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Sujeitos com transtornos graves no desenvolvimento: desafios e apostas interdisciplinares na APAE de Ijuí

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Academic year: 2021

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DEPARTAMENTO DE HUMANIDADES E EDUCAÇÃO CURSO DE PSICOLOGIA

JACSON FANTINELLI DOS SANTOS

SUJEITOS COM TRANSTORNOS GRAVES NO DESENVOLVIMENTO: DESAFIOS

E APOSTAS INTERDISCIPLINARES NA APAE DE IJUÍ

IJUÍ – RS 2016

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JACSON FANTINELLI DOS SANTOS

SUJEITOS COM TRANSTORNOS GRAVES NO DESENVOLVIMENTO: DESAFIOS

E APOSTAS INTERDISCIPLINARES NA APAE DE IJUÍ

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Psicologia da Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande d Sul- UNIJUÍ , como requisito para obtenção do título de Bacharel em Psicologia.

Orientadora: Profª. Mestre Kenia Freire

IJUÍ- RS 2016

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Com orgulho, compartilho o resultado de uma formação; a primeira pesquisa realizada no Curso de Psicologia da UNIJUÍ.

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AGRADECIMENTOS

Gratidão à APAE de Ijuí, instituição que me possibilitou o desenvolvimento profissional e o crescimento como pessoa. A todos os alunos que me ensinaram a dar valor às coisas mais simples e delicadas da vida, especialmente: C; A; S; E; M e S. -“Em Dezembro de 2011, quando entrei por aquele portão...Minha vida nunca mais foi a mesma”.

Às instituições que me receberam durante os três longos anos de estágios: Liga Feminina de Combate ao Câncer, Clínica de Psicologia, UNIGESTAR, CEREST e Instituto Nacional de Seguridade Social- Reabilitação Profissional. Cada uma dessas experiências contribuiu significativamente para a construção do meu percurso pessoal e acadêmico na Psicologia.

À todos aqueles que me confiaram suas vidas, suas angústias e seus amores. Às transferências que nunca esquecerei: A; M; B; L; E.

Às professoras Flávia Flach, Tânia de Souza e Janete Goulart pelas supervisões de estágio. A escuta e os desafios que enfrentamos juntos originaram o estilo do meu trabalho.

Agradecimento especial à Kenia Freire pela orientação deste trabalho, o acolhimento inicial da proposta, a construção do projeto ao Comitê de Ética, a escuta atenciosa, os apontamentos preciosos. Por acreditar no potencial das minhas idéias, inquietações e desejos. Não há palavras que contemplem o significado dessas contribuições na construção deste trabalho em minha formação.

À minha mãe Ieda e ao meu irmão Person, por estarem ao meu lado nos momentos mais difíceis, por respeitarem meu percurso na vida.

Aos meus avós Terezinha Fantinelli e Florinaldo Fantinelli (in memorian), por me transmitirem os valores mais humano da vida: o amor e a memória.

À minha analista, por ser terra firme quando a vida me foi tempestade. Por possibilitar que eu me autorize a costurar minha história, minhas relações, minhas dores e meus desejos. Por respeitar meus ciclos e minhas andanças pela vida.

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“O mundo é salvo todos os dias por pequenos gestos. Diminutos, invisíveis. O mundo é salvo pelo avesso da importância. Pelo antônimo da evidência. O mundo é salvo por um olhar. Que envolve e afaga. Abarca. Resgata. Reconhece. Salva.

Inclui. Esta é a história de um olhar. Um olhar que enxerga. E por enxergar, reconhece. E por

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RESUMO

O presente Trabalho de Conclusão de Curso em Psicologia é uma pesquisa com abordagem qualitativa, de natureza aplicada; sob o ponto de vista de seus objetivos, caracteriza-se como pesquisa explicativa. Quanto ao delineamento, classifica-se como um estudo de caso. Esta pesquisa tem como origem a referência ao trabalho desenvolvido junto à Associação dos Pais e Amigos dos Excepcionais- APAE de Ijuí. Como instrumento metológico utiliza-se a aplicação de entrevistas semi-estruturadas dirigidas à um grupo de profissionais atuantes na instituição, objetivando reconhecer as intervenções que orientam as diferentes especialidades que compõem os tratamentos para sujeitos com transtornos no desenvolvimento. O primeiro capítulo dedica-se a reconstruir e sistematizar as práticas de saúde e sanções sobre a loucura e/ou deficiências exercidas no município de Ijuí (RS), no período de colonização até a fundação da APAE. O segundo capítulo apresenta a instituição das APAES, o Movimento Apaeano, o fluxo de atendimentos e as entrevistas realizadas com áreas que compõem as intervenções neste campo. O último capítulo analisa a importância de compreender a repercursão das intervenções científicas sobre os processos humanos que se desdobram na referida instituição. A partir dos discursos dos profissionais entrevistados apresentam-se temáticas e conceitos, tais como: desenvolvimento humano, subjetividade, relações familiares, deficiências orgânicas (com substratos físicos e/ou mentais), doença mental, articulações entre as diferentes áreas de saber e a construção de processos inclusivos. Essas variáveis que atravessam as propostas de tratamento são abordadas e desenvolvidas a partir de pressupostos teóricos psicanalíticos. O campo do trabalho terapêutico é objeto sobre o qual a presente pesquisa se propõe a analisar, compreendendo os parâmetros diferenciais que se colocam para a construção de propostas interdisciplinares que possibilitam o questionamento entre os saberes e a formação de espaços de diálogo direcionados à reflexão sobre as intervenções e sustentação do comparecimento legítimo do sujeito na práxis que lhe é endereçada.

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ABSTRACT

The present Work of Conclusion of Course in Psychology is a research with qualitative approach, of applied nature; Under the point of view of its objectives, is characterized as explanatory research. As for the design, it is classified as a case study. This research is based on the work developed by the Association of Parents and Friends of the Exceptional - APAE de Ijuí. As a metological instrument, the use of semi-structured interviews directed to a group of professionals working in the institution is used, aiming to recognize the interventions that guide the different specialties that make up the treatments for subjects with developmental disorders. The first chapter is devoted to reconstructing and systematizing health practices and sanctions on insanity and / or disabilities in the municipality of Ijuí (RS), in the period of colonization until the foundation of the APAE. The second chapter presents the institution of APAES, the Apaeano Movement, the flow of care and the interviews carried out with areas that make up the interventions in this field. The last chapter examines the importance of understanding the impact of scientific interventions on human processes unfolding within the institution. From the discourses of the interviewed professionals, themes and concepts are presented, such as: human development, subjectivity, family relations, organic deficiencies (with physical and / or mental substrates), mental illness, articulation between different areas of knowledge and construction of inclusive processes. These variables that cross the treatment proposals are approached and developed from theoretical psychoanalytic assumptions. The field of therapeutic work is an object on which the present research proposes to analyze, understanding the differential parameters that are placed for the construction of interdisciplinary proposals that allow the questioning between the knowledge and the formation of spaces of dialogue directed to the reflection on the Interventions and support of the legitimate attendance of the subject in the praxis addressed to him. Key words: psychoanalysis, developmental disorder, subject, therapeutic work.

