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Stalking ou perseguição obsessiva: a civil frente aos direitos da personalidade

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Academic year: 2018

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ FACULDADE DE DIREITO

PRISCILA PONTE NÓBREGA

STALKING OU PERSEGUIÇÃO OBSESSIVA: A RESPONSABILIDADE CIVIL

FRENTE AOS DIREITOS DA PERSONALIDADE

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PRISCILA PONTE NÓBREGA

STALKING OU PERSEGUIÇÃO OBSESSIVA: A RESPONSABILIDADE CIVIL FRENTE AOS DIREITOS DA PERSONALIDADE

Monografia submetida à Coordenação do Curso de Graduação em Direito da Universidade Federal do Ceará, como requisito parcial para obtenção do grau de bacharel em Direito.

Área de concentração: Direito Civil

Orientador: Professor Dr. William Paiva Marques Júnior

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N676s Nóbrega, Priscila Ponte.

STALKING OU PERSEGUIÇÃO OBSESSIVA : A RESPONSABILIDADE CIVIL FRENTE AOS DIREITOS DA PERSONALIDADE / Priscila Ponte Nóbrega. – 2016.

49 f.

Trabalho de Conclusão de Curso (graduação) – Universidade Federal do Ceará, Faculdade de Direito, Curso de Direito, Fortaleza, 2016.

Orientação: Prof. Dr. William Paiva Marques Júnior.

1. Stalking. 2. Personalidade. 3. Responsabilidade. 4. Dano. I. Título.

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PRISCILA PONTE NÓBREGA

STALKING OU PERSEGUIÇÃO OBSESSIVA: A RESPONSABILIDADE CIVIL FRENTE AOS DIREITOS DA PERSONALIDADE

Monografia apresentada à Universidade Federal do Ceará, como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel em Direito, sob a orientação do Prof. Dr. William Paiva Marques Júnior.

Aprovada em: ___/___/______.

BANCA EXAMINADORA

________________________________________ Prof. Dr. William Marques Paiva Júnior (Orientador)

Universidade Federal do Ceará (UFC)

_________________________________________ Profa. Me. Maria José Fontenelle Barreira Araújo

Universidade Federal do Ceará (UFC)

_________________________________________ Mestranda Vanessa de Lima Marques Santiago

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AGRADECIMENTOS

Aos meus pais, Dulce e Leonardo, por terem me dado liberdade para escolher o Direito e por terem me ensinado perseverança para persegui-lo.

Aos meus irmãos, Ana Carla e Guilherme, pela companhia nos dias tranquilos e a compreensão nos dias complicados.

Ao Bruno, por ter me dado o incentivo necessário para que eu terminasse esse trabalho e por todo o carinho nos últimos anos.

Aos amigos Daniel, Paula e Alana, por terem enfrentado os percalços dos últimos cinco anos comigo, deixando todos os dias mais leves.

À Aline e Gabriela, pelas palavras doces e por todo o apoio nos momentos difíceis.

Ao meu orientador, Prof. Dr. William Marques, por ter sido uma luz e um guia durante a confecção deste trabalho e um professor inspirador durante a graduação.

À Prof. Me. Maria José, por ter me ensinado a amar o Direito Civil no início da graduação e por ter aceitado o convite para estar presente em minha banca.

À Vanessa Marques, por ter aceitado meu convite para participar de minha banca com tanto carinho, além de ter sido uma colega incrível durante a graduação.

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“E uma das coisas que aprendi é que se deve viver apesar de. Apesar de, se deve comer. Apesar de, se deve amar. Apesar de, se deve morrer. Inclusive muitas vezes é o próprio apesar de que nos empurra para frente.”

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RESUMO

Stalking é um fenômeno que tem crescido na mídia e recebido mais atenção entre os juristas nacionais. O fenômeno acontece quando alguém passa a perseguir uma outra pessoa específica, utilizando-se de diversas formas de contato, repetitivamente, invadindo o espaço da vítima. Essa conduta se mostra problemática por ferir os direitos da personalidade da pessoa perseguida. Esses direitos emanam da dignidade humana, protegida pela Constituição Federal, devendo ser protegidos de qualquer assédio. A perseguição protagonizada pelo stalker causa na vítima um temor por si e por sua família, fragilizando seu estado psicológico e, por vezes, sua saúde física. Observando-se a necessidade de reparação proveniente da perseguição, é imperioso que se apure a culpa do perseguidor diante dos danos extrapatrimoniais causados à vítima. É impossível ser recuperado o status quo ante, uma vez que o equilíbrio psicológico da vítima não pode ser restaurado ao status inicial, devendo o perseguidor repará-la mediante indenização decorrente de danos morais.

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ABSTRACT

Stalking is a phenomenon that has grown in the media and received more attention from national jurists. The phenomenon takes place when someone starts to harass a specific person, using different means to contact them and repeatedly invading the victim’s personal space. This behavior is problematic because it infringes the stalked person’s personality rights. These rights arise from human dignity, protected by the Federal Constitution, and must be protected from any harassment. The act of stalking causes in the victim fear for themselves and their family, weakening their psychological state and, sometimes, their physical health. Considering the need for reparation due to the persecution, it is imperative that the stalker’s blame be investigated in light of the extra-patrimonial damages caused to the victim. It is impossible to recover the status quo ante, since the victim’s psychological balance can’t be restored to its initial status, so the stalker must compensate them with indemnification for moral damages.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ... 9

2 DIREITOS DA PERSONALIDADE: CONSTRUÇÃO HISTÓRICA, CARACTERÍSTICAS E PECULIARIDADES... 11

2.1 Construção histórica ... 13

2.2 Características ... 15

2.3 Espécies de direitos da personalidade ... 17

3 STALKING OU PERSEGUIÇÃO OBSESSIVA: TIPIFICAÇÃO E ANÁLISE DE CASOS ... . 23

3.1 Comportamentos do stalker ... 25

3.2 Tipos de stalkers ... 29

3.3 Casos de stalking ... 31

3.3.1 Lilly Allen ... 31

3.3.2 Louise Maria ... 33

4 RESPONSABILIDADE CIVIL ORIUNDA DE CASOS DE STALKING ... 34

4.1 Culpa ... 36

4.2 Dano Moral ... 38

4.2.1 Dano Moral e Stalking ... 39

4.3 Nexo Causal ... 41

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 43

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1. INTRODUÇÃO

Todo ser humano é dotado de direitos personalíssimos, adquirindo-os com o nascimento com vida e abandonando-os frente ao óbito. Os direitos da personalidade, como são chamados, emanam da personalidade íntima e psíquica de cada pessoa, protegendo seus direitos mais básicos. Direitos estes impossíveis de serem limitados, estando, dentre eles, o direito à vida, ao nome, à privacidade, à imagem, à honra. Os direitos personalíssimos não podem ser renunciados, tampouco podem ser violados por outrem, uma vez que emanam da dignidade humana, considerada como fundamento para a República Federativa do Brasil, exposto na Constituição Pátria em seu art. 1°, III.

Por sua vez, o stalker viola diversos direitos personalíssimos, tendo em vista que o stalking é um fenômeno que envolve diversas aproximações físicas ou virtuais, comunicações não consensuais, ameaças, de forma a causar temor em uma pessoa específica. As práticas do perseguidor podem parecer banais, como enviar presentes, fazer declarações de amor, ligar diversas vezes para a vítima e fazer aparições em festas ou no trabalho da pessoa perseguida, podendo evoluir para ações violentas e até morte. Dessa forma, os atos praticados pelo stalker violam os direitos da vítima à intimidade, ao segredo, à privacidade e até à vida.

A responsabilidade civil dos atos do perseguidor deve ser considerada para garantir a reparação judicial do perseguidor à vítima que teve seus direitos da personalidade violados, podendo, assim, exigir que haja indenização diante dos danos morais suportados por esta e por sua família. Não se pode restabelecer o status quo ante na violação dos direitos da personalidade, pois uma vez violados é impossível restaurá-los, devendo-se utilizar a reparação monetária frente aos inconvenientes sofridos pela pessoa perseguida.

Neste trabalho, procuramos discutir, inicialmente, os direitos da personalidade, apresentando sua origem com a da pessoa nascida com vida, uma vez que são direitos inatos ao ser humano. Analisa-se também sua construção histórica, demonstrando seu início na Idade Média, quando ganha força o Cristianismo, dando enfoque à dignidade do ser humano. Em seguida, ressaltamos que os direitos personalíssimos têm como características serem intransmissíveis, irrenunciáveis, absolutos, imprescritíveis, ilimitados, vitalícios, extrapatrimoniais e indisponíveis.

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desagradáveis, presentes com significados escusos, podendo chegar à violência. Neste momento são classificados os perseguidores e relatados casos de perseguição.

