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Robert Chester Smith e o colonial na modernidade brasileira: entre história da arte e patrimônio

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Academic year: 2021

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CENTRO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM HISTÓRIA

Robert Chester Smith e o Colonial na Modernidade

brasileira: entre História da Arte e Patrimônio

SABRINA FERNANDES MELO

FLORIANÓPOLIS 2018

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Robert Chester Smith e o Colonial na Modernidade

brasileira: entre História da Arte e Patrimônio

Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal de Santa Catarina, como parte dos requisitos para obtenção do título de doutora em História.

Orientadora: Prof.ª Dr.ª Maria Bernardete Ramos Flores

FLORIANÓPOLIS 2018

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Agradeço primeiramente a orientadora e professora Maria Bernardete por me acompanhar, me orientar e me incentivar durante toda a jornada da pós-graduação. Grata pela acolhida com suas sábias palavras e com sua ajuda incondicional para que a pesquisa a realizada em Portugal fosse possível. Gratidão por tudo! Terá sempre meu carinho, amizade, respeito e admiração.

Agradeço às professoras Maria de Fátima Piazza e Letícia Nedel pelas importantes contribuições durante a construção da tese e pelo grande aprendizado durante as disciplinas cursadas no decorrer do doutorado. Ao professor Rodrigo Bastos, agradeço pelas referências sobre cidade colonial brasileira. Meus agradecimentos ao programa de Pós Graduação em História da UFSC e ao CNPQ por me proporcionar uma bolsa durante os anos de estudos.

A todos os funcionários do IPHAN, pela acolhida durante as pesquisa. Um especial agradecimento aos funcionários da Biblioteca de Arte da Fundação Calouste Gulbenkian Ana Barata e Carlos Morais, que nos recebeu com muita atenção e cuidado durante os quinze dias de intensa pesquisa. Agradeço novamente a parceria da Profa. Maria Bernardete durante a pesquisa no acervo e a companhia e carinho de Sandra Cruz que nos acompanhou durante a viagem.

Agradeço a Daniel Dalazzen e Caroline Bayer pela ajuda com a sistematização das fontes. Gratidão à amiga Laura Gomez pela ajuda com as tabelas e gráficos e também pelas conversas e companhia no decorrer destes anos. Agradeço às queridas amigas e parceiras Alejandra Luna e Daniela Sbravati, um dos grandes presentes que ganhei no doutorado. Aos amigos (as) e companheiros (as) de jornada, com quem dividi dúvidas, angústias e alegrias: Bruna Oliveira, Clarice Caldini, Cristina Dallanora, Deusa Maria, Fran Dossin, Flávia Souza, Juliana Schmidt, Onete Podeleski, Eloisa Rosalen, Marcos Soares, Michele Petry, Marcelo Sabino, Juzélia Moraes, Rafael Oliveira e Tiago José.

Sou grata a minha família pelo carinho, compreensão e suporte em todos os momentos necessários. Por entenderem minhas ausências e me ajudarem a percorrer este caminho com mais leveza e tranquilidade. Meu amor e gratidão a Mira Cruz, por me apoiar durante toda minha vida acadêmica, a minha mãe Irani Melo, meu pai José Antônio, minha irmã Camilla Melo e a pequena Catarina. A minha avó Heroína, grande fonte de inspiração e sabedoria. Minha eterna gratidão aos sogros Maria da Graça Binato e Tadeu Castro pelo suporte nos momentos cruciais de escrita, que pedem dedicação e reclusão. Agradeço por terem cuidado

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meu companheiro de vida, João Castro pela parceria, apoio e amor incondicional. Agradeço imensamente ao nosso maior presente, o pequeno Caetano, que nasceu durante meu segundo ano de doutorado e que com sua sabedoria pura e iluminada, me faz feliz em todos os momentos e preenche meu coração de amor e alegria.

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Na primeira metade do século XX, houve uma convergência de interesses para a temática colonial, especificamente para a arte e arquitetura colonial brasileira, oriundas de diferentes países como Estados Unidos, Portugal e Brasil. Nesses três países, foram instauradas políticas de Estado e de aproximação cultural voltada para a temática colonial, amparadas por instituições, pesquisas, publicações e eventos em confluência de agentes e sujeitos que utilizaram o colonial com diferentes perspectivas. Dentre esses inúmeros sujeitos, intelectuais e pesquisadores envolvidos, utilizo como fio condutor o historiador da arte Robert Chester Smith, que transitou entre os três países mencionados. Robert Smith realizou sua formação acadêmica em Harvard e, dentre as inúmeras temáticas pesquisadas por ele, dedicou-se principalmente à arte e arquitetura luso-brasileiras. Smith estabeleceu vínculos de trabalho e pesquisa com os governos de seu país de origem (Estados Unidos), Portugal e Brasil apoiado financeiramente por instituições, como a American Council of Learned Societies, Guggenheim Foundation e Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (SPHAN). Nesse contexto, o objetivo geral da tese é perceber como o projeto de catalogar e inventariar a arte e arquitetura colonial brasileira dialoga com o projeto para o patrimônio nacional – que buscava garantir a constituição de uma identidade genuinamente brasileira –, e com um projeto internacional, no qual países como Estados Unidos e Portugal se interessaram pela arte cultura do Brasil e de outros países latino-americanos. Tal análise permite o entendimento da atuação de Smith nos Estados Unidos, em Portugal e no Brasil, além da compreensão entre as articulações entre patrimônio, arte e arquitetura do período colonial, em momentos políticos e culturais de aproximação entre os três países. Entender as abordagens e perspectivas teóricas da temática colonial, adotada por grupos, como os modernistas, representantes do movimento neocolonial, e pesquisadores estrangeiros, torna-se relevante na compreensão de um movimento mais amplo: a tentativa de inserir a História da Arte brasileira em um debate central e não periférico.

Palavras- Chave: Robert Chester Smith. Colonial. História da Arte. Patrimônio.

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In the first half of the twentieth century there was a convergence of interests for the colonial theme, specifically for Brazilian colonial art and architecture, from different countries such as the United States, Portugal and Brazil. In these three countries, state policies and cultural approaches focused on the colonial theme were established, supported by institutions, research, publications and events at the confluence of agents and subjects who used the colonial from different perspectives. Among these innumerable subjects, intellectuals and researchers involved, I use as the guiding thread the historian of art Robert Chester Smith, who transited between the three countries mentioned above. Robert Smith completed his academic training at Harvard and among the many themes researched by him he devoted himself mainly to Luso-Brazilian art and architecture. Smith established working and research ties with the governments of his home country (United States), Portugal and Brazil, financially supported by institutions such as the American Council of Learned Societies, the Guggenheim Foundation and the National Historical and Artistic Heritage Service (SPHAN). In this context, the general objective of the thesis is to understand how the project of cataloging and inventing Brazilian colonial art and architecture dialogues with the project for the national patrimony - that sought to guarantee the constitution of a genuinely Brazilian identity and aesthetics, and with an international project, in which countries like the United States and Portugal became interested in the art of culture in Brazil and other Latin American countries. This analysis allows the understanding of Smith's performance in the United States, Portugal and Brazil, as well as the understanding between the articulations between patrimony and art architecture of the colonial period in political and cultural moments of approximation between the mentioned countries. Understanding the theoretical approaches and perspectives of the colonial theme, adopted by groups such as the modernists, representatives of the neocolonial movement and foreign researchers, becomes relevant in the understanding of a broader movement: the attempt to insert the History of Brazilian Art in a central debate and not peripheral.

