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UNIVERSIDADE REGIONAL DO NOROESTE DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL – UNIJUÍ VICE-REITORIA DE GRADUAÇÃO – VRG COORDENADORIA DE EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA – CEaD Coleção Educação a Distância

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VICE-REITORIA DE GRADUAÇÃO – VRG

COORDENADORIA DE EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA – CEaD

Coleção Educação a Distância

Série Livro-Texto

Ijuí, Rio Grande do Sul, Brasil 2008

Dejalma Cremonese

(2)

98700-000 - Ijuí - RS - Brasil Fone: (0__55) 3332-0217 Fax: (0__55) 3332-0216 E-mail: editora@unijui.edu.br www.editoraunijui.com.br

Editor: Gilmar Antonio Bedin

Editor-adjunto: Joel Corso

Capa: Elias Ricardo Schüssler

Designer Educacional: Liane Dal Molin Wissmann

Responsabilidade Editorial, Gráfica e Administrativa:

Editora Unijuí da Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul (Unijuí; Ijuí, RS, Brasil)

Catalogação na Publicação:

Biblioteca Universitária Mario Osorio Marques – Unijuí

C915t Cremonese, Dejalma.

Teoria política / Dejalma Cremonese. – Ijuí : Ed. Unijuí, 2008. – 220 p. – (Coleção educação a distância. Série li-vro-texto).

ISBN 978-85-7429-672-2

1. Política. 2. Estado. 3. Pensamento político. 4. Cida-dania. 5. Política brasileira. I. Título. II. Série.

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CONHECENDO O PROFESSOR... 7

INTRODUÇÃO... 9

UNIDADE 1 – O CONHECIMENTO É PRÓPRIO DO HOMEM...15

Seção 1.1 – O Homem, o Conhecimento e a Ideologia ...15

1.1.1. O conhecimento empírico ...17

1.1.2. O homem da palavra sagrada ...18

1.1.3. O homem do pensamento mitológico ...18

1.1.4. O mito nosso de cada dia ...19

1.1.5. O homem do pensamento filosófico ...21

Seção 1.2 – Visões sociais de mundo ...22

1.2.1. A ideologia e a utopia ...22

UNIDADE 2 – CONCEPÇÕES GERAIS SOBRE O ESTADO...27

Seção 2.1 – Etimologia da palavra Estado ...27

Seção 2.2 – Diferentes entendimentos sobre o Estado ...28

Seção 2.3 – Os elementos do Estado ...31

Seção 2.4 – O Estado e o poder ...35

Seção 2.5 – A função do Estado ...37

Seção 2.6 – Justificativas teóricas do Estado ...38

UNIDADE 3 – O PENSAMENTO POLÍTICO DAS SOCIEDADES PRIMITIVAS E ORIENTAIS...41

Seção 3.1 – O Estado primitivo ...41

Seção 3.2 – O Estado oriental ...43

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UNIDADE 4 – O PENSAMENTO POLÍTICO DA SOCIEDADE GREGA...59

Seção 4.1 – Os gregos: precursores da política e da democracia ...59

4.1.1. A etimologia da palavra política ...61

4.1.2. A origem do conceito democracia ...65

4.1.3. Uma democracia escravista ...70

Seção 4.2 – A origem da Filosofia na Grécia ...73

4.2.1. A Filosofia é “filha” da pólis ...73

4.2.2. Os pré-socráticos ...74

4.2.3. A contribuição dos sofistas na construção da política grega ...76

4.2.4. O método socrático ...78

4.2.5. Platão e a busca do Estado ideal ...80

4.5.6. A cidade como realidade perfeita em Aristóteles ...83

UNIDADE 5 – O PENSAMENTO POLÍTICO DA SOCIEDADE ROMANA...89

Seção 5.1 – A Política, o Direito e o Exército ...90

Seção 5.2 – Marco Túlio Cícero ...93

Seção 5.3 – Políbio ...94

UNIDADE 6 – O PENSAMENTO POLÍTICO DA IDADE MÉDIA...97

Seção 6.1 – O cristianismo primitivo ...98

Seção 6.2 – O fim do Império e a Idade Média ... 100

Seção 6.3 – Santo Agostinho ... 102

Seção 6.4 – O fim do pensamento medieval e o início do Renascimento ... 104

UNIDADE 7 – MAQUIAVEL E O PENSAMENTO POLÍTICO RENASCENTISTA ... 109

Seção 7.1 – Maquiavel: contexto histórico ... 110

Seção 7.2 – Estrategista da arte da guerra ... 113

Seção 7.3 – Fundador da Ciência Política Moderna ... 115

Seção 7.4 – A natureza humana ... 118

Seção 7.5 – A questão do Estado ... 121

Seção 7.6 – O estilo das obras de Maquiavel ... 122

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UNIDADE 8 – A DEFESA DAS IDÉIAS ABSOLUTISTAS... 127

Seção 8.1 – O Leviatã: o deus mortal de Thomas Hobbes ... 127

UNIDADE 9 – A DEFESA DAS IDÉIAS LIBERAIS... 141

Seção 9.1 – O liberalismo de Locke: o cidadão com direitos naturais ... 142

Seção 9.2 – O Estado democrático de Rousseau ... 147

Seção 9.3 – A democracia moderna: filha do Estado Liberal ... 149

Seção 9.4 – A sociedade civil e o Estado ... 152

Seção 9.5 – O direito à resistência: a tese de Hume ... 155

UNIDADE 10 – PARTICIPAÇÃO E INSTITUIÇÕES: O Debate da Teoria Democrática Contemporânea... 159

Seção 10.1 – Participacionistas e institucionalistas ... 159

Seção 10.2 – Participação na obra A Democracia na América de Aléxis de Tocqueville .... 162

UNIDADE 11 – A DIFÍCIL CONSTRUÇÃO DA CIDADANIA NO BRASIL... 169

Seção 11.1 – Brasil colonial: ausência de direitos e de poder público ... 171

11.1.1 A “conquista” da terra brasilis ... 171

11.1.2. A escravidão ... 172

11.1.3. O analfabetismo ... 175

Seção 11.2 – A Independência e a República no Brasil: participação incipiente ... 176

11.2.1. Um Estado sem nação ... 176

11.2.2. Uma República sem povo ... 179

Seção 11.3 – Os vícios das instituições e da cultura política brasileira ... 180

Seção 11.4 – Os direitos sociais emergem quando os direitos civis e políticos fenecem .. 184

UNIDADE 12 – VICISSITUDES DA POLÍTICA BRASILEIRA... 189

Seção 12.1 – O caso Renan e a degeneração da política ... 189

Seção 12.2 – Maquiavel: o “Old Nick” anda solto! ... 191

Seção 12.3 – (In) fidelidade partidária ... 192

Seção 12.4 – Reforma política: entraves e perspectivas ... 193

(6)

Seção 12.6 – O lulismo é maior que o petismo ... 197

Seção 12.7 – Para que reforma agrária? ... 199

Seção 12.8 – Os desafios da democracia na América Latina ... 200

Seção 12.9 – Mais Estado e menos mercado ... 202

Seção 12.10 – O caráter individualista e pouco solidário do brasileiro ... 204

Seção 12.11 – O Capital Social: um ingrediente a ser considerado ... 205

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curriculares: Ciência Política, Teoria Política, Teoria do Estado e Sociedade, Política e Cultura. O meu eixo de pesquisa está centrado nos temas da Democracia (teoria e processos democráticos), Cida-dania (participação e inclusão social), Cultura Política (Capital Social) e Desenvolvimento. Para maiores informações, disponibilizo

um si te na Inte rne t no se gui nte e nde re ço:

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O homem é, por natureza, “um animal social e político” (zoon politikon). “Aquele que não precisa dos outros homens, ou não pode resolver-se a ficar com eles, ou é um deus, ou é um bruto (selvagem)”, são afirmações atribuídas ao filósofo grego Aristóteles e encontram-se na obra A Política (2002). Também é lapidar, neste sentido, a afirmação da filósofa Hannah

Arendt, constante na obra A condição humana (1995, p. 31), enaltecendo o caráter social e

político do homem: “Nenhuma vida humana, nem mesmo a vida de um eremita em meio à natureza selvagem, é possível sem um mundo que, direta ou indiretamente, testemunhe a presença de outros seres humanos”. Essas citações ressaltam que nenhum de nós é uma ilha, que necessitamos e carecemos da presença do outro para a nossa realização e, mais ainda, toda ação do homem depende, inexoravelmente, da presença de outros.

