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- Metalinguagem - Verdade / Verossimilhança

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Texto

(1)

 Não esqueçam de estudar para o que é relevante para o Vestibular UERJ. Não

percam tempo estudando todo o conteúdo pedido, porque este é surreal e não vai

cair. Como sempre, vamos atentar e reforçar o que cai com mais frequência!

 Por isso não deixem de reforçar seus estudos em

Figuras de Linguagem

,

Valor

semântico dos conectivos

e

Texto argumentativo

(principalmente as

estratégias

argumentativas

e os

métodos de raciocínio

), que são muito frequentes nos exames

de qualificação da UERJ.

Neste slide vocês verão três conceitos que têm sido muito recorrentes nos

últimos exames de qualificação da UERJ. Aqui, aprenderemos o que são e

faremos as questões referentes a eles (Vestibular Estadual 2012 e 2013). Os

conceitos são os seguintes:

- Metalinguagem

(2)

Metalinguagem

A Metalinguagem é uma das 6 funções da linguagem e tem sido

recorrente a sua presença nos últimos Exames de Qualificação

do Vestibular UERJ. Portanto, vamos entendê-la!

Toda comunicação, para ocorrer, exige um código, ou seja, um sistema de

sinais e fatores que permitam que a comunicação se realize. Por exemplo, em uma

conversa informal entre mãe e filha brasileiras, o código utilizado é a língua

portuguesa. Entretanto, há vários outros tipos de código (que podemos chamar

popularmente de linguagem), como a dança, a pintura e a escultura.

Quando um texto centraliza-se em seu próprio código de comunicação,

esclarecendo significados do código utilizado ou falando do próprio texto, dizemos

que há a Função Metalinguística. Um bom e simples exemplo é pensar na aula de

Língua Portuguesa, em que o professor utiliza a própria língua portuguesa para

refletir sobre ela e explicá-la.

Vamos observar, então, de que maneira isso foi cobrado nos últimos

exames da UERJ!!!

(3)

2° exame de Qualificação - Vestibular Estadual 2012

Texto I

A perspicácia, de René Magritte (1936)

Questão 1

Pode-se definir “metalinguagem” como a

linguagem que comenta a própria linguagem,

fenômeno presente na literatura e nas artes em

geral.

O quadro A perspicácia, do belga René

Magritte, é um exemplo de metalinguagem

porque:

(A) destaca a qualidade do traço artístico

(B) Mostra o pintor no momento da criação

(C) Implica a valorização da arte tradicional

(D) Indica a necessidade de inspiração concreta

(4)

Gabarito comentado

Nessa questão, deveríamos não só saber o conceito de

metalinguagem, como também ler atentamente o texto, que está

em linguagem não verbal por se tratar de uma tela do pintor belga

René Magritte. Como muitas outras questões da UERJ, esta nos

forneceu (resumidamente) o conceito de Metalinguagem e

informou que ela ocorria no quadro, de maneira que bastava

entendermos a ligação do quadro com o conceito de

metalinguagem.

No quadro, há um pintor que olha um ovo e pinta um

pássaro, ou seja, a linguagem específica da pintura está sendo

utilizada para refletir sobre ela mesma. Independente da

mensagem que o artista queria nos passar, trata-se de uma reflexão

sobre o ato de pintar e sobre o momento de criação de um artista

da pintura, o que caracteriza a metalinguagem. Portanto, é a

alternativa B que explica o porquê de o quadro apresentar

metalinguagem.

