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Edição de áudio : desenvolvimento dos processos de gravação, reflexões e técnicas específicas de edição em música erudita = Audio editing: development of recording processes, thoughts and specific editing techniques in classical music

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Academic year: 2021

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

INSTITUTO DE ARTES

Marcos Henrique Scheffel

EDIÇÃO DE ÁUDIO:

DESENVOLVIMENTO DOS PROCESSOS DE GRAVAÇÃO, REFLEXÕES

E TÉCNICAS ESPECÍFICAS DE EDIÇÃO EM MÚSICA ERUDITA

AUDIO EDITING:

DEVELOPMENT OF RECORDING PROCESSES, THOUGHTS AND

SPECIFIC EDITING TECHNIQUES IN CLASSICAL MUSIC

CAMPINAS 2019

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EDIÇÃO DE ÁUDIO:

DESENVOLVIMENTO DOS PROCESSOS DE GRAVAÇÃO, REFLEXÕES

E TÉCNICAS ESPECÍFICAS DE EDIÇÃO EM MÚSICA ERUDITA

AUDIO EDITING:

DEVELOPMENT OF RECORDING PROCESSES, THOUGHTS AND

SPECIFIC EDITING TECHNIQUES IN CLASSICAL MUSIC

Dissertação apresentada ao Instituto de Artes da Universidade Estadual de Campinas como parte dos requisitos exigidos para a obtenção do Título de Mestre em Música, na área de Música: Teoria, Criação e Prática.

ORIENTADOR: PROF. DR. JOSÉ EDUARDO RIBEIRO DE PAIVA

ESTE TRABALHO CORRESPONDE À VERSÃO FINAL DA DISSERTAÇÃO DEFENDIDA POR MARCOS HENRIQUE SCHEFFEL E ORIENTADA PELO PROF. DR. JOSÉ EDUARDO RIBEIRO DE PAIVA

CAMPINAS 2019

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Silvia Regina Shiroma - CRB 8/8180

Scheffel, Marcos Henrique,

Sch23e SchEdição de áudio : desenvolvimento dos processos de gravação, reflexões e

técnicas específicas de edição em música erudita / Marcos Henrique Scheffel. – Campinas, SP : [s.n.], 2019.

SchOrientador: José Eduardo Ribeiro de Paiva.

SchDissertação (mestrado) – Universidade Estadual de Campinas, Instituto de

Artes.

Sch1. Edições de áudio. 2. Som - Registro e reprodução - Técnicas digitais. 3.

Registro musical. 4. Música erudita. I. Paiva, José Eduardo Ribeiro de, 1959-. II. Universidade Estadual de Campinas. Instituto de Artes. III. Título.

Informações para Biblioteca Digital

Título em outro idioma: Audio editing : development of recording processes, thoughts and specific editing techniques in classical music

Palavras-chave em inglês: Audio editions

Sound - Recording and reproducing - Digital techniques Music recorder

Classical music

Área de concentração: Música: Teoria, Criação e Prática Titulação: Mestre em Música

Banca examinadora:

José Eduardo Ribeiro de Paiva [Orientador] Emerson Luiz de Biaggi

Luiz Britto Passos Amato Data de defesa: 01-07-2019

Programa de Pós-Graduação: Música

Identificação e informações acadêmicas do(a) aluno(a) - ORCID do autor: https://orcid.org/0000-0002-8483-5827 - Currículo Lattes do autor: http://lattes.cnpq.br/4335576892941888

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MARCOS HENRIQUE SCHEFFEL

ORIENTADOR: PROF. DR. JOSÉ EDUARDO RIBEIRO DE PAIVA

MEMBROS:

1. PROF. DR. JOSÉ EDUARDO RIBEIRO DE PAIVA 2. PROF. DR. EMERSON LUIZ DE BIAGGI

3. PROF. DR. LUIZ BRITTO PASSOS AMATO

Programa de Pós-Graduação em Músicado Instituto de Artes da Universidade Estadual de Campinas.

A ata de defesa com as respectivas assinaturas dos membros da comissão examinadora encontra-se no SIGA/Sistema de Fluxo de Dissertação/Tese e na Secretaria do Programa da Unidade.

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A Deus

Ao meu orientador Prof. Dr. José Eduardo Ribeiro de Paiva Ao Prof. Dr. Emerson de Biaggi

Ao meu pai Rubem Scheffel A minha esposa Luciana Scheffel

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Desde o surgimento da gravação de áudio, no final do século XIX, há uma constante busca pela forma perfeita de se fixar os sons em suporte fonográfico. Perfeita não somente no sentido técnico -- ritmo, andamentos, afinação, dentro de um contexto ou padrão sociocultural --, ou de fidelidade sonora, mas também ao que foi intencionado com a música e o que ela representa em termos artísticos. Com a evolução das tecnologias de gravação, o trabalho desenvolvido a partir do material gravado se tornou tão importante quanto a própria execução. Quando as gravações terminam, o músico sabe que muito ainda poderá ser feito pela música a partir dos recursos disponíveis no estúdio. O compositor e o intérprete sabem do potencial das ferramentas e constroem seus trabalhos considerando essas potencialidades. Observa-se a partir disso que, embora surjam com funções muito específicas, os equipamentos de gravação e/ou edição acabam por desempenhar papéis totalmente diferentes de seus propósitos originais. A arte não é mais do artista e passa a ser tecnológica; a performance passa a ser do técnico de estúdio, que utiliza todo o seu conhecimento e habilidades para deixar a obra com "erro zero". O referencial musical de uma obra passa a ser o que foi produzido no estúdio e não mais a execução ao vivo.

O estudo a seguir tem por objetivo apresentar técnicas de edição em música erudita, uma vez que existem particularidades para esse tipo de gravação / edição. É proposto que, após um breve histórico de como se deu a evolução dos meios de gravação / reprodução sonora, tal elaboração venha embasada pelos conceitos do termo sonoridade, o qual é resultado de todo um processo de criação / captação / edição / reprodução de áudio.

Palavras-chave: edições de áudio, som - registro e reprodução - técnicas digitais, registro musical, música erudita

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Since the beginning of audio recording at the end of the 19 century, there has been a constant search for the perfect way to record the sounds in phonographic support. This perfection involves not only the technical aspects of it – rhythm, time, tuning, within a sociocultural pattern – or sonorous high fidelity, but also what has been intended with the music and what it represents in artistic terms. With the development of audio recording technologies, the work done in the recorded matter became as important as the performance itself. When the recording ends, the musician knows that much can still be done for the music with the equipment available at the studio. Both the composer and the performer know the potential of the tools and build their works taking into account these potentialities. From that point on, it is observed that while the recording and/or editing equipments emerge with very specific functions, they end up by performing totally different roles from their original purpose. The art no longer belongs to the artist, but it is now technological; the performance belongs now to the studio technician, who employs all his knowledge and habilities to leave the work with “zero errors”. The musical benchmark of a work becomes what has been produced in the studio and no longer the live performance.

The present treatise aims to expose edition techniques for classical music, considering the peculiarities that exist for this type of recording/editing. It is proposed that, after a brief description of the development of sound recording/reproduction, this working up will be based upon the concepts of the term sonority, which is the result of a whole process of audio creation / captation / edition / reproduction.

