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A POSSIBILIDADE DE REPARAÇÃO DO DANO AFETIVO PELOS GENITORES

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A POSSIBILIDADE DE REPARAÇÃO DO DANO AFETIVO PELOS GENITORES

Rodrigo Felipe Carniel1

Geovana da Conceição2

SUMÁRIO

Introdução; 1 Família: Transformações e Conceito; 2 Princípios do Direito de Família; 2.1 Principio da dignidade da pessoa humana; 2.2 Principio da convivência familiar; 2.3 Principio da afetividade; 3 Responsabilidade Civil: Considerações gerias; 3.1 Responsabilidade civil objetiva; 3.2 Responsabilidade civil subjetiva; 3.3 Culpa; 3.4 Dano; 3.4.1 Dano Material; 3.4.2 Dano Moral; 3.4.2.1 Quantificação do dano moral; 4 A possibilidade de reparação do dano afetivo pelos genitores; 5 Considerações finais; Referências.

RESUMO

O presente artigo científico, tem como objeto de estudo a responsabilidade civil por descumprimento dos genitores do dever legal de cuidar e manter a prole em convívio familiar. O trabalho foi operacionalizado por intermédio de pesquisa bibliográfica, abordando em primeiro momento o conceito de família e suas transformações, passando pelos princípios do direito de família, e por fim abordando a responsabilidade civil e seus pressupostos. Num ultimo momento, buscou-se demonstrar que havendo negligência dos genitores com sua prole, não cumprindo o dever legal de cuidar, estarão incorrendo em ato ilícito, causando dano à prole, e assim cabendo à reparação dessa lesão através de indenização de caráter compensatória. Assim, tomando-se por base a pesquisa doutrinária e jurisprudencial, o presente artigo tem como objetivo investigar a possibilidade de responsabilização civil dos genitores pelo abandono afetivo em relação aos seus filhos. O método utilizado na presente pesquisa será o indutivo e as técnicas de pesquisa bibliográfica, fichamento e o conceito operacional.

Palavras-chave: Abandono. Afetividade. Dano. Família. Responsabilidade Civil. INTRODUÇÃO

A presente pesquisa cientifica, tem como objeto de estudo a responsabilidade civil por descumprimento dos genitores do dever legal de cuidar e manter a prole em convívio familiar.

1

Acadêmico do 10º período do curso de Direito da Universidade Do Vale Do Itajaí – Balneário Camboriú. E-mail: rodrigofcarniel@yahoo.com.br

2

Professora no Curso de Direito da Universidade do Vale do Itajaí de Balneário Camboriú, Mestre em Gestão de Políticas Públicas da Univali, especialista em Direito Processual Civil. Advogada militante na Comarca de Itajaí na área do Direito de Família. E-mail: geovanaadv@brturbo.com.br

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Tomando-se por base a pesquisa legal, doutrinária e jurisprudencial, o presente artigo tem como objetivo investigar se é possível a responsabilização civil dos genitores pelo abandono afetivo em relação aos seus filhos.

Para alcançar o objetivo proposto, parte-se da seguinte problemática: É possível a fixação de indenização por danos morais devido ao abandono afetivo da prole, pelos seus genitores?

Para tanto, inicialmente abordar-se-á um breve histórico sobre a entidade familiar e suas transformações no decorrer do tempo, passando pelos princípios da dignidade humana, convivência familiar e afetividade.

Posteriormente, passar-se-á a analisar a responsabilidade civil em suas duas espécies: objetiva e subjetiva, e discorrendo sobre a culpa, o dano material e moral e sua possível reparabilidade e valoração.

Por fim será analisada a possibilidade de reparação do dano causado pelo abandono afetivo dos genitores com sua prole, utilizando-se como parâmetro para a pesquisa a orientação do Superior Tribunal de Justiça e os Tribunais dos Estados de Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Minas Gerais e Rio de Janeiro.

O presente estudo está baseado também nos dispositivos legais do Código Civil e da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. O método a ser utilizado será o indutivo e as técnicas de pesquisa bibliográfica, fichamento e o conceito operacional.

1 FAMÍLIA: TRANSFORMAÇÕES E CONCEITO

O conceito de família sofreu grandes modificações ao longo da história do direito brasileiro. No princípio, a formação da família era extensiva, e tinha grande incentivo à procriação, como formavam uma verdadeira comunidade rural, formada por todos os parentes, a família funcionava como uma maquina de produção, na qual seus membros se tornavam força de trabalho3.

No entender de Rodrigo da Cunha Pereira4: “A idéia de família para o Direito brasileiro sempre foi a de que ela é constituída de pais e filhos unidos a partir de um casamento regulado e regulamentado pelo Estado”.

3

DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 5.Ed. São Paulo: Revista dos tribunais, 2009. p. 28 4 PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Direito de família: uma abordagem psicanalítica. 3. ed. Belo Horizonte: Del Rey,

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Com a natural evolução da sociedade, a organização da família foi sofrendo mudanças e as relações entre seus integrantes se tornaram muito mais de igualdade e respeito mútuo, fazendo com que o seu antigo formato hierárquico cedesse lugar à sua democratização5.

