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PR Tarcila Kuhn Alves de Paula

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Academic year: 2021

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CENTRO-OESTE – UNICENTRO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DESENVOLVIMENTO COMUNITÁRIO

TARCILA KUHN ALVES DE PAULA

FUMO E AGRICULTURA FAMILIAR NO CENTRO SUL DO ESTADO DO PARANÁ: CONSIDERAÇÕES A PARTIR DE UMA HISTÓRIA DAS PERCEPÇÕES

IRATI 2015

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FUMO E AGRICULTURA FAMILIAR NO CENTRO SUL DO ESTADO DO PARANÁ: CONSIDERAÇÕES A PARTIR DE UMA HISTÓRIA DAS PERCEPÇÕES

Dissertação apresentada como requisito parcial à obtenção do grau de Mestre em Desenvolvimento Comunitário, Curso de Pós-Graduação Mestrado Interdisciplinar em Desenvolvimento Comunitário, do setor Interdisciplinar da UNICENTRO.

Orientador: Prof. Dr. Jó Klanovicz

IRATI 2015

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TERMO DE APROVAÇÃO

TARCILA KUHN ALVES DE PAULA

FUMO E AGRICULTURA FAMILIAR NO CENTRO SUL DO ESTADO DO PARANÁ: CONSIDERAÇÕES A PARTIR DE UMA HISTÓRIA DAS PERCEPÇÕES

Dissertação aprovada em 27/08/2015 como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre no curso de Pós-Graduação Mestrado Interdisciplinar em Desenvolvimento Comunitário, área de concentração Interdisciplinar da Universidade Estadual do Centro-Oeste – UNICENTRO, pela seguinte banca examinadora:

Orientador: Profª. Dr. Jó Klanovicz Instituição: UNICENTRO

Prof. Drª. Luciana R. F. Klanovicz Instituição: UNICENTRO

Prof. Drª. Samira Perucchi Moretto

Instituição: Universidade Estadual de Goiás

Profª. Dr. Claiton Marcio da Silva

Instituição: Universidade Federal da Fronteira Sul

Prof. Dr. Emerson Carraro Instituição: UNICENTRO

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Primeiramente agradeço a sabedoria concedida pelo Divino Espírito Santo. Também gradeço à mãe Maria, por todo o incentivo espiritual que me concederam.

Ao meu orientador, professor Dr. Jó Klanovicz, que em nenhum momento deixou de ter paciência e sempre pediu para que me mantivesse calma, dizendo que os problemas se resolveriam. Seu apoio foi fundamental para a conclusão dessa etapa da minha vida.

Agradeço a minha mãe, meu maior exemplo de vida e superação, que desde o início dessa trajetória acadêmica esteve comigo. Obrigada por ter me ajudado a fazer o projeto de mestrado e lido incansavelmente esta dissertação. Ao meu pai, que sempre esteve me cobrando sobre os prazos, me levou para Irati e Guarapuava inúmeras vezes, me acalmou quando eu estava nervosa e incentou a continuidade do meu aprendizado. À minha irmã e amiga, Priscila, que sempre soube ouvir e dar os melhores conselhos. Vocês tiveram papel fundamental em mais essa fase da minha vida. Obrigada por tudo.

À família Barbieri, pela acolhida, incentivo e todas as palavras de carinho. Especialmente a vó Leoni (in memorian). Família também se constitui por aquelas pessoas que podemos escolher e eu escolhi estar ao lado de vocês, obrigada por tornarem essa possibilidade recíproca.

Ao amigo Mohamad Fathallah Hajar Neto, pessoa que teve um papel importante na formação de quem eu sou e que durante o ano de 2013 esteve presente em toda a construção da minha vida acadêmica, sempre me incentivando. Desocupar os espaços e reaprender a olhar o outro é fundamental. Que nos lembremos sempre com zelo e cuidado tudo aquilo que nos fez permanecer durante muito tempo ao longo dessa travessia. Consciência tranquila e coração em paz.

Aos professores e professoras do Programa de Pós Graduação Interdisciplinar em Desenvolvimento Comunitário, em especial aos que tive maior contato durante os anos de mestrado: Poliana Fabíula Cardozo, Cristina Ide Fujinaga, Rafael Siqueira Guimarães, Maria Fernanda Bagarollo. Agradeço também ao secretário do programa, Cesar Zanoni, que sempre respondeu minhas dúvidas com bom humor.

Às professoras Dras. Luciana R. F. Klanovicz e Samira Perucchi Moretto, por aceitarem fazer parte da banca, pela leitura e sugestões.

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Às professoras Dras. Rosemeri Moreira, Rosemeire dos Santos Brito e Elisabete Regina de Oliveira, por serem exemplos enquanto mulheres e profissionais.

Ao meu co orientador, professor Dr. Erivelton Fontana de Laat, pelas críticas construtivas e pelo incentivo.

À todos as e os colegas de turma do mestrado, pessoas as quais estive compartilhando momentos de angústias e vitórias. Cito aqui pessoas em especial: Caroline Holm e Karlla Cassol, grandes exemplos de dedicaçãoe e amizade, obrigada por sempre compartilharem conhecimentos e demonstrarem palavras de carinho.

Agradeço também as companheiras de viagem, Renata, Carla Orasmus e Samara, nossas voltas de Irati para Palmeira/Curitiba, muitas vezes eram a melhor parte do meu dia. À Briena, por todas as palavras de carinho e conforto para uma pessoa tão ansiosa quanto eu!

À amiga Caroline Becher, que sem sombra de dúvidas foi uma das pessoas mais importantes no processo de confecção e conclusão desta dissertação, estando presente desde o início do curso, demonstrando receptividade, companheirismo, empenho e muita paciência. Você foi quem mais ouviu minhas preocupações, mais incentivou e mais acalmou. Obrigada por toda a amizade! Você sempre será lembrada com amor.

Às pessoas que caminham ao meu lado há anos, e sempre demonstram amizade, dedicação e carinho: Claudia de Souza, Danile Visniesck, Ágatha Transfeld, Lucimara Cieslak, Thaísa Pasternak e Luciana Chociay.

Às amigas que são de outras vidas: Hellynn Voss e Mariane Barbieri. Vocês não falham em nenhum momento e eu não tenho palavras para agradecer.

Aos funcionários do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Palmeira, e à todas as famílias fumicultoras, obrigada pelo apoio, por terem aberto as portas de suas casas para me receberem. Vocês são exemplos de garra, determinação e sabedoria.

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A cidade de Palmeira está localizada na região Centro Sul do Estado do Paraná, e apresenta-se como pertencente ao Núcleo Regioal onde predomina e concentra-se a maior produção de tabaco do Paraná, produzido especialmente por agricultores e agricultoras familiares. Dentro desta realidade, se faz necessário refletir sobre o trabalho infantil, um problema global muito debatido nas últimas décadas. Dentro da lógica de produção fumageira, o trabalho realizado por crianças e adolescentes é muitas vezes naturalizado. A junção desses dois fatores deu origem a problemática desta dissertação: Entender, a partir de uma História das percepções, quais motivos levam os pais e as mães produtores e produtoras de tabaco, inserirem ou não, seus filhos neste ofício, ou seja, como se dá o entendimento do trabalho infantil para este público que, em sua ampla maioria, trabalhou na produção de tabaco quando criança. Para alcançar o objetivo da pesquisa foram utilizados relatos a partir da história de vida de pais e mães produtores e produtoras de tabaco e também entrevistas com filhos e filhas de produtores e produtoras.

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The city of Palmeira is located in the South Central region of Paraná, presents itself as belonging to the core Regioal dominated and focuses most Paraná tobacco production, produced especially for family farmers. Within this reality, it is necessary to reflect on child labor, a global issue much debated in recent decades. Within the tobacco production logic, the work done by children and adolescents is often naturalized. The combination of these two factors gave rise to problems of this thesis: Understand, from a history of perceptions, what reasons lead fathers and mothers producers and tobacco producers, insert or not, your children this craft, ie as gives the understanding of child labor for this audience that in their overwhelming majority, he worked as a child in tobacco production. To achieve the objective of the research reports were used from the life story of fathers and mothers producers and producers of tobacco and also interviews with children and farmers and producers daughters.

