O oscilador harmˆ onico singular revisitado
(The singular harmonic oscillator revisited)
Douglas R.M. Pimentel, Antonio S. de Castro 1
Departamento de F´ısica e Qu´ımica, Universidade Estadual Paulista “J´ ulio de Mesquita Filho”, Guaratinguet´ a, SP, Brasil Recebido em 25/9/2012; Aceito em 4/4/2013; Publicado em 9/9/2013
Investiga-se a equa¸ c˜ ao de Schr¨ odinger unidimensional com o oscilador harmˆ onico singular. A hermiticidade dos operadores associados com quantidades f´ısicas observ´ aveis ´ e usada como crit´ erio para mostrar que o oscilador singular atrativo ou repulsivo exibe um n´ umero infinito de solu¸ c˜ oes aceit´ aveis, contanto que o parˆ ametro res- pons´ avel pela singularidade seja maior que um certo valor cr´ıtico, em discordˆ ancia com a literatura. O problema definido em todo o eixo exibe dupla degenerescˆ encia no caso do oscilador singular e intrus˜ ao de adicionais n´ıveis de energia no caso do oscilador n˜ ao-singular. Outrossim, mostra-se que a solu¸ c˜ ao do oscilador singular n˜ ao pode ser obtida a partir da solu¸ c˜ ao do oscilador n˜ ao-singular via teoria da perturba¸ c˜ ao.
Palavras-chave: oscilador harmˆ onico, potencial singular, degenerescˆ encia, colapso para o centro.
The one-dimensional Schr¨ odinger equation with the singular harmonic oscillator is investigated. The Hermi- ticity of the operators related to observable physical quantities is used as a criterion to show that the attractive or repulsive singular oscillator exhibits an infinite number of acceptable solutions provided the parameter res- ponsible for the singularity is greater than a certain critical value, in disagreement with the literature. The problem for the whole line exhibits a two-fold degeneracy in the case of the singular oscillator, and the intrusion of additional solutions in the case of a nonsingular oscillator. Additionally, it is shown that the solution of the singular oscillator can not be obtained from the nonsingular oscillator via perturbation theory.
Keywords: harmonic oscillator, singular potential, degeneracy, collapse to the center.
1. Introdu¸ c˜ ao
O oscilador harmˆ onico ´ e um dos mais importantes siste- mas em mecˆ anica quˆ antica porque ele apresenta solu¸c˜ ao em forma fechada e isto pode ser ´ util para gerar solu¸c˜ oes aproximadas ou solu¸c˜ oes exatas para v´ arios proble- mas. O oscilador harmˆ onico ´ e costumeiramente resol- vido com o m´ etodo de solu¸c˜ ao em s´ eries de potˆ encias (veja, e.g., Ref. [1]) e o m´ etodo alg´ ebrico (veja, e.g., Ref. [2]), e tamb´ em por meio de t´ ecnicas de integra¸ c˜ ao de trajet´ oria (veja, e.g., Ref. [3]). Recentemente, o os- cilador harmˆ onico unidimensional foi abordado com os m´ etodos operacionais da transformada de Fourier [4] e da transformada de Laplace [5].
A equa¸c˜ ao de Schr¨ odinger com um potencial quadr´ atico acrescido de um termo inversamente quadr´ atico, conhecido como oscilador harmˆ onico sin- gular, tamb´ em ´ e um problema exatamente sol´ uvel [6]- [12]. A bem da verdade, o problema geral de espa- lhamento e estados ligados em potenciais singulares
´
e um tema antigo (veja, e.g., Ref. [13]). O caso do oscilador harmˆ onico singular com parˆ ametros do po- tencial dependentes do tempo tˆ em sido alvo de inves-
tiga¸c˜ ao recente [14]. O oscilador singular se presta pa- ra a constru¸c˜ ao de modelos sol´ uveis de N corpos [15], tanto quanto como base para expans˜ oes perturbativas e an´ alise variacional para osciladores harmˆ onicos acres- cidos de termos com singularidades muito mais fortes que o termo inversamente quadr´ atico [16]. O oscila- dor singular tamb´ em tem sido utilizado em mecˆ anica quˆ antica relativ´ıstica [17]. A exata solubilidade do os- cilador singular pode ser constatada nas Refs. [6] e [8]
para o caso tridimensional, e tamb´ em ´ e patente nas Refs. [7] e [9] para o caso unidimensional restrito ao semieixo positivo. Duas referˆ encias mais recentes abor- dam o problema unidimensional em todo o eixo [10,11].
