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A ORGANIZAÇÃO PROSÓDICA DO YAATHE, A LÍNGUA DO POVO FULNI-Ô

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PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LETRAS E LINGUÍSTICA

FABIA PEREIRA DA SILVA

A ORGANIZAÇÃO PROSÓDICA DO YAATHE, A LÍNGUA DO POVO FULNI-Ô

(2)

A ORGANIZAÇÃO PROSÓDICA DO YAATHE, A LÍNGUA DO POVO FULNI-Ô

Tese de Doutorado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Letras e Linguística da Faculdade de Letras, Universidade Federal de Alagoas, como requisito final para a obtenção do título de Doutora em Linguística.

Orientadora: Profa. Dra. Januacele da Costa (UFAL)

Coorientadora: Profa. Dra. Stella Telles (UFPE)

MACEIÓ

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Catalogação na fonte

Universidade Federal de Alagoas Biblioteca Central

Divisão de Tratamento Técnico

Bibliotecária Responsável: Helena Cristina Pimentel do Vale

S586o Silva, Fabia Pereira da.

A organização prosódica da yaathe, a língua do povo fulni-ô / Fabia Pereira da Silva. – 2016.

189 f. : il.

Orientador: Januacele da Costa. Coorientadora: Stella Telles.

Tese (Doutorado em Linguística) – Universidade Federal de Alagoas. Faculdade de Letras. Programa de Pós-Graduação em Letras e Linguística. Maceió, 2016.

Bibliografia: f. 186-189.

1. Línguas indígenas. 2. Yaathe. 3. Índios da América do Sul – Brasil – Línguas. 4. Fonologia prosódica. 5. Palavra fonológica. 6. Hierarquia

prosódica. I. Título.

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A duas pessoas muito importantes na minha vida e nesse

processo: minha mãe, Maria José, pela bondade, paciência,

amor e apoio incondicional em todos os momentos; tia Celsa,

tia por adoção, por me incentivar e abrir as portas para que

eu entrasse no mundo acadêmico;

A Maria Alcena e Arani Marques, mulheres Fulni-ô, pessoas

muito queridas, pela importância que elas tiveram na minha

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Yasa setso dodwa sato yaadetowa Fulni-ô sato ke fetfemã Kexatkha de:

_ Tohe ufa sandowa? Nema tha neka:

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A Deus (Eedjadwa), em primeiro lugar, por ter me dado a oportunidade de trilhar esse caminho e por ter me dado a força necessária nos momentos mais tortuosos dessa caminhada.

À Escola João Rodrigues Cardoso, em Águas Belas -PE, responsável por toda a minha formação básica.

À Faculdade de Letras, por ter sido minha segunda casa em todos esses anos de estudos, e ao Programa de Pós-Graduação em Letras e Linguística, da UFAL, por garantir as condições primordiais para que este trabalho se desenvolvesse. De modo especial, agradeço aos professores Miguel Oliveira Jr., Aldir Santos de Paula, Núbia Faria, Telma Magalhães e

Januacele da Costa, pelos conhecimentos compartilhados durante o curso de doutorado. Aos funcionários e técnicos da secretaria e da biblioteca, pelo atendimento sempre cordial e eficiente. De modo especial, a Judson Leão e Inês Peil pelo carinho dispensado.

Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), por financiar em parte esta pesquisa.

À Profa. Januacele da Costa, pela inestimável orientação desde a graduação, encaminhando-me para a pesquisa com as línguas indígenas, de modo particular para a pesquisa com o Yaathe, e pelo tempo e paciência dedicados a este e tantos outros trabalhos que dizem respeito ao povo e à língua Yaathe. Meus sinceros agradecimentos e gratidão.

À professora Stella Telles, pela contribuição a este trabalho como coorientadora e pela contribuição ao estudo das línguas indígenas brasileiras.

Aos professores Aldir Santos de Paula, Miguel Oliveira Jr. e Maria Pankararu, pelas observações e discussões valiosas.

Ao grupo de estudos em Fonética e Fonologia, FonUFAL, agradeço pelas discussões vivenciadas de forma tão enriquecedora, de modo especial ao professor Miguel Oliveira Jr., pelo empenho necessário ao bom andamento das atividades do grupo, com quem venho aprendendo muito. À professora Luciana Lucente, pelas observações feitas durante as minhas apresentações e ajuda essencial, e a cada membro que integra o grupo, por compartilharmos tanto momentos de discussão acadêmica quanto momentos de descontração. De modo especial, agradeço aos amigos mais próximos da área de pesquisa que sempre se fizeram presentes, compartilhando seus conhecimentos, anseios, dúvidas, alegrias e conquistas ao

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durante vários momentos desta caminhada. De modo especial, agradeço ao amigo Cezar Neri,

por ter me acolhido no Campus de forma muito gentil. Aos meus alunos do curso de Letras,

agradeço pelos momentos de partilha de conhecimento e por me fazerem crescer a cada

discussão.

Ao povo Fulni-ô, meus agradecimentos mais que especiais. A Alexandre Pereira dos

Santos (tio Lalão) e família, por me acolherem e serem a minha segunda família. A Ivolene e

a Risolene, pelo carinho e apoio de sempre, por me ouvirem e aconselharem nos momentos

mais difíceis deste processo. As minhas queridas D. Sebastiana, tia Eulina, tia Iaponira,

pessoas que admiro e considero e que sempre se fazem presentes na minha vida. Ao Cacique

João Francisco dos Santos Filho e ao Pajé Gildiere Ribeiro Pereira, pelo indispensável apoio

ao meu trabalho, e, pelo mesmo motivo, ao saudoso pajé Cláudio Pereira Jr. (in memoriam).

Aos participantes desta pesquisa: Cícero de Brito, Hamilton Ribeiro, Tayti Amorim,

Elvis Ferreira, Ivolene Pereira, Maria Alcena (in memoriam) e Arani Marques (in memoriam),

Antônio Jorge, Ivanildee Lenimeile, pelas contribuições indispensáveis a este trabalho. Aos

professores de Yaathe, pelo apoio a este e a outros trabalhos. Ao meu povo Fulni-ô, dedico

um agradecimento especial pelos ensinamentos diários de luta e perseverança em prol da

manutenção da cultura tradicional e da identidade herdadas dos nossos antepassados.

Aos familiares que acompanharam e participaram desta jornada e compreenderam os

momentos de minha ausência: a minha mãe, por sempre fazer prevalecer a calma e a

serenidade; aos meus irmãos, por dividirem comigo as responsabilidades de família; a minha

tia Lourdes e a meus primos Tarcízio, Tarcísia e Tarciana, por se fazerem presentes em várias

fases dessa caminhada. Aos meus avós maternos, Seu Augusto e Dona Flor, in memoriam,

pelo amor e carinho compartilhados de forma inesquecível.

À família Costa e Cabral: Nazaré e filhos, tia Celsa, Francisco e família e Leandro, por

me adotarem como membro da sua família. De modo especial a Fábio Cabral, Diogo Cabral,

Lara Cabral e Carol Costa, por me receberem da melhor maneira possível em Maceió quando

iniciei meus estudos acadêmicos. A Jordana Costa, pelo apoio disponível sempre que precisei.

A Claudeane e Selma, pela amizade. A Sofia Cabral e Alice Cabral, por tornarem a vida mais

bonita em diversos momentos.

A minha psicóloga particular (sem ônus), Carol Costa, por sempre me ouvir nos

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vez que sua constituição, em termos gramaticais, revela-se mais complexa que as demais. Além disso, elas parecem ser as classes de palavras que são mais claramente definidas. Através da análise, nós propomos uma definição do padrão acentual da língua, uma separação de elementos que eram considerados parte de uma palavra gramatical em palavras fonológicas independentes, aspectos da organização das palavras em sintagmas fonológicos e algumas evidências sobre a existência das unidades de nível mais alto: o sintagma entonacional e o enunciado fonológico. Teórica e metodologicamente, esta investigação também nos permitiu fazer algumas reflexões que estão apresentadas nas considerações finais.