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ABRINQ – Associação Brasileira dos Fabricantes de Brinquedos AFUBRA – Associação dos Fumicultores do Brasil

CQCT – Convenção Quadro do Controle de Tabaco DERAL – Departamento de Economia Rural

ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente EPI – Equipamento de Proteção Individual

FEBEM – Fundação Estadual para o Bem Estar do Menor FIA – Fundação para a Infância e a Adolescência

FNPETI – Fórum de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil FUNABEM – Fundacão Nacional do Bem Estar do Menor

IAP – Instituto Ambiental Paranaense

IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística INCA – Instituto Nacional de Câncer

IPEC – Programa Internacional para a Elminicação do Trabalho Infantil LISTA TIP – Lista das Piores Formas de Trabalho Infatil

LOAS – Lei Orgânica da Assistência Social MDA – Ministério do Desenvolvimento Agrário MTE – Ministério do Trabalho e Emprego NR 31 – Norma Regulamentadora 31 OMS – Organização Mundial da Saúde ONG – Organização não Governamental ONU – Organização das Nações Unidas

PETI – Programa de Erradicação do Trabalho Infantil

SINDITABACO – Sindicato Interestadual da Industria do Tabaco TST – Tribunal Superior do Trabalho

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Figura 1 - Principais importadores de fumo brasileiro ... 48

Figura 2 - Material da Campanha 29 de Agosto – Dia Nacional de Combate ao Fumo ... 58

Figura 3 – Idoso trabalhando na fumicultura ... 60

Figura 4 – EPI usado na fumicultura ... 63

Figura 5 – Depósito de agrotóxicos ... 64

Figura 6 – Luva usada para colher fumo ... 65

Figura 7 – Espaço de pernoite para que o fumicultor possa cuidar da secagem do fumo ... 66

Figura 8 – Visão interna da estufa ... 67

Figura 9 – Forno e motor de controle da temperatura da estufa de fumo ... 68

Figura 10 – Folhas de fumo após a secagem ... 69

Figura 11 – Equipamento de plantio de fumo ... 70

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Quadro 1 - População ocupada segundo as atividades econômicas ... 33 Quadro 2 - Principais Estados brasileiros na produção de tabaco em 2012 ... 49 Quadro 3 - Produção, rendimento médio e valor da produção agrícola 2012 ... 50

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INTRODUÇÃO ... 11

CAPÍTULO I - O DESPERTAR DA PESQUISA ... 24

1.1 O TRABALHO INFANTIL E SUA NATURALIZAÇÃO ... 24

1.2 DE ONDE SE FALA ... 30

1.3 ASPÉCTOS DEMOGRÁFICOS E SOCIOECONÔMICOS DE PALMEIRA/PR .. 32

1.4 O TRABALHO INFANTIL E A CRIAÇÃO DO PETI ... 34

1.5 O TRABALHO INFANTIL NA AGRICULTURA ... 35

1.6 METODOLOGIA ... 37

CAPÍTULO II - HISTORICIDADE DO TABACO ... 43

2.1 HISTÓRIA DO TABACO NO BRASIL ... 43

2.2 FATORES QUE DETERMINAM O PLANTIO DE FUMO NA REGIÃO SUL DO BRASIL ... 45

2.3 FUMICULTURA NO BRASIL ATUAL ... 47

2.4 A FUMICULTURA NO MUNICÍPIO DE PALMEIRA ... 49

2.5 CONDIÇÕES DE TRABALHO DO FUMICULTOR ... 51

2.6 AGRICULTURA FAMILIAR ... 54

2.7 O TABACO E O AMBIENTE ... 55

CAPÍTULO III - HISTÓRIA DAS PERCEPÇÕES ... 59

3.1 O INÍCIO: AS MEMÓRIAS SOBRE A INFÂNCIA ... 59

3.2 AS VANTAGENS DO PLANTAR FUMO SEGUNDO OS ENTREVISTADOS .... 61

3.3 O USO DOS E.P.I’s ... 62

3.4 RUPTURAS E CONTINUIDADES COM RELAÇÃO A TECNOLOGIA ... 65

3.5 RUPTURAS E CONTINUIDADES COM RELAÇÃO AO AMBIENTE ... 70

3.6 O TRABALHO INFANTIL NA FUMICULTURA ... 72

CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 74

REFERÊNCIAS ... 77

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INTRODUÇÃO

Esta dissertação tem o objetivo de discutir, de uma perspectiva interdisciplinar e com base em entrevistas com pais e mães fumicultores e fumicultoras e também com adolescentes e jovens, o trabalho infantil nas lavouras de fumo do município de Palmeira, no interior do estado do Paraná. Não interessa aqui a elaboração ou testagem de modelos teóricos que expliquem, de um ponto de vista macro, o trabalho infantil na fumicultura, o que é impossível com apenas quatro entrevistas com pais e mães fumicultores e fumicultoras e treze com adolescentes e jovens que têm histórico familiar de plantio de tabaco. Contudo, é importante considerar, quando de estudos interdisciplinares, que experiências individuais servem para discutir como atingem, influenciam, na esfera privada da pequena propriedade rural, conjuntos de leis, de regras, de tecnologias e de discursos públicos acerca da produção e consumo de tabaco no Brasil contemporâneo.

Alerto aos leitores que, para a confecção desta dissertação, fiz uso de entrevistas com pais e mães plantadores e plantadoras de fumo e com adolescentes filhas e filhos de fumicultores e fumicultoras e por questões de sigilo e ética, alterei deliberadamente os nomes dos entrevistados, substituindo os nomes dos pais e das mães fumicultores e fumicultoras por pseudônimos na forma de números, e o nome das e dos adolescentes e jovens por letras sem, contudo, alterar o teor das entrevistas.

A metodologia usada neste trabalho foi a História oral, pois acreditou-se que a partir dessa metodologia seria possível dar cabo aos questionamentos que inspiraram esta dissertação.

Durante toda minha trajetória como estudante do curso de licentiatura em História, pela Universidade Estadual do Centro Oeste, trabalhei com crianças e jovens da cidade de Palmeira/PR, primeiramente com estágio através da Prefeitura Municipal de Palmeira, nos anos de 2008 e 2009. No ano de 2010, mesmo enquanto acadêmica, iniciei a docência na rede pública estadual de educação, a qual atuo até o momento.

Logo no início de minha carreirra enquanto estagiária da Secretaria Municipal de Educação de Palmeira, tive contato com outros estagiários que trabalhavam no PETI (Programa de Erradicação do Trabalho Infantil), um programa do governo

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federal, destinado a crianças e adolescentes de 7 à 14 anos, que estejam em estado de trabalho infantil.

Este programa visa a retirada das crianças do trabalho infantil através do contra turno social alicerçado a concessão de bolsa para as famílias dessas crianças, desde que as mesmas estejam matriculadas na escola e com no mínimo 75% de frequência.

Na cidade de Palmeira/PR, o PETI está localizado na comunidade de Guarauninha, devido ao alto número de crianças e adolescentes em estado de vulnerabildade social e trabalho infantil especialmente na lavoura fumageira.

Nos anos de 2008 e 2009 meu estágio era na área de educação e não da assistência social, portanto não cheguei a ter contato direto com o público frequentador do programa e nem com os gestores municipais responsáveis pela aplicabilidade do PETI naquele momento.

Em 2010, quando comecei a dar aula na rede estadual, escolhi trabalhar no Colégio Agrícola de Palmeira/PR, e em uma escola do campo. Logo durante o primeiro bimestre naquele ano percebi que haviam muitos estudantes que deixavam de frequentar à escola por um determinado período e que eles faltavam porque era época de safra de fumo e os mesmos precisavam trabalhar, especialmente na colheita.

Outro aspecto que me chamou atenção foi de que alguns estudantes já tinham participado do PETI, e assim surgiam diversos comentários e conversas sobre o assunto durante minhas aulas, o que me fez despertar interesse sobre o tema. Tal interesse rendeu o projeto inicial desta dissertação, o qual a problemática norteadora da pesquisa era entender a aplicabilidade da proposta do PETI, enquanto contribuidora ou não para a formação das crianças e adolescentes da cidade de Palmeira/PR, porém, no decorrer do curso de mestrado o foco da pesquisa acabou mudando.

No ano de 2014, o PETI parou de funcionar devido à problemas nas intalações do prédio onde o programa era aplicado, com isso tive dificuldade em realizar minha pesquisa. Outro ponto que me fez mudar o direcionamento de meus estudos foi o fato do PETI estar passando por uma reformulação federal, portanto, na cidade de Palmeira o programa ainda está não voltou a funcionar, mas voltará assim que aconteçam todos os ajustes necessários.