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura nº 1– Níveis Hierárquicos do Movimento Apaeano... 41

Figura nº 2– Composição das áreas de conhecimento da Escola de Educação Especial Recanto da Esperança e da Clínica Interdisciplinar da APAE de Ijuí...43

Figura nº 3– Abrangência dos Serviços / APAEs – Brasília/2001...44

Figura nº 4– Estrutura pedagógica da escola, grupos de trabalho e localização nos Níveis de Ensino da Modalidade de Educação Especial (2011)...45

Figura nº 5– Figura sobre o desenvolvimento infantil a partir de CORIAT e JERUSALINSKY, 1996...55

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ABNT- Associação Brasileira de Normas Técnicas;

AEE- Atendimendo Educacional Especializado;

APAE – Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais;

APAEANO- Nomeação ao Movimento das Apaes;

AIVD- Atividades Instrumentais de Vida Diária;

AVD- Atividades de Vida Diária;

CAPSI- Centro de Atenção Psicossocial Infanto Juvenil;

CEO- Centro de Especialidades Odontologicas;

CID- Classificação Estatística Internacional de Doenças;

CIMS- Comissão Interinstitucional Municipal de Saúde;

CNS- Conselho Nacional de Saúde;

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CREAS- Centro de Referência Especializado em Assistência Social;

DSM- Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais;

ESF- Estratégia de Saúde da Familia;

FENAPAES- Federação Nacional das Apaes;

FIDENE- Fundação de Integração, Desenvolvimento e Educação do Noroeste do Estado;

GAT- Grupo de Apoio ao Trabalho;

GAP- Grupo de Apoio aos Pais;

HPSP- Hospital Psiquiátrico São Pedro;

INSS- Instituto Nacional de Seguridade Social;

MEC- Ministério da Educação

PAIS- Programa de Assistencia Integral à Saude Mental;

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PRÓ AUDI- Serviço Especializado de Reabilitação Auditiva;

SMED- Secretaria Municipal de Educação e Desporto;

SMS- Secretaria Municipal de Saúde;

SSMA/RS- Secretaria de Saúde e do Meio Ambiente do Rio Grande do Sul;

TEACCH- Treatment and Education of Autistic and Related Communication Handicapped Children (Tratamento e Educação para Autistas e Crianças com Déficits relacionados com a Comunicação);

UNIJUÍ- Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul;

UNIR- Unidade de Reabilitação de Ijuí;

WISC- Escala Wechsler de Inteligência para Crianças;

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO...14

1. CONTEXTUALIZAÇÃO DO ESTUDO...20

1.1 Apresentação do Tema de Estudo...20

1.2 Justificativa...20

1.3 Problema a ser abordado...21

1.4 Hipótese...21

1.5 Definições dos objetivos do estudo...21

1.5.1 Objetivo Geral...21

1.5.2 Objetivos Específicos...21

2. METODOLOGIA PROPOSTA...23

2.1 Delineamento da Pesquisa...23

2.2 Caracterização do local de pesquisa...24

2.3 Tamanho da Amostra...24

2.4 Participantes do Estudo...25

2.5 Critérios de Inclusão e Exclusão...25

2.6. Plano de coleta de dados...25

2.7 Plano de análise e interpretação dos dados...26

2.8 Aspectos Éticos...27

3. REFERENCIAL TEÓRICO...29

3.1 Memória das sanções sobre as deficiências/loucura e das práticas de saúde-educação em Ijuí-RS………...……...………29

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3.2 A composição das práticas de saúde e de educação no trabalho da APAE de

Ijuí...40

3.3 Das intervenções científicas ao Olhar sobre o Sujeito...54

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS...68

5. CRONOGRAMA ...70

6. ORÇAMENTO...72

REFERÊNCIAS...74

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INTRODUÇÃO

O presente Trabalho de Conclusão de Curso em Psicologia é uma pesquisa com abordagem qualitativa, de natureza aplicada; sob o ponto de vista de seus objetivos, caracteriza-se como pesquisa explicativa. Quanto ao delineamento, classifica-se como um estudo de caso, pois se trata de um estudo aprofundado, que visa obter o máximo de informações em referência ao trabalho desenvolvido junto à Associação dos Pais e Amigos dos Excepcionais- APAE de Ijuí. Segundo a observação das atividades educativas e clínicas propostas aos sujeitos com transtornos graves no desenvolvimento, interroga-se as fronteiras das intervenções de diferentes especialidades que compõem estas práxis; de modo a analisar a possibilidade de conexão entre o trabalho clínico e o trabalho escolar. Aposta-se em uma pesquisa que, tomando as propostas interdisciplinares como referencial epistemológico, vise à construção de estratégias de intervenção no campo da saúde mental, junto à sujeitos com graves entraves no desenvolvimento.

Atualmente existem propostas no campo da Educação Especial que são resultados da urgência e da demanda de tratamento que se constrói no encontro entre a Psiquiatria, a Pedagogia e a Psicologia. O trânsito entre essas áreas impulsionou os profissionais que tratam de sujeitos com transtornos graves no desenvolvimento a buscarem alternativas de intervenção que abordem a subjetividade, acolhendo a dinâmica de tratamento e dos processos de escolarização.

A APAE de Ijuí é uma instituição filantrópica fundada em 1970, que acolhe pessoas com deficiência intelectual e transtornos no desenvolvimento. Atualmente atende 386 (trezentos e oitenta e seis) usuários, oriundos de Ijuí, Catuípe, Bozano e Coronel Barros, perfazendo 180 (cento e oitenta) alunos da Escola e 206 ( duzentos e seis) usuários da Clínica Interdisciplinar. A Escola de Educação Especial Recanto da Esperança atende as seguintes modalidades de ensino: Educação Infantil, Ensino Fundamental Incompleto e Educação de Jovens e Adultos. As seguintes leis orientam o trabalho desta intituição: a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência- 2015), Constituição Federal (1998) Art.208, Política Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência – Lei n° 7.853 de 1989, Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBN) Lei nº 9394 de 1996 , Lei nº10098 / 2000 sobre a Acessibilidade, as Diretrizes Nacionais para a Educação

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Especial na Educação Básica ( MEC / 2000 ), Estatuto da Criança e do Adolescente – Lei n° 8.069, de 1990.

A Clínica Interdisciplinar da APAE de Ijuí realiza atendimentos nas áreas de Medicina, Serviço Social, Fisioterapia, Fonoaudiologia, Odontologia, Psicologia, Psicopedagogia e Terapia Ocupacional, dando suporte ao trabalho dos professores e monitores da Escola. A instituição está amparada pela Constituição Federal de 1988 que assegura os direitos das pessoas portadoras de deficiência, destacando-se as Leis n.º 7.853/89, n.º 10.048/00, n.º 10.098/00, e n.º 8.080/90 – a chamada Lei Orgânica da Saúde, bem como os Decretos n.º 3.298/99 e n.º 5.296/04. As ações da Clínica Interdisciplinar da Apae de Ijuí estão pautadas na Política Nacional de Saúde da Pessoa Portadora de Deficiência (2008) e no Estatuto da Pessoa com Deficiência (2015); no intuito de promover a qualidade de vida, dar assistência integral a saúde, prevenir deficiências e estabelecer um fluxo dos serviços de atenção à pessoa com deficiência. Para além da Politica Nacional de Saúde, também há o amparo da Lei Orgânica da Assistência Social, que assegura o Beneficio de Prestação Continuada à pessoa com deficiência, bem como a habilitação e reabilitação, promovendo a sua integração à vida comunitária.

Entre os transtornos graves no desenvolvimento que incidem sobre os sujeitos participantes da proposta de trabalho da APAE, apresentam-se casos com problematizações decorrentes de danos no funcionamento do Sistema Nervoso Central, caracterizados pela Paralisia Cerebral; essa se caracteriza como uma deficiência oriunda de uma lesão em uma área específica do cérebro que é responsável pelo movimento, tronco cerebral e medula espinhal; o que significa que o organismo poderá apresentar dificuldades de controle muscular.

Além de comprometimentos orgânicos com danos neurológicos, observa-se a complexidade de casos onde o transtorno mental prevalece sobre a deficiência intelectual e/ou múltipla, havendo a problemática da constituição subjetiva e da relação com o outro. Nesta perspectiva, o Transtorno do Espectro do Autismo, conforme a classificação psiquiátrica do Manual de Diagnóstico e Estatística de Distúrbios Mentais- DSM V (2014), da Associação Americana de Psiquiatria, é uma condição geral para um grupo de desordens complexas do desenvolvimento do cérebro, que podem se desdobrar antes, durante ou logo após o nascimento. Sendo chamado de Transtorno do Espectro porque a gravidade e nível de comprometimento em indivíduos pode variar de escassamente presente à muito grave. Esses distúrbios se caracterizam pela dificuldade na comunicação e na interação social, e ainda, por

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comportamentos repetitivos e restritos, podendo apresentar a associação de outras comorbidades.

