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A imagem da velhice na contemporaneidade

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Academic year: 2021

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UNIVERSIDADE REGIONAL DO NOROESTE DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL- UNIJUÍ

DHE- DEPARTAMENTO DE HUMANIDADES E EDUCAÇÃO CURSO DE PSICOLOGIA

VANESSA QUEVEDO HORN

A IMAGEM DA VELHICE NA CONTEMPORANEIDADE

Santa Rosa 2013

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VANESSA QUEVEDO HORN

A IMAGEM DA VELHICE NA CONTEMPORANEIDADE

Monografia de conclusão de curso apresentada ao curso de Graduação em

Psicologia do Departamento de

Humanidades e Educação da Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul- UNIJUÍ, como requisito parcial para a obtenção do título de Bacharel em Psicologia.

Orientador: Ângela Maria Schneider Drügg

Santa Rosa 2013

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VANESSA QUEVEDO HORN

A IMAGEM DA VELHICE NA CONTEMPORANEIDADE

Trabalho de Conclusão de Curso em Psicologia para a obtenção do grau de Psicólogo pela Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul, Departamento de Humanidades e Educação, Curso de Psicologia.

Banca Examinadora:

Prof.ª Drª. Ângela Maria Schneider Drügg

Prof.ª Me. Sonia Aparecida da Costa Fengler

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Dedicatória

Dedico este trabalho ao meu avô Guilherme, que aos 93 anos continua a viver afirmando que nunca é tarde para ser feliz.

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AGRADECIMENTOS

A minha orientadora Ângela Drügg, pelo auxílio no trabalho realizado durante esse semestre e a todos os demais professores que muito contribuíram para meu crescimento.

As minhas amigas que compartilharam dos momentos de realização e conclusão desse trabalho.

Aos meus pais que me apoiaram nessa caminhada de cinco anos com todo amor e dedicação.

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Eu não tinha este rosto de hoje,

assim calmo, assim triste, assim magro,

nem estes olhos tão vazios, nem o lábio amargo. Eu não tinha estas mãos sem força,

Tão paradas, e frias e mortas; eu não tinha este coração que nem se mostra.

Eu não dei por conta desta mudança tão simples, tão certa, tão fácil

Em que espelho ficou perdida a minha face?

Cecília Meirelles “Retrato” In: Flores de Poemas

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RESUMO

A pesquisa tem como objetivo investigar as especificidades do envelhecer na contemporaneidade. Foi feito um aporte histórico das questões que cercam o envelhecimento e a velhice nas diversas sociedades, desde a Antiguidade. Leva-se em consideração que cada sujeito possui uma forma singular de envelhecer, então, existem muitas formas de envelhecimento e de velhices. A sociedade de hoje é marcada pela imagem e pelo consumo, sendo a velhice denominada negativamente como declínio. Assim, pensamos nas questões que cercam a velhice, como por exemplo, a rejeição de se tornar velho. O narcisismo está implicado na relação do corpo e da imagem do velho. Trata-se de uma pesquisa bibliográfica, com contribuições de diversos autores que se dedicaram à temática do envelhecimento e da velhice.

Palavras-chave: Envelhecimento, Velhice, Contemporaneidade, Narcisismo, e

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO...9

CAPÍTULO I – A VELHICE NO DECORRER DA HISTÓRIA ...11

1.1 O CONCEITO DE VELHO NA HISTORICIDADE...12

1.2 O VELHO NA SOCIEDADE DE HOJE...15

1.3 O LUGAR DO IDOSO NA FAMÍLIA CONTEMPORÂNEA...19

CAPÍTULO II – O SUJEITO EM PROCESSO DE ENVELHECIMENTO E A VELHICE...23

2.1 VELHICE: COMO DEFINI-LA...23

2.2 O ENVELHECER COMO UM PROCESSO...25

2.3 CORPO NARCÍSICO, CORPO QUE ENVELHECE...28

CONSIDERAÇÕES FINAIS...33

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INTRODUÇÃO

O tema dessa dissertação é a velhice e o processo de envelhecimento que será abordado através de uma pesquisa bibliográfica. Atualmente em nossa sociedade devemos considerar o aumento da população acima dos 60 anos de idade, principalmente no Brasil. O envelhecimento populacional se deve principalmente à medicina e ao desenvolvimento tecnológico que de fato auxilia na redução da mortalidade, consequentemente proporcionando melhor qualidade de vida para todos. O crescimento da perspectiva de vida nos traz questões importantes para o desenvolvimento do trabalho que nos farão pensar em todo o processo de envelhecimento, na função social e nas repercussões subjetivas no idoso.

Para o mundo moderno, velho é aquilo que não se quer mais, o que está quebrado, feio e fora de moda. Não podemos esquecer que quem envelhece é o corpo e não o sujeito. Não é fácil definir a velhice, nem com que idade ela começa, pois o velho é um ser biopsicossocial, que tem uma estrutura biológica, é um ser de linguagem e está inserido na cultura. Esse modo de tratar a velhice também entra no contexto cultural. Na nossa atualidade a figura do sujeito idoso perdeu seu valor social e simbólico positivos, passando a ocupar um lugar estigmatizado e cheio de preconceitos. Hoje em dia o velho já não é mais reconhecido simbolicamente como um dos agentes fundamentais de transmissão dos valores ancestrais, muito pelo contrário, hoje se pensa que o velho serve apenas para ocupar espaço e se conformar que é um sujeito de que nada mais se espera além da morte. Observa-se a contemporaneidade como uma sociedade marcada pela cultura da imagem, onde o corpo tornou-se sobrevalorizado e o que nos interessa é a imagem que passamos desse nosso corpo para o outro.

A questão do envelhecimento mobiliza a todos nós, pois estamos colados a esse processo a todos os dias de nossa vida. As estatísticas demonstram que a população mundial está vivendo muito mais do que em outras épocas. Vários são os fatores que influenciam para com o aumento do número de pessoas idosas. Percebe-se que a imagem do idoso tem passado por mudanças e conceitos radicais no decorrer dos anos. Ao longo da história é possível perceber que a velhice vai sendo investida de diferentes representações. Sendo assim, nos cabe a seguinte

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questão: “como definir a velhice?”, “em que momento sabemos que estamos velhos?”. A proposta do trabalho é entender o que ocorre nesta etapa da vida e também qual o lugar que o idoso ocupa em nossa sociedade.

O trabalho está dividido em dois capítulos, onde o primeiro abordará acerca da velhice no decorrer da história em diversas sociedades e de como essa imagem foi sendo conceituada com o passar dos anos até os dias de hoje. O termo “velho” foi utilizado de diversas maneiras, apropriadas ao seu tempo e sua função. No mesmo capítulo será abordada a questão do lugar do idoso na família contemporânea, fazendo uma referência ao lugar social em que o idoso está inserido.

No segundo capítulo será abordada a questão do sujeito no processo do envelhecimento, também, em que etapa da vida se define a velhice. Para entendermos esse processo, será feito um aporte a respeito das questões narcísicas do sujeito, que são de extrema importância na velhice, ao refletirmos a respeito do corpo de quem envelhece.

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CAPÍTULO I

A VELHICE NO DECORRER DA HISTÓRIA

Historicamente, o homem foi o único ser que conseguiu mudar sua expectativa de vida a partir do controle ambiental, que se iniciou através de medidas de saneamento básico, antibióticos, vacinas e cirurgias, que passaram a promover um aumento da expectativa de vida média do ser humano. A expectativa média de vida na época do Império Romano (cerca de 30 anos) não pode sequer ser comparada a expectativa média na África hoje (cerca de 45 anos), nem muito menos a do Japão (quase 85 anos) (RAMOS, 1995. p. 52.). Nesse contexto, podemos pensar que o envelhecimento depende muito do contexto histórico.

