• Nenhum resultado encontrado

IntroduçãoàTeoriaCinéticadosGases

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "IntroduçãoàTeoriaCinéticadosGases"

Copied!
46
0
0

Texto

(1)

INTRODUÇÃO

À

TEORIA CINÉTICA DE GASES

C. A. Nieto de Castro

DEPARTAMENTO DE QUÍMICA E BIOQUÍMICA

Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa

(2)

Percursores

“It seems probable to me that God in the beginning formed matter in solid, massy, hard, impenetrable, moveable particles...., and these primary particles, being solids, are incomparably harder than any porous bodies compounded of them; even so hard as never to wear or break in pieces”

Isaac Newton, Optics, 1718

“Divide the gas into layers on each side of the plane in which you measure the friction (later viscosity), and suppose the tangential motion uniform in each layer, but varying from one to another. Then particles from a layer on one side of the plane will always be darting about, and some of them will strike the particles belonging to a layer on the other side of the plane, moving with a different mean velocity of translation”

James Clerk Maxwell, Philosophical Magazine, 1859

"According to the physical hypothesis now generally received, a gas is represented as consisting of solid and perfectly elastic spherical particles of atoms, which move in all directions, and are animated with different degrees of velocity in different gases"

Thomas Graham, Philosophical Magazine, 1863 ……..

Este texto foi escrito para fazer parte como capítulo I da obra completa "Estados de Agregação, Estrutura, Equilíbrio e Propriedades", iniciado em 1982/83 pelo autor e pela Doutora Luísa Maria Abrantes, Professora Associada da FCUL e da qual foram publicados 7 capítulos. Entretanto, o ensino desta matéria na Universidade da Madeira, iniciada no ano lectivo de 1991/92, levou à sua reformulação e desenvolvimento, incluindo a introdução às propriedades de transporte na fase gasosa e a teoria das colisões na cinética química. Iniciada a sua distribuição aos estudantes em Dezembro de 1993, foi actualizada em 1994, 1995 e 1997.

Este texto, no entender do autor, poderá servir de apoio à disciplina de Termodinâmica e Teoria Cinética do tronco comum das licenciaturas em Física da FCUL, bem como às cadeiras de Química-Física I e III e de Termodinâmica Molecular das licenciaturas em Química da FCUL, e a licenciaturas de outras Universidades.

FCUL, Setembro de 1997

Carlos A. Nieto de Castro

(3)

CAPÍTULO I

1.1. Estados de Agregação

A experiência da nossa vida quotidiana diz-nos que a matéria se pode apresentar sob formas diferentes. Assim, desde o aspecto duma rocha ou dum pedaço de metal, até ao ar que nos rodeia, passando pela água que compõe os rios e os mares, podemos passar por variadíssimas expressões duma mesma ideia - o estado de agregação da matéria.

Existem três estados de agregação mais correntes - o sólido, o líquido e o gasoso - além de outros menos correntes - o plasma (gases ionizados), os cristais líquidos e os vidros. Enquanto aqueles 3 são estados naturais de ocorrência da matéria, conhecidos desde que o Homem se conhece, estes últimos só recentemente foram identificados, embora os vidros já fossem conhecidos como materiais desde a Antiguidade Clássica.

A experiência mostra-nos que à temperatura ambiente o árgon e o azoto são gases, enquanto que a água e o mercúrio são líquidos e o enxofre e o cloreto de sódio são sólidos.

Porque é que existem estes três estados de agregação? Qual a explicação a nível molecular - microscópico - desta existência?

A experiência também nos mostra que a mesma substância pode ocorrer, conforme o intervalo de temperaturas e pressões, em estados de agregação diferentes, que se transformam uns nos outros. É o caso da água à pressão atmosférica. Para temperaturas menores que 00C é o gelo que existe, enquanto que para temperaturas entre 00C e 1000C é a água líquida que se manifesta. Para temperaturas superiores a 1000C é o vapor de água que nos aparece (embora exista a temperaturas menores, como veremos). Para o azoto já estas temperaturas são diferentes, sendo os domínios de estabilidade de cada um dos estados de agregação Θ < -209,860C - sólido, -209,860C < Θ < -195,80C - líquido e Θ > -195, 80

C - gás. Devemos desde já notar que estas temperaturas dependem da pressão.

Existem assim intervalos de pressão e temperaturas em que os diferentes estados de agregação são mais estáveis do que os outros, transformando-se uns nos outros quando saímos desses intervalos. Assim, o cubo de gelo funde fora do frigorífico (sólido  líquido), a água do mar evapora-se naturalmente (líquido  gasoso) e o sólido desinfectante sublima (sólido  gasoso). Estas transformações designam-se por mudanças de estado.

Do ponto de vista macroscópico podemos encontrar bastantes diferenças entre as propriedades de cada um dos estados de agregação. Assim, a fluidez, que traduz a capacidade de uma quantidade de matéria escoar, é uma característica dos estados líquido e gasoso, pois o sólido não flui. A propriedade que mede esta capacidade é a viscosidade.

A densidade absoluta (ou massa específica) é grande para os estados sólido e líquido e pequena para o estado gasoso. A forma também é diferente. Enquanto que um sólido mantém a sua forma que é bem definida e não sofre alteração com o tempo (à parte da acção de agentes físicos - erosão, por exemplo - ou químicos - corrosão, por exemplo) nem com o local em que se encontre, um líquido adapta-se completamente à forma do recipiente, tomando a forma deste. O gás ocupa qualquer volume que lhe esteja acessível, expandindo-se o mais que puder, não possuindo qualquer forma.

(4)

Este leque de propriedades e comportamentos já permite pôr algumas questões. Em primeiro lugar, porque é que existem diferentes estados de agregação, com diferente número de moléculas por unidade de volume?

Veremos ao longo do estudo da Termodinâmica e da Química Física e nomeadamente neste livro a resposta a esta pergunta com bastante detalhe. No entanto podemos já adiantar certas explicações.

Assim, as moléculas tem certas dimensões e forças entre elas - forças intermoleculares. Por outro lado possuem uma certa energia interna que é proporcional, como veremos, à temperatura absoluta. Quando a densidade é grande, existem muitas moléculas por unidade de volume. O seu estado normal é a ocupação de posições fixas numa estrutura que corresponde à posição de equilíbrio da resultante das forças intermoleculares. Esta estrutura corresponde a uma estrutura ordenada - rede cristalina - e é a característica do estado sólido. Quando aumentamos a temperatura o sólido expande-se (dilata-se) e as moléculas "começam" a vibrar em torno das posições de equilíbrio da rede. A uma certa temperatura - temperatura de fusão - a energia cinética deste movimento é tal que a estrutura cristalina tem um colapso - a fusão, dando origem a uma estrutura ainda bastante ordenada, mas em que as moléculas tem uma certa mobilidade, colidindo bastante umas com as outras. Aparece assim uma certa desordem ou desorganização. O líquido pode assim tomar a forma do recipiente em que se deita e escoar com uma certa facilidade. As forças entre as moléculas são ainda bastante importantes em relação à energia cinética, sendo determinantes na determinação da estrutura do estado líquido. Se continuamos a aquecer o líquido, a energia cinética das moléculas aumenta bastante até que conseguem vencer as forças intermoleculares, e a estrutura do líquido perde-se - evaporação. O estado gasoso é então caracterizado pelo facto da densidade perde-ser bastante baixa e as moléculas não se "incomodarem" umas às outras, isto é, raramente entram em colisão e se fazem sentir as forças entre elas. O gás pode então ocupar qualquer volume que lhe está acessível com uma viscosidade baixa, para o que necessita que as suas moléculas se movam constantemente em direcções aleatórias - estado caótico ou desordenado.

Veremos nos capítulos II, III e IV as principais características dos três estados de agregação mais comuns, introduzindo no último uma pequena introdução aos polímeros sólidos.

No capítulo V abordaremos os princípios da termodinâmica que explicam o equilíbrio entre os diferentes estados de agregação e no capítulo VI as variações das propriedades termodinâmicas, nomeadamente entalpia, energia de Gibbs e entropia, nas diferentes transformações PVT. Por fim, no capítulo VII abordaremos o problema do equilíbrio na reacção química e os aspectos caloríficos envolvidos nestas.

Antes de abordarmos cada um destes capítulos em separado vamos fazer uma pequena digressão pela interpretação molecular do estado de agregação mais simples - o estado gasoso. Esta interpretação permitir-nos-á visualizar melhor certos comportamentos e certas propriedades dos sistemas temperatura, energia, densidade e a sua relação com as propriedades moleculares - dimensões e movimentos das moléculas.