PALAVRAS-CHAVE: Língua indígena brasileira; Yaathe; Fonologia prosódica; Palavra fonológica; Hierarquia prosódica

(12)

language, aiming at defining and delimiting its prosodic units. The analysis is based on a

previously proposed theoretical approach. While the phonological word is discussed in much

more details here, the other units were also described and analyzed, resulting in a full

description of prosodic organization of the language language. The primary data used for

analysis and formulation of hypotheses come from the database Brazilian Indigenous

Language Documentation Project Yaathe (Fulni-ô). These data were collected between 2011

and 2013, respecting all standards proposed by international databases. As a theoretical

support, we lean on Prosodical Phonology, proposed by Nespor and Vogel (1986), which is a

theory of organization of the utterance into phonological units, hierarchically arranged. This

model conceives speech as represented by a system in which each constituent of the hierarchy

acts as context to application of rules and specific phonological processes. The work is

organized in four sections: section 1, in which we present an outline of the phonology and

grammar of the language, considering the pre-existing works, mainly Costa (1999), Cabral

(2009) and Silva (2011); section 2, in which we delimit the prosodic constituent metrical foot

in order to define the accent on Yaathe, describing how syllabic units are arranged to form

metrical feet, watching the accentual prominence in the lexicon. We analyze the verb and

name classes, once the other language words, generally behave in prosodic terms, sometimes

as verbs or as names; section 3, in which we specifically define the phonological word in that

language, noting some criteria that can allow the definition of phonological word in one

language, specifically pause, accent and phonological processes; and section 4, in which we

treat the units above the phonological word in terms of prosodical hierarchy: the phonological

phrase, the intonation phrase and phonological utterance, describing some aspects of these

units. To define the phonological phrase mostly used the break (whether or not), the accent

and phonological processes such as compensatory stretching, melting and falling vowels

vowels. To define the phonological phrase, we used the criteria break (whether or not), accent

and phonological processes such as compensatory lengthening, merge and drop of vowels. At

first, we delimited syntactic phrase unit. For that, we analyzed the following phrases: noun

phrase, verb phrase and postpositional phrase. We take as the basis for our analysis of speech

already defined in previous work (Costa, 1999) and applied the selected criteria to establish

the boundaries of a phonological word in the language. Again, the two largest classes, noun

(13)

the separation of elements that were considered part of a grammatical word into independent

phonological word, organizational aspects of words in phonological phrases and some

evidence of the existence of higher-level units, the phrase intonation and phonological

utterance. Theoretically and methodologically, the investigation also allows us to make some

reflections that are presented in the final considerations.

KEYWORDS: Brazilian indigenous language; Yaathe; Prosodical phonology; Phonological

(14)
(15)

mayores, nombre y verbo, se destacaron como merecedores de descripción más detallada, una

vez que su constitución, en términos gramaticales, se revela más compleja que las demás,

como también parecen ser las clases que se dejan definir más claramente. Tuvimos como

resultados la definición del patrón acentual, la separación de elementos que eran considerados

parte de una palabra gramatical en palabras fonológicas independientes, aspectos de la

organización de las palabras en sintagmas fonológicos y algunas evidencias sobre la

existencia de las unidades de nivel más alto, el sintagma entonacional y el enunciado

fonológico. Teórica y metodológicamente, esta investigación también nos permitió hacer

algunas reflexiones que están presentadas en consideraciones finales.

PALABRAS CLAVE: Lengua indígena brasileña; Yaathe; Fonología prosódica; Palabra

(16)

- sufixo

[ ] transcrição fonética

/ / transcrição fonológica

ˈ acento principal

ˌ acento secundário

< > transcrição ortográfica

= clítico

1PL primeira pessoa plural

1PL primeira pessoa do plural

1SG primeira pessoa singular

1SG primeira pessoa do singular

2PL segunda pessoa do plural

2SG segunda pessoa do singular

3PL terceira pessoa plural

3SG terceira pessoa singular

AD adição

ADM admirativo

AG agentivo

AG.PART particípio agente

ASP aspecto

ASS assertivo

ASSC associativo

ATEN atenuativo

AUX auxiliar

BEN benefactivo

CAUS causal

CIRC circunstancial

COMP companhia

COMPL complemento

CON conectivo

(17)

CSTV causativisador

DEF deferência

DEM demonstrativo

DES desiderativo

DET.GEN determinante genérico

DIM diminutivo

DIR direção

EF enunciado fonológico

EV evidencial

EXC exclusividade

EXI existencial

EXP.ADV expressão adverbial

EXPL expletivo

FAC factivo

FEM feminino

FIN finalidade

FON fonte

FUT futuro

IMD imediatividade

IMP imperativo

IMPF imperfeito

IND indicativo

INEF inefactivo

INF infinitivo

INST instrumental

INT interrogativo

INTENS intensificador

IO índice de objeto

IPOS índice de posse

IS índice de sujeito

LOC locativo

(18)

NEG negativo NEU neutra NPAS não passado Ø morfema zero O objeto

OD objeto direto OI objeto indireto PAC paciente

PAC.PART particípio paciente PART particípio

PARTC partícula PAS passado

PAS.REM passado remoto PERM permansivo

PF palavra fonológica PG palavra gramatical PL plural

PLNEU plural neutro POS possessivo POSP posposição POST posterioridade PP pronome pessoal PRED.NUCL predicado nuclear

PRED.SUJ predicado com marca de sujeito PRES presente

(19)

REF.DEF referencial definido

REF.NDEF referência não definida

RV raiz verbal

RVI raiz verbal intransitiva

RVT raiz verbal transitiva

S sujeito

SF sintagma fonológico

SIM simultaneidade

SUBJ subjuntivo

SUFVs sufixos verbais

TEMP temporal

TEMP.SIM temporalidade simultânea

TRAJ trajeto

V verbo

(20)

INTRODUÇÃO ... 1

O povo e a língua ... 1

Objetivos do trabalho ... 4

Aporte teórico ... 6

Procedimentos metodológicos ... 7

Organização do trabalho ... 11

SEÇÃO 1: A GRAMÁTICA DO YAATHE: OBSERVAÇÕES SOBRE A FONOLOGIA, A MORFOLOGIA E A SINTAXE ... 12

1.1 A Fonologia ... 12

1.2 A Morfologia ... 18

1.2.1 Nomes ... 18

1.2.2 Verbos ... 22

1.2.2.1 Sufixos derivacionais ... 23

1.2.2.2 Sufixos flexionais ... 25

1.2.2.2.1 Sufixos de modo ... 25

1.2.2.2.2 Sufixos de tempo ... 27

1.2.2.2.3 Sufixos tempo/aspecto ... 28

1.2.3 Adjetivos ... 29

1.2.4 Advérbios ... 30

1.2.5 Classes menores ... 31

1.2.5.1 Operadores de conexão de sentenças ... 31

1.2.5.2 Pronomes e outras pró-formas ... 32

1.2.6 Processos de formação de palavras ... 36

1.3 A Sintaxe ... 37

SEÇÃO 2: A SÍLABA E O PÉ MÉTRICO ... 41

2.1 O acento ... 41

2.2 O pé métrico ... 45

2.2.1 O acento em formas nominais ... 45

2.2.2 O acento em formas verbais ... 49

2.3 Resumo da seção ... 60

SEÇÃO 3: A PALAVRA FONOLÓGICA ... 61

(21)

