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Grupos de Trabalho como espaços formativos para professores que ensinam Matemática

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Grupos de Trabalho como espaços formativos para professores que

ensinam Matemática

Larissa Ávila Santana1

GD7 – Formação de Professores que Ensinam Matemática

Resumo do trabalho. A pesquisa proposta neste artigo está sendo desenvolvida no Mestrado do PPGEduMat - UFMS e tem como objetivo investigar espaços formativos, constituídos por professores de matemática que atuam na Educação Básica, nos quais serão problematizadas atividades que envolvam categorias do cotidiano. Os espaços formativos nos quais desenvolveremos nossa pesquisa se constituirão como Grupo de Trabalho. Esta pesquisa tem abordagem qualitativa e, para isto, realizaremos encontros com professores de matemática e produziremos nossos dados por meio de gravações em áudio e vídeo desses encontros. Para as análises desses dados, nos apoiaremos, principalmente, no Modelo dos Campos Semânticos, proposto por Romulo Lins. Esperamos, com esta pesquisa, apresentar algumas características da noção de Grupo de Trabalho como espaço formativo e, além disso, contribuir para que outras categorias façam parte da formação inicial do professor que ensina matemática, colocando-o em situações mais próximas das demandas da prática profissional de professores.

Palavras-chave: Categorias do Cotidiano; Modelo dos Campos Semânticos; Estudos Culturais.

Introdução

Em 2011 desenvolvi um projeto de pesquisa como voluntária no Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica (PIBIC) na Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), intitulado Propostas de Formação Matemática em Currículos Prescritos de Cursos de Licenciatura em Matemática na Modalidade à Distância, sob orientação do professor Dr. João Ricardo Viola dos Santos. Envolvida com esta pesquisa, me tornei integrante do Grupo de Pesquisa em Formação, Avaliação e Educação Matemática (FAEM)2 vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Educação Matemática da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (PPGEduMat/UFMS).

Nesse grupo são realizados trabalhos de pesquisa com professores da Educação Básica, mestrandos e licenciandos. Duas dissertações já foram defendidas, cada uma delas na seguinte temática: a) Uma discussão de discussões de professores que ensinam matemática em um grupo de trabalho; b) Conhecimentos específicos da docência de professores que ensinam matemática em um grupo de trabalho que analisa produções escritas em matemática. Outros três trabalhos estão sendo realizados nas seguintes temáticas: c) uma investigação a respeito de aspectos da prática profissional de uma professora de

1 Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, e-mail: larissabavila@gmail.com, orientador: Dr. João

Ricardo Viola dos Santos.

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Matemática, que elabora e implementa atividades que envolvam análise de produções escritas em Matemática; d) outra investigação que problematiza teorizações a respeito dos conhecimentos de professores que ensinam matemática e que investigam o desenvolvimento profissional em grupos de trabalho; e por fim, e) investigando a participação de professores de Matemática em grupos de trabalhos por meio de entrevistas. Atualmente, uma das linhas de pesquisa do FAEM se insere em um projeto amplo intitulado O uso de categorias do cotidiano para o desenvolvimento profissional de professores que ensinam matemática3, vinculado ao Grupo de Pesquisa e Desenvolvimento em Educação Matemática (UNESP – RC), Sigma-t4, e tem por objetivos elaborar atividades que estejam fundamentadas em categorias do cotidiano, problematizar como processos de contextualização têm sido trabalhados nas práticas profissionais de professores que ensinam matemática, avaliar mudanças nas falas de professores participantes dos grupos de trabalho, investigar as posturas de professores frente a atividades relacionadas a categorias do cotidiano e investigar as potencialidades de atividades relacionadas às categorias do cotidiano no trabalho em sala de aula.

No interior do FAEM existem grupos de trabalho que se caracterizam como espaços formativos nos quais professores que ensinam matemática se encontram e compartilham entraves, potencialidades e realizações de suas práticas profissionais uns com os outros. Não são cursos nos quais professores universitários e/ou alunos de pós-graduação vão ensinar os professores da Educação Básica e/ou alunos da licenciatura. Os grupos de trabalho se constituem na medida em seus participantes compartilham suas vivências e oferecem possibilidades de diferentes aprendizagens mútuas. As atividades que são desenvolvidas nos grupos têm o papel de disparadoras das discussões, sendo que os caminhos percorridos são constituídos ao longo do desenvolvimento dos grupos de trabalho (VIOLA DOS SANTOS, 2014).