Na Classificação de Transtornos Mentais e de Comportamento do CID-10 (1993) o autismo está incluído na categoria “Transtornos Invasivos do Desenvolvimento” e é nessa classificação que também se aborda a psicose na infância. Nos dois manuais citados não há um consenso quanto ao diagnóstico diferencial da psicose e do autismo na infância. Dessa forma, a psicanálise é uma orientação relevante para compor o reconhecimento de aspectos diferenciais que caracterizam estas duas condições psíquicas, ao considerar a noção de sujeito e de estruturação psíquica. No decorrer deste estudo, busca-se referenciais psicanalíticos para contribuir à analise dessas circunstâncias.

Entre as possibilidades de trabalhos que enfatizam a condição de sujeito e a transversalidade do tratamento clínico e educacional, encontramos a proposta da Educação Terapêutica (1999), termo cunhado por Maria Cristina Kupfer para designar um conjunto de práticas interdisciplinares que visam à retomada do desenvolvimento do sujeito. Essa proposta pretende a composição de um trabalho que é tramado entre o educar e o tratar, possibilitando a construção de uma relação transversal entre os saberes e a formação de espaços de diálogo que fomentem a proposição de intervenções que sustentem o surgimento do sujeito.

As seguintes questõs orientam o desenvolvimento deste trabalho: como pensar uma instituição que atende sujeitos com transtornos no desenvolvimento a partir de variadas áreas de saber? Como se dá a organização do trabalho, a conexão e continuidade das intervenções, a extensão e complexidade das demandas, a estrutura do trabalho em rede, e ainda, quais as apostas e os desafios que movem os profissionais que sustentam as práticas de trabalho na APAE? Nesta perspectiva o presente trabalho se propõe a investigar as práticas que orientam as propostas clínicas e educacionais, instigando questionamentos sobre a criação de novos dispositivos de trabalho terapêutico.

Buscando dar conta destas questões, levantam-se pontos a serem analisados e trabalhados, entre os quais se situam:

- os tratamentos destinados a sujeitos com problematizações orgânicas e/ou psíquicas no desenvolvimento;

- as condições do sujeito, da família e das instituições de trabalho terapêutico em sustentar a circulação do sujeito no laço social, apesar de e com o seu transtorno;

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- a articulação entre as áreas que destinam tratamentos à sujeitos com transtornos no desenvolvimento, repensando o lugar das práxis, desde o qual os técnicos e pedagogos dirigem suas intervenções. Aposta-se que o aprimoramento do trabalho interdisciplinar pode gerar consequências que articulem a condição da transdisciplinaridade;

- a construção de estratégias de inclusão, onde o tratar incida com o educar, viabilizando um lugar ao sujeito, indepentente de sua problematização.

Instigado a construir um percurso dissertativo acerca das categorias até então citadas, ocorre a organização de um texto estruturado em três capítulos, brevemente descritos neste momento.

O primeiro capítulo, “Memória das práticas de saúde e educação destinadas à doença e/ ou à deficiência mental em Ijuí”, dedica-se a reconstruir e sistematizar as práticas de saúde e sanções sobre a loucura e/ou deficiências exercidas no município de Ijuí (RS), no período de colonização até a fundação da Associação dos Pais e Amigos dos Excepcionais- APAE de Ijuí. Busca-se aproximar a instituição, que estruturalmente funda-se na escolarização, do movimento de construção de práticas em saúde mental. O interesse do autor em retomar os momentos históricos reside em compreender os movimentos lógicos que demarcaram a condição deste sujeito no decorrer do tempo; de louco, excluído e segregado à construção de dispositivos sociais, educacionais e institucionais de reconhecimento das produções que advém do sujeito, independente das afecções no desenvolvimento.

Articulado em dois momentos, este capítulo retoma, inicialmente, os lugares sociais destinados aqueles que são atravessados por “situações de deficiências”, recuperando eventos que demarcam a ausência de práticas de atenção às problematizações psíquicas e/ou orgânicas. Analisa-se o trabalho da Medicina quanto à intervenção destinada ao tratamento clínico da loucura em Ijuí, bem como a escassa possibilidade de diagnóstico e alternativas de cuidado aos casos de transtornos graves no desenvolvimento. Num segundo momento, detêm-se à elencar trabalhos iniciais que propiciam a construção de propostas educacionais e clínicas, ressaltando as dificuldades encontradas para a estruturação de serviços especializados na área de transtornos no desenvolvimento. Ainda, procura situar a fundação da APAE como um marco na construção de trabalhos visando saúde e educação para pessoas/ sujeitos com deficiências, assim como um ideal em educação inclusiva no município de Ijuí.

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O segundo capítulo, “A composição das práticas de saúde e de educação no trabalho da APAE de Ijuí” , demarca a instituição das Associações dos Pais e Amigos dos Excepcionais no Brasil, o fortalecimento do Movimento Apaeano como uma proposta de inclusão e os desafios que integram a sistematização da atenção à saúde e educação para pessoas com transtornos graves no desenvolvimento. Esclarece-se acerca do fluxo de atendimento na APAE de Ijuí, a estruturação dos serviços e a composição das áreas que atuam junto à essa instituição. Ainda neste momento do trabalho, aborda-se as entrevistas realizadas com as áreas de Medicina, Psicologia, Serviço Social, Fonoaudiologia, Odontologia, Psicopedagogia, Fisioterapia, Terapia Ocupacional, Estimulação Precoce e Educação Especial. Sustenta-se a efetividade de inclusão à medida que o sujeito seja reconhecido nos tratamentos clínicos e nos processos de escolarização, inferindo que uma intervenção a partir da deficiência inscreve efeitos desestruturantes no sujeito.

Como necessidade de trabalhar apontamentos à formação, surge o capítulo “Das intervenções científicas ao Olhar sobre o Sujeito”, que analisa a importância de compreender a repercussão das intervenções científicas sobre os processos humanos que se desdobram na APAE de Ijuí. A partir dos discursos dos profissionais entrevistados apresentam-se temáticas e conceitos tais como: desenvolvimento humano, subjetividade, relações familiares, deficiências orgânicas (com substratos físicos e/ou mentais), doença mental, articulações entre as diferentes áreas de saber e a construção de processos inclusivos. Essas variáveis que atravessam o trabalho terapêutico são abordadas a partir de pressupostos teóricos psicanalíticos.

Nesta perspectiva, a inserção de uma criança nos trabalhos desenvolvidos pela APAE remete a uma complexidade de reconhecimentos e intervenções que apontam ao sujeito e ao seu desenvolvimento, demandando a construção de trabalhos baseados nos conceitos de multidisciplina, interdisciplina e transdisciplina para sustentar ao sujeito um trânsito que permita a elaboração de laços institucionais sob a operação de propostas de tratamento e escolarização articuladas às condições de seu desenvolvimento.

Esta pesquisa caracteriza-se como um levantamento de elementos para abordar a complexidade do trabalho clínico e educacional destinado a sujeitos com transtornos graves no desenvolvimento. As análises construídas ao decorrer da pesquisa partem de uma formação na área de Psicologia, orientada por uma concepção teórica e clínica psicanalítica (referenciada nas construções freudianas e lacanianas) e em referência a experiência de

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trabalho na APAE. A orientação psicanalítica permite posicionar a escuta à singularidade e a subjetividade, estendendo esse endereçamento tanto à práxis clínica quanto aos espaços institucionais. Infere-se que o sofrimento psíquico frente aos transtornos graves no desenvolvimento carece ser trabalhado, a fim de que se possibilite o reconhecimento de condições de desenvolvimento no sujeito. Como fundamentos desta formação, o autor encontra em trabalhos realizados pelos profissionais vinculados ao Lugar de Vida, de São Paulo, e ao Centro Lydia Coriat, de Porto Alegre, referências para pensar a vinculação do trabalho clínico em relação aos processos educacionais inclusivos, promovendo o surgimento do sujeito nesse trânsito.

É importante ressaltar, ainda, o interesse do autor em compartilhar sua pesquisa com estudantes e profissionais das diferentes áreas que compõem a rede de saúde e a rede de educação para sujeitos com problematizaçõs orgânicas e/ou psíquicas, para fomentar propostas e dispositivos de trabalho terapêutico destinado ao sujeito em sua diversidade.