3.2 A palavra fonológica em Yaathe ... 64

3.2.1 Nomes ... 64

3.2.1.1 Clíticos ... 65

3.2.1.2 Sufixos ... 69

3.2.1.2.1 Sufixo agentivo ... 69

3.2.1.2.2 Sufixo de privação ... 71

3.2.1.2.3 Sufixos de gênero ... 72

3.2.1.2.4 Sufixo diminutivo ... 76

3.2.1.2.5 Sufixo de exclusividade ... 77

3.2.2 Verbos ... 78

3.2.2.1 Clíticos ... 79

3.2.2.2 Sufixos derivacionais ... 83

3.2.2.2.1 Sufixo de negação ... 83

3.2.2.2.2 Sufixo de causativização ... 91

3.2.2.2.3 Desideração ... 92

3.2.2.2.4 Deferência ... 93

3.2.2.3 Sufixos flexionais ... 94

3.2.2.3.1 Sufixos de modo ... 94

3.2.2.3.2 Sufixos participiais ... 98

3.2.2.3.3 Sufixos de tempo ... 111

3.2.2.3.4 Sufixo de modalidade ... 115

3.2.2.3.5 Sufixo de finalidade ... 116

3.2.3 Verbos auxiliares ... 117

3.2.3.1 O morfema /kʰiˈa/ ... 117

3.2.3.2 O morfema /ʎa/ ... 129

3.2.3.3 O morfema /ˈhle/ ... 133

3.2.3.4 O morfema /keˈa/ ... 135

3.2.3.5 O morfema /ˈʃi/ ... 136

3.2.3.6 O morfema /ˈkʰana/ ou /ˈkʰane/ ... 137

3.2.3.7 O morfema /waˈti/ ... 141

3.3 Pronomes ... 142

3.3.1 Pronomes pessoais ... 142

3.3.2 Pronomes demonstrativos ... 143

3.4 Posposições ... 145

3.5 Resumo da seção ... 152

(22)

4.1.1 Sintagma nominal ... 156

4.1.2 O sintagma posposicional ... 161 4.1.3 O Sintagma verbal ... 167

4.1.3.1 Clíticos pronominais mais verbo ... 167

4.1.3.1.1 Clíticos pronominais mais verbo principal mais verbo auxiliar ... 168

4.1.3.1.2 Verbos temporais e verbos conectores ... 171

4.2 Sintagma Entonacional ... 172

4.3 Enunciado Fonológico ... 177

4.4 Resumo da Seção ... 181

CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 183

(23)

INTRODUÇÃO

O povo e a língua

Fulni-ô é uma autodenominação, que significa “o que tem rio”, e deve-se ao fato de a

terra indígena Fulni-ô estar localizada a pouca distância da margem esquerda do Rio Ipanema,

um afluente do Rio São Francisco. Na parte principal da terra indígena, encontra-se a cidade

de Águas Belas, sede do município do mesmo nome, localizado na área de transição entre as

regiões agreste e sertão de Pernambuco, cercada totalmente pelo território Fulni-ô. A

população indígena Fulni-ô é de 4.687 indivíduos, de acordo com dados do Siasi/Sesai

(2012).

Atualmente os Fulni-ô estão distribuídos, basicamente, em duas aldeias1. Uma é a aldeia sede, localizada junto à cidade de Águas Belas, onde se encontram as instalações do

Posto Indígena da Fundação Nacional do Índio (FUNAI); a segunda é a comunidade

Xixiakhla, localizada a poucos quilômetros da aldeia sede, no local denominado Supriano.

Essas aldeias são locais de morada permanente, onde se vive durante nove meses do ano, ou

seja, de dezembro a agosto. O Ouricuri é a aldeia sagrada, que fica a 6 quilômetros da aldeia

sede, na qual todos os índios vivem por um período de três meses, de setembro a novembro,

em retiro, mantendo suas tradições culturais e religiosas.

Os povos indígenas que sobreviveram ao massacre, tanto étnico quanto físico,

promovido por diferentes instituições e motivos – no caso dos Fulni-ô, principalmente pela

exploração dos coronéis que governavam e impunham suas vontades nessa região – perderam

elementos importantes do seu equipamento cultural, o que os diferenciava das populações não

índias vizinhas e entre si. Das perdas de marca de identidade, uma perda notável foi a

extinção de línguas nativas. Atualmente, entre cerca de 29 etnias indígenas que vivem no

Nordeste2 e que tiveram sua identidade étnica reconhecida e suas terras legitimadas até o final do século passado, só os Fulni-ô, preservaram a sua língua nativa.

A língua desse povo indígena é o Yaathe, que significa “nossa fala”. De acordo com

Rodrigues (1986), está filiada remotamente ao tronco Macro-jê, sem relação direta atestada

com nenhuma outra língua indígena brasileira conhecida.

1

Muitos índios Fulni-ô também moram na cidade de Águas Belas, em outras cidades e, alguns, na zona rural do município.

(24)

população total. (COSTA, 1993). O uso da língua é muito difundido na comunidade. Nas

famílias, de modo geral, os membros se comunicam em Yaathe. Por exemplo, dão ordens ou

fazem perguntas aos filhos em Yaathe, a despeito de estes, às vezes, responderem em

português. Estudos recentes (COSTA; SILVA, 2010) indicam que crianças muito pequenas

dominam a gramática da língua, bem como outros aspectos particulares do seu uso, como, por

exemplo, as diferenças de gênero social.

Assim, os Fulni-ô fazem uso sistemático de sua língua internamente e têm

demonstrado um esforço muito grande para manter vivas a sua língua e a sua cultura, através

de diferentes iniciativas. Embora tenham sido elaborados muitos trabalhos sobre a língua, há

ainda muito pouco registro do Yaathe, se considerarmos que esses trabalhos representam uma

fração muito pequena de conhecimento, tanto da língua quanto do conhecimento ancestral dos

seus falantes, do qual ela é veículo e receptáculo.

Até a década de 1990, vários estudos de descrição e análise linguística foram

elaborados. Entre eles, podemos citar Meland e Meland (1967), Meland (1968), Lapenda

(1968) e Barbosa (1991). Tanto Meland e Meland (1967) quanto Meland (1968) são

descrições da fonologia, elaboradas sob o modelo tagmêmico (PIKE, 1947). Lapenda (1968)

descreve a estrutura da língua de um ponto de vista tradicional e Barbosa (1991) é uma

descrição fonética e fonológica, também apoiada no modelo tagmêmico.

De 1993 para cá, vários trabalhos foram efetuados sobre a língua. Costa (1993)

procurou investigar a situação linguística dos Fulni-ô, dada a sua peculiaridade de última

língua nativa no Nordeste do Brasil3, a fim de verificar se havia tendências à substituição ou ao deslocamento em relação ao Português. Esta investigação serviu como pano de fundo para

a observação de fenômenos de atitudes linguísticas de professores não índios face à variedade

de Português falada pelas crianças índias que chegavam à escola da cidade e de interferências

de uma língua na outra, mais precisamente da influência do Yaathe – que foi considerado

(25)

língua materna – sobre o Português – segunda língua. Neste caso, tratava-se da variedade de

Português falada pelas crianças índias. Os resultados de tal trabalho puderam, por um lado,

ajudar a clarear e a melhorar a compreensão dos professores de língua portuguesa das

variedades linguísticas que são utilizadas pelos alunos de procedências diversas. Por outro

lado, contribuíram para o conhecimento e o autoconhecimento das nações indígenas.

Costa (1999) detém-se sobre a estrutura do Yaathe, procurando descrever e explicar o

sistema (fonologia e gramática) e o seu funcionamento. Cabral (2009) enfocou o sistema

prosódico da língua, buscando descrever experimentalmente o acento no nível da palavra, e

Silva (2011) efetuou uma análise da sílaba do ponto de vista fonético – empreendendo uma

análise acústica, sobretudo de clusters consonantais incomuns – e do ponto de vista

fonológico, a partir de uma análise autossegmental. Além desses, há outros trabalhos

elaborados por estudantes de graduação, enfocando aspectos diversos. Alguns desses

trabalhos são Cabral (2007); Silva (2008); Melo (2010); Dias (2014); Sousa (2014).

Os estudos, basicamente, focam a estrutura da língua – fonologia, morfologia, sintaxe.

Pouco se sabe sobre aspectos do Yaathe que vão além desses limites. Contudo, é consenso

entre os estudiosos que uma língua não é apenas um mecanismo para denotar significados.

Além disso, ela tem poderes plenos para representar um mundo de experiência vivida.

Diferentes culturas impõem diferentes convenções para o uso e a forma da língua em

situações sociais semelhantes. Práticas linguísticas que se adequam a essas convenções são

uma característica que serve para definir se um falante faz parte ou não de uma comunidade

linguística como um membro competente, isto é, se ele tem competência comunicativa e não

apenas competência gramatical. (FOLEY, 1997).