Na Ref. [10] n˜ ao h´ a detalhes da solu¸c˜ ao do problema nem men¸c˜ ao ` as poss´ıveis degenerescˆ encias, e l´ a consta que, para um oscilador singular atrativo, a part´ıcula colapsa para o ponto x = 0 (The particle collapses to the point x = 0). Na Ref. [11], Palma e Raff es- miu¸cam o problema com o potencial singular repulsivo, concluem apropriadamente sobre a degenerescˆ encia e simplesmente afirmam que n˜ ao h´ a estado fundamental no caso do oscilador singular atrativo (the attractive potential has no lower energy bound).
1
E-mail: castro@pq.cnpq.br.
Copyright by the Sociedade Brasileira de F´ ısica. Printed in Brazil.
O intuito deste trabalho ´ e perscrutar a equa¸c˜ ao de Schr¨ odinger unidimensional com o oscilador harmˆ onico singular. Veremos que, al´ em de uma cr´ıtica ` a lite- ratura concernente a um problema de interesse re- cente e j´ a cristalizado em livros-texto largamente co- nhecidos, a abordagem dos estados ligados do osci- lador harmˆ onico singular que se presencia neste tra- balho permite aos estudantes de mecˆ anica quˆ antica e f´ısica matem´ atica dos cursos de gradua¸c˜ ao em f´ısica o contato com equa¸c˜ oes diferenciais singulares e o com- portamento assint´ otico de suas solu¸ c˜ oes, fun¸c˜ ao hiper- geom´ etrica confluente, polinˆ omios de Laguerre e de Hermite e outras fun¸c˜ oes especiais, valor principal de Cauchy de integrais impr´ oprias, condi¸c˜ ao de hermitici- dade sobre operadores associados com grandezas f´ısicas observ´ aveis e o descarte de solu¸c˜ oes esp´ urias, condi¸c˜ oes de contorno e analiticidade das solu¸c˜ oes na vizinhan¸ ca de pontos singulares, paridade e extens˜ oes sim´ etricas e antissim´ etricas de autofun¸c˜ oes, degenerescˆ encia em sis- temas unidimensionais, transi¸c˜ ao de fase e surgimento de n´ıveis intrusos, et cetera. Seguramente, a profus˜ ao de conceitos e t´ ecnicas ´ e do interesse de estudantes e instrutores. Com o crit´ erio de hermiticidade dos ope- radores associados com quantidades f´ısicas observ´ aveis, o tratamento do problema p˜ oe ` a vista dos leitores que o oscilador singular, seja atrativo ou repulsivo, exibe um n´ umero infinito de solu¸ c˜ oes aceit´ aveis desde que o parˆ ametro respons´ avel pela singularidade seja maior que um certo valor cr´ıtico. Veremos que o espectro de energia ´ e uma fun¸c˜ ao mon´ otona do parˆ ametro res- pons´ avel pela singularidade e que a energia do estado fundamental do oscilador singular, independentemente do sinal de tal parˆ ametro, ´ e sempre maior que dois ter¸ cos da energia do estado fundamental do oscilador n˜ ao-singular para o problema definido no semieixo, e sempre maior que o dobro da energia do estado fun- damental do oscilador n˜ ao-singular para o problema definido em todo o eixo. Mostramos que o problema definido em todo o eixo nos conduz ` a dupla degene- rescˆ encia no caso do potencial singular e ` a intrus˜ ao de adicionais n´ıveis de energia no caso do oscilador n˜ ao- singular (relacionados com as autofun¸ c˜ oes de paridade par). O robusto crit´ erio de hermiticidade do operador associado com a energia cin´ etica (ou potencial) mostra- se suficiente para descartar solu¸c˜ oes ileg´ıtimas e permite demonstrar que se o potencial singular for fracamente atrativo n˜ ao h´ a cabimento em se falar em colapso para o centro ou inexistˆ encia de estado fundamental. Fi- nalmente, mostramos que, seja o problema definido no semieixo ou em todo o eixo, o oscilador n˜ ao-singular pode ser pensado como uma transi¸ c˜ ao de fase do os-
cilador singular, e por causa disso a solu¸c˜ ao do oscila- dor harmˆ onico singular n˜ ao pode ser obtida a partir da solu¸c˜ ao do oscilador harmˆ onico n˜ ao-singular via teoria da perturba¸c˜ ao.