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1. CONTEXTUALIZAÇÃO DO ESTUDO

Esta unidade consiste em apresentar a questão de estudo, a justificativa, o problema, a hipótese e os objetivos desta pesquisa.

1.1 Apresentação do Tema de Estudo

Sujeitos com transtornos graves no desenvolvimento- desafios e apostas interdisciplinares na APAE de Ijuí- RS

1.2 Justificativa

As propostas de trabalho junto aos sujeitos com problemas no desenvolvimento são formadas por várias especialidades. Assim, busca-se interrogar a amplitude de saberes provenientes das mais diversas áreas, como a Psicologia, a Fisioterapia, a Terapia Ocupacional, a Pedagogia, a Neurologia, e assim por diante. Frente à essa complexidade, encontramos situações em que um mesmo sujeito demanda mais de uma forma de intervenção.

A pluralidade de especialidades possibilita maiores condições de esclarecimento sobre uma série de questões, mas também produz consequências sobre os tratamentos destinados aos sujeitos, podendo criar a segregação de visões, restringindo as intervenções sem propor uma continuidade. A própria cisão entre educação e saúde, pertinente em determinadas situações- pode estabelecer uma visão limitada das possibilidades de interpretação dos problemas.

Desse modo, a reflexão interdisciplinar tem se mostrado fundamental para a composição de propostas dirigidas à sujeitos com transtornos graves no desenvolvimento. Esta orientação de trabalho possibilita a constante abertura ao diálogo entre as diversas áreas, sem segregar um único saber, e ainda, impulsiona cada profissional a se apropriar de elementos mínimos relacionados às outras ciências.

Assim, a construção de propostas interdisciplinares pode viabilizar, para além do acolhimento, um lugar de desenvolvimento psíquico, social e físico, que estimule a autonomia e sustente um lugar ao sujeito, apesar de e com o seu transtorno.

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1.2 Problema a ser abordado

A partir das confluências entre as áreas que tratam de sujeitos com distúrbios graves no desenvolvimento, as propostas de trabalho clínico e educacional portam uma gama de saberes. Desse modo, concebe-se como essencial a articulação entre escola e clínica sob a perspectiva da interdisciplinariedade, para sustentar que as intervenções tenham conexão e continuidade. Realizar um diálogo interdisciplinar sobre os tratamentos destinados à sujeitos com problematizações no desenvolvimento não é tarefa fácil, demandando que a equipe se oriente sobre o mesmo “objeto” a partir de olhares complementares.

Qual a importância e relevância da operacionalização de propostas que acolham o sujeito com vicissitudes no desenvolvimento, proporcionando-lhe a continuidade de sua estruturação para investimentos e aberturas de novos tempos lógicos no desenvolvimento?

1.4 Hipótese

O trabalho interdisciplinar pode sustentar o surgimento do sujeito, a partir das intervenções das áreas que compõem a diversidade de olhares sobre o mesmo.

1.5 Definições dos objetivos do estudo

O objetivo é o resultado que se pretende alcançar no término de uma pesquisa. O objetivo de um trabalho é a meta. Os objetivos podem ser gerais e específicos.

1.5.1 Objetivo Geral

Explorar intervenções que possam orientar o trabalho clínico e escolar para sujeitos com transtornos graves no desenvolvimento, de forma que o tratar incida com o educar, refletindo assim sobre os desafios e as propostas terapêuticas interdisciplinares.

1.5.2 Objetivos Específicos

Reconhecer a incidência dos transtornos do desenvolvimento junto aos sujeitos que participam da proposta de trabalho da APAE-Ijuí.

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Investigar práticas que possam orientar as propostas educacionais e clínicas, instigando questionamentos sobre a criação de novos dispositivos de tratamento, abordando a contribuição da psicanálise como uma referência possível para compor as intervenções, a partir do diálogo e do compartilhamento de saberes que afetam a construção de uma práxis interdisciplinar.

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2. METODOLOGIA PROPOSTA

A formulação de propostas educacionais e clínicas para sujeitos com transtornos graves no desenvolvimento demanda que se esclareça qual orientação vem sendo assumida pelo profissional e qual o suporte que a instituição de saúde- educação provê para desenvolver esta abordagem.

Os procedimentos metodológicos são fundamentais no desenvolvimento deste trabalho, sua importância está na estruturação do tipo de pesquisa que foi realizada, plano de coleta de dados e do plano de análise e interpretação dos mesmos.

Segundo a NBR 15287:2005, da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), na qual consta o item “Metodologia”, a pesquisa é um procedimento reflexivo e crítico que busca respostas para problemas ainda não solucionados. Seu planejamento e execução fazem parte de um processo sistematizado que compreende várias etapas detalhadas, compreendendo a seleção dos sujeitos do estudo, a forma de coleta e tabulação dos dados e a análise e discussão dos resultados. A Metodologia é a descrição da abordagem a ser adotada, em que constam todos os passos e procedimentos adotados para realizar a pesquisa e atingir os objetivos. A forma de abordagem refere-se ao tipo de análise e tratamento dos dados; desse modo, a pesquisa pode ser qualitativa ou quantitativa, e quanto ao objetivo geral ela pode ser exploratória, descritiva, explicativa ou analítica.

2.1 Delineamento da Pesquisa

Esta pesquisa utiliza uma abordagem qualitativa, de natureza aplicada; sob o ponto de vista de seus objetivos, caracteriza-se como pesquisa explicativa. Quanto ao delineamento, classifica-se como um estudo de caso, pois se trata de um estudo aprofundado, que visa obter o máximo de informações que permitam destacar e analisar as principais categorias estruturais que caracterizam o trabalho junto à sujeitos com transtornos graves no desenvolvimento.

Nas abordagens qualitativas, de acordo com Minayo (2004), há uma relação dinâmica entre o mundo real e o sujeito, isto é, um vínculo indissociável entre o mundo objetivo e a subjetividade do sujeito, que não pode ser traduzido em números. A interpretação dos fenômenos e a atribuição de significados são básicas no processo de pesquisa qualitativa. Nessa abordagem “a compreensão dos fenômenos se dá a partir de seu acontecer histórico no qual o particular é considerado uma instância da totalidade social”. A pesquisa é vista como

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uma relação entre sujeitos, portanto dialógica, na qual o pesquisador é uma parte integrante do processo investigativo (FREITAS, 2002, p. 24).

A natureza do objeto de pesquisa é aplicada e objetiva construir conhecimentos dirigidos à solução de questões específicas que envolvem probemáticas locais. A pesquisa explicativa visa caracterizar, explicar e analisar os fatores que determinam ou contribuem para a ocorrência dos fenômenos, “aprofunda o conhecimento da realidade porque explica a razão, o porquê das coisas.” (GIL, 2010, p. 28).

A partir da configuração pela qual obtêm-se os dados necessários para a elaboração da pesquisa, torna-se necessário traçar um modelo conceitual e operativo, que abrange a diagramação, a previsão de análise e interpretação de coleta de dados, o ambiente em que são coletados e as formas de controle das variáveis envolvidas. O delineamento da presente pesquisa define-se como estudo de caso, que “consiste no estudo profundo e exaustivo de um ou mais objetos, de maneira que permita seu amplo e detalhado conhecimento.” (GIL, 2010, p. 37). Desse modo, o estudo de caso é uma metodologia de pesquisa que objetiva analisar um fenômeno contemporâneo dentro de seu contexto.

2.2 Caracterização do local da pesquisa

A APAE de Ijuí é uma instituição filantrópica fundada em 1970, que acolhe pessoas com deficiência intelectual e transtornos no desenvolvimento. Atualmente atende 386 (trezentos e oitenta e seis) usuários, oriundos de Ijuí, Catuípe, Bozano e Coronel Barros, perfazendo 180 (cento e oitenta) alunos da Escola e 206 ( duzentos e seis) usuários da Clínica Interdisciplinar. A Escola de Educação Especial Recanto da Esperança atende as seguintes modalidades de ensino: Educação Infantil, Ensino Fundamental Incompleto e Educação de Jovens e Adultos, regida pelas leis federais e estaduais, e orientada pela Federação Nacional das Apaes. A Clínica Interdisciplinar da APAE Ijuí realiza atendimentos nas áreas de Medicina, Serviço Social, Fisioterapia, Fonoaudiologia, Odontologia, Psicologia, Psicopedagogia, Pedagogia, Terapia Ocupacional e Estimulação Precoce.