Atualmente, há uma necessidade específica, que é a de se ter materiais didáticos como

recurso de ensino-aprendizagem da língua no contexto das escolas da aldeia.4 Os professores

de Yaathe fazem quase todo o trabalho necessário: escrevem textos, preparam aulas e planos

de aula, conforme exigido pelas instâncias oficiais, falam sobre cultura e religião, incentivam

o uso da língua e o respeito pela cultura como um todo. Não se pode dizer que o trabalho

desses professores – em grande parte sem formação pedagógica e sem experiência com o

4 A comunidade Fulni-ô possui três escolas da Rede Estadual: A Escola Indígena Marechal Rondon, a Escola

(26)

sistematizado em que se apoiar ou ao qual seguir5. Há, por outro lado, como já dissemos, muito material produzido pelos professores e um esforço cada vez mais constante no sentido

de se padronizar a escrita de modo a ser aceita pela comunidade.

Sá et al. (2012) apresentam um levantamento de trabalhos que discutem a origem dos

Fulni-ô, a saber: Melo (1929); Pinto (1956); Quirino (2006); Campos (2006); Dantas (2010).

Os autores do artigo citado são índios da etnia Fulni-ô e concordam com a afirmação de

Campos, quando ela afirma que “a nossa origem se deu pela junção de quatro famílias: Fôla,

Brogadas ou Brobadas, Carnijós e Fowkhlasa”. (DANTAS, 2010 apudet al., 2012, p. 37).

Ainda segundo os autores, citando Pinto (1956), “Houve tentativas de caracterizar os

Fulni-ô como os últimos representantes dos Cariris históricos, no entanto, esta hipótese foi

refutada com base em comparações linguísticas”. Para os autores, há dados históricos que

indicam que os Carnijós descendem, sobretudo, do grupo dos Tarairious, nação de índios

tapuias, de acordo com Pinto (1956, apudet al., 2012, p. 37): “Os tapuias, isto é, os índios

da língua “travada”, que habitam a capitania de Pernambuco e territórios anexos estavam

subdivididos em quatro principais ‘nações’, os ‘cariris’, os ‘caririwasis’ os ‘cariryjouws’ e os

‘tarairiou”.

O fato de a língua Yaathe constituir-se como uma língua viva, preservando todas as

funções que se acredita que uma língua precisa cumprir em uma comunidade, é por si só

merecedor de atenção, pois, como sabemos, na região Nordeste, a maioria foi esmagada pelo

processo colonizador, perdendo todo ou parte do seu equipamento cultural de identificação

étnica, sendo a língua um fator muito importante dessa identificação. Por isso, uma das

características mais notáveis da situação dos índios Fulni-ô é a sobrevivência da língua, uma

vez que todas as outras línguas indígenas faladas nessa parte do país já são consideradas

extintas. (Cf. OLIVEIRA Jr., M.; COSTA, J. F. e FULNI-Ô, F., 2014).

Objetivos do trabalho

O objetivo inicial da investigação aqui apresentada era a definição e delimitação da

unidade palavra na língua indígena brasileira Yaathe. No decorrer da análise, verificamos que

5 Apesar de existir alguns materiais produzidos por estes professores, além de outros materias como, por

(27)

seria necessário para esse propósito que as demais unidades da hierarquia fossem definidas,

tanto as de nível mais baixo, como a sílaba e o pé métrico, como as unidades de nível superior

– sintagma fonológico, sintagma entonacional e enunciado fonológico. Desse modo, embora a

palavra fonológica seja ainda o aspecto tratado mais extensivamente nesta Tese, as demais

unidades também foram analisadas, o que resultou em uma descrição da organização

prosódica da língua.

Outros objetivos, que não são intrinsecamente parte da pesquisa, mas resultado dela e

relacionados aos interesses tanto do grupo de pesquisa no qual ele está inserido quanto da

comunidade indígena Fulni-ô, são a contribuição que podemos dar para elaboração de

gramáticas escolares e dicionários, além de contribuir para a elaboração de outros materiais

didáticos, como vem sendo feito por nós em um projeto de acompanhamento aos professores

de Yaathe.

Na nossa dissertação de Mestrado (SILVA, 2011), investigamos, apoiados nos

postulados teóricos e metodológicos da Fonética acústica e da Fonologia Autossegmental, a

unidade sílaba, visando com isso a uma compreensão melhor do estudo dessa unidade, do

ponto de vista científico, para, como objetivo social do estudo, contribuir com as tarefas de

assessoria aos professores de Yaathe da escola Fulni-ô. A compreensão desse aspecto da

estrutura da língua é de fundamental importância para a sistematização e padronização da

escrita.

Os resultados desse trabalho apontaram, entre outras coisas, para a necessidade do

estudo de outra unidade importante tanto para uma melhor compreensão da língua quanto

para o funcionamento eficaz de um sistema de escrita. Os falantes não têm consciência dessa

unidade em muitos casos – embora possam reconhecer relativamente bem o que é palavra na

sua língua, quando essa identificação não é problemática. Tentativas de sistematizar a escrita

não têm dado certo porque esbarram no problema da delimitação do que é uma palavra na

língua.

Para alcançarmos o objetivo geral do trabalho, a delimitação da palavra fonológica,

uma outra unidade dessa língua, hierarquicamente inferior à palavra fonológica e para a qual

não havia estudos prévios, o pé métrico, precisou também ser estudada. Por outro lado, a

análise dos dados levou o estudo para unidades prosódicas de nível mais alto que a palavra, de

modo que um esboço de descrição do sintagma fonológico, do sintagma entonacional e do

(28)

Como já dissemos, definir palavra não é algo muito fácil, pois há várias maneiras para

definir uma palavra e nem sempre há uma definição completamente satisfatória. Para tal

definição, no entanto, encontramos critérios que nos ajudam no desenvolvimento dessa tarefa,

porém, são, muitas vezes, critérios problemáticos se considerados isoladamente. Autores

como Matthews (1991), Aronoff & Fudeman (2007), Dixon e Aikhenvald (2010) e

Haspelmath (2010) tratam de critérios que definem e delimitam uma palavra e também

mostram os possíveis problemas enfrentados no empreendimento de tal tarefa.

Há muitos fatores que tornam difícil a definição e delimitação de palavra em uma

língua. Um desses é a falta de correspondência entre os significados lexicais e palavras, como

bem observa Haspelmath (2010, p. 668):

While simplistic approaches such as Swadesh-list-based comparison make the simplifying assumption of a one-to-one correspondence between lexical meanings and words, and thus between words across languages, reality is more complex: words in one language are often in semantic many-to-many relationships with words in another language.

Isso pode ser apreciado em toda a sua complexidade quando coletamos dados

elicitados do tipo listas de palavras. O conceito solicitado pode estar presente – e geralmente

está – mas a forma correspondente frequentemente não pode ser fornecida porque não é uma

palavra, ou o que convencionamos chamar de palavra6, ou o falante nos dá uma forma complexa que pode ser traduzida em uma sentença e, na maior parte do tempo, é uma

sentença também em Yaathe.

Nossa análise baseia-se principalmente na Fonologia Prosódica, proposta por Nespor e

Vogel (1986), que é uma teoria de organização do enunciado em unidades fonológicas

organizadas hierarquicamente e concebe a fala como sendo representada por um sistema em

que cada constituinte da hierarquia atua como contexto de aplicação de regras e de processos

fonológicos específicos. As considerações teóricas são aplicadas na análise dos dados, embora

não estejam aí explicitadas.

6

(29)

Procedimentos metodológicos

Os dados primários, utilizados para análise e formulação de hipóteses, são oriundos do

Banco de Dados do Projeto Documentação da Língua Indígena Brasileira Yaathe (Fulni-ô) e

foram coletados entre 2011 e 2013, na aldeia Fulni-ô, município de Águas Belas, Estado de

Pernambuco, Brasil. Esse projeto foi financiado pelo CNPq, Edital MCT/CNPq N. 014/2010

– Universal, Processo nº 475763/2010-6 e teve seu prazo de vigência encerrado em

11/11/2013. O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP-UFAL), em

20/09/2011, Processo nº 012672/2011-70, tendo os participantes da pesquisa assinado o

Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). Todos os documentos e dados aqui

citados encontram-se arquivados na coordenação do Projeto e no banco de dados The

language Archive em IMDI Corpora, Donated Corpora7.