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Figura 1 - Matéria sobre a exposição de Robert Smith na 4º Bienal

Internacional de arquitetura de São Paulo, em 1990 ... 23

Figura 2 - Biografia de Robert Chester Smith ... 60

Figura 3 - Fotografia de Robert Chester Smith ... 62

Figura 4 - Notícia de jornal sobre o curso intensivo de verão de Português, 1942. Foto de Inter-Americana ... 78

Figura 5 - Parte externa da Igreja da Venerável Ordem Terceira de São Francisco, Salvador, Bahia. S/d. Fotografia de Robert Chester Smith .. 85

Figura 6 - Detalhe da talha do altar da Igreja do Convento de São Francisco, Salvador, Bahia ... 86

Figura 7 - Notícia de Jornal em Homenagem a Robert Smith escrita por Flávio Gonçalves em 1970 ... 113

Figura 8 - Perspectiva do Pavilhão do Brasil, 1939, Exposição do Mundo Português (1940), Belém, Lisboa. De Raul Lino ... 118

Figura 9 - Listagem de colecionadores. Cidade de Joinville/SC e Curitiba/PR ... 138

Figura 10 - Listagem de colecionadores. Cidade de Joinville/SC e Curitiba/PR ... 138

Figura 11 - Volumes inéditos do livro Arquitetura Colonial Brasileira de Robert Smith ... 192

Figura 12 - Índice do livro Arquitetura Colonial Brasileira, de Robert Chester Smith ... 193

Figura 13 - Notícia sobre a visita de Smith ao Ministério da Educação ... 218

Figura 14 - Sobrado típicos de São Luiz do Maranhão. Foto de Robert Chester Smith. ... 228

Figura 15 - Sobrado típicos de São Luiz do Maranhão. Foto de Robert Chester Smith. ... 228

Figura 16 - Notícia de jornal sobre a viagem de Robert Smith para Vitória- Espírito Santo ... 240

Figura 17 - Notícia de Jornal sobre a viagem de Robert Smith a Pernambuco ... 242

Figura 18 - Crônica de Manuel Bandeira sobre exposição de Frans Post ... 266

Figura 19 - O Rio São Francisco de Frans Post, 1647 ... 269

Figura 20 - A Fortaleza dos Reis Magos, Frans Post, 1637 ... 270

Figura 21 - A cidade de Igarassu de Frans Post, 1647 ... 271

Figura 22 - Um engenho de cana- de -açúcar, de Frans Post (s/d) ... 272

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Figura 25 - Detalhe de uma aquarela do Rio Cunaré. Francisco Requena, s/d. ... 276 Figura 26 - Métodos de Construção de uma Canoa de Francisco

Requena (s/d) ... 277 Figura 27 - Armário da Sacristia. Igreja da Venerável Ordem de São Francisco, Salvador, Bahia... 281 Figura 28 - Ex-votos do Senhor Jesus dos Navegantes ... 284 Figura 29 - Ex-voto a Sant'Ana por milagre concedido a Maria Joaquina de Menezes... 287 Figura 30 - Estátuas e quadros de ex-votos em madeira ... 290

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Gráfico 1 - Publicações de Robert Smith sobre o Brasil ... 178 Gráfico 2 - Robert C. Smith na imprensa brasileira ... 183 Gráfico 3 - Rede de correspondências de Robert Smith ... 208 Gráfico 4 - Fluxo de correspondências de Robert Smith entre 1945-1975 ... 209 Gráfico 5 - Temáticas pesquisadas por Robert Smith ... 251

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Quadro 1 - Eventos relacionados aos Estudos Latino- Americanos ... 81 Quadro 2 - Principais arquivos e instituições pesquisadas por Smith nos Estados Unidos ... 90 Quadro 3 - Principais intelectuais citados no decorrer do capítulo 1 e suas relações com Robert Smith ... 92 Quadro 4 - Lista de Arquivos pesquisados por Smith em Portugal ... 104 Quadro 5 - Principais publicações e eventos dos quais Smith participou relacionados aos Estudos Luso-Brasileiros ... 116 Quadro 6 - Principais nomes citados no decorrer deste capítulo e suas relações com Robert Smith ... 148 Quadro 7 - Publicações de Robert Smith sobre o Brasil ... 179 Quadro 8 - Principais nomes citados no decorrer do capítulo 3 e suas relações com Robert Smith ... 197 Quadro 9 - Representantes do SPHAN, cidades e arquivos visitados por Smith durante a viagem ao Brasil de 1937 ... 213 Quadro 10 - Representantes do SPHAN, cidades e arquivos visitados por Smith durante a viagem ao Brasil de 1946... 234 Quadro 11 - Principais nomes citados no decorrer deste capítulo e suas relações com Robert Smith ... 246

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ACLS – American Council of Learned Societies

AHE-RJ – Arquivo Histórico do Estado do Rio de Janeiro BNRJ – Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro

DPHAN – Diretoria do Patrimônio Artístico Nacional EUA – Estados Unidos da América

FCG – Fundação Calouste Gulbenkian FNFi – Faculdade Nacional de Filosofia

GHAHR – Guide Hispanic American Historical Review HAHRH – Hispanic American Historical Review HLAS – Handbook of Latin American Studies IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística ICOM - The International Council of Museum IEB – Instituto de Estudos Brasileiros

IHGB – Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro ILAS – Institutes of Latin American Studies

IPHAN – Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional MBEB –Manual Bibliográfico de Estudos Brasileiros

MES – Ministério da Educação e Saúde NDEA – National Defense Education Act

OCIAA – Office for Coordination of Comercial and Cultures Relations between the America

SNI – - Secretariado Nacional de Informação

SPHAN – Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional USP – Universidade de São Paulo

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 23 ROBERT SMITH E O BRASIL ... 26 APONTAMENTOS TEÓRICOS E METODOLÓGICOS ... 28 A COMPOSIÇÃO DA TESE ... 41 ROBERT SMITH E A TEMÁTICA COLONIAL: RETOMANDO AS DISCUSSÕES ... 43 CAPÍTULO 1 - HISTÓRIA E ARTE LATINO-AMERICANA NOS ESTADOS UNIDOS: UMA GUINADA PARA O COLONIAL ... 47 1.1 SOBRE ARTE LATINO-AMERICANA ... 51

1.2 A FORMAÇÃO DE ROBERT SMITH COMO HISTORIADOR

DA ARTE ... 59

1.3 A FUNDAÇÃO HISPÂNICA E AS PESQUISAS REFERENTES

À AMÉRICA LATINA ... 67 1.4 AMÉRICA LATINA EM (RE)VISTAS ... 74

1.5 METODOLOGIAS PARA O COLONIAL: FOTOGRAFIA E

ESTUDO DE IMAGENS ... 82 CAPÍTULO 2 - VISEUS E BRAGAS NOS TRÓPICOS ... 103

2.1 ARTE PORTUGUESA: “UM CAMPO NEGLIGENCIADO DA

HISTÓRIA DA ARTE” ... 107 2.2 OS ESTUDOS LUSO-BRASILEIROS E AS POLÍTICAS DE

APROXIMAÇÃO ENTRE BRASIL E PORTUGAL ... 114 2.3 URBANISMO E ARQUITETURA LUSO-BRASILEIRA ... 121 2.4 A TALHA PORTUGUESA ... 132 2.5 O ESPÓLIO DE ROBERT SMITH: ENTRE ARQUIVOS E

IMAGENS ... 135 CAPÍTULO 3 - (re)SIGNIFICAÇÕES DO COLONIAL NO

BRASIL ... 152 3.1 PESQUISADORES NACIONAIS E O COLONIAL ... 155 3.2 A PRESENÇA ESTRANGEIRA ... 170 3.3 PESQUISADORES ESTRANGEIROS E O COLONIAL ... 185 CAPÍTULO 4 - ROBERT SMITH NO BRASIL: UM

HISTORIADOR EM CAMPO... 202 4.1 “AOS AMIGOS DO PATRIMÔNIO" ... 205 4.2 A VIAGEM DE 1937: UM MAPEAMENTO DA

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ICONOGRÁFICOS ... 231 CAPÍTULO 5 - PROBLEMÁTICAS SOBRE ARTE ... 250 5.1 HISTÓRIA DA ARTE NO BRASIL, POR ROBERT C. SMITH254 5.2 O COLONIAL EM PINTURAS ... 264 5.3 ARTES DECORATIVAS, MOBILIÁRIO E ARTE VOTIVA .. 278 EPÍLOGO ... 292 REFERÊNCIAS ... 299 APÊNDICE A - CRONOLOGIA ROBERT C. SMITH ... 318 APÊNDICE B - NOTÍCIAS SOBRE ROBERT SMITH

PESQUISADAS NA HEMEROTECA DIGITAL (1937 – 1955) .. 320 APÊNDICE C - CORRESPONDÊNCIAS PESQUISADAS NA FUNDAÇÃO CALOUSTE GULBENKIAN ... 350 APÊNDICE D -CORRESPONDÊNCIAS PESQUISADAS NO ARQUIVO DO IPHAN- RJ ... 364

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INTRODUÇÃO

“Quem era realmente Robert Chester Smith”? Com esse

questionamento foi inaugurada a exposição Robert C. Smith 1912-1975

– A investigação na História de Arte, durante a 4º Bienal Internacional

de Arquitetura de São Paulo, em 1990 (Figura 1). Foram expostos documentos e imagens pertencentes ao espólio documental de Robert Smith, cedido por ele mesmo, via testamento, à Fundação Calouste Gulbenkian, sediada em Lisboa. A seleção de imagens expostas ocorreu em meio as mais de doze mil fotografias sobre arte e arquitetura luso-brasileira, produzidos por Robert Smith em viagens ao Brasil. Na mesma exposição, foram abordados aspectos de sua vida pessoal e as redes de relações estabelecidas formadas por ele, evidenciadas em correspondências com intelectuais brasileiros, europeus e norte-americanos1.