(5)

1° exame de Qualificação - Vestibular Estadual 2013

Texto II

Recordações do escrivão Isaías Caminha

Eu não sou literato, detesto com toda a paixão essa espécie de animal. O que observei neles, no tempo em que estive na redação do O Globo, foi o bastante para não os amar, nem os imitar. São

em geral de uma lastimável limitação de ideias, cheios de fórmulas, de receitas, só capazes de colher

fatos detalhados e impotentes para generalizar, curvados aos fortes e às ideias vencedoras, e antigas, adstritos a um infantil fetichismo do estilo e guiados por conceitos obsoletos e um pueril e errôneo critério de beleza. Se me esforço por fazê-lo literário é para que ele possa ser lido, pois quero falar das minhas dores e dos meus sofrimentos ao espírito geral e no seu interesse, com a linguagem acessível a ele. É esse o meu propósito, o meu único propósito. Não nego que para isso tenha procurado modelos e normas. Procurei-os, confesso; e, agora mesmo, ao alcance das mãos, tenho os autores que mais amo. (...) Confesso que os leio, que os estudo, que procuro descobrir nos grandes romancistas o segredo de fazer. Mas não é a ambição literária que me move ao procurar esse dom misterioso para animar e fazer viver estas pálidas Recordações. Com elas, queria modificar a opinião dos meus concidadãos, obrigá-los a pensar de outro modo, a não se encherem de hostilidade e má vontade quando encontrarem na vida um rapaz como eu e com os desejos que tinha há dez anos passados. Tento mostrar que são legítimos e, se não merecedores de apoio, pelo menos dignos de indiferença.

Entretanto, quantas dores, quantas angústias! Vivo aqui só, isto é, sem relações intelectuais de qualquer ordem. Cercam-me dois ou três bacharéis idiotas e um médico mezinheiro, repletos de orgulho de suas cartas que sabe Deus como tiraram. (...) Entretanto, se eu amanhã lhes fosse falar neste livro - que espanto! que sarcasmo! que crítica desanimadora não fariam. Depois que se foi o doutor Graciliano, excepcionalmente simples e esquecido de sua carta apergaminhada, nada digo das minhas leituras, não falo das minhas lucubrações intelectuais a ninguém, e minha mulher, quando me demoro escrevendo pela noite afora, grita-me do quarto:

(6)

- Vem dormir, Isaías! Deixa esse relatório para amanhã!

De forma que não tenho por onde aferir se as minhas Recordações preenchem o fim a que as destino; se a minha inabilidade literária está prejudicando completamente o seu pensamento. Que tortura! E não é só isso: envergonho-me por esta ou aquela passagem em que me acho, em que me dispo em frente de desconhecidos, como uma mulher pública... Sofro assim de tantos modos, por causa desta obra, que julgo que esse mal-estar, com que às vezes acordo, vem dela, unicamente dela. Quero abandoná-la; mas não posso absolutamente. De manhã, ao almoço, na coletoria, na botica, jantando, banhando-me, só penso nela. À noite, quando todos em casa se vão recolhendo, insensivelmente aproximo-me da mesa e escrevo furiosamente. Estou no sexto capítulo e ainda não me preocupei em fazê-la pública, anunciar e arranjar um bom recebimento dos detentores da opinião nacional. Que ela tenha a sorte que merecer, mas que possa também, amanhã ou daqui a séculos, despertar um escritor mais hábil que a refaça e que diga o que não pude nem soube dizer.

(...) Imagino como um escritor hábil não saberia dizer o que eu senti lá dentro. Eu que sofri e pensei não o sei narrar. Já por duas vezes, tentei escrever; mas, relendo a página, achei-a incolor, comum, e, sobretudo, pouco expressiva do que eu de fato tinha sentido.

LIMA BARRETO

Recordações do escrivão Isaías Caminha. São Paulo: Penguin Classics Companhia das Letras, 2010.

Questão 3

O texto de Lima Barreto explora o recurso da metalinguagem, ao comentar, na sua ficção, o

próprio ato de compor uma ficção. Esse recurso está exemplificado principalmente em:

(A) São em geral de uma lastimável limitação de ideias

(B) Vivo aqui só, isto é, sem relações intelectuais de qualquer ordem

(C) - Vem dormir, Isaías! Deixa esse relatório para amanhã!

