoradas pela sociedade de então como, por exemplo, o uso de drogas, sexualidade, racismo, ecologia, pacifismo e outros. Todavia, estes temas acabaram por evidenciar o aspecto transformador dessa cultura jovem que, ao expressar uma visão crítica da realidade, exerceu influência e poder de modificação na cultura imperialista vigente, ainda que submetida a um processo de industrialização e comercialização.

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mercados específicos: O “Rhythm & Blues”, designado como a música dos negros, e a música Country ou Western, considerada a música dos brancos pobres de áreas rurais. Tanto uma quanto a outra eram alvos de preconceito e marginalização da sociedade norte-americana dos anos 50. Da junção desses dois estilos de música (música negra somada à música branca), surgiu o “Rock and Roll”, que funcionou como uma versão psicológica dominador (branco) versus dominado (negro), que era a prevalência nos Estados Unidos (Brandão e Duarte, 1990). Segundo estes autores, a cultura promovida pela juventude, a partir dessas manifestações, representava uma forma de os jovens de classe média branca incorporarem a opressão em relação à sociedade estabelecida por seus pais, assumindo como bandeira certos valores da cultura negra. Mesmo tendo tido um estilo contestatório e oriundo de base negra, o “Rock and Roll” foi uma mercadoria estilizada pela grande indústria cultural, expandindo-se com o lançamento de Elvis Presley, um jovem branco de classe média americana, que tinha voz rouca e sensual como um negro, o qual abriu campo para a aceitação de negros como Chuck Berry, Little Richard e Fats Domino.

A partir de então, a indústria cultural desenvolveu-se a todo o vapor. Os meios de comunicação de massas, bem como as gravadoras e o cinema, voltaram-se para essa emergente cultura jovem que veio com o “Rock and Roll”, ditando um novo estilo de vida, criando um mercado próprio cada vez mais requisitado (Brandão e Duarte, 1990).

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canções eram sublinhadas pelo ritmo frenético das guitarras elétricas e suas letras expunham ao público os problemas pessoais que os jovens enfrentavam na época e para os quais os adultos não demonstravam a menor sensibilidade (Brandão e Duarte, 1990).

Mediante tais incompreensões, alguns grupos de jovens optavam pela delinqüência juvenil, fazendo disparar as estatísticas sobre crime e violência. Nascidos antes do ataque dos japoneses, em dezembro de 1941, à base americana de Pearl Harbor no Havaí, fato que provocou a entrada dos Estados Unidos na Segunda Guerra Mundial, tal geração cresceu em meio ao conflito e, mais tarde, ao fantasma da guerra fria. Assim sendo, mesmo usufruindo alguns privilégios que a classe média branca detinha, era inevitável para os jovens escapar não só do sentimento de culpa pelas desigualdades sociais e raciais, como também livrar-se do vazio existencial resultante de uma sociedade consumista e materialista (Brandão e Duarte, 1990). Neste sentido, tornou-se mais evidente a realidade dos lares “desajustados”, reflexo da própria guerra e da vida moderna norte-americana, e o aparecimento de grupos juvenis que não se enquadraram no “american way of life” (“estilo de vida americano”, vigente na época), tendo sido tachados de grupos que adotavam comportamento desviante, mais tarde explorados pelos estudos no campo da Sociologia e Antropologia.

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chegando a se alastrar por todo o mundo, incluindo o Brasil. Em 1956, com o filme Ao Balanço das Horas (Rock Around the Clock), estabeleceu-se um contato mais

direto com esse tipo de cultura jovem, com base em seus personagens que retratavam os dilemas de uma geração, ao mesmo tempo em que oferecia um modelo visual e ideológico para a juventude dos anos 50.

Entretanto, nem só de jovens transviados e “Rock and Roll” viveram os anos 50. Os resquícios da guerra fria e da cultura de consumo contribuíram para o surgimento de um pequeno grupo de jovens universitários que tentaram oferecer um estilo de vida alternativo, por meio de um movimento literário. Em 1957, com a publicação do livro de Jack Kerouac, Pé na Estrada (On the Road), eclodiu um fenômeno designado de “beat”. Tratava-se de um termo com várias conotações, que sugeria a busca de uma purificação do espírito, sob a influência das religiões orientais, budismo, zen-budismo e outras. Também se referia a um estilo de vida adotado por aqueles que andavam na contramão do sistema vigente e possuía conotações musicais referentes ao be-bop e ao cool jazz. Assim sendo, ser “beat” significava fluência, improviso, ausência de normas preestabelecidas na vida e na arte. O “beat” buscava um envolvimento profundo, que trazia música, balanço, liberdade e prazer, na procura da realidade marginal das minorias raciais e culturais, no interior da sociedade norte-americana (Brandão e Duarte, 1990).

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70, influenciando músicos como Bob Dylan, Rolling Stones, John Lennon (Beatles) e Jim Morrison, devido às críticas em relação ao estilo de vida e aos tabus americanos como drogas, bebedeiras, sexo e utopias ideológicas. Pode-se dizer, então, que os poetas e escritores beats tentaram fazer uma espécie de ligação direta entre a arte e a vida no mundo moderno, instaurando o que seria uma das principais prerrogativas básicas dos movimentos jovens dos anos 60, que era obedecer aos instintos de uma cultura alternativa ligada ao cotidiano, independente do reconhecimento da cultura oficializada pela sociedade.