2. Potenciais singulares e degeneres- cˆ encia
A equa¸c˜ ao de Schr¨ odinger unidimensional para uma part´ıcula de massa de repouso m sujeita a um potencial externo V (x, t) ´ e dada por
i ~ ∂Ψ
∂t = H Ψ. (1)
Aqui, Ψ (x, t) ´ e a fun¸c˜ ao de onda, ~ ´ e a constante de Planck reduzida ( ~ = h/(2π)) e H ´ e o operador hamil- toniano
H = − ~ 2 2m
∂ 2
∂x 2 + V. (2)
N˜ ao ´ e dificil mostrar que
∂ | Ψ | 2
∂t = i
~
[ ( H Ψ) ∗ Ψ − Ψ ∗ ( H Ψ) ]
, (3)
e levando em considera¸c˜ ao que o operador hamiltoniano
´
e um operador hermitiano, 2 temos o corol´ ario d
dt
∫ + ∞
−∞
dx | Ψ | 2 = 0. (4) A equa¸c˜ ao da continuidade
∂ρ
∂t + ∂J
∂x = 0 (5)
´
e satisfeita com a densidade de probabilidade
ρ = | Ψ | 2 (6)
e a corrente
J = ~ m Im
( Ψ ∗ ∂Ψ
∂x )
. (7)
A equa¸ c˜ ao da continuidade pode tamb´ em ser escrita como
J (x, t) − J (x 0 , t) = − d dt
∫ x x
0dη ρ (η, t) , (8) onde x 0 ´ e um ponto arbitr´ ario do eixo X . A forma in- tegral da equa¸c˜ ao da continuidade, (8), permite inter- pretar inequivocamente a corrente J (x, t) como sendo o fluxo de probabilidade atrav´ es de x no instante t.
No caso de potenciais externos independentes do tempo, a fun¸c˜ ao de onda Ψ admite solu¸c˜ oes particu- lares da forma
2
Todas as quantidades f´ısicas observ´ aveis correspondem a operadores hermitianos. O operador O ´ e dito ser hermitiano se
∫
+∞−∞
dx ( O Ψ
1)
∗Ψ
2=
∫
+∞−∞
dx Ψ
∗1( O Ψ
2) , onde Ψ
1e Ψ
2s˜ ao duas fun¸ c˜ oes de onda quaisquer que fazem ∫
+∞−∞
dx Ψ
∗1( O Ψ
2) < ∞ . Em particular, as fun¸ c˜ oes de onda devem ser quadrado-integr´ aveis, viz. ∫
+∞−∞
dx | Ψ |
2< ∞ .
