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Problemas urbanos : contributos da geografia escolar para o desenvolvimento de aprendizagens significativas

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Academic year: 2021

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Problemas Urbanos

Contributos da geografia escolar para o desenvolvimento de

aprendizagens significativas

Sofia Isabel Monteiro Pereira

Relatório da Prática de Ensino Supervisionada

Mestrado em Ensino de História e Geografia no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino Secundário

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Problemas Urbanos

Contributos da geografia escolar para o desenvolvimento de

aprendizagens significativas

Sofia Isabel Monteiro Pereira

Relatório da Prática de Ensino Supervisionada orientado pelo Professor Doutor Herculano Alberto Pinto Cachinho e coorientado pelo Professor Doutor Sérgio Claudino Loureiro

Nunes

Mestrado em Ensino de História e Geografia no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino Secundário

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(4)

iii

Dedico este trabalho às pessoas mais importantes da minha vida,

Pelos valores que me transmitiram e incutiram Pelo apoio incondicional que manifestaram Pelo que sou.

À minha mãe,

a quem devo tudo.

Aos meus amigos,

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iv

A realização do presente relatório não teria sido possível sem o apoio e alento incondicionais de todos os que estiveram ao meu lado. Por isso, estes agradecimentos são a expressão do meu enorme reconhecimento.

A minha primeira palavra de apreço é dirigida ao meu Orientador, o Professor Doutor Herculano Cachinho, pelo interesse que desde o primeiro momento manifestou em acompanhar-me e pela orientação paciente ao longo deste percurso, agradeço as sugestões, disponibilidade incondicional e incentivo constante.

Ao meu Coorientador, o Professor Doutor Sérgio Claudino, pela paciência, apoio e aconselhamento manifestados ao longo de todo o percurso.

Aos Professores do Mestrado em Ensino de História e Geografia, especialmente à Professora Doutora Maria Helena Esteves, à Professora Ana Leal de Faria e ao Professor Doutor Miguel Corrêa Monteiro por todos os ensinamentos e momentos de partilha.

À minha Professora Cooperante, Maria João Vieira, principal fonte de inspiração nos primeiros passos da iniciação à prática profissional, agradeço o acompanhamento, preocupação e, sobretudo, a partilha de experiências.

A toda a comunidade da Escola Secundária Maria Amália Vaz de Carvalho, pela recetividade e cortesia com que me acolheram e, em especial, aos alunos da disciplina de Geografia, pela participação ativa e contributos neste projeto.

À Inês, que disponibilizou muito do seu tempo para me apoiar, pela sólida amizade de longa data, presença constante e palavras de encorajamento em todos os momentos. No fundo, muito obrigada por crescermos juntas.

À Rita, que me acompanhou diariamente e se tornou um autêntico motor em toda esta caminhada, obrigada pela amizade, paciência, pela sempre enriquecedora troca de ideias e sugestões e por me transmitires força e coragem.

À Sara, que apesar da distância sempre manifestou o seu incessante apoio e compreensão, agradeço as palavras de incentivo, a amizade, o estímulo e a disponibilidade para tudo o que necessitei ao longo deste percurso.

Ao Tiago, um especial agradecimento por acreditar sempre em mim e valorizar, de forma sistemática, o meu trabalho.

À Lucy, pelas intermináveis horas de companhia. À minha mãe, por tudo o que me ensinou.

(6)

v

O relatório apresentado descreve as experiências desenvolvidas no âmbito da prática letiva supervisionada, inserida no contexto da unidade curricular de Iniciação à Prática Profissional III, do Mestrado em Ensino de História e Geografia. Por conseguinte, no presente documento relata-se e analisa-se o trabalho realizado na disciplina de Geografia A, desenvolvido com os alunos de uma turma do 11.º ano da Escola Secundária Maria Amália Vaz de Carvalho, que teve como principal objetivo dar resposta à questão: Que

problemas afetam hoje os bairros da cidade de Lisboa e que medidas se podem propor para a sua resolução, tendo em vista a melhoria da qualidade de vida da população?.

Enquadrada no tema Os espaços organizados pela população, a prática envolveu a conceção e implementação de uma intervenção letiva centrada na metodologia ativa de ensino-aprendizagem designada Aprendizagem Baseada em Problemas (ABP). Neste sentido, a partir das preocupações apontadas pelos alunos no levantamento das respetivas ideias prévias, pretendeu-se que, por via da concretização de diferentes atividades sequenciadas no decorrer da unidade didática, os alunos aprendessem a identificar e a refletir sobre os problemas urbanos de determinadas áreas de estudo, que debatessem e compreendessem o impacte destes problemas na qualidade de vida da população residente, que adquirissem competências de observação, recolha e tratamento de informação pertinente sobre o espaço urbano e, ainda, que desenvolvessem o pensamento crítico relativamente às sugestões de resolução apresentadas. O trabalho desenvolvido culminou numa tarefa final que consistiu na apresentação pública, por parte dos alunos, de uma proposta de resolução para os problemas urbanos por eles identificados.

A análise realizada aos resultados alcançados teve um cariz essencialmente descritivo e qualitativo, revelando que os resultados obtidos comprovam a importância do desenvolvimento de aprendizagens significativas, nomeadamente no contexto da disciplina de Geografia A, às quais se associa um aumento da motivação dos alunos e uma atitude positiva e ativa dos mesmos perante novos desafios. Assim, crê-se que as implicações do trabalho realizado, além de terem sido determinantes no contexto da vida escolar destes alunos, se projetaram e revelaram importantes no crescimento e desenvolvimento dos mesmos enquanto cidadãos conscientes e intervenientes.

Palavras-chave: Geografia, Geografia Escolar, Problemas Urbanos, Aprendizagem

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vi

The stated report describes the experiences developed in the scope of the supervised practice, inserted in the context of the curricular unit of Initiation to the Professional Practice III, of the Master Degree in History and Geography Teaching. Therefore, the present document delineates and analyses the work developed, in the subject of Geography A, with the students of the 11th grade of the Secondary School Maria Amália Vaz de Carvalho, that had as main purpose to answer the following question: Which

problems affect today the neighbourhoods of the city of Lisbon and what measures can be proposed for its resolution, in order to improve the quality of life of the population?.

Framed in the theme The spaces organised by the population, the practice involved the conception and implementation of a tutored approached centred on the active teaching-learning methodology designated Problem-Based Learning. In this sense, derived from the concerns pointed by the students during the gathering of the respective previous ideas, was intended that, by the concretisation of different activities during the didactic unit, the students learned to identify and to reflect about the urban problems of certain areas of study, debated and understand the impact of those problems in the quality of life of the resident population, acquired skills related with the observation, collection and treatment of the crucial information about the urban space, and also, developed critical thinking relatively to the suggestions of the presented resolutions. The developed work culminated in a final assignment that consisted in a public presentation by the students, of a proposal of resolution for the urban problems identified they identified.

The analyse of the achieved results had an essentially descriptive and qualitative span, revealing, that the obtained results demonstrate the importance of fulfilling significative learning skills, concerning the subject of Geography A, to which have been associated an increase in the motivation of the students and a positive and active attitude of these when faced with new challenges. Hence, is believed that the implications of the elaborated work, apart from being determinant in the context of the school environment of these students, have revealed itself important in the improvement and furtherance of the students as conscious and intervenient citizens.

