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CONTRATO DE TRABALHO DESPEDIMENTO SEM JUSTA CAUSA

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Supremo Tribunal de Justiça Processo nº 05S2841

Relator: SOUSA PEIXOTO Sessão: 18 Janeiro 2006

Número: SJ200601180028414 Votação: UNANIMIDADE Meio Processual: REVISTA.

Decisão: NEGADA A REVISTA.

CONTRATO DE TRABALHO DESPEDIMENTO SEM JUSTA CAUSA

OFENSAS À HONRA IMPUGNAÇÃO DO DESPEDIMENTO

ÓNUS DA PROVA

Sumário

1. Não constitui ofensa grave à honra e dignidade dos directores de uma das fábricas da entidade empregadora, a insinuação feita por um trabalhador, na reclamação por ele apresentada relativamente à avaliação que lhe foi

atribuída, de que não havia honestidade nas promoções, sendo regra corrente supervalorizar alguns trabalhadores, ignorando outros.

2. A ofensa à honra integra o crime de injúrias quando a imputação é dolosa.

3. Na acção de impugnação do despedimento compete ao empregador provar o dolo.

4. Determinada imputação pode ser ofensiva, mesmo sem ser criminosa, mas quando tal acontecer, a gravidade da ofensa será naturalmente menor por ser menor o grau de culpa do seu autor (mera culpa).

5. Não constituem justa causa de despedimento as referências, imputações e insinuações menos elogiosas que, directa ou indirectamente, são feitas aos destinatários da reclamação (superiores hierárquicos do trabalhador/

reclamante) desde que se prendam com a fundamentação da própria

reclamação e que não excedam, de modo exagerado, os limites do direito de crítica que uma reclamação pressupõe, mormente se o trabalhador, com 23 anos de "casa", não tem antecedentes disciplinares.

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Texto Integral

Acordam na secção social do Supremo Tribunal de Justiça:

1. "A" propôs a presente acção no Tribunal do Trabalho de Leira contra B - Empresa Produtora de Embalagens de Cartão, S.A., pedindo que a ré fosse condenada a reintegrá-lo e a pagar-lhe o valor correspondente às retribuições que deixou de auferir até ao trânsito em julgado da sentença, alegando, para tanto, que foi ilicitamente despedido, em 27.9.2002, por ser nulo o processo disciplinar, por estar "prescrito" o procedimento disciplinar e por inexistência de justa causa.

Na 1.ª instância, a acção foi julgada procedente com o fundamento de que os factos imputados ao autor não justificavam o despedimento, tendo a ré sido condenada a reintegrá-lo no seu posto de trabalho e a pagar-lhe a quantia de 738,22 euros mensais, a título de retribuição, desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da sentença, acrescida dos respectivos subsídios de férias e de Natal e dos juros de mora.

A ré recorreu da sentença, impugnando a matéria de facto, defendendo a existência da justa causa e alegando que as retribuições intercalares não são devidas desde a data do despedimento, uma vez que a acção não foi

instaurada dentro dos 30 dias subsequentes ao mesmo.

O Tribunal da Relação de Coimbra julgou parcialmente procedente a

impugnação da matéria de facto, aditando um novo facto àqueles que a 1.ª instância tinha dado como provados, manteve a decisão recorrida no que toca à ilicitude do despedimento, mas alterou a sentença no que toca às

retribuições intercalares, por entender que as mesmas só são devidas a partir de 22.8.2003, ou seja, desde o 30.º dia anterior à data da propositura da acção.

Mantendo o seu inconformismo, a ré interpôs o presente recurso de revista, rematando a sua alegação com as seguintes conclusões:

«A) Submetia-se à apreciação do Tribunal a quo a adequação da sanção

disciplinar de despedimento aplicada pela Recorrente ao Recorrido e por este questionada quanto ao mérito e fundamento.