Conclui-se com o estudo acerca da responsabilidade civil, elencando seus elementos. Pondera-se o cabimento de ressarcimento frente ao ato lesivo causado à vítima pelo perseguidor, analisando decisões proferidas por Tribunais de Justiça.

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2. DIREITOS DA PERSONALIDADE: CONSTRUÇÃO HISTÓRICA, CARACTERÍSTICAS E PECULIARIDADES

O Código Civil de 2002 substituiu o termo “homem” por “pessoa” e explicita em seu Art. 1° que: “toda pessoa é capaz de direitos e deveres na ordem civil”. De acordo com Venosa (2004), “pessoa” é o ser ao qual se atribuem direitos e obrigações. O conceito de pessoa está intimamente ligado ao de personalidade, que exprime a aptidão genérica para adquirir direitos e contrair obrigações (DINIZ, 2008).

O início da personalidade civil está disposto no Art. 2° do Código Civil Brasileiro: “A personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro”. A personalidade é um conjunto de características inerentes ao indivíduo, que se intuem facilmente, que até dispensariam menção dada sua inarredabilidade da condição humana e que configura pressuposto da própria existência da pessoa (MONTEIRO, 2012).

A personalidade jurídica é projeção da personalidade íntima, psíquica de cada um (VENOSA, 2004). Os direitos da personalidade são direitos comuns da existência, porque é uma simples permissão dada pela norma jurídica de defender aquilo que a natureza lhe deu (DINIZ, 2008). Toda pessoa é dotada de personalidade, sendo os direitos relativos a esta inatos ao ser humano. Os direitos da personalidade são os que resguardam a dignidade humana; ninguém pode, por ato voluntário, dispor de sua privacidade, renunciar à liberdade, renunciar ao nome para utilização de outrem, renunciar ao direito de pedir alimentos no campo de família, dentre outros (VENOSA, 2004). É o direito subjetivo de exigir um comportamento negativo de todos, protegendo um bem próprio, valendo-se de ação judicial (DINIZ, 2008).

Os direitos de personalidade sempre existiram, mas só foram devidamente reconhecidos pelo Direito diante de fatos históricos que revelaram, ao longo do tempo, a importância do ser humano e justificaram a sua proteção pelo direito privado (MIRANDA, 2000). Eles podem estar ligados ao corpo, ao nome, à imagem, à identidade, não existindo rol taxativo, tendo em vista que os direitos referentes à personalidade são inumeráveis, dinâmicos, variáveis no tempo e no espaço, com isso, estão evoluindo constantemente, sendo descartável um rol que tente enumerar os direitos intrínsecos à personalidade.

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inerentes ao ser humano, não assumindo o risco de uma lista taxativa, para que possa haver, posteriormente, desenvolvimento jurisprudencial e doutrinário (MONTEIRO, 2012). A tutela dos direitos da personalidade deve ser integral, garantindo a sua proteção em qualquer situação (DONEDA, 2005, online).

No mundo atual, a sociedade vive a evolução da ciência e da tecnologia. Diante desse quadro, é inegável a importância dos direitos da personalidade para garantir o respeito à vida, à liberdade, à dignidade, à integridade física, ao nome, ao segredo, aos valores morais e intelectuais, todos necessários ao desenvolvimento da personalidade humana (FERMENTÃO, 2006, online). Esse desenvolvimento tecnológico e a atual dinâmica social criam uma demanda de proteção à pessoa humana que deve ser realizada com novos instrumentos e por todo o ordenamento (DONEDA, 2005, online).

A personalidade não é um direito, de forma que ela apenas apoia os direitos e deveres que dela irradiam, sendo apenas pressuposto de direito. Trata-se, assim, de direitos cujo objeto são bens jurídicos que se convertem em projeções físicas ou psíquicas da pessoa humana, por determinação legal que os individualiza para lhes dispensar proteção (DUTRA; FINAMORI, online). Reconhece-se, de acordo com Maria Helena Diniz (2008), uma dupla dimensão nos direitos da personalidade: a axiológica, pela qual se materializam os valores fundamentais da pessoa, e a objetiva, pela qual consistem em direitos assegurados legal e constitucionalmente. O direito objetivo autoriza a pessoa a defender o que lhe é próprio, como a identidade, a liberdade, a honra, o nome, a imagem.

A Constituição Federal de 1988 enumerou em seu Art. 5°, dentre outros, novamente sem enumeração taxativa, o direito à vida, à liberdade, à igualdade, à integridade física, à inviolabilidade da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem, não se podendo esquecer a proibição de tortura e de atos que degradem o ser humano (MONTEIRO, 2012). O fato de um direito não estar citado na Constituição ou no Código Civil não quer dizer que ele não exista ou que não goze de proteção legal. Os direitos da personalidade reputam-se direitos subjetivos privados não patrimoniais. De fato, visam proteger a pessoa em face de todos os demais particulares, sendo oponíveis erga omnes (DUTRA; FINAMORI, online)

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2.1. Construção Histórica

Não há consenso doutrinário a respeito da origem histórica dos direitos da personalidade. Alguns doutrinadores afirmam que ocorreu na Idade Média através da busca espiritual trazida pelo cristianismo (MINUCCI, online). Os direitos da personalidade como categoria de direitos subjetivos são relativamente recentes, porém, na Antiguidade, já estavam sob tutela jurídica, tendo ofensas físicas e morais punidas através da actio injuriarum, em Roma, e da dike kakegorias, na Grécia (DINIZ, 2008). Em Roma, a proteção dada aos direitos da personalidade era feita por medidas isoladas, apenas reconhecendo aquelas ofensas feitas por meio de injúria, não havendo sistematização desses direitos, enquanto, no mesmo período, na Grécia, a tutela desses direitos possuía uma natureza exclusivamente penal, relacionando-se atos como lesão corporal, difamação, estupro, dentre outros (MENDES, 2009).

O cristianismo trouxe consigo a ideia de fraternidade universal, ajudando no reconhecimento desses direitos durante a Idade Média, muitas vezes reconhecida como um período obscuro. No mesmo período, com pensadores como São Tomás de Aquino e Santo Agostinho, a dignidade humana passou a tomar formas mais firmes (MENDES, 2009). A Carta Magna, na Inglaterra, durante o séc. XIII, passou a admitir direitos próprios do ser humano (DINIZ, 2008).

Os direitos da personalidade aparecem como intrínsecos à razão humana. A ideologia que alicerçou as revoluções burguesas do século XVIII começou a surgir já no humanismo renascentista (século XVI). Com a Revolução Francesa, em 1789, foi promulgada a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, que influenciou grandemente a incorporação de princípios como a dignidade da pessoa humana, a valorização da pessoa e liberdade do cidadão, impulsionando a defesa dos direitos individuais (MENDES, 2009). Após a Segunda Guerra Mundial, diante das agressões causadas pelos governos totalitários, tomou-se consciência da importância dos direitos da personalidade para o mundo jurídico. Dessa forma, várias reuniões aconteceram para resguardar esses direitos, como a Assembleia Geral da ONU em 1948, a Convenção Europeia de 1950 e o Pacto Internacional das Nações Unidas.

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O primeiro diploma legal a positivar especificamente algum desses direitos foi a Lei Romena de 18 de março de 1895, que dispunha sobre o direito ao nome. Pouco depois, já em 1900, entrou em vigor o Código Civil Alemão (BGB), que dispõe em seu artigo 12 também sobre o direito da pessoa a um nome (DUTRA; FINAMORI, online). O Código Civil Italiano de 1942 também prevê os direitos da personalidade em seu primeiro capítulo, nomeado de “Delle persone e della famiglia” (Das pessoas e da família), que prevê em seus Arts. 5° a 10° os direitos ao corpo, ao nome e os direitos à imagem.

A Lei Fundamental da República Federal da Alemanha de 1949 passou a prever, no seu artigo 1°, que:

1. A dignidade da pessoa humana é intangível. Respeitá-la e protegê-la é obrigação de todo o poder público.

2. O povo alemão reconhece, por isto, os direitos invioláveis e inalienáveis da pessoa humana como fundamento de toda comunidade humana, da paz e da justiça no mundo.

3. Os direitos fundamentais, discriminados a seguir, constituem direitos diretamente aplicáveis e vinculam os poderes Legislativo, Executivo e Judiciário.

Além disso, em seus Arts. 2° ao 17°, prevê, entre outros, os direitos à liberdade, à igualdade, ao sigilo, à inviolabilidade de domicílio, ao direito de petição.

Na Áustria e na Suíça, a ideia do direito geral de personalidade criou raízes legislativas. Nos países anglo-saxônicos, os tipos de situação se tornaram cada vez mais amplos em defesa do direito de personalidade (FERMENTÃO, 2006, online).

