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Capítulo 1 Sistema Estomatognático e Funções

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cap1. p.15-48.

Capítulo 1

Sistema Estomatognático e Funções

Cláudia Maria de Felício

Para que possamos intervir no desenvolvimento ou recuperação das funções do sistema estomatognático, é importante conhecermos quais são as estruturas envolvidas, como estas interagem e como se dá a coordenação entre as informações sensórias e o comportamento motor.

Os desvios miofuncionais que precedem e contribuem para o aparecimento de outras alterações, dentre elas, as ósseas e dentárias, ou que são decorrentes destas, deverão ser diagnosticados pelo fonoaudiológico, buscando compreender a origem de cada aspecto detectado e a relação com os demais.

Freqüentemente, o trabalho envolverá a recuperação dos desvios secundários, mas o peso de cada alteração deve ser dimensionado, bem como é preciso ter em mente que estes últimos podem caminhar para a normalidade a partir da ação sobre os fatores primários.

No texto que se segue, esses conceitos serão apresentados de forma integrada com aplicações práticas, a fim de facilitar a compreensão das propostas de prevenção, avaliação e terapia na área de motricidade oral.

Sucção

Comportamento

A sucção é aqui abordada por tratar-se de uma função primária do sistema estomatognático. A alimentação dos recém-nascidos humanos, bem como de outros mamíferos, se dá por meio da sucção. Assim, têm início os movimentos funcionais de lábio, mandíbula e língua, contudo, mesmo antes do nascimento, tais movimentos rítmicos já são realizados, como foi observado em fetos de 28 a 33 semanas de idade78.

A sucção é primariamente controlada por um gerador de padrão central, isto é, uma rede neural localizada na formação reticular221, de onde são enviados impulsos motores para a realização da função.

Como o gerador de padrão é influenciado por impulsos aferentes (Figura 1), podemos dizer que os estímulos provocados pela amamentação natural ou artificial, o tipo do bico, a quantidade de leite escoado fornecem informações sensórias diferenciadas que podem resultar também em comandos motores diferenciados. Isso sugere que os movimentos realizados para sugar quando a amamentação é natural, materna, não é semelhante àqueles realizados quando a amamentação é artificial.

Supõe-se também, a partir da análise do comportamento, que a sucção nutritiva (ingestão de alimentos) e a não-nutritiva (chupeta, dedo) envolvem dois padrões

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motores funcionalmente distintos com, presumivelmente, diferentes mecanismos de controle nervoso central80.

Ao ser amamentado no peito, o bebê exercita as estruturas envolvidas, estimula o crescimento ósseo, a superação do retrognatismo47 e o início da remodelação das articulações temporomandibulares, que nesta fase são planas e não possuem eminência articular71, além de coordenar a sucção com as funções de respiração e deglutição.

A língua apresenta movimentos no sentido póstero-anterior e somente após o momento da sucção é que eleva o seu terço anterior em direção à porção mais anterior do palato duro116. Ela é volumosa em relação ao espaço da cavidade oral e sua posição entre os coxins gengivais permite uma postura adequada para a sucção.

O sulco longitudinal que se forma na língua durante a sucção é semelhante ao que se forma no adulto no ato da deglutição. Movimentos periféricos mais delicados dos lábios, que coincidem com a maturação da língua, são observados na medida em que a sucção vai sendo substituída por outras formas de alimentação97.

Contudo, alguns fatores como comprometimentos neurológicos do bebê, exposição ao álcool e aos narcóticos no ambiente intra-uterino e intubação orotraqueal do recém-nascido por longo tempo podem levar a uma desorganização do comportamento motor de sucção, isto é, fraqueza na sucção intra-oral, compressão reduzida pela mandíbula e movimentos arrítmicos que comprometem a função e a nutrição.

Principalmente nos casos em que se utiliza a sonda, a estimulação por meio da sucção não-nutritiva pode contribuir para a organização do padrão de sucção60, que deve ser realizada, de preferência, nos momentos em que a alimentação é fornecida, para que haja uma associação entre o ato de sugar e a obtenção de alimentos.

De acordo com Jacintho95, assim que se inicia a sucção não-nutritiva, cujo objetivo é estabelecer a coordenação entre sucção-respiração e deglutição, solicita-se a mudança da sonda orogástrica para a nasogástrica. Atingindo tal coordenação, será iniciada a estimulação da sucção nutritiva artificial e posteriormente a materna.

Nutritiva e Não-Nutritiva

Em muitos estudos têm sido destacados os efeitos benéficos da amamentação natural47, 29, dentre eles sobre o crescimento e desenvolvimento dos componentes do sistema estomatognático. Mas, torna-se importante apontarmos que não é apenas o tipo de amamentação que conta, mas sim o quanto esta se prolonga no tempo.

A sucção é uma forma apropriada para a obtenção de alimentos, enquanto o sistema não está preparado para a mastigação. Mas, como explicou Carvalho27, a erupção dos primeiros dentes sinaliza que a criança precisa começar a mastigar.

Geralmente, o prolongamento da alimentação por meio da sucção se dá pela utilização da mamadeira, a qual leva a maior tendência de hábitos de sucção não-nutritiva.

Serra-Negra, Pordeus e Rocha Jr.186 constataram que 86,1% das crianças que não apresentavam hábitos bucais deletérios foram amamentadas no seio por seis meses ou mais, enquanto as que não foram, ou receberam a amamentação materna apenas por um mês, apresentavam sete vezes mais hábitos. Ainda, 57,4% das crianças que usaram mamadeira por período superior a um ano, apresentavam hábitos deletérios.

Diretamente, estes fatores afetam a musculatura oral e perioral e a conformação óssea e dentária. A sucção de polegar e a interposição de língua podem movimentar os dentes e o osso alveolar para locais indesejáveis com relação ao processo de crescimento

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normal44. De acordo também com Serra-Negra et al.186, as crianças com hábitos deletérios apresentavam quatro vezes mais mordida cruzada posterior, 14 vezes mais mordida aberta anterior e 3,6 vezes mais sobressaliência do que aquelas sem hábitos.

Além disso, associada aos hábitos muitas vezes existe uma infantilização, favorecida pelos pais, que leva ao consumo preferencial de alimentos macios. Com isso, a função mastigatória não se torna efetiva, levando à hipofunção dos músculos elevadores da mandíbula e prejuízos no desenvolvimento e crescimento do sistema estomatognático, pela somatória de fatores mecânicos negativos e exercitação inadequada.

