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ANNA PAULA TEIXEIRA DA SILVA

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Academic year: 2021

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FACULDADE DE SERVIÇO SOCIAL – FASSO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM SERVIÇO SOCIAL E DIREITOS SOCIAIS - PPGSSDS

MESTRADO EM SERVIÇO SOCIAL E DIREITOS SOCIAIS

ANNA PAULA TEIXEIRA DA SILVA

O TRABALHO TERCEIRIZADO E O PRINCÍPIO DA VEDAÇÃO AO RETROCESSO SOCIAL: uma análise após a Contrarreforma Trabalhista de

2017

MOSSORÓ/RN

2021

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O TRABALHO TERCEIRIZADO E O PRINCÍPIO DA VEDAÇÃO AO RETROCESSO SOCIAL: uma análise após a Contrarreforma Trabalhista de

2017

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Serviço Social e Direitos Sociais (PPGSSDS) da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (UERN) para obtenção do título de Mestre em Serviço Social.

Orientadora: Prof.ª Dr.ª Márcia da Silva Pereira Castro.

MOSSORÓ/RN

2021

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_________________________________________

Prof.ª Dr.ª Márcia da Silva Pereira Castro - (FASSO/UERN) ORIENTADORA

_________________________________________

Prof.ª Dr.ª Rivania Lucia Moura de Assis - (FASSO/UERN) EXAMINADORA INTERNA

_________________________________________

Prof. Dr. José Albenes Bezerra Júnior - (DACS/UFERSA) EXAMINADOR

EXTERNO

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À minha avó, Fátima, e à minha mãe, Cristina, que ajudaram-me a ser o que sou hoje e ensinaram-me a sempre seguir em frente.

À minha família pelo apoio, nos momentos mais difíceis da minha vida, em especial aos meus tios Sales Júnior e Júlio Sales.

Ao meu namorado, Evilázio Júnior, pelos conselhos, pelo carinho e pelo companheirismo.

À minha orientadora, profª. Drª Márcia Castro, pelos importantes apontamentos e instruções para a construção deste trabalho e pelo apoio que me concedeu durante o meu caminho para me tornar mestra.

Aos membros da minha banca de avaliação, profª Drª Rivânia Moura e prof. Dr. Albenes Bezerra, pela honra e disponibilidade de fazerem parte de mais esse passo em minha jornada acadêmica.

Aos meus e minhas colegas de mestrado da turma 2018.2, pela amizade e pelas discussões engrandecedoras. Choramos/as juntos/as em alguns momentos, mas o sorriso sempre prevaleceu. Sucesso a todos/as!

A todos/as (professoras, técnicos/as, terceirizados/as) que compõem o Programa de Pós-graduação em Serviço Social e Direitos Sociais - PPGSSDS, em especial às professoras Draª Mirla Cisne, Drª Fernandes Marques, Drª Rivânia Moura e Drª Aione Sousa pelas nossas aulas enriquecedoras.

Por fim, agradeço ao tempo, que passou e trouxe fim ao ano de

2020.

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trabalhadores repudiaram as autoridades de Macondo e subiram com as suas queixas aos tribunais supremos. Foi lá que os ilusionistas do direito demonstraram que as reclamações careciam de toda validade, simplesmente porque a companhia bananeira não tinha, nem tinha tido nunca, nem teria jamais, trabalhadores a seu serviço, mas sim que os recrutava ocasionalmente e em caráter temporário”.

Cem Anos de Solidão

1

.

1MÁRQUEZ, Gabriel García. Cem Anos de Solidão. 94ª ed. Rio de Janeiro: Record, 2016, p. 336.

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RETROCESSO SOCIAL: uma análise após a Contrarreforma Trabalhista de 2017

RESUMO: O trabalho terceirizado no Brasil, embora não seja uma realidade recente, por muitos anos não possuiu regulamentação legal, sendo disciplinado por entendimentos jurisprudenciais, sobretudo embasados na Súmula nº 331 do Tribunal Superior do Trabalho, editada com vistas na proliferação dos contratos de terceirização, que ganharam força a partir da década de 1990. A referida súmula claramente fazia distinção entre o trabalho destinado a suprir às atividades-meio daquele classificado como atividades-fim da empresa tomadora de serviços, sendo este vetado. Desse modo, verifica-se que havia algumas restrições quanto à realização do trabalho em terceirização, sobretudo, no que diz respeito ao tipo de atividade que podia ser exercida pelo trabalhador terceirizado. A figura do trabalho terceirizado atendia apenas a realização de atividades-meio da empresa, definidas assim aquelas destinadas a garantir a operacionalização e alcance do real fim do empreendimento. Tal finalidade da empresa comporia suas atividades-fim, as quais são conceituadas como aquelas para as quais a empresa foi constituída, alocando a exploração do ramo designado em seus atos constitutivos. Apenas em 2017, a Lei nº 13.429 deu vigência à algumas alterações legislativas nos contratos de terceirização, autorizando a realização da atividades-fim de uma empresa de forma terceirizada. Tais modificações trouxeram mudanças significativas nas relações trabalhistas, ampliando as possibilidades de precarização das condições de trabalho, sob o argumento de modernizá-lo. A problemática em torno dessa alteração legislativa gira em torno do fato de que possibilitará o aumento das contratações terceirizadas, já que estas não ficarão apenas restritas às atividades-meio, mas abarcarão toda e qualquer função exercida por uma empresa, o que representa uma fragilização nas relações de trabalho.

A presente dissertação, então, busca analisar o trabalho em regime terceirizado e sua influência na proteção ao trabalho encartada em anos de conquistas sociais, discorrendo sobre os impactos negativos da terceirização sobre a segurança e a saúde do trabalhador. Para tanto, mediante a realização de pesquisa bibliográfica e documental, sobretudo através da análise de dados relativos ao trabalho terceirizado no país (entre os anos de 2007 e 2018), serão demonstrados que a terceirização, em face da ofensiva neoliberal hodierna, reflete uma flexibilização da proteção ao trabalhador, introduzindo o princípio da vedação ao retrocesso social como mecanismo de tutela dos direitos trabalhistas.

Palavras-chave: Terceirização. Precarização Social do Trabalho. Princípio da

vedação ao retrocesso social.

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RETROCESS: an analysis after the 2017 labor counter-reform

ABSTRACT: Outsourced work in Brazil, although not a recent reality, did not have legal regulations for many years, being disciplined by jurisprudential understandings, mainly based on Precedent No. 331 of the Superior Labor Court, edited with a view to the proliferation of outsourcing contracts, which gained strength as from the 1990s. The aforementioned summary clearly distinguished between the work destined to supply the core activities of the one classified as the core activities of the service borrowing company, the latter being vetoed. Thus, it appears that there were some restrictions regarding the performance of work in outsourcing, especially with regard to the type of activity that could be performed by the outsourced worker. The figure of outsourced work only served the performance of the company's core activities, thus defining those aimed at ensuring the operationalization and achievement of the real end of the enterprise. Such purpose of the company would compose its core activities, which are conceptualized as those for which the company was constituted, allocating the exploration of the designated branch in its constitutive acts. Only in 2017, Law No. 13,429 gave effect to some legislative changes in the outsourcing contracts, authorizing the carrying out of the core activities of a company on an outsourced basis. Such modifications brought about significant changes in labor relations, expanding the possibilities of precarious working conditions, under the argument of modernizing it. The problem surrounding this legislative change revolves around the fact that it will make it possible to increase the number of outsourced hires, since these will not only be restricted to the middle activities, but will encompass any and all functions performed by a company, which represents a weakening in labor relations. The present work, then, seeks to analyze the work under an outsourced regime and its influence on the protection of work inserted in years of social achievements, discussing the negative impacts of outsourcing on the safety and health of the worker. To this end, through bibliographic and documentary research, especially through the analysis of data related to outsourced work in the country (between the years 2007 and 2018), it will be demonstrated that outsourcing, in the face of today's neo-liberal offensive, reflects flexibility protection for workers, introducing the principle of prohibition against social retrogression as a mechanism for safeguarding labor rights.