Como evidenciado acima, o Grupo de Pesquisa investiga potencialidades de se implementar um espaço formativo no qual os processos de produção de significados – e não os conteúdos matemáticos – sejam centrais ao seu desenvolvimento, pensando a formação matemática do professor que ensina Matemática em termos de processos de

3 EDITAL UNIVERSAL - MCTI/CNPq N º 14/2014, em que cinco Universidades fazem parte: UFMS -

Campo Grande (MS), UFSJ - São João del-Rei (MG), UNIFESP - Diadema (SP), UFMT - Sinop (MT) e Unipampa - Bagé (RS).

4 Grupo de Pesquisa e Desenvolvimento em Educação Matemática liderado pelo professor Romulo Campos

Lins (Unesp/Rio Claro), registrado no Diretório de Grupos de Pesquisa do CNPq. Para mais detalhes do grupo acessar o sítio: www.sigma-t.org

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produção de significados (LINARDI, 2006). Não só apenas em relação a formação matemática, mas também em relação a formação em geral.

No ano de 2015 ingressei no programa de Pós-Graduação em Educação Matemática da UFMS, novamente sob orientação do professor Dr. João Ricardo Viola dos Santos, na área de formação de professores. Nossa pesquisa está vinculada ao projeto anteriormente descrito e os espaços formativos nos quais desenvolveremos nossa pesquisa se constituirão como um grupo de trabalho. Nestes espaços, poderemos ter professores que ensinam matemática na Educação Básica na cidade de Campo Grande - MS, alunos da Licenciatura em Matemática, alunos de Pós-Graduação em Educação Matemática e Professores Universitários que atuam em Licenciaturas em Matemática, participando dos encontros. Nos propomos a repensar outros modos de organizar práticas educativas que ofereçam tanto a futuros professores quanto a professores em exercício, oportunidades que possam ir além do conhecimento do conteúdo matemático. Ou seja, temos a intenção de criar situações a partir das quais possam ser ampliados os significados produzidos para ideias matemáticas, tendo em vista demandas da prática profissional do professor que ensina Matemática.

Um primeiro passo para o desenvolvimento do projeto de pesquisa foi dado pela tese de doutorado de Oliveira (2011) que investigou como acontece um processo de formação profissional fundamentado numa categoria da vida cotidiana, a tomada de decisão, com a realização de um curso de extensão, “Espaço, Aritmética, Álgebra e Tomada de Decisão: um curso de desenvolvimento profissional para professores de Matemática”, em 2010, ministrado nas dependências do Departamento de Matemática da Unesp - Campus Rio Claro, SP. Parte desse curso fundamentou-se no que alguns estudos caracterizam como categorias do cotidiano (LINS, 2005; OLIVEIRA, 2011, 2012). Tais categorias constituem-se como potenciais elementos organizadores da formação de professores de Matemática por serem familiares tanto para os futuros professores quanto para aqueles alunos desses professores. O uso de categorias do cotidiano é interessante, pois

“[...] toma como diretriz a necessidade de realizar a formação e o desenvolvimento do professor a partir de categorias que ele pode compartilhar com seus alunos e alunas, de modo que ao invés de se formar dentro de certas categorias, para depois ter que investir no que alguns autores chamam de "recontextualização" — o que, inclusive, exige uma competência profissional específica e complexa —, sua formação já se dê a partir do contexto das categorias "da vida cotidiana", de modo que a "recontextualização" aconteça do natural (o cotidiano) para o não-natural (o matemático). Assim, a passagem aos modos de produção de significados da Matemática do matemático se dá como ampliação de entendimento, e não como "verdadeira essência do que se diz na rua", nem substituição do "intuitivo" pelo "matemático"”. (LINS, 2006, p. 7)

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Oliveira (2011) realizou em seu doutorado uma análise de um dos módulos desse curso de extensão, buscando entender como aconteceu um processo de formação profissional fundamentado em uma categoria do cotidiano: a Tomada de Decisão. O diferencial desse módulo foi exatamente a utilização dessa categoria para direcionar a formulação e o desenvolvimento do curso. Como era esperado, ao longo do módulo surgiram ideias matemáticas para serem discutidas e problematizadas, mas o conteúdo matemático não era o único protagonista. Na análise das atividades que foram realizadas no curso, foi possível observar que o foco dado a uma categoria do cotidiano não desconsiderou a importância de se explorar conteúdos matemáticos, mesmo que as atividades abordadas não tivessem conteúdos matemáticos explícitos a serem tratados. A necessidade de se tomar uma decisão a respeito das situações que eram abordadas nas atividades fazia com que cada um dos professores, juntamente com o professor ministrante do curso, encaminhassem a discussão e, dessa maneira, escolhessem quais ideias deveriam ser mais adequadas para entender melhor a situação que estava em questão.