1.2) Identidade social e música: aspectos conceituais

Ao pensar em identidade social, é preciso indagar o que ocorre com as pessoas, em particular no tocante à visão que possuem de si mesmas e o que as faz identificarem-se com outras e assim se tornarem um grupo (Tajfel & Turner, 1979). Os autores afirmam que pessoas são levadas a unir-se a outras por meio de características afins e que, uma vez rotuladas a partir de determinado agrupamento, passam a assumir uma identidade de grupo.

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Contudo, na constituição desses grupos, as pessoas deixam de pensar o particular para pensar o coletivo e, assim, também passam a assumir as características de um membro por meio da identidade atribuída ao grupo do qual é parte como, por exemplo, grupo religioso, cidadão brasileiro etc. Dependendo da maneira pela qual as pessoas se autodenominam, também serão denominadas por outros e o senso de quem se é e o que se é, conseqüentemente, sofrerá modificações.

Para a Psicologia contemporânea, abordagens como a Psicologia Analítica do Eu e a Psicologia Cognitiva têm fortemente explorado o estudo da identidade, entendendo o seu conceito como um produto da socialização e garantia pela individualização, conjugando a noção de desenvolvimento com estágios crescentes de autonomia (Jacques, 1998).

O termo identidade foi mais particularmente explorado a partir da preocupação dos psicólogos sociais em estudar o homem como sujeito social, inserido num contexto sócio-histórico. O emprego popular de tal termo, entretanto, apresentou-se marcado por uma diversidade de conceitos, refletindo assim a dificuldade na formulação de uma definição mais aproximada da inter-relação indivíduo e sociedade nos mais variados campos das ciências sociais (Jacques, 1998).

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de vista da concepção, da genética, mas, sobretudo, em se tratando do homem ser reconhecido como tal; o homem só se vê como homem se os outros assim o reconhecerem. Sob essa perspectiva, é possível conceber a identidade pessoal como, e ao mesmo tempo, social, superando a falsa dicotomia entre essas duas instâncias (Laurenti & Barros, 2000).

Na atualidade, ainda se faz presente essa dificuldade na construção de um conceito que defina mais propriamente o termo identidade, tendo em vista a demarcação do território limítrofe do social e do individual. Para Harbermas (1990), a expressão “identidade social” vem sendo empregada com base no pressuposto inter-relacional entre instâncias individuais e sociais, resultantes da composição da “identidade do eu”, alicerçada na “identidade natural” e na “identidade de papel”, a partir de sua integração pela igualdade e diferença em relação aos outros.

A questão da identidade, no contexto das ciências sociais, tem sido extensamente discutida, tendo em vista o surgimento dessa fusão que caracterizou o indivíduo moderno, integralizado e visto como um sujeito unificado.

Para Hall (2000), o consenso acerca das proposições relacionadas ao conceito de identidade, estudado até os tempos atuais, reside na chamada “crise de identidade”, resultante do declínio de velhas identidades, sendo parte de um processo mais amplo de mudança, responsável pelo deslocamento das estruturas e processos centrais das sociedades modernas, proporcionando um abalo nos quadros de referência que forneciam aos indivíduos uma sustentação no mundo social.

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transformações significativas nas paisagens culturais de classe, gênero, sexualidade, etnia, raça e nacionalidade, até então guiadas por sólidos modelos e referenciais de localização do indivíduo como ser social. Tais transformações têm impulsionado a mudança das identidades pessoais, permitindo um abalo do sentido de si, então estável, que favorece o chamado deslocamento do sujeito gerando uma “crise de identidade” a partir da descentração dos indivíduos, tanto de seu lugar no mundo social e cultural quanto de si mesmos. Essas transformações são tão abrangentes e de tamanho caráter emancipatório que é inevitável se pensar numa possível transformação da própria modernidade.

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sujeito é constituído e modificado em presença de uma interação constante com as identidades provenientes do mundo cultural exterior. A identidade, então, consiste no preenchimento entre o interior e o exterior, entre o mundo pessoal e o mundo público, promovendo uma junção do sujeito à estrutura, tornando-os mais unificados e conjugados. Todavia discute-se que transformações ocorridas ao longo dos tempos têm promovido uma fragmentação desse sujeito, cuja identidade unificada e estável, outrora mantida, encontra-se em colapso, propiciando o aparecimento de outras identidades, muitas vezes até contraditórias ou não resolvidas, originando a formação do sujeito pós-moderno, partindo-se do princípio de que não possui uma identidade fixa. O sujeito pós-moderno assume diferentes identidades em diferentes momentos, sendo estas definidas historicamente e não biologicamente. Trata-se de uma construção de identidade multifacetada, a qual se compõe em razão de um contínuo deslocamento, acompanhado pelas evoluções dos sistemas de significação e modificações nas representações culturais e sociais (Hall, 2000). Essa nova incorporação de conceito de identidade pós-moderna vem ao encontro das proposições Marxistas, que discorrem sobre a modernidade tardia, afirmando que todas as relações fixas e congeladas, com o seu aparato de representações e concepções, tendem a ser dissolvidas e a se desmanchar no ar (Hall, 2000).