(5)

1.2. A Teoria Cinética dos Gases

1.2.1. Situação Histórica

Os percursores da teoria cinética dos gases iniciaram-se com os filósofos da Grécia antiga, com o poema De Rerum Natura de Lucretius, e continuaram com Avogadro e a sua hipótese constitutiva dos gases - moléculas. Cannizaro em 1858 demonstrou que as moléculas tinham que ser constituídas por átomos ligados. No entanto, a teoria cinética de gases teve também uma origem mecanicista, desde os trabalhos de Bernoulli em 1738 sobre a pressão dum gás. Este cientista afirma que a pressão dum gás é devida ao impacto das partículas que o compõem nas paredes do recipiente em que está contido. Herapath, em 1821, confirma esta tese, escrevendo que as moléculas têm todas a mesma velocidade. Em 1845 Waterston estabelece o princípio de equipartição da energia.

A teoria cinética dos gases, tal como hoje se entende, teve o seu "nascimento" histórico em 1859 quando James Clerck Maxwell (1831-1879) introduziu o carácter aleatório do movimento molecular - caos molecular, abandonando assim o conceito determinista até então dominante da igualdade das velocidades de todas as moléculas, devido a Herapath. Em 1860, o mesmo cientista publicou os seus trabalhos sobre a lei de distribuição de velocidades para um gás em equilíbrio, e a lei da equipartição das energias moleculares. A época compreendida entre 1850 e 1880 foi fundamental, devendo referir-se os trabalhos de Ludwig Boltzmann (1844-1906) e de Johannes Diderik van der Waals (1837-1923), para além de Rudolf Clausius (1822-1888) e de James Prescott Joule (1818-1889). No período compreendido entre 1880 e 1930 destacam-se os trabalhos de Gibbs, Enskog e Chapmann, tendo estes dois últimos resolvido formalmente a teoria cinética dos fenómenos de transporte para gases monoatómicos, trabalho que apenas foi estendido aos gases poliatómicos por Wang-Chang e Uhlenbeck em 1953.

Foram estes os passos mais marcantes no estabelecimento da primeira teoria molecular que pretende explicar, a partir do comportamento das moléculas e seus movimentos, as propriedades macroscópicas da matéria, neste caso no seu estado de agregação de densidade mais baixa, o estado gasoso.

Qualquer teoria necessita de definir determinadas hipóteses que constituem a base de modelo (ver discussão na secção 1.2.3.), que descreveremos na secção seguinte.

1.2.2. O Modelo da Teoria Cinética dos Gases

As propriedades macroscópicas dos gases junto à temperatura ambiente e pressão atmosférica (densidade baixa) traduzidas pelas leis de Boyle-Mariotte e Charles-Gay Lussac e, consequentemente, pela equação de estado dos gases perfeitos (capítulo II), podem interpretar-se com bainterpretar-se numa colecção de moléculas que interpretar-se movem com uma determinada velocidade e que colidem entre si e com as paredes do recipiente em que estão contidas. Embora, como já foi referido, os trabalhos de James Clerck Maxwell tivessem sido fundamentais para o estabelecimento deste modelo, devem também citar-se as excelentes contribuições de Ludwig Boltzmann e Rudolph Clausius, ainda na segunda metade do século XIX.

Vamos ver como se pode construir uma teoria molecular dos gases a partir de hipóteses simples sobre a estrutura e comportamento da fase gasosa. O modelo já referido é uma construção mental que engloba as características consideradas importantes para determinar o

(6)

comportamento do sistema físico real. Estas características são seleccionadas, quer intuitivamente, quer com base numa análise matemática simples do problema.

A teoria cinético-molecular dos gases baseia-se nas seguintes hipóteses:

1.- Todos os gases são constituídos por um grande número de moléculas idênticas, esféricas, com forças entre elas1, pequenas comparadas com as dimensões do recipiente de volume V

onde estão contidas (

σ

<< V3 , sendo

σ

o diâmetro da molécula) e com as distâncias

percorridas entre duas colisões sucessivas (

σ

<<

Λ

, sendo

Λ

o livre percurso médio).

2.- As moléculas estão em movimento contínuo e aleatório deslocando-se em todas as direcções, em trajectórias rectilíneas.

3.- As moléculas são independentes umas das outras e só interactuam durante colisões de duração pequena. Existe interacção entre as moléculas durante um intervalo de tempo

t

Λ

C

« , sendo C a velocidade média das moléculas.

Estas colisões, em média, são perfeitamente elásticas, isto é, não existe variação da energia cinética translacional durante o choque.

4.- A mecânica newtoniana, em particular a relação F = ma ou F = dp/dt , em que a é a aceleração e p o momento linear da molécula, pode ser utilizado para descrever o movimento das moléculas.

5.- A energia cinética devida ao movimento translacional dum mole de gás é 3/2 RT.

Vejamos agora como as hipóteses 1 a 5 conduzem às equações que traduzem o comportamento molecular dos gases.

1.2.3. A Pressão dum Gás

A pressão dum gás pode agora calcular-se. Ela resulta de facto da força por unidade de área exercida por N moléculas, cada uma com a massa m, contidas num recipiente cúbico de lado

l. A força exercida nas paredes resulta das colisões das moléculas com as paredes.

Consideremos apenas uma molécula. A sua velocidade vai descrever-se por um vector C, de módulo C e com componentes segundo os três eixos, Cx, Cy , Cz . Para facilidade de cálculo podemos escolher o referencial de forma a que as componentes do vector velocidade, C, sejam perpendiculares às paredes do recipiente.

A força exercida quando uma molécula colide com a parede pode calcular-se da segunda lei de Newton (hipótese 4.). Esta lei diz-nos que a taxa de variação de momento linear duma molécula numa dada direcção é igual à força que actua numa molécula nessa direcção, isto é:

F d p dt m d C dt = = (1.1)

1 Existem forças intermoleculares. Neste curso deduziremos as equações dos gases perfeitos, para os quais o

(7)

O momento linear com que uma molécula se aproxima duma das faces do cubo que constitui o recipiente é mCx , se a face em questão for perpendicular ao eixo dos xx. Após a colisão a molécula afasta-se da parede, de tal forma que Cy e Cz não se alteram, mas Cx muda para - Cx , como se mostra na figura 1.1.

inicial final Cx Cz Cy C' y C' z C' x F Parede

Figura 1.1 - A origem da pressão dum gás

No choque, a variação de momento, é mCx - (-mCx ) = 2 mCx =

p pelo que a força exercida em direcção ao gás vale 2 mCx .O número de variações de momento por segundo na parede é o número de colisões por segundo que uma molécula tem com a citada parede.

Atendendo a que uma molécula percorre a distância Cx durante 1 segundo, na direcção x, e que a distância entre duas colisões com a mesma parede é da ordem de 2l, a frequência de

colisão, ou seja, o número de colisões por unidade de tempo com a parede, é Cx/ 2l. Logo a força exercida por uma molécula será o produto da variação de momento pela frequência de colisão com a parede:

F p Cx mC C mC x x x 1 2 2 2 2 =∆ . = . = l l l

e como a pressão é a força por unidade de área, a pressão exercida por uma molécula vem:

p mC mC mC V x x x 1 2 2 2 3 2 1 = = = l .l l

em que V é o volume do recipiente. A pressão exercida pelas N moléculas, atendendo a que são independentes umas das outras (hipótese 3.), será:

p mC V x i i N = =

( 2) 1 (1.2)

Como se sabe o valor médio duma quantidade discreta é a soma dos valores dividido pelo número de valores observados, isto é:

X ni Xi n = =

1 1

(8)

Ora as nossas moléculas movem-se em várias direcções, com várias velocidades, isto é, (Cx)i

(Cy)j. Então Cx e Cx2 serão diferentes de molécula para molécula, e se designarmos por Cx2 o valor médio de Cx2 teremos, atendendo à definição de valor médio:

p m V C m V N C NmC V x i N i x x = = = =

( 2) 1 2 2 (1.3)

Atendendo a que é conveniente estabelecer uma relação entre p e C2 e não entre p e Cx2 e sabendo que o quadrado do módulo dum vector vem dado pela soma dos quadrados das componentes

C2 =Cx2 +Cy2+Cz2

e que para um dado número de moléculas movendo-se em direcções aleatórias

Cx2 =Cy2 =Cz2 então, C2 =3Cx2 e obtemos: pV = 1NmC 3 2 (1.4)

Esta equação, cuja dedução utilizou as hipóteses 1 a 4, traduz a relação que existe entre a pressão, o volume, o número de moléculas e o valor do quadrado do valor médio da sua velocidade. Ela é uma expressão molecular da lei de Boyle, pois N, m e C2 são constantes,

para uma dada temperatura.