Outra observação feita sobre o uso da categoria Tomada de Decisão foi poder criar a possibilidade de se estabelecer relações entre ideias matemáticas e a possibilidade de tomar decisões. Uma das professoras que frequentou o curso, por exemplo, avaliou que, a partir das atividades desenvolvidas naquele módulo, passou a questionar as atividades que preparava para seus alunos e passou a pensar em questões como: “o que esse conhecimento matemático pode modificar a visão do meu aluno e a sua relação com o mundo?” (OLIVEIRA, 2011). Considerando a preocupação dessa professora, principalmente no contexto do nosso projeto, perguntamos: que diferença pode trazer à vida de nossos alunos quando eles estudam matemática?, que diferença pode trazer à vida de nossos alunos quando eles estudam situações que envolvam categorias do cotidiano?, como podemos educar pela Matemática?, como podemos ampliar as discussões nas salas de aula de matemática?. Para nós, essas são questões que deveriam ser abordadas em nossas reflexões enquanto professores que ensinam Matemática.

Outra discussão que atravessa nosso projeto é a contextualização na matemática. Lins e Gimenez (1997), por exemplo, apresentam uma crítica à atividade de se construir papagaios (pipas) com a intenção de falar de simetria, triângulo, cálculo de hipotenusas e de áreas, como muitas vezes é feita pelos professores do ensino fundamental

“(...) não basta trazer para a escola a tarefa para produzir com base nela apenas significados da escola. Qual o sentido de dizer “Vamos fazer papagaios!” com a

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intenção única de falar de simetria, triângulos, cálculo de hipotenusas e de áreas, e – pior ainda – para terminar fazendo o mesmo papagaio de sempre? Alguns dos significados básicos que os papagaios têm na rua estão ligados à beleza e ao equilíbrio: Por que não colocar o desafio de fazer um papagaio diferente mas que seja tão bom quanto o comum? Numa situação dessas, é preciso discutir e explicitar; i) o que é que faz o papagaio comum funcionar; e, ii) qual o “papagaio dos sonhos”, o que envolve discussões sobre beleza, forma e tamanho. Num processo como esse, afirmações sobre a “geometria” do papagaio seriam feitas e possivelmente gerariam outras, abrindo-se a possibilidade da intervenção legítima do professor para trazer novas possibilidades. A noção de equilíbrio, por exemplo, (...) pode ganhar novos significados, possivelmente matemáticos, na medida em que novas formas são propostas”. (p. 27)

Acreditamos, como afirma Lins (2004), que é preciso ir além da relação entre a matemática da Escola com o cotidiano. No caso do papagaio (da pipa), não basta usar o que se faz no cotidiano como pretexto para a matemática escolar. Buscando ir além, acreditamos que, assim como foi no módulo Tomada de Decisão, pela utilização de categorias do cotidiano, seja possível implementarmos práticas educativas que ultrapassem as práticas de contextualização.

Nossa compreensão é que, pela implementação de espaços formativos nos quais sejam problematizadas atividades que envolvam categorias do cotidiano, na medida em que o compartilhamento dos significados produzidos pelos professores aconteça, envolvendo tanto categorias da vida cotidiana quanto categorias da matemática do matemático5, isso

permitirá aos professores e formadores ampliarem o entendimento que têm sobre as situações tratadas, percebendo-as também de forma diferente (VIOLA DOS SANTOS, 2014). Desse modo, pretendemos discutir o que acontece ou o que muda quando trabalhamos com categorias do cotidiano6, problematizando os processos de produção de significados em atividades escolares. Não queremos mensurar se as categorias da matemática do matemático são maiores/menores ou melhores/piores que as categorias do cotidiano. Queremos sim, discutir e problematizar como a matemática nos ajuda a perceber o mundo de outras maneiras.