Ao viajarmos pela história, nos deparamos com o fato de que nas sociedades antigas, os velhos eram valorizados, sendo vistos como portadores de uma grande sabedoria e com esta ajudavam os mais novos em suas atividades, fornecendo conhecimentos adquiridos no decorrer da vida. Já na Grécia, o envelhecimento era visto de forma distinta para as pessoas que faziam parte da classe privilegiada, que detinham o poder político, econômico e cultural e aquelas que realizavam trabalhos braçais. Sendo assim, os primeiros eram prestigiados como sábios, diferentemente dos segundos, que representavam o declínio da juventude e vigor, realidade bem parecida com a nossa que valoriza o corpo e a rapidez, transformando assim a velhice como algo não desejável.

O envelhecimento é uma questão que mobiliza a todos nós, pois estamos colados a esse processo ao longo de toda nossa vida passa. As estatísticas demonstram que a população mundial está vivendo muito mais do que em outras épocas. Vários são os fatores que influenciam para o aumento do número de pessoas idosas. Como nos últimos anos emergiram consideráveis discursos afirmativos a respeito da velhice, não podemos deixar de ressaltar que a nossa realidade ainda não reflete essas mudanças. A falta de instrumentos funcionais da sociedade para lidar com o fenômeno do envelhecimento é citada por Fontes em “O lugar da velhice na sociedade de consumo” (2006):

Em 99,99% da história da humanidade as pessoas nunca viveram mais que trinta ou 35 anos. A experiência de ficar velho, de viver sessenta anos ou mais, é muito nova. Nossa sociedade foi construída com base na expectativa de vida do século XIX. Nossas instituições, o casamento, o Estado, as empresas e o sistema de previdência, como conhecemos hoje,

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vêm de uma época em que apenas 3% das pessoas ultrapassavam a barreira dos 65 anos. [...] Os idosos não podem mais ficar em casa, esperando o tempo passar. Nossa velhice não será confortável. Temos que descobrir o que fazer com a segunda vida que ganhamos de presente. [...] Temos de revolucionar o modo como os idosos são vistos e tratados. [...] São tratados como um estorvo, como seres improdutivos, sem memória, maçantes e fracos. [...] Será um mundo em que a metade mais jovem vai rechaçar a metade mais velha (SCHELP, apud, Fontes,2006, p. 11-14).

Na atualidade, percebemos que os valores e comportamentos culturais que são validados possuem como parâmetro uma sociedade de jovens, mas a demografia mundial aponta outra realidade onde a população idosa está se tornando majoritária. É fato que a imagem do idoso foi se modificando no decorrer da história da humanidade e para termos um maior conhecimento disso, a seguir voltaremos o olhar a essa classe em determinadas épocas históricas.

1.1 O CONCEITO DE VELHO NA HISTORICIDADE

O termo “velho” foi sendo conceituado de diversas maneiras, cada uma apropriada a seu tempo e sua função. Segundo Beauvoir (1990, p. 109-110) os velhos estariam incorporados ao conjunto dos adultos. Na mitologia e na literatura a imagem da velhice varia de acordo com os tempos e os lugares. A imagem da velhice está representada de uma maneira confusa, incerta e contraditória. É, para cada indivíduo, um destino singular, o seu próprio. “O velho, enquanto categoria social, nunca interveio no percurso do mundo” (Beauvoir, 1990, p.110). Esta afirmação deve ser tomada na perspectiva em que ele permanece integrado à coletividade sem se distinguir dela, sendo um adulto, macho, de idade avançada. Dentro desse contexto, o velho não teria arma nenhuma para se defender e seu problema seria estritamente um problema de adultos ativos.

Em seu livro A Velhice, Beauvoir (1990) faz um aporte sobre a história da velhice acerca das sociedades, voltando o olhar à China antiga em virtude da condição privilegiada que proporcionou aos velhos. A civilização chinesa exigia um poder centralizado e autoritário. “Confúcio modelou à imagem da coletividade o microcosmo que deu a esta como base a família. Toda a casa devia obediência ao homem mais idoso” (1990, p.112). Mais adiante, a autora novamente cita Confúcio que faz uma reflexão acerca das etapas da vida associando a velhice à posse de sabedoria:

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Aos 15 anos, eu me aplicava ao estudo da sabedoria; aos 30, consolidei-o; aos 40, não tinha mais dúvidas; aos 60, não havia mais nada no mundo que me pudesse chocar; aos 70, podia seguir os desejos do meu coração sem transgredir a lei moral (BEAUVOIR, 1990. p. 113)

Na mesma obra é possível também ter um entendimento de como o idoso era reconhecido dentro da sociedade judaica. Por si só, o povo judeu já é fortemente reconhecido pelo respeito com que cercou a velhice. Sua sociedade era descrita patriarcal, onde os ancestrais eram eleitos porta-vozes de Deus, considerando a longevidade como suprema recompensa da virtude:

Os cabelos brancos são uma coroa de honra: é no caminho da Justiça que essa coroa é encontrada [...] Abençoada por Deus, a velhice exige obediência e respeito: “Tu te levantarás diante dos cabelos brancos e honrarás a pessoa do velho”- prescreve o Levítico. (BEAUVOIR, 1990. P. 115).

Em relação a outros povos da Antiguidade, pode-se pensar que uma parte deles trata a velhice na esfera do conflito das gerações. Beauvoir (ibid., p. 121) se questiona então sobre qual a condição real dos velhos na Grécia antiga. Segundo a autora, na alta Antiguidade, a ideia de honra ligou-se à ideia de velhice. Segundo Homero (ibid. p.122), a velhice está associada à sabedoria, pois o tempo lhe conferiu experiência e autoridade.

Aristóteles, em A retórica (ibid. p.136) também tira suas conclusões a respeito da velhice. Para ele “é preciso que o corpo permaneça intacto para que a velhice seja feliz: uma bela velhice é aquela que tem a lentidão da idade, mas sem deficiências. Ela depende ao mesmo tempo das vantagens corporais que se poderia ter, e também do acaso”. Para ele, o declínio do corpo acarreta o do indivíduo inteiro. Ainda em A retórica, Aristóteles escreve acerca da juventude e da velhice, conforme Beauvoir:

Aristóteles pinta a juventude com as cores mais risonhas: calorosa, apaixonada, magnânima- e a velhice apresenta-se, para ele, em todos esses pontos, como o oposto: “Porque viveram inúmeros anos, porque muitas vezes foram enganados, [...] os velhos não têm segurança em nada, e seu desempenho em tudo está manifestamente aquém do que seria necessário”. (BEAUVOIR, 1990. P. 136-137).

Segundo Mucida (2004, apud Bertoldo, 2010, p.18), do século XII até o século XV, a velhice estaria bastante associada à decadência, sendo descrita como uma

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fase de apagamento do desejo, emergência de doenças e reduções nas funções fisiológicas, tratadas como perdas irreparáveis. É na Idade Média que a situação dos velhos aparece como desfavorecida, pelo fato de se tornarem enfraquecidos nessa fase. “Tanto entre os nobres, quanto entre os camponeses, a força física prevalecia: os fracos não tinham lugar. (Beauvoir, 1990. p.162).” Era de notável consideração que os mais jovens tinham sua importância, pois os jovens nobres se tornavam cavaleiros e os camponeses eram submetidos a provas durante cerimonias campestres. Sendo assim, o velho não tinha mesmo sua vez, pelo fato de que com o passar dos anos do indivíduo, ele se tornava cada vez mais fraco e debilitado. Por essa razão, a medicina preventiva começou a ser incentivada, onde os médicos advertiam aos idosos evitarem excessos, manterem cuidados higiênicos, beber vinho e fazer acompanhamento periódico.

