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III ENCONTRO LATINOAMERICANO CIÊNCIAS SOCIAIS E BARRAGENS 30 de novembro a 3 de dezembro de 2010, Belém, Pará, Brasil

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III ENCONTRO LATINOAMERICANO CIÊNCIAS SOCIAIS E BARRAGENS 30 de novembro a 3 de dezembro de 2010, Belém, Pará , Brasil

ST03 - Populações indígenas e remanescentes de quilombos

BARRAGEM DE SOBRADINHO: REFLEXOS NA VIDA DOS PESCADORES E PESCADORAS

Margarida Ladislau Barbosa (CPP/BA)

Antonio Tarcisio da Silva (CPP/BA)

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BARRAGEM DE SOBRADINHO: REFLEXOS NA VIDA DOS PESCADORES E PESCADORAS

Margarida Ladislau Barbosa (CPP/BA)

Antonio Tarcisio da Silva (CPP/BA)

Este artigo traz o depoimento de representantes da Comissão Pastoral dos Pescadores (CPP/BA) da regional de Juazeiro (BA) e relata as angústias e situações de desespero vividas pelos pescadores artesanais da Bacia do São Francisco, em especial do Médio e Sub-médio curso do rio. Mostra, também, a importância das organizações populares no enfrentamento destas questões.

Para se construir a Barragem de Sobradinho a região foi decretada área de segurança nacional o que não respeitou os direitos humanos, sociais e reforçava o poder local que estavam nas mãos de hierarquias coronelistas que dominavam todas as organizações de classe (Colônias de pescadores, Sindicatos de Trabalhadores rurais), dificultando a organização da categoria.

As comunidades ribeirinhas tinham suas atividades produtivas oriundas da pesca artesanal e agricultura de vazante e tinham uma relação equilibrada com o Rio São Francisco no seu leito original, as lagoas marginais e pequenos afluentes com uma diversidade de espécies de peixes e uma facilidade de captura do pescado, e os ciclos rotineiros de cheias e vazantes. O rio era navegável e favorecia a comunicação e o abastecimento das comunidades, das cidades ribeirinhas bem como as tradições culturais, das festas populares e religiosas, comidas típicas, as estórias, as lendas, entre outros.

Após a construção da barragem as terras de vazantes, centenas de comunidades e quatro cidades inteiras são inundadas provocando um desequilíbrio social, econômico e ambiental, deslocamento das populações alterando seu modo de vida, sem as suas devidas indenizações, concentração dos peixes na área da represa provocando ao mesmo tempo a mortandade. A chegada de milhares de pescadores de outras regiões aumentou o esforço da pesca, alterando sua modalidade, inclusive com práticas predatórias. O barramento das águas da forma que foi feito sem escada ecológica, impede a passagem dos peixes, conseqüentemente impedindo a piracema nesse trecho do rio, contribuindo

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com a diminuição e extinção de espécies nativas, a exemplo (surubim, pirá, matrixã, curvina...) e a introdução de espécies exóticas.

O Lago modificou a regularidade de enchentes e vazantes, o avanço do assoreamento do rio tem inviabilizado muitos trechos tradicionais de pesca, a poluição química provocada pela mineração e indústrias no Alto São Francisco e pelos agrotóxicos na área do Médio e Submédio; a atividade doméstica e hospitalar em toda a extensão do rio, a privatização, o mau uso e fechamento dos canais de aproximação das lagoas marginais, prejudica a reprodução de diversas espécies de peixes.

Com a construção da barragem houve a diminuição do território pesqueiros com avanços de cercas em terras públicas e a ausência de políticas públicas, entre elas, a assistência técnica, o crédito apropriado, a infra-estrutura de produção, armazenamento, beneficiamento, comercialização e segurança publica (é grande o número de roubo de material de pesca na região). Esta forma como vem se dando o processo, favorece a dependência do pescador e pescadora com o atravessador o qual determina tipo de peixes a ser pescado, contribuindo para a pesca predatória, o preço muito baixo que desvaloriza o trabalho do pescador/a e a importância do seu produto por que ele detém os meios de produção (apetrechos de pesca: barcos, gelo, transporte, e manutenção do pescador).

Outro grande problema diz respeito à saúde dos pescadores e das pescadoras, por não serem reconhecidas as doenças resultantes desse tipo de trabalho, isso impede o acesso a direitos e a tratamentos apropriados. São obrigados a exercerem os mesmos trabalhos sem as devidas condições de saúde, pois seus direitos previdenciários são negados.

Com a problemática criada a partir da construção da barragem, os pescadores e pescadoras artesanais continuam desassistidos e seus problemas e reivindicações não são pautados com a devida importância nos planos de desenvolvimento, na área do lago, os quais priorizam atividades da aqüicultura.