Keywords: Outsourcing. Social Precarious Work. Principle of prohibition

against social retrocess.

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Figura 01 - Organograma dos princípios específicos do Direito do Trabalho...33 Figura 02 - Distribuição das pessoas de 14 anos ou mais de idade, na força de trabalho, por condição de ocupação na semana de referência, segundo as Grandes Regiões entre os anos de 2012 e 2016 ………..……….. 54 Figura 03 – Distribuição percentual das pessoas de 14 anos ou mais de idade, na força de trabalho, por condição de ocupação na semana de referência, segundo as Grandes Regiões - 4° Trimestre - 2012-2019 ………. 55

Figura 04 - Evolução dos vínculos formais de emprego nas atividades tipicamente terceirizadas e tipicamente contratantes Brasil - 2007-2014 (em milhões de vínculos) ………...………...….……….. 74

Figura 05 - Taxa de rotatividade descontada em atividades tipicamente terceirizadas e tipicamente contratantes Brasil - 2007-2014 (em %) ………… 75

Figura 06 - Remuneração nominal média dos vínculos formais de emprego segundo atividades tipicamente terceirizadas e tipicamente contratantes Brasil, 2007-2014 (em R$ e %) ………..………....…… 77

Figura 07 - Distribuição dos vínculos formais de emprego por faixa de

remuneração, segundo sexo em atividades tipicamente terceirizadas e

tipicamente contratantes Brasil, 2014 (em números absolutos) ..…....………. 78

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INTRODUÇÃO ………....….... 9

1 TRABALHO NA SOCIEDADE CAPITALISTA: configuração e proteção social ……….... 14

1.1 Do trabalho precarizado: perspectivas acerca da exploração trabalhista no modelo capitalista ………...…..…… 14

1.2 Evolução histórica da proteção ao trabalho ……….. 23

1.3 Origens do Direito do Trabalho moderno ……….. 29

2 PRECARIZAÇÃO DO TRABALHO: contrarreforma trabalhista e retrocessos no âmbito da proteção ao trabalhador ……….…... 39

2.1 Proteção ao trabalho no âmbito da legislação brasileira ………..….. 39

2.2 A contrarreforma trabalhista de 2017 e a Lei da Terceirização ……. 45

2.3 O verdadeiro significado da flexibilização ………... 58

3 NOVO REGIME DE TRABALHO TERCEIRIZADO NO BRASIL E O PRINCÍPIO DA VEDAÇÃO AO RETROCESSO SOCIAL ……….…… 66

3.1 Terceirização: o que os dados nos apontam………...66

3.2 Trabalho terceirizado e o princípio da vedação ao retrocesso social..80

CONCLUSÃO ………...………. 90

REFERÊNCIAS ……….. 92

ANEXOS ………... 101

Anexo I - Lei nº 13.429/2017 (Lei da Terceirização) ……...………. 102

Anexo II - Nota Técnica nº 172 (Terceirização e precarização das

condições de trabalho Condições de trabalho e remuneração em

atividades tipicamente terceirizadas e

contratantes………...…………...108

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INTRODUÇÃO

Em sua insaciável busca pela acumulação, o capital não conhece limites e empossa-se de todas as áreas da vida do trabalhador, estendendo seus danos nefastos inclusive no âmbito da saúde. Não se importa com as consequências que a exploração da mão de obra acarreta para a estabilidade social ou integridade física e mental do trabalhador, do qual, não raramente, exige esforços sobre-humanos.

A segurança jurídica e econômica do trabalhador passa a integrar o conjunto de valores submetidos aos anseios do mercado, constituindo verdadeira moeda de troca na relação trabalhista. O trabalhador, ante a necessidade de garantir sua mínima subsistência, vê-se impelido a submeter-se ao trabalho em condições cada vez mais precárias e, muitas vezes, na completa irregularidade legal.

Essa exploração feroz, cada vez mais, passa a constituir um ponto comum em nossos dias, onde a acumulação do capital não pode ocorrer sem estar atrelada à exploração da mão de obra barata daqueles que encontram apenas no trabalho, ainda que desvirtuado, sua única fonte de sobrevivência.

Nesse processo extenuante de trocas, a saúde e a segurança do trabalhador é moeda de pouco valor e seu adoecimento e descarte é encarado com naturalidade e como consequência obrigatória de uma vida de trabalho destinada a enriquecer a todos, menos a si.

É com esse enfoque que o presente trabalho busca discutir os longos processos de flexibilização e desregulamentação dos meios protetivos ao trabalho, analisando mudanças significativas no âmbito da legislação e jurisprudência trabalhistas, destinando-se a tecer críticas, sobretudo, à contrarreforma trabalhista de 2017 e ao atual regime de trabalho terceirizado, apresentando as condições precárias que impõem ao trabalhador, aumentando a informalidade e insegurança jurídica dos contratos de trabalho.

Tais condições foram avaliadas a partir da análise das consequências que

essas alterações geram sobre a segurança do trabalhador, bem como de sua saúde,

seja ela física ou mental.

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Assim, partindo desse entendimento, este trabalho põe-se a examinar o processo de (re)precarização encartado sobre a proteção ao trabalho, principalmente, tendo em vista o caráter regressivo que imbuí os contratos de terceirização, agora legitimados pela Lei nº 13.429/2017.

Do ponto de vista metodológico, trata-se de uma pesquisa bibliográfica, pois há a utilização de fontes secundárias como referência para a pesquisa, tais como livros, artigos e teses, mediante as quais serão analisadas algumas das mudanças mais significativas impostas pela Lei nº 13.429/2017, bem como as consequências de tais alterações legislativas no âmbito da sociedade capitalista e os impactos que a ofensiva neoliberal exerce sobre as garantias trabalhistas, mediante a terceirização.

Na delimitação do tema, foram usados os critérios estabelecidos por Gil (2002), quais sejam espacial, temporal e de universo (ou população).

No critério espacial, a pesquisa, embora não tenha um locus físico, foi delimitada aos instrumentos angariados, como a legislação brasileira e comparada de outros países, bem como os julgados que tratam do tema. Foram usadas também as produções doutrinárias

2

acerca da terceirização e do princípio da vedação ao retrocesso social.

No critério temporal, optou-se por apoiar a pesquisa em coleta de dados relativos à terceirização entre os anos de 2007 e 2018, sendo este o ano posterior à entrada em vigor da Contrarreforma Trabalhista e da Lei da Terceirização. Essa opção temporal deu-se em virtude da escassez de dados acerca da terceirização após a sua ampliação pela Lei 13.429/17, mas que servem para demonstrar a realidade dos postos de trabalho terceirizado no Brasil.

Quanto ao critério de universo ou população da pesquisa, pela natureza principiológica da pesquisa, é possível apenas analisar de forma abstrata a repercussão das alterações nos contratos de trabalho em regime terceirizado.

2 No estudo do Direito, doutrina refere-se ao conjunto de conhecimentos produzidos por juristas (communis opinio doctorum) que embasam a criação, interpretação, aplicação e, inclusive, revogação de normas jurídicas. É considerada uma importante fonte do Direito.

(14)

Decidiu-se por não realizar a pesquisa, que anteriormente seria direcionada a entrevistar os terceirizados contratados pela Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (UERN), ante a possibilidade de que entrevistas ou questionários pudessem causar constrangimento.

A pesquisa sobre o tema proposto deu-se por meio de bibliografia especializada, centrando-se, majoritariamente, em escritos da Sociologia do Trabalho, do Serviço Social e do Direito, com especial enfoque ao Constitucional e Trabalhista com o escopo de realizar um levantamento das obras que tratam sobre o assunto, reunindo-as na maior quantidade possível para analisá-las e selecionar aquelas mais adequadas aos objetivos do trabalho.

Posteriormente, a investigação foi feita com base em literaturas acadêmicas diversificadas, considerando uma análise multidisciplinar acerca da proteção de direitos sociais. A pesquisa bibliográfica teve a intenção de reunir conceitos que se liguem ao tema pesquisado, possibilitando o aprofundamento no entendimento do assunto.