Para Arnaldo Rizzardo6, o conceito de família tem um significado estrito, constituindo-se independente de vínculos sanguíneos:

No sentido atual, a família tem um significado estrito, constituindo-se pelos pais e filhos, apresentando certa unidade de relações jurídicas, com idêntico nome e o mesmo domicílio e residência, preponderando identidade de interesses materiais e morais, sem expressar evidentemente, uma pessoa jurídica. No sentido amplo, amiúde empregado, diz respeito aos membros unidos pelo laço sanguíneo, constituída pelos pais e filhos, nestes incluídos os ilegítimos ou naturais e os adotados.

Maria Berenice Dias7 leciona que a forma de constituição da família moderna mudou, “o seu principal papel é de suporte emocional do indivíduo, em que há flexibilidade e, indubitavelmente, mais intensidade no que diz respeito a laços afetivos”.

Esse entendimento é reforçado quando Maria Berenice Dias8 diz que:

A família é um grupo social fundado essencialmente nos laços de afetividade após o desaparecimento da família patriarcal, que desempenhava funções procriativas, econômicas, religiosas e políticas.

Foi, sem dúvida, a partir da Constituição da República Federativa do Brasil de 19889 que as relações familiares passaram a ter maior atenção. A Constituição

Federal de 1988, introduziu entre outras inovações, a igualdade de direitos entre os cônjuges e em relação aos filhos, colocando homem e mulher em igualdade frente à entidade familiar.

5

DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 5.Ed. São Paulo: Revista dos tribunais, 2009. p. 29 6 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p.11.

7

DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 5.Ed. São Paulo: Revista dos tribunais, 2009. p. 42 8

DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 5.Ed. São Paulo: Revista dos tribunais, 2009. p. 43 9

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. São Paulo: Saraiva, 2012. Doravante denominada Constituição Federal de 1988.

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Assim, com os novos valores introduzidos pela Constituição Federal de 1988, a família passou a ter vínculos antes não reconhecidos, a exemplo da afetividade, solidariedade e liberdade entre os membros do grupo.

2 PRINCÍPIOS DO DIREITO DE FAMÍLIA

Temos nos princípios constitucionais, o fio condutor da hermenêutica jurídica, encaminhando o intérprete em consonância com os interesses e valores por eles abrigados e também os princípios norteadores do Direito de Família, que devem ser respeitados nas causas que envolvem as relações familiares.10

No que tange aos princípios voltados ao direito de família, Maria Berenice Dias11 faz o seguinte apontamento:

Há princípios especiais que são próprios das relações familiares e devem sempre servir de norte na hora de se apreciar qualquer relação que envolva questões de família, despontando entre eles os princípios da solidariedade e da afetividade.

Sendo assim, pela grande importância dessa fonte do direito, mostra-se relevante destacar a relação dos princípios constitucionais com o Direito de Família, para que sejam também norteadores das relações familiares e possibilitem uma real aplicação da justiça.

2.1 Princípio da dignidade da pessoa humana

O princípio da dignidade da pessoa humana tem caráter fundamental, é base inclusive para outros princípios, atribuído a ele poder que visa proteger a pessoa humana de situações que venha a ser ofendida.

A dignidade da pessoa humana foi consagrada como valor nuclear da ordem constitucional devido à preocupação com a promoção dos direitos humanos e da justiça social.12

10

DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 5.Ed. São Paulo: Revista dos tribunais, 2009. p. 60 11

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Na relação desse princípio com o direito de família, Maria Berenice Dias13

discorre que:

A dignidade da pessoa humana encontra na família o solo apropriado para florescer. A ordem constitucional dá-lhe especial proteção independentemente de sua origem. A multiplicação das entidades familiares preserva e desenvolve as qualidades mais relevantes entre os familiares, o afeto, a solidariedade, a união, o respeito, a confiança, o amor, o projeto de vida comum.

Tendo em vista que a dignidade da pessoa humana é princípio fundamental, ele se torna base para a formação da família, assegurando o desenvolvimento e os direitos de todos os seus membros, principalmente os da criança e adolescente.

2.2 Princípio da convivência familiar

É também dever da família, possibilitar a criança e o adolescente o convívio familiar pleno e saudável, direito este, que está assegurado no artigo 227 da Constituição Federal, que assim dispõe:

Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

Sobre o tema, Paulo Lôbo14 leciona que: “a convivência familiar é a relação

diuturna e duradoura entrelaçada pelas pessoas que compõem o grupo familiar, em virtude de laços de parentesco ou não, no ambiente comum”.

Sem dúvida, a convivência familiar é de grande importância na proteção e formação da criança e adolescente, para que haja uma condução sadia do menor à maioridade, fazendo parte desse vínculo natural, igualmente, a convivência com parentes próximos, tais como avós, tios e primos, fortalecendo ainda mais essa proteção vinda do âmbito familiar.

12

DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 5.Ed. São Paulo: Revista dos tribunais, 2009. p. 61 13

DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 5.Ed. São Paulo: Revista dos tribunais, 2009. p. 62 14

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2.3 Princípio da afetividade

Como maneira de garantir a dignidade de todos, a Constituição Federal de 1988 elenca um imenso rol de direitos individuais e sociais, demonstrando assim o compromisso de assegurar o afeto.15

Ao se pronunciar sobre o tema, Paulo Lôbo16 discorre que: “o princípio da afetividade é o princípio que fundamenta o direito de família, na estabilidade das relações socioafetivas e na comunhão de vida”.