Embora os hábitos de sucção exerçam influências negativas desde idades precoces, a fase da dentição mista é bastante crítica, portanto é importante que os hábitos sejam interrompidos até o início desta.

Boni21 verificou que, após a remoção dos hábitos de sucção em crianças de 4 a 6 anos, ocorreu redução da mordida aberta anterior, reduções significativas nas medidas cefalométricas 1.NA (ângulo formado pela intersecção da linha NA e o longo eixo do incisivo superior), 1-NA (distância entre a linha NA e o longo eixo do incisivo superior), sobressaliência e aumento do ângulo interincisivo, no período estudado de 37 a 54 dias. No referido estudo foram realizadas sessões de orientação com os pais e as crianças pela fonoaudióloga, mas nenhum aparato mecânico foi utilizado para a remoção do hábito ou correção ortodôntica.

Como explicaram Enlow e Hans44, se os fatores deletérios extrínsecos forem removidos, o equilíbrio normal das relações intrínsecas funcionais trabalhará no sentido de um retorno maior ou menor à posição normal, de acordo com os limites anatômicos naturais do campo de crescimento.

Todavia, se os hábitos são mantidos, não somente serão necessárias medidas de orientação aos pais e crianças, como também tratamento ortodôntico e fonoaudiológico. Assim, a prevenção das má-oclusões inicia-se com a divulgação dos conceitos funcionais e de como estes atuam positivamente sobre o crescimento e desenvolvimento, bem como sobre as influências negativas, quando há disfunções intrínsecas ou provocadas por fatores extrínsecos.

Embora algumas unidades de saúde tenham equipes especializadas para a orientação de gestantes sobre o aleitamento materno, essa ação ainda é limitada a poucos locais. Seria necessário que as autoridades compreendessem o papel da amamentação na promoção de saúde e prevenção de doenças e assim favorecessem a existência e fortalecimento de equipes compostas por médicos, enfermeiros, fonoaudiólogos, cirurgiões-dentistas e outros profissionais.

Numa ação preventiva, além da sucção, o desenvolvimento de outros aspectos, incluindo a linguagem, poderia ser orientado. Por exemplo, mães que amamentam seus filhos assistindo televisão, dirigem-lhes menos o olhar, falam menos com estes, deixando então de realizar ações que estão no “seio” da construção e do desenvolvimento da linguagem e fala. Como escreveu Dussel41 “a cultura, assim como a língua materna, é mamada”.

Mastigação

No processo de maturação pós-natal, a ingestão de alimentos inicia-se com líquidos, passando a pastosos e posteriormente aos sólidos. Ao mesmo tempo, os

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Para que a mastigação possa ser realizada, alguns requisitos são necessários, tais como: aumento do volume intra-oral, irrompimento dos dentes, amadurecimento da neuromusculatura e remodelação das articulações temporomandibulares.

Além disso, fazendo parte do processo de crescimento e desenvolvimento do sistema estomatognático, a própria mastigação é estímulo para a sua continuidade e para a manutenção da saúde dos músculos, articulações e periodonto49, pela exercitação realizada e, ainda, porque é a partir da mastigação que grande parte dos nutrientes importantes para a constituição física são obtidos.

Quando o alimento é colocado na boca, a fim de prepará-lo para a deglutição, duas metas devem ser atingidas: a redução do tamanho das partículas88 e a lubrificação destas pela saliva168, que fazem parte do processo inicial de digestão, pela trituração e a ação

enzimática da saliva sobre o alimento100.

No processo de mastigação, o núcleo motor do trigêmio recebe impulsos provenientes do córtex cerebral, via tracto córtico bulbar, e ativa os músculos abaixadores da mandíbula, para que a boca se abra e ocorra a entrada do alimento. A partir disso, são ativados os músculos elevadores da mandíbula120, 196. Numa seqüência rítmica de abaixamento, elevação e lateralização da mandíbula, dá-se a mastigação, comandada por um gerador de padrão central, localizado no tronco cerebral120.

De acordo com Lund121, o gerador de padrão mastigatório possui dois

componentes, sendo um gerador de ritmo localizado na formação reticular bulbar medial, entre o núcleo motor do trigêmio e a oliva inferior e um gerador de disparo, que são neurônios pré-motores próximos ao núcleo do trigêmio, para os músculos elevadores e abaixadores da mandíbula.

O gerador de padrão rítmico pode ser guiado por impulsos descendentes dos centros superiores ou pelos impulsos provenientes de estímulos sensórios da periferia212. Dessa forma, a retroalimentação periférica tem um papel na modificação e coordenação da atividade mastigatória178. Informações provindas dos pressorreceptores periodontais e

receptores de áreas adjacentes aos dentes parecem contribuir para modificar a trajetória de movimento dos músculos da mandíbula.

Assim, o gerador de padrão central interage com a informação sensória, até que o padrão básico de atividade muscular esteja adaptado ao mundo real (Rosignol, Lund, Drew, 1988 apud Smith, Denny198). Isto é, o comando motor não acontece independentemente das condições periféricas, que incluem o tipo de alimento ingerido, a morfologia das estruturas orofaciais e a função da musculatura. A partir dessas informações é que, por exemplo, são determinados a força e os movimentos aplicados na mastigação.

Comportamento Mastigatório e Variações relacionadas aos Alimentos

O comportamento mastigatório pode ser dividido em quatro etapas88, que descreveremos a seguir:

 Mordida e estágio de transporte I: o alimento é mordido e levado da área incisal para a pós-canina, pela ação da língua, sendo que nesse momento os dentes encontram-se desocluídos;

 Trituração: reduz o tamanho das partículas e é concluída na deglutição terminal ou na fase de liberação (limpeza);

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 Estágio de transporte II: o alimento triturado é transportado distalmente pela língua através do pilar das fauces;

 Liberação: é um período para a coleta de pedaços de alimento que restaram no vestíbulo das bochechas, por meio de atividade da língua, acompanhada por movimentos faciais, labiais e movimentos irregulares da mandíbula, que são concluídos após uma ou mais deglutições88.

Dessa forma, diferentes estruturas encontram-se envolvidas na mastigação, como nervos trigêmio e facial, músculos elevadores da mandíbula, músculos supra e infra-hióideos, língua, lábios, músculo bucinador, dentes e periodonto, mandíbula, maxila e palato. Também a musculatura do pescoço, que define a postura da cabeça e lhe dá sustentação, participa dessa atividade. Detalhando cada uma das fases, poderemos compreender o papel de cada componente.