Além das organizações locais, colônias, associações, e grupos os pescadores e pescadoras estão articulados com outras organizações de trabalhadores/as e de Apoio, ONGs e ao mesmo tempo estão articulando-se no movimento Movimentos dos

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Pescadores do Estado da Bahia (MOPEBA), onde são definidas as estratégias políticas da luta na busca dos seus direitos específicos.

Outras ameaças estão vindo, conjuntamente com o que se chama de progresso. Uma delas é a mineração que inicia suas atividades na região ameaçando o território das comunidades tradicionais, quilombolas e fundos de pasto; outros novos projetos de irrigação estão sendo implantado o que significa mais terras concentradas e , conseqüentemente, mais agrotóxicos lançados na terra e no rio. Além de novas BARRAGENS que podem causar novos problemas; estão sendo construídas e projetadas, e com elas virão novos deslocamentos das pessoas, inundação de terra, desequilíbrio ambiental e novas alterações no modo de vida das populações ribeirinhas principalmente os pescadores e pescadoras.

Atualmente o foco principal dos pescadores e pescadoras é a defesa do território pesqueiro através da preservação e conservação do rio e das espécies.

Desde o início da construção das barragens no rio São Francisco no meado do século 20, processo que durou até a década de 1990 com a construção de: Três Marias, Sobradinho, Itaparica, Complexo de Paulo Afonso I, II, III e IV, Moxotó, Xingó, associada ao aumento da demanda energética. Em 1977 com o fechamento da barragem de Sobradinho, presenciamos toda uma população sendo deslocada de suas comunidades deixando para traz sua historia, cultura, suas terras, enfim deixando parte de suas vidas, muitos saíram pra muito longe desarticulando as famílias. O modo de vida mudou completamente. Acostumados a morar na beira do rio, plantar de vazante e pescar, a partir de então chega num terreno de sequeiro, sofrem as pessoas e os animais. As populações simplesmente são expulsas. Muitos resistiram até a água chegar sendo preciso que as outras pessoas carregassem nos braços, outros não tiveram assistência e tempo nem mesmo para tirar os seus pertences, e a luta pelas indenizações dura até hoje.

Antes de 1977 as cheias eram freqüentes e garantiam o enchimento anual das lagoas marginais, locais de desova de peixes. Perdeu-se a tradição da agricultura de vazante e a pesca no rio, nos anos 1980 no auge do fechamento das comportas aumentou a produção de pescado, e o número de pescadores vindo de outras regiões, trazendo novas modalidades de pesca, mas houve também grande mortandade dos peixes nativos, levando lentamente ao declínio na produção, e então foram introduzindo espécies

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exóticas. As barragens impedem a piracema de diversas espécies de peixes, não são feitas as escadas ecológicas, com isso muitas espécies de peixes desapareceram. Outro grande problema tem sido a irregularidade da vazão da represa provocado pela demanda energética da CHESF (Companhia Hidrelétrica do São Francisco). Hoje a ONS é quem controla, provocando uma acentuada erosão nas margens do rio, com quedas de barrancas, o assoreamento é ininterrupto, não sendo considerado a natureza nem as populações, infelizmente com o descontrole da vazão, ribeirinhos(as), pescadores e pescadoras não conseguem se firmar.

Com as várias demandas provocadas pelos múltiplos usos das águas, a vazão do Rio São Francisco vem diminuindo e perdendo sua força até para desaguar no mar, e o mar vem empurrando o rio.

Pescadores e ribeirinhos vêm resistindo e reagindo a esta situação, intensificando a organização, articulação, mobilização e avançando na discussão sobre a preservação do rio São Francisco, discutindo o acordo de pesca, ordenamento do Lago de Sobradinho, além da luta pela revitalização. Os pescadores são na verdade os mais impactados, com a poluição decorrente dos lançamentos dos esgotos urbanos, industriais e os metais pesados lançados no rio desde o alto São Francisco até a sua foz, o assoreamento do rio causado principalmente pela erosão das áreas ocupadas pela agricultura, ocupação das áreas de vazantes, com o cercamento das terras e fechamento do acesso das lagoas marginais, principalmente no médio São Francisco, com a irrigação em grande escala que consome um grande volume de água e grande quantidade de agrotóxicos, além do projeto de transposição do rio.

Os pescadores e pescadoras, do baixo São Francisco, são os mais prejudicados com a construção dos complexos das barragens. A água já chega quase sem nutrientes, já não tem as várzeas para fazer as plantações inundadas como o arroz etc.