Segundo Almeida (2005, p.22) na Renascença, em torno do século XVI, aparecem alguns escritos nos quais a velhice é tratada com mais otimismo, sugerindo até a ideia de velhice um modelo, na qual a sobriedade, fruto de uma vida regrada, possibilitaria ao sujeito uma velhice com melhores condições, surgindo um maior interesse com referência aos problemas do envelhecimento.

Com o início da Revolução Industrial e do Racionalismo, é possível perceber que vários autores passam a comparar o corpo a uma máquina, que está sempre sujeita ao desgaste. Essa analogia ainda está fortemente presente em nossa sociedade, principalmente nas grandes empresas, onde o empresário busca mão-de-obra jovem devido à rapidez e habilidade, enquanto nega a experiência da pessoa de mais idade, às vezes afirmando que o tempo desta já passou.

Voltando à obra de Beauvoir, é importante ressaltar que no terceiro capítulo da obra A Velhice, a autora faz umaporte a respeito da expectativa de vida do idoso no decorrer da história em diversas sociedades, em épocas diferentes, ressaltando o olhar sobre a imagem que esse sujeito idoso desperta no outro. Ela faz um levantamento sobre o aumento da longevidade no decorrer dos séculos:

Desde a Antiguidade, a expectativa de vida no nascimento não parou de crescer; era de 18 anos entre os romanos; de 25 anos no século XVII. Em cem crianças, vinte e cinco morriam antes de um ano, outras vinte e cinco antes dos 20, e vinte e cinco entre 20 e 45 anos. [...] no século XVIII, a expectativa de vida na França era de 30 anos. [...] em 1851, havia na França 10 % de pessoas idosas de mais de 60 anos, a partir do século XVIII, a proporção dos velhos na população dobrou. (BEAUVOIR, 1990. p. 271).

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A partir das ideias dos autores, percebe-se que a imagem do idoso tem passado por mudanças e conceitos radicais no decorrer dos anos. Ao longo da história é possível perceber que a velhice vai sendo investida de diferentes representações, como o horror e a decadência que estão ligados a uma ideia de decrepitude do corpo, desaparecimento da condição desejante e aproximação do fim da existência, bem como antes, no seu oposto, na representação do sagrado e honroso, referidos a um acúmulo de saber e virtudes adquiridos com a maturidade.

Seguindo as informações obtidas através de estudos, nota-se que nas sociedades tradicionais o velho possuía um lugar de respeito e sabedoria, onde suas histórias davam significados e sentidos à vida. A velhice era vista positivamente, onde a memória e sabedoria eram consideradas riquezas e o papel do idoso era de repassar seu legado para os mais jovens, fazendo uma ligação entre as gerações. O idoso era detentor do saber e aprendizado aprofundado. A palavra do idoso era valorizada, fazendo com que ele ocupasse um lugar de excelência.

Os valores tradicionais foram se perdendo com o passar dos anos ao ponto em que emergiu uma cultura individualista onde esse velho, responsável pela transmissão de valores e que passara a não ser mais reprodutor de vida e nem mais produtor de riquezas, de nada mais vale, passando assim a ter a imagem associada à inutilidade. Foi nesse momento que a imagem da velhice teve uma transformação negativa que predomina até hoje em nossa sociedade.

1.2 O VELHO NA SOCIEDADE DE HOJE

Em nossa sociedade, a velhice é vista como um obstáculo, sendo considerados apenas seus declínios e fragilidades. Apesar de ser instituída cronologicamente a partir dos 60 anos, nos convém dizer que a idade não é ponto de estagnação ou nostalgia. Baseado no Estatuto do Idoso, além de sua força como instrumento legal, ele goza também pela reconhecida importância social que conseguiu conquistar desde 1994, quando foi criada a Lei 8.842 (Política Nacional do Idoso-de 4 de janeiro de 1994) que regulamenta a politica nacional do idoso no Brasil, pelos efeitos produzidos no imaginário sobre a velhice e também os tratamentos dispensados aos idosos. Isso se tornou um marco para a história da velhice na sociedade brasileira, que possibilitou mudanças significativas em relação

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à figura do idoso. O estatuto tornou-se uma junção de várias vozes que falam da velhice e ao discutirem em relação à mesma, acabam por criar sentidos pelos quais os sujeitos a reconhecem e possam se reconhecer como idosos.

A sociedade contemporânea é marcada pela cultura da imagem. A imagem negativa que se construiu nos primórdios do século XVIII contribuiu para a assunção da ideia de que o sujeito só é válido se for jovem e bonito, rejeitando-se aqueles que não correspondem aos quesitos da sociedade. A subjetividade na contemporaneidade é marcada por traços narcísicos, pois a produção em massa e o mercado de consumo estão direcionados à imagem, assim como a relação entre os sujeitos. O consumo voltado para o corpo revela uma aversão em que a velhice pode ser colocada e vista como um temor, uma rejeição. Como podemos perceber, os valores colocados para a sociedade de hoje mostram uma sociedade de jovens, fazendo com que se esqueça que atualmente a população está vivendo mais e melhor, e que hoje os velhos já são a maioria. Por esse motivo é possível perceber que há uma discordância muito grande quanto ao olhar e estrutura da sociedade atual em relação aos idosos.

Numa sociedade capitalista, além de ser marcada pela cultura da imagem, se valoriza também a produção, que geralmente pode ser considerada a primeira dificuldade a ser enfrentada pelo idoso, fazendo com que ele seja excluído do mercado de trabalho. Na atualidade, produtividade e velocidade são termos de grande importância para o mundo do trabalho e parece que fazem parte somente das características da juventude. É fato de que em certo ponto, a velhice se caracteriza por um período de redução e ausência de trabalho formal, fazendo com que seja utilizada uma quantidade de termos negativos que são aplicados aos idosos, como “inativos”, “improdutivos”, fazendo com que essas pessoas se sintam aposentadas para a vida e não somente para o trabalho. Tudo isso nos leva a pensar que a partir de certa idade, ou até mesmo quando o indivíduo se aposenta, ele deixa de ser produtivo, se tornando incapaz de ter uma participação social. Esse pensamento serve para fazer com que o sujeito idoso se sinta excluído esfera social.

Mesmo que esta seja a realidade em que vivemos, e que todos esses fatores descritos acima sejam reais, não podemos pensar que o lugar do idoso deixou de estar em constante desenvolvimento. A Política Nacional do Idoso criou normas e direitos para garantir a autonomia dos idosos, mas no contexto da nossa sociedade onde a velhice passou a ser muito mais percebida, nota-se que a legislação não tem

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sido aplicada e isso se deve a vários fatores, que vão desde as contradições dos próprios textos legais, até mesmo o desconhecimento geral da população de parte de seu conteúdo. A principal ideia da criação dessa política seria então atribuir e reforçar um lugar social e cultural para a velhice, possibilitando o reconhecimento do idoso enquanto sujeito em constante processo de transformação e subjetivação tendo direito ao exercício de cidadania.

