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INSTITUTO FEDERAL DO ESPÍRITO SANTO CAMPUS VENDA NOVA DO IMIGRANTE CURSO DE LICENCIATURA EM LETRAS COM HABILITAÇÃO EM LÍNGUA PORTUGUESA

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INSTITUTO FEDERAL DO ESPÍRITO SANTO CAMPUS VENDA NOVA DO IMIGRANTE

CURSO DE LICENCIATURA EM LETRAS COM HABILITAÇÃO EM LÍNGUA PORTUGUESA

ANDRIELI FEU DORDENONI

ANÁLISE DO PERFIL FEMININO NA OBRA A PIOR PRINCESA DO MUNDO, DE ANNA KEMP E SARA OGILVIE

VENDA NOVA DO IMIGRANTE – ES 2021

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ANDRIELI FEU DORDENONI

ANÁLISE DO PERFIL FEMININO NA OBRA A PIOR PRINCESA DO MUNDO, DE ANNA KEMP E SARA OGILVIE

Monografia apresentada à Coordenadoria do Curso de Licenciatura Letras Português do Instituto Federal do Espírito Santo, Campus Venda Nova do Imigrante, como requisito parcial para a obtenção do título de licenciatura plena em Língua Portuguesa.

Orientadora: Profa. Dra. Mariana Passos Ramalhete.

VENDA NOVA DO IMIGRANTE – ES 2021

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D694a Dordenoni, Andrieli Feu.

Análise do perfil feminino na obra A pior princesa do mundo, de Anna Kemp e Sara Ogilvie / Andrieli Feu Dordenoni. – 2021.

47 f. : il. ; 30 cm.

Orientadora: Mariana Passos Ramalhete.

Monografia (graduação) – Instituto Federal do Espírito Santo, Curso de Licenciatura em Letras Português, Venda Nova do Imigrante, 2021.

1. Literatura – Estudo e ensino. 2. Literatura infantojuvenil. 3. Análise. I.

Ramalhete, Mariana Passos. II. Instituto Federal do Espírito Santo. III. Título.

CDD 23 – 869.07 Elaborada por Adriana Souza Machado – CRB-6/ES – 572

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ANEXO V

FORMULÁRIO DE PARECER DA APRESENTAÇÃO FINAL DO TCC II

A discente Andrieli Feu Dordenoni apresentou a versão final do TCC com o título

“Análise do Perfil Feminino na Obra A Pior Princesa do Mundo, de Anna Kemp e Sara Ogilvie”, ao Curso de Licenciatura em Letras-Português do Instituto Federal de Educação do Espírito Santo – Campus Venda Nova do Imigrante, como requisito para aprovação no componente curricular Trabalho de Conclusão de Curso.

O trabalho obteve nota ...100..., com o seguinte parecer:

( X ) Aprovação, sem reservas, do Trabalho de Conclusão de Curso.

( ) Aprovação somente após satisfazer as exigências pré-determinadas, no prazo fixado pelo Regulamento (não superior ao término do período letivo).

( ) Reprovação o Trabalho de Conclusão de Curso.

... ...

Assinatura do/a Orientador/a Profa Dra Mariana Passos Ramalhete Coordenadoria de Letras – Ifes, campus VNI

Siape: 2419041

...

Assinatura do Avaliador (a) I*

...

Assinatura do Avaliador (a) II*

* Preencher somente se houver banca examinadora.

Venda Nova do Imigrante, 16 de junho de 2021.

MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO INSTITUTO FEDERAL DO ESPÍRITO SANTO CAMPUS VENDA NOVA DO IMIGRANTE

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AGRADECIMENTOS

Agradeço inicialmente à minha família pelo apoio e pelas palavras de conforto nos momentos de dificuldade extrema. Agradeço em especial meu parceiro João Victor Figueiredo por suportar meus ataques de estresse e estar sempre ao meu lado durante o processo de produção deste trabalho, acreditando e reafirmando minha capacidade para terminá-lo.

Agradeço imensamente à minha Professora Orientadora Dra. Mariana Passos Ramalhete pela paciência e humanidade ao manter-se compreensiva e flexível o quanto foi possível com relação aos prazos e minha disponibilidade.

Por fim, agradeço a todo o corpo docente e institucional do Campus Venda Nova do Imigrante pelo compromisso e paixão ao longo dessa jornada. Fica registrado meu agradecimento geral a todos que participaram desse processo direta ou indiretamente.

Obrigada!

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A literatura infantil contraria o caráter pedagógico antes referido, compreensível com o exame da perspectiva da criança e o significado que o gênero pode ter para ela. Sua atuação dá- se dentro de uma faixa de conhecimento, não porque transmite informações e ensinamentos morais, mas porque pode outorgar ao leitor a possibilidade de desdobramento de suas capacidades intelectuais. (Regina Zilberman)

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RESUMO

A literatura infantojuvenil surgiu com a ascensão da burguesia com caráter uno pedagogizante. Com relação à mulher, sua função social era manter estereótipos de submissão e obediência à figura masculina. Dessa forma, esse trabalho elabora uma análise linguístico-literária da obra infantojuvenil A pior princesa do mundo, da autora Anna Kemp e da ilustradora Sara Ogilvie (2012), com objetivo de observar se atualmente textos deste gênero ainda são escritos para corroborar com estereótipos e compreender qual é o perfil traçado das personagens descritas nessa história. Foi possível ressaltar por meio da análise que o perfil da mulher e sua postura tornaram- se ativas nas histórias atuais e que ao longo dos anos a literatura infantojuvenil vem desvinculando-se da função pedagógica, buscando promover as realidades de seu público leitor.

Palavras-chave: Análise literária. Literatura infantojuvenil. A pior princesa do mundo.