5 A matemática do matemático e a matemática da rua, da vida cotidiana, são distintas e têm, cada uma, sua

organização e seus modos legítimos de produzir significados (LINS & GIMENEZ, 1997). Quando falamos dessas duas matemáticas não queremos estabelecer uma dicotomia entre elas, mas sim apresentar duas possibilidades de se pensar na Matemática e, além disso, reconhecer como legítimos outros modos de produção de significado que não seja apenas os da matemática do matemático. Segundo Oliveira (2011), a categoria da matemática do matemático é caracterizada por modos de produção de significados considerados como legítimos por aqueles que dizem fazer e são culturalmente reconhecidos como quem fazem Matemática (p. 192).

6 Neste Projeto de Pesquisa não vamos definir ou caracterizar Categorias do Cotidiano. Pretendemos

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Nesse contexto se insere nossa pesquisa que tem como objetivo geral investigar espaços formativos, constituídos por professores de matemática que atuam na Educação Básica, nos quais serão problematizadas atividades que envolvam categorias do cotidiano.

Estratégia Metodológica

Nesse trabalho realizaremos uma pesquisa qualitativa na qual há: uma íntima relação do pesquisador com o pesquisado (resultando em uma não neutralidade); um maior interesse no processo, analisando as informações de maneira intuitiva; a descrição dos dados tendo como foco o particular, buscando um maior nível de profundidade de compreensão; a não intenção de comprovação ou refutação de algum fato; a impossibilidade de estabelecer regulamentações (BOGDAN e BIKLEN, 1994; GARNICA, 2004).

No segundo semestre de 2015, voltaremos nossos esforços para o estudo e a preparação de atividades relacionadas a categorias do cotidiano. No primeiro semestre de 2016 realizaremos o grupo de trabalho e produziremos nossos dados por meio de gravações em áudio e vídeo dos encontros desse grupo de trabalho.

Pretendemos que esses encontros criem situações para que os professores de matemática possam discutir, aprender e problematizar atividades que envolvam categorias do cotidiano. Além disso, temos o objetivo que em todos os encontros possamos provocar nos professores movimentos de estranhamento e descentramento7, os quais serão exercícios e experiências que poderão oferecer oportunidades aos professores de repensarem sua prática profissional.

Duas discussões teórico-metodológicas atravessam nosso processo de pesquisa: o Modelo dos Campos Semânticos e algumas discussões da área de Estudos Culturais. A seguir, apresentamos um primeiro delineamento a respeito desses atravessamentos.

Uma primeira discussão sobre o Modelo dos Campos Semânticos

Tomaremos o Modelo dos Campos Semânticos (MCS) (LINS, 1999, 2001, 2006, 2008, 2012) como uma fundamentação teórico-metodológica para produzir e analisar nossos

7 Entendemos que o movimento de estranhamento pode acontecer em uma situação em que existe de um

lado, “aquele para quem uma coisa é natural – ainda que estranha – e de outro aquele para quem aquilo não pode ser dito” (LINS, 2004, p. 116). Já o movimento de descentramento pode acontecer quando existe a intenção de tornar-se sensível ao estranhamento do outro e de tentar entender o que o outro está falando: “Não sei como você é; preciso saber. Não sei também onde você está (sei apenas que está em algum lugar); preciso saber onde você está para que eu possa ir até lá falar com você e para que possamos nos entender (...)” (LINS, 1999, p. 85).

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dados. O MCS oferece uma maneira de pesquisadores fazerem leituras, interações e intervenções nos modos de produção de significados de professores.

Nosso objetivo aqui não é tentar explicar todas as noções que o MCS articula. Neste momento, traremos apenas algumas noções que atravessarão as análises desta pesquisa. O MCS “se dirige à manutenção da interação (ou de espaços comunicativos), declaradamente” (LINS, 2008, p. 545, grifos do autor). Um espaço comunicativo acontece quando modos de produção de significados são compartilhados. Para compreendermos a noção de espaço comunicativo, precisamos falar sobre as noções de objeto e de significado. Objeto “é algo a respeito de que se pode dizer algo” (LINS, 2004, p. 114). Esse objeto não é ou está constituído de antemão, não existe objeto anterior à fala, ele é constituído na produção de significados, durante a fala do sujeito. Entendemos que significados são produzidos na fala: “[...] significado é o conjunto de coisas que se diz a respeito de um objeto. Não o conjunto do que se poderia dizer, e, sim, o que efetivamente se diz no interior de uma atividade. Produzir significado é, então, falar a respeito de um objeto (LINS e GIMENEZ, 1997, p. 145-146)”.