A equação (1.4) pode escrever-se na forma

p=1 C 3

2

ρ

em que

ρ

= Nm

V é a densidade do gás. A densidade numérica n é N

V pelo que

ρ

= m n é

importante, nesta altura, ficar com uma noção do valor da densidade numérica n para vários valores da pressão, a 300 K. Assim, à pressão atmosférica temos cerca de 2,5.1025 moléculas /m3, enquanto que no ultra vazio (cerca de 10-7 bar) temos 3,2.1012 moléculas/m3. No espaço,

onde as temperaturas rondam os 3 K, temos cerca de 4.104 moléculas/m3.

1.2.4. Energia Cinética e Temperatura

É mais clara a percepção das energias moleculares do que a das velocidades moleculares. Assim, o valor médio de energia cinética de cada partícula será:

(9)

ε

c = 1mC 2

2

pelo que a equação (1.4) se pode escrever

pV = 2 N c 3

ε

ou se atendermos a que o movimento das moléculas é linear, representando uma translação, podemos designar esta energia cinética por translacional e escrever:

pV = 2 N tr 3

ε

Se for n a quantidade de substância presente no recipiente n = N/N0 , em que N0 é o número de Avogadro, o número de moléculas existentes num mole de gás. Então, podemos escrever:

pV = 2nN tr 3 0

ε

e introduzindo Etr como sendo o valor médio da energia translacional de 1 mole de gás, obtemos:

pV = 2n Etr

3 (1.5)

Introduzindo agora a hipótese 5., isto é, Etr = 3RT

2 obtemos: pV = 2n RT =nRT 3 3 2 . (1.6)

que é equação de estado dum gás perfeito. A energia translacional média Etr é de facto o valor da energia interna de um gás monoatómico, isto é:,

U =Etr = 3RT

2 (1.7)

Um gás poliatómico tem outras formas de armazenamento de energia (rotacional e vibracional) que analisaremos na secção 1.2.8.

Podemos concluir que os postulados 1 a 5 nos permitem obter, por via molecular, a equação de estado do gás perfeito, reflexo das experiências macroscópicas de Boyle, Mariotte, Charles e Gay-Lussac. Podemos assim concluir que as hipóteses formuladas estão correctas e que o modelo concorda com a experiência.

(10)

1.2.5. A Lei de Distribuição de Velocidades e de Energias

A equação (1.5) pode ser utilizada para calcular o valor de C. Assim, atendendo a que:

Etr = 3RT = N mC 2 1 2 0 2 pelo que C RT M C RT M 2 = 3 2 = 3 (1.8)

em que M é a massa molecular do gás, M = N0 m. A equação (1.8) relaciona a raiz quadrada do valor quadrático médio da velocidade molecular com a temperatura e a massa molecular. Assim, para o O2 a 298 K: 1 2 ms 482 032 , 0 298 . 3143 , 8 . 3 = − = C

Podemos assim verificar que o valor quadrático médio da velocidade molecular depende de T e M e que para o O2 à temperatura ambiente a sua raíz quadrada vale 482 ms-1, superior à

velocidade do som no ar (340 ms-1 ). No entanto, para o mercúrio já só é 195 ms-1 , o que é

lógico pois trata-se de uma molécula mais pesada. O valor de C2 é próximo do valor médio da velocidade molecular, como veremos seguidamente.

A razão entre a constante dos gases perfeitos R e o número de Avogadro N0 é a constante de Boltzmann k 1 23 0 JK 10 . 3806 , 1 − − = = N R k

que tem o significado de constante dos gases perfeitos por molécula. A energia cinética média por molécula será:

ε

tr = 3kT 2 (1.9) e a 298 K vale J 10 . 17 , 6 ) 298 ).( JK 10 . 3806 , 1 ( 2 3 −231 =21 = K tr ε

enquanto que para um mole de moléculas é:

1 0 3720Jmol 2 3 = − = =N RT Etr εtr

(11)

Verifica-se assim que a energia cinética média a uma dada temperatura é a mesma para todas as moléculas, independentemente da sua massa. Isto significa que a uma dada temperatura as moléculas mais leves se movem com maior velocidade do que as mais pesadas (O2 e Hg). Retomemos a relação existente entre C C C2, x2, y2 e Cz2. Multiplicando por 1/2 m dá:

1 2 1 2 1 2 1 2 2 2 2 2 mC = mCx + mCy + mCz ou

ε

c =(

ε

c)x+(

ε

c)y+(

ε

c)z = 3kT 2

e como não há preferência direccional:

(

ε

c)x =(

ε

c)y =(

ε

c)z = 1kT

2 (1.10)

ou seja as três direcções fundamentais do espaço, designadas por formas de armazenar energia, têm uma energia média 1/2 kT. Esta constatação traduz o princípio de equipartição de energia. Cada forma de armazenar energia tem em média 1/2 kT. Esta é uma consequência directa da teoria cinética dos gases e é um princípio extraordinariamente importante no estudo das energias moleculares (vide 2.7).

Estamos agora em condições de estudar melhor como é que as velocidades moleculares se distribuem. Na realidade, se a velocidade de cada molécula pode ser diferente da das outras moléculas, como é que estas velocidades se distribuem, isto é, qual o número de moléculas com uma dada velocidade C, ou melhor, quantas moléculas tem uma velocidade entre C e C + dC?

Este problema foi resolvido com os trabalhos de Ludwig Boltzmann. Segundo este autor a fracção de moléculas com energia e , num conjunto de moléculas que possuem vários estados de energia possível, equiprováveis,

ε ε ε

0, 1, 2,..., ,...

ε

i

ε

N vem dada por

N N e e i kT kT i i = − −

( / ) ( / ) ε ε (1.11)

em que Ni é o número de moléculas com energia εi e N é o número total de moléculas, N = Σ Ni. Em termos de velocidades moleculares, podemos escrever que a fracção de moléculas dN/N com velocidades entre Cx e Cx + dCx é:

dN N Ae dC mC kT x x = (−1 / ) 2 2

em que A é uma constante de proporcionalidade que pode ser calculada do seguinte modo: a fracção de moléculas existente em todo o espaço, com velocidades C entre -∞ e +∞ é, necessariamente, 1. Então:

(12)

dN N Ae dC mC kT x x −∞ +∞ −∞ +∞

= =1

( 2/2 )

pelo que A vem:

A e mCx kT dCx = − −∞ +∞

1 2 2 ( / )

O integral existente na equação anterior é um dos integrais que aparece na teoria cinética dos gases. A matemática diz-nos que:

e dx a ax − −∞ +∞

2 = π

pelo que o valor do integral anterior em que a = m/2 kT, vem dado por 2πkT

m ou seja:

A m

kT =

pelo que a equação da distribuição de velocidades vem:

1 2 2 2 N dN dC m kTe x mCx kT = −

π

/

Esta relação mostra que a fracção de moléculas, com velocidades entre Cx e Cx + dCx varia, com a temperatura. Quando passamos para o espaço a 3 dimensões, obtemos a lei de distribuição de velocidades de Maxwell-Boltzmann. Para 3 dimensões, a fracção de moléculas que possuem componentes do vector velocidade entre Cx e Cx + dCx , Cy e Cy + dCy e Cz e Cz + dCz é o produto das fracções segundo cada uma das direcções, isto é:

dN N m kTe dC m kTe dC m kTe dC mC kT x mC kT y mC kT z x y z =                − − − 2 2 2 2 2 2 2 2 2

π

π

π

/ / / . . ou 1 2 3 2 2 2 2 2 N dN dC dC dC m kT e x y z m Cx Cy Cz kT = − + +

π

/ ( )/

Atendendo a que se deseja o valor da fracção de moléculas com velocidade entre C e C + dC, num espaço entre duas esferas centradas na origem, com raios C e C + dC (esse espaço tem um volume 4

π

C2dC, que é equivalente a dC

xdCydCz), e, recorrendo à definição de C2, obtemos: 1 4 2 3 2 2 22 N dN dC m kT C e mC kT =     − π π / / (1.13)

(13)

Apresenta-se na figura 1.2 o valor de 1

N dN

dC para o azoto a duas temperaturas, 100 K e

300 K. O valor de 1

N dN

dC é de facto a probabilidade de encontrar moléculas com velocidades

entre C e C + dC. A figura 1.2 mostra-nos vários aspectos. Em primeiro lugar a probabilidade de encontrar moléculas do gás com velocidades elevadas ou baixas é praticamente nula. A distribuição de probabilidades é aproximadamente parabólica na origem, pois o termo em C2

predomina sobre a exponencial. Para velocidades mais elevadas, no entanto, o termo exponencial começa a ser mais importante, causando a passagem por um máximo e decrescendo rapidamente para zero. O máximo da curva corresponde à velocidade mais provável.