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ABSTRACT

Children's literature for young people emerged with the rise of the bourgeoisie and had a unique pedagogical character. In relation to women, their social role was to maintain stereotypes of submission and obedience to the male figure. In this way, this work constitutes a linguistic-literary analysis of the juvenile children's work The Worst Princess in the World by author Anna Kemp and illustrator Sara Ogilvie (2012), with the objective of observing, understanding whether currently it is still informing itself corroborating with stereotypes and what is the profile of the identical characters in this story. It was possible to emphasize through this analysis that the profile of the woman and her posture are active in the current stories and that, over the years, the juvenile children's literature has been detaching itself from the pedagogical function, seeking to promote the realities of its reading public.

Keywords: Literary analysis. Children and youth literature. The Worst Princess in the World.

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LISTAS ILUSTRAÇÕES

Figura 1: As meninas, Diego Velázquez (1656) ... 16

Figura 2: Capa ... 21

Figura 3: Contracapa . ... 21

Figura 4: Leitura ... 23

Figura 5: Chegada ... 24

Figura 6: O beijo ... 24

Figura 7: No castelo ... 25

Figura 8: Guarda-Roupa ... 25

Figura 9: O espirro ... 27

Figura 10: Caos ... 27

Figura 11: Independência ... 28

Figura 12: Alter ego x Realidade 1 ... 30

Figura 13: Alter ego x Realidade 2 ... 30

Figura 14: O encontro ... 32

Figura 15: A espera ... 33

Figura 16: O tédio ... 34

Figura 17: “Resgate” ... 34

QUADROS Quadro 1: Descritores X Ano de publicação das obras relacionadas ... 11

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SUMÁRIO

1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS ... 9

2 REVISÃO DE LITERATURA ... 11

2.1 A REPRESENTAÇÃO DO GÊNERO FEMININO NA LITERATURA INFANTOJUVENIL ... 12

2.2 LITERATURA, GÊNERO E ESCOLA ... 14

3 REFERENCIAL TEÓRICO ... 16

4 METODOLOGIA ... 19

5 ANÁLISE ... 21

5.1 FORMAÇÃO DO LEITOR ... 35

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 36

7 REFERÊNCIAS ... 37

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1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS

É possível afirmar que a literatura infantojuvenil desempenha papel fundamental para formação histórico-social da sociedade, uma vez que estereótipos, mecanismos de dominação e posicionamentos sociais são reforçados em grande parte nas obras, ainda que o autor não dispunha dessa intenção. Dessa forma, é comum que grupos marginalizados como negros, indígenas, LGBTQIA+

e mulheres tenham sua representatividade resumida a estereótipos sugeridos por e para manter o status quo, nestas obras. Seria ingênuo, por outro lado, compreender a literatura infantojuvenil como neutra, negando, assim, a influência política que recebe.

A partir dessa afirmação e dos estudos de Silva (2010), compreende-se que o papel feminino nas obras infantojuvenis, majoritariamente, resume-se ao convívio familiar (irmã, avó, mãe, amada, princesa), à fragilidade física, intelectual e sentimental. Além disso, parafraseando Silva (2010), o padrão de comportamento representado nas obras constantemente reduz-se à submissão e à obediência a personagens masculinos. Em suma, caracteriza-se como totalmente dependente e incapaz de lidar com os próprios problemas sozinha.

Por outro lado, a mulher desempenha um papel marcante e decisivo na sociedade, e é portanto plausível que assim seja representada também na literatura. A partir do século XX, com o advento das lutas feministas travadas por grupos como as Sufragistas e suas conquistas de direitos para as mulheres (PINTO, 2010), novas autoras ganharam mais espaço e notoriedade e o papel feminino nas obras literárias desenvolveu níveis menos limitados e cerceados por padrões ideais. Nessa perspectiva, encontram-se as obras A princesa que escolhia, de Ana Maria Machado e Mariana Massarani (2006); A bolsa amarela, de Lygia Bojunga (1976); Não Era Uma Vez...: Contos Clássicos Recontados (2010) e A pior princesa do mundo, da autora Anna Kemp e da ilustradora Sara Ogilvie (2012). Essa última chama atenção, em primeira instância, por seu título sugestivo que nos leva ao questionamento inicial: o que em seu perfil comportamental difere das demais princesas para que a mesma seja considerada a “pior” do mundo? Desse modo, o presente trabalho tem como

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objetivo geral analisar esta obra de literatura infantojuvenil, além de observar a construção do enredo e do perfil feminino. De forma detida e específica, pretende-se enxergar a construção do enredo no livro quanto às suas características linguísticas, estruturais, de estilo e elementos narrativos essenciais que a compõem, traçando o perfil feminino na obra e compreendendo as possíveis formas de interferência do livro na construção da imagem social da mulher.

A produção e promoção deste trabalho justificam-se, em primeiro lugar, pela inexistência de análises completas ou ainda diretamente relacionadas à obra A pior princesa do mundo, o que promoveu o aumento da curiosidade a despeito da obra. Além disso, justifica-se pela necessidade da constante reafirmação e promoção da igualdade de gêneros. Afinal, esta proposta constitui-se, no interior da pesquisa, em uma tentativa de quebrar tabus e crendices impostas pelas classes dominantes. Por fim, pretende-se discutir sobre uma visão mais ampla, rica e próxima da realidade sobre a mulher, por meio da literatura infantojuvenil, e sua real presença e atuação na sociedade atual.