Veja-se o que discorre Maria Helena Diniz17 sobre o afeto no ambiente familiar:

As relações de família, formais ou informais, indígenas ou exóticas, ontem como hoje, por mais complexas que se apresentem, nutrem-se, todas elas, de substâncias triviais e ilimitadamente disponíveis a quem delas queira tomar afeto [...]. A teoria e a prática das instituições de família dependem, em última análise, de nossa competência em dar e receber amor.

Conforme salienta Rolf Madaleno18, a criança e o adolescente “precisam ser nutridos pelo afeto de seus pais, representado pela proximidade física e emocional, cujos valores são fundamentais para o suporte psíquico e para a futura inserção social dos filhos”.

Nesse norte Sérgio Resende Barros19 preceitua que:

O afeto tem compromisso com o gênero humano. Para cumprir esse compromisso, a Constituição fixa três centros de imputação, a família, a sociedade e o Estado, aos quais os artigos 227 e 230 atribuem o dever de assegurar à criança, ao adolescente e ao idoso direitos básicos.

Portanto, nota-se que o afeto é imprescindível na formação saudável da criança e do adolescente, e na sua futura inserção social, e por tal importância

15

DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 5.Ed. São Paulo: Revista dos tribunais, 2009. p.69 16 LÔBO, Paulo. Direito Civil: Famílias. São Paulo: Saraiva, 2011. p.73

17

DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil. 21. Ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 71

18

MADALENO, Rolf. O preço do Afeto in A ética da convivência familiar sua efetividade no cotidiano dos tribunais. Editora Forense: Rio de janeiro, 2006. p. 152

19

BARROS, Sergio Resende. Direitos Humanos da Família: dos fundamentais aos operacionais. São Paulo: Imago, 2003.p. 142

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encontra-se assegurado na magna carta. Em uma ultima analise, os laços de solidariedade e afeto surgem da convivência familiar, da competência de dar e receber amor.

3 RESPONSABILIDADE CIVIL: CONSIDERAÇÕES GERAIS

As relações advindas do direito de família, assim como outros ramos do direito, também estão sujeitas a deveres e obrigações que podem implicar na responsabilização civil em não havendo o seu cumprimento.

Maria Helena Diniz20 define a responsabilidade civil como:

A aplicação de medidas que obriguem uma pessoa a reparar dano moral ou patrimonial causado a terceiros, em razão de ato por ela mesmo praticado, por pessoa por quem ela reponde, por alguma coisa a ela pertencente ou de simples imposição legal.

Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho21, no mesmo sentido,

acrescentam que: “a responsabilidade civil deriva da agressão a um interesse eminentemente particular, sujeitando, assim, o infrator, ao pagamento de uma compensação pecuniária a vítima, caso não possa repor in natura o estado anterior das coisas”.

Já Fábio Ulhoa Coelho22 discorre que: “a responsabilidade civil é a obrigação em que o sujeito ativo pode exigir o pagamento de indenização do passivo por ter sofrido prejuízo imputado a este último”.

Como demonstrado acima, no que diz respeito a responsabilidade civil, a doutrina encontra-se bem homogênea, não havendo divergência entre seus conceitos, podendo-se concluir que a responsabilidade civil é a obrigação de reparar um dano patrimonial ou moral causado a outrem, por fato causado pelo agente ou por pessoas ou coisas que estejam sob sua responsabilidade.

20

DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil. 21. Ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 34

21

GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: responsabilidade civil. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 9

22

COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito civil: obrigações, responsabilidade civil. 4. Ed. São Paulo: Saraiva, 2010.p. 266

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A responsabilidade civil é dividida em duas espécies: subjetiva e objetiva. Sendo que na primeira, a razão de sua responsabilização ocorre pela prática de ato ilícito. Já na objetiva, o agente apenas pratica ato lícito, porém esta relacionada a ele fato jurídico descrito na lei como ensejador da responsabilidade23.

Sobre esse tema, Fábio Ulhoa Coelho24 explica que:

Quem responde subjetivamente fez algo que não deveria ter feito; quem responde objetivamente fez só o que deveria fazer. A ilicitude ou licitude da conduta do sujeito a quem se imputa a responsabilidade civil é que define, respectivamente a espécie subjetiva ou objetiva.

No trabalho em questão, vale dar maior atenção a espécie subjetiva da responsabilidade civil, na qual suas bases estão na manifestação da sua vontade.

3.1 Responsabilidade civil objetiva

Na responsabilidade objetiva, a presença da culpa é irrelevante, vez que o agente tem responsabilidade devido ao risco pelo exercício de sua atividade.

Veja-se o que preceitua Maria Helena Diniz25 a respeito do assunto:

Na responsabilidade objetiva, a atividade que gerou o dano é lícita, mas causou perigo a outrem, de modo que aquele que a exerce, por ter a obrigação de levar para que dela não resulte prejuízo, terá o dever ressarcitório, pelo simples implemento do nexo causal. A vítima deverá pura e simplesmente demonstrar o nexo de causalidade entre o dano e a ação que o produziu.

Sobre a responsabilidade objetiva, Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho26 discorrem que:

Segundo tal espécie de responsabilidade, o dolo ou culpa na conduta do agente causador do dano é irrelevante juridicamente, haja vista que somente será necessária a existência do elo de causalidade entre o dano e a conduta do agente responsável para que surja o dever de indenizar.