Existem inúmeras formas de envelhecer e de velhice e cada sujeito apresenta uma singularidade absoluta a respeito da mesma. A sociedade consumista de hoje é marcada por uma cultura de imagem que preza por um corpo sobrevalorizado, inferindo que a felicidade está implicada na beleza e juventude que em nada remete a um estado de velhice. Nessa perspectiva a velhice vem sendo caracterizada por uma imagem negativa, remetendo-nos a pensamentos de rejeição e temor do envelhecimento. Em sua obra “A Velhice” (1990), Simone de Beauvoir destaca que:

O velho -salvo exceções- não faz mais nada. Ele é definido por uma exis, e não por uma práxis. O tempo o conduz a um fim- a morte- que não é o seu fim, que não foi estabelecido por um projeto. E é por isso que o velho aparece aos indivíduos ativos como uma “espécie estranha”, na qual eles não se reconhecem. (BEAUVOIR, 1990, p. 266)

Nessa perspectiva, pode-se entender que com o passar dos anos, a figura do sujeito idoso perdeu seu valor social e simbólico positivos, passando a ter uma imagem negativa e fragilizada. Hoje, o velho já não é mais reconhecido como aquele que transmite seus valores e saberes, mas sim aquele debilitado, “aposentado”. O aumento progressivo da longevidade é um dos principais fatores para que o envelhecimento populacional brasileiro adquirisse uma maior visibilidade social mudando a configuração e desafiando a sociedade brasileira a enfrentar essa questão na contemporaneidade. A questão do envelhecer e da velhice passaram nas últimas décadas a ser uma problemática de extrema significância, exigindo um maior interesse social que até então não existia. A partir deste contexto buscaremos qual e entendimento do envelhecer para diferentes autores.

Para Neri e Cachioni (1999, p.113-140), as questões ligadas ao envelhecimento populacional, em vários países do mundo, assumem muita relevância no panorama atual, pois as consequências sociais do aumento da população idosa são muito importantes. O movimento necessário para suprir as necessidades específicas desse público é relativamente novo, e além das questões

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de saúde e previdência, os idosos também reivindicam um espaço mais assistido no social que, na maioria das vezes deprecia a velhice.

O artigo 8° do Estatuto do Idoso (2003) assegura que: “Envelhecer é um direito personalíssimo e sua proteção um direito social”. A atenção dada à questão do envelhecimento é legítima e assegurada em lei, pois se trata de uma condição que diz da possibilidade de os sujeitos conseguirem prolongar sua existência.

Mucida (2004, apud Bertoldo, 2010, p.13) ressalta a ideia de que o processo de envelhecimento nos acompanha a vida inteira e exige de cada sujeito alterações gradativas no estilo de viver cotidianamente para garantir qualidade de vida. A velhice é um momento específico dentro desse processo, que passa a ser marcado pela acentuação na redução e modificações do funcionamento de diversas funções. O processo de envelhecimento é um acontecimento maior, no qual estão englobadas as representações de vida adquiridas desde o nascimento.

Alguns autores defendem que o momento principal para pensar na velhice é quando se envelhece de fato, fase que chama a atenção pelo caráter de surpresa em que captura o sujeito na maioria das vezes. Esse caráter de surpresa ocorre principalmente em virtude de não ter sido dada ao envelhecimento a devida atenção por parte do sujeito.

Mucida (2004, apud Bertoldo, 2010, p.15) afirma ainda que a velhice é uma categoria social. Sendo assim, o tratamento dado ao sujeito que envelhece é traçado a partir de suas experiências e dos diferentes significados que foram a elas sendo dados. Nesta perspectiva, é interessante observar, a maneira como tem se organizado o contexto social no qual estamos hoje inseridos, para podermos entender que papel a velhice tem exercido nesse panorama.

Beauvoir (1990, apud Bertoldo, 2010, p.15) ainda ressalta a existência de consequências do envelhecimento populacional, decorrentes da maior longevidade. Esse fenômeno faria suscitar questionamentos acerca de como organizar-se enquanto sociedade para essa nova demanda, pois se prevê para as próximas décadas, um processo de envelhecimento ainda mais significativo. Isso torna visível a ideia de que a população que está envelhecendo aumenta gradativamente, trazendo a preocupação sobre que efeitos esse fato trará à medida que a organização proposta no social parece ir num sentido oposto aos significantes associados à velhice. No contexto atual é possível ver que a juventude está em

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destaque e têm mais valor, fazendo com que consequentemente seja mais satisfatória a vida desse sujeito do que a vida na maturidade.

A autora esclarece também que o envelhecimento geral da população mundial não significa somente que o limite de vida tenha se estendido, mas sim que a proporção das pessoas idosas torna-se muito mais significativa. O processo de envelhecimento das populações pode ser observado em quase todos os países ocidentais, gerando uma maior implicação acerca das políticas administrativas. Ocorre isso porque antes o papel que o sujeito desempenhava na sociedade, através de sua profissão, coincidia com sua existência, o que hoje, na organização do trabalho, não acontece mais, pois na maioria das vezes, o idoso está à margem das atividades que regem o social. Segundo Beauvoir :

[...] o envelhecimento da população suscita uma nova questão. [...] Não somente as pessoas idosas são muito mais numerosas que outrora, como também não se integram mais espontaneamente a sociedade. [...]A velhice tornou-se objeto de uma política. (BEAUVOIR, 1990, pg.273).

Antes, o envelhecimento que poderia ser considerado um privilégio de poucos, hoje passa a ser um lugar comum. Ao mesmo tempo em que envelhecer se refere a um prolongamento de vida, o ideal que se tem, na contemporaneidade, é o de prolongamento de características que dizem de um adolescer. O idoso tem como dilema a falta de representações sociais que digam de um lugar que lhe permita a operação da função simbólica que lhe foi atribuída em outro momento.

1.3 O LUGAR DO IDOSO NA FAMÍLIA CONTEMPORÂNEA

O fenômeno do envelhecimento faz muita questão ao social, e quando entramos em detalhes, não se pode deixar de lado o fato de que esse social adquire formas primeiramente através da família. Em qualquer idade, a família é considerada a base de vida de uma pessoa. Como na fase da infância, a velhice também exige do ambiente familiar, cuidados frente à suas alterações físicas e psicológicas. Como dito anteriormente, foi-se o tempo em que as famílias tradicionalmente honravam cuidar de seus idosos por respeito à sabedoria de seus antecedentes. Atualmente é o modelo nuclear de família que prevalece, em que num mesmo lar, convivem apenas pais e filhos, e o afastamento entre idosos e seus netos tornou-se comum. Em muitos casos há uma perda total de contato entre o idoso e sua família. Com

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relação ao que diz no Estatuto do idoso, é obrigação da família, da sociedade e do poder publico assegurar ao idoso, com absoluta prioridade, a efetivação do direito á vida, à saúde, à alimentação, à educação, à cultura, ao esporte, ao lazer, ao trabalho, à cidadania, à liberdade, à dignidade, ao respeito e a convivência familiar e comunitária.

Segundo Mannoni (1995, p.19) “quando o parente idoso não pode mais viver razoavelmente só e, por falta de recursos, não poder ser beneficiado com uma ajuda domiciliar, os filhos “colocam” seus pais numa instituição (e isso sem critério de idade, aos 70 ou aos 90 anos...). Adiante, afirma que “a pessoa idosa, quando constata que não pode mais agir como antes sobre o meio ambiente, não tem, ao que parece, outra escolha senão retirar-se (do mundo) na depressão (ibid.,p..21).

No art. 4º do Estatuto, está previsto que nenhum idoso será objeto de

qualquer tipo de negligência, discriminação, violência, crueldade ou opressão, e todo

de acordo com o Estatuto, o envelhecimento é definido como um [...] direito

personalíssimo e a sua proteção um direito social, sendo obrigação do Estado a garantia de proteção e saúde, mediante efetivação de políticas sociais públicas que permitam um envelhecimento saudável e em condições de dignidade.

Hoje, nas sociedades industrializadas, o Estado tem a função de proteger o idoso como qualquer outro cidadão, da violência física e emocional. Mas, ao mesmo tempo, as pessoas, quando envelhecem e ficam mais fracas, são isoladas da sociedade e, portanto, restritas ao círculo da família e dos conhecidos.