(7)

Gabarito comentado

Mais uma vez, a UERJ nos fornece já no enunciado o conceito de

Metalinguagem. No entanto, em vez de identificarmos a relação do texto com o

conceito, deveríamos identificar em qual trecho do texto havia a forte presença

da metalinguagem. Esse tipo de questão também é bem comum nos vestibulares

em geral, ou seja, pedir que o vestibulando indique um exemplo do que está

sendo pedido no enunciado com frases do texto.

Um mesmo texto pode ter mais de uma função, como é o caso deste.

Aqui, verifica-se também a presença da função emotiva, já que há uma

expressão pessoal sobre o que está sendo dito. Isso está evidenciado na

alternativa B, em que o narrador comenta sobre si mesmo, seus sentimentos e

reflexões. No entanto, nesta questão, precisamos identificar em qual trecho há

de fato a metalinguagem, isto é, a ficção sendo utilizada para refletir e comentar

sobre o próprio ato de escrever ou sobre o momento de criação do escritor. Isso

aparece na alternativa D, na qual o escritor faz referência ao seu próprio

processo de escrita (“tentei escrever”; “relendo a página”).

(8)

Verdade / Verossimilhança

Assim como a Metalinguagem, os conceitos de Verdade e Verossimilhança e suas relações também têm aparecido em alguns Exames de Qualificação da UERJ. Portanto, vamos entendê-los!

Se pegarmos o dicionário da Academia Brasileira de Letras, teremos as seguintes definições: Verdade:

1. Aquilo que é real; verdadeiro: Às vezes a verdade dói. 2. Correspondência à realidade; exatidão: Seu

depoimento corresponde à verdade. 3. Princípio religioso, científico, moral, etc. em que se baseiam

doutrinas, crenas, atitudes: A ressurreição de Cristo é a verdade básica dos cristãos. Verossímil:

1. Que parece verdadeiro; com aparência de verdade; que tem probabilidade de ser verdadeiro. – verossimilhança.

Percebemos assim que há uma diferença entre o que é real e o que parece ser real ou tem a possibilidade de ser real. O conceito de verossimilhança é muito utilizado na área da Literatura e ficção em geral, pois as histórias (livros, filmes e etc) são feitas quase sempre a partir daquilo que é verossímil - e não necessariamente uma cópia da realidade. Um escritor ou cineasta, quando cria seus enredos, está tratando de acontecimentos da realidade, que presenciou ou vivenciou diretamente, ou está criando histórias que são apenas verossímeis, ou seja, que poderiam constituir fatos reais? Tudo isso é uma grande discussão, mas o importante é entendermos a diferença e relação que há entre esses dois conceitos. Para refletirmos um pouco mais, vamos ler uma crônica do professor da UERJ Gustavo Bernardo, publicada na Revista Eletrônica do Vestibular UERJ, que explica e reflete sobre esses conceitos, que é justamente o que os textos das provas da UERJ fazem.

(9)

Por que a verossimilhança é melhor do que a verdade?

Há milênios, Aristóteles afirmava: é melhor o verossímil que convença à verdade que não convença.

A tese aristotélica é bem demonstrada no curta-metragem “Mentira”, de Flávia Moraes, realizado em 1989 a partir de um conto de Luís Fernando Veríssimo.

Um marido pacato volta para casa do trabalho, mas demora mais do que o previsto no engarrafamento. Para piorar, o pneu do carro fura. Ele o troca com dificuldade. Quando acaba de pôr o pneu furado e o macaco na mala, sua aliança de casado escorre do dedo, rola pelo asfalto e mergulha no bueiro. E agora: o que ele vai dizer em casa?

Imagina-se dizendo toda a verdade, mas visualiza a mulher chorando e gritando que só uma mulher muito burra acreditaria naquela história, que é mentira, que na verdade ele perdeu a aliança no carpete felpudo do motel onde se divertia com a amante!

Não. A verdade não convence.

Quando chega em casa, o homem não diz nada, esperando a mulher perceber a falta da aliança. No jantar, a mulher de fato pergunta o que aconteceu com a aliança. Ele responde que não vai mentir: perdeu-a no carpete felpudo do motel onde estava com a amante e por isso mesmo vai entender se ela achar que o casamento acabou.