Seguindo o pensamento de Aristóteles, não basta a convivência em sociedade para caracterizar nosso aspecto social e comunitário, pois desta forma também vivem as formigas e as abelhas. O que, então, pode nos diferenciar dos outros seres do mundo? Aristóteles

aponta para a conotação racional do homem, a utilização peculiar do pensamento (logos)

para a construção e transmissão do conhecimento. Adverte o filósofo que “todos os homens

têm o desejo de saber ”, pois só o homem conhece e tem consciência de si mesmo.1 Além do

aspecto racional, o homem diferencia-se dos demais seres pelo senso ético (bem e mal, certo e errado), senso estético (culto ao belo) e, o mais importante de todos, por viver na cidade (pólis), pela politicidade (vida cívica).

O homem foi feito, assim, para a vida da cidade (bios politikós, derivado de pólis, a comunidade política), ou seja, o fim último do homem é viver na pólis, onde se realiza como

cidadão (politai), manifestando a sua natureza, o termo de um processo de constituição de

sua essência, a sua natureza. Então, é próprio do homem não apenas viver em sociedade, mas viver na “politicidade”. A verdadeira vida humana deve almejar a organização política, que é uma forma superior e até oposta à simples vida do convívio social da casa (oikia) ou de comunidades mais complexas. A partir da compreensão da natureza do homem,

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dos aspectos da vida social adquirem um estatuto essencialmente político, tais como as noções de governo, de dominação, de liberdade, de igualdade, do que é comum, do que é próprio.

Por fim, é possível perceber que a reflexão de Aristóteles sobre a política não se separa da ética, pois a vida individual está imbricada na vida comunitária; esta é a razão pela qual os indivíduos se reúnem em cidades (e formam comunidades políticas), não apenas para viverem em comum, mas para viver “bem” ou para a “boa vida”. O fim da cidade, portanto, é não só assegurar aos cidadãos a vida e sua conservação (zein), mas o viver bem (euzein) (Prélot, 1973, Livro 1, p. 135). Deste modo, a vida política destina-se a garantir a qualidade e a perfeição da vida. Para que isso ocorra, é necessário que os cidadãos vivam o bem co-mum, em conjunto ou por intermédio dos seus governantes. Se acontecer o contrário (a busca apenas do interesse próprio), dá-se a degeneração do Estado.

Este livro-texto serve como uma introdução ao pensamento político ocidental. Preten-de ser um apanhado sobre os pensadores clássicos da Filosofia e da Ciência Política. Expõe, de forma sucinta, as teorias mais significativas sobre o tema em questão. Mesmo o leitor com pouco contato com este componente curricular verificará que muitas discussões ocorri-das, algumas há mais de dois mil anos, ainda contribuem muito para a compreensão da sociedade e do mundo contemporâneo. Isso porque fazemos parte da cultura ocidental. Carregamos, ainda, muito das civilizações passadas, principalmente dos gregos e romanos. Sem contar a contribuição de mais de dois mil anos de religião cristã sobre nós. Conheça, a seguir, um resumo sobre os assuntos que cada Unidade abordará.

A Unidade 1 trata da questão do homem e das diferentes formas de conhecimento:

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A Unidade 2 discorre sobre as concepções gerais do Estado. Neste capítulo você co-nhecerá a etimologia do termo e dos diferentes entendimentos sobre o Estado: seus elemen-tos, forma de poder, funções, além das relações de classes em seu interior. Há, também, uma rápida exposição sobre os quatro paradigmas que justificam o Estado. O capítulo é uma introdução às diversas teorias que justificam o Estado, dando ênfase à teoria contratualista, pois seus autores serão estudados em capítulos posteriores.

Na terceira Unidade você conhecerá um pouco mais sobre a organização política das

sociedades primitivas. Ela começa abordando uma teoria sobre o Estado primitivo, logo a seguir descreve o Estado oriental e o papel da teocracia, chegando às características do poder do Estado antigo. Importante destacar que a fundamentação teórica deste capítulo ampara-se, basicamente, nos argumentos das Lições sobre a Filosofia da História, do filósofo alemão G. W. Friedrich Hegel.

A Unidade 4 trata do pensamento político da sociedade grega clássica. Nele você

estudará a etimologia do termo política, além de conhecer uma melhor elucidação do

con-ceito de democracia. Por exemplo, a “democracia escravista” dos gregos. Também será

abor-dada a origem da Filosofia: pré-socráticos, Sócrates e os sofistas, Platão e Aristóteles. Esta Unidade deve ser bem compreendida para que se note a influência dessa civilização sobre o pensamento ocidental e, também, como os gregos influenciaram os romanos, tema da uni-dade seguinte.

A quinta unidade versa sobre o pensamento político da sociedade romana. Você

des-cobrirá que a idéia de que os romanos apenas assimilaram a cultura grega não se confirma. Os romanos, por exemplo, deram grande contribuição ao Direito moderno e à política mo-derna, por meio das teorias e idéias dos grandes pensadores. Você constatará ainda que com o declínio do Império Romano o Ocidente vê surgir o cristianismo primitivo.

A Unidade 6 tem por objetivo analisar o pensamento político da Idade Média, e a

grande influência da Igreja neste período, em todos os setores da vida. Nesta Unidade você conhecerá, também, um pouco do pensamento dos doutores da Igreja, principalmente

San-to Agostinho, e como o auSan-tor do livro Cidade de Deus e Cidade dos Homens aproveitou e

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do pensamento cristão, que só perderá influência no século 15, com as pesquisas experi-mentais, principalmente de Copérnico e Galileu, e conhecerá alguns pensadores do período renascentista.

Na Unidade seguinte o tema é o pensamento político no período renascentista. Você

compreenderá por que este período foi denominado de Renascimento, o que os pensadores da época buscavam e contra o que “se opuseram”. A Unidade também trata da teoria de um dos maiores pensadores políticos da História: Maquiavel. É por meio dessa leitura que você compreenderá por que a teoria política é dividida em antes e depois de Maquiavel. É impor-tante lembrar que Maquiavel viveu num período de reunificação dos Estados, e a ele tam-bém interessava a união da Itália, para que se tornasse um Estado forte.

A oitava Unidade aborda o Estado absolutista moderno. Basicamente é uma

exposi-ção sobre o maior teórico do Estado absolutista: Thomas Hobbes. A partir do estudo desta unidade você terá condições de definir o que é o estado de natureza para este pensador, por

que Hobbes é um contratualista, qual a sua justificativa para o Estado. Hobbes viveu num

período conturbado da Inglaterra, e sua preocupação maior era com a melhor forma de governo. O pensamento de Hobbes choca-se com a teoria liberal.

Na Unidade 9 você conhecerá os diferentes entendimentos sobre o liberalismo, quem

são seus maiores teóricos, quais as diferenças entre o pensamento de John Locke e de Rousseau. Por que esses pensadores, à semelhança de Hobbes, são chamados de

contratualistas, o que significa o estado de natureza para esses pensadores e o que enten-dem sobre sociedade civil. Note que o pensamento liberal é o que vai comandar a política moderna. Até hoje esses autores são referências para o Estado moderno. É a partir desta unidade que você perceberá a importância, por exemplo, do pensamento de Rousseau para os debates sobre participação popular, democracia e cidadania.

A Unidade 10 analisa as diferenças entre duas escolas de pensamento, referentes à

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A Unidade 11 aborda inicialmente abordando o tema da cidadania em relação ao nosso pais; como o tema da cidadania foi tratado nos diferentes períodos da história do Brasil. É realizado um percurso histórico desde o Brasil Colônia, passando pela Independên-cia e República até os dias atuais. Concluindo a Unidade você encontrará uma distinção entre direitos civis e direitos sociais.

A última Unidade traz um olhar crítico da política brasileira atual. Você acompanhará

o quadro político brasileiro, os políticos de hoje e seus comportamentos perante o país. Te-mas recorrentes, como ética na política, fidelidade partidária, reforma política, partidos, pre-sidente da República, reforma agrária, serão abordados. Enfim, temas que não saem dos noticiários. Assuntos que, pelo fato de estarmos habituados a eles – e, talvez, por isso mes-mo, pelo hábito –, não damos a devida atenção.