B) Nessa apreciação impunha-se, desde logo, considerar a existência ou inexistência de comportamento ilícito por parte do Recorrido e, apreciada

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esta, aplicar o Direito, isto é, verificar da subsunção dos factos assentes à previsão do n.° 1 do art. 9.º do Dec. Lei n° 64--A/89.

C) A matéria de facto assente espelha, com algumas incorrecções que, nesta instância, não serão já analisadas, a prova produzida em Audiência de

Julgamento.

D) Dessa prova resultou inequívoca a demonstração de que o Recorrido pôs em causa, de forma explícita e consciente, a honra e dignidade dos Directores da unidade fabril em que trabalhava, como, aliás, bem considerou o Venerando Tribunal a quo, corrigindo, nesta parte, a douta decisão proferida na 1.ª

instância.

E) A honra e dignidade de qualquer colega de trabalho não pode ser posta em causa por qualquer trabalhador, sob pena de, fazendo-o, violar de forma

grosseira, o dever de respeito por esse Colega, tornando prática e imediatamente impossível a subsistência da relação de trabalho.

F) Tal impossibilidade é, naturalmente, realçada se o Colega do trabalhador for director da empresa onde este trabalha e se, em vez de um foram

ofendidos quatro Colegas, Directores.

G) Ao pôr em causa a honra e dignidade de quatro Directores da Recorrente, colocou, o Recorrido, em xeque (xeque-mate, dir-se-ia!) a autoridade destes e, em consequência, toda a estrutura hierárquica, que necessariamente deve suportar uma relação de trabalho.

H)Todo o comportamento do Requerido - silêncio no processo disciplinar e descarada e desavergonhada negação dos factos que lhe eram imputados na nota de culpa nestes autos - define com clareza o carácter do Recorrido e denuncia a incapacidade de se confiar na sua actuação, configurando, no que aos autos respeita, uma verdadeira litigância de má fé.

I) Os insultos dirigidos pelo Recorrido aos quatro Directores da Recorrente feriram a honra e dignidade destes, não tendo o Recorrido, não obstante ter consciência da falsidade das suas acusações, em qualquer momento

manifestado vontade em retratar aquelas imputações.

J) A circunstância de o Recorrido ser, ao tempo do despedimento, telefonista da Recorrente, por ele passando grande parte dos contactos da Fábrica com o exterior, torna intolerável a consideração feita pelo M.º Juiz a quo de que, tratando-se a Recorrente de uma grande Empresa (onde estão os factos que o suportem?) existiriam poucos contactos entre o Recorrido e aqueles que foram gravemente ofendidos pelas insinuações, torpes e não verdadeiras, do mesmo.

L) Pretender, como fazem ambas as instâncias, que o facto de o Recorrido trabalhar na Recorrente há mais de vinte e três anos deve constituir elemento inibidor da aplicação da sanção despedimento - enquanto, unanimemente, a Jurisprudência considera tal circunstância irrelevante em caso de verificação

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de roubo de dinheiro (ainda que pouco!) - é considerar menos grave o comportamento de um trabalhador que "rouba" a dignidade a quatro

superiores hierárquicos do que o comportamento do trabalhador que rouba, a um destes directores, cinco cêntimos.

M) Perante a ofensa da honra e dignidade de quatro dos seus Directores, só por manifesta falta de noção dos efeitos provocados por uma lesão dessa

natureza (a lesão da honra é, com frequência, irreversível) se pode admitir via diferente da cessação do contrato de trabalho.

N) Admitir, como fizeram as instâncias a quo, que o ilícito praticado poderia ser censurado sendo imposta sanção de menor gravidade do que o

despedimento e que de tal sanção resultaria até o reforço da autoridade da Recorrente é desconhecer que se está perante a lesão da honra de quatro superiores do Recorrido e que tal ofensa só com o desaparecimento do ofensor da organização da Recorrente pode ser minimamente reparada.

O) Abordar o ilícito praticado pelo Recorrido - e assente - como um acto de gravidade menor é seguramente menosprezar o direito à honra dos ofendidos pelo comportamento do Recorrido.