Segundo o MCS, entendemos conhecimento como sendo

“(...) uma crença que afirmamos [...], e que assim o fazemos porque nós, que o

enunciamos, acreditamos termos uma justificação para fazê-lo (e não precisamos

esperar por uma autorização exterior para isto)”. (LINS, 2008, p. 541).

Para nós, conhecimento não é apenas uma crença-afirmação, mas uma crença-afirmação junto com uma justificação. Ou seja, a justificação é um elemento essencial do conhecimento e, além disso, entendemos que o conhecimento é do domínio da enunciação e não do enunciado. Por exemplo, livros de matemática não possuem conhecimento, eles são “apenas” resíduos de enunciação das pessoas que os produziram. Esses resíduos de enunciação são “coisas” que acreditamos que alguém disse ou expressou (gestos, expressões faciais, sinais, entre outros).

Outra noção central do MCS que utilizaremos na análise de nossos dados é a de leitura plausível. Nas palavras de Lins,

“A leitura plausível se aplica de modo geral aos processos de produção de conhecimento e significado; ela indica um processo no qual o todo do que eu acredito que foi dito faz sentido. Outra maneira de dizer que faz sentido em seu todo é dizer que o todo é coerente (nos termos de quem eu constituo como um autor do que estou lendo)” (LINS, 2012, p.23).

Realizar uma leitura plausível pode ser identificada quando voltamos os olhares para aquilo que foi dito pelo sujeito e nunca para o que ele não disse. Ou seja, a leitura plausível

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se caracteriza como uma atitude que procura a leitura do outro pelo que ele tem, e não olhar o outro pelo erro ou pela falta. Assim, a leitura plausível é uma leitura positiva. Tentaremos realizar uma leitura plausível de processos de produção de significados produzidos pelos participantes do nosso grupo de trabalho, quando eles estiverem em movimentos na/pela discussão de atividades que envolvam categorias do cotidiano.

Uma primeira discussão sobre os Estudos Culturais

Um segundo atravessamento de nossa pesquisa são algumas discussões a respeito dos Estudos Culturais.

Pretendemos neste trabalho trazer algumas reflexões para nosso trabalho. Iniciamos com alguns aspectos históricos dessa seara de investigações.

Os Estudos Culturais começaram a se constituir nos anos de 1950 e na década de 1960, na Inglaterra, a virada cultural8 começou a ter maior influência sobre a intelectualidade e

sobre a academia, sendo formado como um novo campo de estudos, organizado em torno da cultura como conceito central, começando com a fundação do Centro de Estudos Culturais Contemporâneos na Universidade de Birminghan, em 1964 (HALL, 2010, p.12). Mesmo sendo uma invenção britânica, os Estudos Culturais chegaram a outros países e continentes, incluindo Estados Unidos, Austrália, África e alguns países da América Latina.

Embora seja difícil responder o que são Estudos Culturais, isso não significa que podem ser quaisquer coisas em quaisquer contextos. Quando olhamos para a história do surgimento dos Estudos Culturais, podemos apontar algumas características que podem identificar alguns de seus objetivos.

Nos últimos sessenta anos o mundo vem sendo marcado por profundas e importantes transformações culturais, que refletem diretamente nas formas de vida das sociedades, com intensas repercussões no trabalho docente.

Segundo Costa (2010),

“[...] o campo da Formação de Professores está desafiado por um considerável conjunto de estudos atuais, que ajudam a desenhar os novos contornos da vida nas sociedades de hoje e oferecem contribuições substantivas e consistentes para se pensar a educação sob novos ângulos e perspectivas, para além dos

limites exclusivamente escolares. Conforme tenho argumentado, antes de

ingressar na escola, as pedagogias do presente, forjadas na condição

8 A “virada cultural” iniciou com uma revolução de atitudes em relação à linguagem. Segundo HALL (2010),

a “virada cultural” está intimamente ligada a esta nova atitude em relação à linguagem, pois a cultura não é nada mais do que a soma de diferentes sistemas de classificação e diferentes formações discursivas aos quais a língua recorre a fim de dar significado às coisas (p. 10).