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O Homem, o Conhecimento e a Ideologia

Seção 1.1

O conhecimento é próprio do homem

Já Aristóteles (Metafísica, 1969, I, 980a 1-2) expressava que “todos os homens têm o

desejo natural de conhecer ”, que é próprio do homem a descoberta, e a curiosidade sobre as coisas faz com que o mesmo se realize no mundo. O homem, como ser-no-mundo, difere-se dos demais animais e das coisas pelo seu aspecto pensante: conhece e tem consciência de si

mesmo. Ao pensar ele desoculta, desvela o sentido das coisas, se aproxima da essência, do

âmago, do ser das coisas. Além de conhecer, o homem tem a capacidade de criar e inovar, por isso busca incansavelmente o novo, possibilitando o progresso com o avanço das ciências e das novas tecnologias. Ontem, o homem vivia isolado nas cavernas, sofrendo as mais variadas privações; hoje, vive organizado em sociedade, usufruindo comodidades, organiza-do politicamente, crianorganiza-do e inovanorganiza-do tecnologias. E mais, avanços na aviação e na informática fazem do homem um ser global: o mundo tornou-se uma pequena aldeia. Um exemplo disso é a rede mundial de computadores (Internet), que possibilitou a aproximação

entre as pessoas das mais variadas partes do mundo.1

É notório também que, com o passar do tempo, o homem foi acumulando conhecimen-to. Sabemos hoje muito mais do que os nossos antepassados sabiam graças ao espírito ino-vador do homem e ao seu espírito de conquista. Se o homem pensa, cria o conhecimento, quer dizer que é capaz de pensar por si mesmo, em síntese: que pode decidir o seu destino e os rumos da humanidade.

1 Este primeiro capítulo foi inspirado nas aulas do saudoso professor doutor Dom Edmundo Luís Kunz, quando tive a oportunidade de

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Pensar é buscar o âmago das coisas, é se apossar da essência do objeto, do ser (aquilo que há de mais profundo). Para os filóso-fos gregos o ser era denominado de logos,2 a alma das coisas, o

fundamento dos seres, o recolhimento do múltiplo na unidade.

Assim o homem desde o princípio se perguntou sobre as ori-gens das coisas: de onde vem tudo e qual o elemento comum que tudo constitui. Os gregos chamaram este princípio fundamental de arché, princípio imperante de onde tudo nasce ou de que tudo

vem a ser.3 Nem sempre, contudo, foi assim, pois houve épocas

em que a busca da explicação para a origem das coisas não se dava pela razão (logos). No princípio as explicações para as ques-tões naturais (mundo) e existenciais da vida humana se davam pelas idéias religiosas ou por narrativas mitológicas.

A passagem de um tipo de conhecimento para outro fez com que a imagem do homem também passasse por transformações (de uma mentalidade para outra). Essa mudança, entretanto, não se deu de uma hora para outra. Longos foram os períodos de trans-formações, e mais, sempre acompanhados por um processo inter-mitente de profunda crise. É uma mentalidade da humanidade (civilização) que termina e outra que começa a surgir. E, nesse momento, surge a crise, isto é, quando o homem perde o funda-mento sem ter ainda encontrado outro que o sustente. É nesse momento de transição que a crise se estabelece e leva o homem a se perguntar, assim como fez Santo Agostinho, logo após a que-da do Império Romano: “Quid sum ego” (Quem sou eu)? Esta questão leva o homem inexoravelmente a um novo paradigma, um novo ser cheio de esperanças, pronto a consolidar uma nova mentalidade, uma nova civilização.

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A seguir vamos estudar algumas dessas teorias e como elas se constituem.

1.1.1. O CONHECIMENTO EMPÍRICO

Sabemos que o conhecimento segue uma escada de diferentes degraus. O primeiro deles chama-se conhecimento empírico ou, também, conhecimento ordinário. Essa forma de conhecimento é proporcionada pela experiência ou o contato imediato de nossos sentidos (audição, visão, percepção) com os seres individuais da realidade do mundo, contato esse percebido e firmado pelo juízo e pela linguagem. Em síntese, o conhecimento empírico é aquele adquirido pelos indivíduos no dia-a-dia. É o acúmulo de conhecimentos adquiridos pelas práticas da vida, pela experiência da vida.

Por milhares de anos o ser humano se pautou por essa forma de conhecimento. O homem de outrora carecia de informações mais apuradas (conhecimento filosófico ou cien-tífico), por isso recorria à experiência dos mais velhos para solucionar questões de ordem natural ou existencial. Dentro da comunidade os homens mais velhos detinham o saber, sendo por isso mesmo respeitados e valorizados. Por essa razão hoje costumamos dizer: “vi-vendo e aprendendo”, “Fulano ou Beltrano é um homem de experiência”, “a experiência é a mestra da vida”, o que caracteriza esta forma de conhecimento.

O conhecimento empírico apresenta algumas características que lhe são próprias.

Ini-cialmente, é um conhecimento acima de tudo pragmático: brota das necessidades e dos

inte-resses da vida; conhecemos aquilo de que temos necessidade para viver: conhecer para viver

e não conhecer por conhecer. Segundo, é um conhecimento individual – não universal – que

vale rigorosamente só para casos vividos. Por exemplo: se uma determinada erva “curou” as dores de fígado ou estômago de Maria ou Pedro, não significa que os resultados sejam alcan-çados de maneira geral e universal e possam curar os males hepáticos e estomacais de toda a

humanidade. Terceiro, é um conhecimento trazido pela vida e não buscado

intencionalmen-te, como o conhecimento científico; por isso, é um conhecimento alógico, ametódico, desordenado, assistemático e acrítico. Por fim, pode-se afirmar que o conhecimento empírico

fundamenta-se no senso comum, que consiste na apreensão de certos princípios e verdades

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1.1.2. O HOMEM DA PALAVRA SAGRADA

O mistério sempre cercou o homem e o conhecimento empírico (da experiência da vida) não conseguiu responder às questões ligadas à origem e ao destino das coisas e da humani-dade. A grande questão era: qual é o sentido da vida humana e da natureza? É assim que surge o homem da palavra sagrada (homem religioso), aquele que recorre ao sobrenatural para explicar os fatos da vida, do cotidiano. No decorrer da História, a religião sempre teve um papel fundamental, pois ditou regras morais, estabeleceu juízos de valor (bem e mal), “salvou” e “condenou” os hereges, enfim, foi capaz de determinar o caminho a ser seguido, segundo os critérios das elites hierárquicas de cada instituição religiosa. Foi assim nas soci-edades primitivas com o comando dos sacerdotes (xamãs), da mesma forma nas socisoci-edades teocráticas orientais (povos da Babilônia), no Egito e no povo hebreu. O panteísmo antropomórfico dos gregos e romanos (deuses imortais) não deixava de influenciar e interfe-rir diretamente na vida dos homens (considerados mortais). Por fim, a Igreja Católica Apostó-lica Romana (cristianismo), bem como outras grandes religiões do mundo (hinduísmo, maoísmo, islamismo) cumprem fielmente a conotação da dominação e controle das mentes e corações de boa parte dos seres humanos. Diante disso questiona-se: Poderia o homem pres-cindir do aspecto sagrado? A fé advém do temor (medo)? Como podemos explicar tais fatos?

1.1.3. O HOMEM DO PENSAMENTO MITOLÓGICO

O mito não é apenas uma história fantasiosa, ou uma narração fictícia. O mito pode consistir em uma história que traz consigo um fundo de verdade, uma mensagem. Quase sempre é imbuída de um princípio de valor de cunho ético, cujo objetivo é reger e manter uma comunidade unida e organizada. O mito, nesse sentido, é buscado pela reflexão, para

chegar ao conhecimento.4 Platão empregou esse recurso na célebre passagem da República,

na alegoria da caverna, na qual o referido filósofo fez uma clara distinção entre o mundo sensível (mundo real) e o mundo inteligível (mundo ideal). Os gregos por muito tempo se utilizaram da prerrogativa mitológica, os mais eminentes dramaturgos foram Sófocles e Eurípedes, que escreveram Édipo rei, Sísifo, Prometeu acorrentado, entre outros.

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1.1.4. O MITO NOSSO DE CADA DIA

O mito é histórico.5 Resultado de uma criação coletiva da

própria sociedade, os homens, desde os primórdios, o têm utiliza-do para explicar o enigmático, o desconheciutiliza-do. O mito serviu e ainda serve para abrandar e acalmar os temores da existência humana. Ele traz consigo uma resposta e, também, uma espe-rança para os problemas da vida. Pode, no entanto, conduzir, ditar valores e comportamentos em uma sociedade. Assim, o mito não é mera ilusão ou fantasia, ele precisa ser examinado, desafi-ado e refletido. Só a reflexão pode explicar o mundo e entender a vida. Caso contrário, crenças e estereótipos, costumes e hábitos passarão a ser considerados naturais, aceitos e justificados como algo imutável ou incontestável.