Key-words: Geography, School Geography, Urban Problems, Problem-Based Learning,

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vii DEDICATÓRIA ... iii AGRADECIMENTOS ... iv RESUMO ... v ABSTRACT ... vi ÍNDICE DE FIGURAS ... ix ÍNDICE DE GRÁFICOS ... x ÍNDICE DE QUADROS ... xi

ÍNDICE DE ANEXOS ... xii

INTRODUÇÃO ... 1

CAPÍTULO I – ENQUADRAMENTO CIENTÍFICO ... 5

1.1. As principais tendências urbanas da atualidade ... 5

1.1.1. Um mundo urbanizado com padrões de crescimento distintos ... 5

1.1.2. A prosperidade urbana e suas dimensões ... 10

1.2. Os problemas urbanos como obstáculo à prosperidade das cidades ... 17

1.2.1. Ameaças urbanas persistentes ... 17

1.2.1.1. Alterações no modelo de crescimento urbano ... 18

1.2.1.2. Proliferação contínua dos bairros de lata... 19

1.2.1.3. Saturação dos serviços e infraestruturas urbanas ... 21

1.2.2. Problemas urbanos emergentes ... 23

1.2.2.1. Exclusão social, pobreza e desigualdade ... 23

1.2.2.2. Aumento da migração involuntária ... 25

1.2.2.3. Incremento da insegurança e risco urbano ... 27

1.2.2.4. Alterações climáticas e degradação ambiental ... 29

CAPÍTULO II – ENQUADRAMENTO PEDAGÓGICO ... 33

2.1. Questões pertinentes em torno da Geografia Escolar ... 33

2.1.1. A Geografia: do percurso histórico à institucionalização como Ciência ... 33

2.1.2. O valor formativo e a utilidade social da educação geográfica ... 36

2.1.3. O contributo da Geografia para a Cidadania ... 39

2.2. Contextualização da unidade didática nas linhas programáticas ... 41

2.2.1. Os problemas urbanos no Programa de Geografia A ... 41

2.2.2. Os problemas urbanos no manual escolar adotado ... 43

2.2.3. O Estudo de Caso como componente investigativa ... 45

2.2.3.1. O Projeto Nós Propomos!... 47

CAPÍTULO III – CONTEXTO ESCOLAR E REALIDADE EDUCATIVA ... 49

3.1. Caraterização da escola cooperante e da comunidade escolar ... 49

3.1.1. Enquadramento geográfico ... 49

3.1.2. Breve historial da escola ... 51

(9)

viii

3.4. A importância da observação de aulas ... 55

3.5. As atividades não letivas desenvolvidas ... 55

CAPÍTULO IV – A APRENDIZAGEM BASEADA EM PROBLEMAS ... 57

4.1. Caraterísticas da Aprendizagem Baseada em Problemas ... 57

4.1.1. Natureza empírica e fundamentos teóricos ... 57

4.1.2. Particularidades dos problemas e respetivos cenários ... 61

4.1.3. O aluno no centro da aprendizagem e o professor como tutor ... 64

4.1.4. A importância do trabalho cooperativo ... 65

4.1.5. As etapas específicas da ABP ... 68

4.1.6. Limitações e vantagens inerentes à ABP ... 70

CAPÍTULO V – A UNIDADE DIDDÁTICA: CONCEÇÃO, IMPLEMENTAÇÃO E AVALIAÇÃO 73 5.1. Os problemas urbanos através da ABP ... 73

5.1.1. Planificação e orientação da intervenção pedagógica para a ABP ... 73

5.1.2. A preparação da intervenção pedagógica de acordo com a ABP ... 75

5.1.2.1. O levantamento das ideias-prévias ... 75

5.1.2.2. A formação e a dinâmica dos grupos ... 78

5.1.2.3. A situação-problema e o cenário problemático apresentados .... 84

5.2. A intervenção pedagógica e o desenvolvimento do processo de ABP ... 86

5.2.1. Estratégias de ensino-aprendizagem adotadas ... 87

5.2.1.1. Como proceder à recolha de informação de base geográfica? ... 88

5.2.1.2. Que aspetos considerar na observação do espaço urbano? ... 89

5.2.1.3. Qual a pertinência do role-playing na prática pedagógica? ... 90

5.2.1.4. Como proceder à recolha da informação estatística? ... 93

5.2.2. Produtos desenvolvidos no processo de resolução do problema ... 94

5.2.2.1. Grupo A ... 94

5.2.2.2. Grupo B ... 94

5.2.2.3. Grupo C ... 95

5.2.2.4. Grupo D ... 95

5.2.2.5. Grupo E ... 96

5.3. Avaliação dos resultados da prática pedagógica ... 97

5.3.1. Técnicas e instrumentos de recolha de dados ... 97

5.3.2. Técnicas de tratamento de dados ... 99

5.3.3. Evidências de aprendizagem ... 99

CONSIDERAÇÕES FINAIS... 109

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ... 115

(10)

ix

Figura 1 Atuais e futuras megacidades do mundo (2015-2030) 9

Figura 2 A Roda da Prosperidade 16

Figura 3 Evolução da população urbana a residir em bairros de lata, por grandes regiões 21

Figura 4 Relação entre urbanização e pobreza 22

Figura 5 Desigualdade versus Taxa de Pobreza, 2013 25

Figura 6 Registo da variação global de emissões de CO2 29

Figura 7 Enquadramento da subunidade didática Problemas Urbanos 42 Figura 8 Localização da Escola Secundária Maria Amália Vaz de Carvalho na cidade de Lisboa 50 Figura 9 Aspetos evidenciados pelos alunos sobre a cidade de Lisboa 77 Figura 10 Pontuação individual versus Pontuação em grupo dos alunos do Grupo A 82 Figura 11 Pontuação individual versus Pontuação em grupo dos alunos do Grupo E 83 Figura 12 Palavras e expressões que representam os principais problemas existentes em Lisboa 84

(11)

x

Gráfico 1 Contributo do método de ensino para a aquisição de competências de trabalho de grupo 102 Gráfico 2 Relevância da apresentação oral dos trabalhos e dos respetivos resultados 104 Gráfico 3 Relevância da situação-problema para o desenvolvimento do trabalho colaborativo 106 Gráfico 4 Aplicabilidade prática das questões discutidas em aula 107 Gráfico 5 Contributo das aulas e do método de ensino para a descoberta, reflexão crítica e debate 108

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xi

Quadro 1 População do mundo por áreas em 2015, 2030, 2050 e 2100. 7

Quadro 2 As cinco dimensões da prosperidade urbana 12

Quadro 3 Número de docentes por categoria e evolução do número destes por idade (2007-2011) 52 Quadro 4 Caraterísticas individuais e coletivas de comunidades de aprendizagem produtivas 79 Quadro 5 Comportamentos desejáveis dos professores para cada fase da ABP 88

(13)

xii

Anexo 1 Exemplos dos planos de aula elaborados para a intervenção pedagógica 132 Anexo 2 Ficha de recolha das ideias prévias (individual) 135 Anexo 3 Ficha de recolha das ideias prévias (grupo) 137 Anexo 4 Notícias recolhidas para utilizar como estratégia de motivação 139

Anexo 5 O jogo Perdidos na Lua 146

Anexo 6 Classificações obtidas pelos alunos no jogo Perdidos na Lua 149 Anexo 7 A situação-problema e o cenário apresentados à turma 152 Anexo 8 Exemplo de um inquérito apresentado aos alunos 156 Anexo 9 Fichas de orientação para observação do espaço e problemas urbanos 158 Anexo 10 Ficha de orientação para constituição da Associação de Moradores 165

Anexo 11 Ficheiro de apresentação oral do Grupo A 166

Anexo 12 Ficheiro de apresentação oral do Grupo B 172

Anexo 13 Ficheiro de apresentação oral do Grupo C 179

Anexo 14 Ficheiro de apresentação oral do Grupo D 185

Anexo 15 Ficheiro de apresentação oral do Grupo E 189

Anexo 16 Exemplos de atas realizadas pelos alunos 193

Anexo 17 Exemplo de um contrato de trabalho redigido pelos alunos 197 Anexo 18 Descrição da turma sobre a cidade de Lisboa 198 Anexo 19 Descrição da turma sobre os principais problemas da cidade de Lisboa 199 Anexo 20 Descrição da turma sobre as soluções para a resolução dos problemas 200

(14)

I

NTRODUÇÃO

Na atualidade, mais de metade da população mundial reside em áreas urbanas, o que indica que o mundo atual se está a metamorfosear num local predominantemente urbano. Com efeito, a gestão das áreas urbanas tem sido apontada como uma das questões mais desafiantes e pertinentes do século XXI. O acentuado crescimento urbano continuará, tendencialmente, a verificar-se, dado que as projeções estatísticas recentes são perentórias na defesa da ocorrência do fenómeno, de forma genérica, nos países menos desenvolvidos do mundo. De resto, ainda que o grau de urbanização tenha sofrido variações de acordo com as particularidades de cada país, nenhuma região vivenciou um decréscimo desta. Certo é que a alusão a este fenómeno surge, do mesmo modo, acompanhada pela referência aos desafios de índole pluridimensional postos às áreas urbanas, devido, sobremaneira, ao facto de estas constituírem autênticos polos atrativos de pessoas, bens, serviços e conhecimento, em virtude dos quais são consideradas os lugares ideais para o desenvolvimento e realização de múltiplas ambições pessoais. Portanto, as cidades ao contribuírem de forma impar para a produção de riqueza, mensurável através do PIB, assumem, também, um papel de charneira do ponto de vista do dinamismo económico, pelo que facilmente se justifica que o conceito de prosperidade urbana inclua, além da produtividade e das infraestruturas, dimensões imateriais como sejam a qualidade de vida, a equidade e inclusão social e a sustentabilidade ambiental.