2.3 Tamanho da Amostra

A pesquisa é realizada com 19 (dezenove) profissionais que atendem na Clínica Interdisciplinar da APAE de Ijuí, e com 2 (dois) profissionais que atuam na Escola de Educação Especial Recanto da Esperança. A amostra define-se como intencional, onde o

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pesquisador se dirige à população/universo que deseja compreender. Os resultados têm validade para este grupo específico, ou seja, em um contexto específico.

2.4 Participantes do Estudo

Da área da saúde, comparecem os seguintes entrevistados : um médico neurologista, um clínico geral, dois terapeutas ocupacionais, quatro psicólogos, três fonoaudiólogas, três fisioterapeutas, uma psicopedagoga, duas assistentes sociais, uma odontóloga e uma pedagoga que atua na Estimulação Precoce. Da área de Educação Especial dois professores são entrevistados.

2.5 Critérios de Inclusão e Exclusão

Os profissionais são selecionados conforme os seguintes critérios:

1 Atendem na Clínica sujeitos com transtornos graves no desenvolvimento; 2 Atendem na Escola sujeitos com transtornos graves no desenvolvimento; 3 Buscam trabalhar de forma interdisciplinar;

4. Desejam participar da pesquisa através da entrevista.

Serão excluídos aqueles que:

1 Não atendem na Clínica ou na Escola;

2 Não atentem sujeitos com transtornos graves no desenvolvimento.

2.6 Plano de coleta de Dados

O plano para a coleta de dados dispõe-se através de pesquisa bibliográfica em teses, artigos, jornais, livros, análise de documentos históricos da instituição em questão e de seu Projeto Político Pedagógico (2011).

No que se refere à análise do estudo de caso da APAE de Ijuí: na primeira etapa ocorre a aplicação de entrevistas semi-estruturadas (áudio gravações) de caráter exploratório, com profissionais da Clínica Interdisciplinar da APAE de Ijuí e com professores da Escola de Educação Especial Recanto da Esperança (Conforme descrito em apêndice, p. 80). Para

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direcionar as entrevistas, abordam-se de três questões, com o objetivo de perscrutar as intervenções terapêuticas realizadas junto a sujeitos com transtornos graves no desenvolvimento.

Três perguntas são apresentadas à população examinada:

1) Que intervenções a sua área de formação propõe aos sujeitos com transtornos graves no desenvolvimento?

2) Qual a sua visão sobre o trabalho interdisciplinar?

3) Quais dificuldades você encontra para a construção de um trabalho interdisciplinar?

2.7 Plano de análise e interpretação dos dados

A interpretação dos dados é qualitativa, uma vez que os dados são analisados e descritos de forma estruturada e fundamentada. Minayo (2004) considera a entrevista semi-estruturada um instrumento que possibilita a coleta de informações objetivas, permitindo captar a subjetividade embutida em valores, atitudes e opiniões.

Para melhor compreensão do objeto de estudo, dedica-se a aproximação da realidade a partir do quadro referencial dos sujeitos do estudo, buscando compreender a repercursão das intervenções científicas sobre os processos humanos que se desdobram na APAE de Ijuí. A transcrição das entrevistas dirige-se por meio da leitura “flutuante”, que consiste numa leitura exaustiva e repetida dos depoimentos, em busca da identificação das categorias empíricas presentes nas falas, para, em seguida, realizar a “leitura transversal”, possibilitando a identificação dos temas centrais, por meio dos quais se procede o aprofundamento de cada categoria. Além da categorização e descrição das percepções, propõe-se uma discussão, com base no referencial teórico construído, integrando o mapeamento feito na observação sistemática com as percepções e grandezas coletadas nas entrevistas e variáveis, podendo vir, acompanhados de figuras, com recursos explicativos. Desta forma, as sistematizações das entrevistas multidis,ciplinares são transcritas, analisadas e relacionadas com as principais variáveis que caracterizam os desafios e as apostas relativas ao trabalho clínico e educacional destinado à sujeitos com transtornos graves no desenvolvimento.

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2.8 Aspectos Éticos

Este trabalho é realizado de acordo com as Diretrizes e Normas Regulamentadoras De Pesquisas Envolvendo Seres Humanos, segundo a Resolução do Conselho Nacional de Saúde (CNS) nº 466/2012, e foi submetida e aprovada pelo Comitê de Ética da Unijuí.

Esta pesquisa utiliza uma abordagem qualitativa, de natureza aplicada; sob o ponto de vista de seus objetivos, caracteriza-se como pesquisa explicativa. Quanto ao delineamento, classifica-se como um estudo de caso; como instrumento metodológico utiliza-se entrevistas semi-estruturadas, dirigidas à um grupo específico de profissionais da Clínica e da Escola da APAE de Ijuí. Objetiva-se reconhecer a incidência dos transtornos do desenvolvimento junto aos sujeitos que participam das propostas de trabalho da APAE de Ijuí, explorando intervenções que possam orientar o trabalho clínico e escolar para sujeitos com problematizações no desenvolvimento, de forma que o tratar incida vinculado ao educar, refletindo assim sobre os desafios e as propostas de trabalho terapêutico.

Têm-se o propósito de compartilhar a pesquisa com estudantes e profissionais das diferentes áreas que compõem a rede de saúde e a rede de educação para sujeitos com transtornos graves no desenvolvimento, fomentando propostas e dispositivos de trabalho terapêutico destinado ao sujeito em sua diversidade.

Participam da pesquisa os profissionais que trabalham com propostas multidisciplinares e realizam atendimento terapêutico na Clínica ou na Escola, delimita-se a pesquisa aos casos de sujeitos com transtornos graves no desenvolvimento. A partir deste critério, são elididos da pesquisa os profissionais que não realizam atendimento na Clínica ou na Escola e os que não tem experiência de atendimento junto aos sujeitos com graves entraves no desenvolvimento. A escolha é intencional, levando em conta o interesse dos profissionais em fomentar propostas de trabalho terapêutico. Aos participantes foi garantido o acompanhamento e o suporte na entrevista, bem como esclarecimentos adicionais de acordo com suas demandas durante o período de intervenção. Esclaresceu-se que a qualquer momento da realização desse estudo, qualquer participante teria a possibilidade de recusar-se a participar ou retirar-se da pesquisa, sem nenhum tipo de penalidade, constrangimento ou prejuízos aos mesmos. Foi-lhes garantido o anonimato, utilizando nomes fictícios/áreas de atuação nas descrições e o acesso aos dados restringido apenas ao pesquisador. A preocupação em não revelar a identidade dos participantes tem como intenção evitar qualquer tipo de constrangimento. Para isso a pesquisa assegurou, por meio do consentimento e anonimato, os

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procedimentos necessários para a participação dos sujeitos da amostra, sem a violação das informações e sem prejudicar as pessoas e a comunidade.

Aos participantes é assegurada a confidencialidade dos dados durante todo o processo. Foi-lhes fornecido uma cópia do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, assinado pelo autor e pela orientadora da pesquisa. A natureza das gravações, sua transcrição e a utilização das demais informações coletadas, são tratadas com o máximo de cuidado ético. O sigilo das informações está preservado através de adequada codificação dos instrumentos de coleta de dados. Todos os registros efetuados no decorrer desta investigação são usados para fins unicamente científicos, não sendo utilizados para qualquer fim comercial.

Estas informações são utilizadas única e exclusivamente para execução do presente projeto. As informações somente poderão ser divulgadas preservando o anonimato dos sujeitos e serão mantidas em poder do responsável pela pesquisa, o pesquisador Jacson Fantinelli dos Santos, por um período de 5 (cinco) anos. Após este período, os dados serão destruídos por meio de incineração, picote ou exclusão.