No Brasil, tem-se na Constituição Imperial 35 incisos do art. 179, tratando dos “Direitos Civis e Políticos do Cidadão Brasileiro”, resguardando o direito à liberdade, à inviolabilidade de domicílio, direitos autorais e segredo epistolar (DUTRA; FINAMORI, online). As Constituições de 1891, 1934, 1937 e 1967 seguiram dando proteção aos mesmos direitos elencados na Carta Magna imperial, com evoluções discretas, como a inclusão de um capítulo próprio para esses direitos, e resguardando outros direitos como sigilo à correspondência e direitos autorais.

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5° do mesmo diploma, ressalta-se a tutela ao direito à vida, à liberdade, à honra, ao sigilo, à intimidade, à imagem, à criação intelectual. Além disso, a Carta Magna garante uma tutela genérica no Inciso XLI do mesmo artigo, quando diz que: “a lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais”. No parágrafo 2° do Art. 5°, a CF também deixa claro queos direitos e garantias expressos nela não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ficando claro que os direitos da personalidade não são limitados, podendo ser protegidos independentemente de previsão legal.

Na vigência do Código de 1916, os juristas brasileiros tinham a ideia de que possuir personalidade era ter aptidão, atributo para ser titular de direitos, ou seja, aptidão para titularizar relações jurídicas, ou melhor, ser sujeito de direito (GIRÃO, 2012, online). Nessa época, a doutrina confundia a ideia de personalidade com a titularização das relações jurídicas.

O Código Civil Brasileiro de 2002, como já citado, tem um capítulo intitulado “Dos direitos da personalidade”, no entanto não enumera esses direitos, evitando assim um rol taxativo ou exaustivo, elencando apenas hipóteses que assegurem o direito da pessoa ao próprio corpo. A prioridade é especificar direitos, adaptando ao caráter prioritário constitucional, deixando com que a jurisprudência, a doutrina e a legislação extravagante absorvam os princípios da Constituição e adaptem ao caso concreto.

O CCB trata principalmente da proteção à integridade física e à integridade moral. No âmbito da integridade física fica claro que não é possível dispor do próprio corpo se não por exigência médica, afastando hipóteses de remoção de órgãos, cirurgias e atos que atentem contra a saúde e integridade, quer praticados por terceiros, quer por iniciativa da sociedade, quer por ato da própria pessoa. Aceitam-se, no entanto, medidas compulsórias em favor da coletividade, como campanhas de vacinação em casos de epidemias. Já a proteção à integridade moral é referente ao nome, à imagem, à honra e à vida.

2.2. Características

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características que não podem ser negligenciadas, sendo estes direitos absolutos, imprescritíveis, ilimitados, vitalícios, extrapatrimoniais e indisponíveis.

São absolutos por serem oponíveis erga omnes, sendo assim direitos subjetivos de natureza privada (VENOSA, 2004). São extrapatrimoniais, pois estão fora do patrimônio pecuniário, sendo insuscetíveis de aferição econômica, tanto que, se impossível for a reparação in natura ou a reposição do status quo ante, a indenização pela sua lesão será o equivalente (DINIZ, 2008).

São intransmissíveis, visto não poderem ser transferidos à esfera jurídica de outrem. Os direitos da personalidade nascem e se extinguem com seu titular e são dele inseparáveis. Dessa forma, ninguém pode usufruir de bens de terceiros, como a vida, a liberdade e a honra. São também irrenunciáveis, visto que não podem ultrapassar a esfera de seu titular (DINIZ, 2008).

São ilimitados ante a impossibilidade de se imaginar um número fechado de direitos da personalidade, tendo em vista que não se pode resumi-los ao arrolado normativamente (DINIZ, 2008). Os direitos da personalidade são mutáveis com o tempo, como já dito neste trabalho, é impossível enumerá-los e prever quantos existirão diante das conquistas tecnológicas e econômico-sociais, logo esses direitos devem ser tutelados frente ao caso concreto. O Enunciado n° 4 da Jornada de Direito Civil admite que a limitação aos direitos da personalidade é possível desde que não seja permanente nem geral. O Código Civil, em seu Art. 13, admite implicitamente sua disponibilidade ao aceitar doação de órgãos e tecidos para fins terapêuticos, desde que não comprometa a integridade física do autor.

Os direitos da personalidade também têm a característica de serem vitalícios, terminando apenas com o advento da morte. O aniquilamento não é absoluto, tendo em vista que existem direitos que perduram após o óbito. A família do morto poderá exigir respeito à imagem, à honra e ao seu direito de autor (DINIZ, 2008). Pelo mesmo motivo são imprescritíveis os direitos, tendo em vista que perduram enquanto durar a vida humana (VENOSA, 2004). Além disso, não se extinguem pelo uso, nem pela inércia na intenção de defendê-los (DINIZ, 2008). Todos os direitos da personalidade estão dispostos em cláusula pétrea constitucional, logo não é possível impor prazos para sua aquisição ou defesa. Então, se o objetivo for indenização civil por lesão direta, tem-se a imprescritibilidade (DINIZ, 2008). Por outro lado, o Código Civil de 2002, em seu Art. 206, §3°, V, dispõe que para dano patrimonial ou dano moral indireto o prazo prescricional é de três anos.

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estampada em documento de identificação (DINIZ, 2008). Além disso, pessoas famosas poderão dispor de sua imagem para a promoção de venda de produtos, mediante remuneração convencionada. Também é possível que alguém disponha do corpo para uma ação altruísta, como doar sangue ou órgãos, observando o disposto no Código Civil que limita a disposição do corpo, não podendo a ação altruísta resultar em diminuição permanente da integridade física. Então, podemos perceber que os direitos da personalidade podem ser objeto de contrato, como o de concessão de uso de imagem ou o de merchandising para inserir em produtos uma criação intelectual. Sendo assim, os direitos da personalidade têm disponibilidade relativa (DINIZ, 2008).

2.3 Espécies de direitos da personalidade

Os direitos da personalidade não são numerados por serem ilimitados, no entanto, alguns desses direitos são exaustivamente protegidos em todos os códigos que versaram sobre o assunto na Idade Moderna. Sendo estes os direitos que protegem a vida, a imagem, a integridade física e moral, a privacidade, o nome, entre outros, não é possível afirmar qual direito é mais importante, sendo imperioso que haja ponderação entre todos eles.

Dentre esses direitos, indubitavelmente o mais exaustivamente protegido é o direito à vida. Sua relevância é clara quando a legislação veda o homicídio e o suicídio, incluindo a eutanásia. O direito à vida inicia-se com o nascimento e perdura até a morte, importando apenas que o nascimento ocorra com vida, independentemente de parto ou forma de concepção (MONTEIRO, 2012). Dessa forma, o Art. 15 do Código Civil Brasileiro aduz que: “Ninguém pode ser constrangido a submeter-se, com risco de vida, a tratamento médico ou a intervenção cirúrgica”, ficando clara a proteção à vida acima de outros direitos. O direito à vida se verifica em toda a sua plenitude, impondo-se que seja respeitado pelo titular e por toda a sociedade (MONTEIRO, 2012).

Outro momento em que podemos perceber o direito à vida como principal é em casos, por exemplo, de transfusão de sangue a uma Testemunha de Jeová; quando houver risco à vida do paciente deve-se fazer ponderação priorizando o direito à vida sobre o direito à liberdade religiosa. Caso não haja risco à vida, deve ser respeitada a liberdade religiosa, e o médico deverá tentar ajudar o paciente por meios alternativos.

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amputação de uma perna gangrenada que poderia comprometer o restante do corpo do paciente.

A integridade física é outro direito constantemente assegurado. O Código Civil pátrio, em seu Art. 13, explana que: “Salvo por exigência médica, é defeso o ato de disposição do próprio corpo, quando importar diminuição permanente da integridade física, ou contrariar os bons costumes”. O dispositivo aplica-se, na verdade, aos atos de disposição de partes do corpo. A princípio, ficam permitidos os atos de disposição de partes renováveis do corpo, sujeitos, porém, a regulamentação (como no caso da doação de sangue) (DONEDA, 2005, online). Dessa forma, o direito ao corpo é indisponível quando representar um perigo à integridade física.

É possível a disposição do corpo que não cause danos permanentes à pessoa, como transplantes de órgãos duplos, doação de sangue, doação de medula óssea. O Enunciado n° 6, aprovado na Jornada de Direito Civil, esclarece que no Art. 13 do Código Civil, ao falar de exigência médica, são considerados os aspectos físicos e psicológicos (DINIZ, 2008). Com essa interpretação é possível que se autorizem as cirurgias de mudança de sexo em transexuais, visto que o corpo é a adequação da pessoa a uma situação existencial mais apropriada para o desenvolvimento da sua personalidade.