Obtivemos três tipos principais de dados: 1) fala, divididos em fala espontânea e

semiespontânea, através de diferentes gêneros – tais como narrativas, textos procedimentais,

conversação em díades – e fala elicitada, através de listas de palavras; 2) escrita, também em

diferentes gêneros, desde narrativas até materiais didáticos, incluindo poesias e outros

exemplares escritos; 3) dados elicitados gravados no início dos anos 1990 e ao longo dos anos

2000, incluindo listas de palavras, questionários gramaticais e narrativas orais; 4) eventos

culturais, como músicas e danças típicas, gravados em áudio e vídeo.

Entre os dados que coletamos, incluem-se listas de palavras e frases, tendo como

modelo as já clássicas listas Swadesh (Swadesh, 1955), LDQ (Comrie & Smith, 1977), e

aquelas propostas por Healey (1975), em seu Manual de trabalho de campo, e uma série de

exemplares discursivos, entre os quais narrativas de experiência pessoal, mitos, narrativas

procedimentais e conversas espontâneas. Considerando que informações visuais têm

reconhecida importância para a compreensão de determinados fenômenos linguísticos,

gravamos também em vídeo a maior parte das sessões de coleta de dados em campo. Dados

não linguísticos – como vídeos de danças, fotografias – e produção do povo, como desenhos,

literatura, material didático, entre outros, também foram coletados e armazenados.

Os dados de áudio e vídeo foram gravados e arquivados respeitando-se todas as

medidas e indicações propostas pela E-MELD School of Best Practice8, que vem sendo

adotadas em projetos de documentação de línguas indígenas internacionalmente, pelo Open

7 https://corpus1.mpi.nl/ds/asv/?4

(30)

(14721:2003), adotado pelos bancos de dados linguísticos mais recentes, e anotados seguindo

os preceitos do Metadata Encoding and Transmission Standard (METS)10, também adotados

por bancos de dados internacionais. Os dados de áudio foram gravados com microfones tipo

headset DPA Headband 4066 e um gravador digital de flash Marantz PMD661. Os dados de

vídeo foram gravados com uma filmadora Digital Sony Handycam HDR-PJ10, em full-HD e

altíssima qualidade.

As transcrições e anotações das listas de palavras foram feitas no programa PRAAT11

(Boersma & Weenik, 2007), uma vez que este aplicativo nos permite uma segmentação

precisa no nível dos sons e dá acesso a detalhes acústicos dos dados, o que não apenas facilita

a transcrição, nos mais diferente níveis, mas também auxilia a feitura de estudos acústicos os

mais diversos. A anotação das listas de palavras no PRAAT apresenta cinco fiadas: i) palavra

(palv); ii) segmento (segm); iii) fonológica (fonl); iv) ortográfica (ortg); e v) tradução (trad).

Os textos foram anotados no ELAN12, alinhando-se os arquivos de áudio e vídeo. A anotação

foi feita por meio de cinco fiadas: i) texto (tx); ii) palavra (wd); iii) morfema (mb); iv) glossa

(gl); e v) tradução livre (ft).

Os dois aplicativos possuem interface, o que significa que os dados de um podem ser

importados pelo outro, permitindo uma ampla gama de utilização em análises e estudos

diferentes, uma vez que as transcrições feitas tanto no PRAAT quanto no ELAN são

compatíveis entre si.

A transcrição e tradução foram feitas com o auxílio dos professores de Yaathe, o que

garantiu maior acurácia e proporcionará uma discussão acerca de um modelo adequado de

grafia a ser adotado, com aprovação da comunidade. A anotação dos dados para

disponibilização foi feita pelos pesquisadores do Projeto, envolvendo ainda estudantes de

Iniciação Científica13.

9 Consultative Committee for Space Data Systems, Reference Model for an Open Archival Information System

(OAIS), CCSDS 650.0-B-1 Blue Book January 2OO2 (Washington, DC: CCSDS Secretariat, 2002). Disponível online: http://public.ccsds.org/publications/archive/65OxOb1.pdf.

10

Library of Congress, “METS: Metadata Encoding & Transmission Standard” (2007), http://www.loc.gov/standards/mets/.

11

Aplicativo computacional usado para transcrição. (www.praat.org) 12

ELAN (EUDICO Linguistic Annotator) é uma ferramenta de anotação multimídia desenvolvida pelo Max Planck Institute for Psycholinguistics.

(31)

Para outra parte dos dados linguísticos, que não foi transcrita, anotada e traduzida,

respeitando-se, assim, a vontade dos falantes nativos da língua, uma vez que se trata de

discursos e textos tradicionais pertencentes a áreas fechadas da cultura, como a religião, por

exemplo, fizemos ainda o trabalho de anotação de metadados, obedecendo às exigências do

banco, para que também pudessem ser arquivados em formato original. Será uma forma de

preservar informações sobre essa parte da cultura para as futuras gerações, caso seja

necessário, tendo em vista que a língua pode ser incluída entre as que correm risco de

extinção, de acordo com relatório da Unesco 201014.

Foram gravadas 4 listas de palavras, com dois informantes; 08 textos procedimentais

com informantes de ambos os sexos e de idades variadas, tendo também como tema diferentes

produções artesanais, já que artesanato, sobretudo em palha, é uma marca forte dos Fulni-ô;

06 textos narrativos; e 04 textos conversacionais.

O banco de dados do Projeto Documentação da Língua Indígena Brasileira Yaathe

(Fulni-ô) está, a princípio, organizado seguindo o modelo de bancos de dados existentes, com

algumas adequações necessárias, no sentido de se considerar e atender às características do

grupo e da língua em questão. Os dados referentes a cada sessão foram organizados dentro de

uma pasta, contendo documento de áudio, vídeo e anotação, bem como as informações sobre

a sessão (Metadata), conforme apresentamos a seguir.

A nomeação dos arquivos segue a seguinte proposta:

i) Nome da Língua: código do ISO (FUN);

ii) Código do Informante: duas primeiras letras do nome + primeira letra do

sobrenome;

iii) Tipo de Sessão: as três primeiras letras

CON - conversas

DIS - discurso público

ENT - entrevistas

EST - estímulos visuais

LIS - lista de palavras

NAR - narrativas

PRO - procedimentos

SEN - sentenças

iv) Número da Sessão: numeração contínua, referente ao tipo de sessão (três dígitos).

(32)

Seguindo as orientações acima, temos uma nomeação de arquivo do tipo:

FUN_CIB_NAR_001

Esses códigos e chaves foram devidamente adequados e utilizados na Tese para

identificar os dados oriundos do Banco da seguinte forma:

i) Código do Informante;

iii) Tipo de Sessão;

iv) Número da Sessão.

Como exemplo, temos a seguinte nomeação:

ARM_NAR_003

Outros dados tiveram sua própria forma de identificação. Para esses dados, adotamos a

seguinte nomeação:

i) código do informante;

ii) tipo de dado: AUE (aula Escrita); TEE (texto escrito); LIE (Lista de palavra

escrita), LIO (lista de palavra oral), LIF (lista de frases); PAR (paradigma);

iii) numeração do dado.

Como exemplo, temos:

CIB_LIE_001

TAC_TEE_001

HAR_PAR_001

CIB_LIO_001

ELF_LIF_001

Há ainda outros dados que não estão identificados por serem advindos de fontes

diversas, como de nosso próprio conhecimento como pertencente à etnia Fulni-ô, assim como

através de conversas com outros falantes da língua na comunidade.