Outrossim, realizou-se buscas em sites da internet, com o fito de se localizar artigos científicos, matérias, notas, dentre outros que tratam da temática e corroborem para o desenvolvimento deste trabalho.

Foi utilizada também a pesquisa documental realizada com o uso de leis, produções de órgãos especializados no estudo dos fenômenos sociais, sobretudo o trabalho, (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos - DIEESE; Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE etc.) e de decisões encartadas na jurisprudência pátria, especialmente do Supremo Tribunal Federal e Tribunal Superior do Trabalho, visando identificar o posicionamento destes tribunais superiores sobre o assunto.

Por fim, a presente pesquisa pode ser classificada como qualitativa,

adotando o caráter descritivo, visto que traça as principais características acerca da

terceirização e do princípio da vedação ao retrocesso social, sendo também

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compreensiva exploratória, realizando o levantamento e análise de obras que fundamentem a tese a ser defendida no trabalho.

Inicialmente, buscou-se aprofundamento na categoria trabalho, em suas múltiplas facetas, e na análise de como o padrão de acumulação flexível encartado nos últimos quarenta anos representa um dos principais agentes do capital na investida contra a moderna estruturação trabalhista e aos mecanismos de proteção ao trabalho.

Para tanto, o primeiro tópico desta dissertação destina-se a tecer comentários acerca da evolução histórica da proteção ao mundo do trabalho, passando por diversas sociedades ao longo do tempo, inclusive o Brasil. Além disso, aborda-se as origens do Direito do Trabalho enquanto ramo jurídico estruturado, demonstrando-se sua ligação direta com o crescimento da organização sindical no mundo.

O segundo tópico tratará dos processos de exploração do trabalho e da flexibilização da proteção trabalhista, com enfoque na contrarreforma trabalhista de 2017, expondo e analisando as mais significativas alterações na legislação do trabalho impetradas pela nova lei, bem como as críticas a ela feitas por juristas e sociólogos. A perspectiva principal deste capítulo é demonstrar que a Contrarreforma configura-se como instrumento de mitigação da proteção ao trabalho, subjugando-o às pretensões do capital.

Hodiernamente, discute-se ainda as possíveis benesses da flexibilização, o que se constitui em clarividente tentativa de justificar modificações legais, tais como a contrarreforma trabalhista e a nova lei de terceirização. Essa discussão doutrinária de conceitos será abordada ainda no segundo capítulo, como fruto de processos de precarização do trabalho.

O terceiro tópico tratará da terceirização, sua origem, regulamentação

legal e a inquirição acerca dos discursos de modernização propostos pelo regime de

trabalho terceirizado. Os baixos custos de produção e a ausência de

responsabilização direta das empresas que se valem de serviços subcontratados

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acarretou, sobretudo, após a década de 1980, um crescimento nos contratos de trabalho terceirizado.

Sabe-se que, no âmbito brasileiro, embora por muitos anos a regulamentação da terceirização tenha sido constituída como lacuna legal, ante a ausência de norma que disciplinasse sua aplicação, isso não representou empecilho para que os contratos terceirizados florescessem em nossa sociedade.

O estudo nessa terceira tópico irá, portanto, centrar-se na avaliação das condições enfrentadas pelos trabalhadores brasileiros no regime de terceirização no Brasil, valendo-se de dados de importantes entidades sindicais e de pesquisas acadêmicas na área. Ante a recente regulamentação da terceirização no Brasil, com a Lei nº 13.429/2017, será feito um exame das novas condições instituídas pela novel legislação.

O trabalho prossegue sua construção com a abordagem ao principal instituto de proteção aos direitos fundamentais, sobretudo aos sociais, valendo-se da doutrina sociojurídica moderna, a qual apresenta o entendimento pela maximização da tutela das conquistas sociais.

Apresenta-se o princípio da vedação ao retrocesso social, vetor de validade principal, dentro deste trabalho, para a aferição acerca da validade das contrarreformas implementadas pelo governo brasileiro nos últimos anos.

Desse modo, as modificações no âmbito da regulamentação da

terceirização serão cotejadas com os desígnios de proteção ao trabalho e aos

demais direitos fundamentais e com as instruções assentadas pelo princípio da

proibição ao retrocesso social, dispondo-se a averiguar se tal regime trabalhista

constitui ou não violação à segurança jurídica do trabalhador.

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1 TRABALHO NA SOCIEDADE CAPITALISTA: configuração e proteção social

1.1 – Do trabalho precarizado: perspectivas acerca da exploração trabalhista no modelo capitalista

Em O Capital, Marx (1996), discorrendo sobre o processo do trabalho, o definiu como forma de interação do ser humano com a natureza - da qual este depende para viver - a fim de alcançar a realização de suas necessidades, e

em seus elementos simples e abstratos, é atividade orientada a um fim para produzir valores de uso, apropriação do natural para satisfazer as necessidades humanas, condição universal do metabolismo entre o homem e a Natureza, condição natural eterna da vida humana e, portanto, independente de qualquer forma dessa vida, sendo antes igualmente comum a todas as suas formas sociais. (MARX, 1996, p. 303).

É célebre sua comparação entre o trabalho humano e o animal, afirmando que “o que distingue, de antemão, o pior arquiteto da melhor abelha é que ele construiu o favo em sua cabeça, antes de construí-lo em cera” (Idem, p. 298). Assim, o trabalho humano passa essencialmente por um processo cognitivo de apreensão de significados e planejamento de resultados.

O que distinguiria, portanto, o trabalho humano é que este exige uma consciência ativa do trabalhador, que não exerce suas atividades por mero instinto selvagem, a exemplo de abelhas em uma colmeia. O trabalho, mesmo o manual, é um exercício da capacidade intelectual humana destinada a atingir um determinado objetivo, pois

no processo de trabalho a atividade do homem efetua, (...) mediante o meio de trabalho, uma transformação do objeto de trabalho, pretendida desde o princípio. O processo extingue-se no produto. Seu produto é um valor de uso; uma matéria natural adaptada às necessidades humanas mediante transformação da forma. O trabalho se uniu com seu objetivo. O trabalho está objetivado e o objeto trabalhado. O que do lado do trabalhador aparecia na forma de mobilidade aparece agora como propriedade imóvel na forma do ser, do lado do produto. Ele fiou e o produto é um fio. (Idem,p.

300).

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É no trabalho que o indivíduo deposita suas aspirações e põe em prática os processos criativos que culminam na produção de bens e a geração das riquezas sociais. Desse modo, é possível apreender que o trabalho na concepção marxista assume um caráter ontológico. O trabalho fundamenta, portanto, o ser social.

Esse processo de alteração da natureza através do trabalho tem para Marx um significado muito mais amplo do que simplesmente a modificação de espaços físicos e a criação de bens materiais, mas também de mudanças nas relações sociais, políticas e históricas que definem a sociabilidade humana, tendo em vista que

na produção social da própria existência, os homens entram em relações determinadas, necessárias, independentes de sua vontade; essas relações de produção correspondem a um grau determinado de desenvolvimento de suas forças produtivas materiais. A totalidade dessas relações de produção constitui a estrutura econômica da sociedade, a base real sobre a qual se eleva uma superestrutura jurídica e política e à qual correspondem formas sociais determinadas de consciência. O modo de produção da vida material condiciona o processo de vida social, política e intelectual. Não é a consciência dos homens que determina o seu ser; ao contrário, é o seu ser social que determina sua consciência (MARX, 2008, p. 47).

No entanto, Marx entende que o trabalho possui uma natureza dicotômica, representada pelas categorias do trabalho concreto e do abstrato.

Aquele representa o atendimento das necessidades humanas, ao passo que o trabalho teria a função de ser útil ao indivíduo e garantir sua sociabilidade. Seria justamente o trabalho como fundamento da sociabilidade humana, através da modificação da natureza.

O trabalho abstrato, por sua vez, seria a configuração assumida no modo

de produção capitalista, ao passo que representa mero valor de troca e

destinar-se-ia apenas a atender às demandas do capital e não a produzir riquezas

para a classe trabalhadora. O trabalho em sua forma abstrata reflete a redução do

trabalhador à sua força de trabalho, que passa a ser apenas mercadoria.

