ISSN: 1678-0345 ActaSciVet@ufrgs.br
Universidade Federal do Rio Grande do Sul Brasil
Guerra, Priscila Regina; Ferraz, Sandra; de Campos, Thaís; Cardoso, Marisa
Perfil de resistência a antimicrobianos e avaliação da presença de grupos clonais em isolados de Salmonella Bredeney de linfonodos submandibulares de suínos e matéria-prima para fabricação de
embutidos
Acta Scientiae Veterinariae, vol. 39, núm. 4, 2011, pp. 1-6 Universidade Federal do Rio Grande do Sul
Porto Alegre, Brasil
Disponível em: http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=289022118008
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N Acta Scientiae Veterinariae, 2011. 39(4): 996.
ORIGINAL ARTICLE
Pub. 996 ISSN 1679-9216 (Online)
Perfil de resistência a antimicrobianos e avaliação da presença de grupos clonais
em isolados de Salmonella Bredeney de linfonodos submandibulares de suínos e
matéria-prima para fabricação de embutidos
Antimicrobial Resistance Profile and Assessment of Clonal Groups in Salmonella Bredeney Isolated from Pig Submandibular Lymph Nodes and Minced Meat for Sausage Production
Priscila Regina Guerra1, Sandra Ferraz2, Thaís de Campos1 & Marisa Cardoso1
ABSTRACT
Background: Salmonella is an important agent of the foodborne disease and can be vehiculated by products of animal origin. In recent years, the risk that pathogenic bacteria resistant to antimicrobial enter the food production chain and be transmitted to consumer is a growing concern. Salmonella Bredeney is one of the most prevalent serovar isolated from lymph nodes of slaughter pigs, and the contamination of pork with this serovar has been reported. Therefore, the purpose of this study was to determine the resistance profile and clonality of Salmonella Bredeney isolates from submandibular lymph nodes and minced meat originated from common slaughter pig batches.
Materials, Methods & Results: Fifty three isolates of Salmonella enterica serovar Bredeney from submandibular lymph nodes (n = 14) and minced meat used for fresh sausage production (n = 39) originated from five slaughter batch were evalu-ated. Antimicrobial resistance was determined by the agar disk diffusion tests using disks with the following antimicrobials: nalidixic acid (Na, 30 µg), ciprofloxacin (Cip, 5 µg), gentamicin (Cn, 10 µg), sulphonamide (S3, 300 µg) and tetracycline (Te, 30µg). Later on, isolates that presented the most common resistance profile were submitted to Xba I macrorestrition and analyzed by pulsed-field gel electrophoresis (PFGE). Among the S. Bredeney isolates, 40 (75.5%) were resistant to at least one of the tested antimicrobials. Resistance against tetracycline was the most frequent (32 isolates, 61.5%), followed by resistance to sulphonamide (n = 21, 39.6%), gentamicin (n = 5, 9.4%) and nalidixic acid (n = 3, 5.6%). All strains were susceptible to ciprofloxacin. The profile resistance to tetracycline-sulphonamide (TeS3) was detected in 16 isolates from minced meat and two isolated from lymph nodes. PFGE analysis of these isolates showed six different pulsotypes. The pulsotypeA1 was the most frequent among the isolates, and pulsotype A2 was present in isolates from submandibular lymph nodes and minced meat originated from a common slaughter batch.
Discussion: The analyzed isolated of Salmonella Bredeney showed lower multiresistance frequency when compared with previous reports. Resistance to tetracycline and sulphonamide were the most prevalent in line with other studies conducted with porcine Salmonella isolates. Overall, the resistance pattern TeS3 was the most common among the isolates, and was present in 16 isolates from minced meat and in two isolates from submandibular lymph nodes. This pattern is possibly related to the frequent prophylactic and therapeutic use of these antimicrobials in pigs. Strains presenting the resistance pattern TeS3 showed a high diversity of XbaI-pulsotypes. Nonetheless, it was possible to identify a common pulsotype between strains from lymph nodes and minced meat. Fresh pork sausage is not submitted to a thermal treatment step in its manufacturing process. Moreover, the survival of Salmonella strains at the refrigeration temperatures used during the shelf life of fresh pork sausages has been reported. In spite of the fact that pork sausages are mainly consumed after cooking, the hazard of cross-contamination during preparation and the insufficient thermal treatment leading to Salmonella-transmission to consumers, still remains. It leads to the conclusion that resistant Salmonella strains originated from slaughter pig can be present in pork products consumed by the population.