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Ao mesmo tempo em que os rumos da pesquisa sobre as crianças em situação de trabalho infantil e o PETI se desconfiguraram, suscitaram questões em torno da agricultora e do agricultor familiar que me deixaram estremamente inquieta. Dessa maneira, com a soma dos impecílhos ao pesquisar o PETI, mais a inquietute perante algumas questões sobre a fumicultora e o fumicultor culminaram na mudança de rumo da pesquisa e, assim se formulou a pergunta a qual busquei resposta: qual o entendimento das fumicultoras e dos fumicultores de Palmeira/PR, sobre o trabalho infantil na lavoura de tabaco? A resposta dessa pergunta se concretizou nesta dissertação, onde pude perceber que as fumicultoras e os fumicultores de Palmeira/PR, tem uma grande preocupação com o futuro de seus filhos e filhas, assim, pretendem de alguma maneira ajudá-los e ajudá-las a iniciar um ofício, como uma espécie de garantia para o futuro, porém, este ofício não precisa necessáriamente ser na lavoura de tabaco.

A lavoura de tabaco significa uma importante fonte de renda para 162.410 fumicultoras e fumicultores dos três estados do sul do Brasil, que representam os maiores produtores de tabaco do país (AFUBRA/IGBG, 20013/2014). Porém, ao falar de fumicultura é necessário pensar outras questões tangentes a este tema além da geração de reda, como o trabalho infantil, a saúde da fumicultora e do fumicultor e o tabagismo, sendo este um tema extremamente debatido na contemporâneidade.

Cada vez mais associa-se o hábito de fumar com o surgimento de doenças cardiovasculares, enfisêma, impotência sexual, úlcera, bronquite e diversos tipos de câncer. Segundo o Instituto Nacional de Câncer (INCA), as doenças cardiovasculares e o câncer são as principais causas de morte no Brasil e, entre os tipos de câncer o de pulmão aparece em primeiro lugar em óbitos de tabagistas. De modo geral, o INCA mostra em suas estimativas que o tabagismo é responsável por 200 mil mortes por ano no Brasil, o que significa 23 pessoas por hora (BRASIL, 2009).

Com o impacto social que os dados acima apresentados causam, o INCA, enquanto órgão do Ministério da Saúde responsável por coordenar e executar o Programa de Controle do Tabagismo no Brasil, vem ampliando sua atuação com o intuito de diminuir o número de fumantes. Basta lembrar que até alguns anos atrás

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era comum pessoas fumarem em locais fechados, ou que eram permitidas propagandas de cigarros na televisão1.

Outra medida que teve bastante repercussão na sociedade e na mídia foi a exigência de que os fabricantes de cigarros/charutos ou qualquer produto advindo do tabaco, incluíssem em suas embalagens fotos e advertências sanitárias expondo os malefícios do tabagismo2.

Segundo Boeira e Guivant (2003), o anti tabagismo é antigo, em 1604, o rei da Inglaterra, Jaime I (1556-1625), escreveu a primeira obra nesse sentido, denominada de “Counterbast to Tobacco”. Vale destacar que essa preocupação com o antitabagismo não quer dizer que algum país está livre do cigarro, atualmente na Europa o cigarro é um produto presente e com poucas leis de combate.

No século XVII, vários países tentaram proibir o consumo de tabaco, mas isso aconteceu de maneira mais efetiva décadas mais tarde através de algumas religiões cristãs e também devido ao desenvolvimento de uma consciência crítica por parte dos médicos que já alertavam para os malefícios do tabagismo:

O papa Urbano VIII proíbe o uso de tabaco entre eclesiásticos em 1642. Mais tarde, na década de 1830, a Igreja Adventista (EUA) dá consistência a uma tradição cristã antitabagista e de combate ao alcoolismo. Mas a urbanização favorece a popularização do consumo. Paralelamente, emerge na década de 1860 a consciência crítica de médicos, que se somam aos religiosos na luta contra o vício. Formava-se assim a base de uma rede social antifumo ... (BOEIRA; GUIVANT, 2003, p. 3).

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1

Art. 2o É proibido o uso de cigarros, cigarrilhas, charutos, cachimbos ou qualquer outro produto fumígeno, derivado ou não do tabaco, em recinto coletivo fechado, privado ou público.

§ 3º Considera-se recinto coletivo o local fechado, de acesso público, destinado a permanente utilização simultânea por várias pessoas. (NR)

Art. 3º É vedada, em todo o território nacional, a propaganda comercial de cigarros, cigarrilhas, charutos, cachimbos ou qualquer outro produto fumígeno, derivado ou não do tabaco, com exceção apenas da exposição dos referidos produtos nos locais de vendas, desde que acompanhada das cláusulas de advertência a que se referem os §§ 2o, 3o e 4o deste artigo e da respectiva tabela de preços, que deve incluir o preço mínimo de venda no varejo de cigarros classificados no código 2402.20.00 da Tipi, vigente à época, conforme estabelecido pelo Poder Executivo.

2

§ 5º Nas embalagens de produtos fumígenos vendidas diretamente ao consumidor, as cláusulas de advertência a que se refere o § 2o deste artigo serão sequencialmente usadas, de forma simultânea ou rotativa, nesta última hipótese devendo variar no máximo a cada 5 (cinco) meses, inseridas, de forma legível e ostensivamente destacada, em 100% (cem por cento) de sua face posterior e de uma de suas laterais.

§ 6o A partir de 1o de janeiro de 2016, além das cláusulas de advertência mencionadas no § 5o deste artigo, nas embalagens de produtos fumígenos vendidas diretamente ao consumidor também deverá ser impresso um texto de advertência adicional ocupando 30% (trinta por cento) da parte inferior de sua face frontal.

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Percebe-se que o antibatagismo surgiu inicialmente como proibição da igreja, porém, sem muito sucesso devido a urbanização. Mais tarde essa preocupação também surgiu entre os estudiosos da área da saúde.

No início da década de 20 surgem leis antitabagistas nos EUA, mas as empresas conseguem driblar as legislações e assim o mercado de tabaco se difunde, mesmo que de forma ilegal. As leis restritivas serviram mais para concentrar o setor que para proibir, pois as empresas buscaram brechas na legislação, conseguindo ganhar o mercado e superar as críticas, especialmente com o lançamento do cigarro com filtro. Em 1960 e 1970 houveram investigações sobre riscos do tabagismo para a saúde, as vendas recuaram e as empresas fizeram estratégias de marketing e mercado extreno para defender seu domínio (BOEIRA; GUIVANT, 2003, p. 4).

Boeira e Guivante, citando Miles (1982) e Taylor (1984), relatam que foi devido ao reconhecimento da Organização Mundial da Sáude (OMS), da relação entre tabaco e algumas doenças que o mercado interno dos EUA começou a se fechar e assim consequentemente houve uma procura por novos espaços através do mercado externo (BOEIRA; GUIVANT, 2003, p. 4).

O pensamento em prol da saúde das pessoas em detrimento ao tabaco só vem crescendo a partir de vários órgãos da sociedade, através do setor da saúde, religioso, mas também da educação, de coletivos pró saúde e até mesmo ONG’S.

Atualmente com o intuito de diminuir o número de tabagistas são realizados estudos que tentam por exemplo, mapear o perfil do fumante e verificar quais fatores levaram essa pessoa a começar a fumar. Assim, percebe-se que históricamente existe uma grande preocupação com o tabagista, especialmente por parte do Estado.

Essa situação de preocupação do Estado com o tabagismo se torna clara quando observa-se a Convenção Quadro para o Controle do Tabaco (CQCT). Trata-se de um tratado de saúde pública da OMS, que começou a Trata-ser elaborado em 1999 e o qual possui uma adesão de 178 países. A partir do reconhecimento dos graves danos sanitários, sociais e econômicos decorrentes do tabagismo, esse tratado internacional busca reduzir o consumo, a comercialização e a produção do tabaco (SOUZA, 2009, p. 2).

No que diz respeito ao produtor de tabaco, existem dois artigos específicos na CQCT, o artigo 17 que se refere ao incentivo a diversificação nas propriedades

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fumicultoras no sentido de dar alternativas sócio econômicas e ambientais aos produtores que estejam dispostos a mudar de atividade e o artigo 18, que fala sobre a atenção e proteção ao meio ambiente e a saúde dos trabalhadores, no que diz respeito ao cultivo do tabaco (CQCT, 2003, p. 14).