Figura 1 - Matéria sobre a exposição de Robert Smith na 4º Bienal Internacional de arquitetura de São Paulo, em 1990

Fonte: Jornal Cultura. Arquivo da Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa, Portugal.

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A exposição foi construída com base no espólio documental de Smith, doado por testamento à Fundação Calouste Gulbenkian (FCG), em Lisboa, Portugal, e enfatizou seus trabalhos dedicados à arte colonial brasileira.

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Em 2000, a mesma exposição foi realizada na capital portuguesa com o objetivo de lançar um olhar sobre a vida de um homem que “desembarcou em Lisboa antes da II Guerra Mundial e nunca mais parou de estudar o barroco colonial” (MILHEIRO, 1990, p. 28). A Bienal de Arquitetura e a exposição Robert (re) introduziram, no circuito brasileiro, o acervo desse historiador norte-americano, constantemente retomado para os estudos referentes ao período colonial brasileiro (1500-1822) e para a talha decorativa em Portugal. Esse seria o início de um processo de „patrimonialização da memória‟ de Robert Smith no Brasil, uma trajetória iniciada por ele na década de 1930, retomada em 1990 e documentada em 2014, pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, por meio da publicação e compilação de seus escritos a respeito do Brasil.

“Quem era realmente Robert Smith?”. Um questionamento

similar ocorreu-me quando tive o primeiro contato com as obras desse historiador em 2012, em um encontro com minha orientadora, Dra. Maria Bernardete Ramos Flores, em sua biblioteca particular. Chegamos ao nome de Robert Smith em uma conversa sobre inventários de arte e registros imagéticos da arte brasileira. Esses registros visuais chamaram a minha atenção no decorrer das pesquisas para minha dissertação de mestrado (MELO, 2013), na qual a temática central se relacionava à ambiência urbana, à arquitetura, à visualidade das cidades e ao patrimônio edificado em Florianópolis. Entretanto, o enfoque incidiu nas construções tidas como „modernas‟, distintas de um cenário tipicamente barroco ou eclético, o art déco, que, com seus traços geométricos e ausências de ornamentação, provocou estranhamento em meio à arquitetura típica do período colonial. Em Robert Smith, tal problemática se inverte. Seu interesse estava na tradição, na herança da arquitetura portuguesa no Brasil, no momento em que imagens e visualidades tidas como „modernas‟ invadiam os espaços urbanos.

Em meio aos novos estilos, emergiram discussões acerca da necessidade de preservação da arquitetura colonial, principalmente do estilo barroco. No Brasil, o debate preservacionista e patrimonial começou a figurar em instituições públicas a partir das primeiras décadas do século XX, e a produção de imagens, sejam elas fotográficas, pinturas, inventários de arte, entre outras, tiveram um importante papel no registro do patrimônio arquitetônico e artístico brasileiros. Os inventários de arte foram utilizados em diferentes momentos históricos com intencionalidades distintas. Nos inventários, figuravam a relação de obras arquitetônicas, detalhes construtivos e

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estilísticos de exemplares da arquitetura e da arte nacional, sobretudo do período colonial. Em linhas gerais, os inventários são entendidos como documentos ilustrados por pinturas, fotografias, ou até mesmo, pela escrita, como foi o caso do livro Pau Brasil, de Oswald de Andrade, escrito após sua viagem a Minas Gerais, em 1924.

Viajantes estrangeiros também fizeram registros da paisagem urbana de diversas cidades brasileiras, como, por exemplo, Franz Post, no século XVI, e Jean Baptiste Debret, no século XIX (DEBRET, 1965). Referencio Frans Post por suas pinturas terem sido estudadas por Robert Chester Smith nos artigos As Paisagens brasileiras de Frans

Post (1938) e Três paisagens brasileiras de Frans Post (1939); e

Debret, por ter sido a principal referência do engenheiro português Ricardo Severo para a criação de um inventário arquitetônico vinculado ao Movimento Neocolonial2.

Elenco três principais correntes responsáveis por essa produção: os modernistas, com suas viagens pelo interior do Brasil3; os partidários do Movimento Neocolonial, na tentativa de criar referências estéticas para as construções; e os pesquisadores estrangeiros, em busca de material inédito e da catalogação de fontes para um campo de estudos ainda incipiente. Smith insere-se na terceira categoria: um pesquisador estrangeiro interessado na catalogação de obras de arte do período colonial brasileiro. O estudioso não estava isolado nessa empreitada, uma vez que outros pesquisadores estrangeiros, como o francês Germain Bazin, o inglês John Bury, a alemã Hanna Levy e o uruguaio Juan Giuria, estiveram no Brasil entre 1930 e 1940, com o mesmo intuito: estudar, catalogar, registrar e inventariar elementos da arte e da

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O movimento em prol da criação de um estilo arquitetônico brasileiro, já latente na Escola Nacional de Belas Artes, na atuação didática do historiador Ernesto da Cunha de Araújo Viana, germinou em São Paulo com a atuação do arquiteto Ricardo Severo, na década de 1910, e ganhou força no Rio de Janeiro, nos anos 20. O novo estilo foi batizado de neocolonial por seu patrono, o médico José Marianno Filho. Com a arquitetura, alcançou o mobiliário e outras artes utilitárias. Antes de ser um estilo, foi, sobretudo, um movimento artístico-cultural. Configurou-se por meio do debate de ideias e ações que constituíram um glossário de formas arquitetônicas destinadas a caracterizar – em pedra e cal – a nacionalidade, gerando obras que pretendiam instituir ambientes brasileiros genuínos, por serem condizentes técnica, bioclimática e culturalmente com a vida no país (CANDURU, 2009, p. 1).

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Da Viagem de Descoberta do Brasil, resultaram os trabalhos: “A arte religiosa no Brasil”, de Mario de Andrade, Manifesto da Poesia Pau Brasil e Pau Brasil, de Oswald de Andrade.

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arquitetura do período colonial do país.

Com base no livro Robert C. Smith: A investigação na História

da Arte, organizado pela Fundação Calouste Gulbenkian (SMITH,

2000), tive o primeiro contato com a obra de Robert Smith. O livro é uma coletânea de quinze artigos, escritos por diferentes historiadores da arte. Nele, há diversas imagens, fotografias, plantas e desenhos acumulados pelo historiador no decorrer de suas pesquisas. O conjunto dos textos que compõem o livro apresenta um panorama dos trajetos investigativos de Smith, possibilitando uma visão geral de suas obras com base nas problemáticas lançadas pelos diferentes autores. Graças à vasta obra do autor em foco e sua circulação entre Estados Unidos, Portugal e Brasil, notei a possibilidade de lançar novos questionamentos e olhares acerca dos temas estudados pelo historiador, cuja centralidade está na arte e arquitetura do período colonial brasileiro.