Na mordida, a abertura bucal é realizada de acordo com a dimensão do alimento, por exemplo, 28 mm para banana e 8 mm para biscoito88 e com a quantidade de

alimento que se deseja abocanhar.

A força aplicada na mordida correlaciona-se diretamente à dureza do alimento, cuja percepção depende diretamente das informações sensórias sobre a deformação provocada no alimento e a própria força de mordida139.

Para compreender melhor, sinta a diferença na força aplicada mordendo um biscoito crocante que se quebra com facilidade, um chocolate que ficou na geladeira e um pão amanhecido que apresenta propriedade elástica, como costumamos dizer: “parece borracha”. Cada uma dessas situações exigirá uma variação na força e até mesmo movimentos associados. Muitas vezes, em nossas refeições, não mordemos os alimentos, porque utilizamos talheres para cortá-los e levá-los à cavidade oral.

No estágio de transporte I, em que o alimento é levado para as faces oclusais posteriores, o músculo masseter apresenta baixos níveis de atividade, porque a redução do alimento não está ocorrendo, enquanto o músculo geniohióideo encontra-se ativo, devido à atividade da língua. A forma e consistência do alimento pode influenciá-lo, por exemplo, na ingestão de biscoito duro são observados múltiplos ciclos de estágio de transporte I. Na ingestão de sorvete ou alimentos semelhantes, o estágio de transporte I é seguido quase que imediatamente pelo estágio de transporte II, que leva o alimento para a faringe88, porque dispensam a trituração.

A trituração inicia-se após o estágio de transporte I, sendo que a força, os movimentos mastigatórios realizados e o tempo despendido podem ser afetados pelo tamanho, forma, dureza e viscosidade do alimento103. Pode, ainda, ser crítico para

determinar o padrão de trituração, a natureza fibrosa ou granulosa do alimento89.

Comparando a mastigação de diferentes tipos de alimentos, pesquisadores verificaram que a amplitude eletromiográfica (EMG) dos músculos elevadores da mandíbula aumenta de acordo com a dureza do alimento89, 203. Porém, a diferença de

atividade do músculo masseter tende a ser maior que a do temporal, de acordo com o aumento da dureza do alimento89, devido ao seu papel preponderante na trituração.

Explicando melhor, a atividade EMG registrada de um grupo de fibras musculares reflete o número e a freqüência de potencial de ação, que determinará a performance mecânica daquelas fibras (para uma dada condição de comprimento do músculo ou encurtamento da velocidade). Dependendo das condições sob as quais os sinais elétricos são registrados, as condições EMG dos músculos de fechamento mandibular podem refletir a força de mordida212.

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Durante a mastigação, de acordo com a diminuição das partículas e o amolecimento do alimento pela saliva, a atividade EMG cíclica dos músculos do fechamento mandibular geralmente decresce212.

A informação de consistência do alimento, que é transmitida ao sistema nervoso central, modifica também o padrão básico de movimentos203. Alimentos duros provocam amplos movimentos de lateralidade da mandíbula171.

Assim, a irregularidade que se observa de um ciclo mastigatório para o outro deve ser uma resposta à condição do alimento, isto é, o quanto este está triturado e lubrificado, pelo fato do comportamento ser modulado por impulsos sensórios da boca88. Tal irregularidade não significa incoordenação e sim movimentos diferenciados, durante o processo mastigatório.

Outros fatores também interferem na performance mastigatória: o padrão no qual o alimento é quebrado na boca; a área de contato dos dentes que determina a área disponível para cortar o alimento durante cada ciclo mastigatório; a quantidade de força disponível para cortar o alimento; os padrões de movimentos da mandíbula que determinam a velocidade e direção que as superfícies cortantes dos dentes se unem durante cada ciclo100.

As características físicas do alimento correlacionam-se diretamente com o número de triturações antes da deglutição, aumentando, por exemplo, na seguinte ordem: maçã sem casca, banana, maçã com casca e biscoito duro88.

Os movimentos rítmicos de trituração são interrompidos quando partículas residuais ainda estão presentes na cavidade oral, mas cujo tamanho permite que sejam agregadas sem trituração.

Dessa forma, no estágio de liberação, que é normal, o padrão de movimento é irregular e parece associado à coleta e agregação de partículas de alimentos para formar um bolo. A atividade dos músculos genioglosso e geniohióideo é intensa, enquanto a do masseter é fraca. Este estágio depende das características do alimento, dentre elas, peso e dureza, da lubrificação pela saliva e da estratégia intra-oral para lidar com o alimento, isto é, habilidade motora do músculo bucinador e principalmente da língua. Certos alimentos provocam estágios de liberação mais demorados que outros. Por exemplo, biscoitos duros em comparação com banana e maçã sem casca88, amendoins, coco,

cenoura em relação à pêra, mamão, melão, dentre outros. Na Figura 2 apresentamos um diagrama sobre o comportamento mastigatório, de acordo com o tipo de alimento.

Estruturas e Ações

Os papéis de algumas estruturas na mastigação foram mencionados na descrição do comportamento mastigatório. Pretendemos agora focalizá-los, ampliando certos detalhes, para facilitar a compreensão.

Ao pensarmos em mastigação, logo evocamos a participação dos dentes que é imprescindível no corte e trituração dos alimentos, portanto, a eficiência mastigatória depende do número de contatos oclusais. Quando estes estão reduzidos, ocorre uma diminuição da eficiência, pois geralmente não há compensação por meio do aumento do número de ciclos mastigatórios. Acrescenta-se, ainda, que dente sem função resulta em atrofia e perda de orientação das fibras do ligamento periodontal, inflamação gengival e perda óssea97. Freqüentemente, isso se deve à perda de dentes antagonistas, levando ao desuso dos dentes remanescentes e à sensibilidade dolorosa, que comprometerá ainda mais a mastigação.

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A mandíbula durante a mastigação realiza diversos movimentos com finalidades específicas: dobradiça para morder e esmagar, protrusão, retrusão e lateralidade para triturar o alimento. Quando os músculos elevadores são ativados, os abaixadores são desativados e vice-versa145.

Na abertura atuam os músculos pterigóideos laterais com contração bilateral simultânea, o digástrico e os infrahióideos que estabilizam o osso hióide para que os suprahióideos possam abaixar a mandíbula.