O idoso carrega a expectativa de receber atenção e cuidados dos filhos e netos no momento em que perder ou tiver suas capacidades diminuídas, sendo esse um fantasma que o ronda e o preocupa. Essa ameaça de que isso poderá ocorrer se apresenta de uma maneira constante, podendo ser motivo de sofrimento psíquico. É na família que as pessoas buscam recursos para poderem viver essa etapa de forma mais afetiva.

A visão que se tinha antes do idoso como dependente do Estado e da família hoje se modifica, pois netos e filhos também necessitam receber o apoio de pais idosos. Isso acontece porque os idosos aposentados recebem de um a três salários mínimos mensais e continuam contribuindo financeiramente para a renda familiar de seus filhos, que muitas vezes, devido a forte taxa de desemprego dependem dessa ajuda para sobreviver. Pensando também nessas condições financeiras e também na falta de respaldo público para auxiliar as famílias nos cuidados com o idoso, as

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instituições especializadas tem sido uma alternativa encontrada pelos filhos para transferirem a responsabilidade de cuidados com seus pais. Os principais motivos da entrada de idosos em asilos são a falta de respaldo familiar relacionado a dificuldades financeiras, distúrbios de comportamento e precariedade nas condições de saúde.

Beauvoir (1990, p.312) destaca que “quando não podem mais sustentar-se, física e economicamente, o único recurso dos velhos é o asilo”, referindo-se a ele como um “morredor”, sendo o asilo um lugar que serve para esperar a morte.

É de se perceber que apesar de todos os avanços da política para os idosos eles ainda são desvalorizados e em muitos casos faltam cuidadores para assisti-los. Em certos momentos, os idosos acabaram se tornando um peso para as famílias e para a sociedade em geral. Isso pode resultar na impossibilidade de manter o idoso no seio familiar, levando a procura de instituições onde eles completarão seu ciclo vital. Mesmo estando em um asilo, o ambiente familiar é de extrema importância para o idoso, pois, o contato com a família permite que ele se mantenha próximo ao seu meio natural de vida, onde o contato familiar preservará seu autoconhecimento e seus valores. Dentro do asilo, o idoso será obrigado a adaptar-se às normas e regulamento do local, tornando-se membro de uma nova comunidade e convivendo com pessoas com as quais não tem nenhum vínculo afetivo.

Adiante, Beauvoir (ibid., p. 317) aponta sobre as condições de vida nos asilos: [...] entre os velhos, a própria mudança de lugar, seja ela de que tipo for, frequentemente acarreta a morte. É antes o destino dos que sobrevivem que se deve deplorar. Num grande número de casos, pode-se resumir esse destino em algumas palavras: abandono, segregação, decadência, demência e morte [...] separado de seu passado, de seu ambiente, muitas vezes vestido com um uniforme, o velho perdeu toda a personalidade, não passa de um número [...] o velho fica portanto, abandonado. (BEAUVOIR, 1990. P. 317).

É claro que com o passar dos anos, as instituições asilares mudaram, ficaram menos obscuras, com mais recursos, mas ainda assim é possível ter essa imagem de precariedade que ronda os asilos. Muitas famílias e a sociedade tentam justificar a internação dos idosos pela necessidade de cuidá-los adequadamente. O discurso aparente por parte do poder público é o da intenção de protegê-los para evitar que sofram maus tratos. Sabemos que por melhores que sejam as condições da instituição não é possível evitar que sejam submetidos a sofrimentos, pois sua

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condição de interno muitas vezes se configura por si só motivo para profundas angústias. Uma vez que estejam fora da esfera produtiva tornam-se inúteis e socialmente inoportunos; para a família ao demandarem maior quantidade de atenção e cuidados, tornam-se estorvo e fonte de despesas adicionais.

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CAPÍTULO II

O SUJEITO EM PROCESSO DE ENVELHECIMENTO E A VELHICE 2.1 VELHICE: COMO DEFINI-LA?

Tudo o que supomos saber sobre a velhice não é o suficiente para defini-la e percebe-se que essa falta de saber contribui para com os preconceitos que estão enraizados na nossa cultura acerca da imagem do velho. Na tentativa de melhor compreendê-la, não poderia deixar de buscar primeiramente o que está contido na significação das palavras velho e velhice. O conceito encontrado no Dicionário Unificado da Língua Portuguesa (Rios, 2009) traz o seguinte entendimento para os termos:

Ve.lho 1.Que não é novo. 2.Que existe há muito tempo; antigo. 3.Gasto pelo uso. 4.Avançado em idade. 5.Que tem aparência de velhice. 6.Que exerce há longo tempo uma profissão. 7.Diz-se de qualquer homem célebre da antiguidade. 8.Desusado, obsoleto. 9.POP. Forte. 10.Bom, perito. s.m.

11.Homem idoso. 12.FAM. Pai ou marido (quando idoso ou

carinhosamente).

Ve.lhi.ce 1.Estado de velho. 2.Idade avançada. 3.A classe dos velhos. 4.Rabugice própria dos velhos. 5.O conjunto das pessoas velhas. (RIOS, 2009, p. 682)

Percebemos que somente por essa conceituação encontrada no dicionário, a palavra velho, ou mesmo velhice carrega um caráter negativo. Este caráter é atribuído às pessoas e coisas que ficam velhas, mas muitas vezes, quando escutamos essa palavra, nos vem à mente aquele sujeito de idade avançada, de cabelos brancos e bengala. Aquele sujeito gasto pelo tempo vivido.

Apesar de sua conceituação, sabe-se que não é fácil definir onde e quando o sujeito fica velho, pois o corpo envelhece, mas a velhice também possui segredos e virtudes passíveis de manifestações. A imagem que se carrega da velhice é a do próprio viver. Como nos diz Beauvoir (1990): “O que define o sentido e o valor da velhice é o sentido atribuído pelos homens à existência”.

Segundo Jerusalinsky (1996, p.4) existe um determinado momento em que percebemos que a vida já não é mais a mesma. É neste momento que inevitavelmente se percebe os sinais que revelam a chegada da velhice.

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Mannoni (1995, p.16) questiona-se sobre “em que momento se fica velho?”, “em que momento o sujeito passa a ser considerado e considera-se nessa posição?” e “que fatores viriam a delimitar isso?”. Segundo a autora, a velhice não tem nada a ver com o passar do tempo num sentido cronológico, mas sim com a posição psíquica do sujeito. Partindo disso, o sujeito envelheceria conforme suas possibilidades identificatórias em relação a condutas e pensamentos mais joviais, ou também poderia se identificar com comportamentos mais amadurecidos. Por exemplo: uma mocinha muito jovem pode encarnar desde muito cedo a senhora respeitável, ou um senhor com idade mais avançada pode adotar condutas e um estilo de vida mais jovial, ou até mesmo infantil.

Beauvoir (1990, p.357) declara que “A velhice é um além de minha vida, do qual não posso ter nenhuma plena experiência interior”. Para ela a velhice é o que ocorre com as pessoas que ficam velhas, tornando-se impossível encerrar essa pluralidade de experiências em apenas um conceito, e, mais adiante diz: “tentamos representar quem somos através da visão que os outros têm de nós”. Nessa passagem ela quer frisar que existem períodos que bastam para nos assegurar de nossa identidade, fazendo uma comparação entre essas etapas da vida, começando pela infância, onde as crianças ficam satisfeitas com o reflexo de si mesmas que acabam por descobrir através das palavras e comportamentos dos que lhes são próximos, correspondendo a eles. Já na adolescência a imagem se fragmenta, criando uma crise de identificação, e isso ocorre na velhice também, mas há diferenças a serem ressaltadas. Quando o adolescente passa por essa crise ele se dá conta de que atravessa um período de transição, onde seu corpo se transforma e isso gera um incomodo. Já o idoso se sente velho através dos outros, sem ter passado ou experimentado tais mudanças, como no caso dos adolescentes.