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Todo trabalho é, por um lado, dispêndio de força de trabalho do homem no sentido fisiológico, e nessa qualidade de trabalho humano igual ou trabalho humano abstrato gera o valor da mercadoria. Todo trabalho é, por outro lado, dispêndio de força de trabalho do homem sob forma especificamente adequada a um fim, e nessa qualidade de trabalho concreto útil produz valores de uso (Idem,p. 175).

Para Marx, o trabalho é condição inerente à vida humana em sociedade, de modo que estará presente em qualquer forma socioeconômica assumida.

Entretanto, embora seja o trabalho que determine a produção da riqueza social, a relação do ser humano com esse trabalho deve ser avaliada da perspectiva histórica, o que chamou de trabalho historicamente determinado pelo modo de produção social.

Nessa concepção, o trabalho deve ser compreendido quando inserido numa análise do modelo econômico (feudal, capitalista etc.) que determina a produção. Lessa e Tonet (2012, p. 28) afirmam que

No modo de produção primitivo, era a propriedade comunal, primitiva. No modo de produção escravista e feudal, era a propriedade privada do senhor de escravos e do senhor feudal. No modo de produção capitalista, “a forma social” desta riqueza é o capital.

No modelo capitalista, assim, o trabalho caracteriza-se como abstrato e é entendido por Marx como “o dispêndio da força vital”, no qual “se transpõe continuamente da forma de agitação para a de ser, da forma de movimento para a de objetividade” (1996, p. 307). Ou seja, a ação cria o produto concreto, o qual surge do emprego de tempo “socialmente necessário” para sua produção e tem por finalidade única perpetuar a acumulação do capital.

Portanto, um valor de uso ou bem possui valor, apenas, porque nele está objetivado ou materializado trabalho humano abstrato. (...) Tempo de trabalho socialmente necessário é aquele requerido para produzir um valor de uso qualquer, nas condições dadas de produção socialmente normais, e com o grau social médio de habilidade e de intensidade de trabalho.” (Idem, p. 168/169).

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Ocorre que a jornada de trabalho, conceito desenvolvido por Marx no Livro I de O Capital, é composta por dois fatores: o trabalho necessário e o trabalho excedente. Aquele configura o dispêndio de tempo necessário para o custeio da força de trabalho, considerando que esta é objeto de compra e venda por um valor determinado.

Se, portanto, a produção dos meios de subsistência médios diários do trabalhador exige 6 horas, então ele precisa trabalhar 6 horas por dia para produzir diariamente sua força de trabalho ou para reproduzir o valor recebido por sua venda. A parte necessária de sua jornada de trabalho compreende então 6 horas e é, portanto, mantendo- se inalteradas as demais circunstâncias, uma grandeza dada. (Idem,p. 345).

No entanto, a concepção marxista ressalva que a mera produtividade não basta para a satisfação dos anseios do modelo capitalista. Todo tempo dispendido na produção de mercadorias que não pertencem ao trabalhador seria o que Marx chamou de trabalho excedente, o que propicia a perpetuação da acumulação do capital, através da mais-valia.

O segundo período do processo de trabalho, em que o trabalhador labuta além dos limites do trabalho necessário, embora lhe custe trabalho, dispêndio de força de trabalho, não cria para ele nenhum valor. Ela gera a mais-valia, que sorri ao capitalista com todo o encanto de uma criação do nada. Essa parte da jornada de trabalho chamo de tempo de trabalho excedente, e o trabalho despendido nela: mais-trabalho (surplus labour).

Assim como, para a noção do valor em geral, é essencial concebê-lo como mero coágulo de tempo de trabalho, como simples trabalho objetivado, é igualmente essencial para a noção de mais-valia concebê-la como mero coágulo de tempo de trabalho excedente, como simples mais-trabalho objetivado. Apenas a forma pela qual esse mais-trabalho é extorquido do produtor direto, do trabalhador, diferencia as formações socioeconômicas, por exemplo a sociedade da escravidão da do trabalho assalariado. (Idem, p. 331).

Inserida nesse processo de trocas, no âmbito do capitalismo, existe, assim, a intrínseca necessidade da separação entre trabalho e meios de produção.

É dessa cisão que surge a exploração do trabalho, sobretudo, em razão do

assalariamento que aprisiona o trabalhador, o qual se vê coagido a vender sua força

para garantir sua subsistência. Nesse sentido,

(21)

se por um lado, podemos considerar otrabalhocomo um momento fundante da vida humana‚ ponto de partida no processo de humanização, por outro lado, a sociedade capitalista o transformou em trabalho assalariado, alienado, fetichizado. O que era uma finalidade central do ser social converte-se em meio de subsistência. A força de trabalho torna-se uma mercadoria, ainda que especial, cuja finalidade é criar novas mercadorias e valorizar o capital. Converte-se em meio e não primeira necessidade de realização humana. (ANTUNES; BRAGA, 2009, p. 232, grifos originais).

Nesse ponto, a teoria marxista retoma o sentido ontológico do trabalho, que deveria ter a finalidade de garantir a realização do ser humano, assumindo um papel fundamental para a sociabilidade da classe trabalhadora. Entretanto, o modo de produção capitalista gera um trabalho que não é verdadeiramente livre, mas sim alienado de sua busca pela dignificação da vida humana.

Nesse contexto, torna-se importante analisar o conceito desenvolvido por Marx de alienação, fenômeno que atinge a classe trabalhadora. Para ele, os operários são os produtores das riquezas materiais e culturais, mas dela não aproveitam, visto que tais bens passam a ser detidos por um grupo muito fechado.

Essa apropriação é devida à divisão social entre classes e a reapropriação dos bens socialmente produzidos somente seria possível através da extinção de tal divisão.

Para Marx, o direito à propriedade somente teria caráter universal se esta fosse socializada e dela todos pudessem usufruir (MARX apud. COUTINHO, 2010, p.

145-146/151).

O trabalho abstrato atua, então, no processo de alienação da classe trabalhadora, ao passo que, além de não permitir mais a identificação e o desenvolvimento do trabalhador através as atividades que desenvolve, o trabalho, enquanto mercadoria, passa a consistir um mecanismo de opressão da classe trabalhadora, e assume, como Marx chamou nos Manuscritos Econômico-Filosóficos, um caráter de estranhamento, tendo em vista que o trabalhador não consegue mais se reconhecer no exercício de um trabalho que o desumaniza.

Nessa exploração sistemática, o trabalhador perde a noção do processo

do trabalho como um todo e “qualquer que seja, entretanto, seu ponto de partida,

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seu resultado final é o mesmo: um mecanismo de produção cujos órgãos são seres humanos” (MARX, 1996, p. 455).

Desse modo, o trabalho perde então sua essência primordial, sua finalidade de garantir uma existência digna ao trabalhador e deixa de ser trabalho livre, uma vez que subjugado às necessidades do capitalismo.

Ao longo dos anos, o trabalho assumiu diversas formas de precarização na sociedade capitalista. Já na fase do capitalismo monopolista

3

verifica-se a mais profunda crise do capitalismo a nível global, a qual trouxe mudanças significativas na seara do trabalho.

Foi a nova crise do capital, caracterizada como uma crise de superprodução que atingiu os países capitalistas centrais a partir de 1973, que tendeu a impulsionar, principalmente a partir dos anos 80, uma série de transformações sócio–históricas que atingiram as mais diversas esferas do ser social. Desenvolveu-se a mundialização do capital, que tende a impulsionar um novo complexo de reestruturação produtiva, uma ofensiva do capital na produção, que busca constituir um novo patamar de acumulação capitalista em escala planetária e que tende a debilitar o mundo do trabalho, promovendo alterações importantes na forma de ser (e subjetividade) da classe dos trabalhadores assalariados. (ALVES, 1999, p.

79).