Nos esportes competitivos e em determinadas profissões, como bombeiro ou policial, é frequente a ocorrência de lesões corporais graves, mas o risco é assumido voluntária e conscientemente por aqueles que praticam essas atividades (MONTEIRO, 2012).

A integridade moral está intimamente ligada à integridade física, como pudemos ver no Enunciado n° 6. É um direito para que se mantenha a lucidez mental do titular, opondo-se a qualquer atentado que venha a atingi-la, oponível a todos. Também se impede que, por toda a vida, qualquer outra pessoa afete sua mente de modo a causar-lhe danos leves ou graves, permanentes ou transitórios.

O nome civil da pessoa natural é mais do que simples denominação, é de extrema relevância na vida social, por ser um direito subjetivo da personalidade e também de interesse da coletividade, já que carrega a função de distinguir os indivíduos e atribuir-lhes corretamente direitos e deveres (CUNHA, online). O direito ao nome está tutelado nos Arts. 16 a 19 do Código Civil:

Art. 16. Toda pessoa tem direito ao nome, nele compreendidos o prenome e o sobrenome.

Art. 17. O nome da pessoa não pode ser empregado por outrem em publicações ou representações que a exponham ao desprezo público, ainda quando não haja intenção difamatória.

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Art. 19. O pseudônimo adotado para atividades lícitas goza da proteção que se dá ao nome.

O nome está protegido contra atentados de terceiros, por ser o sinal exterior pelo qual se individualiza a pessoa, identificando-a na família e na sociedade (DINIZ, 2008). O direito ao nome está instrumentalizado na Lei n° 6.015/73 e suas alterações legislativas, em seus artigos 51 a 55, que obrigam todo nascimento a ser levado ao conhecimento do registro civil, em que será posto um nome à criança. O direito ao nome e a importância do nome para a pessoa natural estão no mesmo plano de sua capacidade civil e nos demais direitos inerentes à personalidade (VENOSA, 2004).

Reprime-se abuso cometido por terceiro que o exponha em publicações ou representações ao desprezo público, violando a respeitabilidade de seu titular, mesmo sem intenção de difamar, por atingir sua boa reputação moral e profissional (DINIZ, 2008). Quanto ao art. 18, temos o Enunciado 278 da IV Jornada de Direito Civil: “A publicidade que venha a divulgar, sem autorização, qualidades inerentes a determinada pessoa, ainda que sem mencionar seu nome, mas sendo capaz de identificá-la, constitui violação a direito da personalidade”. Também é relevante o fato de que o direito à informação e à liberdade de expressão foi lembrado pelo legislador, que não vetou a pura e simples publicação do nome alheio, porém somente em casos que exponham a pessoa ao desprezo público (CUNHA, online).

O direito ao pseudônimo, como os adotados por escritores, também recebe a proteção dada ao nome, aplicando-se a ele todas as disposições anteriores, sendo vetada a sua utilização sem autorização de seu titular, alcançando também heterônimos, como os utilizados por Fernando Pessoa ao assinar seus poemas como Álvaro de Campos, Alberto Caeiro, entre outros.

O Art. 20 do Código Civil tutela o direito à imagem quando diz que:

Art. 20. Salvo se autorizadas, ou se necessárias à administração da justiça ou à manutenção da ordem pública, a divulgação de escritos, a transmissão da palavra, ou a publicação, a exposição ou a utilização da imagem de uma pessoa poderão ser proibidas, a seu requerimento e sem prejuízo da indenização que couber, se lhe atingirem a honra, a boa fama ou a respeitabilidade, ou se se destinarem a fins comerciais.

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CIVIL. DANOS MORAIS E MATERIAIS. DIREITO À IMAGEM E À HONRA DE PAI FALECIDO.

Os direitos da personalidade, de que o direito à imagem é um deles, guardam como principal característica a sua intransmissibilidade. Nem por isso, contudo, deixa de merecer proteção a imagem e a honra de quem falece, como se fossem coisas de

ninguém, porque elas permanecem perenemente lembradas nas memórias, como bens imortais que se prolongam para muito além da vida, estando até acima desta, como sentenciou Ariosto. Daí porque não se pode subtrair dos filhos o direito de defender a imagem e a honra de seu falecido pai, pois eles, em linha de normalidade, são os que mais se desvanecem com a exaltação feita à sua memória, como são os que mais se abatem e se deprimem por qualquer agressão que lhe possa trazer mácula. Ademais, a imagem de pessoa famosa projeta efeitos econômicos para além de sua morte, pelo que os seus sucessores passam a ter, por direito próprio, legitimidade para postularem indenização em juízo, seja por dano moral, seja por dano material. Primeiro recurso especial das autoras parcialmente conhecido e, nessa parte, parcialmente provido. Segundo recurso especial das autoras não conhecido. Recurso da ré conhecido pelo dissídio, mas improvido.

(STJ/REsp 521697/RJ/ RECURSO ESPECIAL 2003/0053354-3/ RELATOR: MINISTRO CESAR ASFOR ROCHA)

É também o direito que a pessoa tem de não ver a sua efígie exposta em público ou mercantilizada sem o seu consenso e não ter sua personalidade alterada material ou intelectualmente, causando dano à sua reputação (DINIZ, 2008). A esse respeito trata o Enunciado n° 5 da I Jornada de Direito Civil:

5 – Arts. 12 e 20: 1) as disposições do art. 12 têm caráter geral e aplicam-se, inclusive, às situações previstas no art. 20, excepcionados os casos expressos de legitimidade para requerer as medidas nele estabelecidas; 2) as disposições do art. 20 do novo Código Civil têm a finalidade específica de regrar a projeção dos bens personalíssimos nas situações nele enumeradas. Com exceção dos casos expressos de legitimação que se conformem com a tipificação preconizada nessa norma, a ela podem ser aplicadas subsidiariamente as regras instituídas no art. 12.

Tutelando sobre o mesmo assunto, temos o Enunciado n° 279 da IV Jornada de Direito Civil, que aduz:

279 – Art. 20. A proteção à imagem deve ser ponderada com outros interesses constitucionalmente tutelados, especialmente em face do direito de amplo acesso à informação e da liberdade de imprensa. Em caso de colisão, levar-se-á em conta a notoriedade do retratado e dos fatos abordados, bem como a veracidade destes e, ainda, as características de sua utilização (comercial, informativa, biográfica), privilegiando-se medidas que não restrinjam a divulgação de informações.

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quando se tratar de pessoa notória, como artistas ou políticos, não sendo isso, no entanto, uma permissão para que se devasse sua vida pessoal. A autora também enumera que o direito à imagem pode ser limitado quando for pessoa que exerça cargo público ou quando se tiver que garantir a segurança pública, prevalecendo o interesse social sobre o individual. Também não se pode evitar que seja utilizada sua imagem em caso de documento de identificação, por exemplo, ou em caso de moléstia grave que precise ser conhecida por cientistas.

A imagem moral, compreendendo o conceito que a pessoa tem de si própria, deve ser igualmente preservada, coibindo qualquer ato que vise atingi-la (MONTEIRO, 2012).

O Art. 21 do Código Civil protege o direito à privacidade que dispõe: “A vida privada da pessoa natural é inviolável, e o juiz, a requerimento do interessado, adotará as providências necessárias para impedir ou fazer cessar ato contrário a esta norma”. Segundo Maria Helena Diniz (2008), existem aspectos da vida da pessoa que precisam ser preservados de intromissões indevidas, mesmo que se trate de pessoa notória no que atina à vida familiar, à correspondência, ao sigilo bancário, ao laudo médico, aos hábitos de consumo, entre outros.

Washington de Barros Monteiro (2012), no mesmo sentido, explana que o direito à privacidade é o direito de ter seu gosto pessoal, intimidade do lar, amizades, lugares frequentados, medicamentos tomados sob proteção, devendo ficar fora da intromissão de quem quer que seja. Inclui-se também o direito ao sigilo de correspondência, comunicação telefônica e via internet. O direito ao sossego, ao silêncio, a não ser assediado por estranho em sua intimidade.

A proteção da privacidade é um dos temas mais delicados, isto pelo potencial de ofensas à personalidade ter crescido com o desenvolvimento tecnológico e também pela dificuldade de os instrumentos de tutela tradicionais do ordenamento realizarem adequadamente esta proteção (CUNHA, online). Não se deve entender que a proteção da privacidade não se possa fazer também por via da responsabilidade civil, apenas é patente a dificuldade em se utilizar este instituto quando o dano é tão dificilmente demonstrável, como em tantos casos de violação da privacidade (CUNHA, online). Numerosas normas legais se ocupam do assunto, como as convenções de condomínio que procuram assegurar a privacidade entre vizinhos (MONTEIRO, 2012).