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Nessa perspectiva, Guattari (1976) acrescenta que o imaginário grupal tem dimensão cotidiana, é vivo, resultado do social e da história e está entranhado no grupo, não apenas circunscrito a uma estampa social. A recuperação desta presença do imaginário nos grupos sociais e da importância dada aos elementos “irracionais” que compõem os grupos, valoriza a interferência dos grupos sociais categoriais nos relacionamentos intergrupos, nas categorizações dos grupos sociais quanto à sua identidade e, assim, na dinâmica social, solicitando a proposta de uma pauta para as ciências sociais que considere o imaginário dos grupos. No entanto, há algo que caracteriza os grupos contemporaneamente e que coloca o imaginário grupal na berlinda, retirando o que ele tem de vivo. Nestes grupos, o imaginário perde seu viço, deixa de estar sob o efeito do tempo e da história para se congelar, torna-se coisa. O imaginário no grupo cristaliza-se e o grupo passa a ser apenas um nome, apenas uma imagem, apenas o estereótipo. Mesmo nestas circunstâncias os grupos categoriais ainda mantêm sua importância social enquanto formadores da identidade dos indivíduos. Assim, a identidade social é entendida a partir dos vínculos que os indivíduos estabelecem com grupos sociais. O indivíduo deriva necessariamente do grupo e não o contrário. Portanto, a exemplo do que ocorre nos grupos, a identidade dos indivíduos não só caracteriza, mas também se associa à tentativa dos indivíduos de pertencer, (Guattari ,1976).

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contestação e de legitimação de idéias contrárias ao sistema político-econômico então vigente como, por exemplo, a contracultura, a geração “beat”, o movimento hippie, a Beatlemania e as influências do “Rock and Roll” e da música negra

norte-americana.

Com isso, torna-se clara a compreensão de identidade social como o resultado de um imaginário grupal de dimensão cotidiana, permeado pelo social e pela história, entranhada e constituída por meio do grupo. A identidade social, então, constrói-se pelos vínculos que indivíduos estabelecem com grupos sociais (Guattari, 1976).

1.3) Música: Arte e Expressão das Minorias

A partir dos processos de fundamentação sócio-culturais, desde os movimentos emancipatórios do século XIX, surge uma sociedade que exige um novo tipo de arte. Nessa nova sociedade o conceito de representação da arte, como um objeto de ornamento de uma classe social privilegiada, como um status-símbolo na vida privada de uma elite social, não é mais relevante (Contier, 1991).

Tal sociedade caracteriza-se por um governo estruturado nas mudanças oriundas e regidas pela sociedade de consumo e que, em tese, resultaram nos anseios e nas modificações orientadas à satisfação de uma cultura de massa.

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Os sistemas de comunicação, de economia e tecnologia, de linguagem e expressão artística, misturam-se uns nos outros, mergulhando num único todo. Ao mesmo tempo, a arte se torna o fator preponderante de estética e humanização do processo civilizador, tendo em vista a sua transformação em arte ambiental (Contier, 1991).

Assim como a arte, também a música exerce uma função de humanizar a civilização tecnológica. Consiste num instrumento de modificação e possui uma função social que interfere em todos os aspectos da vida humana. Indubitavelmente, a música é capaz de intensificar ou reduzir a dinâmica do sistema psicoautônomo humano, por meio de ritmo, tempo, movimento, estrutura melódica e harmônica, timbre e duração da música, bem como a sua relação com a constituição do ser social, estrutura de personalidade e suas funções orgânicas (Sloboda, 1997).

Diante dos desafios da atual sociedade tecnológica, é depositada sobre a arte a função de envolver o homem e deixar sua marca na vida diária, de forma aplicada à realidade. E a música, como uma modalidade de expressão artística, tem incorporado a “missão” de transformar critérios e idéias artísticas em realidade, sobre o pano de fundo das mudanças sociais, isto é, um complemento estético a vários setores da vida e da atividade do homem pós-moderno, que se apresenta a serviço da sociedade (Shepherd, 1991).

1.3.1) Música e linguagem

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comunicam algo universal quanto à construção da lingüística no intelecto humano (Sloboda, 1997).

Para Costa (1989), a linguagem foi criada e desenvolvida pelo homem, como um instrumento que determina quase por completo seus pensamentos e dirige grande parte de suas ações. Assim, torna-se difícil se conceber a realidade fora dos conceitos lingüísticos de que se dispõe, a tal ponto que diversos autores consideram que a linguagem é não apenas um produto cultural, mas se confunde ou se funde com a própria cultura. Isso porque, dentro de qualquer sistema lingüístico, as experiências e vivências serão traduzidas por um determinado número de símbolos que serão sempre insuficientes para abrigar toda a riqueza e diversidade do percebido, o que faz com que grupos culturais diferentes possuam diferentes representações da realidade, visões de mundo próprias e peculiares.

De acordo com Jakobson (1970), a linguagem constitui-se no próprio fundamento da cultura e no principal instrumento da comunicação informativa e, obviamente, deve haver um código comum entre os participantes para que a interação se torne adequada. Para Eco (1971), um código representa um sistema de probabilidades, sobreposto à eqüiprobabilidade do sistema inicial para permitir a comunicação. Este sistema, segundo o autor, estabelece um repertório de símbolos que se distinguem por oposição recíproca.