Ψ(x, t) = ψ(x) e − i
E~t , (9) onde ψ obedece ` a equa¸c˜ ao de Schr¨ odinger independente do tempo
H ψ = Eψ. (10)
Neste caso, com condi¸c˜ oes de contorno apropriadas, o problema se reduz ` a determina¸c˜ ao do par caracter´ıstico (E, ψ). A equa¸ c˜ ao de autovalor (10) tamb´ em pode ser escrita na forma
d 2 ψ dx 2 +
(
k 2 − 2mV
~ 2 )
ψ = 0, (11)
com
k 2 = 2mE
~ 2 . (12)
A densidade e a corrente correspondentes ` a solu¸ c˜ ao ex- pressa pela Eq. (9) tornam-se
ρ = | ψ | 2 , J = ~ m Im
( ψ ∗ dψ
dx )
. (13)
Em virtude de ρ e J serem independentes do tempo, a solu¸c˜ ao (9) ´ e dita descrever um estado estacion´ ario.
Note que, por causa da equa¸c˜ ao da continuidade (5) e (8), a corrente J n˜ ao ´ e t˜ ao somente estacion´ aria, mas tamb´ em uniforme, i.e. J (x) = J (x 0 ).
Os estados ligados constituem uma classe de solu¸c˜ oes da equa¸ c˜ ao de Schr¨ odinger que representam um sistema localizado numa regi˜ ao finita do espa¸co.
Para estados ligados devemos procurar autofun¸ c˜ oes que se anulam ` a medida que | x | → ∞ . ´ E ´ obvio que, em decorrˆ encia deste comportamento assint´ otico, J → 0 quando | x | → ∞ . Assim, a uniformidade da corrente dos estados estacion´ arios demanda que J seja nula em todo o espa¸co. Fato esperado em vista da interpreta¸ c˜ ao de J apresentada anteriormente. Tamb´ em, neste caso podemos normalizar ψ fazendo
∫ + ∞
−∞
dx | ψ | 2 = 1. (14) Com um potencial invariante sob reflex˜ ao atrav´ es da origem (x → − x), autofun¸c˜ oes com paridades bem de- finidas podem ser constru´ıdas. Neste caso, as auto- fun¸ c˜ oes de H s˜ ao tamb´ em autofun¸c˜ oes do operador pa- ridade, viz.
H ψ (p) n = E n (p) ψ (p) n
(15) P ψ (p) n = pψ n (p) ,
onde P ´ e o operador paridade, p = ± 1 e n denota quais- quer outros n´ umeros quˆ anticos. Como consequˆ encia da
hermiticidade de H e P , as autofun¸c˜ oes satisfazem ` a condi¸c˜ ao de ortogonalidade
∫ + ∞
−∞
dx (
ψ n ( ˜ ˜ p) ) ∗
ψ n (p) = 0, para ˜ n ̸ = n ou ˜ p ̸ = p.
(16) Por causa da paridade, podemos concentrar a aten¸c˜ ao no semieixo positivo e impor condi¸c˜ oes de contorno na origem e no infinito. Naturalmente, a autofun¸c˜ ao ´ e cont´ınua. No entanto, temos de considerar a condi¸c˜ ao de conex˜ ao entre a derivada primeira da autofun¸c˜ ao ` a direita e ` a esquerda da origem, que deve ser obtida diretamente da equa¸ c˜ ao de Schr¨ odinger independente do tempo. Normalizabilidade, conforme comentado de pouco, requer que ψ → 0 quando | x | → ∞ . Auto- fun¸c˜ oes com paridades bem definidas em todo o eixo podem ser constru´ıdas tomando combina¸c˜ oes lineares sim´ etricas e antissim´ etricas de ψ definida no lado po- sitivo do eixo X. Estas novas autofun¸ c˜ oes possuem a mesma energia, ent˜ ao, em princ´ıpio, existe uma dupla degenerescˆ encia (E n (+) = E ( n − ) ). E not´ ´ orio que o es- pectro de estados ligados de sistemas unidimensionais com potenciais regulares ´ e n˜ ao-degenerado (veja, e.g., Refs. [6] e [8]). Entretanto, se o potencial for singu- lar na origem, por exemplo, tanto as autofun¸c˜ oes pa- res quanto as autofun¸c˜ oes ´ımpares poderiam obedecer
`
a condi¸c˜ ao homogˆ enea de Dirichlet na origem, e cada n´ıvel de energia exibiria uma degenerescˆ encia de grau dois. 3 A condi¸c˜ ao de conex˜ ao obedecida pela derivada primeira da autofun¸ c˜ ao, contudo, poderia excluir uma das duas combina¸ c˜ oes lineares, e nesse caso os n´ıveis de energia seriam n˜ ao-degenerados.