Feita a análise e levantadas hipóteses que não puderam ser testadas nos dados

disponíveis, empreendemos outras gravações de dados, dessa vez através de elicitações

direcionadas para os fenômenos específicos. Esses dados também deverão compor o Banco de

Dados do Projeto, arquivado em rede, mas até o momento ainda não lhe foram anexados e

(33)

Organização do trabalho

O trabalho está organizado da seguinte forma:

- na Seção 1, apresentamos um esboço da Fonologia e da Gramática da língua,

considerando os trabalhos preexistentes, principalmente Costa (1999), Cabral (2009) e Silva

(2011);

- na seção 2, delimitamos o constituinte prosódico pé métrico, a fim de definirmos o

padrão de acento;

- na seção 3, definimos especificamente a palavra fonológica;

- na seção 4, tratamos das unidades superiores à palavra fonológica em termos de

hierarquia prosódica: o sintagma fonológico, o sintagma entonacional e o enunciado

(34)

FONOLOGIA, A MORFOLOGIA E A SINTAXE

Nesta seção, trazemos algumas considerações sobre o funcionamento da gramática do

Yaathe a partir de trabalhos já existentes, como Costa (1999), Cabral (2009) e Silva (2011),

com o intuito de fornecer informações sobre a língua que serão importantes para a análise que

propomos nesta tese. Na fonologia, apresentamos o sistema de vogais e consoantes, a

estrutura da sílaba, os processos fonológicos e o acento. Na morfologia, apresentamos as

classes de palavras, as categorias gramaticais relacionadas a cada classe e os processos de

formação de palavras. E, por último, na sintaxe, abordamos a ordem dos constituintes e os

tipos de constituintes. Salientamos que todas as considerações estão apoiadas nos trabalhos

supracitados, mas, em alguns pontos, determinados dados são reinterpretados para maior

clareza.

1.1 A Fonologia

Nesta subseção, na qual apresentamos a organização dos sons da língua Yaathe,

utilizamos para o sistema de vogais e consoantes e para os processos fonológicos, o trabalho

de Costa (1999); para as considerações sobre a sílaba, Silva (2011); e para o acento, Cabral

(2009).

A língua Yaathe possui um inventário de 33 fonemas, sendo 21 consonantais e 12

vocálicos. Nos Quadros 1 e 2, a seguir, apresentamos esses fonemas.

Quadro 1 - Consoantes

QUADRO 1 Labial

Coronal

Dorsal Glotal

+ant -ant

asp asp asp asp

Não-Contínuas p ph t d th k kh

Fricativas f s ʃ h

Africadas ts tʃh

Nasais m n

Laterais l ʎ

(35)

Quadro 2 - Vogais

QUADRO 2 Labial Coronal Dorsal

-longo +longo -longo +longo -longo +longo

Aberto 1 u u: i i:

Aberto 2 o o: e e:

aberto 3 ᴐ ɛ a a:

O Padrão silábico é (C)(C)V(C), com V podendo ser uma vogal longa. Os seguintes

tipos de sílabas são possíveis: V, CV, VC, CVC, CCV e CCVC.

A sílaba mínima é V ou Vː e todos os segmentos consonantais podem ocupar a

posição de onset simples, enquanto os onsets complexos apresentam restrições:

a) as consoantes que podem ocupar a posição C1 são as seguintes: /t, th, k, kh, d, f, s, ʃ, ts, tʃ, tʃʰ, m/;

b) a posição C2 pode ser ocupada por /t, d, tʰ, k, f, s, ts, m, n, l/;

c) o núcleo pode ser ocupado por qualquer um dos fonemas vocálicos: /u, u, i, iː, o, oː,

e, eː, ɔ, ɛ, a, aː/;

d) a posição C3, posição de coda, pode ser ocupada pelos fonemas /k, s, ʃ, h, ts, m, l, w, j /;

e) o núcleo, sendo ocupado por uma vogal longa, não permite mais uma consoante na

coda.15

Os principais processos fonológicos, de acordo com Costa (1999), são: processos de

assimilação – desvozeamento, nasalização, palatalização e labialização – harmonia vocálica,

alongamento compensatório, apagamentos diversos, tanto de vogais como de consoantes,

fusão e elisão de vogais.

A seguir, damos exemplos de cada um dos processos mencionados.

a) desvozeamento de oclusiva

i) A oclusiva coronal sonora /d/ muda para [t] antes de consoante surda.

1)

[ikʰetdotˈkʲa]

/i= kʰete -dode -ka/

1SGS= achar -NEG -IND

Eu não acho.

(36)

i) As oclusivas /t/, /d/ passam a [tʃ] e [dʒ] depois de uma vogal anterior alta /i/.

2)

[etʃitʃoˈwa]

/e= tʃi -towa/

3SGS= chegar -PART

O que chega.

3)

[titʃidʒoˈwa]

/titʃi -dowa/

novo -PART

rapaz

ii) A ocluisva /k/ [kʲ] quando uma vogal anterior alta precedente é apagada.

4)

[tʰa tʃkʲaˈse]

/tʰa= tʃi -ka -se/

3SGS= chegar -IND -PAS

Eles chegaram.

c) labialização

i) As oclusivas /t/, /d/ [tʷ], [dʷ], respectivamente, nos sufixos /-towa/ e /-dowa/.

5)

[seˈtsotʷa]

/setso -towa/

índio -MIS

Os índios.

6)

[kʰlɛˈtʃadʷa ]

/kʰlɛtʃa -dowa/

cantar -PART

cantor

ii) A oclusiva /k/ [kʷ] quando uma vogal posterior média alta precedente é apagada.

7)

[e ˈkʰkʷa]

/e= kʰo -ka/

3SGO= beber -IND

(37)

d) alongamento compensatório

i) duas vogais breves iguais passam a vogal longa em fronteira de morfemas, devido

ao apagamento de /h/.

8)

[i ˈtak ˈːne ˈte]

i= ta= ke naha -ne te

1SGS= 3SGO= LOC.POSP ver -CAUS FIN

Para eu mostrar a ela.

ii) uma vogal oral breve passa a longa nasal em fronteira de morfema quando um

morfema da forma /-ne/ é apagado.

9)

[tetʃiˈdʒõːkʲa]

/tetʃidʒo -ne -ka/

satisfeito -FAC -IND

Estar satisfeito.

iii) uma vogal breve passa a vogal longa quando uma sílaba é apagada em posição

medial de palavra ou na fronteira entre uma palavra e uma posposição16.

10)

[oːˈke]

/owe -ke/

eu -LOC

Comer

11)

[ˈkoːte]

/koho -te/

mão -INST

Com a mão

16

(38)

[ˈfoːke]

/fowa -ke/

pedra -LOC

Na pedra

[ˈfeːke]

/feja -ke/

terra -LOC

Na terra

e) nasalização

i) uma vogal antes de uma consoante nasal nasaliza-se.

14)

nma]

/nema/

então

f) elisão de vogal

Vogais são elididas em fronteiras de morfemas e de palavras.

15)

[faleˈtsɛja]

/fale etsɛja/

pato amarelo

16)

[ɔtsˈkalka]

/ɔtska elka/

homem ruim

g) harmonia vocálica

A vogal do morfema de gênero feminino /-sV/, não especificada, assimila todos os

traços da vogal da sílaba precedente.

17)

[oˈwe]

o -we

eu -MASC

Eu

18)

[oˈso]

o -so

eu -FEM

(39)

19)

[aˈwe]

a -we

tu -MASC

Tu

20)

[aˈsa]

a -sa

tu –FEM

Tu

21)

[ˈsawho]

sawe -ho -ø

brigar -PART -MASC

Guerreiro

22)

[sawˈhoso]

sawe -ho -so

brigar -PART -FEM

guerreira

Em relação ao acento, considerando o estudo de Cabral (2009), que trata do acento

lexical, o Yaathe é uma língua que coloca o acento em uma das duas últimas sílabas da

palavra. A atribuição do acento, no nível do léxico, é arbitrária, o que quer dizer que é

fonológico. O sistema de acentuação da língua de forma mais detalhada não foi ainda

investigado em trabalhos anteriores.

i) palavras acentuadas na última sílaba.

23)

a. [kaˈsa] filha

b. [thɛˈthɛ] bico

c. [datˈka] chefe

d. [fuliˈkha] Rio Ipanema(rio largo)

e. [natsaˈka] feijão

(40)

24)

a. [ˈoʃa] mosca

b. [ˈtaʃi] dente

c. [ˈtkãno] dois

d. [seˈtsõ:kja] índia

e. [maˈdʒõ:kja] morcego

f. [seˈkehe] lugar

1.2 A Morfologia

Nesta subseção, apresentamos um resumo da morfologia do Yaathe, conforme descrito

em Costa (1999). Vamos nos deter, por interessar mais especificamente ao nosso trabalho, em

classes de palavras, flexão e/ou derivação.