Keywords: audio editions, sound - recording and reproducing - digital techniques, music recorder, classical music

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1 1.1 1.2 1.3 1.4 1.5 1.6 1.7 1.8 1.9 1.10 2 2.1 2.1.1 2.1.2 2.1.3 2.1.4 2.1.5 2.1.6 3 3.1 3.2 3.3 3.3.1 3.4 3.5 3.6 4 4.1 4.2 4.3 4.4 4.4.1 4.4.2 4.4.3 4.4.4 4.4.5 4.4.6 4.4.7 INTRODUÇÃO... DO FONÓGRAFO AO STREAMING: A ESCUTA MUSICAL NA ERA DA TECNOLOGIA... O fonógrafo... O gramofone... A gravação elétrica... O disco de vinil... A fita magnética... O estúdio de gravação... O áudio digital... O disco compacto... Os arquivos digitais... O streaming... CONCEITUANDO A SONORIDADE... Estrutura da sonoridade... Fonte sonora... Objeto sonoro... Estilo... Performance... Local sonoro... Conclusão... OS PARÂMETROS EDITÁVEIS DO ÁUDIO... Afinação... Ritmo... Timbre... Fidelidade sonora... Dinâmica... Panorama sonoro... Ambiência... A EDIÇÃO PROPRIAMENTE DITA... O editor de áudio... A aura da música... As estações de trabalho... A edição... Preparando o terreno... Copiando e colando... Ajustando a afinação... Corrigindo o ritmo... Equalizando... Trabalhando a dinâmica... Adicionando ambiência... CONCLUSÃO... REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS... 9 12 12 15 18 19 21 23 24 26 27 30 34 41 41 42 43 44 45 47 48 49 50 52 55 56 58 59 65 65 66 68 70 71 75 78 80 82 85 87 89 92

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INTRODUÇÃO

Até o final do século XIX, a única forma de se ter uma experiência musical era por sua própria realização, seja como executante ou como ouvinte. Era um evento social. A música acontecia naquele momento, naquele local, somente para as pessoas que ali estavam. Com o surgimento das gravações, esse convívio social foi, aos poucos, dando lugar às execuções independentes e solitárias de peças musicais, seja na sala de casa, através do recém-criado fonógrafo, mais tarde no carro, ou mais recentemente, nos fones de ouvidos, através de tocadores de MP3 ou ainda ouvindo música online através das plataformas streaming. "Pode-se afirmar que a relação entre a música e a tecnologia vem desde muito tempo atrás, principalmente ao se pensar que todo instrumento musical encerra em si uma tecnologia específica utilizada para seu desenvolvimento e construção, e que toda criação musical somente se materializa através dessa tecnologia." (PAIVA, 2012).

A gravação foi o meio encontrado para perpetuar a execução do intérprete, embora essa gravação pudesse ser manipulada, com precariedade no início do século XX e quase que totalmente nos dias atuais. Aos poucos, percebeu-se que os estúdios eram ferramentas de criação sonora, e não apenas para captação e gravação. A música dita como popular, que considero a música ouvida pelas massas, começou a se valer dessa capacidade de criação musical. Com o surgimento dos instrumentos elétricos, passou-se a utilizar efeitos em estúdio, a fim de criar nuances, timbres, sonoridades distintas, muitas vezes impossíveis de serem realizados ao vivo. "Aí principia a separação entre música ao vivo e música gravada, e o estúdio passa a ser um ambiente especifico, onde determinadas sonoridades somente podem ser ali obtidas." (PAIVA, 2012).

A partir da década de 60, os primeiros sistemas multipistas trouxeram aos estúdios maior liberdade na criação da música pop. Agora já era possível gravar o mesmo músico várias vezes (overdub), deixando em segundo plano a performance ao vivo. "Com a gravação multipista, as complexas harmonizações vocais e as dobras instrumentais ganham espaço na produção musical, afastando-a cada vez mais do simples registro, e fazendo com que o processo de gravação passe a ser um elemento expressivo de primeira ordem." (PAIVA, 2012). "Os LPs, que não passavam de execuções ‘naturais’ gravadas, tornaram-se finalmente instrumentos por si mesmos, instrumentos que os artistas mais habilidosos em gravações estão aprendendo a tocar com uma surpreendente autoridade." (GABREE in MUGIATTI, 1973).

Brian Eno (In: COX, WARNER, 2004), músico e produtor ligado a artistas e grupos do primeiro escalão pop, salienta o fato de que, quando as gravações terminam, o

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músico sabe que muito ainda poderá ser feito pela música a partir dos recursos disponíveis no estúdio. O compositor e o intérprete sabem do potencial das ferramentas e constroem seus trabalhos considerando essas potencialidades. Observa-se a partir disso que, embora surjam com funções muito específicas, os equipamentos de gravação e/ou edição acabam por desempenhar papéis totalmente diferentes de seus propósitos originais.

Glenn Gould1 utilizou a tecnologia dos estúdios para gravar com excelência a obra de J. S. Bach. Gravava uma obra do início ao fim, e depois de ouvir a gravação, refazia pequenos trechos com maior perfeição. Gould usava combinações de microfones, afastando-os ou aproximando-afastando-os, a fim de conseguir dinâmicas precisas.

Na prática fonográfica, há uma constante procura pela forma perfeita de fixação dos sons em suporte fonográfico. Perfeita não somente no sentido técnico ou de fidelidade sonora ao que foi gravado, mas, sim, também (e, dependendo do caso, até prioritariamente) ao que foi intencionado com a música, para o que ela se destina e o que ela representa ou propõe em termos artísticos, aumentando sua força expressiva. (CASTRO, 2015).

A arte não é mais do artista e passa a ser tecnológica; a performance passa a ser do técnico de estúdio, que utiliza todo o seu conhecimento e habilidades para deixar a obra com "erro zero". O referencial musical de uma obra passa a ser o que foi produzido no estúdio. Músicos querem tocar ao vivo com a mesma perfeição que ouvem um registro totalmente manipulado. Gould detestava tocar no palco, pois considerava uma experiência intensamente desagradável. Encontrou no estúdio o local ideal para a atividade musical e a base para fazer sua música, deixando de lado a performance no palco, que até então era o objeto principal da realização musical. Para Gould, a gravação substituiu o palco, tornando-se o padrão para julgamento de um concerto. "Uma visão que coloca o estúdio como o local da perfeição, onde a obra pode ser feita, refeita e corrigida até se obter um resultado que satisfaça o intérprete, e que se torne o referencial a ser seguido." (PAIVA, 2012). Além disso, o estúdio permite que o músico crie uma "identidade musical", particular, que possa identificá-lo.

A música passa então a ser produzida não mais em função da performance ao vivo, mas sim em função de sua reprodução, visando o público midiático e o sucesso das gravadoras.

[...] técnicas de gravação, transmissão, reprodução – microfones, caixas acústicas, amplificadores, fitas - têm sido desenvolvidos ao ponto de traírem seu objetivo

      

1

 Renomado pianista canadense (1932-1982), conhecido especialmente por suas gravações de Johann Sebastian Bach. Suas gravações das Variações Goldberg são consideradas um marco na música ocidental do século XX. Gould abandonou as apresentações ao vivo em 1964, dedicando-se apenas às gravações em estúdio. 

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original, que era o de garantir uma reprodução fiel. Cada vez mais as chamadas técnicas de reprodução estão adquirindo uma irreprimível tendência de se tornarem autônomas e criar sua própria imagem musical, e cada vez menos se preocupam em reproduzir tão fielmente quanto possível a condição de uma audição direta. (BOULEZ, 1986).

A partir da década de 80, com o surgimento do protocolo MIDI, tornou-se possível programar a execução de música. Sintetizadores conectados a computadores já podiam substituir a execução real de um instrumento musical por programação através de cliques, programando samplers, timbres novos, ou criando-os a partir de recursos até então inexistentes. "[...] isso era uma verdadeira revolução nos modos tradicionais de execução e composição musical ao aliar todas as possibilidades sonoras dos sintetizadores às automações trazidas pelos computadores." (PAIVA, 2012). O músico, além de músico, é agora um programador, criando timbres personalizados e solidificando sua identidade. As composições podem ser criadas a partir de loops gerados por softwares desenvolvidos especialmente para esse fim.

A gravação tem estado no centro das mudanças ao longo da história da música moderna, afetando cada faceta do esforço artístico: técnica, invenção e estética. Ela vai, sem dúvida, continuar a ser uma força musical importante, e os usuários continuarão a responder às suas possibilidades e limitações. Uma visão clara desta relação permitirá que as gerações futuras aprendam a moldar o papel da gravação de som na vida musical do mundo.

Para que possamos, neste trabalho, desenvolver e estudar as técnicas específicas para a edição de áudio na música erudita, primeiro precisamos conceituar alguns pontos. No capítulo que se segue, tentaremos ampliar o entendimento de como o desenvolvimento da tecnologia permitiu que os sons sejam manipulados, através das gravações, criando novos timbres, instrumentos e uma infinidade de novas maneiras de se fazer/criar/editar música. Além disso, estudaremos como a sonoridade pode ser formada e/ou alterada através da manipulação dos parâmetros editáveis do áudio.

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1 Do fonógrafo ao streaming: a escuta musical na era da tecnologia

Iniciando nosso estudo, é necessária a compreensão de como a tecnologia foi e ainda é capaz de moldar as formas de se fazer música. Neste capítulo estudaremos, de maneira breve, como se deu o desenvolvimento dos meios de gravação, e como estes meios alteraram a escuta musical através do tempo. Tal estudo é necessário, uma vez que os recursos tecnológicos disponíveis hoje para produção de música -- popular ou erudita -- são o resultado de décadas de desenvolvimento contínuo e estão em constante aperfeiçoamento. Futuras gerações, possivelmente, terão necessidades e recursos que ainda nem imaginamos. O que sabemos é que a tecnologia permeia e conduz a maneira de se fazer / ouvir música, como veremos a seguir.