P) Perante tal ofensa, qualquer "Bom Pai de Família" reagiria como fez a Recorrente, despedindo o Recorrido.

Q) Não o tendo feito, teria a Recorrente violado, de forma flagrante, o seu dever de solidariedade e mesmo respeito com os seus Directores, assumindo uma posição de verdadeira conivência com os atentados feitos à honra

daqueles.

R) Não o tendo feito teria a Recorrente violado em concreto os deveres constantes das alíneas a) e ) (parte final) do art. 19.º do Dec. Lei 49.408.

S) Deveria, assim, o Venerando Tribunal a quo ter julgado validamente

decidido, pela Recorrente, o despedimento do Recorrido, por ser esta sanção a única que, face à gravidade dos factos praticados pelo Recorrido preservava a autoridade daqueles que, gravemente, foram atingidos por esse

comportamento.

T) Concluindo pela existência de justa causa de despedimento do Recorrente pela Recorrida, teria o venerando Tribunal a quo feito boa aplicação do Direito aos factos considerados assentes.

U) A ser diversa a sanção aplicada pela Recorrente ao Recorrido, ter-se-ia posto em causa não só o respeito pela honra dos ofendidos, como a própria manutenção dos respectivos contratos de trabalho, por se considerar

manifestamente inviável a coexistência entre o Recorrido e aqueles directores, após a ocorrência de ofensas de tamanha gravidade.

V) Ao decidir como fez, violou o Venerando Tribunal a quo, de forma flagrante o disposto nos arts. 9.º e 13.º do Dec. Lei 64-A/89.»

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O autor não contra-alegou e, neste Supremo Tribunal, o Ex.mo Procurador- Geral Adjunto pronunciou-se pela concessão da revista.

Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

2. Os factos

Os factos que a Relação deu como provados não foram objecto de recurso. Por isso, dão-se aqui por reproduzidos, ao abrigo do disposto nos artigos 713.º, n.º 6 e 726.º do CPC, sem prejuízo de oportunamente serem chamados à colação aqueles que se mostrem relevantes para a apreciação e decisão da revista.

3. O direito

Como resulta das conclusões formuladas pela recorrente, o objecto do recurso, que por aquelas é delimitado (artigos 684.º, n.º 3 e 690.º, n.º 1, ambos do CPC), restringe-se à questão de saber se o despedimento do autor foi decretado com justa causa.

Mais concretamente, trata-se de saber se o teor da comunicação enviada pelo autor, em 8 de Julho de 2002, através de correio electrónico, ao director da fábrica da ré, em Leiria, Eng.º C, de que remeteu cópia aos também directores daquela fábrica, D, E e F, é ofensivo da honra e dignidade dos referidos

directores e, na hipótese afirmativa, se essa ofensa, pela sua gravidade e consequências, é de molde a tornar imediata e praticamente impossível a subsistência da relação laboral estabelecida entre as partes (1) .

Como é sabido, nos termos do n.º 1 do art. 9.º da LCCT (2), constitui justa causa de despedimento o comportamento culposo do trabalhador que, pela sua gravidade e consequências, torne imediata e praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho.

A justa causa pressupõe, portanto e antes de mais, uma conduta por parte do trabalhador que se traduza na violação culposa dos seus deveres contratuais.

Não basta, porém, um qualquer comportamento e uma culpa qualquer. Como se disse no recente acórdão de 7 de Dezembro de 2005 (3), o comportamento tem de ser objectivamente tão grave, em si mesmo e nas suas consequências, que, quebrando a confiança que deve existir entre as partes no cumprimento de um contrato com a natureza que tem o contrato de trabalho, torne

irremediável a ruptura da relação contratual, por se concluir não existir outra sanção susceptível de sanar a crise contratual aberta pela conduta do

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trabalhador, deixando de ser exigível ao empregador o respeito pelas garantias da estabilidade do vínculo laboral.