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2 REVISÃO DE LITERATURA

Para a construção deste trabalho de análise, utilizou-se como referência estudos anteriormente desenvolvidos nas áreas de literatura com foco na representatividade da mulher na literatura brasileira contemporânea, na construção da identidade feminina nas obras de literatura infantojuvenil e na área de psicologia com foco na promoção do estudo de gêneros com crianças, entre os anos de 2010 e 2020, ou seja, trabalhou-se com as produções relacionadas ao tema elaboradas nos últimos 10 anos.

A seleção de artigos foi realizada por meio dos seguintes descritores: o próprio nome da obra “A pior princesa do mundo”, “Representação feminina em literatura” e “Representação da mulher em literatura infantojuvenil”. As buscas retornaram um número reduzido de produções relacionadas à área de literatura infantojuvenil e do gênero feminino e, por essa razão, houve a necessidade de optar por um crivo temporal maior. No Quadro 1 estão listados o número de obras relacionadas aos descritores utilizados em relação ao ano de publicação.

Quadro 1: Descritores X Ano de publicação das obras relacionadas

Descritores 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018 2019 2020

A pior princesa do mundo

Representação feminina em literatura

X X

Representação da mulher em literatura infantojuvenil

X X X

Fonte: Quadro produzido pela própria pesquisadora.

Como é possível observar no quadro acima, não foram encontradas obras relacionadas diretamente ao título literário A pior princesa do mundo. Partiu-se então para o segundo descritor “Representação feminina em literatura” que replicou o total de 2 artigos, sendo eles: “Representação feminina na narrativa infanto juvenil brasileira contemporânea” (2010), “As Meninas na literatura infanto-juvenil brasileira” (2012). Por fim, o terceiro descritor “Representação da

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mulher em literatura infantojuvenil” mostrou-se com maior retorno da pesquisa, em que 3 trabalhos relacionados foram encontrados, são eles: Merida e Elsa: as princesas do século XXI (2015), “As novas identidades das princesas empoderadas na literatura infantojuvenil contemporânea” (2017) e “Falando sobre gênero na escola: potencialidades de uma intervenção com crianças”

(2020). A fim de facilitar a compreensão dos referidos artigos citados, optou-se por dividi-los em duas seções intituladas respectivamente: “A representação do gênero feminino na literatura infanto-juvenil” e “Literatura, gênero e escola”.

2.1 A REPRESENTAÇÃO DO GÊNERO FEMININO NA LITERATURA INFANTOJUVENIL

Pode-se iniciar a discussão com a autora Leda Silva (2010), que em seu artigo intitulado “Representação feminina na narrativa infanto juvenil brasileira contemporânea” evidencia que em 2005 os livros do Programa Nacional Biblioteca da Escola (PNBE) majoritariamente trabalhavam a partir de uma perspectiva ideológica dominante, privilegiando e favorecendo autores e ilustradores do sexo masculino. Além disso, as personagens protagonistas são em maioria brancos, do sexo masculino e de classe média ou aristocrata. Em contrapartida, a personagem feminina, assim como as demais minorias, é inferiorizada e desprovida de movimento próprio. A autora complementa que:

Em todas as fases de sua vida (infância, adolescência, vida adulta ou velhice), a mulher é representada com uma postura coadjuvante em relação ao homem e pró-ativa somente no seio familiar, em relação à prole, ou em seus afazeres domésticos (Silva, 2010, p. 83).

Essa representação reforça estereótipos e arquétipos sociais que são impostos à mulher há séculos. A compreensão errônea de que o gênero feminino estará sempre voltado para o trabalho doméstico e a criação dos filhos perpassada por esse tipo de literatura reforça concepções machistas e que oprimem as conquistas femininas ainda atualmente.

Corroborando com Silva (2010) a respeito da construção da identidade feminina na literatura infantojuvenil brasileira, Rosemberg e Piza (2012), em seu trabalho

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“As Meninas na literatura infanto-juvenil brasileira”, aprofundam-se na compreensão das relações sociais e hierárquicas de gênero, idade e raça traçadas nas obras de literatura infantojuvenil brasileiras. As estudiosas evidenciam que:

No plano das relações de gênero, a bibliografia especializada vem indicando, enfaticamente, que à mulher é imputado um papel proeminente na família, sendo-lhe reservadas funções expressivas e domésticas, mesmo que sua participação no mercado de trabalho venha crescendo prodigiosamente nas últimas décadas (ROSEMBERG e PIZA, 2012, p. 216).

É possível observar ainda que a literatura infantojuvenil, apesar de seu caráter moralizante e reducionista dos séculos passados, que em teoria preza sempre pela “inocência” da criança, trabalha, por isso, a partir de valores sexistas, machistas e classicistas, reforçando estereótipos.

Segundo Rosemberg e Piza (2012), nos anos 80, há uma alteração na construção do perfil feminino, recuperando-se modelos folclóricos com adaptação de histórias em que as personagens femininas são apresentadas como seres mais enérgicos, com perspectivas de vida individuais que fogem à maternidade e ao casamento. Contudo, essa alteração no percurso representativo feminino das histórias demonstrou-se em grande parte desastrosa, uma vez que as personagens são retratadas como agressivas, supercríticas e competitivas, em resposta aos movimentos extremistas feministas. Seguindo essa mesma linha, as autoras afirmam que a mulher negra, por exemplo, é retratada de forma extremamente sexualizada e objetificada, o que gera margem para mais estereótipos e preconceitos infundados a respeito do perfil feminino consolidado pelas obras.