3. Oscilador singular
Seguindo a nota¸c˜ ao da Ref. [11], vamos agora conside- rar o potencial
V (x) = 1
2 mω 2 x 2 + ~ 2 α
2mx 2 , ω > 0. (17) O parˆ ametro adimensional α caracteriza trˆ es diferentes perfis para o potencial, como est´ a ilustrado na Fig. 1.
Para α = 0 temos o potencial do oscilador harmˆ onico regular (po¸co simples), e para α ̸ = 0 temos o caso de um po¸co duplo com uma barreira de potencial repulsiva e singular na origem (α > 0) ou o caso de um po¸co sem fundo puramente atrativo (α < 0). Para o potencial (17), a equa¸c˜ ao de Schr¨ odinger independente do tempo assume a forma
d 2 ψ dx 2 +
(
k 2 − λ 2 x 2 − α x 2
)
ψ = 0, (18) com
λ = mω
~ . (19)
3
Os mais c´ eticos quanto ` a possibilidade de degenerescˆ encia em sistemas unidimensionais podem constatar esta particularidade visu-
alizando as poss´ıveis autofun¸ c˜ oes no caso de dois po¸ cos infinitos dispostos simetricamente em torno de x = 0.
Figura 1 - Os trˆ es perfis para V (x) . As linhas tracejada, cont´ınua e pontilhada para os casos com α negativo, nulo e positivo, res- pectivamente.
Quando α = 0, as solu¸ c˜ oes da Eq. (18) s˜ ao anal´ıticas em todo o eixo X. Quando α ̸ = 0, todavia, ψ pode manifestar singularidade na origem. Tal singula- ridade poderia comprometer a nulidade da corrente em x = 0, a existˆ encia das integrais definidas nos intervalos (0, + ∞ ) e ( −∞ , + ∞ ), e a hermiticidade dos operado- res associados com as quantidades f´ısicas observ´ aveis.
Por causa desta sensa¸ c˜ ao de amea¸ca, come¸caremos a abordagem do problema pela averigua¸ c˜ ao do com- portamento das solu¸c˜ oes da Eq. (18) na vizinhan¸ca da origem. ´ E claro que o comportamento assint´ otico ( | x | → ∞ ) tamb´ em ´ e merit´ orio.
3.1. Comportamento na origem
Na vizinhan¸ca da origem a Eq. (18) passa a ter duas formas distintas
d 2 ψ
dx 2 + k 2 ψ ≃ 0, para α = 0
(20) d 2 ψ
dx 2 − α
x 2 ψ ≃ 0, para α ̸ = 0.
De um jeito ou de outro, no semieixo positivo podemos escrever
ψ ≃
A | x | β
++1 + B | x | β
−+1 , para α ̸ = − 1/4 D | x | 1/2 + F | x | 1/2 log | x | , para α = − 1/4,
(21)
onde
β ± = − 1 2 ±
√ 1
4 + α (22)
´
e solu¸c˜ ao da equa¸c˜ ao alg´ ebrica indicial
β ± (β ± + 1) = α. (23) Na vizinhan¸ca da origem, o comportamento dos termos
K nn ˜ = ψ ∗ n ˜ (
− ~ 2 2m
d 2 dx 2
) ψ n
(24) V nn ˜ = ψ ∗ n ˜
( ~ 2 2m
α x 2
) ψ n
comina a hermiticidade dos operadores associados com a energia cin´ etica e com o potencial. Para α ̸ = − 1/4, podemos escrever
K nn ˜ ≃ − ~ 2 α 2m [
A ∗ ˜ n A n | x | 2 Re β
++ B n ∗ ˜ B n | x | 2 Re β
−(25) + A ∗ n ˜ B n | x | β
+∗+β
−+ A n B n ∗ ˜ | x | β
++β
∗−]
, e para α = − 1/4
K nn ˜ ≃ − ~ 2 α 2m
1
| x |
[ D ∗ n ˜ D n + F ˜ n ∗ F n log 2 | x | (26) + (D ∗ n ˜ F n + D n F n ˜ ∗ ) log | x | ] .