Nota-se que há um descompasso entre a CQCT, seus objetivos e as políticas públicas que tem sido adotadas pelo Estado brasileiro em sua campanha contra o tabagismo. Enquanto é possível perceber que há um forte investimento em campanhas para impedir pessoas de fumar, não é possível perceber, pelo menos dentro do grupo de entrevistados, a mesma intensidade de esforços no sentido de conduzir o agricultor e a agricultora ao encerramento da atividade com o fumo. Muitos deles e delas sequer conhecem a CQCT.

Dizer que os agricultores e as agricultoras desconhecem a CQCT, contudo, não significa dizer que o Estado está ausente da discussão. O Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) vem promovendo chamadas públicas no Rio Grande do Sul, em Santa Catarina e no Paraná, os três estados com maior produção de tabaco do país, com vistas à conversão da fumicultura em outras atividades agrícolas.

As chamadas tem por objetivo divulgar a assistência técnica para quaisquer outras atividades em detrimento à fumicultura, por exemplo,a pecuária leiteira, a fruticultura e até o turismo rural, porém, o resultado da tentativa de diversificação nas propriedades fumageiras foi quase inexpressivo, pois o plantio de tabaco está intimamente ligado com a hereditariedade, a cultura, a geração de renda.

O Ministério do Trabalho e do Emprego (MTE), também somou esforços à CQCT, no que diz respeito ao cuidado com a saúde do fumicultor através da Norma Regulamentadora 31 (NR 31)3 que busca controlar os riscos ocupacionais em atividades de trabalhadores e trabalhadoras rurais. Fonseca (2007), considera que na fumicultura se destacam os riscos de acidentes, a carga horária de trabalho elevada, esforço físico em exesso, posturas viciosas, riscos químicos e intoxicação por agrotóxicos, nicotina, calor, stress, entre outros fatores que acabam por configurar um cenário prejudicial ao trabalhador e a trabalhadora.

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3

Disponível em: http://portal.mte.gov.br/data/files/8A7C816A4295EFDF0143067D95BD746A/NR-31%20(atualizada%202013).pdf

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Mesmo com esse cenário, segundo o INCA (2014) e o SINDITABACO (2014), existem 162.410 famílias produtoras de tabaco na região sul, quase todas inseridas no contexto do que oficialmente se considera agricultura familiar no Brasil.

Talvez a persistência na produção de fumo na agricultura familiar esteja ligada diretamente à rentabilidade que essa cultura agrícola oferece, sendo cultivada em pequenas áreas e em qualquer tipo de terreno. Em contextos de pequena propriedade, a conversão a outras atividades agrícolas ficaria inviabilizada diante desse quadro, conforme é possível observar através da fala de #D:

O pai, ele plantou fumo por burro, né? Porque não quis estudar e onde nós moramos não tem chance de conseguir algo mais rentável, só com o fumo, por causa da região. Soja também dava, mas nós não temos condição de comprar maquinário, daí lidamos com o fumo! #D, 2013.

O entrevistado #D, ao ser questionado sobre as razões de plantar fumo em sua propriedade afirma que ele e a família plantam fumo por dois motivos básicos: características georáficas do terreno e condições econômicas. O contexto da agricultura familiar fumageira não pode ser explicado apenas por uma lógica do mercado global de cigarros, deve-se levar em conta esses aspéctos específicos.

Se #D, 2013, afirma que, por uma condição de falta de dinheiro, planta fumo e não soja, que hoje representa o produto de maior área plantada no Brasil, isso significa que o fumo gera expectativas culturais e econômicas diversas no público entrevistado. Para alguns o tabaco é parte da vida, naturalizado, impregnado no cotidiano, quase que um produto fetichizado (WOLFF, 1999). , conforme afima #D, 2013:

Eu passo mal em todas as colheitas, fico com tontura e vômito a semana inteira. Mas vale a pena porque é passageiro! Nem meu pai e nem meu tio passam mal, só eu. O pai passava mal no começo só, agora não! Eu gosto de plantar fumo porque ficamos reunidos com a galera, com os amigos! E o dinheiro também ajuda (#D, 2013).

O adolescente #D, afima que gosta de plantar fumo por estar reúnido com os amigos e a família, e que o fato de passer mal não é necessáriamente um problema porque é algo passageiro, citando ainda seu pai como exemplo de alguém que passava mal, mas que com o passar do tempo se acostumou com o trabalho no fumo e não passa mais mal, ou seja, o entrevistado vê no exemplo do pai uma esperança de que um dia não passará mal com o trabalho no fumo.

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Através das entrevistas, precebe-se que algumas famílias aprovam e/ou necessitam que os filhos e filhas trabalhem na lavoura fumageira, outras famílias, contudo, afirmam que, se seus filhos e filhas tiverem que plantar fumo, preferem mudar de profissão, abandonar a agricultura. Um olhar mais minucioso sobre a questão nos revela uma preocupação mais pontual de vários entrevistados: o fumo acaba sendo um elemento fundamental para inserir os filhos e filhas na ótica do trabalho rentável da terra, para inseri-los no hábito do trabalho.

O universo do não trabalho nessas famílias é impensável, todos os adolescentes entrevistados sabem descrever o minuciosamente o trabalho na fumicutura, conforme descrevem os entrevistados #D, 2013:

Começamos com a semeadura, com os canteiros, com o preparo dos canteiros, uma lona grande cheia de água, sabe? Daí põem as bandejas semeadas já e vai cuidando, passando produto químico. Leva uns dois meses até o plantio na terra, daí até a colheita acho que leva mais um mês mais ou menos. Plantando eu não passo mal, porque é tipo, sabe maquininha de plantar feijão? Só que é diferente, é uma abertura em cima, dái põem a muda ali, enfia na terra e a muda certinho ali. Vai plantando, cuidando das mudas até chegar num ponto ideal pra colher. Colhe o baixeiro4, que é a primeira colheita e que é a mais ruim, a mais difícil de colher, daí tem a segunda. Também tem que classificar, que separar o melhor nas classes, que é o amarelho e o preto. Lá em casa separamos em três classes, depois tem o fardamento. (#D, 2013).

O adolescente descreve todo o processo de trabalho desde o início do plantio até a classificação do tabaco. No decorrer da entrevista ele também contou como era o processo de separação das folhas de tabaco, inclusive qual era a nomenclatura de cada tipo de folha e o valor das mesmas. Isso denota total conhecimento sobre o cultivo do fumo. Dessa maneira, percebe-se que o adolescente, que no ano da entrevista (2013), tinha 16 anos, provavelmente já estava inserido nesse contexto de trabalho há alguns anos. Outro exemplo de que as e os adolescentes tem total conhecimento do manejo do tabaco foi com a entrevistada #E, 2014:

Para cultivar o fumo a gente tem que plantar a semente emu ma bandeja de isopor, daí coloca num canteiro com água e depois conforme as mudas vão crescendo você tem que podá-las, a partir da quinta poda e se chover, você pode plantar na terra. Tem dois tipos de plantios: o direto que você tem que plantar aveia antes e nem esperar secar e amaçar, e o plantio normal, que é o que nós fazemos, que não planta aveia, mas daí você tem que carpi. Depois que o fumo cresce vem a colheita do baixeiro, e você vai colhendo. Para secar o fumo você tem que ter uma estufa com motor. O fumo fica 4 ))))))))))))))))))))))))))))))))))))))))))))))))))))))))

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dias e 5 noites secando, enquanto isso pode você ir colhendo e guardando o fumo no paiól. Depois vem a parte de classificar, embonecar5 e fazer o fardo, depois mandar para a companhia de fumo para daí chegar na fábrica de tabaco (#E, 2014).

Além do fato de descrever minunciosamente o processo de trabalho do tabaco, a adolescente demonstra também sabedoria sobre a agricultura de modo geral, isso é observado quando a entrevistada #E, (2014), diferencia o plantio direto do não direto.

Se faz necessário ressaltar que através das entrevistas, o jovem e a jovem do campo demonstram domínio sobre as práticas agrícolas, especialmente no que diz respeito ao fumo, obviamente, por ser o tipo de agricultura presente no dia a dia dos entrevitados e entrevistadas. É provavel que este conhecimento advém do próprio viver, pois o trabalhar é algo naturalizado, que faz parte inclusive da integração da família.