Em contrapartida, a todas as evidências sexistas, machistas e estereotipadas da construção do perfil feminino citadas acima, o trabalho das autoras Souza e Amaral (2017) denominado “As novas identidades das princesas empoderadas na literatura infantojuvenil contemporânea” anuncia que é possível observar e constatar que as críticas auxiliaram na geração de resultados positivos e, dessa

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forma, não há como ignorar as mudanças que ocorreram nos últimos anos. A respeito da construção das personagens femininas, as autoras afirmam que

As principais características das princesas pós-modernas são a autonomia, a autoconfiança, a coragem, a determinação e a independência. Os critérios de beleza são outros e já não ocupam, entre elas, o lugar mais importante (SOUZA e AMARAL, 2017, p.104).

Souza e Amaral (2017) finalizam o trabalho evidenciando que a princesa contemporânea se alia ao empoderamento feminino, exige para si liberdade, inquieta-se com o mundo e deseja vê-lo, senti-lo de perto, vivenciando aventuras e todas as demais possibilidades que lhes eram negadas antes.

Ainda sobre a construção do perfil das princesas contemporâneas e sua influência no universo da literatura infantojuvenil, Ferreira (2015) explica em seu trabalho Merida e Elsa: As princesas do século XXI que grandes divulgadores e formadores culturais, como Walt Disney e Cartoon Network, são responsáveis pela disseminação de estereótipos e, de modo geral, sempre corroboraram com as características viabilizadas pelo momento histórico em que os mesmos são produzidos. Dessa forma é importante compreender que a concepção de perfil feminino está sendo reformulada aos poucos juntamente com a sociedade e também nos demais meios de comunicação. Ao finalizar seu trabalho, Ferreira (2015) evidencia que há muito ainda a ser percorrido para alcançar o ideal, contudo, os avanços são notáveis e sinalizam para uma nova perspectiva.

2.2 LITERATURA, GÊNERO E ESCOLA

A literatura carrega em si, como comentado acima, valores relacionados a seu momento histórico de produção. Dessa forma, sua circulação no meio escolar não incute neutralidade. Assim, é necessário compreender os estudos sobre o gênero na atualidade e sua influência no universo infantojuvenil e escolar. Para isso, consultou-se a obra “Falando sobre gênero na escola: potencialidades de uma intervenção com crianças”, de Botton, Strey e Costa (2020).

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A segregação comportamental entre masculino e feminino, elucidam os autores, trata-se da reprodução de estereótipos socialmente construídos e, portanto, não se relacionam com o gênero biológico. É durante a infância que as normas ditadas pelo meio social da criança serão incentivadas, fiscalizadas e internalizadas pela grande maioria dos indivíduos, e a literatura infantojuvenil tem grande influência na manutenção e promoção dessas normas. É a literatura que insere de forma sutil na compreensão da criança os conceitos de divisão e segregação dos gêneros. Além disso, a instituição escolar responsável em grande parte pela propagação da literatura no Brasil é um dos principais ambientes para veiculação de estereótipos, e é também o principal meio para o desmonte e o declínio de preconceitos amplamente corroborados ao longo dos anos, pois viabiliza a apresentação de conceitos menos estereotipados e permite a reflexão sobre o que é tratado como “comum” pela sociedade.

Um exemplo prático do poder transformador da escola está descrito no trabalho de Botton, Strey e Costa (2020) que evidenciam, em sua intervenção escolar com crianças de 6 e 7 anos, que o trabalho com a reformulação dos gêneros como unidade social deve ser iniciado ainda na infância e elucidado na mesma.

Dessa forma, é possível eliminar estereótipos e desvalorizações das minorias feminina, negra, LGBTQIA+, dentre outras.

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3 REFERENCIAL TEORICO

Além dos referidos artigos, utilizou-se como base para construção teórica do presente trabalho o livro intitulado A literatura infantil na escola, de Regina Zilberman (2003), que destaca algumas razões para a literatura infantil ser constituída da maneira que é atualmente. Zilberman explica inicialmente o contexto em que a literatura infantil e a noção de infância surgiram; Segundo a estudiosa, no passado, durante e até o final da Idade Média, não havia a concepção de infância. Dessa forma, as crianças eram submetidas ao mesmo tratamento dos adultos, sem qualquer tipo de filtro. Elas trabalhavam, tinham acesso aos mesmos livros produzidos para adultos e, inclusive, suas vestimentas imitavam as destes. É possível observar o processo, a título de conhecimento, na obra As meninas, de Diego Velázquez (1656), abaixo:

Figura 1: As meninas, Diego Velázquez (1656)

Fonte: História das artes.

A compreensão de infância como conhecemos surgiu apenas em meio à Idade Moderna, com a ascensão da burguesia e o declínio da nobreza, a partir de uma nova percepção de família lotada em um núcleo familiar unicelular composto por pai, mãe e filhos, com apreço pela privacidade e pelo afeto entre os membros.

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Visando a uma educação de qualidade para seus filhos, surgem os primeiros livros de literatura infantil, não por acaso escritos por pedagogos e professores.

Nesse sentido, os livros são comprometidos com o completo aprendizado da criança, como manuais de comportamentos e atuações exemplares diante da sociedade em que estão inseridos. A perspectiva pedagogizante da literatura infantil gera discriminação e inferiorização das crianças, e sobre isso a autora faz uma analogia:

A literatura infantil, como o Novo Mundo do século XV, está envolvida por uma capa protetora de enganos e preconceitos que, ao mesmo tempo, a diminuem intelectualmente e reprimem uma averiguação que ponha em evidência sua validade estética ou suas fraquezas ideológicas (ZILBERMAN, 2003. p. 11).

Ou seja, ainda que ao longo dos anos alguns autores de literatura infantil tenham trabalhado para modificar sua intenção pedagogizante, ainda que trabalhem a partir da compreensão da perspectiva da criança e da sua realidade, a literatura infantil segue presa a estereótipos de sua época inicial, tipicamente pedagógica.