Em ambos os casos V nn ˜ ≃ − K ˜ nn . Vemos destas ´ ultimas rela¸c˜ oes que a hermiticidade do operador associado com a energia cin´ etica (ou potencial) ´ e verificada somente se Re β ± > − 1/2 quando α ̸ = 0, o que equivale a dizer que o sinal negativo defronte do radical na Eq. (22) deve ser descartado e α deve ser maior que − 1/4. Natu- ralmente, devemos considerar β − = − 1 tanto quanto β + = 0 quando α = 0. Portanto, podemos afirmar que ψ comporta-se na vizinhan¸ca da origem como
Cx β+1 (27)
com
β =
− 1 2 +
√
1 4 + α,
− 1 ou 0,
para α ̸ = 0, com α > − 1 4 para α = 0.
(28) Note ainda que a nulidade da corrente requer apenas que β ∈ R e F = 0, enquanto a condi¸c˜ ao de orto- normalizabilidade exige apenas que Re β ± > − 3/2 e F = 0. A condi¸c˜ ao α > − 1/4, que nos faz evitar um potencial atrativo com singularidade muito forte, rela- cionado com o problema da “queda para o centro” [6],
4
No processo de regulariza¸ c˜ ao, V (x) ´ e substitu´ıdo por V (x
0) para x < x
0≈ 0 e depois de usar as condi¸ c˜ oes de continuidade para
ψ e dψ/dx no cutoff tomamos o limite x
0→ 0. Resulta que a solu¸ c˜ ao com β
−´ e suprimida em rela¸ c˜ ao a essa envolvendo β
+quando
x
0→ 0.
tanto quanto a solu¸ c˜ ao apropriada da equa¸ c˜ ao indicial (23), foram obtidas aqui de uma maneira extremamente simples, sem recorrer ao processo de regulariza¸c˜ ao do potencial na origem. 4 Nota-se que, ainda que acrescido da exigˆ encia de normalizabilidade, o processo de regu- lariza¸ c˜ ao do potencial ´ e inapto para exluir o caso com α ≤ − 1/4 [6]. O crit´ erio de hermiticidade do operador associado com a energia cin´ etica (ou potencial) ´ e l´ıcito e suficiente para descartar solu¸c˜ oes esp´ urias. 5 Resumi- damente,
β = − 1 ou β > − 1
2 . (29)
A condi¸ c˜ ao de Dirichlet homogˆ enea (ψ (0) = 0) ´ e essen- cial sempre que α ̸ = 0, contudo ela tamb´ em ocorre para α = 0 quando β = 0 mas n˜ ao para β = − 1. Em suma,
ψ | x=0
+≃
0, C,
para α ̸ = 0, ou α = 0 e β = 0 para α = 0 e β = − 1,
(30) e
dψ dx
x=0
+≃
0, C,
∞ ,
para α > 0, ou α = 0 e β = − 1 para α = 0 e β = 0
para α < 0.