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Numa definição muito simples, Costa (1989) afirma que a música é a organização de relações entre sonoridades, simultâneas ou não, no decorrer do tempo. Assim, sons e silêncios são combinados e encadeados entre si, formando ritmos, melodias e harmonias. O ritmo consiste basicamente na ordenação do movimento, formando um elo entre espaço e tempo. Tratando-se de música, seus elementos básicos são a duração e a acentuação das sonoridades. A duração vai definir o andamento, isto é, sons curtos repetidos vão caracterizar um ritmo rápido, sons prolongados, um ritmo lento. A acentuação, por sua vez, vai permitir distinguir uma simples pulsação, ou seja, uma seqüência regular de sons iguais, de ritmos binários, ternários, ou qualquer outro em que um dos sons ou um dos tempos é acentuado com maior intensidade que os demais. Costa (1989) acrescenta ainda que as combinações de duração e acentuações vão formar os diversos ritmos, permitindo que se possa perceber claramente a diferença entre um samba, uma valsa, uma marcha ou um xaxado, por exemplo. Para a autora, o ritmo é apontado habitualmente, como a faceta mais primitiva da música e é ligado à vida biológica. Entretanto, Ducourneau (1977), afirma que o ritmo musical é um dos principais elementos da expressão de sentimentos, tendo na origem de suas indicações de movimento, a marca de indicações afetivas.

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Já a harmonia caracteriza-se pela superposição de intervalos sonoros, ou simultaneidade de notas, formando acordes que se encadeiam no decorrer da composição. É a verticalidade que costuma ser encarada como o aspecto mais intelectual ou racional da música. Estes três elementos estão interligados na música, e cada um deles contribui para a apreensão e compreensão dos demais. Melodia e harmonia, pressupondo sucessão e movimento, não podem existir sem ritmo. As curvas da linha melódica e a distribuição dos acordes vão indicar as acentuações que caracterizam o ritmo, tornando-se desnecessário acentuá-lo pela maior intensidade em um dos tempos. A música, então, configura-se não na soma destes três aspectos, mas na relação entre melodia, harmonia e ritmo. Qualquer modificação em um destes elementos vai alterar o caráter da composição musical (Costa, 1989).

A música representa um sistema de probabilidades, cujas regras modificam a eqüiprobabilidade de qualquer som suceder-se ao anterior, permitindo que a sonoridade se transforme em comunicação musical. Com base nessas regras, são relacionados intervalos, timbres, durações, que se combinam entre si, formando estruturas mais complexas, ritmos, melodias, harmonias, cujo desenvolvimento irá constituir o discurso musical, podendo-se, portanto, concluir que a música tem regras para a combinação de seus diversos elementos, preenchendo então determinadas qualidades do código, que caracterizam a linguagem (Costa, 1989).

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Segundo Jakobson (1970), o principal meio de comunicação informativa é a linguagem verbal, porém Watzlawick & Jackson (2004) abordam a questão por outro ângulo. Segundo estes autores, a linguagem apresenta duas faces distintas, mas complementares, as quais ele chama de comunicação analógica e comunicação digital. A comunicação digital processa-se por palavras e seus significados, que são manipulados de acordo com as regras sintáticas da linguagem. A comunicação analógica, porém, caracteriza-se por ser virtualmente toda comunicação não verbal.

Para watzlawick & Jackson (2004), o não verbal não deve se restringir apenas aos movimentos corporais, mas abranger inflexão de voz, seqüência, ritmo e cadência das próprias palavras. Todos estes aspectos, portanto, podem ser interpretados como “a música da fala”. Na comunicação analógica, são de fundamental importância para a expressão das relações ou dos afetos ligados a estas relações, as intensidades, as acentuações, as durações, as alturas que constituem “a música da fala” e que têm pontos de contato com a música propriamente dita. A principal diferença entre a fala e a música, sob este prisma, é que a linguagem verbal é horizontal, possuindo somente o aspecto melódico, enquanto a música se caracteriza por admitir, e até mesmo exigir, a verticalidade, ou seja, a harmonia.

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arbitrário, de acordo com a convenção semântica de cada língua. Fora desta convenção não há qualquer correlação entre uma palavra e aquilo que representa. No entanto, este laço torna-se necessário para quem fala, na medida em que a referência é imposta pelo código lingüístico, no qual determinado significante denota, forçosamente, um significado.

A rigidez da linguagem verbal é abrandada pela relação de conotação. A conotação ocorre quando o par significante e significado denotado se tornam, juntos, o significante de um significado acrescentado (Eco, 1971).

A linguagem verbal também possui diversos componentes não-referenciais e conotativos. No entanto, segundo Jakobson (1970), todo ato de comunicação verbal requer um contexto a que se refere, apreensível pelo destinatário. Isto é, toda mensagem verbal inclui a função referencial.

Assim, a linguagem compreende, portanto, cinco diferentes funções: expressiva ou emotiva, na qual a atividade comunicativa está centrada no emissor; a função apelativa, não essencialmente centrada no emissor; a conativa, centrada no referente; a poética ou estética, centrada na mensagem em si; e a função metalingüísta, centrada no próprio código utilizado.

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1.3.2) O Rap: Ritmo e Poesia

Apesar da semelhança musical entre o Rap e o Funk, ambos apresentando bases eletrônicas simples, influenciadas pela música negra norte-americana, o Rap “Rhythm and Poetry” (Ritmo e Poesia) traz um estilo próprio de narrativa que propõe uma inserção social por intermédio de ações sociais de protesto e construção, além de questionar as estruturas vigentes. Consiste num dos elementos que compõem o movimento Hip-Hop, que, em português, significa “saltar mexendo os quadris” (Diógenes, 1998). Aliado à Breakdance (dança de rua), ao Graffiti (arte plástica) e à manipulação dos discos de vinil e aparelhagem de som

pelos DJs (Disk Jockeys) e MCs (Mestres de Cerimônia), o movimento Hip-Hop surgiu em meados dos anos 70 nos bairros negros de Nova York: Bronx, Harlem, Brooklin e Queens, nos Estados Unidos, tendo se alicerçado na música negra Jamaicana. Sua base imprimiu a consolidação de um movimento sociocultural e artístico que se estende até os dias de hoje. Teve como característica principal a identificação jovem na prerrogativa de se fazer expressar pela sua arte, refletindo sua inconformidade e resistência diante do racismo e preconceito sofridos pela comunidade moradora dessas localidades (Rose, 1994).