Os resultados são divulgados em tempo hábil. Quanto à instituição APAE de Ijuí está garantido o retorno dos dados obtidos durante o estudo.

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3. REFERENCIAL TEÓRICO

O referencial teórico consiste em uma revisão da literatura já existente, no que concerne ao embasamento teórico, tornando-se uma referência que permite o aprofundamento do estudo.

3.1 Memória das práticas de saúde e educação destinadas à doença e/ ou à deficiência mental em Ijuí-RS

A tentativa presente neste capítulo é a de reconstruir e sistematizar as práticas de saúde e sanções sobre a doença e/ou à deficiência mental, exercidas no município de Ijuí (RS), no período de colonização até a fundação da Associação dos Pais e Amigos dos Excepcionais- APAE de Ijuí, buscando aproximar a instituição que estruturalmente funda-se na escolarização, do movimento de construção de práticas em saúde mental. A abordagem se dá através de registros escritos: cartas, jornais, telegramas, relatos e textos produzidos pela históriografia local, que subsidiam a contextualização no que se refere aos comportamentos e modos de viver considerados diferentes daqueles comuns a normalidade e que frequentemente adquirem significado social quando interpretados no terreno da loucura.

A originalidade deste trabalho encontra-se na tentativa de retomar a história e as concepções de atenção às diferenças, referentes aos doentes mentais e aos deficientes mentais, retomando as práticas e intervenções que orientaram a atenção a esse público, ressaltando que no princípio não havia qualquer discriminação diagnóstica sobre a deficiência mental e a doença mental, justamente por se tratar de um município do interior, de porte médio, eminentemente rural durante os primeiros 80 anos de sua existência, com um perfil populacional multiétnico e que apresenta, por suposto, peculiaridades no atendimento e nas sanções sobre a loucura.

A historiografia sobre os tratamentos à saúde mental é escassa em Ijuí, especificamente no que diz respeito aos períodos de colonização e fundação do município, embora apenas a ausência desses estudos não seja suficiente para justificar o movimento da pesquisa. Neste capítulo será usado como orientação de pesquisa a tese de doutorado da

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enfermeira Véra Lúcia Miron: “Loucos, nervosos e esquisitos: memórias da loucura em Ijuí (RS), 1890-19901”, pretendendo contribuir para o entendimento da história das práticas de saúde mental e de atenção às diferenças no município de Ijuí. Ao dialogar com esta autora e estabelecer leituras sobre a construção dos trabalhos junto à APAE, busca-se articular a fundação desta Instituição aos movimentos estabelecidos neste município em direção à abordagem e ao tratamento da doença mental e/ou deficiência mental.

Miron (1998, p.50) refere que o nascimento de Ijuí situa-se em 1890, constituindo-se na última fronteira agrícola a ser ocupada e explorada no Estado do Rio Grande do Sul. O escasseamento de terras nas chamadas colônias velhas de Silveira Martins, Caxias do Sul e São Leopoldo, aliado à necessidade de defesa e proteção dos territórios fronteiriços no sul do país, levou o governo republicano a expandir essa área à colonização estrangeira.

A inexistência de estruturas que atendam a demanda de saúde mental neste município fez com que o recolhimento à cadeia, o encaminhamento ao hospício, o atendimento ambulatorial e no hospital geral fossem as possibilidades de atenção. Um traço que ganha destaque na fundação de Ijuí é a pluralidade étnica, ressaltada com distinção e hegemonia, em um discurso que apresenta as relações coloniais como harmoniosas e pacíficas, primando pela normalidade e higienização. Segundo o jornal Correio Serrano (1967):

O aumento do número de pessoas com sintomas de debilidade mental, também em nossa cidade, está a exigir providências dos responsáveis pela comunidade. Mensalmente têm se registrado casos de demência, sendo os doentes, na medida do possível, encaminhados ao Hospital São Pedro, em Porto Alegre, a fim de serem submetidos a tratamento psiquiátrico. Aquele nosocômio, entretanto, vê-se a braços com o problema da falta de acomodações. A média de doentes mentais recolhidos ao São Pedro, oscila entre 3.500 e 4.000 quando o hospital possui condições de comportar 1/3 desses números. A falta de transporte adequado e locomoção dos dementes é outro fator que agrava sensívelmente o angustiante problema. Apesar de embrionário, esboça-se um movimento que poderá ter âmbito regional, para a aquisição de uma ambulância que ficaria a disposição da Saúde Pública. Ressalta-se também que o Hospital São Pedro procura acolher débeis mentais que possuam chances de recuperação, naturalmente, após um tratamento especializado. Aliás, o Governo do Estado está planificando transformar alguns centros de tratamento em asilos para recuperação de doentes mentais. No município de Ijuí, a maioria dos desequilibrados procede da zona rural, com alto grau entre descendentes de famílias polonesas. 2

1MIRON, Véra Lúcia. Loucos, nervosos e esquisitos: memórias da loucura em Ijuí (RS), 1890-1990. Tese de doutorado apresentada à Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, da Universidade de São Paulo, 1998.

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Segundo Miron (1998) as pessoas encaminhadas ao Hospital São Pedro são agricultores, imigrantes, trabalhadores da terra, pequenos proprietários, domésticas, crianças epilépticas e/ou deficientes mentais, órfãos abandonados, deficientes físicos e idosos; a autora aponta uma variação na idade dos sujeitos encaminhados ao hospício: desde menores (8, 10, 12, 15 anos) até idosos (76 à 80 anos), a maioria dos pacientes encontrava-se em idade produtiva (18 à 55 anos), constatando-se assim, que todas as possibilidades de contenção da loucura acabam na internação no Hospital São Pedro, caracterizando a incurabilidade da doença e a impossibilidade de um tratamento que não seja abordado através da repressão, da força e da violência.

No decorrer da pesquisa, Miron (1998) transcreve fragmentos de cartas que fazem parte do prontuário de 38 (trinta e oito) pacientes, consultados junto ao Arquivo Público do Estado. Neste contexto, apresenta o caso de Carlos, um adolescente de 19 (dezenove) anos, oligofrênico e que sofre de epilepsia associada. Em seu prontuário consta que é um jovem calmo, incapaz de reagir de modo agressivo no ambiente hospitalar. A avaliação médica realizada em 10 de abril de 1940 relata:

Fisionomia sem vivacidade. Quando fala, emite uma voz de tonalidade aguda. Dada a atitude parada do paciente, sem mímica facial e sem gestos acompanhando o que diz, tem-se a impressão de um boneco falando. Entretanto é assim que Carlos é apresentado ao Hospital, pela autoridade municipal:

É portador o Snr. Joel P., residente neste município que segue para essa capital, em companhia do seu filho Carlos P., doente, necessitando hospitalizar-se. Foi esse doente que deu motivo a uma consulta que vos fiz, em virtude das instruções vossas anteriormente recebidas. Conforme vossa resposta, só poderão ser recebidos doentes cujo estado ofereça perigo ao meio. Não obstante vossas instruções, tomo a liberdade de recomendar esse doente, no sentido de que talvez possa o mesmo ser internado, por tratar-se de uma pessoa que há muitos anos se vem tratando, sem obter resultados satisfatórios. Agravando-se ultimamente o seu estado, com os repetidos ataques e constantes e violentas crises de perturbação mental, seus pais temem que de um momento para o outro se agravem e importem em grave perigo para a família ou estranhos, motivos que, como medida acautelatória, insistem pelo seu internamento. (MIRON, 1998, p.79)3.

Este caso coloca-se como molde de outros que Miron (1998) segue dissertando. Nesta perspectiva, constata-se a inabilidade quanto ao critério diagnóstico que sustenta a internação, bem como a restrita possibilidade de cuidado destinado a esses pacientes no município de Ijuí. Possivelmente entre esses sujeitos encontravam-se situações de transtornos

3 Carta encaminhada pelo prefeito Emílio Martins Buhrer ao Dr. Jacintho Godoy, diretor do Hospital São Pedro

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globais de desenvolvimento com problematizações orgânicas e/ou psíquicas, marcados em alguns casos por injunções subjetivas e/ou sociais.