ROBERT SMITH E O BRASIL

Robert Chester Smith nasceu em 26 de fevereiro de 1912, em Cranford, no estado de Nova Jersey, Estados Unidos. Graduou-se em Belas Artes na Universidade de Harvard, em 1933. Realizou o doutorado em filosofia em 1939, nessa mesma instituição, desenvolvendo parte de sua pesquisa em Portugal4. O direcionamento dos estudos de Smith para Portugal e, posteriormente, para o Brasil iniciou-se com sua viagem de pesquisa para a Itália em 1932, para a realização de seu trabalho de conclusão sobre o arquiteto italiano Luigi Vanvitelli. A documentação encontrada por ele demandou um levantamento mais sistemático de fontes em arquivos portugueses e, para o aprofundamento dessa pesquisa, candidatou-se a uma bolsa de estudos para a Universidade de Coimbra, em 1934, sob a justificativa, segundo ele mesmo, de:

Estudar a arte, em particular a pintura, com vista a escrever uma história sobre o tema. Não existe qualquer trabalho do gênero sobre o tema, em língua nenhuma, pelo que serviria para preencher

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O trabalho de conclusão de Robert Smith foi intitulado Luigi Vanvitelli: um arquiteto napolitano do século XVIII. Sua tese foi intitulada A arquitetura de João Frederico Ludovice e de alguns de seus contemporâneos em Lisboa, 1700-1750. Foi defendida em 1936, sendo a vigésima sobre história da arquitetura a ser feita em uma universidade dos Estados Unidos, e a primeira cujo tema era posterior a 1500.

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uma das grandes lacunas da história das Belas-Artes [...]. Tenho de ir lá para iniciar um estudo exaustivo das pinturas medievais e renascentistas que chegaram até nós (SMITH, 1937 apud WOOD, 2000, p. 33).

Durante os dois anos em que residiu no país (1934 a 1936), adquiriu domínio escrito e oral da Língua Portuguesa5, estabeleceu contato com arquivos e fontes de pesquisa, como manuscritos, relatos de viagens e publicações contemporâneas. Após um intenso período de estudos em Portugal, considerou que seria o momento de visitar o Brasil. A primeira viagem ao Brasil foi 1937, financiada pela American

Council of Learned Societies (ACLS), que concedeu ao pesquisador a

soma de mil dólares (SMITH, 1937). Nos quatro meses em que esteve no país, o jovem pesquisador, com seus 25 anos de idade, teve contato com os principais arquivos e pesquisadores brasileiros.

O ano de 1937 foi marcado pela criação do Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (SPHAN) e de um intenso debate sobre arte, arquitetura e patrimônio, em pleno início do Estado Novo (1937-1945) e Política de Boa Vizinhança (1933-1945) com os Estados Unidos. O interesse pelo Brasil, por parte dos Estados Unidos e também de Portugal, começou a se delinear mais fortemente em 1930, com a adoção de políticas econômicas, artísticas, culturais e de um crescente intercâmbio intelectual e investigativo com a presença de pesquisadores de diversas áreas do conhecimento.

A segunda visita de Smith ao Brasil foi em 1946; deu-se com financiamento da Fundação Guggenheim, após o fim do Estado Novo e da Segunda Guerra Mundial, durante o governo de Eurico Gaspar Dutra. Ele voltou ao Brasil ainda em 1953, 1960 e 19696. Esta tese abarca somente as duas primeiras viagens de Smith ao Brasil, momentos marcados pelo início e fim do Estado Novo; pela Segunda Guerra Mundial; pela institucionalização das Ciências Sociais no Brasil e pela aproximação política e cultural do Brasil com Estados Unidos e Portugal.

Entre 1930 e 1940, período em que Smith se inseriu no campo intelectual brasileiro, o país passava por um momento culturalmente

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Além do domínio oral e escrito da Língua Portuguesa, Smith era fluente em alemão, francês. Estudou latim e grego (WOOD, 2000, p. 33).

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Robert Chester recebeu financiamento de outras instituições de pesquisa, como Comissão Fulbright, American Philosophical Society e Fundação Calouste Gulbenkian.

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efervescente em movimentos artísticos e em correntes intelectuais, dos quais emergiram políticas que marcaram o cenário nacional, com a publicação de revistas e periódicos, grupos artísticos, políticos e literários. Foram construídos diferentes „retratos do Brasil‟, tanto por brasileiros como por estrangeiros, sejam eles “pintados, escritos, fotografados ou musicados”, ancorados em diferentes suportes de memória, como cartas, diários, poesias, postais, fotografias (NOGUEIRA, 2005, p. 25). Nesse grande contingente de personagens encontra-se Robert Smith, personagem que atua como fio condutor da pesquisa.

Os caminhos percorridos por Smith no Brasil e sua atuação em Portugal e nos Estados Unidos guiarão toda a estrutura da tese. Certamente não será possível abordar a sua trajetória completa, nem é essa a intenção. A tentativa é percorrer seus rastros, seus vestígios acumulados nos arquivos, suas obras, as correspondências trocadas com intelectuais brasileiros, as notícias de jornais, para, assim, perceber os debates relacionados à arte colonial, à arquitetura e ao patrimônio, e como Smith se inseriu nesta ambiência intelectual. Portanto, os arquivos são também centrais nesta pesquisa, não somente para a coleta de fontes, mas como espaços de produção de conhecimento, como monumentos e dispositivos de Estado. Os arquivos foram primordiais nas pesquisas de Smith, como pesquisador dos arquivos coloniais, uma vez que, no momento de sua pesquisa, a documentação estava esparsa em cúrias, acervos pessoais e públicos. Além disso, ele foi produtor de seu próprio acervo e interlocutor de instituições interessadas em formar arquivos sobre arte e arquitetura latino-americana.

APONTAMENTOS TEÓRICOS E METODOLÓGICOS

O título Robert Chester Smith e o Colonial na Modernidade

Brasileira: Entre História da Arte e Patrimônio, indica a discussão

central da tese: a problemática colonial pensada com base ou em diálogo com a atuação de Robert Chester Smith nos Estados Unidos, Portugal e, principalmente, no Brasil. A questão colonial é entendida com base em três perspectivas: do ponto de vista temporal, como temática e como chave heurística.

Do ponto de vista temporal, que se tem por colonial, refere-se ao período compreendido entre 1530 e 1822, marcado pelo envio por parte do governo português da primeira expedição colonizadora comandada por Martim Afonso de Souza e a fundação do primeiro núcleo de povoamento no litoral do atual estado de São Paulo. Dentro desse

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recorte principal, Smith (1953, p. 218) delimitou três etapas referentes ao período. A primeira se iniciou com o estabelecimento do Governo Geral, em Salvador, e se estendeu até meados do século XVII. No referido período, a arquitetura não era tanto uma questão de estilo, mas de substituição das edificações existentes, compostas de “cipó e colmo de palmeira por estruturas de pedra cobertas de telhas” (SMITH, 1953, p. 219). O pesquisador percebeu nas construções sóbrias, utilitárias e de pequena escala uma versão simplificada do estilo da Renascença Portuguesa. O segundo período se estendeu de 1655 a 1750, ano da morte de D. João V. Encontrou, na cidade de Salvador, o centro de edificações de caráter metropolitano, nos moldes de Lisboa. O estado de Minas Gerais ganhou destaque na terceira etapa – iniciada na metade do século XVIII até 1821 com o fim da era colonial –, caracterizada pelo florescimento da escola mineira de arquitetura e pela atividade dos construtores. Essas atividades coincidiram com os eventos artísticos em Portugal durante o reinado de D. José I (1750-1777), momento no qual Lisboa foi afetada pelo terremoto de 1755.

Após o terremoto de 1755 e a reconstrução da capital lusitana iniciada por Marquês de Pombal, inaugurou-se um novo estilo arquitetônico, francês e italiano, na corte portuguesa que se modernizava. Tal tendência atravessou o além-mar e instalou-se nas edificações de diversas cidades brasileiras. Os ingredientes do “estilo pombalino” foram a rigidez clássica “influenciada agora pelo espírito de neopaladinismo internacional, o qual rapidamente espalhou-se por Roma, Paris e Madrid” (SMITH, 1953, p. 277). No Brasil, o estilo pombalino foi amplamente utilizado no Rio de Janeiro, capital do vice-reino em 1763, e em Belém do Pará.