1.1 O fonógrafo

Até o final do século XIX, a escuta musical somente era possível ao vivo, com a música sendo executada pelos seus intérpretes. A música acontecia naquele momento, naquele local. O que poderia ser levado da arte ficava registrado apenas na memória dos espectadores. Brian Eno coloca que:

Música, até cerca de 1900, era um evento percebido em uma situação particular que desaparecia quando sua execução terminava. Não havia nenhuma maneira de realmente ouvir aquele trecho de novo, de forma idêntica, e não havia nenhuma maneira de saber se sua percepção estava lhe dizendo que era diferente ou se era diferente a segunda vez que você ouviu. A peça desaparecia quando terminava, por isso era algo que só existia no tempo. (COX, WARNER, 2004. In: PAIVA, 2017).

Porém, em 18 de agosto de 1877, ao gravar e reproduzir o poema "Mary has a little lamb", o norte-americano Thomas Alva Edison2 inventou o primeiro aparato capaz de registrar e reproduzir sons: o fonógrafo. "O fonógrafo trouxe a ruptura ao permitir a primeira audição desvinculada da execução musical e em outra localização física que não a sala de concertos [...]" (PAIVA, 2014). O invento foi fruto do esforço de Edison em estender o

      

2

Entre as 2.332 patentes registradas por Thomas Edison (1847-1931), o fonógrafo foi uma de suas principais invenções. Além de aperfeiçoar o telefone, as suas contribuições mais universais para o desenvolvimento tecnológico e científico foram: a lâmpada elétrica incandescente, o cinescópio ou cinetoscópio, o ditafone e o microfone de grânulos de carvão para o telefone. Edison é um dos precursores da revolução tecnológica do século XX.

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alcance das linhas telefônicas. Esse fator "acidental" soma-se ao fato de que todos os objetos presentes na construção do aparelho já existiam: agulha, diafragma, cilindro, corneta etc.

Tal fato pode levar-nos a questionar o motivo de o fonógrafo não ter sido inventado antes. Contudo, é preciso lembrar que as inovações científicas raramente surgem como resultado de insights de seus inventores. Muitos fatores de ordem social, econômica e cultural influenciam a direção da imaginação dos inventores, até mesmo a própria competição entre eles. (GOMES, 2014).

O fonógrafo constava de um cilindro coberto com papel de estanho e um pavilhão, que tinha no fundo um diafragma ao qual se fixava uma agulha. Uma manivela imprimia ao cilindro um movimento de rotação e outro, mais lento, de translação, de modo que a agulha, apoiada sobre o papel de estanho, nele produzia um sulco ao riscar uma curva espiral ininterrupta. Quando se emitia um som, como a voz de uma pessoa, diante do pavilhão, as ondas sonoras provocavam vibrações no diafragma, que as transmitia à agulha. Esta produzia no papel uma série de elevações e depressões decorrentes das oscilações. Desse modo, o som original era "inscrito", na forma de sulcos, sobre o papel. Ao passar a agulha do diafragma pelo sulco traçado durante a gravação, ela acompanhava as sinuosidades existentes e tornava a vibrar de modo idêntico. Essas oscilações se transmitiam ao diafragma e depois ao próprio ar, onde novamente se formavam ondas sonoras audíveis, que repetiam os sons originais. A gravação / reprodução ocorria de maneira totalmente mecânica, sem nenhuma interferência elétrica.

                Figura 1 - T. Edison e seu fonógrafo Fonte: (NOGUEIRA, 2015)

Figura 2 - O fonógrafo de Edison Fonte: (NOGUEIRA, 2015)

A máquina de Edison, embora de concepção genial, tinha algumas limitações além da imperfeição da reprodução: a gravação na folha de estanho só podia ser tocada

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poucas vezes, não permitia cópias nem a possibilidade de o papel ser retirado e guardado. Michael Chanan (1995) coloca que

as limitações sonoras dos primeiros fonógrafos foram musicalmente restritivas, e assim permaneceram, apesar de constantes melhorias, até a introdução da gravação elétrica em meados da década de 1920, quando o

disco foi unido à amplificação e ao alto-falante.3 (CHANAN, 1995, T.

A.4).

Em 1885, Alexander Graham Bell, seu primo Chichester A. Bell e Charles Sumner Tainter substituíram o papel de estanho por um invólucro de papel encerado, que se podia recolher com facilidade.

Em um artigo de 1878 para a revista North American Review, Edison cita algumas utilidades do novo invento: registros vocais de uma família, ensino de idiomas através da exata pronúncia, produção de audiolivros para pessoas cegas, brinquedos etc. Hoje, todas as funções propostas por Edison foram possibilitadas através da gravação sonora, mas, num primeiro momento e pela limitada qualidade sonora, não ficou aparente que a música fosse o principal foco no desenvolvimento do novo instrumento.

Figura 3 - Cilindro de cera da marca Edison Fonte: (NOGUEIRA, 2015)

Figura 4 - Colocando o cilindro em um fonógrafo Fonte: (NOGUEIRA, 2015)

Apesar de seus entraves técnicos iniciais, o fonógrafo representou o marco inicial da indústria fonográfica por transformar o som intangível da música em objetos materiais que poderiam ser vendidos e comprados, além de separar física e psiquicamente, através da gravação sonora, a audição e a performance musical, levando a implicações de ordem técnica e estética que viriam a redefinir os modos

      

3

 The audible limitations of the early phonograph were musically restrictive, and remained so, despite a constant stream of improvements, until the introduction of electrical recording in the mid-1920s, when disc was joined to amplification and the loudspeaker. (CHANAN, 1995, p. 37). 

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de produção, comercialização e consumo de música ao longo do século XX. (GOMES, 2014).

Figura 5 - Modelo de fonógrafo comercial da marca Edison Fonte: (NOGUEIRA, 2015) Figura 6 - Anúncio de 1904: Fonógrafo Edison Fonte: (NOGUEIRA, 2015) 1.2 O gramofone

Enquanto se gravava sons em cilindros, em 1888 Emile Berliner5 (1851-1919) criou o gramofone, alterando a forma dos cilindros para discos planos, gravados, de início, em apenas uma face. De acordo com as patentes, porém, Edison tinha os direitos da gravação com sulcos, e Bell / Tainter os da impressão em cera. Assim, Berliner foi levado a procurar uma solução nova: sobre um disco de zinco recoberto com uma fina camada de cera, um serpenteador transversal registrava as vibrações; depois, aplicava-se um ácido que atacava somente o metal e, desse modo, produzia uma estria nos lugares em que a agulha havia retirado a cera. O disco ficava pronto depois que se derretia a cera restante. "O disco gravado foi o primeiro meio de “fixação” da música, isto é, de registro de uma obra artística, ao perpetuar a visão do intérprete no momento de sua gravação, visão esta que poderia ser alterada de acordo com os recursos (ainda muito limitados) disponíveis." (PAIVA, 2012).

Berliner, porém, prosseguiu com as pesquisas, pois seu sistema ainda apresentava o inconveniente de só permitir a produção de um disco de cada vez. A possibilidade de cópias surgiu depois que ele teve a idéia de recobrir o disco original com um metal mais duro e

      

5

Emile Berliner (1851-1929) foi um inventor alemão, naturalizado americano. Além das invenções relativas à mecânica aeronáutica, Berliner inventou o gramofone com sistemas novos que vieram possibilitar o aperfeiçoamento do fonógrafo.

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obteve um molde, isto é, uma reprodução em negativo do original, com o qual poderia fabricar outros discos.

Comparados aos cilindros, os discos do gramofone eram mais simples de se fabricar, mais fáceis de serem estocados, transportados, eram mais duráveis (apesar de serem também frágeis) e possuíam uma qualidade sonora levemente superior. Seu predomínio entre o público consumidor se deu de modo bastante lento, pois a produção regular de discos se iniciou apenas dez anos após a patente de Berliner, e, além desse período, ainda continuou disputando o mercado consumidor com o cilindro de Edison por cerca de uma década.