Com efeito, as áreas urbanas, mais do que o modo de vida e respetivos aspetos que o caraterizam, são o recetáculo de toda uma dimensão simbólica relacionada, essencialmente, com a formação de uma identidade cultural, de acordo com a qual são estabelecidos alguns valores que, de alguma forma, explicam os indivíduos que a integram. Por conseguinte, existe uma clara dependência entre este mosaico humano e a pluralidade de processos que as cidades encerram, pelo que a esfera dos recursos económicos, por si só, é claramente insuficiente para o bem-estar da coletividade. Por isso, o conceito de qualidade de vida articula-se, diretamente,

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2

com o de progresso urbano, na medida em que a aposta na melhoria das condições de vida dos cidadãos fomenta nestes últimos a repercussão de boas práticas urbanas. Todavia, a qualidade de vida é avaliada, por um lado, por via de necessidades materiais relativamente à habitação, emprego, rendimento, saúde e educação, mas, de igual modo, por via de aspetos mais abstratos, como sejam a integração social ou a qualidade ambiental.

Neste contexto, dado que as questões mencionadas são absolutamente fundamentais para um desenvolvimento pleno e satisfatório da vida humana, e já que a maioria da população reside, ou residirá futuramente, em cidades, é impossível não trazer à discussão a questão da equidade e dos problemas urbanos como obstáculos à prosperidade urbana. Na verdade, uma cidade é compreendida como sendo justa e equitativa quando possibilita que os seus cidadãos, sem qualquer espécie de distinção, tenham acesso a um conjunto de serviços e infraestruturas que se afiguram essenciais e prementes para a consecução de uma vida melhor. Porém, desde o advento da Revolução Industrial que o crescimento proeminente e excecional dos grandes centros urbanos não acompanhou, pari passu, o incremento das instalações e equipamentos à disposição dos residentes, situação que acabou por levar à conclusão que as sociedades atuais são profundamente desiguais e parciais, no sentido em que alguns cidadãos têm, em detrimento de outros, mais ou melhor acesso a determinados bens essenciais que se afiguram básicos para o seu bem-estar individual. Face ao exposto, existe, atualmente, um número significativo de espaços urbanos que perante a incapacidade de resposta face às indigências da população, tem enfrentado uma profusão de problemas, de índole multidimensional, decorrente dos padrões de crescimento urbano. Com efeito, o modelo de desenvolvimento urbano hodierno não se tem mostrado sustentável, facto que se atribui, mormente, à dificuldade de resolução das ameaças urbanas persistentes, ou seja, aquelas que, de alguma forma, se têm manifestado constantes e de difícil solução, como sejam a proliferação contínua dos bairros de lata ou a saturação dos serviços e das infraestruturas urbanas. Mas, talvez os problemas mais destacados sejam os de caráter emergente, i.e., os que se associam, fundamentalmente, às más políticas de governação, e que se relacionam com o aumento da pobreza, da exclusão e da desigualdade social, com o aumento da migração involuntária, com o incremento da insegurança e risco urbanos e, ainda, com as alterações climáticas e decorrente degradação ambiental.

É este o contexto que justifica o surgimento deste relatório que discorre a respeito da conceção e implementação de uma intervenção pedagógica, no âmbito da unidade curricular de Geografia A, desenvolvida com os discentes de uma turma do 11.º ano da Escola Secundária Maria Amália Vaz de Carvalho, centrada na subunidade didática dos Problemas Urbanos.

Esta intervenção teve como objetivo avaliar o contributo da geografia escolar para o desenvolvimento de aprendizagens significativas, num contexto em que se atribui ao aluno um papel ativo e de destaque na construção da sua aprendizagem e desenvolvimento das respetivas

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3

competências, tendo por base os seus conhecimentos prévios. Partindo da realização de várias atividades centradas na recolha de informação por via do trabalho de campo, pretendeu-se que os discentes aprendessem a identificar e a refletir sobre os problemas urbanos com expressão territorial, que debatessem e compreendessem o impacte dos mesmos na qualidade de vida da população residente, adquirissem competências de observação, recolha e tratamento de dados de base geográfica alusivos ao espaço urbano, e desenvolvessem o pensamento crítico no que respeita às sugestões de resolução apresentadas. De igual forma, tendo em conta os objetivos gerais e as competências do programa da disciplina de Geografia A, bem como as finalidades e as sugestões metodológicas gerais do mesmo, a intervenção pedagógica teve como objetivo dar resposta a uma questão: “Como promover aprendizagens significativas sobre os problemas urbanos?”. Nesta perspetiva, definiram-se os seguintes objetivos específicos:

(i) recolher as representações dos alunos a respeito dos problemas urbanos; (ii) identificar os fatores que, de acordo com os alunos, estão na origem dos

problemas urbanos que identificaram;

(iii) diagnosticar as perceções dos alunos alusivas ao impacte dos problemas urbanos na qualidade de vida da população urbana;

(iv) diagnosticar as perceções dos alunos em relação às soluções para os problemas apresentados;

(v) contribuir para que os alunos desenvolvam o conhecimento do espaço urbano e da sua envolvente;

(vi) sensibilizar os alunos para a identificação dos problemas locais com expressão territorial;

(vii) estimular os alunos a elaborar e a propor medidas de resolução ou mitigação dos problemas urbanos, de intervenção local;

(viii) estimular, nos alunos, a vontade de participar crítica e ativamente, enquanto cidadãos responsáveis e intervenientes, na tomada de decisão dos processos governativos da cidade de Lisboa;

(ix) desenvolver o pensamento crítico e reflexivo sobre o trabalho desenvolvido.

A pertinência do tema é plenamente justificada à luz de uma literacia geográfica que não se restringe à memorização de factos geográficos isolados ou que não se relaciona somente com o conhecimento, mas que faz apanágio da aplicação prática deste último. Posto isto, é cada vez mais imprescindível uma articulação dos conhecimentos geográficos com a ativação e aplicação desse saber em situações concretas, pois só assim se desperta a capacidade de desenvolvimento, não só a nível pessoal e intelectual, mas, também, do ponto de vista da perceção e compreensão dos estudantes face aos problemas atuais.

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4

Relativamente à metodologia de trabalho privilegiada, optou-se por desenvolver uma metodologia ativa de ensino-aprendizagem, designada Aprendizagem Baseada em Problemas, cuja essência consiste na apresentação aos alunos de problemas autênticos, tendo em conta os seus conhecimentos prévios, fornecendo-lhes, deste modo, um contexto significativo para a respetiva aprendizagem. As discussões em grupo, nas quais os alunos são obrigados a clarificar a sua compreensão e a identificar as respetivas necessidades de aprendizagem, são tidas como importantes para a formulação, síntese e avaliação do conhecimento. Nesta perspetiva, o papel do professor passa do habitual transmissor de conhecimentos ao de tutor, cuja tarefa principal é facilitar as aprendizagens dos alunos, monitorizando e questionando todos os processos nos quais as tarefas de aprendizagem são formuladas e relatadas.

Do ponto de vista formal, este relatório desenvolve-se ao longo de cinco capítulos. O Capítulo I, concernente ao enquadramento científico, apresenta uma visão sobre as principais tendências urbanas da atualidade. O Capítulo II, referente ao enquadramento pedagógico, trata de questões pertinentes relacionadas com a geografia escolar, bem como da contextualização da unidade didática nas linhas programáticas da disciplina. No Capítulo III, para uma efetiva compreensão do contexto local onde teve lugar a intervenção pedagógica, procede-se a uma caraterização da escola e da comunidade escolar. O Capítulo IV, alusivo à metodologia, trata sobre as caraterísticas da Aprendizagem Baseada em Problemas, justificando, assim, as opções metodológicas. Por fim, o Capítulo V, relativo à prática de ensino supervisionada, compreende a unidade didática na sua conceção, implementação e avaliação. Logo, procede-se à explicação dos passos que anteciparam a intervenção pedagógica, sobretudo a planificação e orientação das aulas para a ABP. Num segundo momento, discorre-se sobre o desenvolvimento da ABP e apresentam-se os produtos desenvolvidos pelos alunos no processo de resolução do problema e, por último, demonstra-se como se realizou a avaliação dos resultados da prática pedagógica, no que respeita às técnicas de recolha e tratamento dos dados, bem como às evidências de aprendizagem manifestadas pelos discentes.