No fechamento rápido, como ocorre para morder um alimento, atuam principalmente os músculos temporais, enquanto no esmagamento temos a ação do pterigóideo medial e do masseter97.

Comandam a lateralização da mandíbula o músculo pterigóideo lateral e o temporal posterior. Isto é, o músculo temporal posterior ipsilateral move a mandíbula latero-dorsalmente no início da fase de fechamento e o contralateral acompanha o deslize lateromedial final na mesma fase203.

Considera-se como padrões normais movimentos de abertura dirigidos e inclinados para o lado de balanceio e movimentos de fechamento inclinados para o lado de trabalho, isto é, o lado da trituração171.

Uma pequena parte da atividade muscular é necessária para os movimentos básicos de abertura e fechamento, enquanto muita atividade adicional é requerida para vencer a resistência do alimento158.

Como salientou Thexton212, os movimentos utilizados na alimentação envolvem muito mais músculos do que aqueles limitadamente definidos como músculos da mastigação, inervados pelo nervo trigêmio; os músculos inervados pelo facial e hipoglosso são igualmente importantes, mesmo quando a deglutição não é considerada.

Os lábios podem selecionar os alimentos que devem ser ingeridos por meio da sensibilidade tátil e térmica e conduzi-los para a cavidade oral, por uma ação mecânica103. Durante a mastigação eles realizam o vedamento anterior da cavidade oral,

portanto, quanto maior o volume do alimento maior será o abaixamento mandibular e o esforço para manter os lábios selados.

De acordo com Takada et al.203, o músculo orbicular inferior apresenta aumento de atividade na fase de abaixamento mandibular, embora durante o fechamento e a intercuspidação dos dentes ainda apresente algum nível de atividade. Assim, a quantidade de atividade do músculo orbicular oral parece ser mais influenciada pelo tamanho e posição do alimento na cavidade bucal do que pela sua consistência.

No início do processo de ingestão, a língua posiciona-se no soalho da boca para receber o alimento, retraindo-se quando a mandíbula ainda está abaixada212. A seguir, muitas vezes, ela se eleva juntamente com a mandíbula para esmagar o alimento contra o palato.

Em seguida ao esmagamento, ou logo após a entrada do alimento na cavidade oral, leva-o para as faces oclusais que vão triturá-lo, isto é, para o lado de trabalho e deste fica mais rebaixada, enquanto a lateral do lado de balanceio está mais elevada, para evitar que o alimento passe do lado de trabalho para o de balanceio103. Alternando-se o lado de trabalho, essas posições também são alternadas. Durante a trituração, a retração da língua ocorre mais durante a elevação da mandíbula212.

Quando o bolo já se encontra mais triturado, a movimentação da mandíbula passa a ser predominantemente no plano vertical e a língua a acompanha, reduzindo a tortuosidade e tensão que assumira no início do processo, isto é, diminuindo-se a função dos músculos hioglosso e estiloglosso103.

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Movimentando-se, a língua mistura o alimento à saliva, separa as partes que já estão suficientemente trituradas e umedecidas para deglutir e, ao final, retira os restos alimentares que sobraram no vestíbulo49.

Os músculos extrínsecos da língua contribuem para o movimento como um todo, enquanto os intrínsecos, que conectam uma parte da língua a outra, determinam a sua forma e tamanho97. Os extrínsecos são o estiloglosso, palatoglosso, hioglosso e genioglosso. Os intrínsecos são os longitudinais superiores e inferiores, os transversais e os verticais.

A atividade motora da língua é comandada pelo núcleo hipoglosso. Esta pode ser afetada por impulsos aferentes das estruturas faciais e mandibulares. Por sua vez, impulsos aferentes da língua afetam os núcleos motores facial e do trigêmio103.

De maneira simplificada podemos pensar nas influências recíprocas entre os componentes orofaciais. Por um lado, ao mastigarmos, quando ocluímos os dentes, a língua é retraída para não sofrer ferimentos com os golpes mastigatórios. Por outro lado, a habilidade de movimentos da língua, para conduzir os alimentos durante a mastigação, influencia na ação dos músculos mandibulares e, portanto, nos movimentos mandibulares. Além disso, numa deglutição alterada, quando a língua projeta-se anteriormente, os lábios reagem exercendo uma maior contração.

As informações sobre tato, pressão e temperatura, relacionadas ao nervo lingual (fibras mecâno-sensitivas), também influenciam o ritmo mastigatório103.

O músculo bucinador na mastigação desempenha, juntamente com a língua, o papel de reconduzir para as faces oclusais e centro da cavidade oral o alimento que foi para o vestíbulo. Quando existe uma mordida cruzada, a curva de Wilson encontra-se alterada, conseqüentemente o alimento dirige-se mais para o vestíbulo e o músculo bucinador trabalha excessivamente40.

O palato duro por tratar-se de uma estrutura fixa e rígida, auxilia a língua no esmagamento do alimento. Além disso, seus receptores contribuem para a sensação de textura e temperatura103, compondo, juntamente com a sensação gustativa, o conjunto de informações que extraímos dos alimentos.

Diversos receptores orais localizados na língua, bochechas, periodonto, palato participam para informar as diferentes características de cada alimento. Quando apreciamos ou não certa comida, não necessariamente o fator determinante é o sabor.

Por exemplo, a castanha de caju e o amendoim são apreciados quando são crocantes, mas não murchos, mesmo que as outras propriedades permaneçam intactas. Até mesmo o valor afetivo conta, como acontece com comidas que nos lembram a infância ou algo prazeroso (Sobre sensibilidade gustativa ver Silva Netto192).

Mastigação e Morfologia Craniofacial

O crescimento, desenvolvimento e equilíbrio do sistema estomatognático dependem de vários fatores, dentre eles a hereditariedade e as funções.

A relação entre morfologia facial, o volume e a função dos músculos elevadores tem sido pesquisada por meio de estudos que envolvem correlações de medidas cefalométricas ou antropométricas com as medidas de espessura, medida do corte transversal dos músculos e a força por eles desenvolvida.

Os hábitos alimentares, como a ingestão preferencialmente de alimentos macios, têm preocupado diversos estudiosos, os quais indicam que este pode ser um dos fatores etiológicos de má-oclusão no ser humano contemporâneo.