23

COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito civil: obrigações, responsabilidade civil. 4. Ed. São Paulo: Saraiva, 2010.p. 269

24

COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito civil: obrigações, responsabilidade civil. 4. Ed. São Paulo: Saraiva, 2010.p. 269

25

DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil. 21. Ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p.54

26

GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: responsabilidade civil. São Paulo: Saraiva, 2006. p.14

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Portanto, para que haja a caracterização da responsabilidade objetiva, não haverá a necessidade de prática de ato ilícito pelo agente causador do dano, visto que este responde pelo risco da sua atividade, tendo a vítima apenas que demonstrar a existência do nexo causal entre o dano e a ação que o causou.

3.2 Responsabilidade civil subjetiva

Na responsabilidade civil subjetiva, encontramos na manifestação da vontade, mesmo ela sendo consciente ou inconsciente, a fonte para tal obrigação, vez que o agente incorreu em conduta diversa a qual se esperava.

Reforçando esse entendimento, destaca-se as lições de Fábio Ulhoa Coelho27:

A responsabilização por ato ilícito pressupõe a exigibilidade da conduta diversa. Se o sujeito fez o que não deveria, ele é responsável exatamente porque estava ao seu alcance não fazer; ou, por outra: se não fez o que deveria, é responsável porque fazer era-lhe possível. Ao comportar-se de certa maneira, quando poderia comportar-se de outra, o sujeito de direito manifesta, num certo sentido, sua vontade.

A responsabilidade civil subjetiva, a qual é calcada na culpa, está prevista no Código Civil em seu artigo 927: “Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, é obrigado a repará-lo”.

O dano causado em função de ato culposo ou doloso caracteriza a responsabilidade civil subjetiva. Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho28 destacam que “a noção básica da responsabilidade civil, dentro da doutrina subjetiva, é o principio segundo o qual cada um responde pela própria culpa”.

Ao analisarmos o tema supracitado, nota-se a presença da culpa como um dos principais elementos causadores dessa responsabilidade.

3.3 Culpa

A culpa é dividida em atos intencionais e não intencionais, sendo no primeiro caso, figura conhecida juridicamente como dolo, ou seja, quando o agente

27

COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito civil: obrigações, responsabilidade civil. 4. Ed. São Paulo: Saraiva, 2010.p.272

28

GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: responsabilidade civil. São Paulo: Saraiva, 2006. p.14

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pratica atos causando prejuízos a outrem com o objetivo ou assumindo o risco do evento danoso, já nos atos não intencionais figura a culpa simples, ou seja, quando ocorre a negligência, imprudência ou imperícia29.

Sobre o assunto Fábio Ulhoa Coelho30 discorre que:

A culpa que dá ensejo à responsabilidade civil corresponde a ato voluntário, que deveria ter sido diferente. Sem a exigibilidade de conduta diversa, não há ação ou omissão culposa. Embora sempre voluntária, a culpa pode corresponder a ato intencional ou não. No primeiro caso, chama-se dolo, que pode ser direto (o dano causado era a intenção do seu autor) ou indireto (o autor assumiu o risco de causar o dano). A culpa não intencional, a seu turno, é a negligência, imprudência ou imperícia.

Reforçando essa ideia, Maria Helena Diniz31 acrescenta que:

A culpa em sentido amplo, como violação de um dever jurídico, imputável a alguém, em decorrência de fato intencional ou de omissão de diligência ou cautela, compreende: o dolo, que é a violação intencional do dever jurídico, e a culpa em sentido estrito, caracterizada pela imperícia, imprudência ou negligência, sem qualquer deliberação de violar um dever.

Sendo assim, não importa se o ato danoso ocorreu realmente pelo querer do agente, mesmo não tendo ele ciência exata do seu ato e nem medido suas consequências, haverá a caracterização da culpa se agiu com negligência, imprudência ou imperícia.

3.4 Dano

Conforme o entendimento de Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho32 pode-se conceituar dano “como sendo a lesão a um interesse jurídico tutelado, patrimonial ou não, causado por ação ou omissão do sujeito infrator”.

29

COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito civil: obrigações, responsabilidade civil. 4. Ed. São Paulo: Saraiva, 2010.p. 322

30

COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito civil: obrigações, responsabilidade civil. 4. Ed. São Paulo: Saraiva, 2010.p. 323

31

DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil. 21. Ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 41

32

GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: responsabilidade civil. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 36

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No mesmo norte, Maria Helena Diniz33 preceitua que: “o dano pode ser

definido como a lesão (diminuição ou destruição) que, devido a certo evento, sofre uma pessoa, contra sua vontade, em qualquer bem ou interesse jurídico, patrimonial ou moral”.

O dano é também um dos elementos da responsabilidade civil, é definido pela lesão de um bem jurídico, e também pelo prejuízo sofrido por alguém, sendo que a sua não configuração, descaracteriza a responsabilidade civil.

A respeito desse assunto, Maria Helena Diniz34 discorre que:

O dano é um dos pressupostos da responsabilidade civil, contratual ou extracontratual, visto que não poderá haver ação de indenização sem a existência de u m prejuízo. Só haverá responsabilidade civil se houver um dano a reparar (RSTJ, 63:251). Isto é assim porque a responsabilidade resulta em obrigação de ressarcir, que, logicamente, não poderá concretizar-se onde nada há que reparar.