Como veremos nos capítulos posteriores, a modernidade emergiu da superação do mito religioso medieval (razão teológi-ca) para o mito da razão instrumental. A razão desvelou e trans-formou o mundo. O homem passou da “idade das trevas” para a “idade das luzes”, do pensamento único para o pensamento di-verso, plural e múltiplo. A razão impulsionou o pensamento ci-entífico e, este, a técnica e o progresso.

O homem moderno acreditou que a ciência poderia resol-ver todos os problemas da humanidade. Tornou-se um mito a

salvação pela ciência e pela tecnologia.6 A promessa,

entretan-to, não pôde ser cumprida. O certo é que as conquistas moder-nas passam, em nossos dias, por um esgotamento e uma crise acentuada. O conceito de progresso passa a ser questionado na medida em que, por um lado, avançamos, e, por outro, pagamos

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um alto preço pelo consumo de boa parte dos recursos minerais e naturais, além da degra-dação do meio ambiente. Vive-se como se esta fosse a última geração a habitar o planeta Terra. O progresso fugiu do controle. A ciência que emancipou o homem pode destruí-lo a qualquer momento, o perigo nuclear é iminente. Além disso, o progresso veio para uma pequena parcela da população na medida em que cresce, a cada dia, o abismo entre ricos e pobres.

O mundo tornou-se uma “aldeia global” (comunidade única), graças às novas tecnologias da informática (Gonçalves; Gonçalves, 1995), no entanto os homens vêem-se cada vez mais isolados, fragmentados, órfãos de esperanças. Não se tem um projeto de “co-munidade” (projetos comuns). Vive-se, literalmente, em uma sociedade sem consenso. As soluções tendem a ser individualizadas (pessoas, instituições, países), como se o problema também fosse localizado e particularizado. Prevalece o individual em detrimento do

coleti-vo. Com o ceticismo em relação à ciência e ao progresso, o homem pós-moderno procura

preencher o vazio com novos mitos.

Apesar de todo o avanço dos últimos séculos, vê-se aumentar a angústia, a ansiedade e a insegurança, juntamente com inúmeras perguntas que carecem de respostas convincen-tes. Ninguém pode fugir do peso da própria existência humana. Para tentar preencher este vazio surge, a cada dia, uma nova droga, uma nova crença, seita religiosa, ou uma nova terapia que promete a “salvação” ou “solução” dos problemas espirituais e existenciais de uma forma rápida e segura.

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Ao comprar objetos e bens supérfluos, espera-se comprar a própria felicidade. Precisa-mos de uma nova roupa, um novo carro, uma nova casa. Quando não podePrecisa-mos consumir nos sentimos fracassados e inúteis. Paga-se caro pelo lazer, mas sem jamais descansar. O que importa é o hedonismo (prazer a qualquer custo), curtir a vida o máximo possível, pois

só temos o “hoje”, o amanhã é uma incógnita.7

Urge, então, a construção de um novo paradigma que restabeleça as relações entre os homens, com a natureza e com o próprio universo. Não uma razão mitológica, nem mesmo uma razão instrumental individualizada. É possível uma nova razão que se possa definir para além dos mitos e da instrumentalidade? O desafio está lançado.

1.1.5. O HOMEM DO PENSAMENTO FILOSÓFICO

Como vimos nas seções anteriores, no princípio a humanidade se amparou no conhe-cimento mitológico para explicar as origens das coisas. Aos poucos, no entanto, o homem evoluiu e com ele o nível de conhecimento: do conhecimento empírico para o conhecimento da palavra sagrada, juntamente com o conhecimento mitológico. Mais tarde surge o ho-mem do conhecimento filosófico que conheceremos agora, aquele que procura explicar os fatos com argumentos lógicos, utilizando a razão como princípio fundamental, procurando desvelar o ser alethéia (desocultação – desvelamento). Foi o filósofo grego Tales de Mileto quem primeiro buscou elementos racionais para explicar a realidade cósmica. Tales, assim como Pitágoras, Anaxímines, Anaximandro, integram o grupo de filósofos denominados de pré-socráticos, que procuravam explicar questões cosmológicas a partir dos elementos da natureza (água, fogo, ar, átomo).8

Surge, deste modo, o homem do pensamento filosófico, com características diferencia-das dos demais tipos de conhecimento. O homem racional (filosófico) tem, primeiro, uma visão da realidade a partir de si mesmo (autônoma), desvinculada do conhecimento

trans-7 “Vivemos presos ao imediato. À medida que o homem mais desconhece a razão de ser de sua vida, tanto mais ele se agarra às pequeninas

coisas do cotidiano. Tanto menos ele conhece o sentido de sua vida, e mais é tomado de uma angústia e paixão, que deixam a impressão de uma pressa de chegar sem que ele saiba onde” (Mendonça, 1991, p. 17).

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mitido pela tradição e baseada nas crenças e mitos; segundo, um

conhecimento que desoculta, desvela, busca a essência (arché);

terceiro, uma visão de totalidade (não parcial) que atinge a todos os homens e não a alguns em particular. Ou é uma verdade uni-versal ou não é verdade (assim pensavam e se defendiam do relativismo dos sofistas). O debate do conhecimento filosófico se fará presente nos capítulos subseqüentes deste trabalho. Por ora, ainda é pertinente discutir dois temas que integram as visões so-ciais de mundo dos nossos tempos: a questão da ideologia e da utopia.

Seção 1.2

Visões sociais de mundo

1.2.1. A IDEOLOGIA E A UTOPIA

De compreensão diversa e muitas vezes arbitrária e comple-xa, a palavra ideologia foi literalmente inventada por Destutt de Tracy em (1801) na obra Eléments d’Idéologie (Elementos de ideo-logia), e definida como “o estudo científico das idéias e as idéias são o resultado da interação entre o organismo vivo e a nature-za, o meio ambiente”, ou seja, uma parte da zoologia. Essa pri-meira definição foi classificada como empirista e científico-natu-ralista, isto é, positivista (Apud Löwy, 1998, p. 10).

Mais tarde o filósofo Karl Marx, na obra A ideologia alemã

(1846),retoma o termo, definindo-o, em sentido pejorativo, como

“ilusão ou falsa consciência”, correspondendo a interesses de clas-se. A ideologia se constitui, assim, como processo de inversão

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que apresenta o imaginário como se fosse um ente real, num

pro-cesso de coisificação do ser humano. A “falsa consciência” é a

estrutura reificada da qual se sobressai o pensamento burguês. O proletariado é contaminado por elementos da consciência bur-guesa reificada, tal como se evidencia em sua separação entre luta econômica e luta política (Apud McDonough, 1983, p. 53). É necessário, portanto, ultrapassar a falsa consciência para che-gar à consciência de classe.9 O difícil é “matar ” o pequeno

bur-guês que existe dentro de cada trabalhador, dentro de cada um de nós.

Ainda para Marx, “as idéias da classe dominante são em todas as épocas as idéias dominantes, isto é, a classe que é a força material dominante da sociedade é ao mesmo tempo a força

ideológica dominante” (Apud Hall, 1983, p. 64).

Na tradição da herança marxista, a ideologia designa o conjunto de concepções de mundo ligadas às classes sociais: “luta ideológica”, “ideologia revolucionária”, “formação ideológica” são exemplos de entendimento dos significados de ideologia. Por exemplo, para Lenin a ideologia estava vinculada aos interesses de classe, seja ela burguesa ou proletária (Löwy, 1998, p. 10).

Já para Gramsci a ideologia pode ser reduzida a “concep-ções de vida”, filosofias, concep“concep-ções de mundo, sistemas de pen-samento, formas de consciência e senso comum. Para o filósofo italiano a função da ideologia é aglutinar as classes: “A ideolo-gia contribui para ‘cimentar e unificar ’ o bloco social”. A ideo-logia é vista principalmente como “cimento” que aglutina a es-trutura (na qual a luta de classes tem lugar) e o domínio das superestruturas complexas (Hall, 1983, p. 71). Em outras

pala-9 A ideologia no sentido pejorativo esteve sempre ligada às idéias de que serviria para obscurecer a verdade e manipular as pessoas por meio

do engano. Neste sentido, a ideologia quase sempre leva à defesa do status quo (Outhwaite, W.; Bottomore, T., 1996, p. 371).