No âmbito do percurso formativo dos alunos, foram desenvolvidas competências de caráter específico, bem como de índole transversal, cuja aplicação permite dotar de sentido o percurso escolar e educativo dos alunos, sendo, como tal, consideradas da maior importância ao longo da vida, pela concordância que estabelecem com as exigências da vida societal. À semelhança do que sucede com os estudantes, também o docente aprende com a prática das suas ideias, estratégias e métodos diversos. Logo, crê-se que a experiência que aqui se retrata possibilitou a superação de dificuldades e a formação da identidade docente.

Por fim, apresentam-se as considerações finais, que incluem uma apreciação crítica global do trabalho desenvolvido, havendo uma referência aos aspetos que se consideram ter sido conseguidos, bem como as limitações encontradas.

(18)

5

C

APÍTULO

I

E

NQUADRAMENTO

C

IENTÍFICO

1.1. ASPRINCIPAISTENDÊNCIASURBANASDAATUALIDADE

1.1.1. Um mundo urbanizado com padrões de crescimento distintos

Tomando como referência o relatório State of The World’s Cities 2012/2013:

Prosperity of Cities, da responsabilidade da United Nations Human Settlements Programme

(UN-HABITAT, 2013:6), cujo principal objetivo é expor os desafios das áreas urbanas, o mundo atual está a entrar numa era predominantemente urbana. Consequentemente, os espaços urbanos estão a tornar-se, de forma genérica, no habitat humano predominante, bem como no principal impulsionador do respetivo desenvolvimento. Atualmente, mais de dois terços da população mundial reside em áreas urbanas, o que parece estar em consonância com a existência de taxas de urbanização cada vez mais elevadas. Considerando, ainda, os dados publicados pela United Nations Population Fund (UNFPA, 2008:20), no final da primeira década do século XXI, a população mundial residente em áreas urbanas excedeu, pela primeira vez, a população rural, tendo o crescimento desta última registado, naturalmente, um decréscimo, tendência que se deverá manter, uma vez que o principal incremento populacional terá lugar, grosso modo, nas cidades dos países em desenvolvimento, principais responsáveis pela absorção do excedente populacional (WHO, 2016:14).

De facto, a distribuição geográfica da população a nível mundial suportou alterações consideráveis que, tendencialmente, continuarão a repercutir-se durante as próximas décadas. Todavia, ainda que as sociedades modernas sejam predominantemente urbanizadas, com exceção para os continentes Africano e Asiático, que são ainda maioritariamente rurais, com

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6

cerca de 40% e 48% respetivamente da sua população a residir em áreas urbanas (UN, 2014:10), os padrões de crescimento e distribuição não são comuns a todas as regiões. Na verdade, as taxas de crescimento urbano foram mais acentuadas em algumas regiões. Genericamente, nos países desenvolvidos, a taxa de crescimento da população urbana tem vindo a abrandar, tendência que deverá estabilizar-se, prevendo-se inclusive a ocorrência de um declínio populacional em mais de metade das cidades europeias até 2050, nomeadamente em países como a Bulgária, Croácia, Hungria, Lituânia, Roménia, Sérvia, entre outros (UN, 2015a:4). Na génese desta diminuição está o facto de a fertilidade, na maioria dos países europeus, estar abaixo do nível necessário para a substituição total da população, dado que «as countries urbanize, they gain in wealth; and as such, work and educational opportunities for women tend to increase, leading to later marriages, and fewer children, higher rates of urbanization along with growth in gross domestic product lead to lower fertility rates around the world» (UN-HABITAT, 2016:9).

Num claro contraste, projeções recentes indicam que a taxa de crescimento mais elevada e significativa, durante o período compreendido entre 1995-2005, teve origem nas regiões menos desenvolvidas do mundo (UN-HABITAT, 2016:7), sendo o continente Africano o exemplo mais paradigmático, onde se espera que países como Angola, Burundi, Somália, Uganda e outros, venham a aumentar, pelo menos, até cinco vezes mais, as respetivas populações (Angel, Parent, Civco, Blei & Potere, 2011:58). Este crescimento radica, fundamentalmente, num acentuado crescimento natural, uma vez que «the relationship between urbanization and fertility shows that the relatively poor and less urbanized countries have high levels of fertility» (UN-HABITAT, 2016:7). Cabe lugar, ainda neste contexto, uma alusão à ocorrência de conflitos e a uma migração rural-urbana considerável, às quais não se deverá atribuir um papel subsidiário, uma vez que, historicamente, sempre tiveram um contributo determinante para o rápido crescimento das cidades. Face ao que foi explanado, é expectável que mais de metade do crescimento populacional a nível mundial ocorra em África, razão que a torna na região com o crescimento mais significativo. Seguir-se-ão, por ordem de importância, a Ásia, a América do Norte, a América Latina, o Caribe e a Oceânia como os demais territórios que, futuramente, terão um contributo considerável para o crescimento populacional global. Este último, será praticamente inevitável, ainda que o declínio da fertilidade possa vir a aumentar, pelo que se estima que a população mundial alcance os 8,5 mil milhões em 2030, 9,7 mil milhões em 2050 e 11,2 mil milhões em 2100 (Quadro 1).

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Quadro 1 – População do mundo por áreas em 2015, 2030, 2050 e 2100.

População (milhões)

Região (por área) 2015 2030 2050 2100 Mundo 7 349 8 501 9 725 11 213

África 1 186 1 679 2 478 4 387

Ásia 4 393 4 923 5 267 4 889

Europa 738 734 707 646

América Latina e Caribe 634 721 784 721

América do Norte 358 396 433 500

Oceânia 39 47 57 71

Fonte: Adaptado de UN, Population Division (2015). World Population Prospects: The 2015 Revision.

Ainda que o nível de urbanização varie de acordo com o país, desenrolando-se em função das respetivas idiossincrasias, nenhuma região do mundo experienciou uma diminuição da urbanização (UN-HABITAT, 2016:6), pelo que parece pertinente clarificar que, ainda que se incorpore, com frequência, os conceitos de crescimento urbano e urbanização numa única definição, estes reportam-se a realidades distintas. Enquanto o crescimento urbano se reporta ao número absoluto de indivíduos residentes em áreas urbanas, ou seja, está ligado ao aumento da população de uma cidade e da respetiva superfície construída (Lacoste, 2003:111), a urbanização, por sua vez, resulta de uma migração caraterizada, sobretudo, por uma mudança demográfica das áreas rurais em direção aos espaços urbanos. Como consequência direta deste movimento, dá-se um aumento relativamente à proporção de pessoas que habitam áreas classificadas como urbanas (Tacoli, McGranahan & Satterthwaite, 2015:4). À medida que a população urbana aumenta, a área ocupada pelas cidades também cresce, pelo que a urbanização é, igualmente, produto de um crescimento natural significativo ocorrido em áreas urbanas (Tacoli et al., 2015:7), resultado do desenvolvimento interno da população (Angel, Parent, Civco, Blei & Potere, 2011:55).

Enquanto processo, a urbanização está comummente associada à existência de níveis elevados de produtividade, que refletem, de forma algo simplista, uma mudança associada à produção, isto é, à passagem de uma economia agrária para uma economia baseada na indústria, em serviços e tecnologicamente desenvolvida, setores que gozam de aglomeração nos centros urbanos (Silva, Barroso, Rodrigues, Costa & Fontana, 2014:5). Ao mesmo tempo, pode interpretar-se o fenómeno como o resultado conjugado de alterações significativas ao nível da economia, cultura e sociedade (Tacoli et al., 2015:8), que ocorreram a ritmos diferenciados. Os países desenvolvidos, por exemplo, experienciaram a um ritmo gradual o processo de urbanização, onde o fenómeno não foi tão intenso como o que se verificou nos países em desenvolvimento, já que as cidades «foram-se estruturando lentamente para absorver os migrantes, havendo melhorias nas infraestruturas urbanas e aumento da geração

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de empregos» (Silva et al., 2014:5). Ao invés, o desenvolvimento dos países pobres ocorreu de forma tão célere que proliferaram os ambientes problemáticos, com profundas desigualdades sociais, decorrentes do facto deste crescimento não ser acompanhado, de igual forma, pelo incremento das infraestruturas e dos serviços, consequência, em grande medida, da urbanização tardia de que foram alvo.