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Pesquisa realizada com animais16 evidenciou que ratos alimentados com dieta dura, em comparação aos que receberam dieta macia, apresentaram maior largura maxilar e maior correlação entre o crescimento de diversas estruturas, como peso do músculo masseter, comprimento do côndilo e largura do arco maxilar, o que aponta para desvantagens no crescimento daqueles que ingeriram dieta macia. Além disso, como o côndilo da mandíbula resiste à força de mordida, em animais que ingeriram apenas dieta macia foi verificado que era menor e menos denso em comparação aos côndilos de animais tratados com dieta dura.

Assim, de acordo com Beecher e Corruccini16, a dissociação no tamanho de aspectos oclusais durante o crescimento, previamente notados em grupos de humanos com má-oclusão e atribuídos à mistura racial, aparentemente pode resultar de baixo estresse na mastigação devido à consistência macia da dieta.

As desvantagens no crescimento e desenvolvimento do esqueleto maxilofacial em ratos alimentados com dieta macia, comparados aos que tiverem dieta dura, têm sido confirmadas por outros pesquisadores217.

Numa outra pesquisa em que se comparou dois grupos humanos homogêneos geneticamente, sendo um que vivia na área rural e outro na urbana, verificou-se que o grupo rural apresentava maior força mastigatória, com crescimento facial maior e mais coordenado entre as diversas estruturas do sistema estomatognático, provavelmente em decorrência da ingestão de alimentos resistentes34.

A coordenação do crescimento é de suma importância, pois não basta que uma estrutura cresça, é preciso que isso ocorra de modo integrado com as demais, o que favorecerá o equilíbrio do sistema estomatognático. Este é um aspecto relevante, quando pensamos em fornecer estímulos, a fim de prevenir ou recuperar desordens músculo-ósseo-dentárias.

De acordo com Moyers e Carlson147, o crescimento facial é um processo que requer inter-relações morfogênicas íntimas entre todas as partes dos tecidos moles e duros que estão crescendo, modificando-se e funcionando.

Alimentos macios não promovem os desgastes naturais dos dentes e não fornecem estímulos suficientes para favorecer o crescimento das bases ósseas, isto é, da mandíbula do lado de balanceio e da maxila do lado de trabalho. Além disso, se a falta de desgastes naturais resultar em interferências oclusais poderá provocar mastigação unilateral196. Também, um único dente com sensibilidade dolorosa pode modificar o padrão mastigatório.

A mastigação unilateral crônica resulta em assimetria funcional da atividade dos músculos e dos movimentos mandibulares que podem tornar-se permanentes142.

Várias alterações morfológicas podem ser decorrentes de problemas na mastigação. Shuying189, analisando uma amostra de 10075 crianças de três a onze anos, constatou que 66,9% dos casos de mordida cruzada anterior múltipla tinham causas pós-natais, sendo que 31,1% eram decorrentes de mastigação insuficiente.

Tem sido verificado, também, que o tipo facial correlaciona-se com a força de mordida93 e com o volume dos músculos masseter e pterigóideo medial185, 68.

Apesar de existirem controvérsias, baixa força de mordida tem sido constatada em sujeitos com face-longa, tanto crianças93 como adultos167, enquanto sujeitos com

características faciais opostas, isto é, aqueles que apresentam menor inclinação do plano mandibular, menor ângulo goníaco e altura posterior da face maior em relação à altura anterior, apresentam alta força de mordida93, 167.

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depende do número de fibras musculares, pode indicar indiretamente sua capacidade de força68.

O volume do músculo masseter mostra-se correlacionado negativamente com o plano mandibular e o ângulo goníaco68. Sua espessura também relaciona-se negativamente com a altura anterior da face e positivamente com as larguras intergoníacas e bizigomática172. Isto é, sujeitos com o músculo masseter volumoso tendem a ter uma face mais curta e larga e apresentam maior força mastigatória que sujeitos com o músculo masseter delgado.

Assim, quando pensamos em crescimento e desenvolvimento, além dos fatores hereditários, devemos considerar os hábitos alimentares e outros que podem influenciar a atividade da musculatura.

Durante e após o crescimento, o tamanho e a forma da mandíbula são dependentes do vigor da mastigação97. Esta, por sua vez, é dependente do tipo de alimento consumido104, sendo que, aumentando a dureza e resistência do alimento, aumenta-se a atividade dos músculos de fechamento mandibular203.

Finalizando este item, destacamos que alterações nas condições do sistema estomatognático podem comprometer a mastigação, que acima de tudo, é uma maneira de ingerir e iniciar a digestão de componentes imprescindíveis para a nutrição do organismo. Portanto, como resultado de uma mastigação ineficiente, podem surgir distúrbios gastrointestinais e deficiências nutricionais.

Por exemplo, crianças com cáries e perdas dentárias precoces tendem a diminuir a mastigação e conseqüentemente a ingestão de alimentos que exigem corte e trituração. Pacientes com desordens temporomandibulares, devido às condições oclusais e, muitas vezes, dor, podem apresentar uma trituração insuficiente, o que os leva também a ingerir os alimentos mal triturados, ou a fazer uma opção por alimentos os quais exigem menor esforço mastigatório.

O mesmo acontece com usuários de próteses totais mal adaptadas, que além da referida dificuldade, queixam-se de diminuição da sensação gustativa, o que na verdade é o resultado da redução de informações sobre textura e temperatura, porque o palato duro está recoberto, bem como pela perda de ligamentos periodontais.

Deglutição

Fase Oral: controle sensório-motor

A deglutição é uma função complexa que atua para impelir o bolo alimentar para a faringe, tendo também a função de proteção das vias aéreas, tendo em vista que a respiração é interrompida por meio de uma delicada coordenação neuromuscular.

Realizamos deglutição de saliva e alimentos de diferentes consistências, envolvendo os seguintes mecanismos e estruturas: na fase oral da deglutição, o bolo alimentar é colocado na linha média entre a parte anterior da língua e o palato. A ação dos lábios é de vedamento anterior da cavidade oral22 e a atividade da musculatura perioral é muito limitada ou nula durante a deglutição normal, sendo a participação ativa da musculatura perioral um dos indicadores de desvios da deglutição normal130. Tais contrações, quando presentes, podem ser decorrentes de desequilíbrio neuromuscular, dentre eles da língua, ou de má-oclusão que impõe um impedimento mecânico para o selamento dos lábios.

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Os fatores que causam alterações na deglutição são vários e já foram amplamente discutidos em outros trabalhos 49, 128, 159, 160, 161.

Ainda na fase oral, os dentes entram em oclusão cêntrica pela ação dos músculos elevadores, principalmente na deglutição de sólidos, para que haja estabilidade da mandíbula e assim o complexo suprahióideo possa elevar o osso hióide.