A maioria dos entrevistados começou a trabalhar com o fumo ainda enquanto crianças, assim, o plantar fumo aparece como uma questão hereditária, cultural, conforme afirma #D, 2013: “O pai da minha mãe plantava fumo, e plantava bastante, eu ajudo desde pequeno, desde os 6 anos começei a ajudar meus pais”. Também percebemos que o entrevistado #R, 2013, adquiriu o hábito do trabalho na fumicultura através da família: “Faz 12 anos que eu trabalho, tenho 18, comecei a trabalhar com 6, é que o pai e a mãe trabalhavam!” #R, 2013.

No mundo rural da agricultura familiar, e em especial no mundo rural da fumicultura, que é inerente à esse regime de uso da terra, adultos e crianças trabalham. É o seu dia a dia. Não se permite, de um ponto de vista ético e cultural, não trabalhar. O trabalho está antagônico ao não trabalho, seja na lavoura ou nas atividades domésticas:

Uma filha começou a trabalhar de ver, mas a mais nova não gosta muito, a mais velha tem 21 anos e a mais nova 19, por isso que faz tempo que eu estou incentivando a mais nova a estudar, fazer faculdade, não é só porque faz mal, é porque ela não gosta. Porque até a mais velha se formou no ensino médio, mas já estava grávida quando se formou, dai teve que assumir a filha e o marido, talvez se ela não tivesse engravidado ia tentar vestibular, porque ela era uma menina bem inteligente #2, 2015.

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São chamadas de bonecas ou manocas várias folhas de fumo de uma mesma classificação quando amarradas umas nas outras pelo talo.

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Neste momento a fumicultora foi interrompida pela filha que afirmou: eu não gosto porque faz mal e eu não levo jeito, e agora eu passei no vestibular, vou estudar. Sair daqui eu não quero, mas trabalhar com o fumo também não #HE, 2015.

Conforme a fala da fumicultora acima, percebemos a necessidade de trabalho, independentemente da esfera na qual a família está inserida, pois a entrevistada mostrou que gostaria que sua filha mais velha tivesse ingressado numa faculdade, tal como a mais nova, porém, como ela engravidou, isso inviabilizou seus estudos e a fez assumir o compromisso com o trabalho, o que poderia ser postergado com a faculdade. Portanto nesse caso, pode-se afirmar que o que está em pauta não é o trabalho na fumicultura, mas aprender algo que lhe garanta um trabalho.

Assim, esta dissertação está justamente voltada à problematização das intersecções que existem entre o fumo e os modos de vida das famílias fumicultoras, especialmente ao que tange o trabalho infantil. Nesse sentido vale ressaltar o trabalho como elemento fundamentalmente valorizado pelas famílias de agricultores e agricultoras. Assim, faz-se necessário conceituar o entendimento do conceito de trabalho adotado como norteador da interpretação das entrevistas bem como na elaboração desta dissertação:

O que chamamos de trabalho é uma invenção da modernidade. A forma sob a qual o conhecemos e praticamos, aquilo que é o cerne de nossa existência, individual, social, foi uma invenção, mais tarde generalizada do industrialismo. O “trabalho”, no sentido contemporâneo do termo, não se confude com os afazeres, repetidos dia após dia, necessarios à manutenção e à reproducão da vida de cada um; nem com o labor, por mais penoso que seja, que um indivíduo realiza para cumprir uma tarefa da qual ele mesmo e seus próximos serão destinados e os beneficiários; nem com o que empreendemos por conta própria, sem medir nosso tempo e esforço, cuja finalidade só interessa a nós mesmos e que ninguém poderia realizer em nosso lugar. Se chamamos a essas atividades “trabalho” - o “trabalho doméstico”, “trabalho do artista”, o “trabalho” de autoprodução -, fazêmo-los em um sentido radicalmente diverso do sentido que se emprega a noção de trabalho, fundamento da existência em sociedade, ao mesmo tempo sua essência e sua finalidade última (GORZ, 2003, p. 21).

Para Gortz, o entendimento do trabalho se dá como algo fundamental a existência humana e a vida em sociedade. Outras atividades também são chamadas de trabalho, mas de maneira geral, sem ter esse peso social que o trabalho aceito e reconhecimento pela sociedade têm. É algo diferente de qualquer ofício que

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empreendemos para nós, pois tem de ser reconhecido em sociedade, algo realizado na esfera pública, solicitado, reconhecido pelos outros além de nós. E é através deste trabalho que ganhamos identidade social, que nos inserimos em uma rede de relações, que somos reconhecidos (GORZ, A. 2003, p. 21).

Assim, a fumicultura enquanto atividade que não serve apenas aos fumicultores e fumicultoras, que está inserida numa esfera global, é portanto reconhecida e inclusive geradora de uma identidade própria ao trabalhador e a trabalhadora deste ramo. No interioir do estado do Paraná a fumicultura é uma atividade marcante na economia de pequenas propriedades ligadas à agricultura familiar.

O agricultor familiar é aquele que não detém área maior do que 4 módulos fiscais6, utiliza predominantemente mão de obra própria da família nas atividades econômicas de seu estabelecimento, tem percentual mínimo de renda familiar originado de atividades de seu estabelecimento e dirige sua propriedade com sua família (BRASIL, 2006).

Sabe-se que esta é a realidade das famílias fumicutoras do Brasil, especialmente no que toca nossa pesquisa, no centro sul do estado do Paraná, onde grande parte delas contam com a mão de obra inclusive infantil, conforme já ficou evidente nas entrevistas acima citadas.

O trabalho infantil na fumicultura é tido como um sério problema por organismos nacionais e internacionais e vem ganhando notoridade a partir das duas últimas décadas, especialmente a partir da emergência pública da problematização do tabagismo.

Três elementos se fundem a partir dos anos 1990: O estatuto da criança e do adolescente que começa a forçar a escolarização infantil e dar direitos à criança do ponto de vista jurídico no país. Lembremos que antes do estatuto, não existia a figura jurídica da criança em lei, apenas do menor (lei ainda de 1929). Outro elemento é a saúde pública, a preocupação com a saúde das crianças e adolescentes envolvidos em trabalho, e a emergências da criação de políticas públicas para minimizer o trabalho infantil, e também a criação de ONG’s, grupos de ajuda comunitária e o envolvimento social para a resolução do trabalho infantil.

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Segundo o Instituto Ambiental do Paraná (IAP), na cidade de Palmeira, um módulo fiscal corresponde a 16 hectares, assim, 4 módulos são correspondentes à 64 hectares.

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Deve-se lembrar que o desenvolvimento de uma criança não ocorre apenas nos aspéctos biológicos, mas num conjunto de relações interpressoais que abrangem também aspéctos psíquicos, afetivos, sociais e culturais que podem interferir no processo de crescimento das crianças e adolescentes.

A Organização Mundial do Trabalho, OIT (2009), esclarece que nem todo o trabalho realizado por criança e/ou adolescente é classificado como trabalho infantil, assim, o termo é reservado apenas a atividades de trabalho que privem a criança de sua infância e de sua dignidade, sendo este prejudicial ao seu desenvolvimento físico e mental e que atrapalhe/interrompa em seu processo de escolarização.

De acordo com a legislação adotada no Brasil, trabalho infantil é todo aquele exercido por qualquer pessoa abaixo de 16 anos de idade, embora seja permitido o trabalho a partir dos 14 anos, desde que na condição de aprendiz. É também proibido à adolescentes entre 16 e 18 anos trabalharem em atividades insalubres, perigosas ou penosas; de trabalho noturno; de trabalhos que envolvam cargas pesadas, jornadas longas; e, ainda, de trabalhos em locais ou serviços que lhes prejudiquem o bom desenvolvimento psíquico, moral e social (SCHWARTZMAN, 2001, p. 3-4).

Segundo a OIT, em setembro de 2013 estavam em condições de exploradas 168 milhões de crianças em todo o mundo, 11% de toda a população infanto-juvenil, estima-se que a metade deles, que corresponde a 85 milhões, nas piores formas de trabalho infantil (BRASIL, 2013).