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3. STALKING OU PERSEGUIÇÃO OBSESSIVA: TIPIFICAÇÃO E ANÁLISE DE

CASOS

A ação de stalking data da Antiguidade, vemos que não são poucas as literaturas que versam sobre perseguição obsessiva de outros por motivos de romance ou vingança. Atualmente, o fenômeno superou a associação com celebridades, passando a ocorrer com muitas mulheres e se transformando em um problema nas relações interpessoais. O termo “stalking” foi utilizado pela mídia, inicialmente, para descrever invasões à vida de celebridades por seus fãs com deficiências mentais, porém foi generalizado para atingir uma gama de comportamentos de assédio, principalmente em discussões domésticas. Existem poucos estudos acerca do assunto, pois apenas começou a ser estudado com atenção após a sua criminalização no Estado da Califórnia em 1990 (SPITZBERG, 2002, online).

Stalking se trata de um fenômeno envolvendo diversos tipos de comportamentos, motivações, pessoas e contextos em que ocorre. Por conta disso, não existe uma palavra em português que a traduza de modo satisfatório, tendo em vista sua complexidade de casos. O mais aproximado seria utilizar a palavra “perseguição” ou “perseguição obsessiva”, como vem sendo definida pelos pesquisadores que têm a língua portuguesa como principal, pode até ser traduzida como “assédio” em certos casos.

Apesar de ser um sistema complexo de ações, é possível encontrar diversas conceituações a respeito do assunto, tratando-o de forma semelhante ao apresentar os mesmos elementos para que o stalk seja reconhecido no caso concreto.

Conceitua-se a partir da definição contida na National Violence Against Women Survey, que explicita ser o stalking um curso de conduta direcionado a uma pessoa específica e que envolva repetitivas aproximações físicas ou virtuais; comunicação não consensual; ameaças verbais, escritas ou implícitas; ou uma combinação dessas táticas, de modo a causar temor a uma pessoa razoável.

De forma mais detalhada, define Damásio de Jesus (2008, online):

Stalking é uma forma de violência na qual o sujeito ativo invade a esfera de

privacidade da vítima, repetindo incessantemente a mesma ação por maneiras e atos variados, empregando táticas e meios diversos: ligações nos telefones celular, residencial ou comercial, mensagens amorosas, telegramas, ramalhetes de flores, presentes não solicitados, assinaturas de revistas indesejáveis, recados em faixas afixadas nas proximidades da residência da vítima, permanência na saída da escola ou trabalho, espera de sua passagem por determinado lugar, frequência no mesmo local de lazer, em supermercados.

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está vendendo sua residência, que perdeu dinheiro no jogo, que é procurada pela polícia, entre outros. Vai ganhando, com isso, poder psicológico sobre o sujeito passivo, como se fosse o controlador geral dos seus movimentos (JESUS, 2008, online).

Temos também a definição elaborada por James e Farnham (2003, online), que caracterizam o stalk como “repetitivas invasões e comunicações indesejadas, que tenham acontecido pelo menos 10 vezes num período de quatro semanas e que tenham feito a vítima temerosa ou apreensiva”. Frisam também os autores que as condutas praticadas pelo stalker são diversificadas e, em geral, inofensivas, tendo por característica atos como telefonemas, mensagens, presentes, muitas vezes tendo as ações roupagens “românticas” como declarações em público e envio de flores. Outras ações podem ser mais intimidadoras, como proferir ameaças e ofensas à vítima e à sua família.

No mesmo sentido, temos a definição de Mullen, Pathé e Purcell (2000, online), que descrevem o fenômeno como “Uma situação na qual um indivíduo impõe a outro invasões contra sua vontade e que causem medo, na forma de comunicações ou outras abordagens”, afirmando também que para definir o stalk é necessário considerar a percepção da vítima frente ao caso.

A análise dessas situações revela que existem elementos comuns, ficando claro que ao excluí-los não se poderia caracterizar perseguição à vítima, podendo ser um incômodo de outra natureza ou apenas um ato habitual.

O elemento mais importante citado é a repetição. O ato único não causaria a insegurança psicológica na vítima, sendo apenas um ato de violência isolado. No entanto, a repetição do ato abusivo faz com que a vítima se sinta insegura e incapaz de fazer com que isso seja impedido, causando, por fim, o dano psicológico característico do stalking.

Um exemplo disso são as leis que combatem essa ação nos Estados Unidos. Em Nova Iorque são utilizados esses elementos como critério para que se configure crime, incluindo a repetição do ato inconveniente. Além deste, estados como Washington, Wisconsin e Massachusetts também exigem que o ato seja efetuado duas ou mais vezes para que se enquadre na lei contra o stalk.

Outro elemento essencial para a existência do stalking é que a vítima sofra um dano psicológico. Seguindo a definição supracitada, é necessário que os atos causem temor à vítima, fazendo com que ela se sinta insegura, temerosa por si ou por sua família.

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com esse ato. Outro fator de aumento no sentimento de medo é a insegurança ao procurar apoio, tendo em vista que o stalk é um fenômeno dificilmente reconhecido e que não há regulamentação específica para esses casos.

Grangeia e Matos (2012) demonstram que em estudos do contexto português de stalking, ser vítima é uma experiência geradora de medo na maioria dos casos, tendo 43,3% das vítimas ficado um pouco assustadas e 25% muito assustadas.

Existem, no entanto, divergências quanto à necessidade da presença do medo na caracterização do ato de stalking. Alguns pesquisadores acreditam que a presença do medo seja desnecessária, bastando apenas que exista um comportamento anormal ou longo prazo de ameaça ou assédio direcionado a uma pessoa e percebido por ela como tal. Porém, tal pensamento é minoritário na doutrina especializada.

Por último, o curso de conduta deve ser voltado apenas para uma pessoa, que normalmente sofre todas as táticas aplicadas pelo perseguidor, direta ou indiretamente, quando, por exemplo, o perseguidor pratica esses atos na família ou no companheiro da pessoa perseguida.

3.1. Comportamentos do stalker

Os comportamentos exibidos por cada perseguidor são muito diversificados, podendo ser considerados habituais e inofensivos se considerados individualmente, pois nem sempre os atos são considerados ilegais. Temos posto que os stalkers podem agir por meio de envio de cartas e e-mails, mensagens, telefonemas, presentes, declarações públicas de afeto. Porém, esses atos podem chegar ao extremo, como violar o domicílio da vítima, ofender sua honra, proferir ameaças à vítima ou sua família, realizar agressões e até homicídio. Esses comportamentos podem, ainda, envolver outras pessoas, tais como familiares, amigos, colegas de trabalho, e até mesmo profissionais, como médicos, psicólogos, advogados e professores, ou serviços, através dos quais o stalker busca uma forma de acesso à vítima.

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Na pesquisa realizada por Mullen, Pathé e Purcell (2000, online), a duração do stalk variou de 4 semanas a 20 anos. Alguns stalkers revelaram um conhecimento detalhado dos movimentos das vítimas, localizando-as por telefone até o trabalho, casas de amigos e bares.

Pode-se perceber que, apesar de diversas formas de incômodo que podem ser causadas à vítima, muitas vezes esses assédios se encontram num padrão, de forma que seja possível caracterizar e estudar o stalking.

Para exemplificar, temos também a pesquisa realizada por James e Farnham (2003, online), através de 85 casos analisados pelo Serviço Forense do Norte de Londres, que mostra que apenas 12% dos stalkers utilizam apenas uma forma de assédio durante o tempo de perseguição, enquanto a maioria utiliza pelo menos três formas diferentes. Além disso, a pesquisa demonstrou que em 95% dos casos foram efetuadas invasões desagradáveis, como seguir a vítima ou ir à sua casa e local de trabalho. Os perseguidores também se comunicaram com as vítimas em 80% dos casos, tendo utilizado a forma escrita em 51% dos casos. Presentes indesejados foram enviados em 18% dos casos, desses vários presentes comuns como flores, chocolates, joias, lingerie e perfume. Porém, em alguns casos, foram enviados presentes ameaçadores às vítimas, alguns deles com significados ocultos, explicitados mais tarde pelos responsáveis, como um esqueleto querendo dizer que a pessoa estaria melhor morta e um biscoito de cachorro indicando que a vítima seria uma cadela, entre outros. Outras formas de ameaça, escritas e verbais, foram utilizadas em 71% dos casos.

Realizando uma meta-análise de 175 estudos de casos de stalking, Spitzberg e Cupach mapearam oito tipos de comportamentos realizados pelos assediadores. Sendo eles: 1) intimidade extrema; 2) contatos mediados; 3) interações; 4) vigilância; 5) invasão; 6) assédio e intimidação; 7) coerção e ameaça; 8) agressão.