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manifestações em artes plásticas e desenhos de rua, sob o nome de Graffiti; manifestações estas que passaram a substituir a formação e proliferação de muitas gangues nova-iorquinas. Aparentemente tais elementos exerciam um caráter legitimador das expressões de revolta contra a opressão socioeconômica e racial, devido ao uso de reflexões sobre histórias reais, angústias particulares e experiências de vida dos próprios compositores acerca da desigualdade de classe social (econômica), racismo e outros temas até então considerados tabus numa sociedade preponderantemente tradicionalista.

Para Amorim (1997), essas três expressões culturais, o Rap, a Breakdance e o Graffiti surgem vinculadas e entrelaçadas umas às outras, falando

de uma mesma realidade tecida no script social, originalmente caracterizada pela marginalidade e privação dos negros de baixa renda nos Estados Unidos, em oposição à sociedade branca. A prosa Rapper se encarregou, e ainda hoje se encarrega, de contar, na maioria das vezes, as experiências vividas pelos seus próprios compositores, o que acaba por estabelecer uma ligação emocional com o seu público específico dada a identificação integral com as narrativas, que refletem as mesmas vivências de privação financeira, preconceito racial e social. Os primeiros personagens Rappers surgidos no cenário norte-americano foram: Big Daddy Kane, Ice-T, Ice Cube, Tupac, Public Enemy, Mc Hammer, Puff, África Bambaataa, Malcolm Maclaren, entre outros (Rose,1994).

No Brasil, diferentemente do que ocorre nos Estados Unidos, raça, etnicidade e cor são temas secundários no “Hop”. Muitos dos Rappers e Hip-Hoppers brasileiros se definem por uma maioria negra e descrevem em suas letras

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ponto, repetem noções contidas na política de identidade afro-americana. Entretanto, a etnicidade não constitui a identidade fundamental do Rap das metrópoles brasileiras. Antes, o tema da etnicidade é tratado tangencialmente, constituindo um sujeito quase incidentalmente negro: o mano (Herschmann, 2000). Para este autor, o mano caracteriza-se por ser um sujeito primordialmente residente na periferia e constitui-se numa vítima do sistema que se esforça em combatê-lo. No sentido de incorporar muitas questões que agitavam os bairros pobres durante meados da década de 80, o Rap brasileiro mitificou a vida dos manos da periferia, transformando-os em contadores de histórias de violência, brutalidade policial, romance, pobreza e falta de alternativas.

Em São Paulo, a política local está estreitamente ligada à política baseada nas questões dos movimentos sociais inspirados nas Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) das décadas de 1970 e 1980, que lutavam por direitos de cidadania e justiça social. O Rap, neste contexto, acabou por assimilar os conteúdos que ficaram explícitos nas histórias tipificadas que contavam a saga do trabalhador brasileiro de 60 anos de idade, que trabalhou por toda a vida, mas continuava passando privações, sem água, eletricidade, asfalto e sem acesso ao transporte público.

Para Lehmann (1996), o Rap paulistano tem como característica principal a alusão à politização de uma pureza enraizada em uma pobreza glorificada, o que corresponde a um tema central do catolicismo popular brasileiro, diferenciando sua gênese dos demais, o norte-americano e europeu, os quais não fazem nenhuma menção a conceitos ou símbolos religiosos.

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profecia de uma explosão afro-americana, celebrando a chegada de uma nova “nação negra”, e o transforma em um espetáculo comercialmente bem-sucedido. Um espetáculo, contudo, que até hoje retém algumas antigas reivindicações de autenticidade enraizadas na pureza da pobreza subalterna e no antimaterialismo prescrito espiritualmente (Herschmann, 2000).

1.3.3) O Rap em Brasília

Mesmo tendo surgido nos Estados Unidos, o Rap tem mostrado que, a partir de sua exportação, pela indústria fonográfica para diversos países, tornou-se um estilo musical típico dos jovens suburbanos (Abramovay, 2004).

Trata-se de uma música feita por jovens que vivem em periferias suburbanas, que ouviram música afro-americana nas rádios e televisão durante a adolescência e que encontraram uma forma lúdica para preencher o seu dia-a-dia, na contramão das poucas perspectivas das favelas e dos bairros pobres. O Rap brasileiro tem sua maior expressão na cidade de São Paulo; todavia, Brasília encontra-se, atualmente, em segundo lugar no ranking de preferências pela música e já possui uma identidade própria no movimento Hip-Hop nacional.

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arquipélago, uma colcha de retalhos de grupos que com diferentes motivações, viabilizam suas identidades.

Abramovay (2004) afirma que, no Distrito Federal, o Rap tem características peculiares. Trata-se de uma música dinâmica que traz a dança como um componente central em suas apresentações, configurando-se como um elemento de crítica social elaborado, expressando o sentimento de pertencer à sociedade, de participar e reivindicar direitos. O sentimento de exclusão social também é foco das composições brasilienses, sendo para os seus compositores a única música que retrata o cotidiano dos que vivem nas periferias das grandes cidades.