(31) 3.2. Comportamento assint´ otico
A equa¸ c˜ ao de Schr¨ odinger independente do tempo para o nosso problema, Eq. (18), tem o comportamento as- sint´ otico ( | x | → ∞ )
d 2 ψ
dx 2 − λ 2 x 2 ψ ≃ 0, (32) e da´ı sucede que a forma assint´ otica da solu¸ c˜ ao quadrado-integr´ avel ´ e dada por
ψ ≃ e − λx
2/2 . (33) 3.3. Solu¸ c˜ ao no semieixo
O comportamento assint´ otico de ψ expresso pela Eq. (33) convida-nos a definir y = λx 2 de forma que a autofun¸ c˜ ao para todo y pode ser escrita como
ψ (y) = y (β+1)/2 e − y/2 w (y) , (34) onde a fun¸ c˜ ao desconhecida w (y) ´ e solu¸ c˜ ao regular da equa¸ c˜ ao hipergeom´ etrica confluente [18]
y d 2 w (y)
dy 2 + (b − y) dw (y)
dy − a w (y) = 0, (35)
com
a = b 2 − k 2
4λ e b = β + 3
2 . (36)
A solu¸c˜ ao geral da Eq. (35) ´ e dada por [18]
w (y) = A M (a, b, y)+B y 1 − b M (a − b+1, 2 − b, y), (37) onde A e B s˜ ao constantes arbitr´ arias, e M (a, b, y), tamb´ em denotada por 1 F 1 (a, b, y), ´ e a fun¸c˜ ao hiper- geom´ etrica confluente (tamb´ em chamada de fun¸c˜ ao de Kummer) expressa pela s´ erie [18]
M (a, b, y) = Γ (b) Γ (a)
∑ ∞ j=0
Γ (a + j) Γ (b + j)
y j
j! , (38) onde Γ (z) ´ e a fun¸c˜ ao gama. A fun¸c˜ ao gama n˜ ao tem ra´ızes e seus polos s˜ ao dados por z = − n, onde n ´ e um inteiro n˜ ao-negativo [18]. A fun¸c˜ ao de Kummer con- verge para todo y, ´ e regular na origem (M (a, b, 0) = 1) e tem o comportamento assint´ otico prescrito por [18]
M (a, b, y) ≃ Γ (b)
Γ (b − a) e − iπa y − a + Γ (b)
Γ (a) e y y a − b . (39) Haja vista que b > 1, e estamos em busca de solu¸c˜ ao regular na origem, devemos tomar
B = 0 (40)
na Eq. (37). A presen¸ca de e y na Eq. (39) deprava o bom comportamento assint´ otico da autofun¸c˜ ao j´ a di- tado pela Eq. (33). Para remediar esta situa¸c˜ ao cons- trangedora devemos considerar os polos de Γ (a), e as- sim preceituar que um comportamento aceit´ avel para M (a, b, y) ocorre somente se
a = − n, n ∈ N . (41) Neste caso, a s´ erie (38) ´ e truncada em j = n e o polinˆ omio de grau n resultante ´ e proporcional ao po- linˆ omio de Laguerre generalizado L (b n − 1) (y), com b > 0 [18]. Portanto, das Eqs. (12), (19), (36) e (41) podemos determinar que as energias permitidas s˜ ao dadas por
E n = (
2n + β + 3 2
)
~ ω, (42)
e as autofun¸ c˜ oes definidas no semieixo positivo s˜ ao ψ n ( | x | ) = A n | x | β+1 e − λx
2/2 L (β+1/2) n (λx 2 ). (43) Na Fig. 2 ilustramos os primeiros n´ıveis de energia em fun¸ c˜ ao de α no intervalo ( − 1/4, +1/4]. Observe que, qualquer que seja α, ainda que − 1/4 < α < 0, o espec- tro ´ e discreto e sempre positivo. H´ a um n´ umero infinito de n´ıveis de energia igualmente espa¸cados (espa¸camento igual a 2 ~ ω, independentemente de α), e o estado fun- damental tem energia (2β + 3) ~ ω/2 > ~ ω.
5
A ortonormalizabilidade das autofun¸ c˜ oes (relacionada com a hermiticidade do operador hamiltoniano) e a hermiticidade do operador
momento (relacionada com a nulidade da corrente) s˜ ao crit´ erios mais fr´ ageis porque envolvem o comportamento de ψ
∗˜nψ
ne ψ
∗˜ndψ
n/dx
na vizinhan¸ ca da origem, respectivamente.