A arquitetura do período colonial foi definida por Smith, fundamentada em quatro “estilos regionais”. Nas regiões extremas do país – Rio Grande do Sul e Amazônia –, era predominante o estilo austero das missões jesuíticas e das aldeias amazônicas, respectivamente. Em Minas Gerais e Maranhão, prevalecia a arquitetura do estilo setecentista, do norte de Portugal. O Nordeste, onde a cana de açúcar ditou o ritmo de desenvolvimento regional, abarcava os estados de Alagoas, Bahia, Ceará, Espírito Santo, Paraíba, Pernambuco e Sergipe, destacando-se pelo elevado contingente de igrejas, maiores expoentes do estilo colonial (SMITH, 1938).

Robert Smith associou e classificou as diferentes etapas do período colonial brasileiro fundamentando-se na arquitetura, nos estilos e nos movimentos ocorridos na Corte Portuguesa. Com essa afirmação, justifico o entendimento do período colonial tendo por base uma

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perspectiva temática, ou seja, o período colonial é pensado com base no patrimônio arquitetônico, no legado, na herança ou nos vestígios materiais e construtivos oriundos daquele período. Obviamente, a temática colonial pode/deve ser pensada e assim o é, sob outras perspectivas, como a empresa colonial, a escravidão, a violência, a questão indígena, de terras, dentre inúmeras outras possibilidades; todavia, os recortes temáticos dos estudos de Robert Smith direcionam-se à arte, à arquitetura e ao patrimônio. Diante disso, esta tedirecionam-se não direcionam-se debruça sobre colonial como recorte temporal, mas busca perceber como esse período estava sendo entendido/apropriado entre 1930 e 1940 pelos modernistas, pelo movimento neocolonial, pela História da Arte e patrimônio e por Robert Chester Smith, um dos inúmeros sujeitos atuantes em meio a esses movimentos.

A arte colonial está intimamente relacionada aos discursos sobre o barroco. O termo barroco começou a ser utilizado no final do século XVIII e foi transformado em um conceito com os escritos de Cornelius Gurlitt e Heinrich Wolfflin, respectivamente, com os livros Renascimento e Barroco (1888), e Conceitos e Fundamentos da

História da Arte (1915). O barroco foi Classificado de diferentes

maneiras como degeneração (Jacob Burckhardt), categoria estilística (Heinrich Wolfflin), alegoria (Walter Benjamin), projeção de desejo (Germain Bazin).

Apesar de se tratar de um tema interessante e importante para os debates sobre a arte do período colonial,o barroco, como estilo, não será discutido nesta tese, mas abordado como tema transversal que perpassa as pesquisas de Robert Smith,7 centradas na arte e arquitetura do período colonial brasileiro e produzidas em um momento de valorização e preservação em âmbito nacional e internacional (Estados Unidos e Portugal). Dentro do recorte temporal que abarca o período colonial, o que poderia ser tratado por mim como o barroco, o historiador explorou construções pouco analisadas, como fortes, fortalezas, sobrados, mercados públicos, etc. Por intermédio de obras e plantas de construções assinadas por engenheiros militares ou autoridades civis, o pesquisador se debruçou sobre o cotidiano urbano, o comércio, os agentes envolvidos nas construções, os materiais utilizados e seus

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Inúmeros autores trataram do barroco e de suas influências nas artes brasileiras, dentre eles Gomes Júnior (1998). Para lista com vasta bibliografia sobre o barroco, consultar o site:

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preços, além de observar as diferentes técnicas construtivas adotadas.8 Smith pesquisou obras „populares‟, objetos cotidianos, quadros sem autoria e com pouca visibilidade artística no período, como foi o caso da talha portuguesa e das pinturas votivas9, consideradas por ele como fontes de interpretação e pesquisa científica, como objeto de estudo da História da Arte e como patrimônio. Elas tinham algo a dizer sobre aspectos importantes da História do Brasil, relacionada à história da vida privada e ao mobiliário, além de estarem ameaçadas pelo desaparecimento. Essa pluralidade temática permite romper com a ideia de um autor/intelectual enquadrado em um perfil que, teoricamente, possibilitaria entender melhor a sua obra. Smith, sua escrita e seus interesses modificaram-se no decorrer de sua trajetória – construída sob a influência dos ambientes intelectuais brasileiro, europeu e norte-americano.

Como chave heurística, ou seja, como categoria central para as diretrizes da pesquisa, o colonial não é pensado como um fim em si mesmo, mas como ponto de partida para expandir olhares e perspectivas que partem do meu interesse por Robert Chester Smith, historiador que produziu as fontes analisadas na pesquisa e atuou nas principais instituições abordadas. O interesse de Robert pela arte e arquitetura do período colonial pode ser vinculado a um projeto mais amplo, de cunho nacional e internacional, relacionado à tentativa de cartografar, registrar e mapear as manifestações artísticas, não só do Brasil, mas de diversos países latino-americanos. De acordo com Dalton Sala (2000, p. 67), Smith era “muito bem relacionado e para qualquer país que viajasse tinha acesso aos círculos de poder”. Em seus estudos, Sala (2000 apud MILHEIRO, 1999, p. 28) conclui que “Smith, de fato, é uma peça-chave nesse jogo político”. Não se trata aqui de perceber Smith como peça fundamental ou atribuir à sua obra uma genialidade precursora. Trata-se

8

Nesses estudos, ele revelou panoramas até então desconhecidos de cidades brasileiras, como o de “Schwebel para Belém (BNRJ), o prospecto de Caetano do Recife (BNRJ), A Vista planisbéltica, vertical e marítima, do areal do Senhor Bom Jesus do Recife de Pernambuco (AHE- RJ), a Vista da Vila de Nossa Senhora do Rosário do Porto da Cachoeira e de São Félix (New York Public Library)” (BUENO, 2012, p. 34).

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Imagens/arte votivas são objetos produzidos mediante uma promessa ou um voto de fé, como quadros, placas com inscrições ou esculturas em madeira ou cera – muitas delas representando partes do corpo do enfermo que buscava a cura. Esses objetos eram depositados no interior das igrejas ou em cemitérios no intuito de pagar pelo milagre alcançado ou renovar um compromisso de fé e promessa.

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de questionar como se formaram as colaborações e relações institucionais estabelecidas no Brasil e por quem e por qual mote comum essas relações estavam permeadas. Trata-se, do mesmo modo, de ressaltar sua produção intelectual e atuação como funcionário do Estado norte-americano como relevantes para o entendimento da formação de um campo de pesquisa relacionado à arte colonial brasileira dentro do vasto campo da História da Arte.

Como dito, Smith será o fio condutor para a discussão da temática colonial, que, além de permear suas obras, se insere nos debates sobre História da Arte e Patrimônio, eixos que também compõem o título. As discussões sobre História da Arte estarão presentes a nas metodologias utilizadas por Smith para empreender suas análises e no entendimento da formação desse campo nos diferentes países em que atuou. As escolhas temáticas, as formas de abordagem, o contato com os museus, colecionadores, artistas, e as fontes utilizadas por ele, para produzir suas narrativas, são alguns dos pontos discutidos no decorrer de todos os capítulos. Ademais, Smith teve formação acadêmica em História da Arte; portanto produziu trabalhos em constante diálogo com as demandas e discussões do campo em foco.

O eixo patrimônio perpassa diversos momentos da tese e associa-se principalmente às relações de Robert Smith com o SPHAN, que nas décadas de 1930 e 1940 agrupou estudiosos interessados nos elementos artísticos e arquitetônicos do período colonial brasileiro e buscaram inseri-los como patrimônio nacional. As suas viagens pelas capitais brasileiras e as contribuições do SPHAN, sobretudo as de Rodrigo Melo Franco de Andrade, serão chaves para a compreensão das redes formadas em torno do SPHAN.

No decorrer da tese, utilizo a expressão Políticas Culturais. O termo é entendido como formulações e/ou propostas desenvolvidas pela administração pública, ou seja, pelos governos do Brasil, Estados Unidos e Portugal, e por organizações não governamentais, como empresas privadas, fundações, agências de fomento, etc., com o fim de promover intervenções na sociedade por intermédio da cultura. Na tese, o recorte volta-se especialmente para as políticas de aproximação entre os países e para as ações relacionadas aos estudos latino-americanos, à arte latino - americana e à temática colonial.