A figura 1.2 mostra, ainda, que um aumento de temperatura torna a distribuição mais "larga", deslocando o máximo para velocidades mais elevadas. Para C/Cmp>2, 1

N dN

dC≈ 0. No entanto,

a área debaixo da curva, que corresponde à probabilidade total, é a mesma, pelo que o máximo baixa, existindo maior dispersão de velocidades. A largura de distribuição é assim uma medida da temperatura.

0 5 10 15 20 25 30 35 1. E 4/ N *d N /d C /m -1 s 0 200 400 600 800 1000 C/ms-1 T = 100 K T = 500 K

Figura 1.2 - Distribuição de Maxwell-Boltzmann para o azoto, a duas temperaturas O conhecimento da função de distribuição de velocidades permite-nos calcular qualquer tipo de velocidade média. Vejamos o cálculo do valor quadrático médio da velocidade molecular (equação (1.8)): C C dN N m kT C e dC mC kT 2 2 0 3 2 4 2 0 4 2 2 = =     ∞ ∞

π

π / ( / )

Este é outro dos integrais da teoria cinética dos gases, do tipo:

x e dx n n a n ax n n 2 0 2 1 2 1 2 2 2 − ∞ + +

= ( )! ! π

(14)

e como no nosso caso, n = 2, teremos: C m kT kT m kT m 2 3 2 5 2 4 2 2 3 8 3 =           = π π π / / . . ou C kT m RT M 2 = 3 = 3

Podemos agora calcular a velocidade média das moléculas:

C CdN N =

∞ 0 e atendendo a que x e dx n a n ax n 2 1 1 0 2 2 + − + ∞ =

! obtemos: C m kT m kT kT m =           =    4 2 1 2 2 8 3 2 2 1 2 π π π / / . (1.14)

A velocidade mais provável, que como já referimos corresponde ao máximo da curva de distribuição, obtém-se derivando a função de distribuição, igualando a zero e calculando o valor de Cmp : C kT m RT M mp = = 2 2

Estas três velocidades estão relacionadas por razões do tipo:

C C C2: : mp =1 000 0 921 0 816. : , : ,

   EXERCÍCIO 1

Calcular o valor da velocidade média das moléculas do H2, He, H2O, N2, O2, CO2, Cl2, HI e Hg a 298 K e a 1000 K. Comente.

(15)

RESOLUÇÃO:

Utilizando a equação (1.14) e as massas moleculares correspondentes, obtemos os valores da tabela seguinte: C / m s-1 Gás T = 298 K T = 1000 K H2 1770 3240 He 1265 2300 H2O 590 1080 N2 470 860 O2 444 810 CO2 380 690 Cl2 300 550 HI 220 400 Hg 180 330

Podemos verificar o decréscimo de C com a massa molecular e, para o mesmo gás, o seu aumento com a temperatura.

  

A lei de distribuição de Maxwell-Boltzmann pode exprimir-se em termos de energias cinéticas, atendendo a que

ε

tr = 1mC

2 2

. Assim, a equação (1.13) pode transformar-se, pois

d mCdC m mdC m dC ε= = 2ε = 2 ε , obtendo-se 1 2 3 2 N dN d kT e kT ε π ε ε = − ( )/ / (1.15)

A uma dada temperatura, a equação (1.15) descreve a distribuição de moléculas pelas energias translacionais possíveis.

A forma da curva que se obtém é ligeiramente diferente da distribuição de velocidades pois tem uma tangente vertical na origem e decai mais suavemente. Um aumento de temperatura também a torna mais "larga" pois passa a existir uma maior percentagem de moléculas com energias mais elevadas.

Claro que, a partir de (1.15) se pode calcular ε εx, y, ou εz , obtendo-se 1/2 kT, o que confirma o princípio da equipartição da energia.

(16)

1.2.6. A Efusão

A maior parte dos fenómenos com que lidamos a nível macroscópico depende de médias das propriedades individuais dum conjunto bastante grande de moléculas duma dada amostra de gás2. É o caso da pressão e da temperatura do gás. No entanto, alguns fenómenos dependem

duma forma mais detalhada das colisões entre as moléculas dum gás ou destas com uma superfície, como nas propriedades de transporte (viscosidade, condutibilidade térmica e difusão), na adsorção gás-sólido e na cinética química (teoria das colisões).

Outros fenómenos dependem ainda da passagem de moléculas através dum orifício estreito, como é o caso da efusão e dos feixes moleculares.

Neste caso há que abordar a direcção do movimento, em vez de nos quedarmos pelo movimento aleatório em 3 dimensões.

Uma das quantidades com maior interesse é a taxa de colisões de moléculas de gás com a parede, provenientes de uma dada direcção. Consideremos que dNp moléculas batem na parede no intervalo infinitesimal de tempo dt. Consideremos ainda uma molécula com a componente de velocidade Cy no intervalo de velocidades entre Cy e Cy + dCy . Para atingir a parede, tem que se deslocar em relação a esta, e para a atingir no intervalo de tempo dt ou menor tem que estar a uma distância da parede Cy dt ou menor.

O número de moléculas com a componente Cy entre Cy e Cy + dCy (equação (1.12)) é:

dN N m kTe dC Ng y dC mC kT y y y = − = 2 2 2 π / ( ) utilizando g y m kTe mCy kT ( )= − / 2 22 π

A fracção de moléculas à distância Cy dt da parede é C dtyl pois as moléculas que estão

aleatoriamente distribuídas na distância l. O produto dN C dty

l dá-nos o número de moléculas que tem velocidades entre Cy e Cy + dCy à distância Cy dt da parede. Este número é:

N

g y C dtdCy y l ( )

Dividindo pela área da parede l2, obtemos o número de colisões por unidade de área, no intervalo de tempo dt, para as moléculas com velocidades entre Cy e Cy + dCy ,

N

V g y C dtdC( ) y y

2 Considera-se que temos que ter N/N

(17)

em que V é o volume do recipiente. Para obter o número total de colisões dNp com a parede no intervalo de tempo dt, vamos integrar Cy entre 0 e ∞ e multiplicar pela área S da parede.

[

]

dN S N V g y C dC dt p = y y ∞

( ) 0

Este integral é do tipo

xe dx a ax − ∞

2 = 0 1 2 pelo que obtemos:

g y C dC m kT e C dC kT m C y y mC kT y y y ( ) / 0 2 0 2 2 1 4 2 ∞ ∞

=

= = π π

e se atendermos à equação de definição de dNP teremos:

dN S N

V Cdt

p = .

1 4

Se utilizarmos à equação dos gases perfeitos, obtemos:

1 1 4 1 4 8 0 S dN dt C p kT pN RT RT M p . = = π (1.16) O termo 1 S dN dt p

. representa o número de moléculas que batem na parede, por unidade de tempo e por unidade de área (semelhante ao termo ZAA da equação 1.24, adaptado à colisão com a parede).

  

RESOLUÇÃO:

Aplicando directamente a equação (1.16):

1 3 444ms 10 . 32 . 298 . 3143 , 8 . 8 − − = =

π

C 1 2 27 1 23 6 1 s m 10 . 73 , 2 K 298 . JK 10 . 38 , 1 Pa 10 . 1 , 0 . ms 444 . 4 1 1 − − − − − = = dt dN S p EXERCÍCIO 2

Calcular o número de colisões com a parede dum recipiente em que está contido O2 a 298 K e a 0,1 MPa. Comente.

(18)

O número de colisões é elevado, pois o oxigénio sendo uma molécula pequena desloca-se com uma velocidade elevada à temperatura ambiente.

  

Se existir um orifício pequeno de área S a taxa de passagem pelo orifício será3:

1 2 0 S dN dt pN MRT p = π (1.17)

e designa-se taxa de efusão, enquanto que o escape do gás através dum orifício pequeno, tão pequeno que não perturba a distribuição de velocidades pela saída de moléculas (um buraco grande claro que perturba!), se designa por efusão.