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vras, a ideologia, segundo Gramsci, é a acumulação de “conhecimentos” populares e as maneiras de ocupar-se com a vida cotidiana – o que ele chama de “senso comum” (Hall, 1983, p. 65).

Na concepção de Althusser (1987), outro pensador marxista, a ideologia está institucionalizada em aparelhos que servem diretamente aos interesses da classe dominante e da supremacia do Estado capitalista, os quais o autor chamou de Aparelhos Ideológicos de Estado (AIE). Esses aparelhos ou instituições se utilizam das idéias e da persuasão (arte do convencimento ou da famosa “cantada”) para alcançar os seus objetivos, isto é, produzir o consenso e o entendimento entre as classes sociais e legitimar a ordem existente. Podemos citar muitas instituições que são encarregadas pelo sistema de reproduzir as idéias domi-nantes, entre elas a família (hierarquia e disciplina); a escola (elitismo, individualismo e competição); a universidade (visão mercadológica do saber); os meios de comunicação soci-ais (MCS), dentre os qusoci-ais a televisão, o rádio, o jornal, as revistas (a propaganda, o consu-mo, o supérfluo, o culto à imagem, a sociedade do espetáculo, o efêmero, a mediocridade, a futilidade, o descartável; a religião: distorção do real e aprisionamento das mentes; o Direi-to: os tribunais, os sindicatos.). Além dos recursos da persuasão, Aparelhos Ideológicos de Estado (AIE), o poder dominante detém, ainda, o poder da coerção, da força e da violência. Essas instituições são chamadas de Aparelhos Repressivos de Estado (ARE), prestando, com seu aparato logístico e bélico, todo apoio necessário em caso de convulsão social. Pode-se citar as Forças Armadas (Exército, Marinha, Aeronáutica), bem como os diferentes tipos de polícia que existem para defender a propriedade privada ou os interesses dos poderosos ca-pitalistas.

Na obra Ideologia e utopia (1956) Mannheim segue a concepção de ideologia de

(25)

Diferentemente da ideologia, Mannheim entende utopia como aquela que define as representações, aspirações e imagens-de-desejo que se orientam na direção da ruptura da

ordem estabelecida e que exercem uma função subversiva (apud Löwy, 1998, p. 11).

Michael Löwy, na obra Ideologias e Ciências Sociais, assim diferencia as visões sociais de mundo:

Para Bourdieu, as diferentes classes sociais estão envolvidas numa luta propriamente simbólica para imporem a definição do mundo social conforme os seus interesses... As ideo-logias (...), produto coletivo e coletivamente apropriado, servem a interesses universais, co-muns ao conjunto do grupo (apud Corrêa, 1999, p. 28).

Pode-se dizer que a ideologia é o instrumento de manipulação das massas populares, objetivando a manutenção da ordem social vigente e que defende os interesses particulares de grupos e classes dominantes. Ou seja, a ideologia é a ocultação da realidade, ou, como destaca Warrat (apud Corrêa, 1999, p. 29), a ideologia é a coerção da persuasão.

Por fim, a palavra utopia vem da etimologia grega topos = lugar + eu/ou (em parte

alguma – espaço que não existe). Sem lugar, lugar inexistente, ainda não existente, mas

que pode vir a existir. Um exemplo de utopia é a obra de Thomas Morus intitulada A Utopia

(1516). Mais tarde, nos séculos 18 e 19 surgem outros filósofos utópicos: Charles Fourier, Saint-Simon, Etiénne Cabet. No século 20, para Mannheim e Bloch, a utopia passa a ser

Visões

sociais de

mundo

Utópicas

Ideológicas

Quando têm uma função crítica,

negativa, subversiva, quando

apontam para uma realidade ainda

não existente (Löwy, apud

Corrêa, 1999, p. 23).

(26)

vista como forças subversivas e transformadoras da ordem histó-rico-social existente (apud Corrêa, 1999, p. 30). Podemos citar

ainda os nomes de Bloch: O princípio da Esperança (Sonhos

diur-nos) e Huxley: Admirável Mundo Novo como exemplo de

pensa-dores utópicos. Para Löwy e Herkennhoff, a utopia é a represen-tação daquilo que não existe ainda, mas que poderá existir se o homem lutar para a sua concretização. Nesse sentido, a utopia é o grande motor das revoluções.

As seções desta Unidade discorreram sobre as diferentes

for-mas de conhecimento e as visões sociais de mundo. O

importan-te, ao concluir este estudo, é perceber como os valores e interes-ses desempenham funções-chave no ato de conhecer. Não esque-ça que é de fundamental importância a assimilação deste con-teúdo para a compreensão das Unidades subseqüentes.

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Concepções Gerais Sobre o Estado

Seção 2.1

Etimologia da palavra Estado

De pólis advém o conceito de política, que é a ciência/arte de governar a cidade. Para os romanos, a civitas ou res pública é cha-mada de status, que significa situação ou condição. E é na modernidade que o Estado surgirá como instituição, tal como o conhecemos atualmente. Assim como encontraremos diversas grafias para a palavra (em francês Estado será État, Staat para o alemão,

Stato para o italiano e Estado para o espanhol e para o português), também seu significado sofre alterações ao longo da História.

A definição etimológica de Estado feita por Dallari (1995, p. 43) é que a palavra tem origem latina, status, que significa estar firme, denotando situação permanente de convivência e

li-gada à sociedade política, aparecendo pela primeira vez em O

Príncipe, de Maquiavel, escrito em 1513. O conceito de Estado, portanto, na forma que entendemos hoje, é recente, uma defini-ção moderna. Nem sempre o Estado, do modo que o conhecemos hoje, existiu. Foi apenas no início da Idade Moderna (séculos 16-17) que ele se tornou uma realidade. França, Inglaterra,

Espanha e Portugal foram os primeiros Estados a se unificarem.1

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Maquiavel, na obra O Príncipe (1513), inicia a discussão teórica sobre o Estado: “Todos os Estados, todos os governos que tive-ram e têm autoridade sobre os homens, fotive-ram e são ou repúblicas ou principados”.2 Isso não significa, entretanto, que antes da

for-mação do Estado moderno não existissem outras formas de go-verno e de poder. A partir das seções seguintes conheceremos mais sobre o assunto.

Seção 2.2

Diferentes entendimentos sobre o Estado

Entende-se o Estado como sendo um corpo de pessoas (uni-do por laços sociais) viven(uni-do em um determina(uni-do território, orga-nizado politicamente, estando subordinado à autoridade de um governo (poder jurídico e de coerção), capaz de garantir a sobe-rania e o bem comum.

Para Azambuja (1971), o Estado é uma sociedade que se constitui essencialmente de um grupo de indivíduos unidos e or-ganizados, permanentemente, para atingir um objetivo comum. Essa sociedade política é determinada por normas de Direito po-sitivo, é hierarquizada na forma de governantes e governados e tem como finalidade o bem público.

Esse Estado emerge na tentativa de superar o instinto na-tural do homem e instituir definitivamente a sociedade política. Na visão de Azambuja, o instinto social leva ao Estado, que a

2 Conferir a obra O Príncipe, de Maquiavel (1983), principalmente o Capítulo 1 De quantas espécies são os principados e de que modos

se adquirem.

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razão e a vontade criam e organizam (1971, p. 3).3 O Estado, então, é uma criação artificial

do homem. O homem, desde seu nascimento, encontra-se submetido à tutela do Estado. Mesmo contra a sua própria vontade o homem é obrigado a seguir os ditames do Estado, razão pela qual “da tutela do Estado o homem não se emancipa jamais” (p. 3). Se eventual-mente o homem transgredir as normas do Estado, ou não acatá-las, sofrerá as sanções de tal procedimento. O Estado impõe pesados impostos, obriga ao serviço militar (sacrificar a vida em uma guerra, “morrer pela pátria”), impõe a lei mesmo contra a vontade dos cidadãos: “O Estado aparece, assim, aos indivíduos e à sociedade, como um poder de mando, como gover-no e dominação. O aspecto coativo e a generalidade é que distinguem as gover-normas por ele editadas, suas decisões obrigam a todos os que habitam o seu território” (p. 5). Por fim, Azambuja sintetiza a sua noção de Estado como “a organização político-jurídica de uma sociedade para realizar o bem público, com governo próprio e território determinado”.