Destacando a barragem de Sobradinho (BA), onde as comunidades atingidas pela usina hidrelétrica, desde o final da década de 1970, lutam pela efetivação de seus direitos junto à CHESF. As pessoas que foram retiradas do seu ambiente sem nenhuma garantia de moradia construída, ficando embaixo de lonas, árvores ou amontoadas nas casas de algum parente, outros foram para as cidades vizinhas,ainda outras foram para os grandes centros como Brasília e São Paulo. O plano do governo era levar o povo para as

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Agrovilas, em Serra do Ramalho a uma distância aproximada de 1000 Km, muitos foram e parte deles permanecem até hoje por lá, no entanto um grande número retornou por não se adaptarem por lá e também por terem deixado seus familiares espalhados. Muitas pessoas até o momento não reencontrou a direção de sua história. Trazemos todos estes fatos, porque na beira do rio existiam vários povos, ribeirinhos/vazanteiros, pescadores/as quilombolas e indígenas. Todos esses povos não foram informados e acompanhados devidamente, foram simplesmente ignorados pelo poder das elites, dos políticos. Até hoje as dívidas sociais com os atingidos são inúmeras, e ao invés de fazerem essa transferência dos direitos a exemplo da energia e água, que seria o mínimo, já que as pessoas foram retiradas do seu habitat para dar lugar a represa, que gera e distribui energia para boa parte do país, ao contrário disso, novas famílias são ameaçadas pela construção de novas barragens como é o caso de Riacho Seco e Pedra Branca no Submédio São Francisco.

Na primeira cheia em 1979 quatro cidades e centenas de povoados foram inundados na bacia do São Francisco e realocados, atingindo 72 mil pessoas. O povo vendo a água chegar e inundar a terra, vendo as árvores sendo consumidas, os animais, -desde répteis aos passarinhos – se afogando nos seus ninhos, e o rebanho que se conseguiu salvar durava pouco tempo por estarem com os cascos apodrecidos e o povo surpreso por que, na verdade, não acreditavam no que viam e choravam de saudade dos familiares e pela incerteza da continuidade, tudo era estranho tendo que recomeçar.

Mudou praticamente tudo, o modo de plantar e de pescar (drásticas mudanças de hábito) para agricultura e para a pesca, desde o barco até o apetrecho de pescar, e pouco tempo depois pescadores e pescadoras aumentavam a metragem dos apetrechos (linhas, redes.. Até o barco precisou ser modificado. Tanto a montante, quanto a jusante os desabrigados desprovidos recorriam às ações de solidariedade, tantos os que haviam permanecido quanto os que retornavam das agrovilas de Serra do Ramalho.

É nesse cenário que nasce as pastorais sociais na Diocese de Juazeiro, entre elas o Conselho dos Pescadores. Foram muitas lutas com o povo: pelas indenizações, pela organização, pela terra na beira do rio, por um acordo de pesca que não se concretizou, se luta, também, pela própria identidade. Muitos dos nossos povos enlouqueceram quando lembravam dos poucos bens que tinham e que agora não têm mais. Esse era o tempo em que o regime era o Militar, de autoritarismo.

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O povo aos poucos foi se envolvendo nas lutas populares procurando denunciar a situação em que vivem as famílias atingidas pelo lago, e buscando novas formas de conduzir a vida, e de melhor se relacionar com a natureza, com sua cultura, novamente. Mas os problemas continuam. Os Pescadores Artesanais são os que mais sofrem as conseqüências desse conjunto de degradações do rio São Francisco. Os ciclos de cheias e vazantes, processo fundamental para a reprodução das espécies, se tornaram irreversíveis. A cada dia aumenta o assoreamento do rio, a poluição doméstica, industrial, a mineração e a agricultura e a introdução de espécies exóticas, isso tudo impacta negativamente na quantidade e na qualidade do pescado e contribui para extinção das espécies.

Por essas e ouras razões a pesca artesanal vem sendo considerada, como uma atividade em fase de extinção no rio São Francisco.O Estado ao invés de investir na revitalização do rio, para que regularize a produção, propõe aqüicultura (piscicultura que na verdade é a tilapicultura). É essa a solução? Os pescadores e pescadoras vêm resistindo a esse processo propondo alternativas a exemplo do acordo de pesca citado anteriormente e a possibilidade de um ordenamento das atividades no lago de sobradinho, como forma de assegurar a preservação e conservação ambiental, e melhor gerir os conflitos de uso.

O “velho Chico” como é carinhosamente chamado pelos ribeirinhos, continua sofrendo intervenções drásticas como a transposição de suas águas através de vários canais para projetos da grande irrigação e ligação de bacias do São Francisco para o Nordeste Setentrional, onde não se recebe nada, mas doa uma grande parte das suas águas para usos obscuros e para atender demandas do capital. Hoje se fala até em usinas nucleares no São Francisco, seria o golpe de misericórdia no Velho Chico?

O governo federal tem anunciado o projeto de revitalização para a bacia do São Francisco, porém não sai do papel, não percebemos vontade do próprio governo para a implementação de certas medidas que caminhem nessa direção a exemplo da recomposição de matas ciliares, tratamento de resíduos sólidos, tratamento de esgotos e combate ao desmatamento nas margens do São Francisco e de seus afluentes.

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