O termo Políticas Culturais é formado por dois amplos e densos conceitos já debatidos em diferentes áreas das Ciências Humanas: Cultura e Política. De acordo com Canclini (2001, p. 65), as políticas culturais definem-se como um “conjunto de intervenções realizadas pelo Estado, instituições civis e grupos comunitários organizados a fim de

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orientar o desenvolvimento simbólico, satisfazer as necessidades culturais da população e obter consenso para um tipo de ordem ou de transformação social”. Complementando essa definição, Coelho Neto (1997, p. 292) assevera que essas iniciativas buscam “promover a produção, a distribuição e o uso da cultura, a preservação e divulgação do patrimônio histórico e o ordenamento do aparelho burocrático por elas responsável”; considera, ainda, política cultural como uma “ciência da organização das estruturas culturais” cujo objetivo é “o estudo dos diferentes modos de proposição e agenciamento dessas iniciativas, bem como a compreensão de suas significações nos diferentes contextos sociais em que se apresentam”.

No entanto, ao considerar uma definição padrão de política cultural como a ação sistemática do Estado no campo da cultura, percebem-se diferentes modalidades de política cultural, anteriores ao surgimento e estabelecimento das políticas de produção e difusão. Sendo assim, a tipologia adotada na tese abarca igualmente as políticas de identidade e patrimônio, que, de acordo com Nicodemo (2013, p. 5), “aparecem muito antes das políticas contemporâneas de produção e difusão cultural, sendo originárias dos esforços de consolidação dos estados modernos por meio da construção da identidade nacional e da preservação do seu patrimônio cultural”. A escolha desse conceito deve-se à sua articulação com os agentes envolvidos em sua formulação e prática, isto é, as políticas culturais podem ser realizadas por inúmeros setores e agentes sociais, inclusive atuando em conjunto.

No decorrer da tese, abordo questões teóricas e metodológicas sobre a produção intelectual de Robert Smith e de sua experiência profissional como historiador da arte, além de estabelecer um diálogo com as obras de teóricos e intelectuais contemporâneos a ele. O conceito de Lugar de Fala é de suma importância no decorrer da tese, haja vista o trânsito de Smith por diferentes países e instituições. Os lugares de fala obedecem a determinadas regras para serem autorizadas e legitimadas. Pois, “ninguém entra na ordem do discurso se não satisfizer a certas exigências ou se não for, de início, qualificado para fazê-lo" (FOUCAULT, 1998, p.37). O Lugar de Fala atende a uma lógica que articula fala textos e situação concreta e historicamente descritível.

Do mesmo modo, Michel de Certeau (2002, p.65) atenta para os procedimentos do fazer historiográfico, iniciado pelo lugar próprio do historiador e da legitimação e definição daquilo a ser ou não dito. Certeau (2002, p. 65) entende o lugar como posição ocupada pelo historiador e sua consequente influência a imposições e particularidades delineadoras de métodos e interesses direcionados aos

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documentos/fontes e as questões a eles propostas.

Esta tese não se resume a uma biografia acabada acerca do autor, mas se aproxima dessa perspectiva ao seguir pistas e trajetos do historiador para a construção da narrativa.

A biografia tem ocupado um lugar privilegiado na historiografia, o que, em parte, se explica pela descrença nos modelos totalizantes de explicação histórica e pela retomada das reflexões sobre a ação individual na História. Acompanhando essas retomadas, os historiadores se voltam para uma discussão acerca da narrativa, da biografia histórica e da renovação da História Política. A partir de 1960, as pesquisas buscaram recuperar a feição humana nos processos históricos, assegurando, assim, a presença do sujeito, interpretada por Roger Chartier (1994, p. 98) da seguinte maneira:

O objeto da história, portanto, não são, ou não são mais, as estruturas e os mecanismos que regulam, fora de qualquer controle subjetivo, as relações sociais, e sim as racionalidades e as estratégias acionadas pelas comunidades: as parentelas, as famílias e os indivíduos. [...] o olhar se desviou das regras impostas para as suas aplicações inventivas, das condutas forçadas para as ações permitidas pelos recursos próprios de cada um: seu poder social, seu poder econômico, seu acesso à informação [...].

A terceira geração da Escola dos Annales aceitou a abordagem do indivíduo sob algumas circunstâncias metodológicas, vale dizer, as trajetórias individuais deveriam estar inseridas em um modelo macroestrutural que situa o indivíduo em sua época e em seu meio social. Sobre as trajetórias biográficas, Le Goff (1990, p. 7-8) afirmou que “a biografia histórica nova, sem reduzir as grandes personagens a uma explicação sociológica, esclarece-as pelas estruturas e estuda-as através de suas funções e papéis”. De forma resumida, e tomando a

priori as perspectivas apresentadas pelos Annales, a biografia, como

objeto de estudos dos historiadores, limitou-se a dois modelos: à biografia representativa e ao estudo de caso. As duas perspectivas possuíam legitimação no campo historiográfico; porém, o lugar da biografia como possibilidade de uma escrita da História só poderá ser pensado com base em outras questões e em outros termos no debate (AVELAR, 2010, p. 157-172).

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expressão utilizada pelo sociólogo francês Pierre Bourdieu (1996, p. 184). Mencionado autor considera que o relato biográfico se ancora no pressuposto “de que a vida constitui um todo, um conjunto coerente e orientado, que pode e deve ser apreendido como expressão unitária de uma intenção subjetiva e objetiva, de um projeto”. O enredo de uma vida não é uma trajetória retilínea em direção a um fim determinado. Essa crítica à ilusão biográfica provocou uma “interrogação sobre esse vínculo de transparência, postulado com demasiada frequência, entre o biógrafo e o biografado” (DOSSE, 2007, p. 200). Mas a escrita biográfica admitiria exclusivamente a forma de uma narrativa teleológica inevitável? Definitivamente a resposta é negativa. A escrita biográfica, em sua “dimensão barroca” (SCHWARTZ, 1990 apud AVELAR, 2010, p. 159), compreende a sinuosidade da trajetória biográfica, desvinculada da linearidade e totalidade.

No decorrer da tese, utilizo a palavra „trajetória‟ para fazer referência a uma série de eventos e/ou ações que marcaram determinado momento da vida de Robert Smith. Tais momentos estão, na maioria dos casos, relacionados ao âmbito acadêmico, às relações profissionais e às filiações institucionais. As trajetórias seriam o resultado construído de um sistema dos traços pertinentes de uma biografia individual ou de um grupo de biografias (BOURDIEU, 1998). Bourdieu (1998) define uma trajetória como a objetivação das relações entre os agentes e as forças presentes no campo. Essa objetivação resulta em uma trajetória, que, diferentemente das biografias, descreve a série de posições sucessivamente ocupadas pelo mesmo escritor em estados sucessivos do campo literário (BOURDIEU, 1998). Para esta tese, altera-se a palavra escritor por pesquisador/historiador, sem mudar o sentido de sua definição.

Percorrer os rastros de uma trajetória significa acompanhar o desenrolar de processos históricos em espaços sociais definidos pelos grupos e agentes atuantes no campo no qual se inserem. No decorrer da tese, utilizo o conceito de „campo‟ para me referir ao lugar de atuação de Smith, relacionado principalmente à História e à Arte do período colonial. Bourdieu (1998) define campo como um microcosmo social provido de certa autonomia, de leis e regras características.

Esse conceito, para o sociólogo francês Pierre Bourdieu (1983), é consolidado por meio da definição dos objetos de disputas e dos interesses inerentes ao próprio campo. Para que um campo funcione, o sociólogo afirma ser necessário haver

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jogo, dotadas de habitus que impliquem o conhecimento e o reconhecimento das leis imanentes do jogo e dos objetos de disputa. (BOURDIEU, 1983, p. 89).

Não é a intenção discutir toda a teoria de Pierre Bourdieu e tampouco utilizar metodologias de análise que se prendam à sua obra. Como é sabido, o conceito de campo está atualmente presente no domínio das humanidades, e, a meu ver, sua utilização não requer uma incursão mais demorada pela obra do referido autor.