Figura 7 - E. Berliner e seu gramofone patenteado

Fonte: (NOGUEIRA, 2015)

Figura 8 - Gramofone de E. Berliner Fonte: (NOGUEIRA, 2015)

No início, os discos não possuíam um padrão, levando algum tempo para as empresas se definirem por um formato que agradasse ao consumidor. Havia várias velocidades, indo de 76 até 82 rpm (rotações por minuto); as dimensões também variavam, indo de 15 cm até 30 cm de diâmetro, e a duração das gravações também variava entre 2 e 5 minutos. O mercado acabou por aceitar o modelo de disco manufaturado pela empresa Victor (depois RCA Victor, atualmente parte da Universal Music Group), que produzia discos de 25 cm e 30 cm (dedicados a óperas e obras de maior duração), que rodavam a 78 rpm e armazenavam aproximadamente 3 minutos de música -- agora em cada face.

Em 1904, uma gravação de "Vesti La Giubba", ária principal da ópera Pagliacci de Ruggero Leoncavallo (1857-1919), feita por Enrico Caruso6, em Milão, foi o primeiro

      

6 

Enrico Caruso (1873-1921) foi um tenor italiano, considerado, inclusive pelo ilustre Luciano Pavarotti, o maior intérprete da música erudita de todos os tempos. Com vasto repertório, Caruso foi o primeiro cantor clássico a atrair grandes plateias em todo o mundo e ainda hoje figura entre os maiores intérpretes clássicos da história.  

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disco a chegar à marca de um milhão de cópias vendidas, inaugurando definitivamente a era da produção fonográfica massiva.

Inicialmente, a acústica do gramofone favorecia a gravação de vozes, mas não a de instrumentos, especialmente em grupos. Foram os cantores, portanto, os primeiros a se beneficiarem do invento de Berliner, principalmente os de estilo operístico. Além de privilegiar certos estilos de performance e de interpretação musical em detrimento de outros, o gramofone também introduziu mudanças de ordem estética, devido à limitada duração dos discos de 78 rotações. (GOMES, 2014).

A limitação de tempo fez com que a música popular cristalizasse seu formato nos três minutos padrão. Chanan (1995) afirma que a necessidade de se fazer caber uma música no lado de um disco de 78 rpm teve uma série de efeitos diferentes, prejudicando igualmente a música erudita e popular. Como poucas peças eram suficientemente curtas, era necessário muitas vezes ajustar as obras, suprimindo repetições ou retirando seções, por vezes comprometendo questões de estilo e interpretação.

Apesar do grande interesse suscitado pela reprodução de sons ainda nos primeiros anos do século XX, ela era ainda estridente e barulhenta, com uma gama limitada de tons. A sonoridade dependia diretamente da intensidade da voz ou do instrumento musical, pois não se conhecia nenhum processo de controle do volume acústico do disco, para aumentá-lo ou diminuí-lo, nem de regulagem da velocidade de rotação.

É importante lembrar que as gravações eram, até esse momento, totalmente mecânicas, com os intérpretes executando para o cone de um aparato ainda primitivo. Mas, apesar da baixa qualidade sonora, as gravações da época se gabavam de ser realistas e fiéis aos intérpretes. De acordo com Katz (2005), "nas décadas de 10 e 20, a Victor Talking Machine Company publicou anúncios que fariam a cabeça de um ontologista girar: abaixo de ilustrações de artistas famosos, em pé ao lado de suas gravações, proclamava: ‘Ambos são Caruso’ ou ‘Heifetz é realmente Heifetz’."

Paiva (2014) salienta que

o disco gravado fez com que a escuta fosse desvinculada da visualização do intérprete e mediada pelos aparelhos de reprodução sonora, definida posteriormente por Pierre Schaefer como uma forma de escuta ‘acusmática’, aqui compreendida como uma decorrência destas tecnologias do século XX e não ao sentido Pitagórico do termo. As ‘gravações acústicas’, realizadas até a década de 20, não respondiam a frequências acima de 2000 Hz ou abaixo de 164 Hz, o que limitava de forma brutal qualquer discussão sobre qualidade técnica. A gravação elétrica, adotada primeiramente pela Columbia (hoje Sony Music), fez com que a qualidade sonora desse um grande salto, mas ainda bastante limitada pelas possibilidades dos equipamentos da época. (PAIVA, 2014).

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Em 1915 houve uma verdadeira revolução quando o americano Lee De Forest inventou um amplificador de tubo a vácuo. A invenção marcou a transição da gravação acústica para a elétrica, o que imprimiu uma considerável melhora no método que, unido à utilização de novos materiais na confecção dos discos e das agulhas e ao desenvolvimento tecnológico dos sistemas de reprodução (alto-falantes, amplificadores etc.), permitiu uma excelente qualidade sonora final.

1.3 A gravação elétrica

Em meados da década de 1920, a indústria fonográfica passou por uma série de transformações acarretadas pelo advento do rádio e pela substituição da gravação mecânica pela gravação elétrica, que não apenas representou um importante avanço em qualidade, mas também introduziu alterações tanto na prática de gravação quanto na experiência auditiva. Os aparatos mecânicos começaram a ser substituídos, e, então, o sistema de gravação agora não mais precisava ser colocado no mesmo espaço dos músicos, uma vez que a sala de controle ficava separada, tornando-se domínio do engenheiro de som. Era o início do estúdio moderno.

Como afirma Morel (2010), se antes do surgimento do processo elétrico de gravação somente os cantores que possuíam vozes potentes estavam aptos a realizar gravações, "o processo de inovação tecnológica propiciou o melhoramento da captação e gravação das vozes e possibilitou o registro de qualquer tipo de voz.” (MOREL, 2010). "A amplificação elétrica proporcionou aos cantores populares um novo conjunto de possibilidades, e o microfone foi acolhido tanto pelo seu caráter de amplificação da voz como por ser uma ferramenta de expressão com técnicas próprias." (GOMES, 2014).

Figura 9 - Orquestra da RCA Victor (1925) no mesmo estúdio, em uma gravação mecânica (à esquerda) e em uma gravação eletrificada (à direita) Fonte: CASTRO (2015)

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Nas imagens acima, podemos notar os diferentes posicionamentos dos músicos. Na gravação mecânica (foto à esquerda), notamos uma "aglomeração" próxima ao cone de gravação. A "mixagem" era feita de maneira física, aproximando ou afastando determinado instrumentista ou cantor, a fim de equilibrá-lo com os demais. A partir da gravação eletrificada (foto à direita), os cantores e instrumentistas passaram a ter maior liberdade e se acomodarem de maneira mais confortável, pois o microfone poderia ser posicionado conforme a necessidade. "Alguns parâmetros, como a dinâmica natural de uma execução musical podiam ser facilmente alterados conforme o posicionamento do microfone, uma técnica popularizada principalmente pelos cantores, talvez os primeiros a perceberem o potencial expressivo desta manipulação." (PAIVA, 2012). Aí se inicia a separação entre música ao vivo e música gravada. Determinadas sonoridades somente poderiam ser obtidas no ambiente do estúdio, sendo, por muitas vezes, impossíveis de serem reproduzidas ao vivo.

1.4 O disco de vinil

A partir do final da década de 1940, uma nova mudança de paradigma na indústria musical foi provocada pela introdução dos discos de vinil (policloreto de polivinilha)7 no mercado fonográfico. Com capacidade de armazenamento de aproximadamente quarenta minutos (vinte minutos em cada face), e melhor qualidade sonora, os Long Plays (LPs), como também são conhecidos, possibilitaram a substituição dos antigos discos de goma-laca de 78 rotações que comportavam apenas três minutos em cada face. Este novo padrão, introduzido pela etiqueta Columbia Records, trouxe o disco com sulcos mais estreitos, podendo assim reduzir a velocidade a 33 rpm, aumentando sua duração. Os microssulcos ou ranhuras, em forma espiralada, conduzem a agulha do toca-discos, em sentido horário, da borda externa até o centro. A vibração da agulha é transformada em sinal elétrico, o qual é posteriormente amplificado e transformado em som audível.

Um fator que contribuiu para o desenvolvimento do LP foi a busca por uma alternativa material quando os suprimentos de resina foram consideravelmente reduzidos durante a Segunda Guerra Mundial. "Durante certa época, nos Estados Unidos, algumas lojas de discos chegavam ao ponto de pedir aos compradores que devolvessem seus discos velhos

      

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O vinil é feito de uma junção química que converte hidrocarbonetos (elementos básicos do petróleo) em composto unificado. Esse material pode ser encontrado como matéria-prima para produção de adesivos decorativos colantes em paredes ou vidros, personalização de veículos, banners, faixas profissionais, placas de segurança, PVC, entre outros.