Comportamentos de intimidade extrema tendem a refletir atos de cortesia típica, elevados a um nível excessivo (Spitzberg, 2004, online). Nesse tipo de comportamento o stalker exagera em todos os seus atos, comprando presentes enormes ao invés de pequenos, quando um presente pequeno seria o adequado à situação, ou ligando diversas vezes para a pessoa que deseja conquistar. Um homem aparecer na porta da vítima num sábado pela manhã pode ser romântico ou assustador, porém, se o perseguidor levar um presente ele tende ao romantismo, fazendo com que consiga manter contato com a vítima por um tempo mais prolongado e inibindo uma rejeição forçada.

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forma mais intensa, esses contatos são conhecidos como cyberstalking. Não existem muitos estudos acerca da ligação do stalking pela internet e na vida real, porém existem indícios de que as pessoas que perseguem virtualmente, em geral, tentam contatar a vítima na vida real. Por sua vez, os stalkers da “vida real” costumam utilizar-se do meio cibernético para observar a vida de suas vítimas (SPITZBERG; CUPACH, 2004, online).

Interações representam a gama de atividades que podem ocorrer cara a cara ou como conversas próximas. Esse comportamento inclui tentativas de contato com a vítima como sentar próximo a ela em locais públicos, aparições em vários locais em que ela esteja, intrusão na conversa da pessoa com terceiros, invasão do espaço pessoal, procurar se engajar em atividades comuns e frequentar os mesmos locais, assim como tentativas de contato através de terceiros.

As técnicas de vigilância representam, de muitas formas, o estereótipo dos stalkers, a tentativa sistemática de obter informações sobre a vítima sem que ela saiba. Curiosamente, esse comportamento, apesar de comumente associado ao stalking, realizado sozinho raramente se classificaria como perseguição por conta de sua natureza de disfarce. O stalking geralmente é uma ação que causa medo na pessoa, e se a vigilância é escondida, é desconhecida para a vítima. De qualquer forma, os perseguidores frequentemente se utilizam tanto de formas comuns (seguir a vítima, observação em locais públicos) e exóticas (vigilância eletrônica, cavalos de troia em computadores) para conseguir informação sobre seus objetos de desejo.

Invasões envolvem a violação dos limites pessoais e legais definidos normativamente, assim como roubo de informações, arrombar e entrar em suas dependências. Essas atividades podem refletir uma evolução frente às táticas anteriores, tendo em vista que há um risco aumentado de ramificações criminosas se o perseguidor for flagrado cometendo tais atos invasivos. Essa forma também representa uma evolução, pois cria um maior risco de encontrar a vítima ou terceiros no processo de invasão, aumentando o potencial de reação negativa no encontro.

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Quando o stalker muda sua tática de assédio e intimidação para coerção e ameaça, o tom do ato muda para uma sugestão implícita ou explícita de potencial perigo que pode atingir a vítima. Ameaças podem ser feitas contra pessoas amadas, bichos de estimação, propriedades, colegas, a vítima e até o próprio perseguidor, ameaçando suicídio, por exemplo. Todos eles implicam em uma tentativa de influenciar a vítima através de uma agressão em potencial, presumida sob controle do stalker. Analisando as amostras, 54% dos casos de stalking envolvem alguma emissão de ameaça, porém esse número pode variar significantemente quando se muda o tipo de amostragem. Ameaças são mais comuns entre os tipos de stalkers presumidamente mais perigosos, sendo aqueles que chegam a alguma forma de intervenção clínica ou policial (SPITZBERG; CUPACH, 2004, online).

A última categoria de comportamento stalker é agressão física e violência. Tal categoria envolve vandalismo, usos de arma, ataques, machucados, suicídio e tentativa de suicídio, estupro e sua tentativa, além de homicídios consumados e tentados. Quando as formas de violência foram agregadas nas amostras, 32% dos casos envolveram violência física e 12% envolveram violência sexual. Resultado parecido foi obtido pela National Violence Against Women Survey, em que menos da metade dos entrevistados havia experienciado agressão física partindo de seu perseguidor.

James e Farnham (2003, online), em sua pesquisa, afirmam que a maioria dos perseguidores não é violenta e que as taxas de comportamento violento variam entre 30% e 40% na maior parte dos estudos. A violência ocasionalmente resulta em agressão física séria, com a maioria das vítimas sendo agarrada, esmurrada, estapeada ou acariciada à força pelo stalker. Foi sugerido que a taxa de homicídio nos casos de stalk estão em menos de 2%, porém um estudo comparando as taxas de stalking e homicídio mostrou que esse número estava superestimado.

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Mullen, Pathé e Purcell (1999) resumiram as características principais de stalkers com um maior risco de serem associados à violência. As principais foram abuso de substâncias, histórico de delitos penais, delitos particularmente violentos ou sexuais, ser do sexo masculino, ameaçar a vítima, a presença de desvio de personalidade, perseguição de um ex-intímo (ex-parceiros), desemprego e isolamento social.

3.2 Tipos de stalkers

Para um maior entendimento do inconveniente de perseguir o outro, é necessária a análise dos tipos de pessoas que se tornam perseguidores e quais suas motivações. Stalkers vêm predominantemente da parcela solitária, isolada e carente da sociedade, porém isso não exclui a possibilidade de pessoas que se encontram no espectro social comum. Da mesma forma, as vítimas não precisam ser famosas, podendo ser qualquer pessoa (MULLEN; PATHÉ; PURCELL, 1999).

O stalk não configura um fenômeno de gênero, tendo em vista que também pode haver vítimas masculinas, podendo inclusive serem perseguido e perseguidor do mesmo sexo. Porém, insere-se numa relação de abuso e violência, e, por vezes, de controle e ameaça, podendo tornar-se fisicamente cruel. De acordo com descobertas do Departamento de Justiça dos Estados Unidos (1998) após uma pesquisa com oito mil mulheres e oito mil homens, apesar de não ser um crime de gênero, a maior parte das vítimas é do sexo feminino (78%), enquanto a maior parte dos perseguidores é do sexo masculino (87%).

Conforme enfatizado, o stalk pode ser perpetrado e sofrido por qualquer pessoa, independentemente de gênero, porém é estatisticamente mais comum a presença dos homens no polo ativo e das mulheres no polo passivo, principalmente quando se trata de relacionamentos findos ou pretensos, em que o stalker não aceita o término ou recusa da vítima, passando a persegui-la dos mais varados modos (CABETTE, 2010, online).

Muitos dos stalkers foram ex-parceiros da pessoa ofendida, mas o fenômeno também pode acontecer com vítimas estranhas ou pseudoconhecidas, nomeadamente artistas, apresentadores de televisão ou com personagens do mundo da fama.

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Durante a entrevista, 52 sujeitos afirmaram que o stalk foi a resposta à rejeição que sofreram num relacionamento, frequentemente envolvendo o ex-parceiro, mas podendo também acontecer após problemas com a mãe e amizades que chegaram ao fim. Os rejeitados frequentemente reconhecem uma complexa mistura de sentimentos de reconciliação e vingança. A sensação de perda pode ser combinada com frustração, raiva, ciúmes, revanche e tristeza em proporções que mudam em cada ocasião. A maioria dos stalkers rejeitados apresentava distúrbio de personalidade.

Hirigoyen (2006) comenta a questão do "Assédio por Intrusão" ou "Stalking", chamando a atenção para o fato de que "a maioria dos homicídios de mulheres ocorre durante a fase de separação". Aduz que a violência e a opressão se acentuam nesse momento e podem perdurar por muito tempo, depois de separados. O homem se recusa a deixar livre sua ex-companheira, como se ela fosse propriedade sua. Não consegue aceitar sua ausência e a vigia, segue-a na rua, assedia-a por telefone, espera-a à saída do trabalho. Muitas vezes acontece de a mulher ter de mudar de local de moradia. É como se a agressividade e a violência que haviam se mantido contidas durante a relação agora tivessem livre curso.

O objetivo central dos que estão em busca de intimidade é estabelecer um relacionamento com a vítima, porém várias foram alvos de ciúmes, tendo muitos deles apresentado episódios de raiva frente à rejeição de sua presa (MULLEN; PATHÉ; PURCELL, 1999, online).