Os termos nação e Estado também são tratados por Euzébio Queiroz Lima (1957). Para este autor o “Estado é uma nação organizada”. O referido autor, ao iniciar sua obra, começa pela definição do termo nação, entendendo-o como um conceito vasto e como a mais complexa das formas por que as sociedades humanas se apresentam (1957, p. 2). O que antecede a nação é uma ordem civil, não existe nacionalidade onde não existir ordenamento civil. O conceito de nacionalidade, em Queiroz, fica subentendido nos con-ceitos apresentados pelo mesmo nas afirmações de outros escritores. Assim, Queiroz Lima cita H. Hauriou, que define o termo nação “como uma população fixada no solo, na qual um laço de parentesco espiritual desenvolve o pensamento da unidade do grupamento”. Cita, igualmente, o conceito de nação segundo o entendimento de Jellinek: “quando um grande número de homens adquire a consciência de que existe entre eles um conjunto de elementos comuns de civilização, e que esses elementos lhe são próprios (...). O conceito de nação é essencialmente subjetivo, é resultante de um certo estado de consciência” (1957, p. 4).

O conceito de Estado, em Queiroz Lima, está ligado diretamente com a organização política, em que as condições físicas, biológicas, psicológicas, econômicas, intelectuais, morais e jurídicas giram em torno de um governo que administra sob o poder de coação, de uma autoridade que provém do uso incontido da força. Queiroz Lima entende que o Estado está igualmente ligado ao Direito, ou melhor, o Estado está a serviço do Direito.

(30)

Outro autor a definir o Estado é Sahid Maluf (1995). Para eles, não existe uma definição única de Estado. Há vários auto-res que tratam do tema, cada um com uma concepção ou doutri-na diferente. Segundo Maluf, o “Estado é o órgão executor da soberania nacional (...) O Estado é apenas uma instituição naci-onal, um meio destinado à realização dos fins da comunidade nacional...” (1995, p. 11). Ainda conforme Maluf (p. 19-22), o Estado é entendido ainda como a sociedade política necessária, dotada de um governo soberano, a exercer seu poder sobre uma população, dentro de um território bem definido, onde cria, exe-cuta e aplica seu ordenamento jurídico, visando ao bem comum.

Já para José Geraldo Filomeno (1997), o Estado é um tipo especial de sociedade, sendo fundamental analisá-lo nos aspec-tos sociológico, político e jurídico. Com vistas a explicar sua ori-gem, estrutura, evolução, fundamentos e fins, explicita: “o Esta-do é um ser social e, portanto único, embora complexo e não simples, em atenção aos diversos aspectos que apresente: método científico, método filosófico, método histórico e método jurídico” (Perez apud Filomeno, 1997, p. 17). O Estado deve estar a servi-ço do homem: o Estado “é mero instrumento para a realização do homem, tendo em vista sua fragilidade e impossibilidade de bas-tar-se a si mesmo” (p. 18).

Aderson Menezes (1996) ensina que o Estado é uma socie-dade de homens, fixada em território próprio e submetida a um governo que lhe é originário: “O Estado é uma pessoa

politica-mente organizada da nação em um país determinado”.

Michael Mann (1992, p. 167) define o Estado como sendo constituído de quatro elementos fundamentais: o Estado é um conjunto diferenciado de instituições e funcionários, expressan-do centralidade, no sentiexpressan-do de que as relações políticas se irradiam

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de um centro para cobrir uma área demarcada territorialmente, sobre a qual ele exerce o monopólio do estabelecimento de leis autoritariamente obrigatórias, sustentado pelo monopólio dos mei-os de violência física. Tal pmei-osição encontra sustentação a partir de uma visão mista, a qual foi referida originalmente por Max Weber. Parte-se do princípio de que o Estado é um conjunto de instituições decorrentes do desenvolvimento de desigualdades sociais quanto ao exercício do poder de decisão e mando. É clas-sicamente identificado com a idéia de soberano.

A idéia de Estado advém do desenvolvimento das formas de governo como resultante das diversas maneiras de dividir o poder entre governantes e governados. O Estado é um conjunto de insti-tuições especializadas em expressar um dado equilíbrio e uma condensação de forças favoráveis a um grupo e/ou uma classe soci-al. Ele assegura a unidade de qualquer sociedade dividida em inte-resses, particularmente de classes, mas também estamentais, pois garante o monopólio (centralizado ou descentralizado) do uso da força nas mãos do grupo, da classe ou do estamento dominante.

Para que o Estado funcione como tal, no entanto, é neces-sário um conjunto de elementos que lhe dê sustentação, os quais estudaremos na próxima seção.

Seção 2.3

Os elementos do Estado

Fazem parte do Estado, segundo a concepção de Azambuja (1971), três elementos fundamentais: uma população, um

territó-rio e um governo independente, ou quase, dos demais Estados.

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Cada elemento é essencial, “não pode existir Estado sem um de-les” (p. 18). Da mesma forma Azambuja define os conceitos povo e nação como sendo integrantes da população de um Estado. Povo é, segundo o autor, o grupo humano encarado na sua integralidade, numa ordem estatal determinada, é o conjunto de indivíduos sujeitos às mesmas leis. O elemento humano do Esta-do é sempre um povo, ainda que com ideais e aspirações diferen-tes. Já o conceito de nação é entendido como “indivíduos que se sentem unidos pela origem comum, pelos interesses comuns e, principalmente, por ideais e aspirações comuns” (p. 19). O povo é uma entidade jurídica, nação é uma entidade moral, é uma co-munidade de consciências unidas por um sentimento comum. O patriotismo é citado por Azambuja como exemplo. Os conceitos de raça, língua e religião são conceitos coadjuvantes, não cons-tituem a característica fundamental da nação, mas o que une um povo até constituir uma nação é a identidade de História e de tradição, em que o passado comum é condição indispensável para a formação nacional (p. 22).

Mancini, professor de Direito Internacional de Turim, em 1851, conceituou o termo nação da seguinte forma: “Nação é uma sociedade natural de um homem, na qual a unidade de ter-ritório de origem, de costumes, de língua e a comunhão de vida criará a consciência social” (apud Azambuja, 1971, p. 22).

Considerando ainda outros comentadores pode-se citar, de

forma resumida, quatro elementos do Estado.4

O primeiro elemento do Estado é a população. Ela

repre-senta a massa total dos indivíduos que vivem dentro dos limites territoriais de um país, incluindo os nacionais e os

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4 Para Maluf, os elementos que constituem o Estado são os materiais, compostos pela população e território; os elementos formais,

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nais. É importante que a população de um determinado Estado torne-se uma nação. Por nação entende-se o conjunto homogêneo de pessoas ligadas entre si por vínculos perma-nentes de sangue, idioma, religião, cultura e ideais – ou um grupo de indivíduos que se sentem unidos pela origem comum, pelos interesses comuns e, principalmente, por ideais e aspirações comuns.

Existem exemplos de nações que não constituem um Estado: na Espanha, catalães (Catalunha); os judeus até 1948 não haviam constituído um Estado; os bascos na França e Espanha e na Irlanda o IRA, procuram formar um Estado: os eslavos, sérvios, albaneses e croatas – Guerra da Bósnia (Bálcãs), gregos e turcos (Chipre), os curdos, muçulmanos (há no mundo cerca 1,3 bilhão de muçulmanos, que formam a maioria da população ou mino-rias significativas em quase 60 países. A Organização da Conferência Islâmica, que preten-de “assegurar o progresso e o bem-estar preten-de todos os muçulmanos do mundo”, tem 57 países – membros). Dessa forma é possível afirmar que não existe Estado sem nação, mas há mui-tas nações que não constituem propriamente um Estado.

O segundo elemento do Estado é o território. O território é a base física propriamente dita, o âmbito geográfico da nação, onde ocorre a validade da sua origem jurídica. Também não existe Estado sem território. Integram o território: o solo, o subsolo, o espaço aéreo, as embaixadas, os navios e aviões de uso comercial ou civil e o mar territorial (200 milhas, no caso brasileiro). Azambuja cita os judeus como um exemplo de povo que até há pouco tem-po era uma nação, mas não consistia ainda um Estado, tem-por faltar-lhe um território. Somen-te em 1948 formou-se o Estado de Israel. Da mesma forma os nômades e os ciganos, por exemplo, não constituem um Estado em função da falta de um território próprio.

O terceiro elemento é o governo. Por governo entendemos a instituição (de caráter

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Como formas de governo, podemos citar:

1) Unitário: governo centralizado, existente em mais de 50 Estados. A Grã-Bretanha é um exemplo de Estado unitário.