Duriguetto (2011, p. 02) entende que essa crise do capital tem como efeitos que buscam o equilíbrio do sistema “o desenvolvimento de um novo padrão de acumulação (a chamada reestruturação produtiva da era da acumulação flexível) e de um novo regime de regulação (as políticas de ajustes neoliberais)”, e que tais mudanças acabam por gerar consequências, entre outras coisas, ao que chama de

“consumo da força de trabalho”.

Nesse mesmo enfoque, Abramides e Cabral (2003, online) analisam o regime de acumulação flexível sob a ótica do impacto que traz aos trabalhadores, o que consiste em entender que, em resposta à crise estrutural,

3 Abrange a terceira fase do capitalismo, caracterizada pela intervenção de bancos no processo de produção. (NETTO, José Paulo.Capitalismo Monopolista e Serviço Social.7ª ed. São Paulo: Cortez, 2009.)

(23)

o capital busca alternativas para retomar seus níveis de acumulação, que se expressam em novas formas de gestão e controle do trabalho, e obtêm a ampliação da exploração da força de trabalho, pela mais-valia relativa (inovação tecnológica) e pela mais-valia absoluta (ampliação do ritmo de trabalho).

Tal exploração manifesta-se comumente através de péssimas condições de trabalho, da criação de empecilhos para a organização dos trabalhadores e através da retirada de direitos trabalhistas já incorporados ao patrimônio jurídico da classe trabalhadora.

A morfologia atual do trabalho baseia-se no modelo toyotista de produção – um dos pioneiros na acumulação flexível, desenvolvido no Japão, como resposta a frustração do taylorismo/fordismo. Exige, em suma, um trabalhador plurivalente, capaz de adaptar-se às demandas da produção capitalista.

A reestruturação do capital, através de sua mundialização

4

, e a consequente nova morfologia do trabalho iniciou-se em meados da década de 1980, como resposta à crise de superprodução global. Esse processo de mundialização representou uma nova forma de acumulação de capital, caracterizado pelo “regime de acumulação predominantemente financeira

5

” (CHESNAIS apud ALVES, 1999, p.

54), atingindo seu ápice no Brasil a partir dos anos 1990, com o governo de Fernando Henrique Cardoso e a renovação de

processos de desestruturação (...) com a implementação da agenda neoliberal em um governo (...) amplamente comprometido com os acordos internacionais no desmantelamento de um estado forte e interventor e com o processo de desregulamentação das relações de trabalho.

(NASCIMENTO, 2008).

5Tem como características: “1. Taxas de crescimento do PIB muito baixas, inclusive em países (como o Japão) que desempenharam tradicionalmente o papel de “locomotiva” junto ao resto da economia mundial. 2. Deflação rastejante. 3. Conjuntura mundial extremamente instável, marcada por constantes sobressaltos monetários e financeiros. 4. Alto nível de desemprego estrutural 5.

Marginalização de regiões inteiras em relação ao sistema de trocas 6. Concorrência internacional cada vez mais intensa, geradora de sérios conflitos comerciais entre as grandes potências da “Tríade”

(Estados Unidos, Europa Ocidental e Japão).” (CHESNAISapudALVES, 1999, p. 55)

4Comumente referida como globalização. “François Chesnais considera mais adequado denominar o fenômeno da globalização de mundialização do capital, pois ele representa o próprio regime de acumulação do capital, e explica: o conteúdo efetivo da globalização é dado não pela mundialização das trocas, mas pela mundialização das operações do capital, em suas formas tanto industriais quanto financeiras” (CHESNAISapudSANTOS, 2001).

(24)

Esse contexto econômico, fundado na ideologia liberal que se consolidou no país, trouxe consigo diversas formas de precarização do trabalho através da desregulamentação e assumem novos significados no contexto da atual crise econômica

6

. A ampliação do trabalho temporário, por exemplo, mantém o trabalhador em situação de irregularidade, sem o reconhecimento de diversos direitos e à margem das estatísticas trabalhistas.

Abre-se espaço ainda para a venda da falsa noção do

“empreendedorismo”, o qual imbui a ideia de que o trabalhador é dono de seus próprios meios de produção, podendo determinar como e quando trabalha. A verdade é que esta modalidade representa uma forte marginalização do trabalho, a qual transfere ao trabalhador os riscos da atividade, ao passo que isenta o capitalista da responsabilidade sociojurídica para com aquele “empreendedor”.

Vasapollo (apud ANTUNES, 2009, p. 234) afirma que

as novas figuras do mercado de trabalho, os novos fenômenos do empreendedorismo, cada vez mais se configuram em formas ocultas de trabalho assalariado, subordinado, precarizado, instável, trabalho

“autônomo” de última geração, que mascara a dura realidade da redução do ciclo produtivo. Na verdade, trata-se de uma nova marginalização social e não de um novo empresariado.

Antunes (2011, p. 407) relembra a existência em pleno século XXI de trabalho em condições análogas a de escravos, com jornadas que ultrapassam as 17 (dezessete) horas diárias, na maior cidade do país, São Paulo. Ele afirma que

estas modalidades de trabalho — configurando as mais distintas e diferenciadas formas de precarização do trabalho e de expansão da informalidade — vêm ampliando as formas geradoras do valor, ainda que sob a aparênciadonão valor,utilizando-se de novos e velhos mecanismos de intensificação (quando não deautoexploraçãodo trabalho).

Na busca pela maximização do lucro, o capital objetiva assim eliminar a existência do trabalho estável, o qual garante direitos e de segurança à

6Na teoria marxista, as crises econômicas são resultado da própria acumulação de capital e sempre se repetem, ciclicamente, de tempos em tempos.

(25)

classe-que-vive-do-trabalho

7

, o que Antunes (Idem, p. 407) chama de

“eliminação/utilização dos resíduos da produção”, afirmando que “a eclosão generalizada do desemprego estrutural em escala transnacional é a expressão-limite mais aguda e trágica dessa destrutividade presente no mundo do trabalho” (p.

407-408).

A nova condição de trabalho está sempre perdendo mais direitos e garantias sociais. Tudo se converte em precariedade, sem qualquer garantia de continuidade. O trabalhador precarizado se encontra, ademais, em uma fronteira incerta entre ocupação e não ocupação e também em um não menos incerto reconhecimento jurídico diante das garantias sociais.

Flexibilização, desregulação da relação de trabalho, ausência de direitos.

Aqui a flexibilização não é riqueza. A flexibilização, por parte do contratante mais frágil, a força de trabalho, é um fator de risco e a ausência de garantias aumenta essa debilidade. Nessa guerra de desgaste, a força de trabalho é deixada completamente descoberta, seja em relação ao próprio trabalho atual, para o qual não possui garantias, seja em relação ao futuro, seja em relação à renda, já que ninguém o assegura nos momentos de não ocupação. (VASAPOLLOapudANTUNES, 2009, p. 234)

Esse desemprego estrutural ao qual refere-se o autor tem por base uma categoria já desenvolvida por Marx (1996), referida por este como “exército industrial de reserva”, ou seja, a massa de trabalhadores que, estando desempregados, acabam por integrar a força de trabalho excedente.

[...] a acumulação capitalista sempre produz, e na proporção de sua energia e de sua extensão, uma população trabalhadora supérflua relativamente, isto é, que ultrapassa as necessidades médias da expansão do capital, tornando-se, desse modo, excedente (Idem, p. 731).

Esse excedente tem origem, sobretudo, em modificações de ordem técnica que acabam por substituir a mão-de-obra humana, lançando esses

7 Expressão cunhada por Ricardo Antunes para aprofundar o conceito de classe trabalhadora desenvolvido na teoria marxista. Antunes entende que essa classe é constituída por “[...] todos aqueles e aquelas que vendem sua força de trabalho em troca de salário, incorporando, além do proletariado industrial, dos assalariados do setor de serviços, também o proletariado rural, que vende sua força de trabalho para o capital. Essa noção incorpora o proletariado precarizado, subproletariado moderno, part time, o novo proletariado dos McDonalds, os trabalhadores hifenizados de que falou Beynon, os trabalhadores terceirizados e precarizados das empresas liofilizadas de que falou Juan José Castillo, os trabalhadores assalariados da chamada “economia informal” que, muitas vezes, são indiretamente subordinados ao capital, além dos trabalhadores desempregados, expulsos do processo produtivo e do mercado de trabalho pela reestruturação do capital e que hipertrofiam o exército industrial de reserva, na fase de expansão do desemprego estrutural.” (2005, p. 103-104).