De acordo com o Decreto 6.481 de 12 de junho de 2008, Artigo 1, mostra que na Lista das Piores Formas de Trabalho Intantil (TIP)7, o trabalho no processo produtivo e no beneficiamento do fumo está inserido como um dos piores e mais danosos tipos de trabalho, pois a criança e o adolescente estão exposto à diversos riscos criança estes riscos:

Esforço físico e posturas viciosas; exposição a poeiras orgânicas e seus contaminantes, como fungos e agrotóxicos; contato com substâncias tóxicas da própria planta; acidentes com animais peçonhentos; exposição, sem proteção adequada, à radiação solar, calor, umidade, chuva e frio; acidentes com instrumentos pérfuro-cortantes, levantamento e transporte de peso; exposição a poeiras orgânicas, ácidos e substâncias tóxicas (BRASIL, 2008).

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Considerando os riscos à que as crianças e adolescentes estão expostos durante o processo produtivo do tabaco e partindo de uma concepção à priori de que atualmente os fumicultores e fumicultoras e até mesmo as próprias crianças e adolescentes envolvidas no processo produtivo do tabaco têm conhecimento dos malefícios que essa atividade pode acarretar ao longo de suas vidas, esta dissertação objetiva compreender o entendimento dos pais e mães fumicultoras sobre o uso da mão de obra infantil na fumicultura, buscando identificar se ele é cultural ou econômico.

Vale ressaltar que estudar a utilização da força do trabalho infantil seja na fumicultura ou em quaisquer outras atividades, faz com que se compreenda a sociedade atual e o modo que o trabalho é visto nesta sociedade, pois o trabalho é estritamente específico e histórico.

Para atingir o objetivo proposto, esta dissertação foi dividido em três capítulos. O primeiro deles denominado “O despertar da pesquisa”, dedica-se a mostrar e historicizar o local onde a pesquisa foi realizada, a metologia adotada para a elaboração da dissertação e análise das fontes bem como historicizar a naturalização do trabalho infantil, tema central dessa pesquisa. O capítulo II, denominado “Historicidade do tabaco”, remonta a história do tabaco no Brasil e evidencia a importância do mesmo para os agricultores e agricultoras familiares, especialmente da região sul do país.

O terceiro capítulo, “História das percepções”, é escrito a partir da história de vida das fumicultoras e dos fumicultores, onde elas e eles descrevem minunciosamente suas práticas e suas formações e entendimentos de mundo a partir do trabalho com o tabaco, assim, este capítulo mostra as percepções dos produtores e das produtoras de fumo sobre suas práticas e sobre o trabalho infantil.

Pode-se afirmar que o trabalho infantil dentro da realidade exposta nessa dissertação, mostra um viés de como a sociedade está organizada, mesmo se tratando de um local específico, demonstra como esta sociedade se torna naturalizadora da lógica produtiva que utiliza prematuramente a força de trabalho infantil para garantir os meios de sobrevivência, outras vezes, porém, essa lógica trabalhista permeia por um viés cultural. )

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CAPÍTULO I

O DESPERTAR DA PESQUISA

Para as pessoas lembramos que, se existe menor marginalizado (e eles são milhões!), não foram eles que se automarginalizaram. Sua existência implica a de uma sociedade marginalizadora – esta, sim, a verdadeira responsável por sua marginalização. O desemprego, o subemprego, a injusta distribuição de renda, a política salarial desumana, estes são os primeiros e mais básicos responsáveis pela existência do problema. Antes de vermos e condenarmos o pecado pessoal de um homem, de uma mulher ou de uma criança, devemos abrir os olhos para o pecado estrutural de uma sociedade erguida sobre a miséria e a injustiça. (Antonio Carlos Gomes da Costa, 1999) Apud. Dantas, Nozângela Maria Rolim, 2007.

1.1 O TRABALHO INFANTIL E SUA NATURALIZAÇÃO

Segundo Kassouf (2007, p. 324), o trabalho infantil não é um tema recente da literatura, mas apesar de não ter iniciado com a Revolução Industrial, foi a partir dela que muitos historiadores apontaram um agravamento para a utilização de mão de obra infantil nessa época. O que houve de lá para cá foi um aumento dos estudos evidenciando os prejuízos que esse tipo de trabalho trás à vida das crianças e adolescentes. Em 1861, o senso da Inglaterra mostrava que quase 37% dos meninos e 21% das meninas de 10 à 14 anos trabalhavam (KASSOUF, 2007, p. 324).

Vale destacar que no período medieval e moderno as crianças já eram envolvidas em atividades laborais, mas foi a partir da era industrial que elas passaram a se tornar peças fundamentais na sociedade e passaram a ganhar visibilidade.

O sociólogo polonês Zygmunt Bauman (2003), trata a Revolução Industrial como a emancipação de alguns que exige a supressão de outros, aqui, cabe afimar que nesse sentido, a emancipação pertence aos donos dos meios de produção e a supressão cabe aos donos da força de trabalho, inclusive as crianças e adolescentes.

Nesse contexto inicia-se uma vigilância e um controle sobre o trabalho, e cria-se uma consciência coletiva “forçada” de que o trabalho dignifica o homem e é capaz de mover a história e as sociedades. Cabe aq ui citar o “Instituto do trabalho bem-feito”, termo que Veblen escolheu para descrever um possível gosto natural

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pelo trabalho efetivo e um desapreço pelo esforço fútil, que em sua opinião, está presente em todos os seres humanos (BAUMAN, 2003, p. 31).

O trabalho infantil ganha uma lógica que se cristaliza com a construção de discursos do senso comum de que o trabalho aparece como uma alternativa para ocupar a infância e evitar que crianças e adolescentes trilhem o mau caminho, como a ociosidade, a mendingancia e a vadiagem (RIZZINI; RIZZINI, 1996, p. 30).

Esse paradigma da modernidade pautado na lógica produtivista onde o trabalho ocupa o lugar da vadiagem, da preguiça e do ócio, permeia na interação social de muitas famílias fumicultoras do interior do estado do Paraná, conforme descreve a entrevistada #1:

Tenho mais 4 irmãos, os mais velhos trabalham no fumo, já o outro irmão que é mais novo não, ele é 10 anos mais novo, e daí o pai já não plantava mais fumo, é transportador. Ele tem 15 anos hoje e nunca trabalhou, ele é um vadio. Ele é bonzinho, é carinhoso, mas é um vadio, é só computador e vídeo game (#1, 2015).

Percebe-se a importância do trabalho em detrimento de outras atividades, mesmo que atualmente estas atividades, tais como citou a entrevistada - vídeo game e computador - signifiquem algo extremamente ligado ao dia a dia de muitas crianças e adolescentes. Observa-se que existe uma preocupação por parte das agricultoras e dos agricultores para reforçar essa ideia presente no advento da modernidade.

Em 1530 quando iniciou o processo de colonização do Brasil com a chegada das grandes embarcações, estavam presentes grumetes e pajens que desembarcavam de Portugal na condição de trabalhadores, no Brasil (RAMOS, 1999, p. 19).

O doutor em Direito André Viana Custódio (2007), em sua obra Direito da Criança e do Adolescente, descreve o trabalho infantil no Brasil colônia, e caracteriza os grumetes como crianças que realizavam atividades perigosas e, quando não realizavam suas tarefas da forma que deveriam, eram submetidas à castigos como abusos sexuais de marujos. Por pajens, pode-se entender aquelas crianças encarregadas de serviços menos penosos, como arrumar as camas e camarotes e servir as mesas da nobreza (RAMOS, 1999, p. 28).

Percebe-se o grande caráter polissêmico da palavra criança, e que suas variações acontecem muitas vezes para significar o trabalho que esta exercia,

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porém, não cabe aqui focar a atenção apenas na polissemia em torno da palavra criança, mas cabe sim refletir sobre como as crianças foram entendidas em diferentes tempos históricos e, junto com isso refletir sobre a construção e naturalização do trabalho infantil.

Outro ponto que chama atenção com relação a criança e ao adolescente no Brasil colônia, é o fato de que crianças e adolescentes negros e negras eram vendidos no Mercado do Valongo como mercadorias. Leite (2001), mostra um relato de Robert Walsh, de 1828, onde ele descreve como é este processo:

Quase todas as casas dessa rua [Valongo] são depósitos de escravos, que ali ficam à espera de seus compradores [...] quando chega um comprador, eles são trazidos à sua presença, sendo este examinados e apalpados em qualquer parte do corpo, exatamente como já vi açougueiros fazerem com bois [...] senti-me atraído por um grupo de crianças, uma das quais, uma menina, tinha um ar triste e cativante. Ao me ver olhando para ela, o cigano a fez levantar-se dando-lhe uma lambada como uma comprida vara [...] era desolador ver a pobre criança em pé à minha frente, toda encolhida em tal estado de solidão e desespero ... (LEITE, 2001, p. 28).