Este processo foi descoberto por Thomas Graham em 1848, que verificou que, à mesma temperatura, as taxas de efusão de dois gases diferentes variavam inversamente com a raíz quadrada das massas moleculares. Esta lei foi importantíssima, no final do século XIX, para a determinação de massas moleculares. Assim, se designarmos por e1 a taxa de efusão dum gás e e2 a taxa de efusão do segundo gás, à mesma temperatura e pressão, a equação (1.18) permite-nos obter: e e M M 1 2 2 1 = (1.18)

o que traduz teoricamente a lei de Graham. A diferença entre as diferentes taxas de efusão permitem ainda separar as espécies isotópicas, como por exemplo o H2 e o D2, o 20Ne e o 22

Ne 235UF

6 e o 238UF6 . Este último caso permitiu o enriquecimento do urânio natural em 235U, para a produção da bomba atómica durante a 2ª Guerra Mundial, apesar da razão entre as

taxas de efusão ser apenas 1,0043.

O fenómeno de efusão tem sido usado também para a determinação de pressões de vapor de sólidos, quando estas são muito pequenas. Neste método, desenvolvido por Knudsen, aquece-se uma amostra numa câmara fechada previamente evacuada, com um pequeno orifício (tipo buraco de alfinete). A pressão dentro da câmara é a pressão de vapor do sólido à temperatura em questão. O valor desta pressão determina-se medindo a diminuição de peso da amostra de sólido resultante da efusão de moléculas de gás pelo orifício. Assim, multiplicando a taxa de efusão pela massa de cada molécula m M

N =

0

, obtemos a taxa de variação de peso por unidade de tempo e por unidade de área, W:

W m S dN dt M SN dN dt pM MRT p M RT s s = = = = 0 2

π

2

π

A pressão de vapor do sólido p, vem então dada por:

(19)

p W RT M

sat =(1.19)

A equação (1.19) permite então calcular psat, se W for medida com precisão, o que se pode

fazer com uma boa balança (do tipo micro, de preferência). Claro que se torna também necessário conhecer a área S com precisão, para se poder calcular W. Para além deste método, a efusão é bastante importante na indústria electrónica pois permite depositar filmes finos de metais condutores em substratos isolantes.

  

RESOLUÇÃO:

Utilizando a equação (1.18) e exemplificando para o N2, temos:

e e M M e e e e e e N Ar Ar N O Ar H Ar CO Ar 2 2 2 2 2 40 28 1 195 1 118 4 0,953 = = = = = = , , ,472

Pode verificar-se que o acordo é bastante bom para o N2 e para o O2, afastando-se um pouco para o H2 (correcção à direcção do movimento pois a molécula é muito pequena) e para o CO2 (gás não pode considerar-se perfeito, pois T/Tc, sendo Tc a temperatura crítica, é próximo de 1, pelo que têm que se efectuar correcções).

   EXERCÍCIO 3

Calcular para os gases H2, N2, O2, e CO2 a sua taxa de efusão em relação à do árgon tomada como unitária, comparando com os valores experimentais:

N2 = 1,2002 ; O2 = 1,1187 ; H2 = 4,2462 , CO2 = 0,9834 Comente.

(20)

1.2.7. As Colisões Moleculares

A teoria cinética considera que as moléculas, de dimensão σ « V3 , se movem segundo

trajectórias rectilíneas. Este facto é equivalente a introduzir uma força intermolecular infinita quando duas moléculas colidem (r = σ, sendo r a distância entre o centro das esferas) e nula em qualquer outro caso (r ≠ σ) - modelo das esferas rígidas - e a considerar que a teoria cinética de gases se aplica a zonas do diagrama de fases dum gás em que Vm = V/n » N0 .

πσ 3/6. Na realidade as forças entre duas moléculas são infinitas mas para r = 0 (repulsão a

curtas distâncias) e nulas para r = ∞ , passando por um mínimo para um valor r = bσ ( 1 < b < 1,2 σ ) (atracção a médias e longas distâncias)4. A força de interacção

molecular é conservativa e é causada pela existência de um potencial de interacção conservativo φ (r) e vem dada por:

dr r d r

F( )=− φ( ) (1.20)

em que F(r) representa a força intermolecular. O valor de φ (r) encontra-se esquematizado na figura 1.3. r (r) + - σ ε r m

φ

Colisão Deflexão da trajectória

Figura 1.3 - O potencial intermolecular e a colisão entre moléculas

Para uma zona muito pequena da trajectória, da ordem de r ≈ 3 a 4σ, as forças intermoleculares tornam-se importantes, deflectindo a trajectória da linearidade, como se exemplifica na figura 1.35. Por outro lado a duração da colisão ( ou o tempo que a molécula

leva a percorrer a distância 4σ é, por exemplo para o azoto a 298 K, da ordem de

s 10 . 1 , 3 ms 474 m 10 . 7 , 3 . 4 4 12 1 10 − − − = ≈ ≈ ∆ C t σ

4 O assunto será tratado em maior promenor no capítulo II, secção 2.3.

5 Na realidade existem vários tipos de colisão, que podem ser mais atractivas ou mais repulsivas, conforme se

demonstra no estudo mais avançado da teoria cinética de gases, sendo os raios de curvatura da trajectória antes e depois da colisão maiores ou menores.

(21)

ou seja da ordem de 10-12 s e só durante parte deste tempo é que as forças intermoleculares

actuam significativamente. Logo, para fases gasosas diluídas, podemos considerar que as moléculas se comportam, em primeira aproximação, como esferas rígidas.

Podemos assim considerar que a molécula de diâmetro σ percorre uma trajectória rectilínea, varrendo um tubo cilíndrico de diâmetro 2σ, secção recta πσ2, geratriz Ct e volume πσ2Ct,

no tempo t, como se ilustra na figura 1.4.

Área = πσ 2

C t

_

Colisões

Figura 1.4 - A secção eficaz de colisão para esferas rígidas

Se entrarem moléculas dentro deste cilindro vão-se dar colisões, pelo menos uma. Logo o número médio de colisões para um gás6 cuja densidade numérica é n, será nπσ2Ct, sendo a

distância média percorrida por uma molécula entre duas colisões sucessivas, designada por livre percurso médio Λ, dada por:

Λ= Ct =

Ct

nπσ2 nπσ2

1

Na realidade nem todas as moléculas têm uma velocidade igual à velocidade média e Λ varia com C e só quando C > 2C é que este raciocínio é totalmente válido. Maxwell, utilizando a sua lei de distribuição de velocidades, chegou à conclusão de que a equação anterior tinha de ser corrigida por um factor 1/√2. Assim, a equação anterior deve ser escrita na forma7:

Λ= 1 2

2nπσ (1.21)

Para calcular Λ torna-se necessário ter o valor do diâmetro molecular, passível de ser obtido, como veremos, a partir da viscosidade do gás. Assim para o azoto, σ ≈ 0,37 nm. Logo a 298 K e à pressão p, temos:

6 Este número representa o número de moléculas que se encontram dentro do tubo. 7 Para átomos muito lentos ou neutrões deve usar-se a equação sem o √2.

(22)

) MPa ( 10 . 65 , 6 2 9 2 p p kT − = = Λ πσ

o que para vários valores da pressão dá os seguintes resultados:

p / MPa Λ / nm Λ / σ

0,01 665 1800

0,1 66,5 180

1 6,65 18

Para p = 1 MPa = 10 bar, Λ / σ = 18 « 100 e a teoria cinética de gases já não é válida, pois o gás é denso e necessitamos de usar uma equação do tipo de van der Waals ou do virial. De um modo geral as hipóteses da teoria cinética de gases só são válidas se Λ / σ > 100.

O tempo médio durante o qual uma molécula se move sem chocar com outra vem dado por:

τ

= Λ

C (1.22)

Para o azoto a 298 K e 0,1 MPa teremos:

s 10 . 140 ms 476 m 10 . 5 , 66 12 1 9 − − − = = τ

Como se pode verificar o tempo percorrido entre colisões (140 ps) é muito maior do que a duração duma colisão (1 ps), como seria de esperar, pois caso contrário φ(r) tinha que ser totalmente considerado e teoria cinética necessitaria de ser reformulada. Na realidade Λ é um valor médio e a distância percorrida por uma molécula antes dum nova colisão varia bastante de colisão para colisão. Existe uma lei de distribuição de probabilidades do tipo:

P(l)=e−l/Λ com

∞P(l)dl=

Λ

0

sendo l a distância percorrida entre 2 colisões sucessivas. Assim, quanto maior for l menor

P(l) e para l » Λ, P(l) ≈ 0. Praticamente todas as colisões ocorrem para 0 < l< 2 Λ.