Keywords: multiresistence, pork, PFGE, sulphonamide, tetracycline, Salmonella Bredeney. Descritores: multiresistência, PFGE, suíno, sulfonamida, tetraciclina, Salmonella Bredeney.
Received: May 2011 www.ufrgs.br/actavet Accepted: August 2011
1Laboratório de Medicina Veterinária Preventiva, Departamento de Medicina Veterinária Preventiva (DMVP), Faculdade de Veterinária (FaVet),
Univer-sidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Av. Bento Gonçalves n. 9090, Bairro Agronomia, CEP 91540-000 Porto Alegre, RS, Brasil. 2Centro
de Diagnóstico Microbiológico Animal (CEDIMA), Centro de Ciências Agroveterinárias (CAV), Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC), Lages, SC, Brasil. CORRESPONDÊNCIA: M. Cardoso [mcardoso@ufrgs.br - Fax: +55 (51)3308-7305].
em isolados de Salmonella Bredney... Acta Scientiae Veterinariae. 39(4): 996.
INTRODUÇÃO
As bactérias do gênero Salmonella são impor-tantes agentes causadores de Enfermidades Transmiti-das por Alimentos (ETA) em humanos, sendo a maioria dos casos associada ao consumo de produtos de origem animal [21]. Estima-se que cerca de 10% do total de casos de salmonelose sejam veiculados por produtos de origem suína [10]. No Brasil, estudos relatam ele-vada prevalência de suínos portadores de Salmonella ao abate [1,22]. As maiores frequências de isolamento têm sido encontradas em conteúdo intestinal (55,5%) [7] e linfonodos mesentéricos (71,6%) [22], entretanto, tonsilas e linfonodos submandibulares também podem albergar Salmonella.
Estima-se que a infecção de tonsilas possa ocorrer após 30 min de exposição ao ambiente conta-minado e que a bactéria possa invadir, subsequente-mente, os linfonodos regionais [24], tornando a cabeça uma área de alto risco para a contaminação da carcaça [4]. O isolamento de Salmonella Bredeney a partir de linfonodos submandibulares e de músculos da região da cabeça já foi relatado no sul do Brasil [7].
O risco de bactérias causadoras de ETA tornarem-se resistentes a antimicrobianos e entrarem na cadeia de produção de alimentos tem sido uma pre-ocupação crescente. A partir disso, um elevado número de estudos investigando o perfil de resistência de bac-térias ao longo da cadeia produtiva de animais tem sido conduzido nos últimos anos com o intuito de avaliar a disseminação de grupos de clonais resistentes [3,5,6, 2,15,17]. Assim, o objetivo desse estudo foi determinar o perfil de resistência e clonalidade de isolados de S. Bredeney originados de linfonodos submandibulares e de matéria-prima para embutidos provenientes dos mesmos lotes de suínos abatidos.
MATERIAIS E MÉTODOS
Foram analisados 53 isolados de Salmonella Bredeney, pertencentes à coleção de culturas do Setor de Medicina Veterinária-UFRGS, provenientes de lin-fonodos submandibulares (n = 14) originados de cinco lotes de abate de um único matadouro-frigorífico e de carne moída utilizada na elaboração de embutidos (n = 39) proveniente dos mesmos lotes de abate.
Os isolados, mantidos a -20oC em caldo de infusão cérebro e coração (BHI), acrescido de 20% de glicerol, foram recuperados em caldo BHI e
testados quanto ao seu perfil de suscetibilidade aos antimicrobianos, pelo método de disco-difusão em ágar Mueller-Hinton1 O teste foi conduzido de acor-do com protocolo padronizaacor-do [8], utilizanacor-do como cepa controle Escherichia coli (ATCC#25922). Para a realização dos testes foram selecionados os seguintes discos de antimicrobianos1: ácido nalidíxico (Na, 30 µg), ciprofloxacina (Cip, 5 µg), gentamicina (Cn, 10 µg), sulfonamida (S3, 300 µg) e tetraciclina (Te, 30 µg). Isolados que apresentaram o perfil de resistên-cia mais frequentemente observado foram submetidos à macrorestrição de DNA total, seguida de eletrofo-rese em gel de campo pulsado (PFGE), de acordo com o protocolo do PulseNet [20]. Os isolados foram submetidos à clivagem com XbaI2. A eletroforese foi realizada em gel de agarose 1%, utilizando tampão 0,5% Tris-borato-EDTA em sistema CHEF DR-II3 com 6 Volts/cm por 20 h a 14ºC, com um tempo inicial de mudança de polaridade de 2 min e 16 s e um tempo final de mudança de polaridade de 63,8 s. Salmonella Braenderup (ATCC# BAA-664) serviu como refe-rência de tamanho dos fragmentos gerados. Após a eletroforese, o gel foi corado em solução de brometo de etídio4 (2 µg/mL), fotografado em fotodocumentador Gel Logic 2200 Pro® e a imagem capturada e digitali-zada pelo sistema Kodak®. O perfil de macrorestrição foi analisado visualmente e cada posição de banda foi determinada. Isolados com diferença de uma banda foram classificados como clones distintos.