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na compra de discos novos, a fim de reciclar o material." (GOMES, 2014). Além disso, feitos de vinil, os discos ficariam mais leves, maleáveis e resistentes a choques, quedas e manuseio.

Em pouco tempo, o LP veio a ser um sucesso, especialmente na música erudita. O disco “Concerto para Violino em Mi menor de Mendelssohn“ (gravação de Nathan Milstein, condução de Bruno Walterna com a New York Philharmonic) entrou para a história como o primeiro LP a ser gravado e, até o final de 1948, teve mais de um milhão de exemplares vendidos pela Columbia Records.

Figura 10 - Primeiro disco de vinil gravado (1948) Fonte: MACHADO (2016)

Figura 11 - Toca-discos do final dos anos 50 Fonte: NOGUEIRA (2015)

A ideia de trocar de disco a cada três ou quatro minutos tornou-se insuportável. Com os discos de vinil, gerou-se a possibilidade de se produzir discos com maior extensão e quantidade de canções, e também a possibilidade de se gravar as peças do repertório erudito, que são, em geral, mais longas. Tal fato está diretamente relacionado ao advento do álbum conceitual, que "se tornou o carro-chefe da indústria fonográfica, principalmente no final dos anos 60 e até meados dos anos 70. Este novo formato de produção foi responsável pela gradual perda de popularidade do formato single." (GOMES, 2014).

Com o surgimento dos álbuns, os discos passaram a ser vistos como unidades conceituais, e não mais como apenas canções isoladas. A obra composta pelo conjunto das canções, agora tão importante como cada canção individual, passou a ter a sequência cuidadosamente pensada pelos produtores, a fim de dar um sentido conexo em todo o disco. Como exemplos, podemos destacar os álbuns: Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band, dos Beatles, A Night at the Opera, do Queen, Dark Side of the Moon, do Pink Floyd, Tales from Topographic Oceans, do Yes.

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1.5 A fita magnética

Enquanto se gravava sons em cilindros e discos, o dinamarquês Valdemar Poulsen8 patenteava, em 1898, o primeiro sistema de gravação magnético: o Telegraphone. A gravação era feita em um fio de aço semelhante ao fio usado nas cordas dos pianos. O arame saía de um carretel onde estava enrolado e passava por um eletroímã9 que o magnetizava segundo um padrão que variava de acordo com os sons captados por um microfone, enrolando-se em outro carretel. Para se reproduzir o som gravado, bastava passar o arame magnetizado pelo eletroímã e, por indução magnética, geravam-se correntes elétricas que, por sua vez, eram transformadas no som original através dos auscultadores. Embora melhorado ao longo dos anos, este sistema era de baixa qualidade e, em meados dos anos 40, foi substituído pela fita de plástico revestida de óxido de ferro.

Figura 12 - Telegraphone, de Valdemar Poulsen Fonte: NOGUEIRA (2015)

Figura 13 - Gravador magnético em fio de arame de meados dos anos 40 Fonte: NOGUEIRA (2015)

Em 1935 é produzida na Alemanha, pela empresa BASF, a primeira fita de gravação magnética. Tratava-se de uma fita de plástico revestida num dos lados com um pó de óxido de ferro, permitindo, em relação ao sistema desenvolvido por Poulsen, diminuição do peso, maior fidelidade sonora, aumento da capacidade de gravação e a possibilidade de manipulação do material gravado. Os estúdios gravavam em bobinas de fita magnética, que depois eram transferidas para as matrizes para a prensagem dos discos. Este sistema de

      

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Valdemar Poulsen (1869-1942) foi um engenheiro dinamarquês que contribuiu significativamente para o desenvolvimento da tecnologia nos primórdios do rádio. Desenvolveu também o transmissor Poulsen, em 1903, que foi usado em algumas das primeiras estações de transmissão até o início dos anos 1920.

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Eletroímã é um dispositivo que utiliza corrente elétrica para gerar um campo magnético, semelhante àquele encontrado nos ímãs naturais. 

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gravação passou a ser usado também pelo público em aparelhos domésticos, comercializados a partir dos anos 50. Nos anos 60, a empresa holandesa PHILIPS introduziu no mercado a fita cassete, uma pequena caixa que continha os carretéis e a fita magnética, transformando pelos próximos 30 anos o que seria a gravação doméstica e profissional.

A escuta musical, até o final da década de 1970, dependia de salas específicas para tal fim, normalmente equipadas com um toca-discos ou um reprodutor de fitas magnéticas. "Os sistemas ‘móveis’ eram basicamente o ‘som automotivo’, ainda buscando chegar a um bom padrão de reprodução sonora, tendo como base principal a fita cassete." (PAIVA, 2014). Porém, em 1979, a Sony lançou o primeiro dispositivo portátil -- o walkman -- capaz de reproduzir fitas cassete, com fones de ouvido e movido a pilhas. Como o nome sugere, sua proposta era a mobilidade, permitindo que se ouvisse música em qualquer lugar. A partir de então, a escuta musical ganhou total mobilidade com uma qualidade sonora aceitável e passou a ser praticada em todos os tipos de ambiente, levando ouvintes a construírem suas próprias trilhas sonoras. Em 30 anos, com cerca de 200 milhões de unidades vendidas, "...

esse pequeno produto mudou literalmente o hábito de ouvir música [...] em todos os recantos do mundo." (MORITA, 1986).

Figura 14 - Gravador doméstico de fita magnética dos anos 50 Fonte: NOGUEIRA (2015)

Figura 15 - Walkman de fita cassete do início dos anos 80

Fonte: NOGUEIRA (2015)

Um ponto importante, salientado por Gomes (2014), é que, "com as fitas magnéticas, o estúdio de gravação também se tornou um laboratório de experimentação musical no qual muitas vezes criavam-se sons irreprodutíveis em performances ao vivo e onde se desenvolviam novas técnicas de edição e criação musical, dentre as quais se destaca o

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overdubbing10." Surgia, então, a figura do editor de áudio, uma vez que, com a fita magnética, já era possível montar uma música a partir de vários takes. Além do editor, a técnica promoveu o papel do produtor, que passou a ser responsável por supervisionar o estágio de pós-produção, agora mais importante do que apenas pagar as contas e organizar as sessões de estúdio.

Com o gradual desenvolvimento e aperfeiçoamento da tecnologia nas décadas seguintes, a possibilidade de o ouvinte organizar aquilo que queria ouvir num suporte constituiu o principal diferencial da fita magnética em relação ao disco de vinil, além da questão da portabilidade, como vimos acima, trazendo várias mudanças no comportamento e modo de apreciação musical.

1.6 O estúdio de gravação

No final da década de 1950 surgiram os primeiros sistemas de gravação multipista, revolucionando a maneira de se produzir discos. A performance ao vivo dava lugar às criações em estúdio. É o princípio de "uma gama enorme de possibilidades e de formas de se capturar performances, sonoridades e de construir propostas sonoras." (CASTRO, 2015). O estúdio passa a ser um novo "instrumento musical", no qual determinadas sonoridades são obtidas exclusivamente nesse local. Castro ainda acrescenta que "a performance em estúdio passa por obter sonoridades que melhor se adéquem à gravação, o que pode implicar mudanças e adaptações no modo de tocar de cada músico." (CASTRO, 2015).

As técnicas de gravação, edição e produção passaram a ser tão importantes quanto a própria execução do instrumento musical: "[...] é necessário o domínio da técnica para a plena utilização desses recursos tecnológicos, técnica essa que parece hoje tão importante quanto as técnicas musicais propriamente ditas." (PAIVA, 2002).

Salas de gravação, tratadas acusticamente com superfícies reflexivas ou absorventes, moldáveis através de biombos e outros dispositivos, poderiam agora criar e/ou simular ambientes, transportando a performance para o espaço do ouvinte. Era como se o estúdio pudesse ser "afinado" para se atingir as necessidades de uma determinada sessão de gravação. "De fato, uma coisa que ficou clara para os consultores acústicos e profissionais da gravação foi que o estúdio em si tinha se tornado o último instrumento a ser gravado." (HORNING, 2012. In: CASTRO, 2015).

      

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Processo pelo qual sucessivas performances são combinadas ou sobrepostas umas com as outras, criando o ilusão de um desempenho conjunto.