A mulher sai em silêncio da sala, segurando o choro. Depois de uma meia hora, ela retorna, calma, contida, embora com os olhos vermelhos, dizendo em voz baixa que o casamento deles está passando por uma crise, mas os dois juntos têm como superá-la, se quiserem muito. Então, com medo, ela lhe pergunta se ele quer; ele responde que “sim, claro, meu bem” e daí eles se abraçam.

The end, ou melhor: a happy end.

(10)

O herói pretende fugir de alguns bandidos disfarçado de leiteiro. Procura convencer o leiteiro verdadeiro a trocar de roupa com ele, mas conta a verdade: viu uma mulher ser assassinada no escritório por bandidos internacionais, essa mulher era uma espiã, os assassinos o estão perseguindo. O leiteiro não acredita em nada e não se dispõe a ajudá-lo.

O herói então muda a história, admitindo que mentiu: na verdade tivera uma aventura amorosa com uma bela mulher no seu escritório, mas agora precisa se esconder do marido dela: ele o espera, armado, do lado de fora. O leiteiro dá uma gargalhada e exclama: “homem, por que não disse antes? Agora entendo tudo!”. Imediatamente tira sua roupa de trabalho e a entrega ao outro, contente de poder ser solidário naquela situação.

A esposa – que não foi enganada, mas acha que foi – e o leiteiro – que foi enganado, mas acha que não foi representam o espectador e o leitor, que não querem a verdade mas sim o verossímil. A verdade tem o mau hábito de parecer inverossímil, isto é, de não parecer verdadeira.

A solução cabe bem à arte poética, mas pode gerar uma reação indignada naquelas pessoas que prezam muito a sinceridade: então é melhor mentir do que dizer a verdade?

A indignação não é boa conselheira, ela costuma simplificar demais os problemas: tudo se torna ou certo ou errado, ou verdade ou mentira, ou realidade ou ficção, quando a realidade mesma é muito mais complicada – por exemplo, nossa ficção sempre parte da realidade, nossa realidade é sempre construída por inúmeras ficções.

De fato, a verossimilhança não é igual à verdade, mas também não é igual à mentira. A verossimilhança se assemelha à verdade mas não se confunde com ela, representando antes a vontade da verdade do que a verdade mesma. Como já dissemos em outra crônica, nunca temos acesso à verdade completa, logo, a verdade é sempre não-toda. Entretanto, o fato de não termos acesso pleno à verdade não diminui a nossa vontade de sermos verdadeiros e a intensidade da nossa busca pela verdade.

(11)

A verdade mais importante daquele marido não era “perdi a aliança no bueiro”, mas sim: “eu não quero perder a minha mulher”. Certo de que a verdade não funcionaria, ele inventa uma história verossímil que, a despeito de envolver uma traição imaginária, funciona, ou seja: salva o seu casamento e até o revigora.

A verdade mais importante do herói de Hitchcock não era a de contar para o leiteiro o crime que testemunhou, mas sim a de arranjar rapidamente um disfarce para escapar dos assassinos. A segunda versão convence o leiteiro de ajudá-lo e ainda o deixa feliz por ser cúmplice de uma aventura masculina.

A superioridade da verossimilhança em relação à verdade pode ser demonstrada por outra via. Todo mundo conhece aquele tipo de pessoa que se gaba de dizer a verdade todo o tempo, doa a quem doer. Ora, se é verdade que essa pessoa só diz a verdade e toda verdade que lhe vem à cabeça, com certeza podemos considerá-la, na melhor das hipóteses, uma pessoa muito grosseira. Quem diz a sua verdade o tempo todo revela simplesmente falta de educação.

Se desejo conviver com as outras pessoas, minha verdade mais profunda tem a ver com esse desejo e não com a minha constatação de que Fulana estaria mais gorda ou mais velha. Logo, um comentário verossímil será aquele que traduza minha verdade profunda, e não um outro que se compreenda como uma ofensa ou uma grosseria.