(26)

trabalhadores no desemprego que estrutura a sociedade capitalista, fornecendo “a suas necessidades variáveis de valorização do material humano sempre pronto para ser explorado, independentemente dos limites do verdadeiro aumento populacional”

(Idem, p. 859)

Tal reserva de desempregados acaba por beneficiar o capital, na medida que a existência desse grupo de trabalhadores excedentes tem influência direta nas condições de trabalho impostas, sobretudo em relação aos salários. Marx (Idem, p.

864) entende que

Grosso modo, os movimentos gerais do salário são regulados exclusivamente pela expansão e contração do exército industrial de reserva, que se regem, por sua vez, pela alternância periódica do ciclo industrial.

Não se determinam, portanto, pelo movimento do número absoluto da população trabalhadora, mas pela proporção variável em que a classe trabalhadora se divide em exército ativo e exército de reserva, pelo aumento ou redução do tamanho relativo da superpopulação, pelo grau em que ela é ora absorvida, ora liberada.

A esse contexto de crise estrutural do capital soma-se também a “crise de (de)formação do sujeito de classe, determinação tendencial do processo de precarização estrutural do trabalho” (ALVES, 2013, p. 13), na qual a fetichização do trabalho abre espaço também à violação da segurança e da saúde do trabalhador, bens jurídicos que passam a constituir também mercadorias.

1.2 - Evolução histórica da proteção ao trabalho

Desde os primórdios da humanidade, o trabalho sempre exerceu papel fundamental na sociedade como fator de organização e de edificação da pessoa enquanto ser social. Nas sociedades primitivas, o trabalho sempre esteve atrelado à produção de bens que possibilitassem a subsistência do indivíduo de forma digna e seus frutos eram usufruídos por toda a comunidade.

Com o passar do tempo, essas sociedades primitivas passaram a se

organizar e ressignificar o sentido do trabalho. Nas civilizações da Antiguidade, não

raramente o trabalho era percebido como algo penoso, estando profundamente

(27)

atrelado às noções de escravidão e servidão (SILVA, 2018), a exemplo do que a história ensina sobre o Antigo Egito. Não havia nenhuma regulação que limitasse a vontade do senhor de escravos ou que estabelecesse o mínimo de proteção à classe trabalhadora. A relação entre as partes era de proprietário e mercadoria.

De modo similar ocorriam as relações de trabalho na Antiguidade Greco-Romana, sociedades nas quais imperavam a subserviência. Historiadores apontam, inclusive, que foi nesse período que surgiu o termo trabalho, originando-se da palavra latina

“tripalium, espécie de instrumento de tortura que pesava sobre os animais.

Os nobres, os senhores feudais e os vencedores não trabalhavam, pois consideravam o trabalho uma espécie de castigo. Com o passar do tempo, foram surgindo as variações, como tripaliare (trabalhar) e trepalium (cavalete de três paus usado para aplicar a ferradura aos cavalos).

(CASSAR, 2018)

No período feudal, imperava ainda a total relação de submissão entre as partes e subsistia a ausência de direitos trabalhistas, de modo que o servo recebia em contrapartida ao seu trabalho apenas proteção provinda do senhor feudal, o qual, em tese, garantia sua segurança política e militar. Assim,

os servos eram obrigados a entregar parte da produção como preço pela fixação na terra e pela defesa recebida, sendo que os senhores feudais detinham um poder absoluto no exercício do controle e organização do grupo social. Não havia, portanto, como se falar em direito dos trabalhadores. (ROMAR, 2018).

Somente no fim da Idade Média, o servo passou a ter sua personalidade

jurídica reconhecida, sendo apto a contrair direitos, embora, por muito tempo, isso

não tenha representado muito no âmbito das conquistas sociais, sobretudo

trabalhistas (CASTRO, 2013).

(28)

Foi nesse período que começaram a ser desenvolvidas as primeiras corporações de artes e ofícios, as quais reuniam artesãos de diversas especialidades para a produção de bens manufaturados.

As corporações de ofício ou associação de artes e místeres possuíam três categorias: mestre, companheiro e aprendiz. O aprendiz devia obediência ao seu mestre, e no final de seu aprendizado, em torno de cinco anos, tornava-se companheiro ou oficial. Continuava vinculado ao mesmo mestre até que o aprendiz ou o companheiro se tornassem mestres, o que acontecia somente mediante prova, que era paga. Essa dependência dos companheiros aos mestres causou grande atrito entre essas duas categorias (...) (CASSAR, 2018, p. 26)

A troca de mercadorias possibilitada por essa nova modalidade de trabalho deu ensejo à expansão das cidades e ao crescimento do comércio que, por sua vez, passou a exigir uma produção de mercadorias em maior nível.

Colocado em movimento por meio do instrumento máquina, movido a vapor, pela presença da matéria-prima e pelo principal elemento do processo de trabalho — a força de trabalho humana —, nascia, no interior do velho processo de trabalho (pautado na manufatura), a maquinaria, um processo que se estendeu para além dos simples atos de rituais de passagem, manifestando-se nas fissuras da base de produção manufatureira.

(BATISTA, 2014, p. 225).

O capitalismo consolidou-se como sistema econômico predominante e, nesse cenário, teve início o processo de industrialização da sociedade e, com ele, modificações significativas nas relações de trabalho. Romar (2018) aponta que tais alterações sobrevieram da acumulação de capitais pela burguesia, a qual passou a investir em formas de mecanização do trabalho manufaturado, o que desembocou na Revolução Industrial.

Ante o panorama liberal que se instalou pós-Revolução Francesa, à

época da industrialização já havia interferência mínima do Estado na economia e,

consequentemente, nas relações de trabalho. Os trabalhadores da época, que

anteriormente ocupavam a zona rural, agora aglomeravam-se em centros urbanos,

próximos às fábricas que empregavam milhares em condições sub-humanas.

(29)

O trabalho era insalubre e perigoso, acidentes laborais eram comuns. A jornada diária ultrapassava as 18 (dezoito) horas e não havia nenhuma proteção ao trabalho da mulher ou proibição ao trabalho infantil. Silva (2012, p. 277) escreve que

homens, mulheres e crianças amanheciam e anoiteciam nas fábricas, praticamente na carência do necessário a sobrevivência, quando não em povoados aos redores destas, padecendo diuturnamente com epidemias, fome e sem condições, ainda que mínimas, de higiene e saneamento.

Aponta-se ainda que foi por esse período que a noção moderna do termo proletário começou a se formar. Embora a expressão já remontasse à Roma Antiga, através do vocábulo proletarii (romanos que compunham a classe mais baixa da sociedade e que tinham como principal função gerar filhos – prole – para integrar o exército), foi com o amontoamento de trabalhadores em condições precárias que o termo proletariado ganhou seu sentido hodierno. Nascimento e Nascimento (2014, p.

12) afirmam que

proletário é um trabalhador que presta serviços em jornadas que variam de 14 a 16 horas, não tem oportunidades de desenvolvimento intelectual, habita em condições subumanas, em geral nas adjacências do próprio local da atividade, tem prole numerosa e ganha salário em troca disso tudo.

Em virtude dessas condições deploráveis, os trabalhadores passaram a se organizar para exigir garantias ao trabalho exercido e para lutar contra os abusos perpetrados pelos patrões, tendo sido esse o contexto que propiciou as primeiras ideias embrionárias sobre o Direito do Trabalho (CASTRO, 2013).