A partir de 1965 a Medicina passa a assumir o controle sobre a loucura, no entanto, antes já havia uma participação, pois para realizar o encaminhamento desses sujeitos era necessário o atestado dos médicos locais. Esse sistema de encaminhamento é fortemente imbuído à herança coronelista. O prefeito busca relações com maiores instâncias de poder, recomendando pessoas anormais:

Prezado amigo Alberto Loffmann

Nesta data estou encaminhando ao Hospital São Pedro, por intermédio do portador deste, dois indivíduos anormais, nascidos e criados neste município e que até a presente data viveram assistidos por sua mãe viúva e sem recursos. Entretanto, face a sua avançada idade, 78 anos, não mais lhe é possível atendê-los. Tomei a liberdade de recomendar ao Sr. Wilson Pizutti, que se encontrasse dificuldades para internamento dos mesmos, que o procurasse aí na Capital, afim de prestar-lhe algum auxílio nesse sentido4.

Os registros encontrados para denominar as pessoas que passam por situações vinculadas ao campo dos distúrbios psíquicos são: louco, alienado, débil mental, demente, doente mental (MIRON, 1998, p.74). As mesmas expressões reproduzem-se nos depoimentos de familiares, policiais e profissionais de saúde entrevistados pela pesquisadora. Além dessas nominações, era comum o uso de expressões como: “sofrendo das faculdades mentais” e “atacado das faculdades mentais”. Ressalta-se que nesta época inexistia qualquer recurso de diagnóstico, avaliação e caracterização do que seria de ordem da doença mental, deficiência intelectual e outros transtornos no desenvolvimento, colocando-se a todos os “diferentes”, de forma generalizada, como loucos.

Segundo Miron (1998, p.74):

Há aqueles que “não tem mais volta”- loucos incuráveis; aqueles que “se extraviam”, “se perdem”- os nervosos que passam por situações transitórias de dificuldades e consequentemente perda da razão; aqueles que se portam de modo diferente, situando-se no terreno dos tipos estranhos- os esquisitos. Ainda que a Psiquiatria enquadre esses elementos em algum diagnóstico ou síndrome, na representação existente eles se diferenciam e recebem de modos diversos a atenção da sociedade, ainda que homogeneizados nos rótulos acima referidos. Ou melhor dizendo, a representação social que deles se faz é diversa, mas eles podem transitar pelos mesmos espaços: o Hospício, a Cadeia, o Hospital Geral. O que os diferencia então? Noções como agressividade, periculosidade, incurabilidade parecem balizar o campo em que as intervenções ocorrem. Outro limite é a possibilidade de diálogo com esses sujeitos, permitindo a negociação e a tolerância.

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A concepção de incurabilidade se coloca como pressuposto principal de uma Psiquiatria biológica que sentencia a doença mental como fator excludente. Afirmar o limite das terapêuticas determina a inserção em uma concepção de doença que encerra as possibilidade de cura e manutenção da qualidade de vida do sujeito, ignorando a criação de alternativas de tratamento para pessoas com transtornos psíquicos e/ou orgânicos.

As práticas relacionadas ao tratamento da “loucura” e a Medicina no município de Ijuí parecem ter uma relação de encaminhamento marginal – “às margens”- durante as décadas de 1890 à 1970. O médico detectava a loucura e determinava sua contenção no espaço próprio: o Hospício São Pedro em Porto Alegre; atestando que nesse momento a loucura não era incorporada, no nível local, como objeto de saber e prática contínua e sistematizada (MIRON, 1998, p.139).

Devido à estrutura restrita, as alternativas de tratamento da loucura reproduziam-se no âmbito da internação no hospício. Na dificuldade deste, ocupa-se a cadeia e na impossibilidade de qualquer um dos dois ocorre o isolamento no próprio domicílio. Práticas alternativas são utilizadas, incluindo a busca por curandeiros, espiritismo e hipnotizadores que possam dar alguma resposta à família sobre as “esquisitices” do paciente. Miron (1998, p. 187) retrata um caso que figura a inabilidade da família em destinar outro modo de existência da diferença que não seja a exclusão e a segregação:

[...] quando nós encontramos ela, ela tinha uma pecinha no fundo da casa, isolada da família, chaveada. Então, o motorista veio nos avisar dessa casa, dessa família que tinha essa pessoa que morava fechada nessa casa (...) acho que devia ser há uns 7, 8, 10 anos assim. (...) Então nós descobrimos aquela pessoa lá. Aí nós fomos lá, ela chaveada naquela casinha, a mãe dela uma pessoa muito boa, mas que achava que era melhor para a filha deixar lá. Toda cocoseada, toda xixi, ela não saía dali, né, ela ficava mais deitada. E era todo um problema de incontinência urinária, com uma fístula, então... Aí nós fomos visitando a Nilma, sempre visitando e ajudando também a mãe dela. Até que ela...5

Uma série de dificuldades se colocavam às famílias para manejar cuidados especializados de tratamento à pessoas que passam por situações vinculadas ao campo dos distúrbios psíquicos e/ou orgânicos. Desse modo, a questão do transporte aparece como central, especificamente até 1970. Anterioriormente, as condições de viagem até a capital apresentavam inúmeras dificuldades: as estradas eram muitas vezes intransitáveis e a

5 Essa paciente foi encontrada por volta de 1990, o que sugere que se trata de uma prática ainda em voga na

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necessidade de buscar socorro em lombo de burros, mulas e carros de bois, caracterizava a extrema carência de recursos de tratamento, o trem era o principal meio de transporte coletivo. Neste contexto, para realizar o transporte de pacientes ao Hospital Psiquiátrico São Pedro existiu um vagão que partia de Uruguaiana e recolhia dementes pelas cidades do interior, “segundo depoimentos colhidos tratava-se de um vagão com grades, acolchoado, em que os pacientes eram levados ao São Pedro.” (MIRON, 1998, p.122).

É nesse contexto de exclusão, internação e segregação que surgiram através do terceiro setor, as primeiras organizações filantrópicas: Associações de Familiares e Amigos dos Excepcionais (APAE) que se mostraram capazes de lançar um olhar diferenciado à saúde de pessoas com deficiência intelectual e/ou múltipla. Em 1954 foi criada no Estado de Guanabara a primeira APAE do Brasil. Surge então a APAE do Rio de Janeiro, imbuída em criar espaço educacional para o excepcional; estas instituições foram se instituindo nos municípios de Porto Alegre, Canoas, Esteio, São Leopoldo, Novo Hamburgo, Santa Cruz do Sul, Bento Gonçalves, Caxias do Sul, Bagé, Vernanópolis, Santa Maria, Santa Rosa, Passo Fundo, Bom Jesus, Vacaria, Erechim, Pelotas, Rio Grande, Uruguaiana e Livramento.

As práticas destinadas ao tratamento clínico da loucura em Ijuí estenderam-se aproximadamente de 1890 à 1970. Conforme a cidade se industrializava, novas técnicas chegam à colônia, modificando também o tratamento destinados à esses sujeitos; a progressão da Psiquiatria e da Neurologia acarretaram algumas mudanças nas concepções sobre a loucura, doença mental e a deficiência mental. Em 1967, o Rotary Club Ijuí, realizou um levantamento sobre a incidência de crianças excepcionais e constatou que a porcentagem atingia 2.73%, mobilizando assim a realização da captação de fundos e recursos para a estruturação de um trabalho que pudesse atender as demandas desse público no município. Essa mobilização foi nomeada Movimento Apaeano que é uma grande rede, constituída por pais, amigos, pessoas com deficiência, voluntários, profissionais e instituições parceiras- públicas e privadas- para a promoção e defesa dos direitos, cidadania e inclusão escolar e social. A APAE de Ijuí surgiu pelo interesse das famílias de Breno Pereira Gomes e Bruno Schmidt (Presidente do Rotary Club/Ijuí), conscientizados da necessidade de atendimento adequado às pessoas com deficiência neste município.