Por sua vez, a culpa, a gravidade do comportamento do trabalhador e a inexigibilidade da subsistência do vínculo não podem ser apreciadas em função do critério subjectivo do empregador, mas sim na perspectiva de um bom pai de família, ou seja, de um empregador normal, norteado por critérios de objectividade e razoabilidade (como se disse no acórdão citado), devendo o tribunal atender, ainda, por força do disposto no n.º 5 do art. 12.º da LCCT, no quadro de gestão da empresa, ao grau de lesão dos interesses da entidade empregadora, ao carácter das relações entre as partes ou entre o trabalhador e seus companheiros e às demais circunstâncias que no caso se mostrem relevantes.

Como salientam Bernardo Xavier (4) e Monteiro Fernandes (5), o que verdadeiramente caracteriza a justa causa é a imediata impossibilidade prática da subsistência da relação de trabalho. É essa situação de imediata impossibilidade prática de manutenção do vínculo laboral que constitui a verdadeira pedra de toque do sistema. A dificuldade está em saber em que se traduz essa impossibilidade, uma vez que não se trata de uma situação de impossibilidade material de manutenção do referido vínculo, mas antes de uma situação de inexigibilidade jurídica a determinar mediante um balanço em concreto dos interesses em presença: o interesse da urgência da

desvinculação e o interesse da conservação do vínculo.

A decisão sobre a inexigibilidade envolve, no dizer do primeiro daqueles

autores, um juízo de probabilidade, de prognose, sobre a viabilidade futura da relação de trabalho, que tem a ver não só com factos ou situações de facto, mas também com valores que, como tal, não podem nem devem ser objecto de alegação e prova e onde as operações de mera subsunção não têm grande cabimento. Tal juízo assenta numa "análise diferencial de interesses que deve ser feita em concreto, de acordo com uma comparação das conveniências contrastantes das duas partes e com abertura aos interesses gerais que sejam relevantes", sendo de concluir que há justa causa quando o interesse da

emergência do despedimento prevalece sobre as garantias do despedido, o que acontecerá quando o suporte psicológico inerente à relação laboral deixe de existir, ou seja, no dizer de Monteiro Fernandes (6), quando deixem de existir as condições mínimas de suporte de uma vinculação duradoura que implica mais ou menos frequentes e intensos contactos entre os sujeitos.

Entrando, agora, na apreciação do objecto do recurso, comecemos por chamar

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à colação os factos provados que ao caso se mostram relevantes, que são os seguintes:

a) O autor foi admitido ao serviço da ré em 24.8.79, com a categoria de Contínuo de 2.ª classe.

b) Em 24.2.80, foi promovido a Telefonista, em 1.1.2000, a Assistente

Administrativo do grau I e, em 1.1.2002, a Assistente Administrativo de nível VI.

c) No dia 8.7.02, o autor remeteu ao director da fábrica da Ré, em Leiria, Eng.º C, que a recebeu no mesmo dia, a seguinte mensagem, por correio electrónico:

"Venho por este meio manifestar o meu descontentamento e indignação ao modo como a Direcção tem distribuído as avaliações e consequentes

promoções.

A Administração ao criar plafonds de promoções, actua de boa-fé com esperança que as Direcções tenham capacidade e honestidade, para as distribuir de modo o mais abrangente possível, para manterem todos os trabalhadores motivados de modo a apresentarem a melhor rentabilidade possível, o que neste Unidade raramente acontece, é regra corrente SUPER VALORIZAR alguns trabalhadores, ignorando outros.

Em 23 ANOS ao serviço da empresa nunca recebi uma promoção, mas sempre desempenhei as funções acima da minha classificação o mais perfeito possível com total dedicação à empresa, utilizando os meios que me foram

disponibilizados, adaptei-me com facilidade a todas as inovações e tecnologias essenciais à função, tendo mesmo recorrido a formação que paguei, para adquirir conhecimentos que aplico ao serviço da empresa.