Essas organizações de trabalhadores firmaram as bases para o movimento sindical hodierno. Segundo Nascimento e Nascimento (2014, p. 24),

as origens do sindicalismo são encontradas na Inglaterra. Os mais antigos sindicatos eram constituídos de pequenos clubes locais cujo principal objetivo era assegurar a vigência de leis trabalhistas. Todavia, um óbice se antepunha ao movimento sindical, a proibição de associações e de reuniões, ideia que vinha da França, da LeiLe Chapelier, mantida por outros estatutos jurídicos posteriores. O sindicalismo, pela Lei contra a Conjura, em 1799 e 1800, foi considerado movimento criminoso. Os seus sócios sujeitavam-se a penas criminais. Em 1810, inúmeros tipógrafos do The

(30)

Times foram sentenciados a dois anos de prisão. O sindicalismo era um movimento clandestino e marginal. (grifo da autora)

Observa-se assim que o Liberalismo, enraizado nos valores da Revolução Francesa e que já imperava à época, não resguardava a proteção ao trabalho. Pelo contrário, a noção de supremacia da liberdade e do entendimento do trabalho como produção de riqueza e meio de satisfação do interesse humano acabou por criar na sociedade ainda mais a necessidade da tutela protetiva ao trabalho, visto que agravou a

desproporção de forças do trabalhador frente ao empregador (...), o que gerou uma realidade de grave injustiça no modelo das relações de trabalho e levou ao surgimento da chamada Questão Social, ou seja, a luta entre capital e trabalho derivada do estado de extrema exploração em que se encontravam os trabalhadores. (ROMAR, 2018)

A desproteção completa ao trabalho ampliou ainda mais a injustiça social que há anos já imperava. Criou, assim, a necessidade de

um novo sistema legislativo protecionista, intervencionista, em que o Estado deixasse a sua apatia natural e comum, sua inércia, e tomasse um papel paternalista, intervencionista, com o intuito de impedir a exploração do homem pelo homem de forma vil.(CASSAR, 2018)

Embora ainda rudimentares, por esse período surgiram as primeiras noções do que hoje convenciona-se chamar de teoria contratualista do trabalho, a qual reconheceu a necessidade de confirmar a existência de um vínculo entre trabalhador e empregador. “Não se pode ignorar que a ideia do contrato de trabalho tem o mérito de ser um divisor de águas na história do trabalho, deixando no passado o trabalho escravo e fundamentando, no plano jurídico, o trabalho livre assalariado” (DELGADO, 2019, p. 47).

Em fins do século XVIII e durante o curso do século XIX é que se maturaram, na Europa e Estados Unidos, todas as condições fundamentais

(31)

de formação do trabalho livre, mas subordinado e de concentração proletária, que propiciaram a emergência do Direito do Trabalho. (Idem, p.

100)

Desse modo, denota-se que o marco inicial para a criação do Direito do

Trabalho foi, além da organização do proletariado em associações sindicais, a

conclusão de que a desigualdade econômica e social somente poderia ser

apaziguada mediante a intervenção do Estado.

(32)

1.3 - Origens do Direito do Trabalho moderno

Ante as lutas sociais que, ao longo das décadas seguintes, ensejaram a criação de verdadeiros direitos de enfrentamento à exploração, a proteção ao trabalho aos poucos consolidou-se na sociedade moderna, embora tenha sempre sido alvo de investidas do capital. Tais processos políticos e sociais culminaram em conquistas trabalhistas que, aos poucos, foram encartadas nas leis laborais, criando um ramo jurídico hoje conhecido como Direito do Trabalho.

Seu surgimento deve-se à combinação de diversos fatores que podem ser agrupados em três grandes categorias: econômica, social e política. Nenhum desses aspectos teve influência isolada, pois “comportam dimensões e reflexos diferenciados em sua própria configuração interna (não há como se negar a dimensão e repercussão social e política, por exemplo, de qualquer fato fundamentalmente econômico)” (DELGADO, 2019, p. 101).

Nascimento e Nascimento (2014, p. 25) lembram que

o direito do trabalho nasceu também e paralelamente como expressão do intervencionismo do Estado. O Estado passou a tomar posição-chave na economia, desenvolvendo um plano de ação que compreendia uma nova posição perante as relações sociais. (grifo dos autores)

A intervenção do Estado nas relações de trabalho passa a ter caráter

“humanista”, ao passo que se destina à “proteção jurídica e econômica do trabalhador por meio de leis destinadas a estabelecer um regulamento mínimo sobre as suas condições de trabalho”, além de criar “medidas econômicas voltadas para a melhoria da sua condição social” (Idem, p. 25).

Inicialmente, as primeiras regulamentações trabalhistas feitas pelo Estado

eram chamadas de legislação industrial e nelas predominavam “o propósito de

proteger o trabalho do menor e da mulher e o de limitar a duração da jornada de

trabalho” (NASCIMENTO; NASCIMENTO, 2014, p. 26).

(33)

Para Vólia Bonfim Cassar (2018), o Direito do Trabalho tem como principal objetivo a proteção ao trabalhador que, ela compreende, deve ser feita através da “regulamentação legal das condições mínimas da relação de emprego, ou de medidas sociais adotadas e implantadas pelo governo e pela sociedade”.

Observa-se que o Direito do Trabalho é a tentativa de conferir equilíbrio às relações jurídicas no âmbito do trabalho, as quais são caracterizadas pela hipossuficiência que permeia o trabalhador perante as forças do capital (DELGADO, 2019, p. 95). Entende, assim, que

o núcleo fundamental do Direito do Trabalho se encontra, sem dúvida, na relação empregatícia de trabalho, em torno dessa relação jurídica específica é que se constrói todo o universo de institutos, princípios e regras características a esse específico ramo jurídico. (...) O Direito do Trabalho é, pois, produto cultural do século XIX e das transformações econômico-sociais e políticas ali vivenciadas. Transformações todas que colocam a relação de trabalho subordinado como núcleo motor do processo produtivo característico daquela sociedade. (Idem, p. 98-100)

Importa aqui explicar a diferença que existe, no âmbito do Direito, entre trabalho e emprego. O primeiro é considerado o gênero, do qual derivam diversas modalidades de exercer trabalho, como o avulso, o estágio etc. O segundo é uma espécie de trabalho e, para caracterizar-se, deve atender alguns requisitos específicos.

Tais elementos encontram-se no art. 3º da Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), o qual dispõe que “considera-se empregada toda pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário.”

Dissecando o dispositivo legal, extrai-se que os elementos

caracterizadores da relação empregatícia são a pessoalidade, a não eventualidade,

a subordinação e a onerosidade. Romar (2018, p. 131-136), explicando cada um dos

requisitos, assim escreve:

(34)

Pessoalidade — empregado é um trabalhador que presta serviços pessoalmente, isto é, não pode fazer-se substituir por terceiros (art. 2º, caput). (...)

Não eventualidade — empregado é um trabalhador que presta serviços continuamente, ou seja, serviços não eventuais.

(...)

Subordinação — é a sujeição do empregado às ordens do empregador, é o estado de dependência do trabalhador em relação ao seu empregador.

(...)

Onerosidade (ou remuneração) — a relação de emprego não é gratuita ou voluntária, ao contrário, haverá sempre uma prestação (serviços) e uma contraprestação (remuneração). A onerosidade caracteriza -se pelo ajuste da troca de trabalho por salário. (...)

Caso uma relação de trabalho atenda todas essas exigências, estará caracterizado um contrato empregatício. Na ausência de um dos requisitos, pode-se estar diante de outra modalidade de trabalho, como o temporário, o avulso, o estágio etc.

Tal diferenciação torna-se importante tendo em vista que, atualmente, ainda que de modo precarizado, o emprego é a forma de trabalho mais difundida.

Delgado (2019, p. 334) entende que, embora seja apenas uma das espécies de trabalho, a relação de emprego assume caráter especial, ao passo que se constitui,

“do ponto de vista econômico-social, na modalidade mais relevante de pactuação de prestação de trabalho existente nos últimos duzentos anos, desde a instauração do sistema econômico contemporâneo, o capitalismo”. Tal afirmação não significa dizer que as demais espécies de trabalho não merecem a tutela protetiva.