Considerando que a população do Entorno, desde a década de 90, compreendia mais da metade da população de Brasília, é compreensível que os jovens expressem a sua revolta contra o sistema, a pobreza e contra as condições precárias do seu local de moradia, em uma “nova” forma de expressão (Abramovay, 2004).

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Outra característica marcante do Rap de Brasília é o fato de acompanhar todos os momentos de divertimento juvenil: em casa, nas ruas e nas festas. Abramovay (2004) ressalta que os jovens fazem questão de deixar claro que o Rap é um estilo de música tão legítimo quanto qualquer outro e quem gosta dele não é vagabundo. Segundo os próprios Rappers, da mesma forma que alguns gostam de outros estilos musicais, a exemplo do samba e música sertaneja, eles preferem o Rap, o qual por sua ênfase em determinados temas, por manter uma postura forte,

por falar palavrões e o que sente na pele, causa discriminação. A autora frisa que os jovens Rappers de Brasília consideram a sociedade hipócrita, pois é reforçada por idéias preconceituosas veiculadas pelos meios de comunicação, dentre estes, destacam a televisão, que insiste em associar a imagem do Rap à violência e criminalidade.

Assim, entende-se que fazer Rap no contexto de Brasília significa ter estilo e atitude. Para os jovens, mais do que imitar um ritmo de música importada, ser Rapper quer dizer sair do trabalho duro e mal remunerado e, no final do expediente, poder cantar a crônica do dia-a-dia de maneira radical, como também significa uma identidade e uma filosofia de vida (Abramovay, 2004).

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Desacato Verbal e Tropa de Elite. Dentre as cidades-satélites de Brasília, as que mais se destacaram no contexto do Rap, até hoje, foram: Ceilândia, Planaltina, Sobradinho, Candangolândia, Riacho Fundo e Guará (Guedes, 2003).

Segundo Amorim (2004), é importante enfatizar que em Brasília a música Rap também tem a função de divertir, de entreter e não somente de expressar a

condição de vida da periferia. Isto significa que em meio aos problemas impostos pelas condições periféricas de Brasília, os jovens encontram no Rap uma forma de extravasar, ao mesmo tempo em que constroem uma identidade e espaços em comum dentro da cidade que habitam.

1.3.4) A Juventude e o Jovem de Periferia

Os estudos mais freqüentes nas ciências sociais sobre juventude de um modo geral surgem nas décadas de 1920 e 1930, com a Escola de Chicago, nos Estados Unidos. A princípio, a preocupação desse núcleo de estudos não era a juventude propriamente dita, mas entender o crescimento urbano acelerado sobre o comportamento dos habitantes. Com o passar dos anos, foi detectado que o número de imigrantes e a ausência de espaços de integração social e cultural urbano, por exemplo, desencadearam a formação de guetos e a segregação espacial e cultural eram responsáveis por formar grupos, bandos, gangues, organizações clandestinas e o crime organizado (Zaluar,1985).

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afirmando que esta apareceu em contraste com a ordem social. Assim, as questões de delinqüência, por um lado, e de rebeldia e revolta, por outro, permaneceram como chaves na construção da problematização da juventude ao longo desse século.

Desta forma, a socialização na sociedade moderna torna-se mais complexa e os jovens passam a buscar novas referências para se identificar com os processos de mudança social. Para Parsons (1969), teórico que aborda essa temática, a subcultura juvenil deriva-se da cultura geral dos adultos e não é necessariamente hostil ou antagônica a ela, ainda que subsista na sua análise a noção de “desvio” como disfunção do processo de socialização.

Nessa perspectiva, Abramo (1994) discorre que a questão da juventude emerge como tema no bojo da preocupação com as questões vinculadas ao processo de modernização social, ocorrido no ciclo de transformações estruturais, desencadeado no período posterior à Segunda Guerra Mundial. Assim, a partir desse período identifica-se a formação de uma cultura juvenil com características próprias, ressaltando o seu potencial revitalizante para com a sociedade, como agentes políticos de transformação social.

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mais pronunciadas à sociedade, propondo mudanças. Nesse contexto surgem o movimento estudantil e o movimento hippie, levando o jovem a um patamar de ator de mudança social, dentro do contexto específico dessa década, na qual se introduziu concomitantemente novas questões como sexo, drogas, liberdade e pacifismo.

Abramo (1994), afirma que no Brasil os estudos sobre juventude não têm muita tradição, pois privilegiou-se os conflitos entre gerações e, na década de 80, a dedicação se deu ao movimento estudantil, em especial. Em outros termos, o interesse das ciências sociais recaiu sobre o papel da juventude como agente político, sobre sua capacidade de devolver uma postura crítica e transformadora da ordem vigente. Com isso, o autor explica que atualmente existem transformações significativas na composição da categoria juvenil e ao mesmo tempo que surgem diversas manifestações culturais produzidas por jovens de diversas origens sociais.

As gangues, analisadas originalmente pela Escola de Chicago, na década de 90, assumiram maior dimensão e diversidade no cenário urbano. Esta realidade, segundo Abramo (1994), fica clara em estudos que procuram compreender o fenômeno da relação entre juventude e violência no Brasil.

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Assim, numa perspectiva ampla e sistêmica, compreender o jovem significa entender a juventude como um processo, um rito de passagem e transição adolescente para condição adulta, repleta de travessias que se fazem por intermédio de uma trajetória biográfica (estudo, trabalho, estágios, participação em eventos e peripécias dos mais diversos tipos) e por uma trajetória relacional, constituída pelo conjunto das interações, com seus pares e com o mundo adulto, que ele foi sendo capaz de estabelecer durante esse período de sua existência. Travessia entre a infância e a idade adulta, entre a heteronomia e a autonomia, entre o mundo da educação e o mundo do trabalho, entre a condição de filho e a possibilidade ou realidade da condição de pai e mãe.