Conforme é do conhecimento geral, sempre desempenhei muitas mais funções, além das que fazem parte da categoria em que estou classificado, inclusive prestar apoio a alguns elementos de outras empresas do grupo, antes de existir departamento comercial local, desempenhava as funções de assistente, recolhia os contactos dos Clientes, preenchia um impresso que elaborei e remetia-o para Albarraque à atenção do Eng. E e D.ª G.

Sempre que solicitei qualquer acessório para melhorar o desempenho das minhas funções, recebi da m/ hierarquia satisfação negativa, até o simples pedido de uma cadeira me foi recusado, quando da distribuição para todos os outros trabalhadores administrativos, sendo necessário interceder junto da Medicina no trabalho e esta manifestar à Direcção a necessidade de tal utensílio.

Quando foi colocado no m/ posto de trabalho um computador, informei o

Director de serviços que, adquirindo um Modem Fax, poderia receber os Faxes

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no computador e envia-los por e.mail ou imprimir no local de destino, as vantagens são a rapidez de entrega ao destinatário, economia de custos, pois minimiza o gasto de consumíveis do fax (unidade de impressão e toner) com um custo de cerca de 40.000$00 em cada 3.000 impressões, o custo do modem era de cerca de 10.000$00.

Como a empresa não reconheceu as vantagens, comprei e paguei um Modem que foi instalado no computador do m/ local de trabalho, tendo possibilitado as vantagens que V .Exªs conhecem, nomeadamente com a ausência de estafeta.

Comparando o meu desempenho com outras Unidades do Grupo, eu concentro o desempenho de funções que em outras unidades estão distribuídas por

diversos colaboradores com classificações acima da média, inclusive um quadro superior.

Domino quase na totalidade a Gestão da Central Telefónica, quando os outros Centros requisitam cada intervenção à Alcatel, como o simples desbloquear de um telefone pode custar 75 (setenta e cinco euros), em Albarraque esta gestão é feita pelo Eng. H, que utiliza a quase totalidade do s/ tempo a este serviço.

Viana, a Telefonista é uma funcionária classificada no grupo 8.

Direcção Embalagem Recepção de Fax é coordenada por funcionária classificada no grupo 6.

Tenho valorizado e colocado em primeiro plano a satisfação das necessidades da empresa, remetendo para segundo ou terceiro plano a colaboração a

assuntos particulares, desenvolvidos nas horas de expediente por alguns quadros da empresa, inclusivamente já constatei a utilização muito abusiva dos meios de comunicação da empresa, para passatempos no período laboral, efectuados por um quadro superior, para números com tarifa agravada.

Também tenho consciência que a m/ recusa em colaborar com estas situações tem originado notas negativas e levou, inclusivamente, à violação de

privacidade do m/ posto de trabalho, concretizada em 1993, por V. Ex.ª acompanhado pelo Sr. F, foi lamentável que do mesmo modo não tenha

recomendado a mesma violação à secretária do Sr. I, numa última Sexta Feira do mês, onde poderia encontrar as eventuais contribuições provavelmente entregues pelos transportadores, para se manterem autorizados a prestar serviços à empresa.

É frequente ouvir comentários, que eventualmente pode existir alguma falta de rigor financeiro por parte da Direcção, quando da eventual aquisição de alguns bens e serviços, nesta situação pode originar custos supérfluos de muitos milhares de contos sem necessidade aparente.

Concluo que a ausência das classificações merecidas, não se deve à dificuldade financeira da empresa, nem impedimento por parte da

Administração, mas possivelmente ao esquecimento da minha existência no

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momento das classificações.

Em todos os anos comerciais existe um elevado número de erros técnicos e profissionais, que originam reclamações dos clientes, denegrindo a imagem da empresa e causado avultados prejuízos, encomendas devolvidas transformadas em desperdício, com os respectivos encargos de transporte para entrega e devolução, tendo os autores de tais erros obtido promoções sucessivas, e considerados exemplares.

Pelo exposto, venho requerer a V. Ex.a que se digne desenvolver os meios necessários e indispensáveis, para valorizar o meu desempenho, em igualdade circunstâncias que foram valorizados os trabalhadores administrativos

admitidos na mesma data que eu, Agosto de 1979, a reclassificação tem que ter retroactivos a Janeiro de 2002.