As classes de palavras principais são nomes, verbos, adjetivos e advérbios. As outras

palavras são definidas como classes menores, chamadas de operadores de conexão de

sentenças, pronomes e outras pró-formas, quantificadores e auxiliares.

1.2.1 Nomes

Há duas classes de nomes, de acordo com a possibilidade de marcação em termos de

posse: não possuídos e possuídos. São possuídos os nomes que referem a partes do corpo

humano e a relações de parentesco.

a) não possuídos

25)

a. [fe: ˈtʃa] sol

b. [ɔtsˈka] homem

c. [jaˈdedwa] menino

(41)

b) possuídos

26)

a. [i ˈfehe] meu pé

b. [i ˈfo] meu marido

c. [i ˈka] meu filho

Alguns nomes de objetos podem também ser tratados como inalienáveis, são nomes

como casa, conforme exemplo abaixo.

27)

[ja ti]

/ja= ti/

1PLPOS= casa

Nossa casa.

O gênero pode ser indicado por sufixos, apresentando-se três formas para o feminino.

O masculino é a forma não marcada17:

i) /-ne/

[waˈle] [waˈlne] porco/porca

28)

ii) /-sV/

a. [sekejˈniho] [sekejˈniːso] professor/professora

29)

b. [iˈka] [ikaˈsa] filho/filha

iii) /-neka/

[jaːˈdedwa] [jaːdedõːkʲa] menino/menina

30)

(42)

mais indivíduos de ambos os gêneros, conjuntamente: [toˈwa].

[iˈtfetʷa] meu pai e minha mãe

31)

[seˈtsotʷa] um grupo de índios e índias

32)

O sufixo /-wa/ associado à palavra nominal indica diminuição, afetividade, carinho.

[iˈka] [iˈkawa] meu filho/meu filhinho

33)

O sufixo /-sato/18, marca o plural, conforme exemplos abaixo.

[ɔtsˈka] homem [ɔtskaˈsato] homens

34)

[ˈtʃaj] mulher [tʃajˈsato] mulheres

35)

O sufixo /-ʎa/ significa deferência, reconhecimento do status do referente ou do

interlocutor.

[keʃatˈka] [keʃatkaˈʎa] lugar/lugar sagrado (Ouricuri)

36)

[ɔtʃajtoˈwa] [ɔtʃajtowaˈʎa] branco/ branco respeitável

37)

O sufixo /-na/ significa exclusividade.

[ˈnato] [naˈtõna] mel/só mel

38)

O sufixo /-doˈwa/, quando associado a um nome, forma um novo nome que é a sua

privação.

[ˈedʒa] [e:dʒaˈdʷa] erro/o sem erro (Deus)

39)

[eˈfo] [efodoˈãne] marido/ a sem marido (mulher solteira)

40)

(43)

Novos nomes também podem ser formados a partir de raízes verbais pela adição de

sufixos classificados como particípios. São três esses sufixos.

i) /-ho/ forma nomes derivados de raízes verbais agentivas, ou seja, palavras verbais

que referem a eventos realizados por um sujeito agente.

[ˈsawkʲa] [ˈsawho] matar/guerreiro

41)

ii) /-doˈwa/ forma nomes derivados de raízes verbais passivas, ou seja, palavras

verbais que referem a eventos sofridos por um sujeito paciente.

42)

[klɛtʃaˈka] [klɛˈtʃadʷa] cantar/cantor

iii) /-se/ pode ser adicionado a qualquer classe de raízes verbais, derivando nomes que

referem a instrumento, locação, etc..

43)

[efniˈka] [seˈfnise] olhar/espelho

44)

[kʰejniˈka] [sekʰejˈnise] ensinar/escola

No quadro abaixo, podemos ver a morfologia do nome, baseado nas considerações de

Costa (1999).

Quadro 3 - Morfologia do nome

QUADRO 3 Morfologia do nome

Raiz Sufixos

Verbal

(agente)

(gênero) (avaliação) (plural) (status) (exclusividade)

(paciente

(locativo)

(44)

Palavras classificadas como verbos, em Yaathe, podem ser agrupadas,

morfologicamente, nos seguintes tipos:

i) formas gerais, isto é, sem quaisquer particularidades morfológicas, que podem ser

mono-, bi- ou trivalenciais.

[ekilˈkᶨa] subir

45)

[ekiˈka] tirar

46)

[ekoˈka] dar

47)

ii) formas cristalizadas com um elemento /-sa/, de valor reflexivo ou recíproco.

[ˈsawkʲa] lutar

48)

[sa:thatˈkʲa] conversar

49)

iii) formas cristalizadas com um sufixo /-ne/, causativo ou factivo.

[lɛːneˈka] arrancar

50)

[wɛːneˈka] abrir

51)

iv) formas adjetivais

[ekaˈka] é bom

52)

[ekaˈkahe] será bom

53)

[ekakˈka] está bom

54)

[ekakˈkahe] estará bom

(45)

v) verbos existenciais

[ikˈːkʲa] Eu tenho. 56)

[taˈksãːkʲa iˈtʰlo] O cachorro é dele. 57)

As formas verbais podem ser modificadas tanto derivacional quanto flexionalmente,

por morfemas sufixais que expressam uma ampla gama de significados. Clíticos pronominais

proclíticos funcionam como marcadores de pessoa e número, bem como de funções sintáticas,

e não foram considerados como parte da palavra gramatical verbo.

Nas subseções a seguir, damos exemplos de formas verbais constituídas com os

sufixos apresentados na ordem em que eles ocorrem para a constituição da palavra verbal.

1.2.2.1 Sufixos derivacionais

Os sufixos derivacionais são, basicamente, modificadores adverbiais. Eles

preenchem a posição imediatamente seguinte à raiz, modificando o sentido dessa raiz de

formas diversas, acrescentando informação nova. Nos exemplos que seguem, não

apresentamos a forma fonética, dado que essas formas não estão dadas na fonte a que

recorremos.

Negação 58)

/i= sa:thathe -dode -ka/ 1SGS= conversar -NEG -IND

Eu não converso.

Atenuação 59)

/ja= ke sa= ne -ka ja= ekhde -ho -wa -sato -hle/ 1PLS= LOC.POSP EXPL= EXI-IND 1PLPOS= saber -AG -ATEN -PL -IMED

(46)

60)

/ja= ke sa= ne -ka ja= ekhde -ho -wati -sato -hele/ 1PLS= LOC.POSP EXPL= EXI-IND 1PLPOS= saber -AG -INTENS -PL -IMED

Nós temos os nossos que já sabem muito.

Deferência 61)

/i= samlẽne -te owa kʰoʃkʲa -ʎa alaj/

1SGS= misturar -INF DEM palha -DEF COMP.POSP

Para eu misturar com essa palha.

Desideração 62)

/tha= ja= fle -taka -ka/ 3SGS= 1PLO= acabar -DES -IND.

Eles querem acabar conosco.

Permissão 63)

/i= ko -tne -ka/

1SGS= dar -PRMI -IND

Eu aceito dar.

Causativização 64)

/ɔtska jadedwa kfafa -ne -ka/

homem menino dormer -CSTV -IND

O homem faz o menino dormir.

Imediatividade 65)

/seja satʃidʒone -ho -so ta= samake -da -ka/

moça namorar -AG -FEM 3SGS= casar -IMD -IND

(47)

Plural

66)

/ja= ke sa= ne-ka ja= ekhde -ho -wati -sato -hele/ 1PLS= LOC.POSP EXPL= EXI-IND 1PLPOS= saber -AG -INTENS -PL -IMED

Nós temos os nossos que já sabem muito.

Velocidade

67)

/e= tʃi -ma tha= tʃito -hane -ka -se -hele

3SGS= chegar -TEMP.PART 3PLS= atirar -VEL -IND -PAS -IMED

Quando ela chegou, eles já atiraram rapidinho/ no mesmo instante.

1.2.2.2 Sufixos flexionais

Os sufixos flexionais são morfemas que veiculam noções de modo, tempo, aspecto e

modalidade, entre outras.