Para Jerusalinsky (1996, p.06) “a criança se lamenta pelo que ainda não pode fazer, e o adolescente pelo que não o deixam fazer, o adulto se queixa pelo que não fizeram com ele ou pelo que ele não fez”. Mas na velhice, o que acontece? Para o autor, é o momento em que o sujeito está diante de uma minimização do futuro, da qual se extraem as principais significações da vida que ainda resta. “Como acontece na infância, o fantasma fundamental está no futuro, mas, agora, como futuro restringido a uma expressão mínima”.

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No capítulo “Descoberta e Assunção da Velhice – Vivência do Corpo”, do livro

A Velhice, Beauvoir continuará tratando sobre a imagem que o idoso tem de si

mesmo:

Por mais que tenhamos encontrado uma imagem mais ou menos convincente, mais ou menos satisfatória de nós mesmos, temos que viver essa velhice que somos incapazes de realizar. E, em primeiro lugar, vivemo-la no nosso corpo. Não é ele que nos vai revevivemo-la-vivemo-la; mas, uma vez que sabemos que a velhice o habita, o corpo nos inquieta. (BEAUVOIR, 1970, p.369)

Somos resultados de nossas experiências, portanto não somos somente aparência. Construímos nossa própria história ao decorrer dos anos, história essa que não pode ser negligenciada pelo fato de estar contida em um corpo velho. Nossa época apresenta um preconceito em que a juventude é bela e tem um lugar, enquanto a velhice é vista como um castigo, sem graça e sem um lugar. Mas, há sim um lugar para a velhice no mundo contemporâneo, pois se o corpo se transforma o sujeito permanece embora existam especificidades que possam comprometê-lo, ou seja, a memória fica e esse lugar deve ser preservado. No entanto, a figura do sujeito idoso na contemporaneidade perdeu seu valor social e simbólico positivos, passando a ocupar um não lugar, como se o velho de hoje não fosse mais reconhecido simbolicamente como um transmissor de valores ancestrais.

2.2 O ENVELHECER COMO UM PROCESSO

Comumente, consideramos o envelhecer somente em relação às pessoas de idade mais avançada, mas o envelhecimento é um processo inevitável, contínuo, atrelado a mudanças físicas, psíquicas e sociais, que se inicia com o nascimento e só termina com a morte do individuo. O processo de envelhecimento percorre toda nossa vida, desde o dia em que nascemos, sendo assim, o ser humano envelhece enquanto vive.

Em função do equívoco de confundir velhice e envelhecimento, acabamos por ignorar e rejeitar a velhice, deixando-a de lado, mantendo dessa forma, a morte à distância. A velhice significaria a aproximação imaginária do fim de nossa jornada no tempo, a premência do encontro com a morte. Mas ela também nos remete a nossa historicidade, vivência da temporalidade, memória, ou seja, é um processo da nossa

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vida, dentro de uma cultura, em um determinado momento histórico e não podemos dizer que é apenas o que vem antes da morte. Envelhecimento significa crescimento, maturidade, e não o aspecto negativo que tem no senso comum. Já dizia Dolto (apud, Mannoni, 1995, p. 13): “morre-se, quando se termina de viver”. Envelhecer é um processo inerente à vida. A sociedade deve superar essa visão negativa de ter que colocar os velhos em um processo de deterioração, que parece estar colado com a morte.

Para Jerusalinsky (1996, p. 05) não são somente as mudanças na cultura que colocam as pessoas que estão envelhecendo na posição de obsolescência imaginária, pois o próprio ciclo do real do corpo coloca restrições na simbolização da morte. Segundo o autor:

[...] os mais velhos vão saindo de cena, para não suportar as consequências devastadoras- dum esvaziamento do valor narcísico de sua imagem. É neste impasse que o sujeito se refugia nos melhores símbolos de sua vida, na sua obra-prima, no resgate moral da tradição que transmitiu, numa certa regressão aos princípios, crenças e religiões que o orientaram. São, esta, formas restitutivas no simbólico, do valor perdido de sua imagem no espelho social; porque o tempo real o empurrou para “fora do filme”. (JERUSALINSKY, 1996,p.05)

O autor parece insinuar que é chegado o momento para ter um “diálogo” com a morte, pois, ela se “personifica” para que o sujeito possa fazer negociações com ela para não ser tomado de surpresa.

O envelhecimento é um processo que causa modificações em várias esferas da vida. No social, há um ganho em termos de experiências, mas há perda de alguns papéis e funções. A dimensão psíquica irá se modificar desde o modo em que captura a sua identidade mergulhado nas mudanças sociais, até mesmo no modo como se percebe capturado pelo olhar do Outro, a partir de como esse outro vê.

As mudanças ao nível biológico tornam-se visíveis no corpo que é a condição material que dá acesso do sujeito ao mundo. O processo de envelhecimento acarreta em várias modificações corporais. Mucida (2004, apud Bertoldo, p.29) explicita que as modificações que ocorrem a partir de determinada idade são variáveis de organismo para organismo e podem se expressar de diferentes maneiras. O envelhecimento em si provoca alguns desgastes, algumas alterações em diversos sistemas funcionais, considerando que a evolução desse processo ocorre de maneira diferente de um sujeito para outro.

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Estudos revelam que a incapacidade funcional, não decorre somente de algumas doenças e dificuldades estruturais, mas também de fatores sociais, demográficos e psicológicos. A percepção de uma velhice ruim, focada somente em aspectos negativos, é um dos fatores que precipitam a dependência do idoso em sua vida funcional.

O envelhecer enquanto processo biopsicossocial se estrutura de uma forma singularizada, podendo constituir uma velhice sã, de acordo com as possibilidades genéticas e subjetivas que o sujeito pode dispor, ou criar para si, nas mais diversas situações de sua vida. No nível fisiológico, as mudanças ocorrem principalmente no ritmo corporal e nas alterações gerais de funcionamento. Essas modificações surgem em diferentes momentos e sofrem variações para cada sujeito.

Entre o aparecimento de vários sinais, ocorre a negação do processo do envelhecer. Devemos compreender o ser humano a partir de sua singularidade, pois envelhece de modo único e particular, pois como já sabemos, não existe um envelhecer e uma velhice idênticas para todos os indivíduos. O sujeito está envelhecendo, mas há uma denegação desse envelhecer utilizando-se cada vez mais formas de evitar isso. A ilusão de permanecer jovem está presente consciente e inconscientemente. A respeito disso, Messina (2002) salienta no artigo “Dimensões do Envelhecer na Contemporaneidade”:

Na verdade o que parece se buscar na contemporaneidade é uma imagem corporal segundo um modelo de um corpo jovem e de atividade, com uma temporalidade própria, de movimentos rápidos, resistentes ao envelhecimento, à transformação, que representam apenas uma ilusão de juventude eterna. (MESSINA, 2002, p.4)

Mannoni escreveu em sua obra “O Nomeável e o Inominável” (1995, apud Pitanga, p.79): “Quando a velhice se ‘apossa’ de alguém, o faz de forma inesperada”. A autora descreve a velhice como algo que surge subitamente, sendo uma ruptura desencadeada pelas perdas que remetem ou se relacionam com outras perdas.

Nossa sociedade contemporânea tende a associar o envelhecimento às perdas múltiplas, como o declínio das funções biológicas e cognitivas, que se impõem com o passar da idade, exigindo do individuo que envelhece a elaboração de um luto contínuo. O confronto com essas perdas narcísicas implica em ressignificá-las para que o sujeito possa delinear novos contornos para sua vida.