Consciente de que V. Ex.a vai desenvolver os meios que tem disponíveis para satisfação do meu pedido, aguardo resposta com o máximo de brevidade possível, até 12/07/2002.

Cumprimentos, A

08-Julho-2002"

d) No dia 9 de Julho de 2002 o autor, na qualidade de gerente da sociedade J, Ldª, remeteu ao mesmo director da Fábrica da Ré em Leiria, Eng.º C, outra mensagem por correio electrónico, recebida também por este no mesmo dia, com o seguinte teor: (...).

e) A ré considerou ofensivo o teor das mensagens referidas em c) e d) e, em consequência disso, instaurou processo disciplinar ao autor que culminou com o seu despedimento em 30.9.2002.

f) O autor trabalhava, como telefonista, na fábrica de Leiria, por ele passando grande parte dos contactos telefónicos e feitos através de telecópia, entre os serviços da fábrica de Leiria e o exterior, tendo acesso a inúmeras informações internas ao funcionamento da empresa.

g) Com o teor da comunicação dirigida pelo autor ao director da fábrica, em 8.7.2002 e enviada com conhecimento aos directores D, E e F, sentiram-se ofendidos na sua honra e dignidade, quer o destinatário, quer aqueles a quem foi dado conhecimento da comunicação.

Como resulta da alínea c) dos factos supra referidos e como constava já da nota de culpa e da decisão de despedimento, respectivamente a fls. 106-113 e a fls. 142-151 dos autos, a ré instaurou processo disciplinar contra o autor e veio a despedi-lo, além do mais que ao caso não interessa, por ter dirigido ao director da fábrica de Leiria, onde trabalhava, e aos também directores D, E e F, a comunicação referida na alínea c).

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Na decisão recorrida entendeu-se que o teor daquela comunicação violava o dever de respeito que é devido aos superiores hierárquicos, mas que tal violação não assumia gravidade suficiente para justificar o despedimento, acrescendo que o autor tinha mais de 23 anos "de casa", não tendo sido alvo, até então, de qualquer medida disciplinar ou, pelo menos, nada tinha sido alegado pela ré a esse respeito.

A recorrente discorda, veementemente, da decisão recorrida, por considerar que o teor da referida comunicação é altamente ofensivo da honra e dignidade daqueles quatro directores; por entender que o facto do autor exercer as

funções de telefonista, por ele passando grande parte dos contactos da fábrica com o exterior, torna intolerável a manutenção da relação laboral e por julgar irrelevante (dada a natureza da ofensa - ofensa à honra e dignidade dos

directores da fábrica -) o facto de ele ter mais de 23 anos "de casa".

Salvo o devido respeito, a recorrente não tem razão. Vejamos porquê.

A comunicação em causa, como facilmente se pode constatar do respectivo teor, mais não é do que uma reclamação apresentada pelo autor relativamente à avaliação de que foi alvo (embora dos autos não conste qual tenha sido essa avaliação) relativamente aos restantes trabalhadores administrativos

admitidos na mesma data em que ele foi admitido (Agosto de 1979).

É o que, desde logo, resulta do teor do seu primeiro parágrafo, onde o autor claramente diz: "Venho por este meio manifestar o meu descontentamento e indignação ao modo como a Direcção tem distribuído as avaliações e

consequentes promoções.

E é também o que inequivocamente decorre do teor do penúltimo parágrafo, onde o autor expressamente requer que o destinatário da reclamação (o Eng.º C, Director da Fábrica de Leiria) "se digne desenvolver os meios necessários e indispensáveis, para valorizar o meu desempenho, em igualdade

circunstâncias que foram valorizados os trabalhadores administrativos

admitidos na mesma data que eu, Agosto de 1979, a reclassificação tem que ter retroactivos a Janeiro de 2002."