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Coleman (2005) enfatiza que, em meados da década de 70, para uma considerável audiência, a qualidade técnica de uma gravação representava "um fim em si mesmo". "O espetáculo aqui não é mais a performance, o ato musical em si, como era até então, mas sim os overdubs, a imagem estereofônica, a espacialização sonora, bem como a manipulação eletrônica dos sons." (PAIVA, 2012). O desenvolvimento do estúdio se deu de tal maneira, além das questões acústicas, que os aparatos de manipulação de áudio também ajudaram a configurar uma nova prática de gravação, a ponto de se ter a impressão de que um instrumento musical "diferente" estava sendo manipulado.

A manipulação de áudio gravado tornou-se ainda mais usual a partir de meados da década de 1970, com o advento da gravação digital. E, a partir da década de 1990, os computadores e interfaces de áudio ampliaram significativamente as possibilidades de edição e mixagem. Agora as ondas sonoras poderiam não apenas ser ouvidas, mas também vistas graficamente através dos softwares de gravação e edição de áudio, permitindo uma incrível precisão e agilidade no processo de produção fonográfica.

Até o surgimento dos processadores digitais, todas as interfaces se resumiam a botões sobre superfícies, não existindo, por exemplo, a visualização da onda sonora que hoje é encontrada até em gravadores de voz de celulares. Com isso, a produção sonora passa a ter uma nova interface, com todos os sons podendo ser “visualizados” e com o usuário trabalhando diretamente na representação gráfica da onda sonora. (PAIVA, 2012).

Nos anos 90, os sistemas de gravação de áudio digital iniciam sua escalada e popularização que se tornou efetiva a partir de 2000.

As possibilidades de gravação e edição de áudio, aliadas a uma constante queda de preço e a utilização da internet como ferramenta de distribuição musical, provocaram e provocam ainda um constante rearranjar das áreas ligadas à criação sonora e à indústria fonográfica, promovendo as maiores transformações desde o surgimento do disco gravado. (LEVY, 1999).

1.7 O áudio digital

A modulação de áudio em PCM11 data de 1937, quando o cientista inglês Alec Reeves desenvolveu o conceito e ganhou, em 1938, a patente. Curiosamente, o processo de

      

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  Pulse Code Modulation. Esta é a forma mais primitiva de armazenamento de áudio em formato digital, desenvolvido pela Sony e Philips no início da década de 70. No PCM o áudio é transformado numa série de amostras, cada uma com uma amplitude. No CD, por exemplo, temos 44100 amostras por segundo (44.1 kHz) com uma amplitude de 16 bits ou seja, 65 mil valores diferentes. Apesar do uso mais famoso ser o CD, existem

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quantização12de sinal de áudio já tinha sido desenvolvido no final do século XIX, aplicado à telegrafia. Em 1970, o americano James Russel (1931-) inventou uma maneira de gravar e reproduzir áudio digital em mídia óptica.

O áudio digital consiste na representação digital de uma onda sonora por meio de código binário. O processo que envolve, na captação ou gravação, a conversão do som analógico para digital (ADC, Analog to Digital Converter) e, na reprodução, a conversão do som digital para analógico (DAC, Digital to Analog Converter) permite que o som seja armazenado e reproduzido por meio de um CD, de arquivos de áudio, (WAV, AIFF, MP3, etc) ou de outros meios.

O processo de conversão do som analógico para digital acarreta uma perda e é fato que o som digital nunca poderá representar o som analógico de maneira plena. No entanto, a evolução tecnológica dos processos de conversão atingiu um grau elevado de precisão a ponto de não deixar transparecer nenhuma distinção perceptível ao ouvido humano entre o som analógico e sua representação digital.

Figura 16 - Uma onda sonora (cinza) representada digitalmente (vermelho) Fonte: SOARES (2011)

A precisão da representação digital do som varia de acordo com a taxa de amostragem de frequência e a quantidade (profundidade) de bits para cada amostra, ou bit depth. Quanto maior for a taxa de amostragem, mais medidas do sinal serão efetuadas no mesmo período de tempo; logo, menos perda haverá na representação digital do som e maior será a fidelidade do som digital em relação ao som analógico. Um CD de áudio padrão, por

      

várias outras aplicações para o PCM. Por exemplo, o formato com taxa de amostragem de 8 kHz com 8 bits de resolução é usado no sistema telefônico.

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exemplo, possui a taxa de amostragem de frequência, ou sampling rate, de 44.100 Hz e a profundidade de 16 bits.

Paiva (2012) afirma que,

na revolução digital, o mundo é mediado por computadores e telas, e tudo tem de passar por este constante processo de conversão para poder ser utilizado e circular pelo ciberespaço e, consequentemente, códigos são criados para que as informações possam ser digitalizadas e manipuladas. Assim foi com a gravação sonora, que se padronizou no protocolo do CD áudio [...], e que incorporou uma representação gráfica da onda sonora para poder ser manipulada nas interfaces digitais. (PAIVA, 2012).

1.8 O disco compacto

Em meados da década de 1970, a Sony e a Philips aliaram-se para desenvolver um disco digital de apenas 11,5 cm de diâmetro e com duração de uma hora, em apenas um lado. A força-tarefa, liderada por membros proeminentes da Philips, Kees Schouhamer Immink, e Sony, Toshitada Doi, progrediram na pesquisa em tecnologia-laser e discos ópticos digitais que tinha sido iniciada de forma independente pela Sony, em 1975, e pela Philips, em 1977. Essa mídia digital com o nome Compact Disc (ou simplesmente CD), começou a ser comercializada a partir de 1983, vindo a se popularizar com extrema rapidez. O novo suporte seria anunciado como o "som superior eterno", pois o disco não sofria desgaste, não era tocado por nenhuma agulha (como o vinil), tinha maior capacidade, durabilidade e clareza sonora, sem chiados, fazendo com que os discos de vinil fossem considerados obsoletos.

O CD é um disco de acrílico, sobre o qual é impressa uma longa espiral (22.188 voltas, totalizando 5,6 km de extensão). As informações são gravadas em furos nessa espiral, o que cria dois tipos de irregularidades físicas: pontos brilhantes e pontos escuros. Estes pontos são chamados de bits, e compõem as informações carregadas pelo CD. A superfície da espiral é varrida por um laser que utiliza luz no comprimento infravermelho, a qual é refletida pela superfície do disco e captada por um detector. Esse detector envia ao controlador do aparelho a sequência de pontos claros e escuros, que são convertidos em "uns ou zeros": os bits (sistema binário). Para proteger a superfície do CD, é colocada sobre ela uma camada de policarbonato.

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Figura 17 - Compact Disc (CD) Fonte: arquivo pessoal

Figura 18 - CD Player Fonte: Fabricante

O primeiro protótipo do CD trabalhava com som analógico. Porém, logo se percebeu que, ao mudar a gravação para PCM, uma série de outros recursos, na forma de subcódigos, podiam ser gravados junto com o áudio sem prejudicá-lo. Entre as vantagens do uso desses subcódigos estava a sincronização da velocidade de rotação do disco, de modo a manter o bit rate (taxa de transmissão de dados) constante. Ao contrário do disco analógico (LP e similares) a velocidade tangencial de leitura do CD varia do centro para a borda do disco (início e fim da gravação, respectivamente). Com o uso de subcódigos esta variação de rotação é extremamente precisa.

A despeito das discussões controversas sobre o que é melhor -- o LP, com o som mais "natural" ou o CD, livre de ruídos indesejados -- o fato é que o CD se popularizou, na era da mobilidade, através dos tocadores portáteis, som automotivo etc. Mas a tecnologia caminha vertiginosamente, e o reinado do CD foi deposto pelos arquivos digitais, como o MP3, compartilhados aos milhões na internet, para desespero das gravadoras.

1.9 Os arquivos digitais

Como vimos, com as gravações digitais, o áudio passou a ser armazenado não somente em mídias físicas (como discos, fitas ou CDs), mas também em arquivos digitais. E, de todos os formatos de arquivos de áudio conhecidos (WAV, AIF, MP3, OGG, WMA, AAC etc.), certamente o mais difundido pelo mundo, especialmente através da internet, foi e ainda é o MP3.