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moderna, já se encarregaram do alfabetismo requerido para que as crianças dominem a gramática cultural do nosso tempo. Elas chegam à escola fascinadas por imagens, espetáculo e consumo, já familiarizadas com o ritmo vertiginoso dos acontecimentos e com a curta duração, volatilidade e descartabilidade dos objetos, das experiências, dos desejos, dos sentimentos. Pautam suas vidas pela urgência, rapidez e imediatismo (comidas instantâneas, conexão com o mundo num clicar de teclado, novas roupas, afetos e estilos a qualquer momento), e reinventam seus eus inspiradas em repertórios identitários infinitamente renovados. São essas crianças nascidas no século XXI que frequentam nossas salas de aula. Sabemos quem elas são? Como se tornaram o que são? O que elas

precisam aprender que ainda não sabem? Como se educa quando é difícil

vislumbrar uma direção desejável?”. (p. 146, grifo nosso)

Vemos que não podemos mais considerar que apenas as escolas podem mudar a sociedade, é preciso ampliar nossos modos de viver e nossas formas de pensar o ensino da matemática.

“Uma contribuição dos Estudos Culturais em Educação tem sido a possibilidade de se abordar de forma mais ampla, complexa e plurifacetada a educação,

os processos pedagógicos, os sujeitos implicados, as fronteiras construídas pelas ordens discursivas dominantes. Pode-se dizer que há uma ressignificação

do campo pedagógico em que questões culturais como identidade, diferença, discurso e representação são convertidos em foco preferencial”. (COSTA, 2010, p. 135, grifo nosso)

Nesse contexto, a partir dessas características dos Estudos Culturais, é possível compreender que “outras instâncias culturais também são pedagógicas, também têm uma ‘pedagogia’, também ensinam alguma coisa” (SILVA, 2009, p. 139), ou seja, os processos pedagógicos não estão limitados apenas ao espaço escolar. É nesse sentido que queremos travar um diálogo com os Estudos Culturais e as categorias do cotidiano, produzindo espaços onde os professores possam ampliar seus repertórios e seus olhares.

Concordamos com Dal-Farra (2010), quando menciona o conselho de Frans Johansson: é possível conectar e combinar conceitos oriundos de campos diferentes do conhecimento, encontrando novas oportunidades, superando novos desafios e conseguindo novos insights para a construção de processos educacionais mais condizentes com aquilo que acreditamos (p. 540).

Com este trabalho esperamos contribuir com as pesquisas desenvolvidas no Grupo FAEM, contribuir para ampliar as discussões sobre o ensino da matemática nas salas de aula e ampliar o repertório e o olhar dos professores que ensinam matemática. Esperamos também que as discussões teórico-metodológicas da pesquisa contribuam para que outras categorias façam parte da formação inicial do professor que ensina matemática, colocando-o em situações mais próximas das demandas da prática prcolocando-ofissicolocando-onal de prcolocando-ofesscolocando-ores.

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REFERÊNCIAS

BOGDAN, R. C.; BIKLEN, S. K. Investigação Qualitativa em educação. Porto: Porto, 1994.

COSTA, M. V. Sobre as contribuições das análises culturais para a formação dos professores do início do século XXI. Educar em Revista, Curitiba: UFPR, maio/ago. 2010. p. 129-152.

DAL-FARRA, R. A. Matemática e educação matemática: aproximações

epistemológicas, cultura e discursos contemporâneos. Revista Zetetiké – FE – Unicamp – v.18, Número Temático 2010.

GARNICA, A. M. História Oral e Educação Matemática. In: Pesquisa Qualitativa em Educação Matemática. BORBA, M. C.; ARAUJO, J. L. (orgs.) Belo Horizonte: Autêntica, 2004.

HALL, Stuart. A centralidade da cultura: notas sobre as revoluções culturais do nosso tempo. Porto Alegre, 2010. Disponível em:

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Geociências e Ciências Exatas, Universidade Estadual Paulista, Rio Claro, 2006. LINS, R. C.; GIMENEZ, J. Perspectivas em aritmética e álgebra para o século XXI. Campinas: Papirus, 1997.

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VIOLA DOS SANTOS, J. R. O uso de categorias do cotidiano para o desenvolvimento profissional de professores que ensinam matemática. EDITAL UNIVERSAL -

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