Por isso, o poeta precisa ser um fingidor, fingindo a dor que deveras sente – como comentaremos na próxima crônica.

Fonte: http://www.revista.vestibular.uerj.br/coluna/coluna.php?seq_coluna=47

Agora que já lemos e refletimos sobre os conceitos de verdade e

(12)

1° exame de Qualificação - Vestibular Estadual 2012

Texto III

Memórias do cárcere

Resolvo-me a contar, depois de muita hesitação, casos passados há dez anos − e, antes de começar, digo os motivos por que silenciei e por que me decido. Não conservo notas: algumas que tomei foram inutilizadas, e assim, com o decorrer do tempo, ia-me parecendo cada vez mais difícil, quase impossível, redigir esta narrativa. Além disso, julgando a matéria superior às minhas forças, esperei que outros mais aptos se ocupassem dela. Não vai aqui falsa modéstia, como adiante se verá. Também me afligiu a ideia de jogar no papel criaturas vivas, sem disfarces, com os nomes que têm no registro civil. Repugnava-me deformá-las, dar-lhes pseudônimo, fazer do livro uma espécie de romance; mas teria eu o direito de utilizá-las em história presumivelmente verdadeira? Que diriam elas se se vissem impressas, realizando atos esquecidos, repetindo palavras contestáveis e obliteradas?

(...)

O receio de cometer indiscrição exibindo em público pessoas que tiveram comigo convivência forçada já não me apoquenta. Muitos desses antigos companheiros distanciaram-se, apagaram-se. Outros permaneceram junto a mim, ou vão reaparecendo ao cabo de longa ausência, alteram-se, completam-se, avivam recordações meio confusas − e não vejo inconveniência em mostrá-los.

(...)

E aqui chego à última objeção que me impus. Não resguardei os apontamentos obtidos em largos dias e meses de observação: num momento de aperto fui obrigado a atirá-los na água. Certamente me irão fazer falta, mas terá sido uma perda irreparável? Quase me inclino a supor que

(13)

foi bom privar-me desse material. Se ele existisse, ver-me-ia propenso a consultá-lo a cada instante, mortificar-me-ia por dizer com rigor a hora exata de uma partida, quantas demoradas tristezas se aqueciam ao sol pálido, em manhã de bruma, a cor das folhas que tombavam das árvores, num pátio branco, a forma dos montes verdes, tintos de luz, frases autênticas, gestos, gritos, gemidos. Mas que significa isso? Essas coisas verdadeiras podem não ser verossímeis.

E se esmoreceram, deixá-las no esquecimento: valiam pouco, pelo menos imagino que valiam pouco. Outras, porém, conservaram-se, cresceram, associaram-se, e é inevitável mencioná-las. Afirmarei que sejam absolutamente exatas? Leviandade. (...) Nesta reconstituição de fatos velhos, neste esmiuçamento, exponho o que notei, o que julgo ter notado. Outros devem possuir lembranças diversas. Não as contesto, mas espero que não recusem as minhas: conjugam-se, completam-se e me dão hoje impressão de realidade. Formamos um grupo muito complexo, que se desagregou. De repente nos surge a necessidade urgente de recompô-lo. Define-se o ambiente, as figuras se delineiam, vacilantes, ganham relevo, a ação começa. Com esforço desesperado arrancamos de cenas confusas alguns fragmentos. Dúvidas terríveis nos assaltam. De que modo reagiram os caracteres em determinadas circunstâncias? O ato que nos ocorre, nítido, irrecusável, terá sido realmente praticado? Não será incongruência? Certo a vida é cheia de incongruências, mas estaremos seguros de não nos havermos enganado? Nessas vacilações dolorosas, às vezes necessitamos confirmação, apelamos para reminiscências alheias, convencemo-nos de que a minúcia discrepante não é ilusão. Difícil é sabermos a causa dela, desenterrarmos pacientemente as condições que a determinaram. Como isso variava em excesso, era natural que variássemos também, apresentássemos falhas. Fiz o possível por entender aqueles homens, penetrar-lhes na alma, sentir as suas dores, admirar-lhes a relativa grandeza, enxergar nos seus defeitos a sombra dos meus defeitos. Foram apenas bons propósitos: devo ter-me revelado com frequência egoísta e mesquinho. E esse desabrochar de sentimentos maus era a pior tortura que nos podiam infligir naquele ano terrível.