RESULTADOS
Do total de isolados, 40 (75,5%) foram resis-tentes a pelo menos um dos antimicrobianos testados. A resistência frente à tetraciclina foi a mais freqüen-temente encontrada (32 isolados, 61,5%), seguida da resistência à sulfonamida (n = 21, 39,6%), gentamicina (n = 5, 9,4%) e ácido nalidíxico (n = 3, 5,6%). Todos os isolados foram suscetíveis à ciprofloxacina. Os perfis de resistência que incluíam tetraciclina e sulfonamida foram os predominantes entre os isolados de ambas as origens (Tabela1). Entre isolados originados de linfonodos submandibulares o perfil resistência so-mente à tetraciclina (Te) foi o mais encontrado (9/14, 64,3%), enquanto que entre os isolados de matéria--prima o perfil resistência à tetraciclina-sulfonamida (TeS3) foi o mais frequente (16/39, 41,0%). O perfil TeS3 foi encontrado em dois isolados de linfonodos submandibulares.
N
A clivagem com XbaI dos isolados que apre-sentaram perfil de resistência TeS3 gerou de 12 a 14 fragmentos com tamanho entre 1.200 e 78,2 kb (Figura 1). Seis pulsotipos (A1-A6) resultaram da análise por PFGE: o pulsotipo A1 foi o mais frequente entre os isolados, estando presente em sete isolados de dois lotes de abate distintos; A2 incluiu quatro isolados, sendo dois de linfonodos submandibulares e dois de matéria-prima para embutidos originados de mesmo lote de abate; A3 foi encontrado em quatro isolados originados de um lote de abate. Os demais três pulso-tipos (A4-A6) foram detectados em isolados únicos.
DISCUSSÃO
A presença de isolados do gênero Salmonella resistentes á antimicrobianos em alimentos que chegam à mesa do consumidor representa risco, uma vez que pacientes com quadros clínicos graves de salmonelose podem necessitar antibioticoterapia. É amplamente aceito que cepas resistentes podem ser selecionadas em animais pelo uso de antimicrobianos e chegar até o produto final durante o abate e processamento. Por conta disso, o monitoramento de perfis de resistência deve ser conduzido em isolados originados de toda a cadeia de produção de alimentos.
Tabela 1. Perfis de resistência a antimicrobianos de isolados de Salmonella Bredeney
originados de amostras de linfonodos submandibulares de suínos e de matéria-prima para fabricação embutidos.
*Te: tetraciclina; Cn: gentamicina; S3: sulfonamida; Na: ácido nalidíxico.
Figura 1. Padrão de macrorestrição por XbaI de isolados de Salmonella
Bredeney resistentes à tetraciclina-sulfonamida, originados de amostras de linfonodos submandibulares ou de matéria-prima de embutidos proveniente de cinco lotes de abate. Isolados 1-6: pulsotipo A1, lote 4; Isolado 7: pulsotipo A1, lote 3; Isolado 8: pulsotipo A2, lote 1; Isolado 9: pulsotipo A2, lote 2; Isolados 10-11: pulsotipo A2, lote 2; Isolados 12,14,16,17: pulsotipo A3, lote 5; Isolado 13: pulsotipo A4, lote 5; Isolado 15: pulsotipo A5, lote 4; Isolado 18: pulsotipo A6, lote 4. Em negrito os isolados de linfonodos. M, marcador de peso molecular (em kilobases), Salmonella Braenderup clivada com XbaI.
em isolados de Salmonella Bredney... Acta Scientiae Veterinariae. 39(4): 996.