2) Estado Democrático/Federal: é quando o poder do governo é dividido entre um governo central e vários governos locais (divisão de poderes). Exemplo: Estados Unidos (e seus 50 Estados), Austrália, Canadá, México, Alemanha, Índia, Brasil.

3) Governos Confederados: que formam uma aliança de Estados independentes. O órgão central do Governo Confederado tem o poder de tomar decisões pelos demais. A Comu-nidade dos Estados Independentes, como os extintos em 1991 após a queda da União So-viética, é um exemplo de Confederação.

Podemos citar como sistemas de governo o presidencialista e o parlamentarista. O presidencialista está intimamente ligado à separação de poderes: Executivo, Legislativo e Judiciário (agindo de forma independente). O presidente é o chefe maior. Já no sistema parlamentarista o chefe maior é o primeiro ministro, o qual é escolhido pelo partido ma-joritário ou pela coalizão de partidos que fizeram maior número de assentos no Parla-mento.

Por fim, temos o último elemento do Estado, denominado de soberania. Por

sobera-nia entende-se, segundo Pinto (1975), “a capacidade de impor a vontade própria, em últi-ma instância, para a realização do direito justo”. Em outras palavras, a soberania signifi-ca autonomia, sem intervenções externas. A soberania é a forma suprema de poder: é o poder incontestável e incontrastável que o Estado tem de, dentro de seu território e sobre uma população, criar, executar e aplicar o seu ordenamento jurídico visando ao bem co-mum.

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Seção 2.4

O Estado e o poder

O Estado, sede do poder, torna-se palco de lutas políticas. Pelo fato de aqueles que estão no poder gozarem de legitimidade, a oposição às vezes encontra-se na alternativa de aceitar os procedimentos autorizados pelo aparelho do Estado ou de se arriscar a uma prova de força.

É preciso ressaltar que nunca tivemos na História um Estado que interviesse tanto no cotidiano pessoal do indivíduo como na atualidade. Michael Mann (1992, p. 169) descreve que

...o Estado pode avaliar e taxar nossa renda e riqueza na fonte, sem o nosso consentimento ou o de nossos próximos ou parentes (o que o Estado, antes de 1850, nunca fora capaz de fazer); ele estoca e pode usar imediatamente uma maciça quantidade de informações sobre cada um de nós; pode fazer cumprir a sua vontade no mesmo dia em quase todos os lugares sob o seu domí-nio; sua influência sobre a economia global é enorme; ele até provê diretamente a subsistência da maioria de nós (via os empregos que oferece, as pensões previdenciárias, etc.).

O Estado atual penetra na vida cotidiana mais do que qualquer Estado histórico. Seu poder infra-estrutural cresceu enormemente. Não há um lugar para se esconder do alcance infra-estrutural do Estado moderno, conclui o autor. Pode-se levantar um questionamento a partir dessas afirmações: mas afinal, quem controla esses Estados? Mann afirma que é “uma elite estatal autônoma”.

Mann (p. 168-169) enumera duas características do poder do Estado. A primeira seria o poder despótico da elite estatal. O autor apresenta o exemplo do imperador chinês, que, como filho do Sol, “possuía” a totalidade da China e podia fazer o que desejasse com qual-quer indivíduo ou grupo dentro de seu domínio. O imperador romano, apenas um “deus” menor, adquiriu poderes que, em princípio, também eram ilimitados fora da área restrita de afazeres nominalmente controlada pelo Senado.

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Em contrapartida, o poder infra-estrutural – segunda característica do poder estatal – “é a capacidade do Estado de realmente penetrar a sociedade civil e de implantar logisticamente as decisões políticas por todo o seu domínio” (1992, p. 168-169). A existên-cia do Estado, que fundamenta a legitimidade e garante a continuidade do poder, é também a condição para que se possa afirmar a superioridade da competência dos governantes.

Com o surgimento da propriedade individual, nasce a divisão do trabalho, a sociedade se divide em classes, como a dos proprietários e a dos que nada têm. Dessa divisão nasce o poder político, o Estado, cuja função é essencialmente a de manter o domínio de uma classe sobre outra, recorrendo, inclusive, à força e, assim, a de impedir que a sociedade dividida em classes se transforme num estado de permanente anarquia. Mann apresenta três formas de poder: o econômico – os que detêm a riqueza; o ideológico – os que se apossam do saber, e o político – os que têm a força.

O poder econômico é aquele que se vale da posse de certos bens, necessários ou perce-bidos como tais, numa situação de escassez, para induzir os que não os possuem a adota-rem uma certa conduta. Na posse dos meios de produção reside uma enorme fonte de poder por parte daqueles que os possuem contra os que não os detêm.

O poder ideológico é aquele que se vale da posse de certas formas de saber, doutrinas, co-nhecimentos, às vezes apenas de informações, ou de códigos de conduta, para exercer uma influên-cia sobre o comportamento alheio e induzir os membros do grupo a realizar ou não uma ação.

O poder político está ligado aos que detêm o poder de mandar ou comandar (uma minoria), enquanto que aos demais (maioria) cabe obedecer e seguir os ditames do grupo que governa.

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Seção 2.5

A função do Estado

Ao Estado compete manter o equilíbrio da sociedade de classes, atuando sempre e ga-rantindo sua reprodução enquanto tal, “filtrando” as contradições em seu interior, uma vez que para ele convergem as forças em choque. Só podemos entender um determinado tipo de Estado a partir da análise das classes que o compõem. Assim, o Estado goza de certa autono-mia. Ele tem a função de direção, que implica pensar a longo prazo. Como estudamos na seção anterior, as funções do Estado podem ser: a) técnico-econômica: tem por objetivo viabilizar o objeto econômico da(s) classe(s) dominante(s); b) função ideológica: de criar o consenso e, c) função política: manutenção do nível da luta de classes por meio da coerção.

Para Max Weber, por Estado se há de entender uma empresa institucional de caráter político, em que o aparelho administrativo leva adiante, em certa medida e com êxito, a pretensão do monopólio da legítima coerção física, visando ao cumprimento das leis (eco-nomia e sociedade).

Os objetivos da política são tantos quantas forem as metas a que se propõem os deten-tores do poder em um determinado momento. Logo, o Estado não pode ser definido pelos fins a que se propõe, mas pelos meios utilizados para a execução desses fins. O fim último da política é a manutenção da ordem pública nas relações internas e da integridade territorial em relação aos demais Estados.

O Estado legitimaria a divisão de classes sociais? Certamente. Esta foi a crítica feita por muitos autores das Ciências Sociais.

E por classes sociais entende-se, segundo Theotônio dos Santos (1991, p. 41), os agre-gados básicos de indivíduos numa sociedade, os quais se opõem entre si pelo papel que desempenham no processo produtivo do ponto de vista das relações que estabelecem entre

si nas organizações do trabalho e quanto à propriedade.5 As classes sociais compõem uma

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comunidade de interesses em oposição aos outros agregados sociais (da mesma formação social, ou sobreviventes de formações anteriores ou base de futuros agregados). Isto os faz tender a uma comunidade de:

a) consciência de classe: unidade de concepção de mundo e de sociedade segundo seus interesses gerais de classe, o que dá origem a uma ideologia;

b) situação social: formas de comportamentos, atitudes, valores, interesses imediatos, distri-buição de renda, ação e interesse político diante dos partidos e do Estado.

Como “classe dominante” podemos citar ainda a burguesia: industrial (indústrias), a financeira (bancos), a burguesia agrária (empresas rurais) e a burguesia comercial (lojistas e atacadistas). Como “classe dominada” temos o proletariado (dedicam-se ao trabalho ma-nual: operários, agregados, funcionários administrativos e não-manuais – trabalhadores automatizados). Existem ainda camadas intermediárias compostas por pequenos empresá-rios (prestação de serviços, alfaiates, taxistas, profissionais liberais). Por fim, existem as ca-madas excluídas (sacoleiros, catadores de papel, bóias-frias, camelôs).

Você já parou para refletir sobre como surgiu o Estado?

Seção 2.6

Justificativas teóricas do Estado

Através dos séculos historiadores e teóricos da política, entre outros, têm-se questio-nado sobre qual a possível origem do Estado, mas poucos chegaram a um consenso. O que temos é uma resposta aproximada, porém não-conclusiva sobre a sua origem. Vamos elencar as principais teorias que tentam responder a esta controversa questão.