O inverso de τ é a frequência de colisão ν, ou seja o número de colisões que uma molécula sofre por unidade de tempo:

ν = C = πσ C

(23)

O número total de colisões que ocorrem num gás é N . ν / 2, e o número total de colisões por unidade de volume entre duas moléculas do tipo A vem dado por:

Z N V N V C AA= =       1 2 2 2 2 2 ν πσ

ou, em termos de temperatura e massa das moléculas

Z kT m N V AA=             πσ π 2 1 2 2 4 / (1.24)

Esta equação mostra-nos que: Z Z T Z AA AA AA ∝ ∝ ∝

πσ

ρ

2 1 2 2 /

ou seja ZAA » quanto maior for a molécula, quanto maior for a temperatura e quanto maior for a densidade do gás, como seria de esperar. Nesta altura convém salientar que o termo correctivo da pressão dum gás perfeito introduzido por van der Waals na sua equação de estado ( - a

ρ

2 ) se deve a este facto (ver capítulo II).

  

RESOLUÇÃO:

Calcula-se o valor de

Λ

a partir da equação (1.21) e C a partir da equação (1.16) obtendo-se

Λ

= 1157.10-10 m e C = 515 ms-1. Podemos então calcular

ν

e Z AA: colisões/s 10 . 23 , 3 K 500 . JK 10 . 38 , 1 Pa 10 . m 10 . 1157 ms 515 . 2 1 2 1 2 1 34 1 23 5 10 1 = = Λ       = = AA AA Z C V N V N Z

ν

colisões/s 10 . 45 , 4 10 K 500 . JK 10 . 38 , 1 . 10 . 23 , 3 . 2 2 2 9 5 1 23 34 2 = = = = Λ = − −

ν

πσ

ν

p kT Z C C AA n    EXERCÍCIO 4

Calcular o número de colisões que uma molécula de árgon (

σ

= 3,64.10-10 m) a 500 K e a

(24)

1.2.8 Equipartição de energia. Capacidades caloríficas de gases

O modelo descrito anteriormente admite as moléculas como esferas, possuindo apenas energia cinética de translação - energia translacional. Dada a estrutura actualmente conhecida das moléculas, verifica-se que este modelo só pode ser aplicado a átomos, como os gases nobres, He, Ne, Ar, Kr e Xe, ou a radicais atómicos como o H, C, F, Cl, etc.8, isto é, para moléculas

monoatómicas.

Foi Clausius que, para poder explicar as capacidades caloríficas dos gases poliatómicos, introduziu os movimentos moleculares da rotação e da vibração, os quais também contribuem para a energia da molécula e portanto do gás.

Assim temos:

- energia cinética de translação  ½ m Ci2 / molécula

- energia cinética de rotação  ½ I

ω

i2 / molécula9

- energia (cinética + potencial) de vibração  (½ + ½) K ri2 / molécula

cada um destes modos de armazenar energia é independente e constitui um grau de liberdade da molécula. Para o caso da vibração, como temos duas formas de armazenar energia (cinética + potencial)10, a cada grau de liberdade correspondem 2 formas de armazenar energia. Para as

rotações e translações a cada grau de liberdade corresponde uma única forma de armazenar energia. Assim, para uma molécula diatómica, temos:

Translações - 3 GL (x, y, z)

Rotações - 2 GL ( Ry , Rz ) - a rotação em torno do eixo da molécula é trivial - figura

1.5

Vibrações - 1 GL , mas duas formas de armazenar energia

Figura 1.5 - Eixos de rotação duma molécula diatómica

8 Os átomos dos metais alcalinos, Li, Na, K, Rb e Cs também estão isolados a altas temperaturas. No entanto

formam dímeros a temperaturas ambientes e até cerca de 1200 K.

9 I é o momento de inércia em torno dum eixo perpendicular ao plano de rotação e ω a velocidade angular de

rotação.

10 Relembrar o oscilador harmónico linear.

Rotação trivial

R

z

R

x

(25)

O valor médio destas energias só depende da temperatura. Na realidade, para a translação (eq. 1.9 e 1.10) temos:

( )

( )

( )

ε

ε

ε

tr x tr y tr z kT kT kT = = = 1 2 1 1 2 1 1 2 1 3 grau de liberdade grau de liberdade grau de liberdade graus de liberdade _ _ _ _ _ _ _ _ _ _

Para f graus de liberdade, separados em translacionais, rotacionais e vibracionais, temos:

f = ftr + frot + fvib (1.25) e então: ε =fx ou =fx 1 2 1 2 kT E RT (1.26)

Para as vibrações devemos usar fvib’= 2 fvib pois cada grau de liberdade tem duas formas de

armazenar energia. Assim para o N2, O2, HF, Li2, etc., temos f = 3 + 2 + 2x1 = 7:

E=3RT+RT+RT= RT 2

7

2 (1.27)

As moléculas com mais de 2 átomos têm o mesmo número de graus de liberdade translacionais (3) mas passam a ter, desde que não sejam lineares (como o caso do CO2, H2O,

SF6, etc.), 3 graus de liberdade rotacionais, com três momentos de inércia Ix, Iy e Iz.

Generalizando, para moléculas com N átomos, temos um número de graus de liberdade vibracionais:

3N - (3 trans. + 2 rot.) = 3N - 5 GL se for linear 3N - (3 trans. + 3 rot.) = 3N - 6 GL se não for linear

  

RESOLUÇÃO:

Para a água, H2O, não linear, N=3. Logo:

EXERCÍCIO 5

(26)

Translações - 3 GL --- 3/2 RT Rotações - 3 GL --- 3/2 RT Vibrações - 3N-6 = 3 GL x 2 --- 2 x 3 x 1/2RT = 3 RT f = 3 + 3 + 2x3 = 12 e portanto E =12x RT= RT 3 2 6

Para o benzeno, C6H6 , N =12. Logo:

Translações - 3 GL --- 3/2 RT Rotações - 3 GL --- 3/2 RT Vibrações - 3N-6 = 30 GL x 2 --- 2 x 30 x 1/2RT = 30 RT f = 3 + 3 + 2x30 = 66 e portanto E=66x RT= RT 1 2 33   

Podemos agora discutir a energia interna dum sistema de N moléculas, em termos moleculares. A energia interna dum sistema é assim constituída por:

i) pelas energias de translação, de rotação e vibração das moléculas11. Incluem as energias

cinéticas e potenciais de vibração.

ii) pela sua energia potencial, devido à sua posição no volume em que o gás está em relação a um campo exterior e às interacções entre os átomos ou moléculas com todas as outras,

ΦN . Para um gás diluído o valor de ΦN vem dado por:

Φ

N ij i j r = <

φ

( ) (1.28)

iii) energia associada à massa em repouso (termo de Einstein). pelo que: U Ei tr E E U i i rot i i vib i N campo =

( ) +

( ) +

( ) +Φ + (1.29)

Podemos agora escrever, se considerarmos Ucampo = 0,

U ≅N0 f kT+ N

2 Φ (1.30)

Todos estes termos energéticos foram calculados classicamente, utilizando o princípio da equipartição de energia. Na realidade, a mecânica quântica diz-nos que a contribuição de cada grau de liberdade rotacional para f pode ser menor que 1 para T < 40 K e a de cada grau de liberdade vibracional menor do que 2 para T < 3000 K. Verifica-se que a contribuição das vibrações para a energia interna à temperatura ambiente é muito pequena e só certos modos de vibração, com energias pequenas, tal que T ≈ hνi / k é que são activos e capazes de armazenar

energia. Para os gases a baixa densidade - diluídos - ΦN ≈ 0 ( = 0 para gases perfeitos).

11 Na realidade existem outras energias, como a energia electrónica. O valor da energia interna aqui apresentado

tem que ser corrigido pelas energias adicionais (electrónica, composição isotópica, spin nuclear, etc.), como se poderá estudar em cursos mais avançados de Termodinâmica Molecular.

(27)

As capacidades caloríficas dos gases perfeitos podem agora ser calculadas. C U T N V V =      = = ∂ ∂ 0 1 2 f k f 2 R (1.31) H U= +pV U= +nRT (1.32) C H T C nR C R P P V V =      = + +

para um dada quantidade de substância n

por mole

(1.33)

( )

CP=1 R R+ =R

2f 2 f + 2 (1.34)

Define-se o coeficiente adiabático dum gás,

γ

por:

γ

= = + = +      C C P V f f f 2 1 2 (1.35)

Para gases monoatómicos, f = 3, pelo que

γ

= 1+ 2/3 = 1,667. Para gases diatómicos f = 3 + 2 + 2 = 7, pelo que

γ

= 1+ 2/7 = 9/7 = 1,286. À temperatura ambiente os graus de liberdade vibracionais quase não contribuem, e portanto é mais correcto usar f = 3 + 2 = 5, pelo que

γ

= 1+ 2/5 = 7/5 = 1,400. Por exemplo para o N2 à temperatura ambiente

γ

= 1,41,

valor que concorda com a previsão teórica. A tabela seguinte mostra a comparação dos valores de

γ

para várias moléculas, calculados segundo o princípio da equipartição de energia e a partir de dados experimentais a 298 K.