Abramovay (2004), ao estudar os jovens da periferia de Brasília, percebe que o trabalho não é visto como uma fonte de satisfação, de prazer, de realização pessoal e nem mesmo de segurança e de integração social. A autora observa que, do mesmo modo que os jovens estão em busca de novas identidades, negando-se a compartilhar uma filosofia que vincula a identidade social, o dever moral e o êxito no trabalho assalariado, são numerosos os jovens que afirmam acreditar na educação como fonte de ascensão social. Essas ambigüidades nada mais expressam do que as contradições que estruturam a própria existência dos jovens das cidades da periferia, o mundo do consumo e a necessidade de autonomia financeira são fatores que ganham relevância na reflexão da constituição da identidade dos jovens não chefes de família no empenho da busca pelo trabalho.

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Coelho (1992), também aponta para esta direção, ao estudar as normas e valores de jovens favelados, identificando o mundo do consumo como uma poderosa força material e simbólica, em uma sociedade em que se valoriza a posse e ostentação de bens de consumo conferidores de status social. A imagem construída por uma determinada mídia vinculando as pessoas que moram na periferia como criminosos, a forma como a polícia os trata, o preconceito por ser pobre, torna a experiência da violência mais intensa do que a convivência com o mundo do crime, comum nas periferias das grandes cidades brasileiras. Esses fatores, que constituem o cotidiano do jovem de periferia e operam na construção da identidade dos jovens, caracterizam-se em ameaça por sua própria condição de pobre.

Como afirma Zaluar (1985), a consciência dessas barreiras torna-se um fator a mais para a inclinação dos jovens dos grupos populares para o crime: constitui-se num círculo que opera como um obstáculo efetivo à obtenção de emprego e como um mecanismo psicológico poderoso na construção de sua identidade.

1.3.5) Conceituando a exclusão Social

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Excluídos, são todos aqueles que são rejeitados de mercados materiais ou simbólicos e de valores. A exclusão caracteriza-se como uma espécie de desfiliação, representando uma ruptura de pertencimento, de vínculos sociais, isto é, uma impossibilidade de partilhar, o que leva à vivência da privação, da recusa, do abandono e da expulsão, inclusive, com violência, de um conjunto significativo da população (Sawaia, 2002).

Sendo assim, a exclusão constitui-se predominantemente social e não pessoal. Sawaia (2001) afirma que não se trata de um processo individual, embora atinja pessoas, consiste numa lógica que está presente nas várias formas de relações econômicas, sociais, culturais e políticas da sociedade brasileira. Esta situação de privação coletiva é que se está entendo por exclusão social. Ela inclui pobreza, discriminação, subalternidade, não equidade, não acessibilidade, não representação pública.

Na sociedade capitalista, por paradoxo, os excluídos não participam do sistema, mas sustentam a ordem econômica e social. Segundo Martins (1997), no Brasil escravista, o sistema excluía o escravo da ordem social, mas a sociedade era sustentada, grandemente, pelo trabalho escravo. Com a abolição súbita da escravidão, houve dois choques: o que se repercutiu no lado da produção, dado ao esvaziamento de mão-de-obra pela libertação dos escravos de seus locais originais de trabalho (mão de obra substituída por imigrantes europeus). E o outro, o do lado dos ex-cativos, relativo à penúria com que os libertos tiveram que encarar sua nova condição, sem nenhum preparo para assumir um papel digno no ambiente social.

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como fonte fornecedora da identidade social, isto é, “se é aquilo que se faz”, o que normalmente costuma ser a segunda constatação feita sobre alguém que se está conhecendo. A primeira é geralmente sugerida a partir da pergunta: "como você se chama?" (identidade pessoal); e em seguida : “o que você faz? (identidade social)”.

Apesar da alardeada "igualdade de oportunidades" do capitalismo, sabe-se sabe-ser a sociedade, como afirmava Émile Durkheim no início do século XX falando sobre educação, a responsável pela definição das posições, status e dos papéis, inclusive profissionais, que as pessoas ocupam e desempenham em seu meio. Assim, o corpo da sociedade, por meio das instituições, estabelece as posições, seja em termos profissionais, econômicos, culturais, o que repercute no desempenho dos papéis sociais, tendo a educação como mediadora desse processo (Sawaia,2002).

Instâncias ou ambientes de exclusão social, em nível da política global, consistem em países periféricos: América Latina, África e parte do continente asiático, sendo considerados excluídos da ordem econômica mundial, leia-se globalização, em relação aos países centrais (Estados Unidos da América, países da União européia e outros países economicamente desenvolvidos).

No nível de grupos sociais, Martins (1997) explicita que excluídos são as minorias étnicas (indígenas, negros), as minorias religiosas e as minorias culturais. Em termos de gênero, caracterizam-se nas mulheres e crianças. Quanto à opção sexual, consistem em homossexuais, bissexuais e transexuais. Há também os excluídos por idade: As crianças e os idosos, bem como os excluídos por aparência física: Obesos, deficientes físicos, pessoas calvas, pessoas mulatas ou pardas, portadores de deformidades físicas e pessoas mutiladas.