O MP3 é essencialmente um algoritmo de compressão que começou a ser desenvolvido na Alemanha, em 1987, pelo IIS (Institut Integrierte Schaltungen), tendo como os principais envolvidos no projeto os desenvolvedores Ernst Eberlein, Thomas Sporer, Karhl Heinz Brandenburg, Bern Grill e Bernd Kurten. A sigla MP3 deriva do nome dado a esse

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sistema de compressão: MPEG (Moving Picture Expert Group)Audio Layer 3. O objetivo final era o de se conseguir uma taxa de compressão que permitisse reproduzir som com a qualidade de CD, mas que resultasse num arquivo significativamente menor do que o conhecido WAV (arquivo de áudio sem compressão).

Assim, ao longo de toda a pesquisa, a sociedade Fraunhofer, que é uma das maiores organizações de pesquisa europeia e que fazia parte do grupo MPEG, começou a procurar meios de comprimir o áudio mantendo uma alta qualidade. Depois de um trabalho de vários anos, os padrões foram implementados em 1991, no MPEG 1 Audio Layer 3. Três anos depois apareceriam melhoramentos com o MPEG 2 e, em 7 de Julho de 1994, a sociedade Fraunhofer produziu o primeiro codificador de MP3.

O sucesso do MP3 residiu nas enormes vantagens que tinha em relação aos outros formatos digitais de música. O principal foi, sem dúvida, o seu tamanho. Como exemplo, usando a compressão de 128 bits numa música de 5 minutos, teríamos um arquivo MP3 com cerca de 5MB (megabytes). Só para se ter uma ideia da diferença, para a mesma música, o formato mais popular no momento, o WAV, criava um arquivo digital com cerca de 50MB.

Mas a qualidade sonora do MP3, apesar de razoavelmente boa, é tecnicamente inferior à de um CD. Em suma, o que os criadores deste formato fizeram foi retirar do áudio as frequências inaudíveis à audição humana. Este processo, que permite a redução do tamanho dos arquivos a 1/10 do seu tamanho original, traz, entre outras perdas, o corte de frequências abaixo de 40 Hz e acima de 14.000 Hz. Essa perda pode parecer pouco significativa, principalmente no início dos anos 90, quando a indústria lançava seus primeiros gravadores digitais.

Entretanto, com o desenvolvimento dos sistemas de gravação, hoje capazes de gravar com taxas de amostragem de 192 kHz e 24 bits (alguns sistemas em até 32 bits), como os sistemas Pro Tools e equivalentes, essa redução de qualidade nos arquivos comprimidos tornou-se mais perceptível.

E novamente, a íntima relação entre obra e suporte se faz presente: '...os produtores também começaram a alterar a forma como mixam os discos, para assim compensar as limitações do MP3. 'Você precisa se preocupar em como as pessoas irão ouvir a música, e quase todo mundo está ouvindo MP3', diz o produtor Butch Vig, membro do Garbage e produtor do clássico Nevermind, do Nirvana. 'Alguns dos efeitos se perdem. Por isso, você precisa exagerar as coisas de vez em quando'". (LEVINE, 2008. In: PAIVA, 2014).

Em 1999 foi criado o Napster, que foi a primeira rede de compartilhamento de arquivos, a qual permitia aos seus utilizadores compartilharem arquivos MP3 a qualquer hora

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e em qualquer lugar do mundo. Obviamente, as gravadoras processaram o Napster, que foi forçado a encerrar em 2001. Mas, durante os três anos em que esteve em funcionamento, chegou a ter oito milhões de utilizadores online simultaneamente e quando fechou estima-se que eram trocados cerca de 20 milhões de arquivos MP3 por dia.

Este enorme sucesso demonstrou a enorme popularidade que o MP3 tinha conseguido junto aos seus utilizadores e à comunidade em geral, levando ao desenvolvimento dos leitores de MP3 portáteis, como o iPod, lançado pela Apple em 2001. Afonso Lima (2017) coloca que,

com o surgimento do formato, a música começou a se tornar um dos principais tipos de dados digitais compartilhados na internet de forma ilegal, o que fez com que a indústria musical daquela época perdesse a sua hegemonia. Essa nova forma de consumo possibilitou que muitos consumidores tivessem acesso a uma vasta biblioteca de arquivos digitais, trocando os produtos físicos, pelos arquivos digitais em uma velocidade vertiginosa. (LIMA, 2017).

Figura 19 - Primeira geração do iPod, da Apple, lançado em 2001. Fonte: foto do fabricante

Os recursos de armazenamento e manipulação digital trazem um ponto importante: se por um lado, busca-se a "fidelidade absoluta" em estúdios e sistemas de gravação cada vez mais poderosos, por outro lado os sistemas de reprodução de baixo custo (como fones de ouvido) e formatos de qualidade sonora reduzida (como o MP3), em nome da portabilidade, caminham em sentidos opostos.

Dispositivos móveis de escuta como celulares ou reprodutores de MP3, na contínua linha evolutiva dos walkmen, são reproduzidos via fones de ouvido de baixo custo, e a escuta ocorre em locais dos mais diversos, sempre concorrendo com os ruídos de

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fundo. Ou então, nas pequenas caixas acústicas de um kit multimídia padrão de um computador pessoal enquanto se navega na internet, também de baixa qualidade sonora. (PAIVA, 2014).

1.10 O streaming

Preocupada com a queda de vendas dos discos convencionais, a indústria musical viu uma possibilidade de controlar o compartilhamento digital através de uma plataforma de donwload legal, desenvolvida pela Apple: o iTunes. O aplicativo, inicialmente nativo e exclusivo dos dispositivos da mesma marca, permitia downloads pagos de um catálogo extenso de músicas. Com o passar dos anos, muitas produtoras musicais adotaram o serviço em seus lançamentos, de olho no grande aumento das vendas "virtuais". Outras marcas também lançaram suas próprias plataformas, como Amazon Prime, Comcast e Microsoft Zune, entre outros.

Foi então que os primeiros sites de streaming de música começaram a surgir. Este novo modelo possibilita que a música seja ouvida através da transmissão de dados pela rede, reproduzindo o conteúdo escolhido em tempo real e não mais dependendo de um armazenamento local de arquivos, mas acessando os dados de uma nuvem13. Com uma assinatura mensal, ao invés de pagar individualmente por cada música, o sistema traz não só a conveniência de não precisar mais armazenar arquivos em seus dispositivos, mas também permite o acesso a extensos catálogos de faixas dos mais variados tipos. "Essa rápida mudança deu continuidade ao processo de alteração do mercado e também criou novas vias de consumo e distribuição para as duas pontas da cadeia que alimentam o cenário musical: o artista e o consumidor." (LIMA, 2017).

Dentro desse modelo, alguns players surgiram e se destacaram, entre eles o Spotify, criado em 2009, na Suécia, por Martin Lorentzon e Daniel Ek. É considerado pela Federação Internacional da Indústria Fonográfica (IFPI) como um dos principais nomes dos serviços de streaming no mundo. Além disso, segundo recente publicação da revista Reuters, a plataforma já possui mais de 100 milhões de usuários ativos (somando-se os usuários pagantes e os que utilizam o aplicativo gratuitamente, de forma limitada). Além do citado Spotify, outras plataformas de streaming foram criadas, como Apple Music, Deezer e Rhapsody.

      

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Nuvem, em linguagem "cibernética", é um espaço de armazenamento na internet, onde o usuário pode salvar arquivos (música, fotos, textos etc.) e acessá-los a qualquer momento, desde que haja conexão com a rede.

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Figura 20 - Spotify Fonte: imagem do fabricante

Figura 21–Deezer Fonte: imagem do fabricante

De acordo com o relatório publicado em 2019 pela IFPI14,

      

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a receita de música digital cresceu 21,1%, alcançando 11,2 bilhões de dólares em 2018, ultrapassando a marca de 10 bilhões de dólares pela primeira vez e agora representando 58,9% da receita total de música gravada. Dentro do formato digital, o streaming teve um forte crescimento (34,0%), enquanto os downloads tiveram um declínio de 21,2%, caindo para 7,7% do mercado total.15 (Global Music Report, 2019, p. 15, T. A.).

O fato é que a realidade vem mudando e o baixo custo da assinatura dos serviços de streaming acaba por atrair os que buscam este entretenimento no conforto de suas casas. Além disso, hoje existe uma demanda por um conteúdo mais qualificado. Na internet temos diversas páginas de fan pages e blogs, formados por um público que critica e exige produções de boa qualidade, mas que também é fiel àquilo de que gosta. E o streaming se adaptou a essa realidade, pois ele está ligado a uma rede formada por uma comunidade de pessoas e o conteúdo oferecido passa a ser feito a partir da preferência do público que paga e opina pelo serviço. Algo que não acontece na pirataria, pois o produtor de conteúdo não tem uma relação com o cliente.