No que concerne, ainda, aos padrões de crescimento urbano, os núcleos que, por excelência, se afiguram como os mais representativos, experienciando o maior e mais destacado desenvolvimento populacional são as cidades de pequena e média dimensão, que englobam 59% da população urbana mundial (UN-HABITAT, 2016:9). À medida que aquelas se expandem e fundem, novas configurações espaciais têm lugar, pelo que, um pouco por todo o mundo, se tem assistido a um aumento nas dimensões vertical e horizontal das áreas urbanas. Tal como sucede com os grupos populacionais, que se relacionam entre si, também as cidades de pequena e média dimensão viabilizam a formação de corredores urbanos e megacidades, cujas novas configurações, além de espacialmente conectadas e funcionalmente adaptadas do ponto de vista socioeconómico, político e ambiental, atuam «as nodes where global and regional flows of people, capital goods, research and science, services and information combine» (UN-HABITAT, 2016:36). Neste sentido, a provisão adequada de oportunidades e infraestruturas nas pequenas e médias cidades pode auxiliar a urbanização rural e, ainda, ajudar numa distribuição mais equilibrada da população a nível mundial (UN-HABITAT, 2016:36). Porém, o papel secundário que se lhes atribui, em detrimento das grandes áreas metropolitanas, impede que cumpram o seu verdadeiro desígnio enquanto potenciais amenizadoras das disparidades urbanas.

Por outro lado, os mais significativos desafios demográficos que o século XXI enfrenta, situam-se nos espaços urbanos emergentes, onde ocorre grande parte do processo de urbanização global, isto é, nas grandes cidades e nas megacidades. Por definição, as primeiras acolhem entre 5 a 10 milhões de habitantes e as segundas apresentam-se como áreas urbanas que albergam um número igual ou superior a 10 milhões de indivíduos (UN, 2015b:16). Nas últimas décadas, o considerável aumento, destas aglomerações testemunha a respetiva importância, com especial destaque para as regiões da China, Índia, América Latina e o Sudeste Asiático (Figura 1), o que se interpreta como sendo um indicador de transferência do centro de gravidade do mundo urbano dos países em desenvolvimento em direção ao Sudeste Asiático (UN-HABITAT, 2016:9).

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Fonte: World Urbanization Prospects: The 2014 Revision.

Figura 1 – Atuais e futuras megacidades do mundo (2015-2030).

Ainda que com determinadas exceções, as megacidades incluem algumas das cidades mais ricas do mundo, dado que mesmo as mais pobres são tidas como modelos no que diz respeito à capacidade de inovação e aos altos níveis de eficiência de recursos (Kennedy et al., 2015:5985). Certo é que a maioria das megacidades se encontra localizada nas regiões do mundo em desenvolvimento, tendência que se refletirá à medida que as numerosas grandes cidades da Ásia, América Latina e África se transformem em megacidades, o que se calcula que venha a ocorrer até meados de 2030. Devido à sua dimensão, estas áreas são palco de novas dinâmicas e interações sociais, além da multiplicidade de fenómenos que encerram do ponto de vista físico, económico, político e ambiental, por isso, ao desenvolverem-se, habitualmente, de forma acelerada, nem sempre contemplam o dimensionamento das respetivas infraestruturas, pelo que a sua expansão produz entraves múltiplos ao bom funcionamento da vida urbana.

Outro aspeto que importa ressalvar, no que respeita à dimensão demográfica da urbanização, tem que ver com a existência de uma geração atual de jovens que é a maior de sempre na história da humanidade. Atualmente, numa população total de 7,3 mil milhões de pessoas, 1,8 mil milhões são jovens com idades compreendidas entre os 10 e os 24 anos, constatação que não se afiguraria tão gravosa se os países com a proporção mais significativa desta população não se encontrassem entre os mais necessitados a nível mundial (UNFPA, 2014:2). Esta realidade está acrescida de sentido se se atender ao desemprego juvenil, duas a três vezes superior quando comparado com o desemprego da população adulta

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HABITAT, 2016:9), o que, face a um contexto de má governança, pobre desempenho económico ou desigualdades sociais consideráveis, pode contribuir para o aumento de conflitos internos. Assim, a garantia de um emprego produtivo e de uma educação de alta qualidade aos mais jovens pode contribuir para aproveitar as oportunidades de crescimento económico associadas ao dividendo demográfico (UNFPA, 2014:28).

Por outro lado, o rápido envelhecimento da população, propensão que muitas regiões do mundo enfrentam, terá um impacto profundo no decorrer do século XXI, dadas as implicações a longo prazo que exigem em todos os domínios da sociedade. Inevitavelmente, até 2050, a percentagem de indivíduos com idade igual ou superior a 60 anos deverá rondar os 25% em todas as regiões, com exceção para o continente africano (UN-HABITAT, 2016:9). Se os países desenvolvidos se situam na terceira fase da transição demográfica, isto é, num período em que a estrutura etária da população é nitidamente envelhecida, pelo que urge combater a diminuição da mão-de-obra e fazer frente à necessidade progressiva de cuidados de saúde e apoio aos idosos (UN, 2007:9). Os países em desenvolvimento, por sua vez, encontram-se, de forma geral, ainda na segunda fase da referida transição, isto é, numa etapa em que começa, lentamente, a manifestar-se uma diminuição na proporção de crianças, ao mesmo tempo que é acompanhada pelo aumento da proporção de adultos em idade de trabalhar. Este contexto é particularmente importante perante a tomada de consciência de que uma população idosa apresenta «desafios sociais, económicos e culturais para os indivíduos, famílias, sociedades e para a comunidade global» (UNFPA, 2012:3), dado que a respetiva evolução demográfica obriga à tomada de medidas, sobretudo no âmbito da prestação de cuidados de saúde apropriados e segurança dos regimes de pensões (UNFPA, 2012:5; UN-HABITAT, 2016:10), tidos como preocupações urgentes pelos idosos. Uma vez aposentados, a capacidade de assegurar, por via dos sistemas de reforma, uma certa independência financeira é, desde logo, um modo de combater a pobreza e vulnerabilidade económica na velhice, já para não mencionar que «as pensões podem constituir a principal fonte de receita doméstica, e frequentemente permitem que os jovens e as suas famílias enfrentem a carência ou perda de empregos» (UNFPA, 2012:5). No que concerne à saúde física e mental, as apreensões são também inquietantes, já que o acesso aos cuidados médicos necessários, a preços acessíveis, nem sempre está ao alcance da terceira idade, faixa etária onde predominam as doenças crónicas (UN, 2007:115).

1.1.2. A prosperidade urbana e suas dimensões

Nunca os níveis de urbanização foram tão elevados como os que se verificam atualmente. A par desta realidade surgem as cidades que, por sua vez, em termos de número e tamanho, são autênticos polos estruturantes das sociedades modernas. Entendidas, em traços

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gerais, como locais populosos e mais densamente povoados que as áreas rurais, as cidades constituem «uma aglomeração de gente, de capital e de outras forças de produção num espaço limitado, um lugar na paisagem dotado de caraterísticas peculiares» (Barata-Salgueiro, 2005:176). No entanto, não são somente os aspetos tangíveis do modo de vida urbano que as tornam lugares de significativo potencial. Este potencial resulta, igualmente, da existência de uma esfera, impulsionadora de relações sociais, por via das quais os cidadãos geram um capital intelectual capaz de sustentar uma identidade partilhada por todos, permitindo concluir que «além da dimensão material e da social, as cidades possuem [também] uma dimensão simbólica, são depósito de um conjunto de valores e de símbolos» (Barata-Salgueiro, 2005:176). Concomitantemente, os centros urbanos são caraterizados pela massificação da respetiva capacidade produtiva, pelas indústrias e serviços que acomodam, pela diversidade dos grupos sociais, étnicos e culturais que a ocupam e modelam, bem como pelo mosaico de potencial humano que albergam. Em virtude de tal dinamismo e complexidade de processos, por desempenharem um papel de relevo na vida de muitos cidadãos, é perentória a defesa das cidades como lugares, por excelência, onde a população tem uma oportunidade acrescida de poder desenvolver e realizar as suas ambições e aspirações pessoais (UN-HABITAT, 2013:4). Na verdade, durante séculos, as áreas urbanas ofereceram padrões de vida mais elevados do que as áreas rurais (Cadena, Dobbs & Remes, 2012:2), já que nas primeiras, desde que há memória, se concentra a grande maioria dos trabalhadores, consumidores, atividades económicas e riqueza. Ainda que prevaleça uma conceção que circunscreve a prosperidade a uma interpretação marcadamente económica, o conceito está relacionado «to a sense of general and individual socioeconomic security for the immediate and foreseeable future, which comes with the fulfilment of other, nonmaterial needs and aspirations» (UN-HABITAT, 2013:9). Desta feita, se, por um lado, a noção de prosperidade inclui dimensões imateriais, por outro, contempla medidas vitais, como a produtividade, as infraestruturas disponíveis, a qualidade de vida, a equidade e inclusão social, bem como a sustentabilidade ambiental (Quadro 2).