Num período em que não haviam leis que norteavam o cuidado da criança branca, e criança negra era invisível perante a sociedade, sendo naturalmente inserida na lógica do mercado como sinônimo de um trabalhador ou uma trabalhadora, alguém que era exposto como uma mercadoria, e de acordo com seu corpo poderia ser comprado para servir de escravo ou escrava.

Seguindo essa ideologia o trabalho infantil foi se naturalizando e se tornou presente em nosso cotidiano, em nossas famílias, em nossas comunidades. Freitas (2001), pontua que apenas no final do século 20 a infância tornou-se um problema público para o Estado e para as políticas não governamentais, para o planejamento econômico e sanitário, para legisladores, psicólogos, educadores e antropólogos, para a criminologia e para a comunicação de massa.

Cabe aqui ressaltar que o conceito de infância difere de um país para o outro, dependendo da idade cronológica e fatores sócio culturais, assim, a ideia de trabalho infantil também recebe tratamento diferenciado segundo cada país e legislação (KASSOUF, 2007, p. 32).

Arend (2008) aponta que essas ideais de infância e juventude burguesas construídos no Brasil ao longo do século XX, e que eram repassados pela imprensa, apontavam para a necessidade, do ponto de vista das elites, de “salvar” as crianças pobres do ócio, do vício e da miséria.

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Atentamos portanto, para a ideia de infância, que diferente dos conceitos de criança e adolescente, assim, não visto como uma fase biológica da vida, mas uma construção social e histórica (LEITE, 2001, p. 21). A autora afirma que a infância passa a ser visível quando o trabalho deixa de ser domiciliar e as famílias, ao se deslocarem não conseguem administrar seus filhos, assim, as crianças se tornam “menores”.

Até 1920, a palavra “menor”, era sinônimo de criança, adolescente ou jovem, filhos dos pais e mães de baixa (ou nenhuma) renda, ou seja, uma expressão esteriotipada direcionada a criança e adolescente podre. Já, criança e adolescente era o termo usado para designar os filhos e filhas daqueles que possuíam alguma condição financeira, que frequentavam a escola e não precisavam trabalhar (DANTAS, 2007, p. 25).

No século 20 os avanços favoráveis com relação ao cuidado com a criança e os adolescentes foi algo visível, como diminuição das taxas de mortalidade infantil, aumento da estatura média dos jovens, maior taxa de alfabetização e de frequência à escolar.

O Estado se voltou ao cuidado dos menores abadonados, assim, o que norteava a ação do Estado era o Código dos Menores de 1927, porém, qualquer conduta “irregular” do menor, a responsabilidade era atribuída à família. Portanto, a partir deste dispositivo as crianças e adolescentes eram transformados em delinquentes em potencial (DANTAS, 2007, p. 27).

Apenas com a Promulgação dos direitos da criança e do adolescente, a partir de 1994, que são lhe conferidos novos rumos e expectativas. A criança e o adolescente passam por ficar a cargo do Estado, mas também da família e da comunidade. O termo “menor”, por sua vez foi reconstitualizado, destituindo-lhe o caráter discriminatório potencial (DANTAS, 2007, p. 29).

Com relação à educação das crianças, no Brasil colônia os primeiros professores foram os padres jesuítas, lembrando é claro, que essa educação possuía um caráter eminentemente cristão, e que estes professores jesuítas utilizavam o trabalho para tornar essas crianças disciplinadas e obedientes. Dessa forma o trabalho era imposto como algo que poderia “salvar” essas crianças das maldades terrenas, garantindo-lhes o céu, pois seria através do labor que elas estariam realizando algo útil para a sociedade (CUSTÓDIO, 2009, p. 91).

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Percebemos aqui que a lógica do sistema capitalista remete a educação ao status de mercadoria, estabelecendo um vínculo entre educação e trabalho.

Além do cuidado comunitário, outra missão estabelecida pelas igrejas nas Santas Casas de Misericórdias, era exercer os primeiros cuidados ao atender as crianças abandonadas através da Roda dos Expostos, que é extinta tão somente na década de 1950 (MARCILIO, 1999, p. 51).

A roda dos expostos servia como um lugar específico para deixar as crianças as quais a família não tinha condições de cuidar. Assim, para que essas crianças recebessem cuidados nas Santas Casas, foi preciso contar com a ajuda de escravas que exerciam a função de amas de leite. Com relação à essa situação a historiadora Maria Luíza Marcilio comenta:

Quase por século e meio, a roda de expostos foi praticamente a única instituição de assistência à criança abandonada em todo o Brasil. É bem verdade que, na época colonial, as municipalidades deveriam, por imposição das Ordenações do Reino, amparar toda criança abandonada em seu território. No entanto, essa assistência, quando existiu, não criou nenhuma entidade especial para acolher os pequenos desamparados. As câmaras que ampararam seus expostos limitaram-se a pagar um estipêndio irrisório para que amas-de-leite amamentassem e criassem as crianças (MARCÍLIO, 2003, p. 53).

A criança depositada na roda dos expostos era recolhida, logo em seguida batizada e fazia-se um inventário com seus possíveis pertencem, após, registravam essa criança no livro de entrada dos expostos. Porém, dificilmente as crianças ficavam asiladas nas Santas Casas de Misericórdia, sendo assim entregues às amas de leite que ganhavam um pequeno estipêndio para cuidar dessas crianças até que elas completassem uma idade julgada suficiente para começarem a ser exploradas no trabalho, então retornavam às Santas Casas de Misericórdias. Percebe-se assim a articulação da ideia de criança abandonada como fonte de trabalho e consequentemente capital, sendo tratadas como um investimento. Segundo Marcilio (2001, p. 79):

Só a partir dos anos 1960, houve funda mudança de modelo e de orientação na assistência à infância abandonada. Começava a fase do Estado do Bem- Estar, com a criação da FUNABEM8 (1964), seguida da

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8 Fundação do Bem Estar do Menor, criada em 1 de dezembro de de dezembro de 1964, pela Lei nº

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instalação, em vários estados, das FEBEMs9. Com a Constituição Cidadã de 1988, inseriam-se em nossa sociedade os Direitos Internacionais da Criança, proclamados pela ONU10 nos anos de 1950 e a LOAS11 (1993), o Estado assume enfim sua responsabilidade sobre a assistência à infância e à adolescência desvalidas, e estas tornam-se sujeitos de Direito, pela primeira vez na História (MARCILIO, 2001, p. 79).

Percebe-se que a criança abandonada só deixou de ser tratada como uma mercadoria, ou um trabalhador em potencial com a implantação do Estado de Bem-Estar. Cabe aqui ressaltar que o entendimento de Estado de Bem- Estar não condiz com a aplicabilidade do que se viu históricamente no Brasil, pois as FEBEM’s, serviram para encarceirar e marginalizar adolescentes pobres. Porém, vale datar que foi através desses marcos que o Estado passou de uma forma ou outra, a se responsabilizar pela criança e adolescente.

A historiadora Elisabeth Badinter (1985), dá destaque ao papel central que a criança ganhou nas famílias durante o século XIX, pois foi nesse período que a criança começou a ser digna de atenção e investimentos. Seguindo esse viés de proteção e cuidado em torno da criança, em 1959, foi instituída a Proclamação Universal de Direitos da Criança12:

Todas as crianças, absolutamente sem qualquer exceção, será credoras destes direitos, sem distinção ou discriminação por motivo de raça, cor, sexo, língua, religião, opinião política ou de outra natureza, origem nacional ou social, riqueza, nascimento ou qualquer outra condição, quer sua ou de sua família13 (BRASIL, 1959).

Sabe-se da importância legal que a Proclamação Universal de Direitos da Criança possui, pois dá igualdade de direitos para todas as crianças, independente de etnia, credo ou classe social, e garante também o direito das crianças terem proteção, de viverem em um ambiente digno, com oportunidade de um desenvolvimento sadio.