Fábio Ulhoa Coelho35 reforça esse entendimento ao lecionar que:

A existência de dano é condição essencial para a responsabilidade civil, subjetiva ou objetiva. Se quem pleiteia a responsabilização não sofreu dano de nenhuma espécie, mas meros desconfortos ou riscos, não tem direito a nenhuma indenização.

Portanto, somente caracterizará a responsabilidade civil, e portanto, o dever de reparar o prejuízo, se ocorrer o dano, e nas situações em que a reparação ao estado anterior à lesão/dano não seja mais possível, o agente causador deverá compensar esse dano efetuando pagamento de natureza indenizatória.

O dano, assim considerado, poderá ser passível de reparação desde que comprovada à ofensa ao bem jurídico patrimonial ou moral, o qual se discorrerá a seguir.

3.4.1 Dano material

O dano material, conforme Maria Helena Diniz36 pode ser conceituado como:

33

DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil. 21. Ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 62

34

DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil. 21. Ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 59

35

COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito civil: obrigações, responsabilidade civil. 4. Ed. São Paulo: Saraiva, 2010.p. 301

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A lesão concreta, que afeta um interesse relativo ao patrimônio da vítima, consistente na perda ou deterioração, total ou parcial, dos bens materiais que lhe pertencem, sendo suscetível de avaliação pecuniária e de indenização pelo responsável.

Fábio Ulhoa Coelho37 entende que danos matérias “são os que reduzem o valor ou inutilizam por completo bens do credor da indenização. Implicam sempre diminuição do patrimônio da vítima”.

Reforçando essa ideia, Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho38

discorrem que: “o dano patrimonial traduz lesão aos bens e direitos economicamente apreciáveis do seu titular”.

Ainda sobre o assunto, Maria Helena Diniz39 discorre que:

O dano patrimonial mede-se pela diferença entre o valor atual do patrimônio da vítima e aquele que teria, no mesmo momento, se não houvesse a lesão. O dano, portanto, estabelece-se pelo confronto entre o patrimônio realmente existente após o prejuízo e o que provavelmente existiria se a lesão não se tivesse produzido.

Portanto, no que diz respeito à conceituação do dano material, a doutrina é pacífica, tratando o referido dano como lesão sofrida por algum bem pertencente ao patrimônio da vítima, causando a diminuição ou até a extinção do seu valor.

3.4.2 Dano Moral

O dano moral é lesão de interesses não patrimoniais, provocada por fato lesivo no direito subjetivo da vítima. Pode ser entendido como a angústia ou dor pela privação de determinado bem jurídico de interesse da pessoa lesada40.

Destaca-se o entendimento de Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho41:

36

DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil. 21. Ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 66

37

COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito civil: obrigações, responsabilidade civil. 4. Ed. São Paulo: Saraiva, 2010.p.302

38

GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: responsabilidade civil. São Paulo: Saraiva, 2006. p.40

39

DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil. 21. Ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p.66

40

DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil. 21. Ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p.90

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O dano moral consiste na lesão de direito cujo conteúdo não é pecuniário, nem comercialmente redutível a dinheiro. Em outras palavras, podemos afirmar que o dano moral é aquele que lesiona a esfera personalíssima da pessoa, violando, por exemplo, sua intimidade, vida privada, honra e imagem, bem jurídicos tutelados constitucionalmente.

No entanto, não é qualquer dor ou aflição que seja passível de reparação pelo direito, e sim, somente aquelas que forem decorrentes da privação de um bem jurídico sobre o qual a vítima teria interesse juridicamente reconhecido.

A reparabilidade do dano moral foi matéria de controvérsias na doutrina, sendo pacificada, com o advento da Constituição Federal de 1988, que trouxe consigo expressamente a possibilidade da indenização por dano moral em seu artigo 5.º42, inciso V, e inciso X43.

No que tange ao assunto, Diniz44 discorre que: “se o interesse moral justifica a ação para defendê-lo ou restaurá-lo, é evidente que esse interesse é indenizável, mesmo que o bem moral não se exprima em dinheiro”.

Acrescenta ainda Maria Helena Diniz45 que:

A reparação do dano moral é, em regra, pecuniária, ante a impossibilidade do exercício do jus vindicatae, visto que ele ofenderia os princípios da coexistência e da paz social. A reparação em dinheiro viria neutralizar os sentimentos negativos de mágoa, dor, tristeza, angústia, pela superveniência de sensações positivas, de alegria, satisfação, pois possibilitaria ao ofendido algum prazer, que, em certa medida, poderia atenuar seu sofrimento.

Nesse mesmo norte tem-se o entendimento de Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho46:

41

GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: responsabilidade civil. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 55

42

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: V - é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem;

43X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;

44

DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil. 21. Ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 96

45

DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil. 21. Ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 106

46

GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: responsabilidade civil. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 77

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A reparação, em tais casos, reside no pagamento de uma soma pecuniária, arbitrada judicialmente, com o objetivo de possibilitar ao lesado uma satisfação compensatória pelo dano sofrido, atenuando, em parte, as consequências da lesão.

Portando, causando dano a outrem, mesmo que de forma involuntária e praticado o ato ilícito, o causador do dano deverá reparar. Como no dano moral não existe a possibilidade da lesão ser recuperada, voltando ao seu estado anterior, a indenização torna-se pecuniária, de forma a tentar compensar em parte e atenuar os efeitos da lesão.