Contudo, os esforços dos novos autores não devem ser ignorados e desperdiçados, uma vez que a literatura infantil pode e deve ser empregada como agente propiciadora do questionamento e da criticidade de seu leitor diante da sociedade em que circula, considerada ainda geradora da ampliação linguística, emocional e da aquisição do saber infantil. Sobre isso a autora explica:

Como agente de conhecimento porque propicia o questionamento dos valores em circulação na sociedade, seu emprego em aula ou em qualquer outro cenário desencadeia o alargamento dos horizontes cognitivos do leitor, o que justifica e demanda seu consumo escolar (ZILBERMAN, 2003. p. 12).

Dessa forma, a escola se enquadra nesse ponto como principal meio vinculador da literatura, uma vez que trabalha na formação do leitor ao ensinar a decodificação e a compreensão geral do texto, além da apreensão dos temas e em especial a criação e o desenvolvimento de sua criticidade.

Por fim, é possível compreender que a literatura selecionada corrobora com as noções de concepção do gênero feminino na literatura infantojuvenil,

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inicialmente estudadas neste trabalho, e que prontamente discordam da manutenção desses estereótipos. A partir dessas discussões, nosso estudo se direciona nas mesmas diretrizes, porém, com o diferencial pautado na análise inédita da obra A pior princesa do mundo, somando assim às análises da área e possibilitando futuras leituras da referida obra.

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4 METODOLOGIA

O presente trabalho constitui-se metodologicamente em uma pesquisa de natureza básica, uma vez que sua produção não estará vinculada a finalidades imediatas e sim à produção de conhecimento somativo para utilização em pesquisas futuras. Quanto à abordagem, caracteriza-se como qualitativa, uma vez que serão utilizados arquivos bibliográficos e uma obra literária para formalizar o processo, suas investigações e implicações sociais. Objetiva-se com essa pesquisa, assim, analisar, compreender e reformular a vinculação errônea e deturpada da imagem feminina na literatura infantojuvenil.

Trata-se ainda de uma pesquisa bibliográfica, uma vez que para a produção da mesma foi necessário primeiro buscar trabalhos na presente área para construir embasamento e, em um segundo momento, o estudo de um livro de literatura infantojuvenil específico. Esse trabalho é ainda de natureza documental, uma vez que é inédito ao promover a análise do livro A pior princesa do mundo, tratado, nesse sentido, como documento, o qual não apresenta produções e estudos específicos registrados em língua portuguesa até então.

A análise do livro será produzida, em primeira instância, a partir da capa e contracapa e seus componentes, observando a relação entre a escolha das cores de determinadas páginas e sua consonância com o enredo, seguidamente à realização de uma verificação detida sobre o enredo completo da obra, sua caracterização e categorização das personagens, com objetivo de elucidar a visão da autora e as diferenças entre essa obra e demais literaturas infantojuvenis.

Analisaremos, por fim, as expressões da personagem Soninha e algumas das ilustrações da obra, buscando captar e assimilar os detalhes e intenções diretamente ou indiretamente aplicadas no livro pelas autoras e as transformações que o mesmo pode gerar no universo do leitor em que circula.

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Dessa forma, objetiva-se a observação do livro como um todo na busca por compreender o conjunto formador da obra e suas escolhas assertivas ou não para a formação do leitor.

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5 ANÁLISE

Os primeiros elementos a serem pontuados a respeito da edição brasileira do livro A pior princesa do mundo podem ser observados nas Figuras 2 e 3 listadas abaixo, a respeito da escolha de cores:

Figura 1: Capa

Fonte: Imagem fotografada pela própria pesquisadora.

Figura 2: Contracapa

Fonte: Imagem fotografada pela própria pesquisadora.

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É possível observar que na capa há o predomínio da cor azul, socialmente associada a uma cor masculina, e há ainda, na capa e contracapa, a ilustração de uma princesa com aspecto singelo e calmo, calçando um tênis amarelo que pode representar uma possível oposição ao salto alto, mais especificamente o tão clichê “sapatinho de cristal” difundido mundialmente pela releitura da história intitulada Gata borralheira, dos irmãos Grimm (1812), e que por anos foi sinônimo afinco de feminilidade.

A personagem ainda é ilustrada montada em um dragão que sorri amigavelmente, observando a menina em suas costas; representação curiosa, uma vez que em geral os dragões são monstros temidos e maldosos que afligem a vida das princesas estereotipadas. Corroborando com Ferreira (2015), é sempre possível associar, nesse caso, as ilustrações ao momento histórico em que são produzidas. Dadas as atuais lutas femininas por igualdade, é compreensível o compromisso das autoras, desde a capa, com a inauguração do processo de desvinculação da obra com o considerado padrão comum às obras infantojuvenis com a temática de princesas.

Prosseguindo com a construção da relação das cores, imagens e texto, ressalta- se que nenhum aspecto do livro está inserido ao acaso, pelo contrário, é sua união que torna a obra extremamente rica, como é possível observar na imagem selecionada a seguir, considerada a mais expressiva e que melhor explica o teor total da obra.

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Figura 4: Leitura

Fonte: Imagem fotografada pela própria pesquisadora.

Nesta página, é possível observar o predomínio da cor amarela, popularmente relacionada ao otimismo, à riqueza e à felicidade, contudo, ao contrário do comum, a princesa parece se sentir feliz e rica agora apenas por estar em meio aos livros e na busca pelo conhecimento, e não diante de um enorme guarda- roupas de vestidos, como é possível observar na Figura 7, analisada em sequência às Figuras 5 e 6. Ainda sobre a Figura 4, é interessante ressaltar que a fala da personagem demonstra otimismo, uma vez que permanece aguardando o príncipe, porém, em clara impaciência e possível objeção ao método utilizado por ele (influenciado pela história da Rapunzel, como uma outra releitura dos irmãos Grimm [1812]), uma vez que se utiliza dos longos cabelos dela em formato de tranças para subir na torre e só então resgatá-la. O trecho do enredo que comprova essa oposição diz: “Eu só queria mesmo um namorado,/ poder viajar/ E mudar de penteado” (KEMP e OGILVIE, 2015, p. 4).