Ora, como é sabido, quem reclama é porque se sente injustiçado com alguma coisa e esse sentimento de injustiça faz, quase sempre, com que a reclamação peque por excesso.

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No caso em apreço, a recorrente, hipervalorizou os termos da reclamação por ele enviada, imputando-lhe intenções que a factualidade dada como provada não consente. Senão vejamos.

A ré começa por alegar que o conteúdo do primeiro parágrafo da reclamação é ofensivo da honra e dignidade dos directores da fábrica. Nesse parágrafo, o autor diz que a Administração da ré, ao criar plafonds de promoções, actua de boa fé e com a esperança de que as Direcções (leia-se Direcções das Fábricas/

Centros de produção da ré) tenham capacidade e honestidade para as distribuir de modo o mais abrangente possível, para manterem todos os trabalhadores motivados de modo a apresentarem a melhor rentabilidade possível, o que na fábrica de Leiria raramente acontece, sendo regra corrente supervalorizar alguns trabalhadores, ignorando outros.

Temos de reconhecer que uma tal afirmação contém implícita a acusação de que a direcção da fábrica não actuava, em matéria de promoções, com a lisura que era esperada. E também temos de aceitar que aqueles a quem a

comunicação foi enviada se tenham sentido ofendidos na sua honra e

dignidade, como, aliás, foi dado como provado (vide al. g) dos factos supra).

Todavia, isso não chega para imputar ao autor a prática de um crime de

injúrias (art. 181.º do C. Penal), pois, sendo este um crime de natureza dolosa (art. 13.º do C. Penal), era necessário que tivesse sido dado como provado que ele tinha agido com dolo, em algumas das suas modalidades (dolo directo, necessário ou eventual - art.º 14.º do C. Penal -). Essa prova não foi feita, sendo certo que tal ónus recaía sobre a ré, ora recorrente, por força do

disposto no n.º 4 do art. 12.º da LCCT, nos termos do qual compete à entidade empregadora fazer a prova dos factos que invocou para decretar o

despedimento do trabalhador.

Dir-se-á que a afirmação feita pelo autor não deixa de ser ofensiva, mesmo sem ser criminosa. Isso é verdade, só que, nesse caso, a gravidade da ofensa será muito diminuta, quer no que toca ao ilícito, quer no que diz respeito à culpa (mera culpa), ficando, por isso, muito aquém da gravidade que o conceito legal de justa causa pressupõe.

Depois, alega a ré, que o autor teria ofendido a honra e dignidade do Eng.º C, ao acusá-lo de, em 1993, ter violado a privacidade do seu posto de trabalho e de não ter feito, ou mandado fazer o mesmo ao Sr. I, em cuja secretária

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"poderia encontrar as eventuais contribuições provavelmente entregues pelos transportadores, para se manterem autorizados a prestar serviços à empresa."

Segundo a ré, o autor não logrou provar a alegada violação da privacidade do seu posto de trabalho e insinuou que aquele director tinha conhecimento do comportamento que imputou ao ex-colega I (7), o que constituiria uma afronta à dignidade daquele director.

Relativamente a tais factos, dir-se-á, apenas, que, no processo disciplinar, o autor não foi acusado de com eles ter pretendido ofender a honra e dignidade daquele director. No que toca aos ditos factos, a ré limitou-se a acusá-lo de que "[a] imputação grave de desonestidade que lança sobre o Sr. I, ex-

funcionário da empresa, evidencia, a serem verdadeiras tais imputações, que o arguido conhecia situações graves e irregulares passadas na empresa desde esse ano de 1993, nada tendo, até hoje, denunciado perante os seus

superiores hierárquicos" (vide art. 12.º da nota de culpa, a fls. 36 e 37 dos autos, e art. 12.º da decisão de despedimento, a fls. 46 dos autos) e a acusá-lo de que "[a] mesma imputação, a ser falsa, constitui um comportamento

caluniador e difamatório de um seu ex-colega, ao qual, até por estar já

retirado da empresa, não são garantidos quaisquer direitos de defesa da sua honra e dignidade" (vide art.º 13.º da nota de culpa e art.º 13.º da decisão de despedimento, a fls. 37 e 46 dos autos, respectivamente).