3.4.2.1 Quantificação do dano moral

Em tema de dano moral, a questão mais difícil para doutrina e jurisprudência é a quantificação do dano moral, ou seja, como traduzir em pecúnia a lesão de um bem que não tem valor material.

Segundo Fábio Ulhoa Coelho47: “o padrão geral é o da intensidade da dor. Quanto maior o pesar experimentado pelo sujeito ativo, maior o valor da indenização. Não há e é provável que nunca haja instrumentos de medição da dor”. Veja-se o entendimento de Maria Helena Diniz48 sobre a quantificação do dano:

O magistrado, para que possa estabelecer, equitivamente, o quantum da indenização do dano moral, deverá considerar a gravidade da lesão, baseado na conduta culposa ou dolosa do agente, a situação econômica do lesante, as circunstâncias do fato, a situação individual e social da vítima ou dos lesados etc.

Ainda sobre a dificuldade em estabelecer o quantum no dano moral, Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho49 preceituam que:

O objeto da liquidação da reparação pecuniária do dano moral é uma importância que compensa a lesão extrapatrimonial sofrida. Não há como evitar a ideia de que, efetivamente, a natureza do objeto da liquidação exige o arbitramento, uma vez que os simples cálculos ou os artigos são inviáveis, na espécie.

47

COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito civil: obrigações, responsabilidade civil. 4. Ed. São Paulo: Saraiva, 2010.p.442

48

DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil. 21. Ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 136

49

GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: responsabilidade civil. São Paulo: Saraiva, 2006. p.353

(15)

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Sendo assim, o arbitramento judicial se torna o meio mais eficiente na avaliação do quantum, conforme destacam ainda Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho50:

O Juiz, investindo-se na condição de árbitro, deverá fixar a quantia que considere razoável para compensar o dano sofrido. Para isso, pode o magistrado valer-se de quais parâmetros sugeridos pelas partes, ou mesmo adotados de acordo com sua consciência e noção de equidade [...]

Portanto, não dispondo o Juiz de um critério jurídico, tem ele a liberdade para estipular o quantum indenizatório a partir da sua experiência como magistrado e pelos critérios da analogia e equidade, e caso o valor estabelecido seja insatisfatório ou excessivo, cabe às partes reclamar a uma instância superior.51

(p355 Pamplona)

4. A POSSIBILIDADE DE REPARAÇÃO DO DANO AFETIVO PELOS GENITORES

A possibilidade da ocorrência de uma reparação de dano causado pelo abandono afetivo dos genitores para com a sua prole, será analisada no decorrer desde tópico, no intuito de se alcançar o objetivo proposto na presente pesquisa.

Primeiramente, vale salientar que não existem restrições legais à aplicação das regras de responsabilidade civil e consequentemente o dever de indenizar, no âmbito direito de família, o que justifica a sua aplicação também nas relações afetivas.

Conforme destacado nos item acima estudados, a responsabilidade civil subjetiva tem como pilar três pressupostos: o dano, a culpa do autor e o nexo causal. Portanto, havendo a presença desses três elementos, é cabível a vítima o direito de ser indenizada de forma compensatória pelo dano sofrido, no caso em questão, também aplicável ao abando afetivo pelos genitores em relação aos seus filhos.

50

GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: responsabilidade civil. São Paulo: Saraiva, 2006. p.354

51

GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: responsabilidade civil. São Paulo: Saraiva, 2006. p.355

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1619

Sobre a possibilidade de indenização decorrente do abandono afetivo, veja-se o recente posicionamento do Superior Tribunal de Justiça, tendo como relatora a Ministra Nancy Andrighi52, cuja ementa segue:

CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. FAMÍLIA. ABANDONO AFETIVO. COMPENSAÇÃO POR DANO MORAL. POSSIBILIDADE. 1. Inexistem restrições legais à aplicação das regras concernentes à responsabilidade civil e o consequente dever de indenizar/compensar no Direito de Família. 2. O cuidado como valor jurídico objetivo está incorporado no ordenamento jurídico brasileiro não com essa expressão, mas com locuções e termos que manifestam suas diversas desinências, como se observa do art. 227 da CF/88. 3. Comprovar que a imposição legal de cuidar da prole foi descumprida implica em se reconhecer a ocorrência de ilicitude civil, sob a forma de omissão. Isso porque o non facere, que atinge um bem juridicamente tutelado, leia-se, o necessário dever de criação, educação e companhia – de cuidado – importa em vulneração da imposição legal, exsurgindo, daí, a possibilidade de se pleitear compensação por danos morais por abandono psicológico. 4. Apesar das inúmeras hipóteses que minimizam a possibilidade de pleno cuidado de um dos genitores em relação à sua prole, existe um núcleo mínimo de cuidados parentais que, para além do mero cumprimento da lei, garantam aos filhos, ao menos quanto à afetividade, condições para uma adequada formação psicológica e inserção social. 5. A caracterização do abandono afetivo, a existência de excludentes ou, ainda, fatores atenuantes – por emandarem revolvimento de matéria fática – não podem ser objeto de reavaliação na estreita via do recurso especial. 6. A alteração do valor fixado a título de compensação por danos morais é possível, em recurso especial, nas hipóteses em que a quantia estipulada pelo Tribunal de origem revela-se irrisória ou exagerada. 7. Recurso especial parcialmente provido. (Superior Tribunal de Justiça, Terceira Turma, Processo REsp 1159242, 10/05/2012)