Os classificados como incompetentes na pesquisa reconheceram que o objeto de atenção não correspondia sua afeição, mas eles mantinham a esperança de que seu comportamento resultaria em intimidade com a vítima. O grupo inclui pessoas limitadas intelectualmente e indivíduos incompetentes socialmente cujo conhecimento em rituais de flerte eram rudimentares, juntamente com homens que se admitiam no direito de ter uma parceira, mas sem capacidade ou vontade de estabelecer uma forma de interação social inferior ao relacionamento. Por muitas vezes, os perseguidores aqui classificados já teriam realizado o mesmo ato com várias pessoas. Eles observavam suas vítimas como potenciais parceiras atrativas, porém, diferentemente daqueles buscando intimidade, eles não conferiam qualidades únicas aos seus objetos de desejo, encontravam-se atraídos, mas não apaixonados, e em momento algum afirmaram que seus sentimentos eram correspondidos.

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atraente, rica e feliz enquanto ele havia experienciado uma rejeição profissional humilhante. Em outro caso, um homem perseguiu um médico que ele achava que tinha errado ao diagnosticar o câncer de coluna da sua esposa.

Os seis stalkers predatórios estavam preparando um ataque sexual. Esses homens encontravam prazer na sensação de poder causada pelo stalking, existindo elementos do processo de conhecer a vítima e ensaiar, em fantasia, o ataque pretendido. A perseguição poderia ocorrer por um tempo prolongado até que o ataque ocorresse ou ele fosse apreendido. Um deles procurou ajuda após alcançar o ponto de equipar uma casa isolada, adquirindo éter e cordas, e estar preparado para sequestrar a vítima. Os perseguidores predatórios em geral possuíam parafilias e tinham mais probabilidade de ter condenações por abuso sexual do que todos os outros grupos.

Stalkers que buscam intimidade requerem atendimento psiquiátrico agressivo, particularmente por serem bastante insensíveis a sanções judiciais, muitas vezes encarando comparecimentos ao tribunal, e até prisão, como preço a pagar pelo amor verdadeiro. Ao contrário, vários perseguidores rejeitados podem ser persuadidos a desistir por meio de multas ou potencial encarceramento, exceto aqueles envolvidos em disputas pela guarda dos filhos ou os extremamente ciumentos. Os incompetentes desistem com facilidade, sendo o desafio impedi-los de começar novamente, escolhendo outras vítimas. Ressentidos, que comumente se evidenciam presunçosos, não são fáceis de iniciar tratamento, enquanto sanções legais tendem a inflamar seu senso de acusação, em vez de inibi-lo. Os stalkers predatórios, por conta da natureza de planejar o ataque, são primeiramente um caso de polícia, existindo um papel para os psiquiatras no tratamento das parafilias.

3.3. Casos de stalking

Casos de stalking não são raros, acontecem em todos os países e com qualquer pessoa, celebridade ou não. Ao analisar-se os comportamentos e as motivações de cada perseguidor, é imperioso estudarmos casos reais e fictícios para um melhor entendimento desta prática.

3.3.1. Lilly Allen

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perseguição iniciou em 2009 através da rede social Twitter, onde o perseguidor, Alex Gray, criou uma conta chamada Lilly Allen RIP (descanse em paz Lilly Allen), alegando que ele tinha escrito uma das músicas dela.

Desse dia em diante, a cantora passou a receber cartas, ouvir discursos abusivos, acusações e ameaças de suicídio. De acordo com a cantora, o perseguidor deixava cartas na sede da sua gravadora, no escritório do seu agente, na loja da sua irmã e em seu flat. Após esses eventos, ela foi à polícia com as cartas, pois estava assustada e acreditava que aquilo era muito sério.

O homem tentou se aproximar de seus colegas de trabalho, que o descreveram como assustador. Um dia, em um show, uma pessoa levantou um cartaz no qual afirmava que havia escrito uma de suas músicas. Allen terminou o show e ligou para a polícia, quando recebeu um alarme para situações emergenciais que a polícia buscou meses depois. Durante um tempo, nada aconteceu, até que um dia a polícia ligou para sua casa e disse que o Alex Gray estava ativo novamente, sem dar maiores explicações. A artista foi até a delegacia e pediu para que eles lhe mostrassem uma foto de seu stalker, primeiramente seu pedido foi recusado, em seguida lhe mostraram uma foto e logo levaram embora.

Em outubro de 2015, a cantora recebeu uma amiga e, enquanto estava fazendo o jantar, deixou uma panela queimar e abriu a porta da cozinha, deixando-a destrancada pela primeira vez em meses. Mais tarde naquela noite ela foi acordada por fortes batidas na parede e percebeu que alguém estava tentando entrar no seu quarto. Em seguida um homem invadiu o cômodo gritando e parecia estar muito irritado, ele também carregava um objeto por baixo do seu casaco. O perseguidor foi pego de surpresa quando percebeu que Allen não estava sozinha em casa e, dessa forma, foi possível expulsá-lo.

A polícia não aceitava a hipótese de que seria o mesmo homem, afirmando que seria apenas um roubo comum, pois sua bolsa de mão havia sido levada, porém a cantora acredita que Gray passava muitas noites observando a casa escondido em seu jardim. Uma semana depois do ocorrido, Allen acreditava que a polícia estava fazendo buscas para encontrar quem invadiu sua casa, no entanto, após voltar de um trabalho, ela encontrou sua bolsa de mão no porta-luvas de seu carro queimada com tudo que estava dentro.

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ele, assim como anotações em seu álbum. Em 2015, uma acusação de assédio foi adicionada aos seus registros.

Lilly Allen relata que sua vida mudou completamente em virtude do medo que ela sentia por estar sendo perseguida e por não encontrar nenhum apoio nas autoridades que procurou. Passou a ser uma mulher cuidadosa com os lugares aonde ia e com quem ia, tem medo de todo pequeno barulho que escuta em casa e teve que abandonar seu flat, mudando-se para uma avenida movimentada.

3.3.2. Louise Maria

Em março de 2016, uma estudante da Universidade de Brasília foi assassinada por um de seus colegas de faculdade. Ela cursava Biologia e foi morta no laboratório de química da universidade. O seu assassino foi procurado pela polícia, momento em que revelou o local em que havia deixado o corpo, um matagal, e descreveu como havia ocorrido o homicídio. Vinícius, seu colega de 19 anos, afirmou tê-la asfixiado com um pano embebido em clorofórmio, abandonando seu corpo em um matagal, envolto em um colchão inflável, além de ter ateado fogo ao seu rosto e seus genitais. O motivo, também descrito pelo assassino, foi a garota ter se recusado a iniciar um relacionamento com ele.

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4. RESPONSABILIDADE CIVIL ORIUNDA DE CASOS DE STALKING

Historicamente, nos primórdios da civilização humana, dominava a vingança coletiva, que se caracterizava pela reação conjunta do grupo contra o agressor de um de seus componentes (DINIZ, 2013). Nas primeiras formas organizadas de sociedade, bem como nas civilizações pré-romanas, a origem da responsabilidade está calcada na vingança privada (GAGLIANO, 2005). Depois, o uso consagra em regra jurídica o talião. O legislador se apropria da iniciativa particular, intervindo para declarar quando e em que condições tem a vítima o direito de retaliação (DIAS, 2006).

Após esse período, há o da composição, ante a observância do fato de que seria mais conveniente entrar em composição com o autor da ofensa, para que ele reparasse o dano mediante a prestação da poena (pagamento de certa quantia em dinheiro) (DINIZ, 2013). Veda à vítima, daí em diante, fazer justiça pelas próprias mãos, compelindo-a a aceitar a composição fixada pela autoridade (DIAS, 2006).

Um marco na evolução histórica da responsabilidade civil se dá com a edição da Lex Aquilia (GAGLIANO, 2005). Constituída de três partes, sem haver revogado totalmente a legislação anterior, sua grande virtude é propugnar pela substituição das multas fixas por penas proporcionais ao dano (GAGLIANO, 2005). A Lex Aquilia estabeleceu as bases da responsabilidade extracontratual, criando uma forma pecuniária de indenização do prejuízo, com base no estabelecimento de seu valor (DINIZ, 2013).

Toda manifestação da atividade humana traz em si o problema da responsabilidade (DIAS, 2006). A palavra “responsabilidade” tem sua origem no verbo latino respondere, significando a obrigação que alguém tem de assumir com as consequências jurídicas de sua atividade. Portanto, está ligada ao surgimento de uma obrigação derivada da ocorrência de um fato jurídico (GAGLIANO, 2005). Digamos então que “responsabilidade” exprime a ideia de equivalência, de contraprestação, de correspondência. A responsabilidade não é fenômeno da vida jurídica, estando presente em todos os domínios sociais (DIAS, 2006). Responsabilidade, para o direito, nada mais é que uma obrigação derivada de assumir as consequências jurídicas de um fato, consequências que podem variar de acordo com o interesse lesado (GAGLIANO, 2005).

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prejuízo, sendo o interesse em restabelecer o equilíbrio econômico-jurídico a causa geradora da responsabilidade civil (DIAS, 2006).