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Podemos até pensar que as pessoas mais velhas perdem seu estatuto positivo ao serem destituídas de seu lugar privilegiado e de respeito. Sabemos que essas perdas podem produzir efeitos psíquicos traumatizantes. A perda do corpo jovem seria um desses lutos que o sujeito em processo de envelhecimento deve elaborar. Todos nós nos comunicamos externamente com o mundo através do nosso corpo. Nesse caso não sabemos o que o corpo do velho estaria comunicando. Sabemos apenas que antes do velho tentar se comunicar ele já está marcado pelo o olhar negativo das pessoas que certamente não mais o escutarão, pois a velhice não passa de uma “rabugice” que apenas toma o tempo.

2.3 CORPO NARCÍSICO, CORPO QUE ENVELHECE

É notável que exista uma articulação entre narcisismo e velhice. O processo do envelhecimento modifica a aparência do corpo de várias maneiras: rugas, cabelos brancos, flacidez. Na concepção de Messy (1999):

Podemos ter essas coisas sem sermos socialmente velhos, como podemos ter bastante idade sem aparentar, para a satisfação de um narcisismo galante. Indubitavelmente é no registro corpóreo, onde se instalam os sinais do envelhecer, mediante a inexorável passagem do tempo, criando, para cada indivíduo, diferentes representações sobre seu corpo. (MESSY, 1999, p.25).

Além de expor os traços do tempo, o corpo também expõe o que o tempo representa e significa. As suas marcas irão revelar a história vivida pelo sujeito e por esse motivo, podemos pensar sobre as repercussões das transformações corporais para a pessoa idosa. A aparência física da velhice implica em perceber as atribuições que são designadas à subjetividade e ao valor social dos idosos.

Como já vimos anteriormente, vivemos em uma sociedade que supervaloriza o novo e o belo, aí pensamos no corpo do idoso como aquilo que está velho e precisa ser descartado. Hoje é comum alguém não querer ser velho, ou parecer velho. Como disse Costa (2001), citado por Pitanga em Velhice na Cultura

Contemporânea (2006, p.98): “O corpo passa a servir como vitrine: o que eu sou é o

que eu aparento, meu corpo fala por mim. O que vemos hoje são homens-vitrine, com a alma mais rasa”.

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A representação social do corpo nos oferece acesso à estrutura de uma determinada sociedade, pois cada um atribui ao corpo humano um sentido particular e isso também ocorre com as diferentes sociedades. Cada uma deposita um tipo de atributo próprio que o homem deve ter, do ponto de vista intelectual, moral e físico. Esses atributos são essenciais para todos os membros da sociedade, embora existam diferentes grupos ou classes que a mesma engloba.

O corpo é produto da construção cultural e é um veículo de transformações de papéis sociais e com o passar dos anos ele foi se tornando cada vez mais carregado de conotações liberados na publicidade, na moda, nos filmes, se tornando objeto de obsessão da juventude. O corpo de cada indivíduo não revela somente sua singularidade, mas também tudo aquilo que caracteriza o grupo em que vive. Cada corpo expressa a história de uma sociedade marcada pelos seus valores, leis, crenças e sentimentos que estão na base da vida social. (Gonçalves, 1994, apud Delalibera, 2005, p.10).

A imagem do corpo é própria de cada sujeito estando ligada a sua história e apresentando-se como síntese das experiências relacionais do sujeito. É eminentemente inconsciente; pois estrutura-se através da relação entre sujeitos e é nela que se inscrevem as experiências relacionais, que não são da mesma ordem da necessidade, mas fundamentalmente do desejo (Goldfarb, 1998, apud Delalibera, 2005, p.22).

É perceptível que o sujeito narcísico contemporâneo sempre está em busca de uma imagem que agrade o outro. Dependemos da nossa imagem no espelho do outro. Por esse motivo, nos comunicamos com o mundo externo através do nosso corpo, da nossa imagem. Partindo dessa ideia então, o que o corpo do velho poderia estar comunicando e o que acontece com seu ideal do ego cuja origem é narcisista e tem haver com o narcisismo perdido da infância quando ele mesmo era o próprio ideal? Esse lugar do olhar e da imagem nos remete a tratar sobre a questão do narcisismo.

Partiremos então do mito à teoria, citado por Pitanga em “Velhice na Cultura Contemporânea” (2006):

Na mitologia grega, Narciso era um jovem de beleza rara, própria dos deuses, filho do rei Céfiso e da rainha ninfa Liríope. Após o seu nascimento, o adivinho Tirésias profetizou que ele deveria viver sem ter conhecimento de sua própria beleza. Na versão de Ovídio, é nas águas puras e límpidas de um rio que Narciso vai se dessedentar e descobrir sua própria imagem.

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Ao defrontar-se com sua imagem refletida no espelho das águas, primeiramente não se reconhece. Nesse primeiro instante, que é de não reconhecimento, ele encantado e capturado pelo fascínio de sua própria imagem, fica prisioneiro do imaginário. O caráter ilusório da paixão de Narciso por si mesmo fez com que ele ficasse deitado, contemplando a sua imagem durante muitos dias, vindo a morrer nesse local. Ora, fixado na ilusão e condenado a não amar senão a si mesmo, retira a libido e o interesse dos objetos externos para contemplar sua própria imagem. Vive assim, uma forma de amor que não o conduzia à vida, mas à morte. [...] conforme as predições de Tirésias, o belo Narciso não pode atingir a velhice porque olhou sua imagem. Ele viveria somente enquanto a si mesmo não visse. (PITANGA, 2006, p.100-101).

Por referência a esse mito, Freud concebe e elabora sua teoria sobre o narcisismo como um estado normal no processo da constituição e desenvolvimento psíquico. A partir disso, como podemos analisar a relação do idoso ao se deparar com sua imagem diante do espelho? A revelação do envelhecimento causa um estranhamento, um susto diante do espelho ao confrontar-se com sua imagem refletida.

Segundo Pitanga (2006,p.110) “a imagem refletida no espelho é a imagem de si mesmo e, ao mesmo tempo, de um outro externo”. Quer dizer que o sujeito é o mesmo, mas em idades diferentes que tentam se reconhecer um no outro sendo o mesmo. É essa estranheza de tentar reconhecer essa imagem que torna a chegada da velhice apavorante. A velhice será percebida antes, pelos outros do que pelo próprio sujeito que envelhece. Sendo assim, o velho não pode conceber sua imagem como é para os outros. Beauvoir adverte que:

[...] para reencontrar uma visão de nós mesmos, somos obrigados a passar pelo outro: como esse outro me vê? Pergunto-o ao meu espelho. A resposta é incerta: as pessoas nos vêem, cada uma à sua maneira e nossa própria percepção, certamente, não coincide com nenhuma das outras. (BEAUVOIR, 1990,p. 363-364)

Partindo desse pressuposto, o velho sempre será o outro, em quem não nos reconhecemos. É muito difícil assumir a velhice, pois ela aparece estranhamente de uma maneira em que o velho não se reconhece como tal nesse rosto. Adiante, Beauvoir acrescenta que o velho no espelho pode se tornar um outro, pode se tornar aquilo que ele não quer ser. Para ela, “o velho é sempre o outro” e ainda afirma:

[...]em mim, é o outro que é idoso, isto é, aquele que sou para os outros e esse outro sou eu [...] A aparência de nosso corpo e de nosso rosto nos informa com mais certeza: que contraste com nossos 20 anos! Só que essa mudança se opera continuamente, e nós mal percebemos [...]. em nós é o