Também é possível notar a sutil crítica à clássica Rapunzel na Figura 5 a seguir, que ilustra a chegada do príncipe.

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Figura 5: Chegada

Fonte: Imagem fotografada pela própria pesquisadora.

Em contrapartida ao processo de crescimento do cabelo da princesa, seu príncipe simplesmente se vale de uma escada para alcançar a amada, ignorando a ideia clássica de como subir na torre. Na mesma linha, existe o momento do beijo, em geral aguardado pela princesa submissa, que está desacordada, inerte e sem vida. A atitude nas histórias clássicas é sempre atribuída à identidade masculina, contudo, em evidente oposição a tal mecanismo de dominação, a princesa da história é quem se adianta para beijar o príncipe, conforme a figura abaixo:

Figura 6: O beijo

Fonte: Imagem fotografada pela própria pesquisadora.

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Prosseguindo com as contradições relacionadas ao universo difundido das princesas como norma, volta-se a comentar a opção da personagem em questão pelos livros, em detrimento das roupas e objetos preciosos, tal opção é observada comparando a Figura 4, comentada anteriormente, com as Figuras 7 e 8 abaixo:

Figura 3: No castelo

Fonte: Imagem fotografada pela própria pesquisadora.

Figura 4: Guarda-Roupa

Fonte: Imagem fotografada pela própria pesquisadora.

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Observa-se nessas páginas o predomínio da cor rosa, popularmente relacionada ao feminino, a delicadeza e a ternura que reforçam o estereótipo social da mulher como dona de casa, protetora dos filhos, sem ambições próprias e submissa ao homem, aspectos explicados por Silva (2010) em seu artigo. As falas do príncipe reforçam a concepção machista que impedia as mulheres de fazerem determinadas atividades: “Eu uso armadura, você usa vestido. (...) Sorria muito, mantenha a rotina/ Lutar com dragão não é coisa de menina” (KEMP e OGILVIE, 2015, p. 13 e 14, grifo nosso). Chama atenção o fato de um personagem masculino tentar promover o cerceamento da personagem feminina, impondo a ela aquilo que deve ou não fazer. Além disso, na expressão “coisa de menina”

há o registro de ascensão da burguesia, já que no processo histórico foi elaborado um plano social para reforçar o papel da mulher como esposa no novo modelo de núcleo familiar burguês, de acordo com Zilberman, que também explica: “Reforça-se o papel da esposa dentro do núcleo familiar, a fim de fazê- la assumir sua função materna” (2003, p. 38). Essa concepção é difundida ainda atualmente entre as crianças, por meio da opção feita pelos pais conservadores com brinquedos como carrinhos e espadas para meninos, bonecas e joguinhos de panelas para meninas.

Em contrapartida, às objeções do príncipe surge o dragão que, concordando com a princesa e enxergando nela um igual, auxilia a mesma a sair de sua situação de subjugada. Em possível referência à história dos Três porquinhos, também como releitura dos irmãos Grimm (1812), o dragão espirra com força para lançar tudo pelos ares, como mostram as imagens a seguir:

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Figura 9: O espirro

Fonte: Imagem fotografada pela própria pesquisadora.

Figura 10: Caos

Fonte: Imagem fotografada pela própria pesquisadora.

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Nota-se que as duas páginas são dominadas pelo vermelho, cor popularmente associada ao conflito, à guerra, em que não há diálogo além da representação de tudo pelos ares. Diante da situação de contraposição de ideias, as da princesa e as do príncipe, as páginas podem representar a rebeldia da personagem e sua afirmação final como independente.

Por fim, a última imagem a ser analisada nessa etapa é justamente a que comprova a independência da personagem em relação ao príncipe e aos estereótipos a ela impostos, uma vez que é possível visualizar a volta do predomínio da cor azul, associada também à segurança e à compreensão. A personagem, juntamente com o Dragão, é representada como livre, e o enredo corrobora isso quando diz: “Daquele dia em diante, Soninha estava pronta,/ Os dois rodaram o mundo de ponta a ponta” (KEMP e OGILVIE, 2015, p.25).

Figura 5: Independência

Fonte: Imagem fotografada pela própria pesquisadora.

As autoras fecham o circuito contra estereótipos com esse quadro, em que a princesa aparece com as tranças cortadas, como um desejo inicialmente expressado na Figura 4, com as roupas destruídas em contradição ao que lhe é

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exigido pelo príncipe nas Figuras 7 e 8, e especialmente livre, sobrevoando os céus com seu amigo dragão. É de suma importância constatar que a construção das imagens e do enredo ao longo livro foi propositalmente criada para culminar nessa página, quando todos os desejos da protagonista são finalmente concretizados por ela mesma.

É importante reiterar que o dragão se reconhece de igual para igual junto à princesa, e não como seu salvador, uma vez que o término da história, que em geral seria com um casamento entre ambos e a frase: “E viveram felizes para sempre”, mostra um outro foco: “E viveram felizes os dois”, apontando que não necessariamente para viverem felizes a princesa e o dragão precisariam permanecer juntos enquanto casal.