Também no mesmo sentido já entendeu o Egrégio Tribunal de Alçada Civil de Minas Gerais53, cuja ementa discorre:

INDENIZAÇÃO DANOS MORAIS – RELAÇÃO PATERNO-FILIAL – PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA – PRINCÍPIO DA AFETIVIDADE O dor sofrida pelo filho, em virtude do abandono paterno, que o privou do direito à convivência, ao amparo afetivo,

52

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. REsp. nº1159242 Relatora:Nancy Andrighi. julgado em 10-05-2012. Disponível em: www.stj.gov.br/jurisprudencias. Acesso em: 15 out. 2012.

53

MINAS GERAIS. Tribunal de Justiça de Minas Gerais. Ap. Civ. N° 408.550-5, 7ª C. Civ., j. 01/04/04, Relator Juiz Unias Silva. Disponível em www.tjmg.jus.br/jurisprudencias. Acesso em:15 out. 2012

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moral e psíquico, deve ser indenizável, com fulcro no princípio da dignidade da pessoa humana. (Tribunal de Alçada do Estado de MG, Ap. Civ. N° 408.550-5, 7ª C. Civ., j. 01/04/04, Relator Juiz Unias Silva)

No mesmo norte veja-se a decisão do Egrégio Tribunal do Rio de Janeiro54,

cuja ementa segue:

ABANDONO AFETIVO ATO PRATICADO PELO PAI DANO MORAL CARACTERIZACAO FIXACAO DO VALOR APLICACAO DOS PRINCIPIOS DA PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE APELAÇÃO CÍVEL. ABANDONO AFETIVO. GENITOR. DANOS MORAIS. DEVER DE INDENIZAR. Inobstante as controvérsias existentes sobre o tema, inclusive no âmbito do STJ, o abandono afetivo por parte do genitor, capaz de gerar dor, vergonha e sofrimento, caracteriza dano moral passível de indenização. O valor arbitrado a título de indenização, deve atender aos parâmetros do razoável e proporcional. Recursos aos quais se nega provimento.

Como já mencionado no decorrer da pesquisa, os cuidados para com a criança e adolescente são de suma importância para o seu sadio desenvolvimento psíquico, social e profissional e é neste tópico que se afirma a possibilidade de reparação, caso haja omissão por parte dos genitores.

Nesse norte, segue fragmento do voto da Ministra Nancy Andrighi55:

Vê-se hoje nas normas constitucionais a máxima amplitude possível e, em paralelo, a cristalização do entendimento, no âmbito científico, do que já era empiricamente percebido: o cuidado é fundamental para a formação do menor e do adolescente; ganha o debate contornos mais técnicos, pois não se discute mais a mensuração do intangível – o amor – mas, sim, a verificação do cumprimento, descumprimento, ou parcial cumprimento, de uma obrigação legal: cuidar.

Destaca-se das lições da Ministra Nancy Andrighi que não é o amor entre pais e filhos que se busca quantificar, pois isto é intangível, como diz a relatora, o que se busca na indenização pelo abandono afetivo é a responsabilização do agente pelo descumprimento da sua obrigação constitucional de cuidado com sua prole.

54

RIO DE JANEIRO. Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro. AP. Civ. Nº 0154617-61.2010.8.19.0001 DES. CHERUBIN HELCIAS SCHWARTZ - Julgamento: 03/05/2012 - DECIMA SEGUNDA CAMARA CIVEL. Disponível em www.tjrj.jus.br/jurisprudencias . Acesso em 15 out. 2012

55

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. REsp. nº1159242. Relatora:Nancy Andrighi.julgado em 10-05-2012 Disponível em: www.stj.gov.br/jurisprudencias. Acesso em: 15 out. 2012

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Faz-se importante destacar na presente pesquisa que há inúmeros julgados de vários tribunais brasileiros que não reconhecem a ocorrência do dano afetivo, por entenderem que o amor e o carinho não são exigíveis do ponto de vista obrigacional, conforme destaca o Desembargador Marcus Túlio Sartorato do Tribunal de Justiça de Santa Catarina56:

Os sentimentos compreendem a esfera mais íntima do ser humano e, para existirem, dependem de uma série de circunstâncias subjetivas. Portanto, o filho não pode obrigar o pai a nutrir amor e carinho por ele, e por este mesmo motivo, não há fundamento para reparação pecuniária por abandono afetivo.

No mesmo sentido, já se manifestou o Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande Do Sul57:

A paternidade pressupõe a manifestação natural e espontânea de afetividade, convivência, proteção, amor e respeito entre pais e filhos, não havendo previsão legal para obrigar o pai visitar o filho ou manter laços de afetividade com o mesmo. Também não há ilicitude na conduta do genitor, mesmo desprovida de amparo moral, que enseje dever de indenizar.

Como se vê, é a obrigação legal de cuidado e proteção aos filhos que é objeto de análise pelos tribunais e não apenas o afeto em si.