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outro que é velho, que a revelação de nossa idade venha dos outros. (Beauvoir, 1990,p. 348-351)

No corpo revela-se uma velhice não desejada, assustando o sujeito como se fosse uma grande ameaça. Quando o idoso não se reconhece na sua própria imagem, pode ser que ele permaneça fixado a um tempo passado, rejeitando o presente. A temporalidade é permanente e nos constitui, fazendo com que possamos reconstruir nosso passado, fazendo com que vivamos o presente dando-lhe uma continuidade, fazendo também com que projetemos nosso futuro. A respeito disso, Goldfarb (1998) contribui:

O tempo do envelhecimento está ligado á consciência da finitude, que se instaura a partir de diferentes experiências de proximidade com a morte durante a vida toda, mas que na velhice adquire a dimensão do iniludível. (GOLDFARB, 1998, p. 108)

Como dito anteriormente, a velhice remete à nossa história. É comum ficarmos espantados quando revemos álbuns de fotografias. Na maioria das vezes, ao nos depararmos com nossos retratos dizemos: “era eu nessa foto?”. Daí surgem as recordações de como éramos no passado. Utilizamos o verbo “era”, como se não fosse mais a mesma pessoa. Quem seria então? A imagem do espelho ou da foto não mais corresponde à imagem armazenada na memória e que segundo MESSY (apud Pitanga, 2006, p. 122), “pode ser confundida com a imagem de um pai ou outro parente idoso, talvez morto”.

Segundo Pitanga (2006, p.129) “o corpo que durante anos conservou-se dentro de uma certa estabilidade, começa a mostrar sinais de declínio. Além de não mais corresponder aos anseios dos idosos, também mobiliza olhares e passa a ser notado”. Nesse sentido, a autora afirma que a cada dia as transformações que ocorrem no corpo são mais perceptíveis e sua forma física refletida no espelho se distancia da imagem que antes serviu como a representação de si mesmo.

Adiante, a autora ainda afirma que “essa é a imagem da memória, idealizada que remete a familiaridade do eu especular. Quando volta o olhar para sua imagem, não se reconhece, pois a velhice não é reconhecida pela própria pessoa de imediato” (Pitanga, 2006, p. 130).

Entende-se que algo muda com o passar dos anos e a descoberta desses sinais que marcam essa passagem do tempo causam um sentimento de estranheza

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ao idoso ao se descobrir como um outro. Ao se confrontar com esse estranho é que são colocadas às dúvidas e incertezas sobre si mesmo. As rugas, os cabelos brancos, tornam-se uma deterioração corporal. O idoso sofre com as marcas do tempo, de uma maneira particular, mas estas marcas são experiências de vida.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

A velhice sempre fez questão na história das sociedades. A cada passo da evolução social a velhice teve suas diferentes conceituações. O crescimento do número de pessoas idosas no mundo é um processo que está sendo percebido e também começa a provocar interesse aos demais. As medidas que surgem e estão sendo adotadas para dar suporte a esta demanda dependem muito da representação social associada à velhice nesse contexto. Esse contexto em que se vive corresponde à cultura e também as reivindicações do próprio idoso que se envolve diante desse cenário. Nessa perspectiva, foi possível analisar o conceito que a velhice tem na atualidade, sendo possível perceber a falta de investimentos relacionados à estrutura que o social tem a oferecer para a classe dos idosos.

Como vimos, a vivência em relação à velhice sofre grande influência das representações sociais, pela cultura na qual o sujeito está inserido, que muitas vezes poderá influenciar na qualidade de vida para esse sujeito que envelhece, ou pode até mesmo causar sofrimento psíquico. Esse sofrimento começa a ser vivenciado pelos idosos desde a negação do envelhecer, na questão da exclusão familiar, na percepção de que a sociedade fechou seu lugar na participação social. Nega-se ou denega-se o envelhecer enquanto pensamos no mito da juventude eterna. Na velhice, o corpo vai sofrendo abalos, começando a enviar os sinais de declínio. O corpo vai processando e a aparência física refletida no espelho começa a se distanciar daquela imagem armazenada na memória.

Antes, a visão que se tinha do idoso era como dependente do Estado e da família, mas nos dias atuais, há uma contraposição referente a isso. É perceptível que netos e filhos também necessitam receber o apoio de pais idosos. Isso ocorre porque os idosos aposentados recebem de um a três salários mínimos mensais e continuam contribuindo financeiramente para a renda familiar de seus filhos, que muitas vezes, devido a forte taxa de desemprego dependem dessa ajuda para sobreviver. Não podemos esquecer-nos da falta de respaldo público para auxiliar as famílias nos cuidados com os idosos, fazendo com que as instituições especializadas sejam a alternativa encontrada pelos filhos para transferirem a responsabilidade de cuidados com seus pais. Sendo assim, no asilo o idoso será obrigado a adaptar-se às normas e regulamento do local, tornando-se membro de

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uma nova comunidade e convivendo com pessoas com as quais não tem nenhum vínculo afetivo.

Partindo para a questão do envelhecimento em si que foi apresentada ao longo do trabalho, entendemos que somos resultados de nossas experiências, portanto não somos somente um ser de aparência. O sujeito constrói sua própria história ao decorrer dos anos, história essa que não pode ser negligenciada pelo fato de estar contida em um corpo velho. Em relação à historicidade, nossa época apresenta um preconceito em que a juventude é bela e tem um lugar, enquanto a velhice é vista como um castigo, sem graça e sem um lugar. Mas existe sim um lugar para a velhice no mundo contemporâneo, pois se o corpo se transforma o sujeito permanece embora existam especificidades que possam comprometê-lo, ou seja, a memória fica e esse lugar deve ser preservado.

Nosso contexto social associa o envelhecimento às perdas múltiplas, como o declínio das funções biológicas e cognitivas, que se impõem com o passar da idade, exigindo do individuo que envelhece a elaboração de um luto contínuo, fazendo com que haja um conflito entre as perdas narcísicas que podem produzir efeitos psíquicos traumatizantes. A perda do corpo jovem seria um desses lutos que o sujeito em processo de envelhecimento deve elaborar, pois nos comunicamos externamente com o mundo através do nosso corpo e nesse caso não sabemos o que o corpo do velho estaria comunicando. Sabemos apenas que antes do velho tentar se comunicar ele já está marcado com o olhar negativo das pessoas que certamente não mais o escutarão, pois a velhice não passa de uma “rabugice” que apenas toma o tempo.

Algo muda com o passar dos anos e a descoberta desses sinais que marcam essa passagem do tempo causam um sentimento de estranheza ao idoso ao se descobrir como um outro. Ao se confrontar com esse estranho é que são colocadas às dúvidas e incertezas sobre si mesmo. O idoso sofre com as marcas do tempo, de uma maneira particular, mas estas marcas são experiências de vida.

A maioria das pessoas entende a velhice como uma fase de tristeza e infelicidade, uma fase que nada se espera além da morte. Esse é um confronto que colabora com o surgimento do temor, insegurança e angústias. Entende-se que é possível que o idoso faça uma avaliação de seu aprendizado, suas conquistas e realizações com um olhar de quem cumpriu sua tarefa, pois o passado não é simplesmente um acúmulo de recordações, lembranças e saudade do que se foi,

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mas sim um significado daquilo que foi vivido, criando novas perspectivas para o futuro.

Deve-se encarar a velhice e atribuir a ela possibilidades e experiências onde a pessoa idosa seja tratada como sujeito e não apenas como um objeto de cuidados. Enquanto existir o amanhã, haverá um sentido para a velhice. O envelhecimento é um processo que está inscrito em todos os seres humanos, desde seu nascimento, e dele ninguém pode fugir.

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Referências

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