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A primeira trata da Teoria da força. Esta teoria defende que o Estado nasceu da força, quando uma pessoa ou grupo contro-lou os demais (poucos submeteram muitos) o Estado surge com a luta de classes (visão marxista). Na concepção marxista o Esta-do defende os interesses daqueles que pertencem à classe Esta- domi-nante (donos do poder econômico). Para Marx o Estado é visto

como dominação de classe.6 Igualmente para Max Weber, o

Es-tado não se deixa definir a não ser pelo específico meio que lhe é peculiar, tal como é peculiar a todo outro agrupamento político, ou seja, o uso da coação física (Weber, 1999b, p. 56). Consiste em uma relação de dominação do homem sobre o homem, fundada no instrumento da violência legítima. Definição de Estado para Weber: “empresa institucional de caráter político onde o apare-lho administrativo leva avante, em certa medida e com êxito, a pretensão do monopólio da legítima coerção física, com vistas ao cumprimento das leis”.

A segunda teoria é a Teoria evolucionária. Segundo esta teoria o Estado desenvolveu-se naturalmente a partir da união de laços de parentesco, em que o mais forte (guerreiro mais hábil ou caçador e pescador ou o mais velho) detinha o controle do poder. Evolução do bando – clãs – tribos (caçadores e coletores nômades) até agricultores e pastores (nascimento do Estado).

A terceira teoria é chamada de Teoria do direito divino. Para os estudiosos que defendem esta teoria, o Estado nasceu na Eu-ropa, entre os séculos 15 e 18. Defendem que o Estado foi criado por Deus, e Deus delegou o poder divino de governar aos reis (despotismo esclarecido). Como exemplo da Teoria do direito di-vino temos as experiências dos governos absolutistas de Henrique VIII e Luís XIV.

6 Da mesma forma, para Pateman, “o Estado está inescapavelmente comprometido com a manutenção e reprodução das desigualdades

da vida cotidiana, enviesando decisões em favor de interesses particulares” (Apud Held, 1991, p. 149).

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Jean Bodin e Bossuet defendiam o poder divino dos reis para administrar o Estado. Afirma Bodin:

Nada havendo de maior sobre a Terra, depois de Deus, que os príncipes soberanos, e sendo por Ele estabelecidos como seus representantes para governarem os outros homens, é necessário lembrar-se de sua qualidade, a fim de respeitar-lhes e reverenciar-lhes a majestade com toda a obediência, a fim de sentir e falar deles com toda a honra, pois quem despreza seu príncipe soberano, despreza a Deus, de quem ele é a imagem na Terra (Bodin, apud Chevallier, 1986, p. 61).

Da mesma forma, para Bossuet, o rei é a própria presença de Deus na terra:

Considerai o príncipe em seu gabinete. Dali partem as ordens graças às quais procedem harmonicamente os magistrados e os capitães, os cidadãos e os soldados, as províncias e os exércitos, por mar e por terra. Eis a imagem de Deus que, assentado em seu trono no mais alto dos céus, governa a natureza inteira... Enfim, reuni tudo quanto dissemos de grande e augusto sobre a autoridade real. Vede um povo imenso reunido numa só pessoa, considerai esse poder sagrado, paternal e absoluto; considerai a razão secreta, que governa todo o corpo do Estado, encerrada numa só cabeça: vereis a imagem de Deus nos reis, e tereis idéia da majestade real (Bossuet, apud Chevallier, 1986, p. 97-98).

Em outras épocas da História Antiga tivemos, igualmente, a teocracia como forma de governo, como nos impérios egípcio, chinês, bem como entre os astecas e maias. Mais próxi-mo dos nossos tempos tem-se a experiência administrativa centralizada autocrática do Mikado experienciada no Japão até 1945.

Por fim, a Teoria do contrato social, a mais significativa das teorias da origem do Esta-do. O Estado nasce do contrato social. Nos séculos 17 e 18 os filósofos John Locke, Thomas Hobbes e Jean-Jacques Rousseau desenvolveram esta teoria. Do “Estado de natureza” para

o “Estado civil”,7 sobre os quais aprofundaremos nosso estudo nas Unidades 8 e 9.

Como você pode constatar, esta Unidade teve por objetivo conceituar o Estado. Por isso insistimos na análise do Estado (funções, poderes, forma de poder, relações de classe), e aborda-mos, também, as principais teorias que o justificam. Na próxima Unidade vamos conhecer o pensamento político das sociedades primitivas e também das sociedades orientais. Vamos lá?

7 As unidades 8 e 9 deste trabalho irão discorrer sobre a Teoria do contrato social. Para entender a evolução do Estado conferir,

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O Pensamento Político das Sociedades Primitivas e Orientais

Seção 3.1

O Estado primitivo

Ao analisarmos o Estado primitivo, convém lembrar a fragilidade de suas relações po-líticas, as quais eram muito diferentes daquelas que conhecemos na atualidade. Inicialmen-te é pertinenInicialmen-te definir alguns conceitos, como bando, tribo, caçadores e coletores, agriculto-res e pastoagriculto-res, que julgamos consistirem passos fundamentais para compreender a evolução

dessas sociedades até alcançarem o estágio final denominado Estado.1

Patrícia Crone (1992, p. 84) afirma que a primeira civilização da História, ainda em tempos remotos, foi produto da religião, isto é, as suas relações não estavam submetidas aos poderes de um chefe de ordem material, mas sim sob o domínio de uma imaginação detento-ra de autoridade suprema: “Quem detinha o poder edetento-ram os deuses, e não seus escdetento-ravos, que possuíam a terra”. Assim, as manifestações religiosas estavam ligadas essencialmente aos fenômenos da natureza, ou seja, tudo o que fosse misterioso, tudo o que o homem não entendesse, o inexplicável, era atribuído à força divina: o sol, as estrelas, a lua, o trovão, todos são exemplos de divindades da época.

Crone cita o bando como o primeiro estágio da evolução política da humanidade. No

bando, a organização é mínima; em contrapartida, a barbárie é uma constante. A tribo é considerada o segundo estágio dessa evolução, pois são sociedades ordenadas em

referên-1 Importante lembrar que o Estado, como nós o conhecemos na atualidade, é uma criação da modernidade (séculos 16 e 17). Alguns

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cia a parentesco, sexo e idade. Embora sendo um estágio superior ao bando, a tribo ainda não alcança uma organização capaz de estruturar a comunidade no aspecto social e econô-mico, nem mesmo no aspecto coercitivo: todos tomam as decisões ao mesmo tempo (1992, p. 84). Em conseqüência, há desunião, destruição e morte, pois “a atividade humana não pode ser coordenada em larga escala e a fissão é uma parte normal do processo político” (p. 82). Após iniciar pelo bando e chegar à condição de tribo, é necessário que a mesma seja destruída para que realmente ocorra a estruturação do Estado.

Os pioneiros, contudo, na elaboração e na estruturação de uma forma precária de Estado são os coletores e caçadores, que segundo a descrição de Gamble (1992), são socie-dades originárias da pré-História e formam as primeiras manifestações de poder objetivadas em uma comunidade humana. Com os coletores e caçadores temos a “sociedade de abun-dância original”, caracterizada por uma curta semana de trabalho e poucas preocupações, graças a uma despensa naturalmente bem abastecida, promovendo uma pequena popula-ção. Da mesma forma, os coletores e caçadores eram vistos como sábios econômicos, toman-do decisões perfeitamente sensatas, evitantoman-do o desperdício e, conseqüentemente, a crise e a fome em tempos de escassez. Atualmente os estudiosos os recordam como povos providentes e previdentes, são exemplos de bons administradores de recursos, guiados pelo princípio do menor esforço e da eficiência na conservação das calorias dos alimentos. Pode-se presumir, então, que o Estado não se iniciou com os coletores e caçadores, mas com os povos que começaram a cultivar a terra, os agricultores, e os pastores a cuidar dos rebanhos, daí a afirmação: “Os caçadores e coletores não constituíram os primeiros Estados, mas formavam os primeiros ‘caçadores’ de Estado”.

É possível perceber então as origens neolíticas como fases importantes, em que aparece a domesticação dos animais e plantas como fator central na transformação da sociedade em relação à estatitude final. Surge, então, a transição da selvageria para a parceria decorrente da revolução econômica e científica, oriundas das relações, primeiramente, dos caçadores e coletores, para a agricultura e pastoris. A partir do desenvolvimento da agricultura e de seu acúmulo, passa-se à criação de normas, direitos e deveres decorrentes dessa realidade.

Referências

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