A perspectiva de redes intelectuais10 será utilizada para perceber as ações e a circulação de Smith e de outros sujeitos ocupados com a temática colonial e localizá-los com base em seus contatos, relações interpessoais, etc. Em Redes Intelectuales en América Latina:

Hacia la Constitución de una Comunidad Intelectual, Eduardo

Déves-Valdés (2007, p. 30) definiu rede intelectual como o conjunto de pessoas ocupadas na produção e difusão de conhecimento, cuja comunicação acontece em razão de sua atividade profissional. Os estudos sobre as redes intelectuais na América Latina representam uma mudança significativa do ponto de vista metodológico para o tratamento e análise de documentos/textos de um determinado autor ou de um conjunto de autores e ideias que compõem uma rede intelectual. O estudo das redes intelectuais permite uma ampliação contextual e o questionamento de um Estado-Nação como contexto demarcador da escrita; do sujeito como fonte plena de saber; da influência da matriz teórica europeia como história de uma ideia (ARMANI, 2013, p. 139).

As redes são compostas por elementos heterogêneos, como relações de poder, exclusões, inclusões, amizades, inimizades, sensibilidades, conflitos e solidariedades de vários tipos, como a de idade, de estudos ou a geracional. A noção de geração como “parte importante da engrenagem do tempo” (SIRINELLI, 2003, p. 137), moldada também pelo historiador que rotula, classifica e constrói seus elementos, será uma lente conceitual para perceber os itinerários e os

10

As redes intelectuais podem ser utilizadas como aporte teórico e metodológico para pesquisadores interessados em construir cartografias intelectuais; para aqueles que se ocupam da circulação das ideias pelo espaço e pelo tempo; para aqueles que tentam localizar os pensadores em seus contatos, por meio das relações interpessoais; ou ainda para os que se ocupam das hibridizações e transformações geradas em ecossistemas intelectuais, dos quais as redes são um dos componentes; para aqueles que trabalham as “influências”, a circulação das ideias e sua disponibilidade em redes.

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mapas de engajamento intelectual de Robert Chester Smith. No interior das redes, as formas de comunicação são variadas, acontecem pelo intercâmbio de trabalhos, correspondências, projetos comuns, congressos, prefácios, comentários sobre livros, citações recíprocas, cartas, etc.

As aproximações culturais, idiomáticas, políticas ou econômicas estão presentes na constituição das redes, além das afinidades eletivas criadas por intelectuais que trabalham temáticas comuns. A densidade comunicacional faz com que as relações espontâneas passem a atingir um nível institucional, com a formação de sociedades, centros, congressos e publicações. No entendimento de Ângela de Castro Gomes (2004, p. 51),

os intelectuais são homens cuja produção é sempre influenciada pela participação em associações, mais ou menos formais e em outros grupos que se salientam por práticas culturais de oralidade e/ou escrita.

As estratégias de sociabilidade podem ser percebidas pela composição das redes e pela posição ocupada por um intelectual no interior dela, seus contatos, a confluência de ideias, as trocas, os vínculos institucionais. Essas redes eram fundamentais para atuação de Smith nas instituições e para publicações e desenvolvimento de pesquisas. As relações por ele estabelecidas permitem compreender a ambiência intelectual nacional e internacional de forma mais ampla, no sentido de perceber os posicionamentos desse historiador perante as instituições, as publicações, as relações de trabalho e amizade e as posturas teóricas por ele adotadas, muitas vezes em consonância com seus pares e com as instituições que o amparam; outras vezes, divergentes.

As redes intelectuais são utilizadas como suporte metodológico para localizar e entender os deslocamentos, as trocas intelectuais, de colaboração, amizade e vínculos institucionais criados pelo historiador no Brasil. Ao adotar tal metodologia, é possível problematizar noções de contexto, texto, ideias, escritas e temporalidades. Antes de tomar o contexto histórico como um meio de interpretação da realidade das ideias, é necessário entendê-lo não como um local positivo e estático de interpretação, mas como plural lugar de simultaneidades e histórico, não por estar na história, mas por ser temporal. Com base na metodologia desenvolvida por Váldes (2007), serão criados quadros com a finalidade

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de apresentar alguns dos intelectuais com os quais o personagem principal desta tese estabeleceu algum vínculo, seja por meio do contato pessoal, de correspondências, de prefácios, de críticas, de citações ou eventos.

A tese dialoga, concomitantemente, com a História dos Intelectuais, que vem concretizando-se a partir da década de 1970. Antes deste período, a história dos intelectuais, por possuir um viés eminentemente político, mas com interseções no social e cultural, era associada aos processos de curta duração, ao acontecimento. Característica que por si só a afastava dos interesses de pesquisas, cujas dimensões temporais se encontravam na média e longa duração. O surgimento de uma nova história política, desvinculada dos cânones do positivismo, possibilitou um contexto favorável para um novo posicionamento e abordagem conceitual da história dos intelectuais. Sua inserção no tempo de média duração, a possibilidade de construção de um corpus documental, a paulatina dessacralização do intelectual e a legitimação de novos campos – como a história do tempo presente – e os novos balizamentos da relação do pesquisador com seu objeto foram elementos favoráveis para sua transformação.

As fronteiras, interações e conceitos próprios da história dos intelectuais, sua ligação com a história política, com a biografia e as confusões de definição com a história intelectual e a história das ideias são questões que perpassam pelas indagações do pesquisador imerso nesse campo de pesquisa. O próprio conceito de intelectual é complexo e ambivalente. A definição de Sirinelli (2003, p. 242) é uma das mais acionadas pelos historiadores e se desdobra em duas acepções de intelectual. Uma mais ampla, com viés sociocultural e envolvimento de mediadores culturais, e outra mais restrita, associada ao engajamento, não necessariamente ao partidário. Historicizar o conceito de intelectual e perceber que ele não é estanque, mas mutável de acordo com o contexto, época, grupo, redes de sociabilidade, e a auto - definição dos atores envolvidos é um primeiro passo para não engessar essa categoria. O excesso de fontes é uma das dificuldades enfrentadas pelos que estudam os intelectuais, devido ao grande acúmulo de documentos, publicações e registros acumulados por eles no decorrer de suas trajetórias. Quanto mais volumosa a documentação, como é o caso desta pesquisa, maiores são as possibilidades de diferentes abordagens, multiplicam-se as problemáticas que se capilarizam em campos de conhecimento interlocutores da História, como Arquitetura, História da Arte, Ciências Sociais, entre outros.

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publicações exigiu uma estratégia de divisão espacial/geográfica, quer dizer, os capítulos foram pensados tomando-se por base os principais países pelos quais Smith transitou: Estados Unidos, Portugal e Brasil. A disposição segue uma ordem cronológica que dialoga com a formação intelectual de Smith e a configuração do próprio campo de estudos no qual estava inserido. A tentativa é promover maior visibilidade aos trânsitos e diálogos de Smith com seus pares, suas filiações institucionais e, além disso, perceber a configuração política e cultural daqueles países em diálogo com a trajetória intelectual de Robert Smith, suas redes de sociabilidades e intelectuais e sua produção acadêmica sobre arte e arquitetura colonial brasileira.

No decorrer da pesquisa, foram consultados dois arquivos principais: o do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), no Rio de Janeiro, e o da Fundação Calouste Gulbenkian, em Lisboa, Portugal11. No arquivo do IPHAN, foi encontrado um total de 192 correspondências datadas do período entre 1945 e 1975; já, na Fundação Calouste Gulbenkian, 39 correspondências, entre 1946 e 1975. Em razão do grande fluxo de correspondências entre Smith e intelectuais brasileiros, entre 1945 e 1975, período que extrapola o escopo da tese, busquei sistematizar todo esse material e organizá-lo para a tese e pesquisas futuras. Realizei um levantamento geral das correspondências encontradas nos arquivos do IPHAN e da Fundação Calouste Gulbenkian, organizadas por quadros preenchidos com os seguintes dados: nome do documento, local e ano, remetente, destinatário, os principais nomes citados, breve resumo do conteúdo e palavras-chave. Com o intuito de sistematizar esses dados, foram utilizados gráficos que permitem verificar os fluxos de correspondências entre Smith e intelectuais brasileiros. Além desses arquivos principais, foram realizadas pesquisas no Arquivo Nacional, na Fundação Casa de Rui Barbosa e no Arquivo do Itamaraty.