Figura 2 - Autoenergias (ϵ = E/( ~ ω)) em fun¸ c˜ ao de α no inter- valo ( − 1/4, +1/4]. As linhas cont´ınuas para o oscilador singular, e os quadrados em α = 0 para o oscilador n˜ ao-singular.
Na Fig. 3 ilustramos o comportamento da auto- fun¸ c˜ ao para o estado fundamental. A normaliza¸ c˜ ao foi realizada por m´ etodos num´ ericos mas poderia ter sido obtida por meio de f´ ormulas envolvendo os polinˆ omios de Laguerre associados constantes na Ref. [18]. A com- para¸ c˜ ao entre as quatro curvas mostra que a part´ıcula tende a evitar a origem mais e mais ` a medida que α aumenta. Eis um resultado esperado no caso α > 0 que ocorre tamb´ em no caso α < 0. Observe que, qualquer que seja α > − 1/4, as autofun¸c˜ oes (43) s˜ ao fisicamente aceit´ aveis, ainda que no intervalo − 1/4 < α < 0 elas possuam derivada primeira singular. ´ E mesmo assim, contanto que o parˆ ametro α seja maior que − 1/4, o par caracter´ıstico (E n , ψ n ) constitui uma solu¸ c˜ ao per- miss´ıvel do problema proposto. A part´ıcula nunca co- lapsa para o ponto x = 0 e certamente h´ a um estado fundamental.
3.4. Solu¸ c˜ ao em todo o eixo
A autofun¸c˜ ao definida para todo o eixo X pode ser es- crita como
ψ (p) n (x) = θ (x) ψ n ( | x | ) + p θ ( − x) ψ n ( | x | ) , (44) onde
θ (x) =
1 para x > 0, 0 para x < 0
(45)
Figura 3 - Autofun¸ c˜ ao (ϕ = ψ/ √
4λ) normalizada do estado fun- damental definido no semieixo em fun¸ c˜ ao de ξ = √
λ x. As linhas cont´ınua, ponto-tracejada, tracejada e pontilhada para os casos com α igual a − 0, 249, − 0, 2, +0, 2 e +3, respectivamente.
´
e a fun¸c˜ ao degrau de Heaviside, p ´ e o autovalor do ope- rador paridade, e a autoenergia ´ e dada por
E n (p) = (
2n + β + 3 2
)
~ ω. (46)
A hermiticidade do operador associado com a energia cin´ etica (ou potencial), por causa da singularidade em x = 0 no caso α < 0 (β < 0), depende da existˆ encia do valor principal de Cauchy 6 da integral
∫ + ∞
−∞
dx K ˜ nn ( ˜ pp) . (48) Obviamente, o valor principal de Cauchy poderia con- sentir um afrouxamento das condi¸c˜ oes de contorno im- postas sobre as autofun¸c˜ oes. Autofun¸c˜ oes mais singu- lares que essas anteriormente definidas no semieixo se- riam toleradas se na vizinhan¸ca da origem os sinais de K nn ( ˜ ˜ pp) ` a direita e ` a esquerda da origem fossem diferentes para quaisquer p e ˜ p. Por´ em, temos
K nn ˜ ( ˜ pp) (x < 0) = ˜ pp K nn ˜ (x > 0) (49) de modo que, no caso em que α < 0, a integral (48) n˜ ao seria finita para ˜ p = p. Somos assim conduzidos a preservar a rigidez do crit´ erio de hermiticidade j´ a esta- belecido no problema definido no semieixo.
A continuidade (ou descontinuidade) de dψ/dx na origem pode ser avaliada pela integra¸c˜ ao da Eq. (20)
6
Se f (x) for singular na origem, a integral ∫
+∞−∞
dx f (x) ser´ a nonsense. Contudo, o valor principal de Cauchy, P ∫
+∞−∞
dx f (x), ´ e uma prescri¸ c˜ ao que pode atribuir um sentido proveitoso ` a representa¸ c˜ ao integral por meio da receita que se segue:
P
∫
+∞−∞
dx f (x) = lim
ε→0
(∫
−ε−∞
dx f (x) +
∫
+∞+ε