Por isso, tais factos não podem ser considerados na dimensão que agora a ré lhes pretende dar (ofensa da honra e dignidade do Eng.º C), por tal contrariar o disposto no n.º 4 do art. 12.º da LCCT, nos termos do qual na acção de

impugnação judicial do despedimento a entidade empregadora só pode invocar os factos constantes da decisão de despedimento.

De qualquer modo, valem aqui, no que toca à culpa, as considerações feitas relativamente ao segundo parágrafo da reclamação.

Finalmente, a ré alega que o autor ofendeu a honra e a dignidade dos

directores, ao acusá-los de falta de rigor financeiro, no que toca à aquisição de bens e serviços e ao acusá-los, de todos os anos, existir um elevado número de erros técnicos e profissionais que originam reclamações dos clientes,

denegrindo a imagem da empresa e causando avultados prejuízos, tendo os autores de tais erros obtido promoções sucessivas e sido considerados como trabalhadores exemplares.

Porém, também aqui a ré carece de razão.

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Efectivamente, no que toca à falta de rigor financeiro, o autor limita-se a dizer que "[é] frequente ouvir comentários, que eventualmente, pode existir alguma falta de rigor financeiro por parte da Direcção, quanto à aquisição de alguns bens e serviços (...)". O autor nem sequer afirma que essa falta de rigor exista.

E, no que diz respeito ao elevado número de erros técnicos e profissionais, o autor não os imputa aos directores, muito menos a título de culpa. Limita-se a afirmar que tais erros existem, que os mesmos originam reclamações dos clientes, denegrindo a imagem da empresa e causando-lhe avultados prejuízos e que os autores desses erros têm sido sucessivamente promovidos e

considerados trabalhadores exemplares. Só a parte final da frase é que poderia ser considerada ofensiva para os directores, por insinuar que

premiavam os maus trabalhadores em detrimento dos bons. Mas também aqui valem as considerações feitas acerca do segundo parágrafo.

Concluindo, diremos que o teor da reclamação, no seu conjunto, não pode ser interpretado como gravemente ofensivo da honra e dignidade dos directores a quem foi dirigida. As referências, imputações e insinuações menos elogiosas que, directa ou indirectamente, lhes são feitas prendem-se com a

fundamentação da própria reclamação e não excedem de modo exagerado os limites do direito de crítica que uma reclamação pressupõe, não constituindo, por isso, justa causa para despedimento, mormente se o trabalhador, com 23 anos de "casa", não tinha antecedentes disciplinares.

4. Decisão

Nos termos expostos, decide-se negar a revista e confirmar a douta decisão recorrida.

Custas pela recorrente.

Lisboa, 18 de Janeiro de 2006 Sousa Peixoto

Sousa Grandão Pinto Hespanhol

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(1) - Anota-se que o teor da comunicação enviada pelo autor ao Eng.º Neto Fernandes, no dia 9 de Julho de 2002, também serviu de fundamento ao

despedimento, mas na revista a recorrente restringe a questão da justa causa ao teor da comunicação enviada no dia 8 daquele mês e ano.

(2) - Regime jurídico da cessação do contrato individual de trabalho e da

celebração e caducidade do contrato de trabalho a termo, aprovado pelo Dec.-

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Lei n.º 64-A/89, de 27/2, em vigor à data em que o autor foi despedido.

(3) - Proferido no proc. 1919/05, da 4.ª Secção, de que foi relatora a Ex.ma Conselheira Maria Laura Leonardo.

(4) - Curso de Direito do Trabalho, Verbo, 2.ª edição, pag. 491 e seguintes.

(5) - Direito do Trabalho, Almedina, 12.ª edição, pag. 556.

(6) - Ob. cit., pag. 559.

(7) - Vide art.º 20.º da alegação do recurso de revista.

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