Por meio da representação de Soninha, cujo nome também é bastante sugestivo:

significa sabedoria em russo, é concebível compreender que a mesma é oposta às habituais princesas, já que sonha em ser independente, viajar e ganhar o mundo. Sua atitude, comentada anteriormente, chama atenção em contrapartida às princesas já citadas, como Rapunzel e Cinderela, que aguardam o beijo do príncipe. Soninha é quem se adianta para beijar seu “Salvador”. Dessa maneira é traçado o perfil feminino na obra. Longe de princesas marginalizadas e ofuscadas pelo arquétipo masculino, Soninha pode ser associada ao novo perfil de princesa e, logo, de mulheres da atualidade, fortes, decididas e independentes, corroborando com o perfil evidenciado por Ferreira (2015) em seu trabalho.

Há ainda no livro duas personagens coadjuvantes, o príncipe e o dragão. O príncipe é caracterizado por meio do sarcasmo que somente pode ser percebido através da união das imagens com o texto. Ele se descreve como um típico príncipe dos contos clássicos, forte, valente, guerreiro e vencedor de batalhas, contudo, as imagens evidenciam um príncipe fraco, magro que somente combate quando o adversário é claramente débil e indefeso. É possível observar essa relação entre o alter ego, ou seja, a versão em que o príncipe se vê, sua melhor versão do “eu”, e sua verdadeira realidade nas Figuras 12 e 13:

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Figura 12: Alter ego x Realidade 1

Fonte: Imagem fotografada pela própria pesquisadora.

Figura 13: Alter ego x Realidade 2

Fonte: Imagem fotografada pela própria pesquisadora.

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Há clara incompatibilidade entre o que é dito, como em: “Lutei para valer” (KEMP e OGILVIE, 2015, p. 7), e a imagem ilustrada que o mostra lutando contra um possível príncipe transformado em sapo e completamente desarmado, ou ainda quando diz: “Por toda parte assustei” (KEMP e OGILVIE, 2015, p. 8) e a ilustração evidencia o mesmo apontando sua espada para um coelhinho indefeso.

É possível evidenciar ainda que o príncipe exerce clara função de antagonista diante da princesa, uma vez que diferentemente da mesma impõe ao mundo uma realidade mentirosa, fixada em estereótipos socialmente aceitos, e busca, a todo custo, repreender e impedir a independência dela. Além de se demonstrar atônito com a atitude da princesa ao beijá-lo.

Por fim, temos a personagem do Dragão, que de modo geral é representada como ser maldoso e cruel, responsável, em grande parte dos contos, por manter as princesas prisioneiras em suas torres, mas que em A pior princesa do mundo, mais uma vez, tem seu ideário quebrado. Nesse caso, o Dragão apesar de forte e grande, apresenta-se como um amigo que auxiliará na remoção da princesa de seu cárcere imposto pelo príncipe. A reação de Soninha ao ver o Dragão é bastante atípica também, uma vez que, ao contrário do medo, ela o convida para um chá. Ele, por sua vez, não demonstra agressividade para com ela e não age de forma pretensiosa a ponto de ser considerado um “Salvador”, pelo contrário, ele corresponde aos ideários de Soninha, partilha de suas vontades e, por essa razão, auxilia em sua fuga. Como é justificável na Figura 14 a seguir:

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Figura 14: O encontro

Fonte: Imagem fotografada pela própria pesquisadora.

Ambos em diálogo demonstram insatisfação com as atitudes do príncipe, e é por essa identificação pessoal que acabam por se tornarem amigos, optando por fazer algo contra os desmandos do mesmo. O dragão é ainda retratado com a cor laranja, secundária, popularmente conhecida por excitar a fome e também a criatividade.

O corpo textual do livro tem sua linguagem trabalhada por meio da poesia, sua construção é baseada em rimas simples de dois versos em que a última palavra de cada verso é a rimada. Compõe-se ainda majoritariamente por uma narrativa em primeira pessoa do singular, chamando atenção por trabalhar a história através do olhar de Soninha, personagem principal. Os diálogos, também trabalhados em rimas, são curtos e diretos, e em sua maioria pronunciados pela princesa. Nota-se que diferentemente dos livros do PNBE analisados por Silva (2010), que priorizam a personagem masculina em detrimento da feminina, o livro A pior princesa do mundo trabalha com uma perspectiva claramente antagônica e cria o universo da história voltado para a independência total de Soninha. Dessa forma, a obra regula-se entre as colocações de Rosemberg e Piza (2012), uma vez que Soninha é representada de forma operante, porém, ao

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contrário do que as autoras afirmam em sua obra a respeito das características das personagens serem deturpadas, sendo sempre representadas como agressivas e competitivas, Soninha em momento nenhum apresenta expressões de raiva e descontrole, além de ser protagonista em 100% do tempo. Equipara- se também aos estudos de Souza e Amaral (2017) que comprovam o novo perfil feminino das princesas atuais, pautado agora no empoderamento feminino:

Soninha é muito ativa na busca por sua liberdade.

Ainda sobre as expressões de Soninha, é interessante observar que elas diferem mais uma vez do habitual. De modo geral, pode-se afirmar que as princesas da tradição clássica apresentam muito pouco ou nada de expressões faciais, e as poucas que apresentam ainda são apáticas. Soninha, por sua vez, regula suas expressões de acordo com as situações vividas ao longo da obra. Através do olhar e da postura corporal, ela evidencia, por exemplo, nas Figuras 1 e 3 demonstradas a seguir, tédio, monotonia e chateação, pois está com olhos bem abertos em sinal de ansiedade, a boca fechada e com a postura desleixada na sacada de seu castelo e na cadeira. O enredo corrobora quando diz: “(...) meu príncipe virá,/ Mas como ele demora, por onde andará?” e “Já esperei mil anos a fio,/ Meu coração está vazio” (KEMP e OGILVIE, 2015, p. 3).