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Quadro 2 – As cinco dimensões da prosperidade urbana.

Fonte: Adaptado de UN-HABITAT, 2012: State of The World’s Cities 2012/2013: Prosperiy of Cities. Em primeiro lugar, a capacidade produtiva de uma cidade é, antes de tudo, uma condição básica para construção da prosperidade urbana. Ao produzirem mais de 80% do PIB (UN-HABITAT, 2016:31), as cidades assumem um papel decisivo no desenvolvimento económico já que, ao concentrarem no mesmo espaço o capital financeiro e humano, estimulam a produtividade nacional. Depois, face ao incremento da população, regista-se um aumento no número de trabalhadores e consumidores, facto que decorre, em larga parte, das economias de aglomeração. Por conseguinte, desenvolve-se a economia local e aumenta-se a possibilidade de gerar emprego decente, diminuindo, portanto, a desigualdade de oportunidades entre os diferentes grupos da sociedade (UN-HABITAT, 2016:187). As cidades mais produtivas são as que elevam os padrões de vida da sua população por via da existência de bens e serviços acessíveis, dado que os rendimentos e receitas referentes à produtividade permitem investimentos vários que atribuem à cidade uma parte considerável da sua identidade. Para reforçar esta perspetiva, deve atender-se à produtividade não como um fim em si mesma, mas antes como uma base que proporcionará aos residentes urbanos um padrão de vida adequado, já que o capital humano, intelectual e social, formas de capital não tangíveis, se apresentam, de modo crescente, como fatores-chave da produtividade urbana (UN-HABITAT, 2013:43).

Por outro lado, não é possível almejar o reforço da produtividade sem investir nas infraestruturas que a capacitam, logo, estas últimas constituem o segundo pilar da prosperidade urbana, dado que dizem respeito ao conjunto de equipamentos que, em conjunto com os

Dimensões da prosperidade urbana Produtividade

Contribui para o crescimento económico, originando receitas, oferecendo empregos decentes e fornecendo igualdade de oportunidades a todos através de políticas económicas e reformas efetivas.

Infraestruturas Fornece infraestruturas básicas de apoio à população urbana, melhorando os padrões

de vida desta e aumentando a respetiva produtividade, mobilidade e a conetividade.

Qualidade de vida Reforça a utilização dos espaços públicos em função da coesão comunitária e da

identidade cívica, garantindo a segurança individual e material de todos os cidadãos.

Equidade e inclusão social

Assegura uma (re)distribuição equitativa dos benefícios da prosperidade, reduzindo a pobreza, protegendo os direitos das minorias e assegurando a participação cívica nas esferas social, política e cultural.

Sustentabilidade ambiental

Valoriza e promove a proteção do ambiente urbano e dos recursos naturais, assegurando a eficiência energética, reduzindo a pressão sobre os recursos naturais e minimizando as perdas ambientais.

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recursos humanos, prestam serviços essenciais para o bom funcionamento da sociedade, como redes de distribuição de água, gás, eletricidade e transporte, condições de saneamento básico, limpeza e manutenção dos espaços públicos, recolha e tratamento de resíduos sólidos, entre outros. Quando se trata da existência e disponibilidade de serviços finais, como sejam as escolas, as instituições de ensino superior, os hospitais e os serviços médicos de ordem superior (Satterthwaite, 2007:32), as cidades assumem, indubitavelmente, um lugar de destaque, já que a população urbana tem mais e melhores facilidades de acesso à educação e a cuidados de saúde, variáveis em estreita articulação dado que uma formação superior ou um rendimento elevado têm um impacte positivo direto na promoção da saúde (WHO, 2014:2). No que respeita às infraestruturas essenciais na manutenção de uma boa saúde, nas cidades, a oferta do sistema é, além de variada, mais recente e monitorizada (Montgomery, 2009:2). Ademais, é economicamente mais viável e simples fornecer infraestruturas e serviços públicos às cidades do que aos espaços rurais (UN-HABITAT, 2016:32). Por isso, as primeiras estão mais aptas a oferecer uma melhor qualidade de vida aos seus habitantes.

A terceira base de apoio da prosperidade urbana remete para qualidade de vida que acaba por representar, em síntese, as dimensões da prosperidade urbana, uma vez que a funcionalidade dos espaços urbanos é por ela sustentada. Ainda que uma definição precisa do conceito continue por desvendar, a qualidade de vida encontra-se em estreita articulação com o progresso e êxito de qualquer cidade ou região, assim, quanto maior o compromisso de uma cidade para com a promoção do respetivo ambiente urbano e melhoria da qualidade de vida dos seus cidadãos, mais significativas serão as oportunidades de estes repercutirem boas práticas, cientes do seu contributo para o bem-estar da sociedade.

A expressão qualidade de vida designa «a broad ranging concept affected in a complex way by the person's physical health, psychological state, level of independence, social relationships, personal beliefs and their relationship to salient features of their environment» (WHOQOL, 1997:1). Portanto, ainda que se reconheça, claramente, a importância dos recursos económicos para o bem-estar da maioria dos indivíduos, estes são manifestamente insuficientes por si só, primeiramente, porque os recursos não estão acessíveis, de igual forma, a todos os cidadãos e, depois, porque têm a capacidade de gerar bem-estar de uma forma que difere de sujeito para sujeito (Stiglitz, Sen & Fitoussi, 2009:144). Logo, existe uma clara alusão ao facto de o bem-estar-humano, na sua plenitude, só ser passível de ser alcançado tendo em consideração um conjunto de atributos de cariz multidimensional, sendo a qualidade de vida um conceito holístico, cujo alcance abarca vários indicadores mensuráveis, que adquirem «diferentes traduções, consoante a estrutura socioeconómica da população» (Santos & Martins, 2002:4). Neste sentido, atente-se, também, que a sociedade e respetivos contextos sociais, políticos e culturais, influenciam, de forma substancial, as necessidades de vida dos

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cidadãos, por isso, não detêm um caráter perene, havendo sim «uma variação significativa dessas mesmas necessidades, ao longo do tempo» (idem,ibidem), em função das circunstâncias societais.

Ainda que surjam, com frequência, no campo da interpretação da qualidade de vida, representações dicotómicas que admitem uma relação material/imaterial, objetivo/subjetivo e individual/social (idem,ibidem), o fator que aparenta ser consensual enfatiza a subjetividade e a multidimensionalidade como sendo os dois aspetos mais relevantes deste conceito (Seidl & Zannon, 2004:582). Não raras vezes, a qualidade de vida é avaliada por via de noções subjetivas, relacionadas com o bem-estar humano, as quais, grosso modo, dizem respeito à existência de atividade profissional decente, habitação condigna, acesso à educação e formação, serviços de saúde, presença de infraestruturas, segurança e qualidade ambiental. Julga-se, então, que estas são as caraterísticas que constituem as preocupações mais comuns e relevantes que atribuem à vida o seu devido valor (UN-HABITAT, 2013:93). Na verdade, as caraterísticas acima mencionadas têm uma forte ligação com o que é designado por nível de

vida e dizem respeito às necessidades humanas primárias, ou seja, às necessidades materiais

em termos de habitação, emprego ou trabalho, rendimento, saúde, educação e aspetos de natureza infraestrutural (UE, 1999:14). Por seu turno, as condições de vida que remetem para aspetos imateriais, aqueles que dizem respeito às relações humanas, à integração social, à qualidade ambiental e outras, cabem à esfera da qualidade de vida. Mais do que a ausência de mal-estar físico ou psicológico (WHOQOL, 1997:3), a qualidade de vida está articulada com aspetos de índole comportamental, social, ambiental e cultural, que são também importantes para o desenvolvimento da vida humana na sua plenitude. Apesar da complexidade implícita, é usualmente aceite uma aceção do conceito como sendo, basicamente, a «satisfação das necessidades de uma população a nível económico, social, psicológico, espiritual e ambiental, proporcionando tranquilidade, segurança e esperança de um futuro melhor» (Valente, 2006:2). A qualidade de vida é, portanto, influenciada pelas transformações da sociedade, pela existência de certos recursos, respetiva acessibilidade e facilidade de utilização (Santos & Martins, 2002:6), bem como pelas diversas dimensões que integram o bem-estar humano, desenvolvendo-se, entre estas, uma relação de complementaridade e dependência mútua.