Gás CP / J mol-1K-1 CV / J mol-1K-1 (CP-CV)/R

γ

exp

γ

calc

Ar 20,79 12,47 1,001 1,667 1,667 He 20,79 12,47 1,001 1,667 1,667 H2 28,87 20,54 1,001 1,406 1,286b O2 29,50 21,13 1,006 1,396 1,286b Cl2 34,52 25,69 1,062a 1,344 1,286b CO 29,16 20,79 1,007 1,403 1,286b CO2 37,49 28,95 1,027a 1,295 1,154c SO2 39,33 30,54 1,057a 1,288 1,154c CH3OCH3 66,48 57,53 1,077a 1,156 1,042c

a - gases não perfeitos a 298 K

b - valor calculado com graus de liberdade vibracionais “congelados” é 1,400.

c - valor calculado com graus de liberdade vibracionais “congelados” é 1,333. Na realidade alguns já contribuem um pouco.

(28)

A análise da tabela anterior mostra que o problema geral é mais complexo e só a mecânica quântica o pode explicar. O uso dos níveis de energia de cada grau de liberdade molecular (translacional, rotacional, vibracional, electrónico, etc.) obtidos com a mecânica quântica e a espectroscopia molecular, juntamente com a estatística de Boltzmann, permite o cálculo rigorosos do coeficiente adiabático.

1.3. As Propriedades de Transporte

Uma das grandes vitórias da teoria cinética da gases, ao tempo de Maxwell, foi a explicação por este da viscosidade dos gases. Passaremos agora à formulação da teoria elementar dos processos de transporte.

É uma observação corrente que, sempre que uma amostra dum material se encontra sujeita a uma diferença de temperaturas12 entre dois dos seus pontos, se origina um fluxo espontâneo de energia sobre a forma de calor, da região mais quente para a mais fria, evidenciando o fenómeno da condução de calor. Este fenómeno faz parte dum conjunto de fenómenos de transporte que ocorrem sempre que um sistema termodinâmico está fora do equilíbrio e evolui espontaneamente para um novo estado de equilíbrio. Os outros fenómenos de transporte são a viscosidade, que está associada com gradientes de velocidade macroscópica do fluido, e a difusão, associada a um gradiente de composição13. Associado a cada processo de transporte

está o fluxo duma variável macroscópica do sistema, energia para a condução térmica, momento linear para a viscosidade e massa para a difusão.

O fluxo de cada destas variáveis, J, relaciona-se duma forma linear com o gradiente da correspondente propriedade macroscópica, X, tal que:

J KdX

dx

= − (1.36)

A constante de proporcionalidade K designa-se por coeficiente de transporte e representa a condutibilidade térmica para o transporte de energia, a viscosidade para o transporte de momento e o coeficiente de difusão para o transporte de massa.

No caso particular dos gases diluídos a única forma de transporte de qualquer destas quantidades é pelo movimento das moléculas e pelas suas colisões. O transporte de energia, por exemplo, é determinado pelo número de colisões e pela natureza das mesmas. A primeira formulação teórica deve-se a Maxwell e a formulação rigorosa, como já se referiu, a Boltzmann, Enskog e Chapmann, conhecida hoje em dia como teoria de Chapman-Enskog. Qualquer das formulações parte de duas hipóteses básicas, o caos molecular e a existência de apenas colisões binárias, isto é, entre duas moléculas.

12 Na realidade a um gradiente de temperaturas, T. A uma dimensão o gradiente, ∇ =T dT

dx i sendo i o vector unitário segundo o eixo dos xx.

(29)

1.3.1 A Viscosidade

Para compreendermos porque é que surge a viscosidade nos gases, consideremos o gás entre dois pratos, como na figura 1.6 (a), tal que o prato superior se move com uma velocidade v na direcção positiva do eixo dos xx. O gás junto ao prato inferior não se move, pelo que pelo que se cria nele um gradiente de velocidade, originando que o gás exerça um atrito no prato superior, de tal forma que para se manter este em movimento é preciso aplicar uma força no prato superior. Foi Newton que estabeleceu a lei da viscosidade, que define o coeficiente de viscosidade η, em termos da força viscosa F exercida num prato de área A, e o gradiente de velocidade d v

dz através da equação:

F Ad v

dz

= −

η

(1.37)

A origem das forças viscosas pode apreender-se através duma analogia muito simples. Consideremos dois comboios que se movem em linhas paralelas, mas com velocidades diferentes, e que trocam entre si sacos de correio. O resultado desta troca é a aceleração do combóio que se move mais devagar pois os sacos que lhe chegam têm maior velocidade, enquanto que o combóio mais rápido, ao receber sacos com menor velocidade tem tendência a abrandar a marcha. O efeito global é a diminuição da diferença de velocidade entre os dois comboios, tal com se tivesse exercido uma força de fricção - atrito - entre eles. No caso do gás são as suas camadas adjacentes que correspondem aos comboios e as moléculas a mover-se entre camadas aos sacos de correio.

x y z v atrito x z lt lt v v- __dv dzlt v+dv dzlt __ A B C A (b) (a)

Figura 1.6 - Diagrama esquemático da transferência de momento entre planos consecutivos dum gás

Consideremos um plano de referência no gás, no plano xy, no qual o gás se move com uma velocidade v na direcção positiva dos xx, designado na figura 1.6 (b) por B. As forças viscosas podem deduzir-se considerando as moléculas que atingem o plano de referência B, seja do plano superior C, à distância l

t, seja do plano inferior A, também à distância lt. A

distância l

t é uma medida da distância percorrida por uma molécula desde a sua última

colisão e pode demonstrar-se ser igual a 2

(30)

uma velocidade  Λ      + 3 2 dz dv

v e um fluxo de momento linear na direcção negativa do eixo dos

zz, z-, de       Λ       + 3 2 dz dv v

m , sendo m a massa da molécula. Analogamente as moléculas que

chegam a B vindas de A transportam um momento

      Λ       − 3 2 dz dv v m na direcção z+. O

número de moléculas que cruzam o plano xy por unidade de área e unidade de tempo é, como já vimos na secção 1.6, dado pela equação:

1 1 4 A dN dt N V C p = .

Logo o momento linear transportado pelas moléculas que chegam a B de C por unidade de área e unidade de tempo é N

V . C 1 4      Λ       + 3 2 dz dv v

m e o momento linear transportado pelas

moléculas que chegam a B de A por unidade de área e unidade de tempo é

N V . C 1 4      Λ       − 3 2 dz dv v

m . Atendendo à lei de Newton F d p

dt

= a força de atrito que actua na direcção x+ por unidade de área é:

F A =− N V . C 1 4 + N V . C 1 4      Λ       − 3 2 dz dv v m F A N V mC dv dz = −     1 3 Λ (1.38)

Comparando com a lei de Newton da viscosidade dada pela equação (1.37), o coeficiente de viscosidade ou viscosidade do gás vem dado por:

η

= 

ρ

   = 1 3 1 3 N V mCΛ CΛ (1.39)

e usando o valor do livre percurso médio dado pela equação (1.21) obtemos:

η

π σ

π

πσ

π

= 1 = 2 1 3 8 3 2 8 2 2 n . nm kT m m kT m ou

η

πσ

π

= 2   3 2 1 2 mkT / (1.40)

Esta equação prevê:

1) que a viscosidade dum gás diluído de esferas rígidas é independente da densidade e da pressão - resultado que Maxwell obteve!

(31)

2) que a viscosidade dum gás diluído de esferas rígidas é proporcional a T1 2/ , facto que foi também crucial para à época de Maxwell comprovar a teoria cinética de gases. Na realidade para os gases reais

η

∝ Tn com > 0.5, como veremos seguidamente. A n equação (1.29) foi uma das primeiras equações que tornou possível estimar os diâmetros moleculares dos compostos, pois se medirmos a viscosidade dum gás perfeito a uma dada temperatura podemos obter

σ

.