Figura 15: A espera

Fonte: Imagem fotografada pela própria pesquisadora.

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Figura 6: O tédio

Fonte: Imagem fotografada pela própria pesquisadora.

Enquanto lê, sua expressão é de curiosidade, seu rosto é praticamente todo encoberto pelo livro e sua postura é ereta. Quando o príncipe a leva, e ela ainda não sabe que será posta em cárcere, sua expressão é de plenitude, seus olhos estão delicadamente fechados e sua boca projeta um sorriso de satisfação. A princesa então fala: “– Eba! – vibrou Soninha. – Fui, enfim,/ libertada! Agora, sim, tudo deu certo!” (KEMP e OGILVIE, 2015, p. 9), como mostra a imagem abaixo:

Figura 7: “Resgate”

Fonte: Imagem fotografada pela própria pesquisadora.

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Chegando ao castelo, sua expressão é de decepção, e se mantém assim nas próximas cenas do livro. Mas ao longo da história, suas expressões também são muito bem marcadas justamente para demonstrar de modo fiel aquilo que de fato pensa sobre a situação, e para reafirmar sua condição decidida e independente.

5.1 FORMAÇÃO DO LEITOR

Para a formação do leitor, todos os elementos até aqui citados são de suma importância, uma vez que serão base para sua formação social, pessoal e crítica.

Parafraseando Zilberman (2003), a utilização do livro na escola é legitimada primeiro pela relação que traça com o leitor por auxiliar em sua formação crítica e pelo papel transformador que exerce no ensino, trazendo a realidade do aluno para o mesmo. A literatura infantojuvenil está atrelada a uma série de outras demandas, e nisso pode ser associada, por exemplo, ao desenvolvimento linguístico do leitor, sua capacidade de compreender o fictício, a fantasia e especialmente a aquisição de conhecimento. Contudo, a efemeridade do público para o qual o autor de literatura infantojuvenil escreve, o fato de ser um adulto que publica para crianças e por incutir na obra a visão que acredita ser a do possível leitor infantil podem tornar fragilizada essa literatura, passando a ser vista como inferior. Assim, cabe à escola possibilitar a utilização máxima de seus potenciais direcionadores, gerando discussões a partir de livros como A pior princesa do mundo. Ainda que as escolas venham sofrendo duros golpes com relação à sua liberdade para conduzir a educação, em especial após o início da campanha à presidência (em 2018) do atual presidente Jair Bolsonaro, é preciso seguir em meio às dificuldades em prol de um ensino melhor.

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6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Por fim, é possível perceber que as autoras intencionavam, ao longo de toda obra, possibilitar questionamentos para o público infantil, tais como: “Por que ela não pode usar armadura?” ou “Por que ele a prendeu no castelo?”. É possível notar um inegável avanço com relação à literatura infantojuvenil: de uma perspectiva totalmente pedagogizante, com a transmissão de normas e regras sociais para as crianças, passou-se a uma literatura comprometida com a estética, com uma certa emancipação de ideias e com atenção mínima às aspirações infantis, em sua produção. Livros infantojuvenis como A pior princesa do mundo têm sido mais comuns hoje, e sua promoção demonstra o caminho para um futuro com mais equidade para todos.

Soninha e sua altivez traçam relações mais próximas às atuais mulheres brasileiras que sonham muito, não com o simplório príncipe encantado, mas com respeito e igualdade, mulheres que almejam sua felicidade sem a obrigação da maternidade, usam armaduras psicológicas blindadas contra o machismo e derrotam diariamente paredes gigantescas de preconceito e anos de patriarcalismo. A pior princesa do mundo trata de uma menina inspirada no real, com sonhos e ideologias reais, contribuindo para a identificação do público leitor.

É esse fato verossímil que a torna para o príncipe, gestor e fomentador dos estereótipos, a pior princesa do mundo, porque se recusa a seguir a vida que lhe foi imposta, da mesma forma que as mulheres modernas.

Finalmente, cabe à escola desde a educação infantil fomentar a leitura literária, a leitura crítica, pois a infância é a base da sociedade; e na expectativa para mudarmos algo, é pela base que devemos começar, quer seja eliminando os estereótipos, quer seja promovendo a liberdade pessoal e a igualdade ainda na primeira infância. E não custa lembrar: deixando velhos sapos para trás.

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7 REFERÊNCIAS

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“Falando sobre gênero” na escola: potencialidades de uma intervenção com crianças. Revista de Psicologia da IMED, v. 12, n. 2, p. 58-75, 2020.

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DE SOUZA, Andressa Castro Priori; DO AMARAL, Nair Ferreira Gurgel. As novas identidades das princesas empoderadas na literatura infantojuvenil Contemporânea. Professare, v. 6, n. 2, p. 97-122, 2017. Disponível em:

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FERREIRA, Júlia da Silveira. Merida e Elsa: as princesas do século XXI.

2015. 75 f. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Comunicação – Habilitação em Jornalismo) – Escola de Comunicação, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2015. Disponível em:

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Frozen: Uma aventura congelante (Frozen). Direção: Chris Buck e Jennifer Lee Produção: John Lasseter e Peter Del Vecho. Walt Disney Pictures, 2013.

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GRIMM, Jacob e Wilhelm. Contos Maravilhosos Infantis e Domésticos. 3ª ed. São Paulo: Cosac & Naify. 2015.

IRMÃO do Jorel. Roteiro: Juliano Enrico. 2014. Son., cor.

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Valente (Brave). Direção: Mark Andrews e Brenda Chapman. Produção:

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ZILBERMAN, Regina. A literatura infantil na escola. 11ª ed. São Paulo:

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Referências

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