A língua, então, se contrai contra o palato e por meio de seus movimentos ondulatórios, isto é, elevação maciça da parte anterior contra o palato duro pela contração do músculo milohióideo127, o bolo é impelido.

Cabe salientar que a ingestão preferencial de alimentos moles, que exigem pouca mastigação, não favorece o amadurecimento da função de deglutição, porque não ocorre o estímulo para que a língua se contraia a fim de não ser traumatizada pelas faces incisais ou oclusais durante a mordida e os golpes mastigatórios. Isto é, diminui-se a modulação da atividade do núcleo hipoglosso (motricidade da língua) pela oclusão dentária. Assim, não são efetuados os impulsos sensórios e os comandos motores que regulam os movimentos e o posicionamento. Além disso, toda atividade da língua na mastigação, como descrita anteriormente, estará reduzida.

Ao contrário, quando o alimento é duro e/ou seco exige maior força mastigatória e um número maior de ciclos, para que se torne suficientemente triturado e umedecido pela saliva e assim possa ser deglutido. Isso corresponde a uma importante exercitação de todos os componentes que participam da mastigação e da deglutição.

Como já mencionado, o tamanho e a lubrificação das partículas interferem na trituração e freqüência da deglutição. Em pesquisa na qual se variou o tamanho e a concentração de partículas de castanha do Pará colocadas numa porção de yogurte, constatou-se que, mesmo quando as partículas estavam suficientemente umedecidas para serem deglutidas, isto é, em baixa concentração, triturações exploratórias foram necessárias para avaliar o tamanho das partículas. Também, quando as partículas eram de tamanho apropriado para a deglutição, se a concentração fosse acima de 20%, a mastigação se fazia necessária para umedecer o alimento168. Portanto, é preciso que ambas as condições sejam atingidas, trituração e lubrificação, para que a deglutição ocorra normalmente.

Para Prinz e Lucas168, a detecção de partículas bastante reduzidas é realizada,

particularmente entre a parte anterior do dorso da língua e o palato duro adjacente. Isto confirma a importância dessa área em termos de informação sensória oral.

Fase Faríngea: neuromusculatura e disfunções

Na seqüência do processo de deglutição, o palato mole fecha a nasofaringe, o dorso da língua se deprime e o bolo desliza para a orofaringe210. Segue-se a elevação e anteriorização da laringe, protegendo as vias aéreas inferiores e aumentando a passagem do esôfago.

A fase faríngea da deglutição compreende dois mecanismos básicos, o propelente e o de válvula106. No mecanismo propelente, tendo como função empurrar o bolo para o esôfago, atuam os músculos superior, médio e inferior da faringe e a inervação é realizada pelos nervos vago e glossofaríngeo.

Pelo mecanismo de válvula são interrompidas as seguintes conexões, pelas respectivas ações neuromusculares:

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 Entre a faringe e a laringe: pela elevação da laringe, cujos músculos atuantes e respectivos nervos são: genioglosso (nervo hipoglosso), palatofaríngeo (nervo vago), salpingofaríngeo (nervo vago), estilofaríngeo (nervo glossofaríngeo);

 Entre a faringe e o esôfago: promovida pelos músculos constritor faríngeo inferior e músculo cricofaríngeo (menor parte do músculo constritor faríngeo)106.

Os movimentos envolvidos na fase faríngea podem variar, de acordo com o tipo de bolo a ser deglutido, por exemplo, ao ingerir maçã, na deglutição inicial, a do suco, o movimento da laringe é menor em comparação à deglutição posterior, a da polpa88.

Alimentos pouco rígidos podem ser deglutidos em partículas grandes, porque é menor o desconforto e distorção dos tecidos moles da faringe e do esôfago superior, produzido por alta pressão faríngea168.

Para muitos sujeitos, o aumento da dureza do alimento pode não provocar aumento no número de triturações a fim de reduzí-lo para que seja deglutido. Eles engolem partículas menos pulverizadas, mantendo o número de golpes mastigatórios e tempo de mastigação, sem também aplicar maior força do que aqueles que engolem partículas reduzidas89. Portanto, a ingestão de partículas grandes depende da tolerância individual168 e da eficiência mastigatória.

Em certos casos, nos quais julgamos ter o paciente uma alteração na deglutição, na verdade pode estar ocorrendo uma ineficiência na mastigação, o que resulta em esforço para deglutir partículas grandes e pouco umedecidas, desequilibrando a postura da cabeça e a ação dos músculos envolvidos. Portanto, é indicado que se observe a deglutição de substâncias com consistências variadas e que se analise a eficiência da trituração de alimentos sólidos.

Cabe mencionar que desordens na fase faríngea da deglutição podem resultar de falhas no mecanismo de válvula. A incoordenação na dissociação da cavidade nasal com a orofaringe resulta em refluxo nasofaríngeo. A disfunção do músculo cricofaríngeo, que normalmente deve se relaxar com a chegada do bolo a fim de que este passe para o esôfago, pode fazer com que o alimento retorne e seja aspirado. Em bebês, a pneumonia de repetição pode ser provocada por tais falhas no mecanismo de válvula da fase faríngea da deglutição, em decorrência de problemas neurológicos106.

A não elevação da laringe também pode resultar em aspiração. Perlman et al.164

verificaram que 71% dos sujeitos adultos com reduzida elevação do osso hióide na deglutição apresentavam aspiração. O movimento do osso hióide é crítico para o deslocamento anterior da laringe e abertura do esfincter cricofaríngeo. Também, o movimento anterior do hióide e aproximação da cartilagem tirohióide contribuem para o movimento horizontal da epiglote. A aspiração em adultos pode ter as seguintes causas: função desviada da epiglote, elevação reduzida do hióide, estase valecular, estase hipofaríngea difusa e atraso no início da fase faríngea.

Logemann et al.117 verificaram que a adição do sabor azedo (50% de suco de limão)

a um bolo líquido, favoreceu a melhora na velocidade e eficácia da fase orofaríngea da deglutição em sujeitos que sofriam de disfagia neurogênica moderada. De acordo com os autores, é possível que os resultados sejam decorrentes do impulso sensório aumentado ou diferenciado que é produzido pelo sabor azedo. Assim, tal sabor funcionaria como um alerta sensório pré-deglutição para o sistema nervoso.