Tem-se, portanto, que o objeto principal do Direito Trabalhista moderno é o trabalho subordinado. O empregado (parte contratada) está em uma relação de submissão contratual ao empregador (parte contratante), o qual exerce sobre aquele autoridade no que diz respeito à execução de seu ofício. Em virtude dessa subordinação, o empregador possui poder gerenciador, de comando, podendo, inclusive, aplicar sanções ao trabalhador, dentro do que é previsto legalmente, caso entenda que este desrespeitou alguma diretiva ou disposição contratual.

No entanto, sobretudo, em virtude da predominância de tal modalidade e

da exigência de subordinação (submissão do empregado), a relação de emprego é o

(35)

principal palco para a precarização trabalhista, sendo alvo principal de irregularidades nas condições de trabalho, além da flexibilização ou desregulamentação da legislação pertinente.

Existe, assim, uma desigualdade que é inerente às relações de emprego, considerando que o trabalhador não possui o mesmo poder econômico que detém seu empregador. Em razão disso, a legislação e a doutrina trabalhista conferem ao empregado uma posição especial de tutela jurídica, tendo em vista o reconhecimento de sua condição de parte hipossuficiente dentro do contrato de emprego.

É em virtude dessa hipossuficiência que o Direito do Trabalho é permeado por princípios que buscam garantir a tutela protetiva ao trabalhador. Além daqueles previstos na Constituição Federal de 1988 (CF/88), entre os quais se destacam a dignidade da pessoa humana (art. 1º, III) e os valores sociais do trabalho (art. 1º, IV), o estudo jurídico do trabalho também elenca princípios próprios. Entretanto, antes de adentrar na exposição deles, é necessário trazer a discussão acerca da definição do que é um princípio à luz do estudo jurídico.

Os princípios têm caráter basilar no ordenamento jurídico de um Estado, ao passo que não apenas norteiam a criação e a aplicação das normas (ou regras) jurídicas, como também sozinhos têm força normativa para garantir o respeito a direitos. Possuem, portanto, o que Canotilho (2003, p. 1087) de “força normogenética”, pois “são fundamento de regras, isto é, são normas que estão na base ou constituem a ratio

8

de regras jurídicas”.

Diferenciam-se das regras - aqui entendidas como a legislação escrita em sentido estrito - por não necessitarem, em virtude de seu caráter fundamental, de estarem positivados na ordem jurídica.

8Ratio legis:Razão de ser de uma lei. “Finalidade da lei; escopo visado pela norma jurídica. Constitui pormenor de investigação indispensável para conhecer-se o alcance da lei”. (Disponível em:

https://www.jusbrasil.com.br/topicos/298172/ratio-legis)

(36)

Princípios são enunciações normativas de valor genérico, que condicionam e orientam a compreensão do ordenamento jurídico, a aplicação e integração ou mesmo para a elaboração de novas normas. São verdades fundantes de um sistema de conhecimento, como tais admitidas, por serem evidentes ou por terem sido comprovadas, mas também por motivos de ordem prática de caráter operacional, isto é, como pressupostos exigidos pelas necessidades da pesquisa e da práxis" (REALE, 2003, p. 37)

Assim, o Direito do Trabalho possui também, como ramo jurídico público, princípios inerentes à sua atuação, o que Romar (2018, p. 63) chama de “princípios específicos”, dentre os quais estão: o protetor (ou de proteção), a irrenunciabilidade, a continuidade da relação de emprego, a primazia da realidade, a razoabilidade e a boa-fé

9

.

Figura 01 - Organograma dos princípios específicos do Direito do Trabalho

Fonte: Figura da autora.10

O primeiro deles, chamado princípio da proteção

11

, fundamenta todo o sistema jurídico de tutela do trabalho. É em virtude dele que toda norma trabalhista

11 “Conhecido também como princípio tutelar ou tuitivo ou protetivo ou, ainda, tutelar-protetivo e denominações congêneres” (DELGADO, 2019, p. 233).

10Figura elaborada pela autora deste trabalho com base na doutrina de Romar (2018).

9Os estudiosos do Direito do Trabalho elencam em suas obras diversos outros princípios trabalhistas, como o da imperatividade das normas trabalhistas, o da intangibilidade salarial etc. Entretanto, para os fins do estudo ora conduzido e considerando que os princípios acima elencados são citados em todas as obras trabalhistas, este trabalho ater-se-á apenas a eles.

(37)

deve ser criada ou aplicada partindo do princípio de que a lei deve garantir especial tratamento ao trabalhador, em virtude de sua condição hipossuficiente.

Este princípio tem por fundamento a proteção do trabalhador enquanto parte economicamente mais fraca da relação de trabalho e visa assegurar uma igualdade jurídica entre os sujeitos da relação, permitindo que se atinja uma isonomia substancial e verdadeira entre eles. Seu propósito consiste em tentar corrigir desigualdades, criando uma superioridade jurídica em favor do empregado, diante da sua condição de hipossuficiente (ROMAR, 2018, p. 64).

Essa posição protetiva do Direito do Trabalho é fruto da própria construção histórica deste ramo jurídico, para o qual a liberdade individual - oriunda da noção liberal de trabalho - não pode prevalecer sobre a tutela das garantias do trabalho.

a liberdade contratual assegurada aos particulares não poderia prevalecer em situações nas quais se revelasse uma desigualdade econômica entre as partes contratantes, pois isso significaria, sem dúvida nenhuma, a exploração do mais fraco pelo mais forte. (ROMAR, 2018, p. 64).

É considerado o mais importante princípio do Direito do Trabalho. Sem ele, não haveria justificativa para a existência desse ramo jurídico. Delgado (2019, p.

233-234) entende que

há ampla predominância nesse ramo jurídico especializado de regras essencialmente protetivas, tutelares da vontade e interesses obreiros; seus princípios são fundamentalmente favoráveis ao trabalhador; suas presunções são elaboradas em vista do alcance da mesma vantagem jurídica retificadora da diferenciação social prática. Na verdade, pode-se afirmar que sem a ideia protetivo-retificadora, o Direito Individual do Trabalho não se justificaria histórica e cientificamente.

O princípio protetivo tem dimensões tão amplas que se subdivide em três

desdobramentos para sua eficaz aplicação, através dos subprincípios do in dubio

(38)

pro operario, da norma mais favorável e da condição mais benéfica, conforme a doutrina do jurista uruguaio Américo Plá Rodriguez (2015, p. 106):

a) a regra in dubio, pro operario: critério que deve utilizar o juiz ou o intérprete para escolher, entre vários sentidos possíveis de uma norma, aquele que seja mais favorável ao trabalhador; b) a regra da norma mais favorável determina que, no caso de haver mais de uma norma aplicável, deve-se optar por aquela que seja mais favorável, ainda que não seja a que corresponda aos critérios clássicos de hierarquia das normas; e c) a regra da condição mais benéfica: critério pelo qual a aplicação de uma nova norma trabalhista nunca deve servir para diminuir as condições mais favoráveis em que se encontrava um trabalhador. (grifei)

O subprincípio do in dubio pro operario determina que em caso de incerteza quanto à aplicação de uma determinada norma, a interpretação dada a ela deve ser aquela pro operario, ou seja, que priorize o interesse do trabalhador. O aspecto principal desta condição é a existência de dúvida acerca da aplicação da norma, que será sempre dirimida de modo a beneficiar o operario, permitindo que a interpretação da lei possa ser extensiva (no sentido de reconhecer e conceder direitos) ou restritiva (quando impede ou atenua possíveis prejuízos ao trabalhador).

Analisando a aplicação do in dubio pro operario, Romar (2018, p. 66) entende que, muito embora atualmente parte dos estudiosos do Direito Trabalhista considere esta uma regra superada

12

, a legislação trabalhista brasileira atual, em virtude da Contrarreforma de 2017, que alterou o art. 8º, § 3º e o art. 611-A, § 1º da Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), mitiga a validade dessa interpretação benigna à classe trabalhadora, “em especial no que tange à restrição de interpretação imposta à Justiça do Trabalho em relação ao conteúdo das convenções coletivas e dos acordos coletivos de trabalho”.

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