A presença de uma linha de investigação independente sobre a qualidade de vida urbana radicou no facto de as cidades acolherem grande parte da população mundial e representarem locais de enorme potencial económico. Ademais, depois da Segunda Guerra Mundial, a manifestação de acentuadas preocupações devido à urgente necessidade de reconstrução das cidades e à perda do bem-estar dos que nela habitavam, fortaleceu a pertinência do termo e a sua proliferação (Meeberg, 1993, citado por Almeida, 2013:21). Hoje em dia, a crescente focalização no conceito é completamente justificada pela urgência de

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pensar a cidade como um local de expressão coletiva, de vivências e experiências partilhadas, de vida comunitária.

A equidade e inclusão social são, também, a base para um desenvolvimento urbano sustentado e próspero. Uma cidade justa e equitativa é aquela que oferece a todos os seus residentes, sem qualquer forma de discriminação, o acesso a uma habitação condigna, uma rede de saneamento básico adequada e espaços públicos de qualidade e a garantia de acessibilidade aos serviços educacionais e de saúde. Hoje em dia, é sobre a aplicação da democracia, da justiça e dos direitos humanos que recaem as novas preocupações urbanas, pois um elevado grau de equidade garante o uso eficiente dos recursos urbanos disponíveis, dado que «when equity is embedded in urban development strategies, efficiency is enhanced, asset utilization becomes optimal, productivity improves, and social cohesion is strengthened. (UN-HABITAT, 2013:85). Neste contexto, as áreas urbanas são territórios prioritários no que diz respeito à promoção de medidas de coesão e inclusão social, dados os fenómenos de pobreza, marginalização e exclusão que aí se têm vindo a manifestar. No que respeita à sua eficácia, a equidade deve ser assegurada nas suas vertentes social, económica, política e cultural, sob pena de se comprometer a satisfação dos direitos fundamentais de cada indivíduo no seio da sociedade e a dignidade humana. Portanto, de forma a garantir a equidade social, deve aumentar-se as oportunidades direcionadas a minorias e grupos vulneráveis nas esferas social, política e cultural (UN-HABITAT, 2016:6), através, por exemplo, da criação de emprego, de serviços de segurança social, da provisão de habitação (idem, p.157), bem como da participação cívica ativa nas áreas urbanas.

Em última análise, a construção das sociedades atuais radica num conjunto de preocupações ecológicas e ambientais que se tornaram prioridades centrais para a forma como se perspetiva o futuro. Na verdade, as primeiras ligações estabelecidas entre desenvolvimento

económico e ambiente remontam à década de 70 do século XX, quando se alertou para as

graves repercussões de um crescimento económico e demográfico acentuado em relação ao aumento dos níveis de poluição e à sobre-exploração e esgotamento de recursos (Madureira, 2005:1). Anos depois, em 1987, o relatório Brundtland – Our Common Future – define

desenvolvimento sustentável como sendo um «desenvolvimento que atende às necessidades

do presente sem comprometer a possibilidade de as gerações futuras atenderem a suas próprias necessidades» (WCED, 1987:16). Neste contexto, a incorporação de preocupações ambientais no planeamento urbano pode revelar um conjunto de oportunidades e atividades economicamente viáveis para o crescimento económico, e, acima de tudo, ambientalmente sustentáveis, como o uso de energias renováveis, a reciclagem de materiais e prestação de serviços ambientais (UN-HABITAT, 2016:99), entendidas como estratégias de resiliência dos espaços urbanos.

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Os espaços urbanos surgem como os principais consumidores de recursos naturais, absorvendo mais de metade da energia mundial, e, concomitantemente, como os maiores produtores de poluição e resíduos, respondendo por mais de 70% das emissões de globais de gases de efeito de estufa (UN, 2014:3). Além disso, a sustentabilidade ambiental é adicionalmente desafiada pelos padrões de consumo que prevalecem nestes ambientes, questões que, quando associadas ao aumento da incidência de desastres naturais nos espaços urbanos (UN-HABITAT, 2016:134), têm combinado o crescimento das cidades aos desafios globais de sustentabilidade ambiental. Ao instituírem um equilíbrio entre o crescimento económico e o ambiente natural, os espaços urbanos ambientalmente sustentáveis apresentam-se, além de energeticamente eficientes, como os mais prósperos, competitivos e menos poluídos (idem, p.96), sendo capazes de produzir os recursos necessários, bem como proporcionar uma base de vida saudável e o bem-estar dos seus habitantes.

Uma cidade próspera implica, portanto, o aumento da qualidade e nível de vida, numa conceção que integre uma sensação de segurança, conforto e sucesso das áreas urbanas, permitindo, tanto quanto possível, a participação e mobilização ativa dos cidadãos na tomada de decisões que norteiam o futuro do espaço urbano, a pertença daqueles a grupos de apoio com os quais se identifiquem, colocando à sua disposição os recursos indispensáveis à concretização das aspirações pessoais (idem, p.11). De resto, a prosperidade urbana deve assegurar, de forma equitativa, a produção de riqueza, a existência de oportunidades educacionais, de serviços de saúde, mobilidade e acessibilidade e de espaços públicos adequados, numa perspetiva que não ameace o ambiente e respetivos recursos (Figura 2).

Fonte: UN-HABITAT, 2012: State of The World’s Cities 2012/2013: Prosperity of Cities.

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1.2. OSPROBLEMASURBANOSCOMOOBSTÁCULOÀPROSPERIDADEDASCIDADES

Iniciado no século XIX com o advento da Revolução Industrial e fortemente intensificado no decurso do século XXI, o crescimento ímpar dos centros urbanos, consequência de uma alteração profunda na distribuição da população, ocasionou significativos desafios. A determinada altura, o ganho de protagonismo das cidades não podia ser observado separadamente dos aspetos perniciosos nelas existentes, pois estes interferiam nos contextos da vida diária da população. Face a esta realidade, ainda que seja indiscutível o potencial que a urbanização trouxe às cidades, transformando-as em autênticos núcleos de prosperidade e conhecimento, providas de inovação e criatividade, não é possível relegar para segundo plano que grande parte dos centros urbanos se tem confrontado, cada vez mais, com problemas de índole pluridimensional, face à incapacidade de resposta sustentável aos reptos colocados pelas sociedades modernas (UN-HABITAT, 2016:5).

Por certo, se para uma parte cada vez mais crescente da população mundial, as perspetivas de um futuro promissor estão fortemente associadas às cidades, e viver nestas é, não raras vezes, sinónimo de uma vida melhor, já que estes espaços são capazes de satisfazer aquilo que se julgam ser as necessidades mais prementes dos sujeitos e grupos que nela habitam, a intensa e progressiva ocupação do espaço urbano, através de um crescimento caótico, é «ela própria geradora de um conjunto de problemas e de disfuncionamentos internos, cuja influência nas condições de vida dos cidadãos importa conhecer» (Santos & Martins, 2002:7). De resto, o crescimento urbano nem sempre se fez acompanhar pelo igual aumento dos respetivos serviços e infraestruturas, situação que conduziu ao notável desajuste entre as necessidades dos cidadãos e o conjunto de instalações e equipamentos à disposição dos mesmos. Por conseguinte, quando uma cidade é desigual, alguns cidadãos têm, em detrimento de outros, mais ou melhor acesso a determinados bens essenciais que se afiguram básicos para o bem-estar individual e coletivo (WHO, 2014:9; UN-HABITAT, 2016:4).

1.2.1. Ameaças urbanas persistentes

Nas últimas décadas, os espaços urbanos têm experienciado, forçosamente, os efeitos de fenómenos relacionados com as alterações nos padrões de crescimento urbano, com o aumento significativo de população urbana a residir em bairros de lata e, também, com os desafios provocados pela necessidade premente em assegurar serviços e infraestruturas suficientes para a totalidade da população urbana (UN-HABITAT, 2016:1), temas que se têm manifestado constantes e de árdua resolução.