1.2.2.2.1 Sufixos de modo

Os sufixos que expressam o modo da forma verbal ocupam a posição em seguida à

raiz, ou, no caso de esta ter sofrido modificação por um (ou mais de um) dos sufixos

derivacionais, depois desses sufixos.

Indicativo

68)

[ˈdʒoske likuˈliʎa ˈke i a foːˈja koˈkahe]

/i= o -seke likuli -ʎa ke i= a= fo:ja ko -ka -he/

1SGS= ir -SUBJ ouricuri -DEF LOC.POSP 1SGS= 2SGO= colher dar -IND -FUT

(48)

69)

[aedãneˈʃi]

/a= e= dane -ʃi/ 2SGS= 3SGO= bater -IMP.

Bata nele.

Assertivo

70)

[iekʰdedeˈdo]

/i= ekʰede -dode -do/

1SGS= saber -NEG –ASS

Eu não sei mesmo.

Assertivo/futuro

71)

[ˈdʒõne]

/i= o -ne/

1SGS= ir -ASS.FUT

Eu irei.

Infinitivo

72)

[ejniˈʃi ˈdʒote i ˈti ˈtuj]

/ejni -ʃi i= o -te i= ti tuj/

esperar -IMP 1SGS= ir -INF 1SGPOS= casa DIR.POSP

(49)

Simultaneidade

73)

[tʰa ˈtʃmã saˈke tʰa tʃaˈkaˈhlede]

/tha= tʃi -ma sake tha= tʃa -ka hle dehe/ 3SGS= chegar -SIM junto 3SGS= encontrar -IND IMED ADM

Quando eles chegaram já se encontraram!

Condicional

74)

[fliˈtʃa tdnisekekeˈa dʒokakeˈa ˈiwte]

/flitʃa tdni -seke -kea i= o -ka -kea i= o -te/

chuva sair -SUBJ -COND 1SGS= ir -IND -COND 1SGS= ir -INF

Se a chuva parasse eu iria sair.

1.2.2.2.2 Sufixos de tempo

Tempo é expresso por sufixos que se agregam à última posição da forma verbal,

marcando o limite da palavra gramatical verbo.

Presente

75)

[i feːˈtõːkʲa oˈwa feˈja te]

/i= feetone -ka -ø owa feja te/

1SGS= trabalhar -IND -PRES esta terra INSTR.POSP

Eu trabalho nesta terra.

Passado

76)

[jaːˈdedʷa noˈkase tʃʰlɛkˈtuj]

/jadedwa no -ka -se tʃhlɛka tuj/

menino ir -IND -PAS árvore DIR.POSP

(50)

77)

[sõma ikfafˈkahe o:ˈke]

/soma i= kfafa -ka -he owe ke/

amanhã 1SGS= dormer -IND -FUT 1SGPRON LOC.POSP

Amanhã eu dormirei aqui.

1.2.2.2.3 Sufixos tempo/aspecto

Três sufixos expressam noções temporais, mas carregam um sema de aspecto. São os

sufixos /-ʎa/, passado remoto imperfeito, o sufixo /-kʰia], que expressa noção de tempo

passado e aspecto imperfeito, e o sufixo /-khane/, com valor continuativo em qualquer tempo. Cada um desses morfemas apresenta comportamento diferentes. Enquanto /-ʎa/ tem

posição fixa imediatamente depois da raiz ou do tema, /-kʰia/ pode ocupar essa posição, mas

pode ainda ocorrer na posição de morfema de tempo ou coocorrer com o morfema de tempo

passado /-se/. O morfema /-khane/ comporta-se do mesmo modo que os morfemas

derivacionais.

Passado remoto 78)

[ˈneho de tʰa kleʃiʎaˈka ˈdehe ˈfuli i ˈsej foãˈnej]

/neho de tha= kleʃi -ʎa -ka dehe fuli i se i fowane i/ isso FON.POSP 3SGS= passear -PAS.REM -IND ADM rio TRAJ mato TRAJ serra TRAJ

Então eles passeavam frequentemente pelo rio, pelo mato, pela serra.

Passado/Imperfeito 79)

[i natsaˈka te lɛːnekʰiaˈka]

/i= natsaka te lɛ:ne -khia -ka/

1SGS= feijão INSTR.POSP arrancar -IMPF -IND

(51)

Continuativo 80)

[i fɔẽːˈːkʲa oˈwa ˈfuli ke]

/i= fɔene -khane -ka owa fuli ke/

1SGS= pescar -CONT -IND -PRES este rio LOC.POSP

Eu ainda pesco neste rio.

1.2.3 Adjetivos

Costa (1999, p. 131) afirma o seguinte sobre os adjetivos em Yaathe:

A classe de adjetivos em Yaathe é fechada, com poucos membros. Os adjetivos verdadeiros são, como na maior parte das línguas do mundo, aqueles que codificam propriedades mais prototípicas: tamanho, forma, textura, avaliação, cor, distância e gosto.

Os adjetivos verdadeiros são nomes, a notar pela marca de definição, ou são derivados de nomes, pela presença do sufixo ja/ _ esse sufixo varia como a/ e /-wa/. Agora, há expressões adjetivais que são codificadas em formas verbais terminadas em /-ka/ e outras em /-dowa/. As formas terminadas em /-ka/ apontam para características mais dinâmicas, enquanto que as formas terminadas em /-dowa/ para características menos dinâmicas. Por isso, acreditamos haver uma distinção aspectual entre as duas formas de caracterização, principalmente se levarmos em conta que essas formas de expressão são, na verdade, formas verbais.

Como a morfologia do adjetivo, em Yaathe, é igual à do nome, podemos supor que a origem do adjetivo, nessa língua, tenha sido o nome. Entretanto, deve-se também notar que os significados adjetivais representados por elementos de superfície com forma verbal não recebem as marcas morfológicas do nome – a menos que essas formas sejam participiais.

Adjetivos, em predicados nominais (estado), ou verbais (mudança de estado), podem receber categorias como tempo, no primeiro caso, e tempo e modo, no segundo, mas não aspecto, aproximando-se, assim, mais dos nomes do que dos verbos.

Nota-se, nessa descrição, certa indefinição quanto a uma tomada de decisão entre

colocar os adjetivos na classe dos nomes ou na classe dos verbos.

Sendo adjetivos uma classe híbrida, optamos por considerar que palavras como

adjetivos, isto é, palavras que expressam propriedades dos seres, constituem raízes que podem

ser atualizadas como nome ou como verbo no discurso, dependendo da sua inserção na

estrutura sintática. Sendo Yaathe uma língua sem cópulas, poderia ser interessante considerar

adjetivos como uma classe de verbos. Entretanto, há situações em que os adjetivos se

comportam como nomes, uma vez que recebem sufixos que são categorizados nominalmente,

como gênero, podendo, inclusive, ser a única evidência quanto ao gênero de um nome, uma

vez que poucas palavras são marcadas com relação a essa categoria morfológica, como

(52)

[feˈtʃa tʃʰɔloˈãne ˈke]

/fetʃa tʃʰɔloa -ne ke/

sol quente -FEM LOC.POSP

no sol quente

1.2.4 Advérbios

Apenas uns poucos significados são expressos por formas que podem ser

consideradas verdadeiros advérbios ou advérbios simples:

– lugar:

[ˈũna]

82)

[ˈufa]

83)

–velocidade:

[ekũmãˈsãj] devagar

84)

– tempo:

[ˈhle] já, agora (PART/ CONJ. SUBORD)

85)

[kasˈke] novamente (REPETIÇÃO)

86)

A maior parte dos significados adverbiais é codificada em pronomes e nomes, que

recebem marcação de caso.

87)

[oːˈke]

/owe ke/

eu LOC.POSP

aqui (Lit.: em mim)

88)

[jaˈke]

/ja= ke/

1PL= LOC.POSP

Imagem

Figura 2 - Variação de F0 [ja ˈtʰo hiakaˈse i]
Figura 3 - Variação de F0 [ja ˈkʰodʒo neˈse]
Figura 4 -Variação de F0 [e ˈfnite]

Referências

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