GRACILIANO RAMOS

(14)

Questão 14

Essas coisas verdadeiras podem não ser verossímeis. (l. 25)

Com a frase acima, o escritor lembra um princípio básico da literatura: a verossimilhança –

isto é, a semelhança com a verdade – é mais importante do que a verdade mesma.

A melhor explicação para este princípio é a de que a invenção narrativa se mostra mais

convincente se:

(A) parece contar uma história real

(B) quer mostrar seu caráter ficcional

(C) busca apoiar-se em fatos conhecidos

(D) tenta desvelar as contradições sociais

(15)

Gabarito comentado

Para responder essa questão, você deveria ter não só os conceitos de verdade e

verossimilhança bem esclarecidos como também uma boa leitura do texto de Graciliano

Ramos. Deveríamos entender do que estava tratando o narrador de Memória do Cárcere.

Em todo o texto, o narrador discute suas hesitações e escolhas para escrever

suas lembranças, e isso é deixado claro no primeiro período do texto: “Resolve-me a

contar, depois de muita hesitação, casos passados há dez anos – e, antes de começar, digo

os motivos por que silenciei e por que me decido.” (grifo meu). Como se vê, o trecho

transcrito na prova de vestibular não são as lembranças, mas os motivos pelo qual o

narrador demorou tanto para escrever e suas reflexões sobre esse ato. Daí por diante, ele

vai comentando sobre o receio de falar sobre outras pessoas e o direito de escrever sobre

suas observações. Comenta ainda sobre até que ponto sua memória era fiel, qual era o

limite entre ficção e realidade no que ia contando, de modo que resolve deixar de lado

seus apontamentos sobre a observação da realidade e deixar-se criar.

É dessa forma que se estabelece a discussão da questão 14. Quando o narrador

afirma que “Essas coisas verdadeiras podem não ser verossímeis”, trata-se da mesma

discussão que o professor Gustavo Bernardo faz em sua crônica, ou seja, o que de fato

aconteceu pode não ter nenhuma aparência de real, por isso a preferência pela

verossimilhança (que é o que tem aparência de real). O enunciado então pede que o

aluno complete a explicação sobre este conceito, que é: a invenção narrativa se mostra

mais convincente se parece contar uma história real (A).

(16)

1° exame de Qualificação - Vestibular Estadual 2013

Texto III

Ciência e Hollywood

Infelizmente, é verdade: explosões não fazem barulho algum no espaço. Não me lembro de um só filme que tenha retratado isso direito. Pode ser que existam alguns, mas se existirem não fizeram muito sucesso. Sempre vemos explosões gigantescas, estrondos fantásticos. Para existir ruído é necessário um meio material que transporte as perturbações que chamamos de ondas sonoras. Na ausência de atmosfera, ou água, ou outro meio, as perturbações não têm onde se propagar. Para um produtor de cinema, a questão não passa pela ciência. Pelo menos não como prioridade. Seu interesse é tornar o filme emocionante, e explosões têm justamente este papel; roubar o som de uma grande espaçonave explodindo torna a cena bem sem graça.

Recentemente, o debate sobre as liberdades científicas tomadas pelo cinema tem aquecido. O sucesso do filme O dia depois de amanhã (The day after tomorrow), faturando mais de

meio bilhão de dólares, e seu cenário de uma idade do gelo ocorrendo em uma semana, em vez de

décadas ou, melhor ainda, centenas de anos, levantaram as sobrancelhas de cientistas mais rígidos que veem as distorções com desdém e esbugalharam os olhos dos espectadores (a maioria) que pouco ligam se a ciência está certa ou errada. Afinal, cinema é diversão.