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1.2.1.1. Alterações no modelo de crescimento urbano

Ao longo do tempo, as mudanças ocorridas ao nível da configuração espacial das áreas urbanas, instigadas pela rápida urbanização, têm levantado obstáculos à prosperidade das cidades, na medida em que dificultam o planeamento dos referidos espaços. Além das preferências pessoais por um estilo de vida urbano, outras razões subjazem à expansão e dispersão urbanas e consequente redefinição dos limites da cidade, como sejam a má gestão do território, a ausência de regulamento sobre as áreas periurbanas, ou, num sentido positivo, a vulgarização do transporte individual, dos transportes públicos e a melhoria geral das acessibilidades (Mateus, 2011:651; Assumpção, 2015:20; UN-HABITAT, 2016:37).

À medida que as cidades se vão expandindo para fora dos seus limites físicos iniciais, assiste-se à proliferação dos mercados de trabalho, comercial, habitacional, industrial, agrícola, financeiro e serviços pelo território jurisdicional (UN-HABITAT, 2016:36), assistindo-se a uma fratura nos critérios de localização das atividades (Pereira, 2004:132) e a uma mudança das áreas funcionais dos centros urbanos em direção à periferia, onde as recentes configurações que aí se assumem, produzem novas dinâmicas sociais e económicas. Estas novas territorialidades que se originam são, essencialmente, o reflexo dos padrões de crescimento morfológico relacionados com a suburbanização, a periurbanização e a rurbanização (UN-HABITAT, 2016:37) apresentando, por isso, fragilidades territoriais e ambientais várias que se relacionam com o elevado consumo de espaço e energia, custos significativos de infraestruturas e de gestão dos serviços, diminuição gradual dos espaços abertos e, também, o deterioramento ou possível ausência súbita das paisagens rurais (Pereira, 2004:132). De resto, os supracitados espaços emergentes traduzem uma «elevada segregação, territorialmente fragmentada, pouco sustentável, e social e culturalmente dominada por tendências perversas de dualização e exclusão» (Borja, 2003; citado por Pereira, 2004:133), dado que o suburbano – ou seja, «o lugar urbano de menor qualidade» (Mateus, 2011:352) – é caraterizado, sobretudo nos países pobres, por uma evidente estratificação social, bem como por uma segregação e uma estigmatização espacial, acompanhada pela falta de infraestruturas, insuficiência ou inexistência de serviços públicos adequados e condições precárias em termos habitacionais e urbanísticos.

O planeamento urbano estratégico e as plataformas mais abrangentes de política urbana surgem como possíveis forças transformadoras dos espaços urbanos. Porém, a postura adotada relaciona o planeamento urbano com o aparecimento, cada vez mais acentuado de problemas, principalmente, quando esta realidade se reporta aos países desenvolvidos, acabando por promover a pobreza e a exclusão urbanas. Enquanto em relação às cidades, se verificou uma mudança drástica nos respetivos padrões de crescimento, tal não sucedeu ao nível do planeamento, onde a adaptação ocorrida foi de tal forma impercetível que, ao invés

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de atuar como instrumento eficaz em prol da mudança urbana sustentável, contribuindo para o bem-estar humano e ambiental, tem originado sérios problemas (UN-HABITAT, 2009:3). Assim, uma vez reconhecida a necessidade premente de converter as cidades em lugares prósperos, aprazíveis, com elevados níveis de conforto e forte capacidade atrativa, os problemas urbanos estão a tornar-se nos principais focos de preocupação das entidades governativas, pelo que urge adaptar o planeamento urbano a uma nova abordagem com técnicas e métodos eficazes que estejam à altura dos desafios colocados pela expansão e desenvolvimento urbanos (WHO & UN-HABITAT, 2010:6), cuja adequação passa, inevitavelmente, por refletir as necessidades das populações que serve (UN-HABITAT, 2016:134), bem como pela leitura das dinâmicas socioculturais e possibilidade de participação efetivamente ativa por parte das comunidades.

1.2.1.2. Proliferação contínua dos bairros de lata

O alojamento constitui um dos principais problemas urbanos, uma vez que a carência habitacional contribui para a segregação socioespacial de determinados grupos sociais que habitam os espaços urbanos. A pressão demográfica exponencial que se exerceu sobre as cidades, despoletada pelo processo de industrialização, impossibilitou que a estrutura física destas últimas resistisse ao fluxo crescente de indivíduos, oriundos, sobretudo, de territórios rurais, que nela vinha a manifestar-se. Face à incapacidade do tecido urbano em garantir uma estrutura residencial que desse resposta à procura da população, e devido à ausência de planeamento, os espaços urbanos continuaram a expandir-se e a desenvolver-se sob os desígnios dos novos ocupantes, levando à disseminação de habitações de índole clandestina, isto é, de residências que não têm em consideração as normas legais de urbanização e cujas infraestruturas não estão preparadas para suportar as elevadas densidades populacionais aí existentes. Regra geral, os bairros de génese ilegal apresentam-se idênticos, em termos de tipologia e qualidade dos materiais, aos de construção lícita (Barata-Salgueiro, 2005:325), não constituindo, forçosamente, bairros degradados.

Por outro lado, o crescimento horizontal das cidades está relacionado com a expansão dos bairros de lata, situação que se traduz numa autêntica urbanização da pobreza, ou seja, numa mudança dos fenómenos de pobreza das áreas rurais para os espaços urbanos (UN-HABITAT, 2003:26). A construção destes bairros ocorreu, particularmente, em virtude da falta de habitação social, da procura de alojamentos a preços acessíveis (Barata-Salgueiro, 2005:323), do crescimento e progresso das infraestruturas de transporte e dos transportes público e privado (Antunes, 2011:4). Quando se deslocam para um novo território, os migrantes tendem a fixar-se em áreas onde as comunidades partilham de raízes étnicas e culturais idênticas, de forma a facilitar a sua integração. Contudo, estas aglomerações são

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constituídas, por norma, por indivíduos com fraca capacidade económica, o que origina a existência de bairros de lata, também designados por bairros de barracas (Barata-Salgueiro, 2005:325), isto é, formas marginais de implantação urbana, densamente povoadas, caraterizadas por uma elevada concentração de pobreza, geralmente segregadas, estigmatizadas e geograficamente isoladas, cuja população residente, na maioria dos casos, apresenta baixos níveis de escolaridade, formação e qualificação profissional (Barata-Salgueiro, 2005:326), e se encontra desempregada, circunstâncias que a posiciona numa reconhecida desvantagem social, ao dificultar-lhe a participação e integração na comunidade (UN-HABITAT, 2003:32; UN-HABITAT, 2016:51).

A qualidade do edificado, por seu turno, não se afigura alheia a esta realidade, já que nestes contextos degradados, prevalecem condições de habitabilidade e conforto mínimas, a reduzida dimensão das habitações, deficiências de construção e precariedade dos materiais utilizados, questões às quais se junta a ausência de instalações sanitárias, de infraestruturas básicas de saneamento e de condições de higiene e salubridade mínimas (Cardoso & Perista, 1994:105; Tomé, 2014:72). Estes territórios caraterizam-se, ainda, por englobarem uma mistura dos usos do solo, pelo que, com frequência, se encontram próximos de fontes poluentes e de depósitos de lixo (Barata-Salgueiro, 2005:326). Logo, havendo uma relação entre a insuficiência de condições de habitabilidade dos bairros de lata e os diversos problemas de saúde dos que neles habitam (UN-HABITAT, 2003:32), parece inútil qualquer tentativa de solucionar os problemas ambientais sem antes perspetivar a resolução dos desafios subjacentes à pobreza e à desigualdade social (WCED, 1987:12), sobre as quais radica, fundamentalmente, a formação e proliferação da habitação precária.

Embora a proporção de população urbana residente, atualmente, em bairros de barracas seja inferior do que há duas décadas, o número absoluto de habitantes destes bairros continua a aumentar, sendo que a grande maioria destes se localiza nas cidades dos países em desenvolvimento (Figura 3), dado que estas são as que apresentam um crescimento mais rápido e, por isso mesmo, englobam uma maior concentração deste tipo de assentamento informal, demonstrando, ao mesmo tempo, a incapacidade das cidades em acompanhar o próprio crescimento.

Imagem

Figura 2 – A Roda da Prosperidade.
Figura 3 – Evolução da população urbana a residir em bairros de lata, por grandes regiões
Figura 4 – Relação entre urbanização e pobreza.
Figura 5 – Desigualdade versus Taxa de Pobreza, 2013.
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Referências

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