Outra questão importante, já presente na era do MP3 e acentuada com o advento do streaming é a possibilidade do usuário criar sua própria playlist, com canções desvinculadas de seu contexto original e colocando-as na ordem em que quiser. Os álbuns conceituais, com canções originais unificadas por um único tema, agora dão lugar aos singles, organizados a critério do usuário. Paiva coloca que "[...] é a partir do surgimento dos reprodutores digitais que encontramos os botões que permitem randomizar a escuta, com as faixas sendo reproduzidas em ordem aleatória, e quebrando a unidade que se encontra no álbum." (PAIVA, 2014). Os próprios sistemas de venda de música pela internet apontam essa questão como uma vantagem, uma vez que o consumidor pode comprar apenas o que quiser, e não o álbum inteiro.

Em tempos modernos, a música "virtual" se dissemina de tal maneira que passa a ser uma realidade comum, fazendo com que, em nome da praticidade e mobilidade, o objeto físico (tal qual um disco de vinil ou um CD) tenha caído em desuso. E essa ausência do material físico nos traz mais um ponto importante: na era do MP3, a música poderia surgir e desaparecer sem deixar rastros: "... é criada e difundida pela rede, no mundo virtual, e deixa de existir quando o ultimo ouvinte a deleta de sua máquina." (PAIVA, 2012). No streaming, o ouvinte não é detentor da mídia ou arquivo. A música só existe se houver conexão com a rede.

      

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Overall digital revenues grew by 21.1% to US$11.2 billion in 2018, crossing the US$10 billion mark for the first time ever and now accounting for 58.9% of total recorded music revenues. Within this format, the picture was varied with streaming pushing growth up strongly (increasing by 34.0% to US$8.9 billion), while downloads saw a decline of 21.2%, dropping to 7.7% of the total market. (Global Music Report, 2019, p. 15).

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"Sem vestígios da existência, sem fixação, todo um processo de crítica, análise e compreensão de questões estéticas se perde." (PAIVA, 2012).

As plataformas de streaming assumiram o papel do espaço de compartilhamento e até, em alguns casos, rede social, por conta das funcionalidades de interação entre os usuários. Conseguiram inserir a música em diferentes momentos da vida de quem faz parte desses espaços, potencializando a forma como consumidor, produtor e produto se relacionam. Mas nenhuma tecnologia teria real aproveitamento não fosse o produto que está por trás dela: a própria música, em sua essência, através da sonoridade.

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2 Conceituando a sonoridade

Sonoridade, por definição em dicionários comuns, se refere à qualidade sonora, ou à propriedade de produzir sons. Mas, apesar de ser muito empregado no campo da música, o termo ainda não possui uma definição melhor contextualizada. Dicionários de referência em música, como o Grove, não possuem o termo em seu conteúdo. Desta maneira, torna-se bastante amplo o conceito de sonoridade, e inicio esse capítulo buscando contextualizar quais são essas “qualidades sonoras” presentes no termo em estudo.

Guilherme Castro (2015) coloca que “o processo de atribuição de qualidades e valores que damos aos sons em um determinado contexto [...] nos permite entendê-los como música ou não.” No livro How do we hear music: the relationship between music and the hearing mechanism (2005), James Beament sugere origens para essa primeira qualificação dos sons em um sentido musical e apresenta um cenário interessante sobre o desenvolvimento da escuta musical. Som e música diferem justamente pelas qualidades atribuídas a ambos, dentro de um contexto cultural e histórico. "[...] nem todo som é música, mas toda música se serve do som [...]" (CASTRO, 2015).

Beament aponta que os primeiros objetos construídos pelo homem capazes de produzir sons foram criados com o intuito e a necessidade de autoproteção e sinalização. Desta maneira, não podemos afirmar que tais objetos surgiram com a intenção real de produzir música. No entanto, instrumentos com alturas definidas (flautas, instrumentos de percussão) foram encontrados em sítios arqueológicos, indicando que a linguagem e a música se desenvolveram concomitantemente. "Quando os sons deixam de ser índices de alerta, fertilidade e presença e se tornam uma construção simbólica sem outros propósitos vitais diretos, é quando eles se tornam música. Portanto, desse ponto de vista, pode-se até falar que o que é reconhecido como música é uma forma humana de uso e de atribuição simbólica dos sons." (CASTRO, 2015).

As questões sensoriais e da percepção sonora, em música, possuem uma importância distinta das mesmas na linguagem falada. Por isso, há normalmente uma distinção de conceitos entre o que vem a ser a sonoridade nos campos da linguística - que tratam mais de questões fonológicas - e da música - que tratam de questões mais complexas do uso e produção dos sons em geral. E a primeira variável que influencia a ideia de sonoridade vem das qualidades sensoriais dos sons musicais. Beament coloca que

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o que todos experimentam quando o som é recebido pelos ouvidos são sensações. E a música é uma série de sensações; ela começou como sensações e, por mais complexa e sofisticada que tenha se tornado, ainda é apenas um conjunto de sensações. Músicos criaram um número muito grande de termos que são simplesmente nomes para coisas que eles podem distinguir, ou acreditam que podem, em sensações. A maioria dos termos nos diz pouco sobre o que está produzindo essas características das sensações nos sons. [...] Compositores geralmente trabalham em busca das sensações que eles gostam e esperam que outras pessoas também gostem. [...] Descrever sensações não é fácil, [...] e algumas características das sensações musicais são virtualmente impossíveis de se descrever, mas, com uma considerável experiência, pode-se perceber que muitos dos termos se referem a fenômenos reais; alguns deles são pura ilusão.16 (BEAMENT, 2005, T. A.).

Podemos iniciar o processo de qualificação dos sons com base nas sensações. Beament sugere que qualificar o som em música está relacionado a dois fenômenos: “alturas definidas e padrões de tempo, onde ambos são artefatos, invenções da espécie humana”. (BEAMENT, 2005). Ainda de acordo com o mesmo autor, a velocidade com que esses dois fenômenos se uniram nas diversas sociedades e culturas, seja com predomínio dos padrões rítmicos ou alturas definidas, sugere que ambos são muito apreciados tão logo são experimentados.

Quando os sons musicais foram analisados há mais de cem anos atrás, os componentes que foram descobertos e chamados de harmônicos aparentemente ofereciam uma explicação simples para muitas coisas sobre música. Desde então, os físicos têm analisado e descrito os sons em muitos detalhes. Mas os sons no ar não são uma descrição das sensações. [...] Não se pode assumir que uma análise de um som musical mostre o que podemos ouvir; isso também tem levado as pessoas a acreditar que ouvem coisas que não podem. Suponha, por exemplo, que nós não pudéssemos ouvir harmônicos; algumas das explicações mais básicas da música entrariam em colapso. Com que precisão podemos ouvir os sons de uma quinta? Felizmente, menos exato do que muitos músicos acreditam que podem, pois, se pudessem, a música teria que ser tocada com tanta precisão que se tornaria impraticável. Mas essas questões dependem do nosso sistema auditivo e não das descrições dos sons.17 (BEAMENT, 2005, T. A.).

      

16  What everyone experiences when sound is received by the ears are sensations. And music is a series of sensations; it started as sensations and however complex and sophisticated it has become, it is still just a set of sensations. Musicians have devised a very large number of overlapping terms which are simply names for things they can distinguish, or believe they can, in sensations. Most of the terms tell us little if anything about what it is in the sounds which are producing those features of the sensations. Most musicians: composers and players don't know. Composers have usually worked entirely in terms of the sensations which they liked and hoped other people would like. Most listeners have no idea, though they usually know what they like and dislike. Describing sensations isn't easy, sound sensations happen to be difficult, and some features of music sensations are virtually impossible to describe, but with considerable experience, one comes to appreciate that many of the terms do relate to real phenomena; a few of them are pure delusion. (BEAMENT, 2005, p. 2-3). 

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When musical sounds were analysed over a hundred years ago, the components which were discovered called harmonics, appeared to offer a simple explanation for many things about music. Since then, physicists have analysed and described the sounds in great detail. But the sounds in the air are not a description of the sensations. There are what appear to be very obvious things in the sounds which do not appear to be in the sensations and very small things which do. One cannot assume that an analysis of a musical sound shows what we can hear; it has also led people to believe they can hear things which they can't. Suppose, for example, that we could not hear harmonics; some of the most basic explanations of music would collapse. How accurately can we hear the

Referências

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