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CAPÍTULO 2 – NATUREZA DO MÉTODO

2.1) O Problema

Ao se recorrer a divulgações sociológicas e achados científicos sobre as manifestações e comportamento de jovens de baixa renda das periferias brasileiras, atualmente, encontram-se demonstrações significativas da literatura acerca do aumento da violência e uso de drogas, bem como uma apologia da elevação dos níveis de pobreza e desemprego por meio do aumento da desigualdade social e conseqüente queda nas condições básicas de sobrevivência das massas desfavorecidas pelo sistema econômico vigente.

Entretanto, demais estudos realizados nos anos 90 entre jovens de comunidades pobres do Rio de Janeiro e São Paulo (Herschmann, 2000), apresentam uma retomada na compreensão das teorias sobre exclusão social, ressaltando o fenômeno de inclusão através da associação e assimilação de signos e significados próprios dos guetos, a um mercado nacional que concebe o Rap como uma música que traduz a cara do jovem brasileiro dos dias atuais, não apenas o de baixa renda, mas também o de classe média.

Nesse contexto a juventude, então marginalizada, tem recebido um status de ascensão, passando de consumidora à produtora de uma nova manufatura: o Hip-Hop, que tem ganhado adeptos em praticamente todos os becos, pistas de

dança e shows ou aglomerações jovens de diversas cidades brasileiras, como também dos Estados Unidos, Europa e Ásia.

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pesquisa, além de abrir campo para a discussão desse advento, apontando para a função social e cultural do Rap como elemento catalisador dos processos de inclusão social de indivíduos, indagando até que ponto esta é capaz de influenciar e favorecer o resgate de auto-estima e consolidar a concepção de cidadania entre tais populações.

2.2) Justificativa

Considerando que segundo o senso comum, o segmento da juventude periférica tem representado uma porção marginalizada da sociedade e que ao ser referido, geralmente é associado a questões relacionadas à violência e uso de drogas, surge um enorme desejo de ampliar a discussão sobre jovens de baixa renda, seus anseios, manifestações e visão de mundo, numa perspectiva de garantia de direito e de cidadania. Tal motivação vai ao encontro das dimensões que contemplam a psicologia Social, a psicologia social da música e a teoria da identidade social e tendo em vista o imaginário e subjetivação deste ator social que utiliza o Rap para significar sua existência e a maneira como interage com seus pares no contexto sócio-cultural em que se insere.

Com o intuito de se obter um olhar sistêmico e “orgânico” do fenômeno, fez -se necessário à interface entre tais visões interdisciplinares acerca dos jovens de periferia, uma vez que possibilitará o alcance de uma leitura mais próxima da integridade da realidade e complexidade desse tema, que está tão evidente no seio da juventude brasileira atual.

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2.3) Objetivos

2.3.1) Objetivo Geral:

Investigar a expressão da identidade social de jovens da periferia de Brasília, através do Rap.

2.3.2) Objetivos Específicos:

• Identificar as significações do Rap para o jovem de periferia;

• Compreender a identidade social desses jovens, através do Rap;

• Investigar o papel do Rap como elemento de inclusão social;

• Reconhecer as possíveis funções sociais do Rap.

2.4) Questões de Pesquisa

• Como os jovens de periferia significam o Rap?

• Qual a influência do Rap na identidade social de jovens da periferia de

Brasília?

• Qual a relação entre o Rap e os processos de inclusão social de jovens

de periferia?

• Qual o papel social do Rap no contexto das comunidades de periferia

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2.5) Contextualizando a Pesquisa

Esta é uma pesquisa qualitativa e exploratória, ou seja, uma pesquisa que busca explorar significações relacionadas a um fenômeno específico, que no caso da presente pesquisa é o Rap.

Para Demo (2001), González Rey (2002) e Minayo (2000), a Pesquisa com a abordagem qualitativa privilegia a profundidade e a intensidade dos fenômenos e dos dados em oposição à extensão e a generalização dos resultados da abordagem quantitativa. A qualitativa é não-linear, não se esgota na dimensão externa dos fenômenos e considera complementar e essencial tanto qualidade quanto a quantidade. Porém, não exige um número extenso de sujeitos participantes na pesquisa, justamente por objetivar conhecer o complexo e o diferenciado como parte de um todo (acontecimento, relações a cada momento com etapa de um processo). Com isso, possibilita a leitura analisando o antagonismo, a ambigüidade, o conflito, as relações entre grupos sociais e no interior deles, e o inter-relacionamento dos fenômenos.

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interna do objeto de pesquisa, bem como favorecer a compreensão dos resultados individualizados e não específicos. Estes foram elementos fundamentais para a realização desta pesquisa.

Na tentativa de se conhecer o fenômeno do Rap e investigar a relação entre a música e a identidade social de jovens em comunidades periféricas de Brasília, foi entendido que a pesquisa qualitativa e a utilização do método de estudo de caso, seriam a melhor opção na obtenção de um estudo mais profundo acerca de uma realidade específica, como é o caso desses jovens Rappers, objeto deste estudo.

Segundo a definição de Yin (1989), o método de estudo de caso consiste num método de investigação que envolve um investigador que faz um detalhado exame de um único indivíduo, grupo ou fenômeno. Trata-se de um estudo em profundidade, que considera as particularidades e peculiaridades do objeto, distinguindo-se dos demais métodos por manter o foco no agrupamento e especificidade dos dados referentes ao objeto eleito, não visando generalizações e permitindo o retrato de uma única realidade singular (Turato, 2003).

Referências

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