No presente estudo, isolados de S. Bredeney não apresentaram frequência elevada de multirresistên-cia, como descrito em outros estudos [5,6,12,15,16]. A resistência contra tetraciclina e sulfonamida foi a mais frequentemente encontrada, perfil que tem sido repor-tado em diversos sorovares de Salmonella provenientes de suínos, bem como de outras origens [12,13,17]. Em relação á isolados originados de suínos, o longo tempo de uso terapêutico e profilático dessas classes de antimicrobianos tem sido considerado como causa provável de seleção de isolados resistentes [6,15]. Por outro lado, variações nos perfis de resistência são co-mumente observadas entre tipos de amostras e regiões de isolamento [17], e relacionam-se com a seleção de amostras resistentes pelo uso dos antimicrobianos. Notadamente, o modelo de exploração de suínos em um sistema verticalizado de produção pode levar à associação mais evidente dos perfis de resistência à agroindústria de origem dos animais do que à região geográfica de origem dos isolados [2], o que reflete o protocolo de uso de antimicrobianos adotado pelas empresas no manejo dos animais.
A emergência de isolados resistentes às fluoro-quinolonas tem sido investigada, principalmente pelo fato de ser a droga de eleição nos casos em humanos que necessitam de tratamento [3,14,23]. No presente estudo não foram encontrados isolados resistentes à ci-profloxacina, entretanto ocorreram perfis de resistência ao ácido nalidíxico em isolados de matéria-prima para embutidos. Estudos têm demonstrado que a resistência ao ácido nalidíxico pode estar associada à diminuição da suscetibilidade de isolados de Salmonella frente às fluoroquinolonas [14], portanto esse resultado reforça a necessidade de prosseguir com o monitoramento de isolados resistentes a esse princípio ativo.
Os isolados de matéria-prima que apresenta-vam perfil comum de resistência (TeS3) demonstraram diversidade de pulsotipos, sendo a variação relacionada com os lotes de origem dos animais. Foi possível, ain-da, observar tanto a ocorrência de pulsotipos comuns em diferentes lotes (A1, A2), como diversidade de pulsotipos em um mesmo lote de origem (A3, A4). A técnica de PFGE tem sido utilizada com sucesso para a caracterização de isolados de Salmonella e para
identificar clonalidade entre isolados de diferentes origens [2,9,12]. No presente estudo foi possível de-monstrar a clonalidade entre isolados de linfonodos e de matéria-prima, indicando que isolados resistentes que chegam ao matadouro-frigorífico infectando os suínos podem persistir após o processamento e chegar ao produto final.
Os embutidos podem ser elaborados de diver-sas formas, podendo ser submetidos ao cozimento ou processo de cura. A linguiça frescal, produto altamente consumido na região sul do país, não apresenta uma etapa de tratamento térmico ou cura na sua elaboração, possibilitando que isolados de Salmonella permane-çam viáveis no produto final. A ocorrência de embu-tidos contaminados pode ser detectada no comércio, como demonstrado em estudos conduzidos no Brasil e em outros países [11,18]. Da mesma forma, foi demonstrado que a manutenção em temperaturas de refrigeração, durante o período de comercialização, não é capaz de diminuir a população de Salmonella presente no produto [19]. Apesar de linguiça frescal ser tipicamente consumida após cozimento, e o risco de ocorrência de casos de salmonelose devido ao consu-mo desse produto ter sido estimado coconsu-mo baixo [19], persiste a possibilidade de contaminação cruzada de outros alimentos durante a manipulação, ou a veicula-ção de Salmonella após tratamento térmico insuficiente desse produto. Nesse contexto, a possibilidade de transmissão de isolados resistentes por linguiça frescal de origem suína não pode ser descartada.
CONCLUSÃO
Isolados resistentes de Salmonella Bredeney oriundos de suínos abatidos podem contaminar a matéria-prima de embutidos e chegar até o consumidor. NOTAS INFORMATIVAS
1Oxoid®, Cambridge, Reino Unido. 2Fermentas, St. Leon-Rot, Alemanha.
3BioRad Laboratories, Hercules, Estados Unidos. 4Sigma®, St. Louis, Estados Unidos.
Declaration of interest. The authors report no conflicts of
interest. The authors alone are responsible for the content and writing of the paper.
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