  

RESOLUÇÃO:

Como a pressão é a atmosférica podemos admitir que o N2 tem um comportamento de gás diluído. Assim podemos utilizar a equação (1.29) em unidades molares:

nm 295 , 0 m 10 . 95 , 2 m 10 . 16 , 6 mol . 10 . 023 , 6 1 . K 298 . K J.mol 3143 , 8 kg.mol 10 . 28 Pa.s 10 . 19 . 3 2 1 3 2 3 2 10 2 20 2 1 23 2 / 1 1 1 1 3 6 2 2 / 1 0 2 2 / 1 2 = = ∴ =       =       =       = − − − − − − − −

σ

σ

π

π

σ

π

πσ

π

πσ

η

x MRT N mkT   

A teoria exacta de Chapman-Enskog dá para a viscosidade de esferas rígidas:

(

)

η

π

πσ

=0 499   = 5 16 1 1 2 2 , N / V mCΛ mkT ou

η

π

πσ

π

=5   16 1 2 1 2 mkT / (1.41)

A equação (1.41) difere da (1.40) no factor 5

16 0 982

2

3 0 667

π

= =

, em vez de , , ou seja a viscosidade de esferas rígidas é na realidade maior do que a prevista pela teoria cinética elementar.

EXERCÍCIO 6

Calcular o diâmetro molecular do N2, sabendo que a sua viscosidade a 298 K e a 0,1 MPa é 19 µPa s.

(32)

1.3.2. A Condutibilidade Térmica

Para a condutibilidade térmica o processo de derivação é semelhante. Um gradiente de temperatura causa o transporte de energia pelas moléculas, dando origem a um fluxo de energia sob a forma de calor, Q. Foi Jean Fourier que estabeleceu a lei da condução de calor. O fluxo de calor por unidade de área, Q/A que atravessa a área A é proporcional ao gradiente de temperatura: Q A dT dz = −

λ

(1.42)

sendo

λ

o coeficiente de condutibilidade térmica, ou simplesmente, condutibilidade térmica. Se for U a energia interna do gás, e raciocinando pela figura 1.6 (b), temos que as moléculas que chegam ao plano B vindas de C transportam uma energia por unidade de área e unidade de tempo, na direcção z- dada por U dU

dz + 4

3Λ, pois o espaço entre planos consecutivos para

a condutibilidade térmica é l t =

4

3Λ. As moléculas que chegam ao plano B vindas de A

transportam uma energia por unidade de área e unidade de tempo, na direcção z+ dada por

U dU

dz − 4

3Λ. Obtém-se para o fluxo total:

Q A N V C dU dz = −     2 3 Λ

Atendendo a que para um gás perfeito a energia interna só depende da temperatura:

dU dz dU dT dT dz C dT dz V = = obtemos: V

λ

=     2 3 N V C ΛC (1.43)

e, utilizando os valores das variáveis conhecidas:

λ

πσ

π

πσ

π

=     =   1/2 2 3 1 2 8 2 3 2 2 2 2 2 1 2 N V C N V kT m C kT m V V . /

λ

πσ

π

= 4   3 2 1 2 C kT m V / (1.44)

Esta equação prevê:

1) Tal como no caso da viscosidade, a condutibilidade térmica dum gás diluído é independente da densidade e da pressão.

(33)

2) A condutibilidade térmica dum gás diluído é proporcional, tal como a viscosidade, a T1/2, facto que tem um acordo razoável com a experiência. Se utilizarmos

simultaneamente os valores da viscosidade e da condutibilidade das esferas rígidas, obtemos:

λ

η

λ

η

= 2 C ou = = 2 m m C V V Eu (1.45)

sendo a razão adimensional Eu designada por factor de Eucken, igual a 2 para as esferas rígidas segundo a teoria elementar. A teoria cinética rigorosa para esferas rígidas dá para a condutibilidade térmica:

λ

πσ

π

= 25   32 2 1 2 C kT m V / (1.46) O factor multiplicativo é 25 32 =0 781, em vez de =0 414, 4

3

π

, pelo que a condutibilidade

térmica dum gás de esferas rígidas é maior do que o valor dado pela teoria cinética elementar. Tal como no caso da viscosidade a condutibilidade térmica dum gás real varia com a temperatura tal que

λ

∝ Tn com n > 0.5. O valor do factor de Eucken vem dado por:

Eu= 2 5, (1.47)

1.3.3. A Difusão

Consideremos agora o fenómeno da difusão molecular. Se dispusermos duma garrafa de gás, por exemplo de CO2 num ponto qualquer duma sala e abrirmos a válvula de segurança com cuidado, de forma a deixarmos sair o gás lentamente, a concentração do CO214 junto à garrafa

aumenta, tornando-se maior do que no resto da sala. Cria-se assim um gradiente de concentração do CO2 que vai originar um fluxo espontâneo de massa até que a concentração do CO2 seja a mesma em toda a sala15 . Esse fluxo molecular J/A, por unidade de área e

unidade de tempo através dum plano perpendicular à direcção do movimento dá origem a um transporte de massa, tal que:

J

A D

d m dz

= − ( n) (1.48)

Esta é a representação mais simples da lei de Fick, sendo D o coeficiente de difusão da espécie que se difunde no meio em causa. Se for n a densidade numérica do gás, e raciocinando novamente com o auxílio da figura 1.6 (b), temos que as moléculas que chegam a B de C transportam uma quantidade de massa por unidade de volume, por unidade de área e unidade de tempo, na direcção z- dada por m d m

dz

n+ 2 n

3

( ) Λ

. As moléculas que chegam a B de A transportam uma quantidade de massa por unidade de volume, por unidade de área e unidade

14 Na realidade para os gases é a sua pressão parcial pi. que é proporcional à sua concentração molar, isto é

pi = ci RT.

15 O gradiente que se cria é de potencial químico do gás, mas como µ

i - µi0 = RT ln(ci RT), é o mesmo que falarmos em gradiente de concentração.

(34)

de tempo, na direcção z+ dada por m d m dz

n− 2 n

3

( ) Λ . Obtemos assim para o fluxo total de massa, por unidade de massa e unidade de tempo, através do plano de referência e na direcção contrária ao gradiente: J A C d m dz = − 1 3 Λ ( n) (1.49)

Comparando as equações (1.48) e (1.49) obtemos:

D C kT m = 1 =   3 1 3 8 1 2 1 2 2 Λ

π

πσ

/ n (1.50)

Esta equação prevê:

1) O coeficiente de difusão para as moléculas dum gás depende da densidade numérica n , resultado diferente do obtido para a viscosidade e para a condutibilidade térmica.

2) D varia com T .

A equação (1.39) pode simplificar-se obtendo-se:

D kT m = 2   3 1 2 1 2 n

πσ

π

/ (1.51)

A teoria de Chapman-Enskog para esferas rígidas conduz-nos ao resultado:

D kT m = 3   8 1 2 1 2 n

πσ

π

/ (1.52)

ou seja, com o factor 3

8 = ,0 375 em vez de 2

3

π

= ,0 212. O coeficiente de difusão

16 pode ainda

exprimir-se em termos da pressão e temperatura:

D kT m kT p = 2   3 1 2 1 2

πσ

π

/ (1.53)

ou seja, é inversamente proporcional à pressão e directamente proporcional a T 3/2. A

dependência da pressão coincide com o que a experiência nos mostra, mas a dependência da temperatura tem um expoente n > 1,5.

1.3.4. Aplicação aos Gases Poliatómicos

A extensão da teoria cinética dos gases a moléculas poliatómicas levanta bastantes problemas, que ainda hoje em dia não estão resolvidos. O principal problema deriva do facto de que, durante uma colisão, pode haver transferência de energia intermolecular, translacional, como

Referências

Documentos relacionados

A Avaliação Cruzada é uma técnica que permite solucionar os dois problemas anteriormente mencionados, a saber, excesso de pesos zero arbitrados a algumas

Us -linguísticos à osição (gesto trações...). uno restitui o um texto usan tro imagens. O aluno id caracteriza personage oral, se se em indicaç em escuta for um tem curso de a O

VISTOS, RELATADOS E DISCUTIDOS OS PRESENTES AUTOS, ACORDAM OS INTEGRANTES DO GRUPO I DA 1ª CÂMARA CÍVEL DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SERGIPE, SOB A

Após verificar o alinhamento do pallet, acione o acelerador lentamente para frente até que esteja na posição adequada na prateleira.. Acione lentamente o acelerador para posição

a) A União Europeia constitui-se na atualidade como sendo o exemplo mais bem sucedido de integração econômica regional. Atualmente é composta por 27 países e

O objetivo deste estudo é avaliar a qualidade de vida de pacientes portadores de glaucoma, comparando pacientes do sistema público de saúde atendidos no Hos- pital Universitário

No sentido de verificar a estabilidade do efeito corona, foram preparadas 2 amostras de tecido engomado de algodão para cada tempo de tratamento corona (1 a 25 min.), sendo que

Entrega do empenho e abertura do prazo para que o beneficiário da ata entregue o bem/serviço – é feito contato com o beneficiário da ata (o fornecedor que