No Brasil por sua vez, foi na década de 1980 o marco inicial para os direitos da criança e do adolescente, conforme apontam as educadoras Maria dos Anjos Lopes Viela e Célia Regina Vendramini:

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A Lei Estadual 1.534 de 27/11/1967 autorizou o Poder Executivo a instituir a Fundação Estadual do Bem-Estar do Menor - FEBEM, vinculada a Secretaria de Estado e Serviço Social.

Fundação para a Infância e Adolescencia (FIA), 2015).

10

Organização das Nações Unidas.

11 Lei Orgânica da Assistência Social. 12

Proclamada em 20 de novembro de 1959, pela Organização das Nações Unidas.

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A década de 1980, no Brasil, pode ser considerada um marco na luta em favor dos direitos sociais das crianças com sua extensão na década de 1990: a promulgação da Constituição Federal de 1988; a adoção, em 1989, da Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança; a aprovação, em 1990, do ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente); o IPEC (Programa Internacional para a Eliminação do Trabalho Infantil) em 1992, e a criação,em 1994, do FNPETI (Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil) como espaço para reunir e articular os poderes envolvidos em políticas e programas de prevenção e erradicação do trabalho infantil (entidades do Governo Federal, organização de empregadores e trabalhadores, ONGs, Procuradoria Geral da República e Ministério Público do Trabalho); os programas do IPEC (Programa Internacional para a Eliminação do Trabalho Infantil) em 1992, e a criação,em 1994, do FNPETI (Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil) passam a incluir, a partir de 1992, o tema do trabalho infantil na agenda de políticas sociais e econômicas (VIELA; VENDRAMINI, 2010, p. 120).

Apesar do surgimento e da importância dessas leis para garantirem os direitos sociais e civis das crianças e dos adolescentes, sabe-se que nem todas as crianças possuem de fato esses direitos efetivados, tendo assim enormes prejuízos ligados a infância, como fome, maus tratos, trabalho infantil, prostituição, precariedade na educação, saúde, cultura, esportes, abusos psicológicos, sexuais, entre outros.

Por fim, no século XX eram visíveis os avanços favoráveis as condições das crianças e dos adolescentes como: diminuição das taxas de mortalidade infantil, aumento da altura média dos jovens, maior taxa de alfabetização e de frequência à escola. Porém, mesmo depois de tantos estudos em torno da temática, concretizando os prejuízos que o trabalho infantil trás às crianças, em pleno século XXI, a OIT divulgou em setembro de 2013, que no mundo ainda há mais de 168 milhões de crianças trabalhando14.

1.2 DE ONDE SE FALA

As terras que hoje pertencem à cidade de Palmeira/PR, começaram a ser habitadas - além dos índígenas - no início do século XVIII, através da distribuição de cartas de sesmarias que eram enviadas aos portugueses. Outro ponto importante para a habitação da cidade se deu com o Caminho de Viamão, que ligava o Rio Grande do Sul a Sorocaba/SP. Neste trajeto, até então habitado apenas por índios ))))))))))))))))))))))))))))))))))))))))))))))))))))))))

14 Disponível em

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Kaigangues, surge a Vila da Palmeira, lugar com amplas pastagens para gados, onde os tropeiros paravam para passar a noite.

Outro fato que merece destaque quanto à colonização da cidade de Palmeira foi a vinda de uma capela de Nossa Senhora da Conceição, antes pertencente à Freguesia de Tamanduá. A vinda desta capela fez com que houvesse a construção da Igreja Matriz onde está edificada hoje a Igreja de Nossa Senhora da Conceição, terras doadas pelo Tenente Manuel José de Araújo, a pedido de sua devota esposa, Ana Maria da Conceição de Sá, por ato de 07 de abril de 1819, data do aniversário da cidade (MAYER, 2013). Sobre esse acontecimento, Teresa Wansovicz Mayer relata:

Com a transferência da sede da Freguesia de Tamanduá para Palmeira, a população gradualmente foi se transferindo para o novo povoado não só em virtudeda construção da nova Igreja; como também em busca de melhores condições de vida. (...) Pode-se dizer que a evolução social de Palmeira, processou-se sob os melhores auspícios, isto não só por motivos de possuírempropriedades e fazendas na Nova Freguesia (...) A corrente imigratória iniciou-se com a chegada dos primeiros colonos à região dos Campos Gerais, russos-alemães, procedentes do Volga na Rússia, fixando-se também em Palmeira no ano de 1878 (MAYER, 1992, p. 22).

Percebe-se que a transferência da Freguesia de Tamanduá para Palmeira fez com que aumentasse o número de imigrações para a cidade. Porém, este não é o único fator desencadeante de tal colonização, houve também um grande incentivo de colonização das terras dos Campos Gerais por parte do governo que lhes concedia vantagens excepcionais e particulares, tais como gado, dinheiro e objetos domésticos (MAYER, 1992).

O assentamento definitivo das bases do grande capital nas várias regiões da Europa no final do século XIX e início do XX causou grande mobilização populacional de famílias de colonos para outras regiões do mundo. O Brasil, nessa mesma época, criou políticas de incentivo à imigração familiar européia para algumas regiões até então despovoadas do sul do país, assim, se formaram diversas colônias de imigrantes oriundos dos mais diversos países europeus.

Segundo Mayer (1992), o número de imigrantes russo-alemães que chegaram a Palmeira nesta mesma época era de 1.101 pessoas. No que se refere à questão da agricultura, os imigrantes fracassaram, pois não estavam habituados com o tipo de solo presente na cidade de Palmeira/PR, dessa forma, era comum que estes se queixassem da infertilidade do solo que só produzia com estrume. Há registros

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também de colonização polonesa, japonesa e italiana dedicada quase que exclusivamente a agricultura, alemães e ingleses que se dedicavam à agropecuária e sírio-libaneses dedicados ao comércio (MAYER, 1992).

Dessa maneira, as colonias firmadas nas terras de Palmeira/PR, foram aos poucos se habituando com as especificidades da cidade e assim as pessoas foram criando laços de pertença bastante fortes. Com o passer oo tempo algumas comunidades se tornaram localidades com fortes características étnicas, como é o caso de Witmarsun imigrada por alemães e Santa Bárbara, imigrada por poloneses.

Nas primeiras décadas após à imigração estas colônias caracterizavam-se com uma agricultura basicamente familiar e de subsistência, o desenvolvimento tecnológico e o processo de mecanização do campo juntamente com o surgimento de grandes indústrias em grandes cidades levou, no entanto, esses sistema de colônias auto-suficientes ao colapso.

De modo geral, as áreas onde as colônias estavam estabelecidas em superfície plana tornaram-se áreas predominantemente latifundiárias, porém, aquelas colônias localizadas em áreas predominantemente de planaltos, com relevo irregular, mantiveram em grande medida suas configurações originais.

1.3 ASPÉCTOS DEMOGRÁFICOS E SOCIOECONÔMICOS DE PALMEIRA/PR

Segundo IBGE, censo 2010, o município de Palmeira possui uma população de 32.123 habitantes, sendo 19.375 moradores da zona urbana e 12.748 moradores da zona rural. Do número total de habitantes, 16.046 são homens e 16.079 são mulheres. Com relação as atividades econômicas pode-se observar no quadro abaixo a grande importância da agricultura e pecuária para a cidade de Palmeira.

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Quadro 1 - População ocupada segundo as atividades econômicas

Fonte: SEAB/DERAL, 2012.

Assim, pode-se afirmar que a cidade de Palmeira tem sua economia assentada no setor primário onde se destacam a pecuária e a agricultura, especialmente com o cultivo de soja, fumo e milho. No setor secundário encontram-se indústrias de beneficiamento e transformação de madeira e a indústria de laticínios (MAYER, 2013).

Segundo a bacharel em direito Cátia Aparecida Gross, Palmeira/PR, possui uma área de 1.552 Km, limitando-se com os municípios de Ponta Grossa, São João do Triunfo, Lapa, Porto Amazonas, Teixeira Soares, Campo Largo e Balsa Nova. A economia da cidade baseia-se principalmente na agricultura e na pecuária. Pode-se dizer que a agricultura em Palmeira/PR está solidificada principalmente na produção de grãos e tabaco, sendo o último a principal fonte de renda para os pequenos agricultores.

Como recorte espacial da pesquisa, optou-se por comunidades da zona rural do município de Palmeira/PR, por ser uma cidade inserida plenamente no centro da principal região produtora de fumo do estado do Paraná e no mercado global do fumo. Outro ponto que influenciou para que essas comunidades fossem estudadas,

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