Até recentemente, defendia a posição mais rígida, que filmes devem tentar ao máximo ser fiéis à ciência que retratam. Claro, isso sempre é bom. Mas não acredito mais que seja absolutamente necessário. Existe uma diferença crucial entre um filme comercial e um documentário científico. Óbvio, documentários devem retratar fielmente a ciência, educando e divertindo a população, mas filmes não têm necessariamente um compromisso pedagógico. As pessoas não vão ao cinema para serem educadas, ao menos como via de regra.

(17)

Claro, filmes históricos ou mesmo aqueles fiéis à ciência têm enorme valor cultural. Outros educam as emoções através da ficção. Mas, se existirem exageros, eles não deverão ser criticados como tal. Fantasmas não existem, mas filmes de terror sim. Pode-se argumentar que, no caso de filmes que versam sobre temas científicos, as pessoas vão ao cinema esperando uma ciência crível. Isso pode ser verdade, mas elas não deveriam basear suas conclusões no que diz o filme. No mínimo, o cinema pode servir como mecanismo de alerta para questões científicas importantes: o aquecimento global, a inteligência artificial, a engenharia genética, as guerras nucleares, os riscos espaciais como cometas ou asteroides etc. Mas o conteúdo não deve ser levado ao pé da letra. A arte distorce para persuadir. E o cinema moderno, com efeitos especiais absolutamente espetaculares, distorce com enorme facilidade e poder de persuasão.

O que os cientistas podem fazer, e isso está virando moda nas universidades norte-americanas, é usar filmes nas salas de aula para educar seus alunos sobre o que é cientificamente correto e o que é absurdo. Ou seja, usar o cinema como ferramenta pedagógica. Os alunos certamente prestarão muita atenção, muito mais do que em uma aula convencional. Com isso, será possível educar a população para que, no futuro, um número cada vez maior de pessoas possa discernir o real do imaginário.

MARCELO GLEISER Adaptado de www1.folha.uol.com.br.

Questão 10

A oposição entre “ciência” e “Hollywood”, expressa no título do artigo de Gleiser, corresponde a outra oposição bastante estudada no campo da literatura, que se verifica entre:

(A) acontecimento e opinião (B) historicismo e atualidade (C) verdade e verossimilhança

(18)

Gabarito comentado

É claro que, como estamos tratando do assunto verdade/verossimilhança,

vocês devem ter acertado essa questão, mas vamos entender por que acertaríamos

ou por que erraríamos e quais as características dessa questão e de outras da UERJ.

Como sempre, isso é o mais importante!

Mais uma vez, o aluno que tivesse os conceitos de verdade e

verossimilhança bem esclarecidos na cabeça perceberia que o texto trata o tempo

todo disso, isto é, dos filmes terem que tratar fielmente a realidade (ciência) ou terem

a liberdade de criar o que apenas parecesse com a realidade para o espectador do

filme, sem ter compromisso com ela (verossimilhança).

Por isso é que a oposição já expressa no título (“Ciência e Hollywood”)

refere-se também à oposição entre verdade e verossimilhança (alternativa C). As

outras oposições que aparecem não têm relação com a discussão feita no texto, por

isso é sempre tão importante fazer leituras muito atentas dos textos do vestibular.

(19)

Galera, espero que tenham gostado dos slides e entendido o que é

metalinguagem e verdade/verossimilhança, mas não esqueçam que

esse NÃO é o assunto mais relevante para UERJ, portanto estudem

com afinco aquilo que de fato tem grande chance de estar na prova

de domingo, que vocês já devem saber de cor, rs!

 Figuras de Linguagem

 Valor semântico dos conectivos

 Texto argumentativo (principalmente as

estratégias argumentativas e os métodos de

raciocínio

(20)

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