As primeiras atividades da APAE em Ijuí iniciaram-se na residência da Presidente Sônia Selma Gomes; contando com a participação da diretora e do Conselho Deliberativo foi instalado junto ao grupo Escolar Osvaldo Aranha, uma classe especial sob a responsabilidade

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da professora Elizabeth Trindade Ratzlaff, que possuía o curso de Educação Especial. Em seguida, dispondo do apoio do Rotary Club Ijuí e da Municipalidade, a professora Vera Regina Sartori foi cursar a especialização em Educação Especial na Secretaria de Educação do Estado (SEC). Após o término do curso Vera Regina Sartori desempenhou suas funções com classe especial na Escola Municipal Dona Leopoldina no Bairro Burtet, as duas classes especiais eram mantidas pelo Município e pelo Estado, mas a parte do material didático era fornecida pela APAE.

O Hospital São Pedro continuava acolhendo a todos que encaminhavam demandas de internação. É somente a partir de 1970, quando se inicia o programa de interiorização das ações de saúde mental da Secretaria Estadual de Saúde, que o número de vagas é restringido e começa a existir dificuldades de internação no referido Hospital. Com o suporte da Assistência Social inaugura-se o movimento de busca de familiares dos pacientes internados que não apresentam razões psiquiátricas para permanecerem no hospício (MIRON, 1998, p.125). Constata-se a desvinculação das ações da APAE com as da Secretaria Estadual de Saúde, considerando que o Movimento Apaeano é filantrópico e fundado na área da escolarização, neste primeiro momento distanciou-se das práticas de saúde.

No final de 1970 o Hospital Geral de Ijuí passa a internar pacientes psiquiátricos, havendo uma redução de encaminhamento ao hospício. Entretanto a cadeia também adquire um lugar de acolhida de loucos, como se verifica através de notícias publicadas em meios de comunicação da época (MIRON, 1998, p. 104):

O Sr. Álvaro C., residente no bairro São José, compareceu à Delegacia de Polícia sábado ultimo, solicitando providências com referência ao seu filho João F. C. que sofre de debilidade mental. Declarou o comunicante que naquele dia fora agredido pelo filho com uma pedrada e que em face de atitude agressiva do mesmo, temia novas agressões, razão pela qual solicitou que o mesmo fosse recolhido ao Presídio Municipal enquanto providenciava sua internação em Porto Alegre6.

Apesar do Movimento Apaeano estar se instaurando no município, essas ações ainda não se estendiam em toda a região. É nesse contexto que a APAE de Ijuí foi fundada; em 28 de Agosto 1970, na sala de sessões da Câmara Municipal de Vereadores de Ijuí, sob o patrocínio do Rotary Club de Ijuí, uma sociedade civil de caráter assistencial, sem finalidade lucrativa, com duração por prazo ilimitado, com sede e foro na mesma cidade. A Instituição funda-se no âmbito da educação, desvinculada inicialmente de ações de atenção à saúde,

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destinando educação às crianças com deficiência auditiva, deficiência mental, paralisia cerebral e outros tipos de deficiências.

A retrospectiva histórica da relação entre deficiência mental e escolarização possibilita esclarecer a origem de uma prática chamada Psiquiatria Educativa, localizada no século XIX. Constatam-se as tentativas de tratar as crianças “diferentes” ao lado de práticas asilares que as segregavam em situações que se caracterizavam como legítimos “depósitos humanos”. O médico discípulo de Pinel, Jean Itard, era especialista na educação de sujeitos com deficiência auditiva e de linguagem e dispunha-se a tratar crianças que eram categorizadas como “idiotas”- terminologia utilizada à classificação para todas as deficiências mentais. Itard aplicava-lhes o que era chamado na época de tratamento moral. Era moral, pois intervia sobre a educação do corpo, e não sobre a singularidade do sujeito (KUPFER, 2000, p.41).

No intuito de assegurar os direitos, estabelecer diretrizes e posicionar as ideologias filosóficas, sociais e comunitárias da Instituição, foi criado em 1972, o primeiro Estatuto da APAE de Ijuí, no mesmo ano em que foram doados 7.000 metros quadrados de área pela Prefeitura Municipal de Ijuí. Ainda sem sede própria, buscou-se apoio em outras instituições, esta demanda foi acolhida pela Fundação de Integração, Desenvolvimento e Educação do Noroeste do Estado (FIDENE), que a partir de 26 de setembro de 1973, realizou a cedência de uma sala de aula, então denominada: “Núcleo de Recuperação da APAE”, tendo como professora Mariele Leindecker, que iniciou o trabalho com 9 (nove) alunos; este convênio com a FIDENE foi mantido até o ano de 1976, quando a APAE iniciou a construção do prédio próprio, atendendo então a 25 (vinte e cinco) alunos. É pela via da escolarização que a Instituição ganha seu espaço dentro deste município; destacando-se pela construção de uma proposta de olhar diferenciado sobre as deficiências, inaugurando outra possibilidade de atenção à esta população.

Sobre esta temática Jerusalinsky (1997, p.91) propõe:

[...] a figura da escola vem a calhar porque a escola não é socialmente um depósito como o hospital psiquiátrico, a escola é um lugar para entrar e sair, é um lugar de trânsito. Além do mais, do ponto de vista da representação social, a escola é uma instituição normal da sociedade, por onde circula, em certa proporção, a normalidade social. Portanto alguém que frequenta a escola se sente geralmente mais reconhecido socialmente do que aquele que não frequenta. É assim que muitos de nossos psicóticos púberes ou adolescentes reclamam que querem ir à escola como seus irmãos, precisamente porque isso funcionaria para eles como um signo de reconhecimento de serem capazes de circular, numa certa proporção, pela norma social. E efetivamente isso acaba tendo um efeito terapêutico.

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Em 1974 o Rotary Club de Ijuí doou para a APAE os 4.000 metros quadrados de área frontal; como presidente o Sr. João Lemanski incentivou a construção do segundo bloco da planta da escola que foi doada pelos engenheiros Bruno Michaelsen e Paulo Schneider. Nesse ano, os atendimentos aconteciam em dois espaços, sendo um na Escola Dona Leopoldina e outro no Núcleo de Recuperação na FIDENE, contando com o trabalho das professoras Vera Regina Sartori e Marilene Leindecker, respectivamente:

[...] em uma sala cedida pela FIDENE, desde outubro de 1973, quando iniciou suas atividades, contando com 9 crianças, de graus diversos de excepcionalidade. Este ano a escola conta com o número de 22 crianças divididas em dois grupos, que foram avaliadas pelas suas deficiências e classificadas como deficientes mentais dependentes- 12 e deficientes mentais menos dependentes- 107.

A partir de 1974 a APAE de Ijuí iniciou o movimento de contratação de profissionais da saúde; um médico neurologista é agregado ao grupo de técnicos que prestam assistência às pessoas com deficiência atendidas pela instituição. Somente em 1993 que outras áreas foram integradas nas práticas de atendimento:

O primeiro pavilhão abriga um gabinete dentário, o setor de Fisioterapia e Fonoaudiologia e um gabinete para a Assistente Social8.

A expansão da infraestrutura da APAE é decisiva para a ampliação da demanda de atendimento às pessoas com deficiências. A construção da praça se coloca como uma inovação e progressão do cuidado às diferenças; criar um espaço de lazer aos sujeitos que até então estava excluídos das relações sociais coloca-se como parte de um processo de luta antimanicomial e inclusão social.

Retornando ao contexto das políticas de tratamento à doença mental e ao surgimento da APAE no município de Ijuí, pode-se afirmar que a estruturação de serviços de atenção à loucura fazem parte de um processo gradativo, marcado por conflitos, contradições e diferenças. A partir de 1970, a loucura passa a ser objeto de trabalho sistemático da Medicina local. Havia um atendimento prestado a partir da Secretaria de Saúde e do Meio Ambiente do Rio Grande do Sul (SSMA/RS) e estava vinculado à mudança na política do nível central estadual que busca alternativas para diminuir a população do Hospital São Pedro (MIRON, 1998, p.158).

7 APAE precisa deapoio para construção da sede própria. Correio Serrano, Ijuí, 1974. 8 APAE de Ijuí é destaque no Estado. Jornal da Manhã, Ijuí, 1993.

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