Dessa forma, de acordo com Maria Helena Diniz (2013), a responsabilidade civil é a aplicação de medidas que obriguem uma pessoa a reparar dano moral ou patrimonial causado a terceiros, em razão de ato por ela mesma praticado ou por pessoa, animal ou coisa sob sua responsabilidade. Na responsabilidade civil, o agente que cometeu o ilícito tem a obrigação de reparar o dano patrimonial ou moral causado, buscando reparar o status quo ante (GAGLIANO, 2005).

É possível, também, dividir responsabilidade civil em três categorias: quanto ao seu fato gerador, seu fundamento e em relação ao agente. A primeira categoria é classificada em responsabilidade contratual, se oriunda de inexecução contratual, ou extracontratual ou aquiliana, se resultante de um dever geral de abstenção pertinente aos direitos reais ou de personalidade (DINIZ, 2013). A dificuldade na demonstração de culpa do agente é minorada quando a conduta ensejadora do dano advém de descumprimento de dever contratual, pois nesse caso a culpa é presumida (GAGLIANO, 2005). A culpa contratual é a violação de um dever de adimplir, que constitui o objeto do negócio jurídico, ao passo que, na culpa aquiliana, viola-se um dever negativo, ou seja, a obrigação de não causar dano a ninguém (GAGLIANO, 2005).

A segunda categoria trata da responsabilidade civil quanto ao seu fundamento, podendo ser subjetiva, quando fundada na culpa ou dolo por ação ou omissão, ou responsabilidade objetiva, quando fundada no risco (DINIZ, 2013). Na concepção de Gagliano (2005), a responsabilidade civil subjetiva é aquela decorrente de dano causado em função de ato doloso ou culposo, enquanto na responsabilidade civil objetiva não é necessário que se comprove culpa, pois a culpa seria irrelevante na conduta do agente causador do dano.

A última categoria é aquela relativa ao agente, podendo ser responsabilidade direta, se proveniente da própria pessoa imputada, ou responsabilidade indireta, se promana de ato de terceiro.

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Ademais, existem três elementos que caracterizam a responsabilidade civil, são eles: culpa, dano e nexo de causalidade.

4.1 Culpa

No nosso ordenamento jurídico, vigora a regra geral de que o dever ressarcitório pela prática de atos ilícitos decorre da culpa, ou seja, da reprovabilidade ou censurabilidade da conduta do agente (DINIZ, 2013). A culpa é fundo animador do ato ilícito, da injúria, da ofensa. Nesta figura encontram-se dois elementos: o objetivo, expressado na ilicitude, e o subjetivo, do mau procedimento imputável (DIAS, 2006). Não havendo culpa, não haverá, em regra, qualquer responsabilidade (DINIZ, 2013). Trata-se da violação de uma obrigação preexistente, a qual consiste no dever de não prejudicar ninguém (RIZZARDO, 2007).

Assim, em seu Art. 186, aduz o Código Civil que: aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito. Não se pode falar em ato ilícito sem a culpa, ou defender que se manifesta por mera violação à lei (RIZZARDO, 2007). O ato ilícito é o praticado culposamente em desacordo com a norma jurídica, destinada a proteger interesses alheios, é o que viola direito subjetivo individual, causando prejuízo a outrem, criando dever de reparação (DINIZ, 2013). Então, se há a repercussão do ato ilícito no patrimônio de outrem, concretiza-se a responsabilidade civil (RIZZARDO, 2007).

A culpa, em seu sentido amplo, compreende: o dolo, que é a violação intencional do dever jurídico, e a culpa em sentido estrito, caracterizada pela imperícia, imprudência ou negligência, sem qualquer deliberação de violar um dever (DINIZ, 2013). As espécies se entrelaçam. A negligência traz tonalidades de imprevisão. A imprudência envolve desprezo pela diligência. Imperícia e negligência se confundem, em vários pontos, pois o incapaz de dirigir é insensato na observância dos requisitos para o exercício da função (RIZZARDO, 2007). Em outra definição, por Gagliano (2005), a culpa, em sentido amplo, deriva da inobservância de um dever de conduta, previamente imposto pela ordem jurídica, em atenção à paz jurídica.

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para que possa se apontar a culpa. O último elemento deixa claro que deve haver a violação de um dever de cuidado previsto anteriormente.

Além disso, a culpa pode ser classificada, de acordo com Maria Helena Diniz (2013), em quatro categorias. A primeira delas é a culpa em função da natureza do dever violado, dividindo-a em contratual, quando o dever violado advém de contrato, e extracontratual, quando o dever violado é regra geral de direito. Não é necessário provar a culpa na obrigação contratual ao pedir indenização, diferente da culpa aquiliana, que deve ser comprovada para que possa ser devida indenização. A segunda classificação de culpa acontece quanto a sua graduação, podendo ser: grave, quando houver negligência extrema do agente; leve, quando a lesão de direito puder ser evitada com atenção ordinária; e levíssima, se a falta for evitável por uma atenção extraordinária.

Pode ser classificada também quanto aos modos de sua apreciação, considerando-a in concreto quando há exame da negligência ou imprudência do agente, e in abstracto quando se faz uma análise comparativa da conduta do agente com a do homem médio ou pessoa normal. Por último, pode-se classificar a culpa quanto ao conteúdo da conduta culposa, se o agente comete ato positivo sua culpa será in comittendo ou in faciendo, se comete abstenção, sua culpa será in omittendo.

Como citado, a culpa pode ser graduada em grave, leve e levíssima, sendo considerada devido à intensidade da negligência, imprudência ou imperícia. Normalmente, o grau de culpa não importa em maior ou menor peso na indenização, cujo critério para a fixação é medido pela extensão do dano (RIZZARDO, 2007). Para efeito de indenizar, não se distingue, a priori, o dolo da culpa leve, por exemplo (GAGLIANO, 2005). Nesse sentido temos o Código Civil de 2002, em seu Art. 944: “A indenização mede-se pela extensão do dano. Parágrafo único. Se houver excessiva desproporção entre a gravidade da culpa e o dano, poderá o juiz reduzir, equitativamente, a indenização”.

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4.2. Dano Moral

O dano é um dos pressupostos da responsabilidade civil, contratual ou extracontratual, visto que não poderá haver ação de indenização sem a existência de um prejuízo (DINIZ, 2013). Sem a ocorrência desse elemento não haveria o que indenizar, e, consequentemente, não haveria responsabilidade (GAGLIANO, 2005). Imperioso também frisar que toda forma de dano, mesmo derivado de um ilícito civil e dirigido a um só homem, interessa à coletividade. Até porque vivemos em sociedade, e a violação do patrimônio do meu semelhante repercute na minha esfera pessoal (GAGLIANO, 2005).

A antijuridicidade caracteriza o dano em geral, mas este não emana necessariamente de uma conduta antijurídica. É possível, assim, que nenhuma infração se consuma e nasça o dever de reparação, simplesmente porque houve dano. O interesse é o objeto de tutela da lei, o que fere o interesse é o dano (RIZZARDO, 2007). Note-se que a configuração do prejuízo poderá decorrer da agressão a direitos ou interesses personalíssimos, a exemplo daqueles representados pelos direitos da personalidade (GAGLIANO, 2005).

Não pode haver responsabilidade civil sem a existência de um dano a um bem jurídico, sendo imprescindível a prova real e concreta dessa lesão. Dessa forma, para que haja pagamento de indenização é necessário comprovar a ocorrência de um dano patrimonial ou moral (DINIZ, 2013). O dano pode ser definido como a lesão que, devido a um certo evento, sofre uma pessoa, contra sua vontade, em qualquer bem ou interesse jurídico, patrimonial ou moral (DINIZ, 2012). Não podemos limitar a extensão do dano, ele deve ser ampliado aos limites da fronteira do prejuízo sofrido pelo ser humano em seus bens, de forma ampla e irrestrita (REIS, 2010).

Assim, para que haja dano indenizável, é imprescindível que estejam presentes os seguintes requisitos, de acordo com Maria Helena Diniz (2013): diminuição ou destruição de um bem jurídico, patrimonial ou moral pertencente a uma pessoa, pois a noção de lesão pressupõe a do lesado, não havendo dano sem o lesado, tendo em vista que só pode reclamar indenização aquele que sofreu a lesão; efetividade ou certeza do dano, pois a lesão não pode ser hipotética, devendo o dano ser real e efetivo; causalidade, devendo haver uma relação entre a falta e o prejuízo causado; subsistência do dano no momento da reclamação do lesado; legitimidade, pois a vítima, para pleitear reparação, deve ser titular do direito atingido; e ausência de causas excludentes de responsabilidade.

Referências

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