Ainda sobre o dever legal de cuidar da criança e adolescente, e a sua proteção decorrente de alguma negligência, acrescenta a Ministra Nancy Andrighi58 que:

Essa percepção do cuidado como tendo valor jurídico já foi, inclusive, incorporada em nosso ordenamento jurídico, não com essa expressão, mas com locuções e termos que manifestam suas diversas desinências, como se observa do art. 227 da CF/88. [...]. Negar ao cuidado o status de obrigação legal importa na vulneração da membrana constitucional de proteção ao menor e adolescente, cristalizada, na parte final do dispositivo citado: “(...) além de colocá-los a salvo de toda a forma de negligência (...)”.

56

SANTA CATARINA. Tribunal de Justiça de Santa Catarina. AC 292381 SC 2010.029238-1. Rel. Des. Marcus Túlio Sartorato. Terceira Câmara de Direito Civil. Julgado em: 30.06.2010. Disponível em: www.tj.sc.gov.br/jurisprudencia. Acesso em: 15 out. 2012.

57 RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Apelação Cível Nº 70044341360, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: André Luiz Planella Villarinho, Julgado em 23/11/2011. Disponível em: WWW.tjrs.jus.br/jurisprudencias. acesso em: 15 out. 2012.

58

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. REsp. nº1159242. Relatora:Nancy Andrighi.julgado em 10-05-2012 Disponível em: www.stj.gov.br/jurisprudencias. Acesso em: 15 out. 2012.

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Portando, alcançando o cuidado à categoria de obrigação legal, quando existir negligência nesse dever, caracterizando abandono afetivo em face do filho menor, estará o genitor incorrendo em ato ilícito. Como dito, não é discutido o dever de amar, e sim o dever legal de cuidar, dever que é jurídico, o qual vem incrustado após a decisão de gerar ou adotar filhos.

Veja-se o que relata ainda a Ministra Nancy Andrighi59:

Em suma, amar é faculdade, cuidar é dever. A comprovação que essa imposição legal foi descumprida implica. por certo, a ocorrência de ilicitude civil, sob a forma de omissão, pois na hipótese o non facere que atinge um bem juridicamente tutelado, leia-se, o necessário dever de criação, educação e companhia – de cuidado – importa em vulneração da imposição legal.

Portanto, quando os genitores forem negligentes com sua prole, não exercendo o dever legal de cuidado, fazendo com que haja abandono afetivo, no seu sentido mais amplo, estarão incorrendo em ato ilícito, causando dano a sua prole, de cujo ato caberá indenização de forma a compensar essa lesão sofrida pela vitima.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente artigo buscou de forma sucinta demonstrar a possibilidade de reparação por dano moral, através da responsabilidade civil subjetiva, em virtude do abandono afetivo e a negligência dos genitores no dever legal de cuidado da prole.

Destacou-se no presente trabalho, que embora amar seja faculdade, o cuidar da prole é dever jurídico dos genitores, conforme demonstrado pelo recente entendimento do Superior Tribunal de Justiça, portanto divergindo do entendimento dos Tribunais de Justiça de Santa Catarina e Rio Grande do Sul supracitados na pesquisa, onde entendem que o amor e afeto não são exigíveis do ponto de vista obrigacional assim como a existência do convívio familiar para que a criança e adolescente tenham uma boa formação psíquica, social e profissional futuramente.

Portanto, havendo a presença do dano, a culpa do genitor e o nexo causal, resta caracterizada a responsabilidade civil subjetiva, sendo perfeitamente cabível a

59

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. REsp. nº1159242 Relatora: Nancy Andrighi julgado em 10-05-2012 Disponível em: www.stj.gov.br/jurisprudencias. Acesso em: 15 out. 2012.

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reparação do dano através de indenização de caráter compensatória pela lesão sofrida, conforme inclusive tem entendido o Superior Tribunal de Justiça, Tribunal de Justiça de Minas Gerais e Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro destacados durante a pesquisa, confirmando assim a pergunta de partida.

REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS

BARROS, Sergio Resende. Direitos Humanos da Família: dos fundamentais aos operacionais. São Paulo: Imago, 2003.

BRASIL. Código Civil. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. São Paulo: Saraiva, 2012.

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Disponível em: www.stj.gov.br/jurisprudencias. Acesso em: 15 out. 2012.

COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito civil: obrigações, responsabilidade civil. 4. Ed. São Paulo: Saraiva, 2010.

DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 5.Ed. São Paulo: Revista dos tribunais, 2009.

DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil. 21. Ed. São Paulo: Saraiva, 2007.

GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito

civil: responsabilidade civil. São Paulo: Saraiva, 2006.

LÔBO, Paulo. Direito Civil: Famílias. São Paulo: Saraiva, 2011.

MADALENO, Rolf. O preço do Afeto in A ética da convivência familiar sua

efetividade no cotidiano dos tribunais. Editora Forense: Rio de janeiro, 2006.

MINAS GERAIS. Tribunal de Justiça de Minas Gerais. Disponível em www.tjmg.jus.br/jurisprudencias. Acesso em:15 out. 2012

PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Direito de família: uma abordagem psicanalítica. 3. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2003.

RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Disponível em: WWW.tjrs.jus.br/jurisprudencias. acesso em: 15 out. 2012.

RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família. Rio de Janeiro: Forense, 2005. SANTA CATARINA. Tribunal de Justiça de Santa Catarina. Disponível em: www.tj.sc.gov.br/jurisprudencia. Acesso em: 15 out. 2012.

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