Além da investigação arquivística, foi realizada uma pesquisa na Hemeroteca digital da Biblioteca Nacional, entre 1936 e 1955. Com

11

A realização do doutorado sanduíche estava prevista desde a apresentação do projeto para o processo de seleção do doutorado, visto que a tese seria inviabilizada sem a consulta do arquivo pessoal de Smith. Durante o ano de 2015, o CNPQ interrompeu as candidaturas para as bolsas. Por esse motivo, com recursos próprios e ajuda da Orientadora Maria Bernardete, realizamos uma pesquisa intensiva de quinze dias nos arquivos da Fundação. O enfoque foi dado aos documentos escritos, como cartas, manuscritos, recortes de jornais, relatórios, etc.

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base nos periódicos, foi possível constatar a atuação de Smith como crítico de arte e sua participação e visibilidade como formador de opinião na imprensa brasileira. Para a sistematização desse material, foram feitos quadros preenchidos com o nome do jornal, título da matéria, ano, conteúdo e palavras-chave, inseridas nos apêndices.

Por causa do elevado número de intelectuais e pesquisadores responsáveis pela formação de Robert Smith, escolhi por inserir os nomes principais ao final de cada capítulo. Os quadros foram preenchidos com nome, local de nascimento, filiação institucional, principais temas de pesquisa e relações com Robert Smith. O objetivo desse recurso é a visualização das articulações e relações formadas pelo estudioso nos diferentes países pelos quais transitou além das aproximações de pesquisa e formas de colaboração.

Os livros e artigos escritos por Smith foram também fontes primordiais. Alguns textos foram fotografados, para posterior leitura, nos arquivos pesquisados, outros encontrados em sebos. Grande parte dos artigos de Robert Smith sobre o Brasil foi reunida em dois livros organizados pelo IPHAN com apoio da Fundação Calouste Gulbenkian, em 2012, ano de comemoração do centenário de Smith. Os dois volumes, organizados por Nestor Goulart Reis Filho, entraram para o conjunto das obras de referência do IPHAN por intermédio de um projeto do arquiteto Luiz Fernando de Almeida, então presidente da instituição. Robert Smith e o Brasil. Arquitetura e Urbanismo (vol. I) (GOULART, 2012) é composto por nove artigos e textos introdutórios, elaborados por Beatriz Siqueira Bueno, José Pêssoa e Renata Araújo. Reúne textos publicados em diferentes periódicos do Brasil, Portugal e Estados Unidos. Por estarem dispersos, seriam de difícil acesso à maioria dos pesquisadores, e, assim, o agrupamento dos textos permite a compreensão da:

Amplitude dos campos de interesse daquele autor e alcance excepcional de seus estudos. Permite estudar sua trajetória como pesquisador, acompanhando em boa parte a construção de uma nova área de estudo, processo no qual teve papel destacado (GOULART, 2012, p. 9).

O segundo volume, Robert Smith e o Brasil. Cartografia e

iconografia (vol. II) (GOULART, 2012) reúnem dez artigos, nos quais o

autor utiliza a iconografia como principal fonte de pesquisa. A interpretação e o uso de imagens pictóricas, fotográficas, mapas e

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plantas ganham destaque e permitem interpretar sua produção artística como fotógrafo do Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – (SPHAN), na acumulação de seu acervo pessoal e pela sua metodologia no trato das imagens como fonte de pesquisa histórica. A recente publicação dos volumes pelo IPHAN revela uma retomada da produção de Robert Smith por parte dos pesquisadores, inserindo novamente sua obra no circuito acadêmico e organizando sua produção para pesquisas futuras.

A COMPOSIÇÃO DA TESE

A tese está dividida em cinco capítulos e, a seguir, apresento as principais discussões expostas em cada um deles.

Em História e arte latino-americana nos Estados Unidos: uma

guinada para o colonial, o objetivo é verificar como os estudos

latino-americanos e a temática colonial, principal tema de estudos de Robert Smith, estavam sendo tratados nos Estados Unidos na primeira metade do século XX. O fio condutor da discussão é a trajetória acadêmica e intelectual de Smith em seu país natal, sua movimentação e atuação em seu campo de ação, assim como as aproximações e distanciamentos teóricos e metodológicos no que se refere a seus pares. Ainda nesse capítulo, é discutida a atuação de Smith na Fundação Hispânica e na

Library of Congress, em Washington, instituição voltada para os estudos

da cultura latino-americana, fundamental para a consolidação e integração do estudo da arte e cultura latino-americana e luso-brasileira nos Estados Unidos.

O capítulo Herança Lusa ou Viseus e Bragas nos Trópicos traça um panorama da atuação de Smith em Portugal, em um momento de afirmação da identidade portuguesa em conjunto com movimentos tradicionalistas como a Casa Portuguesa e de aproximação política entre o varguismo e o salazarismo. A aproximação entre os „países irmãos‟ aconteceu por meio políticas culturais que percebiam no Brasil um continuum da civilização portuguesa, perspectiva adotada igualmente nas interpretações de Smith sobre a arte e a arquitetura colonial.

O capítulo (re) Significações do colonial no Brasil discute o período de (re) descoberta da arte colonial brasileira e da emergência do Movimento Neocolonial, das viagens modernistas, do SPHAN, com sua Revista e redes de colaboradores com os quais Smith criou vínculos em suas viagens de 1937 e 1946. Com base nessas articulações, percebem-se redes de colaboração e amizade entre pesquisadores da temática

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colonial. Em meio aos pesquisadores nacionais, houve grande presença de estrangeiros interessados na referida temática. A atuação de tais pesquisadores será situada pelas convergências e embates teóricos entre Robert Smith (EUA), Germain Bazin (França), Hanna Levy (Alemanha), John Burry (Inglaterra) e Juan Giuria (Uruguai), todos eles pesquisadores da arte colonial e interessados em construir uma cartografia visual da arte brasileira. O escopo principal do capítulo é demonstrar que o Brasil não foi um recipiente vazio que recebeu um historiador e outros pesquisadores interessados na mesma temática para escrever sobre arte e arquitetura colonial, mas que contava com movimentos que buscavam afirmar uma identidade artística e arquitetônica.

Em Viagens ao Brasil: um historiador em campo, são discutidas as impressões e atuações de Smith em diversas cidades brasileiras, percorridas durante as viagens de 1937 e 1946. Os relatórios produzidos por Smith para as instituições de financiamento, principais fontes do capítulo, são utilizados para entender as percepções do historiador em relação à sua pesquisa desenvolvida no Brasil. Estes relatórios, datilografados em inglês e encontrados na Fundação Calouste Gulbenkian, forneceram detalhes da viagem, como roteiros, datas, custos e contatos estabelecidos pelas diversas regiões do país. As viagens foram uma maneira de o historiador especializar-se em sua área de estudos por meio de pesquisas de campo, além de atender aos interesses culturais e políticos das instituições de fomento. A bibliografia produzida durante sua primeira visita ao Brasil, em 1937 até o ano de 1946, ano de sua segunda visita, será apresentada nesse capítulo e será interpretada pelo viés geográfico – cidades visitadas, tempo de estadia, instituições de apoio, etc. – e, no sentido metodológico, os autores com os quais dialogou, os temas e arquivos pesquisados, os tipos de fontes utilizadas, dentre outros tópicos relacionados ao tema em questão.

No último capítulo, Problemáticas sobre Arte, serão abordados temas que contemplaram as pesquisas e interesses de Robert Smith. O objetivo desse capítulo é perceber outras temáticas, que extrapolam a arquitetura colonial, como mobiliário e pinturas votivas, por exemplo. Ainda nesse capítulo, trato das pinturas do holandês Frans Post, utilizadas por Smith na construção de dois artigos sobre arte, paisagem e arquitetura colonial.

Referências

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