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Uma outra função que exerce forte efeito sobre o sistema estomatognático é a respiração. Quando esta se dá pela via aérea nasal, propicia condições favoráveis para o crescimento e desenvolvimento dos tecidos duros e moles.

Porém, dois critérios básicos para o bem estar do ser humano, isto é, a boa aparência e a saúde, podem ser comprometidos se o padrão nasal não for possível99. Dentre os fatores que podem impedir ou dificultar a respiração nasal estão as obstruções nasais por rinites vasomotoras ou alérgicas, hipertrofia de adenóides e desvio de septo nasal.

A respiração bucal estabelece-se pela conjunção de uma passagem aérea reduzida, devido à predisposição anatômica e a obstrução das vias aéreas superiores. Assim, a função biológica primária da nasofaringe, que é prover a passagem ao fluxo de ar da cavidade nasal para a orofaringe e vias aéreas inferiores, não será realizada99.

Tem havido controvérsias quanto à definição objetiva do padrão respiratório. De acordo com Warren et al.219, considera-se obstrutivo para a passagem de ar o espaço aéreo menor que 0,4 cm2, observado por meio de telerradiografia.

Carvalho28 relatou que os respiradores estritamente bucais são raros. Mais freqüentes são os pacientes que não podem respirar livremente pelo nariz e realizam uma respiração mista, buco-nasal, que a autora denominou insuficientes respiradores

nasais.

A abertura anterior da cavidade oral não necessariamente significa respiração bucal. Se a língua oclui a cavidade oral ou ocorre o fechamento linguopalatal, o trajeto do ar está essencialmente fechado219. Isto é, além do vedamento labial, a cavidade oral pode ser vedada pelos contatos na porção média do dorso da língua com o palato duro e posteriormente da base da língua com o palato duro128.

Profissionais da saúde, dentre eles, otorrinolaringologistas, fonoaudiólogos e cirurgiões-dentistas têm se preocupado com as várias conseqüências negativas da respiração bucal e, com freqüência, as características morfofuncionais dos portadores desse tipo respiratório são estudadas e descritas.

Experimentos realizados com animais permitiram constatar os efeitos do impedimento da passagem do ar pela cavidade nasal. Um estudo muito importante foi o de Harvold et al.83 que compararam dois grupos de primatas (Macaca mulatta), sendo

que em um deles foi provocado o bloqueio nasal. Os animais do grupo com obstrução nasal desenvolveram algum tipo de má-oclusão, dependente do recrutamento de diferentes músculos para movimentos rítmicos ou para mudança na posição de mandíbula, língua e lábios. Aqueles que adquiriram uma postura baixa da mandíbula, apresentaram extrusão aumentada dos dentes, plano mandibular inclinado e ângulo goníaco mais aberto.

Schievano187 explicou que no respirador bucal ocorrem alterações musculares, funcionais, posturais, ósseas e comportamentais, em diferentes graus de severidade.

A resolução da respiração bucal e a eliminação ou minimização de suas conseqüências somente é possível por meio de uma equipe multiprofissional. Para isso, a compreensão dos fatores que produzem as alterações características dos respiradores bucais é fundamental, o que vai além da simples detecção das alterações.

Apresentaremos, a seguir, algumas diferenças entre os respiradores nasais e bucais, relacionadas aos comportamentos neuromusculares, e discutiremos as razões pelas quais ocorrem.

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Respiração nasal

O indivíduo respirador nasal mantém seus lábios selados e a mandíbula encontra-se na posição de repouso. A língua fica contida na cavidade bucal propriamente dita e, devido ao contato com o palato, realiza uma função expansora sobre a maxila, que equilibra-se com as forças restritivas do músculo bucinador.

A coluna cervical apresenta uma lordose fisiológica30 e a cabeça mantém-se ereta. Estas são condições favoráveis para que as informações sensórias provenientes da mucosa oral, dos músculos elevadores, cervicais, faciais e linguais e das articulações temporomandibulares realizem-se de modo adequado, propiciando respostas motoras também dentro de padrões de normalidade que favorecerão, se não existirem outros fatores intervenientes, o crescimento e desenvolvimento craniofacial.

Respiração bucal

O indivíduo respirador bucal, por não utilizar a cavidade nasal ou por fazê-lo de modo ineficiente pode apresentar atrofia das narinas. Também há mudanças na retroalimentação sensória e, conseqüentemente, na função da neuromusculatura craniofacial, que precede a adaptação morfológica do esqueleto craniano138.

Em primeiro lugar, os lábios deixam de cumprir o papel de vedar a cavidade oral anteriormente. Para a passagem do fluxo aéreo, a boca se abre, havendo separação dos lábios, o que implica uma diminuição de impulsos sensórios e, conseqüentemente, redução dos impulsos motores, o que torna o lábio superior hipotrófico e o inferior flácido (Figura 3). Quando alguma função ou mesmo a tentativa voluntária exige o selamento labial, ocorrerá a tensão do músculo mentoniano, que entra em ação para auxiliar a elevação do lábio inferior incompetente e, assim, promover o contato deste com o superior que encontra-se, muitas vezes, encurtado.

Ainda, para o vedamento haverá uma participação da parte lateral do orbicular dos lábios, resultando em depressão das comissuras labiais28.

Separados, os lábios deixam de exercer a ação de contenção dos arcos dentários e, geralmente, os dentes superiores tornam-se vestibularizados, o que dificultará ainda mais o selamento labial. Cabe lembrar que, em certos casos de mordida aberta esquelética, o lábio superior pode apresentar-se delgado, mas sem estar encurtado.

Para a passagem do ar pela cavidade oral, também será necessário o aumento do espaço funcional interoclusal, que é obtido pelo abaixamento mandibular e extensão da cabeça. Mas, esta extensão prejudicará o campo visual e, como compensação, haverá a flexão cervical30.

Estas mudanças sucessivas provocarão desequilíbrios nas funções estomatognáticas, incluindo a postura de repouso e, ainda, na coluna cervical. Dores cervicais e cefálicas poderão acontecer.

A língua, também, exercerá um papel na manutenção do trajeto do ar. Pela contração do músculo genioglosso, a base da língua é avançada, aumentando o espaço orofaríngeo e permitindo uma passagem de ar menos obstruída119.

Diretamente, ocorrerão mudanças na fisiologia dos músculos da língua, pois a postura preponderante passará a ser rebaixada e anteriorizada na cavidade oral, o que tende a modificar o padrão de realização das outras funções e poderá acarretar alterações dentárias e ósseas, de acordo com as várias pressões desequilibradas exercidas sobre tais

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estruturas, bem como pelo desequilíbrio compensatório que provocará em outros músculos.

Como já descrito, a função de deglutição exemplifica muito bem esta interação funcional (ou disfuncional) entre os músculos inervados pelo nervo hipoglosso e aqueles inervados pelo facial. Por exemplo, a participação ativa da musculatura perioral durante a deglutição é um indicador de que há um desvio nesta função130.

A falta de ação expansora da língua, que permite ao músculo bucinador uma ação sem oposição de forças, em parte pode ser responsável pela atresia de maxila, que é uma deficiência de crescimento muito comum em respiradores bucais.

O músculo bucinador pode ser hiperativo pelo efeito de hábitos de sucção, o que agrava muito o problema. Mas, mesmo quando sua atividade não está aumentada, a pressão desse músculo, juntamente com outros que são estirados e dirigidos mesialmente em relação à cavidade oral, quando a mandíbula se abaixa, pode ter um efeito restritivo no desenvolvimento da maxila, que é um osso bastante poroso e, portanto, mais facilmente remodelável.

Todos esses desvios levarão a mudanças na aparência do respirador bucal. De acordo com Aguilar3, a localização da obstrução respiratória determina tipos diferentes

de alterações, isto é, nos casos de obstrução alta, a tendência é provocar má-oclusão classe II e nas obstruções baixas, por exemplo, por hipertrofia de tonsilas, má-oclusão classe III.

Vários autores têm descrito alguns ou vários aspectos comuns aos respiradores bucais. A seguir serão apresentadas as características mais freqüentemente citadas da

síndrome do respirador bucal28, 30, 49, 99, 128, 129.

Características Físicas do Respirador Bucal

 Lábios entreabertos e ressecados  Língua abaixada e protruída

 Narinas atrésicas  Cavidade nasal com espaço reduzido  Edemas ao redor dos olhos  Pálpebras inclinadas para baixo  Postura de cabeça estendida  Coluna cervical flexionada

 Hipofunção dos músculos elevadores  Altura anterior da face aumentada  Ângulo goníaco mais aberto  Ângulo mandibular aumentado  Mordida aberta anterior  Má-oclusão Classe II ou III de Angle  Hiperplasia de gengivas  Hiperatividade do músculo Mentalis  Atresia de maxila  Freqüente mordida cruzada

 Assimetria torácica  Depressão submamária  Ombros anteriorizados  Compressão do tórax  Escápulas salientes  Hipercifose, hiperlordose Respiração Bucal e Morfologia Facial

A face com predomínio de crescimento vertical não necessariamente é a conseqüência de um padrão de respiração bucal. Quando se focaliza os casos de respiradores bucais, deve-se pensar na conjunção de fatores hereditários, ambientais e funcionais.

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predispõe à respiração bucal136. Por conseguinte, pode provocar grande desequilíbrio no crescimento das estruturas craniofaciais, como: atresia de maxila, mordida cruzada posterior e mordida aberta.

De acordo com Proffit e Fields169, embora nem todos os indivíduos que se tornam adultos com face-longa apresentem este padrão antes da puberdade, as crianças que têm esse padrão raramente crescem fora dele.

Como abordado anteriormente, a relação entre a morfologia da face e a musculatura elevadora da mandíbula tem sido investigada. Vamos, portanto, relacioná-las à respiração bucal.

Proffit e colaboradores constataram que adultos com face-longa apresentaram força oclusal equivalente à metade da verificada em sujeitos com proporções faciais normais170. Enquanto as crianças com face-longa apresentaram força igual à verificada em crianças com proporções faciais normais, sendo a força oclusal destas correspondente à dos adultos com face-longa169. De acordo com os autores, parece que por alguma razão as crianças que desenvolvem um padrão de face longa param de ganhar força nos músculos elevadores da mandíbula, enquanto as outras desenvolvem mais força de acordo com a maturidade.

Existem controvérsias se as forças musculares desempenham um papel na determinação da morfologia facial ou se refletem as vantagens mecânicas obtidas pelos músculos nos diferentes tipos faciais.

Corrucini, Henderson e Kaul34 não encontraram associação entre força de mordida e respiração bucal. Para Ingervall, Thuer e Kuster93, o tipo facial associado à respiração bucal pode não ser devido à fraqueza da musculatura mastigatória, e sim causado, dentre outros fatores, pelo estiramento dos tecidos moles.

Contudo, é importante considerarmos que aquele que apresenta obstrução de vias aéreas superiores não pode manter a sua boca ocupada pelos alimentos por muito tempo, pois esta precisa ser utilizada para a passagem do ar. Resulta disso, muitas vezes, uma opção por alimentos que possam ser ingeridos rapidamente, isto é, que exigem pouca trituração para serem deglutidos. Com isso, os músculos elevadores da mandíbula desenvolverão pouca atividade.

Considerando-se as informações do item mastigação, desse capítulo, e associando-as à vivência clínica, podemos hipotetizar que, embora a força de mordida não possa ser diretamente relacionada ao tipo respiratório, a função mastigatória alterada do respirador bucal, que desenvolve pouca força de mordida, pode ser um fator contribuinte para as alterações morfofuncionais.

Devemos nos lembrar, ainda, que o processo mastigatório envolve informações sensórias provenientes da língua e exige desta uma movimentação refinada, o que favorece o amadurecimento de sua capacidade funcional, que é pré-requisito também para outras funções.

Estando a respiração alterada e, por conseguinte, o repouso fora da normalidade, outras funções como deglutição, mastigação e fala poderão ser alteradas.

Respirar é imprescindível, por isso poucas pessoas percebem que respirar mal possui inúmeras conseqüências negativas, das quais comentamos aqui apenas uma parcela. O respirador bucal é uma pessoa que precisa de ajuda para respirar bem, mas nem sempre ele e sua família, nos casos de crianças, compreendem a importância de uma ação conjunta de vários profissionais, que inclui o fonoaudiólogo atuando em motricidade oral. Cabe a todos nós, profissionais da saúde, esclarecê-los a esse respeito, quando o problema já está instalado e sobre as medidas preventivas que permitiriam evitá-lo.

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O objetivo neste capítulo inicial sobre as funções foi apresentar um referencial básico, norteador do nosso trabalho em motricidade oral. A seguir, daremos continuidade focalizando a fala.

Referências

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