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W. Benjamin coloca que toda música tem uma aura, que é indivisível. Ao se criar uma produção com trechos de várias gravações, essa aura se quebra e é questionável se ela ainda exista. Para Benjamin, a aura é definida como “uma figura singular, composta de elementos espaciais e temporais: a aparição única de uma coisa distante, por mais perto que ela esteja.” (BENJAMIN, 1994). De acordo com Benjamin, a aura da obra de arte é única e indivisível. Em seu ensaio, publicado pela primeira vez em 1936, A Obra de Arte na Era da

Reprodutibilidade Técnica, o autor analisa de que forma a reprodução da obra de arte altera o

seu caráter "aurático". Além disso, analisa qual o papel e a função do artista frente ao crescimento dos meios de comunicação e à reprodução de arte. O seu principal argumento é que, "na ausência de qualquer valor ao ritual da tradição na era da reprodução mecânica, a arte seria sobretudo uma prática política." (LEITE, 2014).

Paiva (2012) salienta que, ao se criar uma obra que é o resultado de diversas gravações emendadas entre si, pode-se questionar a existência desta aura que caracteriza a obra de arte. Isso também dá margem a uma eterna discussão em que as opiniões se dividem entre onde está a verdadeira arte: se na performance ou na gravação.

Segundo Benjamin, a aplicação da técnica de reprodutibilidade produzia uma ruptura da aura da obra de arte. Este conceito de aura na obra de arte é essencial para entender a teoria do autor. A aura é uma figura simbólica que se projeta no espaço / tempo. Esta forma simbólica corresponde ao valor da obra de arte. A modernidade, e a sua reprodução mecânica produziram uma ruptura nesta forma simbólica. Essa ruptura produziu a necessidade da posse do objeto e implicou alterações nas suas formas de reprodução e a construção da sua imagem simbólica. As formas de reprodução implicam que o objeto de arte passa a ser transitório e é reprodutível. Por outro lado, a sua imagem, nos diferentes objetos reproduzidos, passa a ser uma unidade, e é durável.

      

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Ensaísta, crítico literário, tradutor, filósofo e sociólogo alemão (1892 - 1940). Associado à Escola de Frankfurt, foi fortemente inspirado tanto por autores marxistas, como Bertolt Brecht, como pelo místico judaico Gershom Scholem. Seu trabalho, combinando ideias aparentemente antagônicas do idealismo alemão, do materialismo dialético e do misticismo judaico, constitui contribuição original para a teoria estética. Entre as suas obras mais conhecidas, contam-se A Obra de Arte na Era da Sua Reprodutibilidade Técnica (1936), Teses

A destruição da aura do objeto de arte, pela sua reprodução mecânica, além de afetar a sua autenticidade, retira esse objeto do seu invólucro e o transforma em mercadoria. A arte, como mercadoria, passa então a constituir-se como um valor de culto que necessita se exibir de forma constante e renovada no tempo.

[...] a aura da obra de arte possui, para Benjamin, dois elementos principais: autenticidade e unicidade. A primeira se relaciona a seu substrato físico. Constitui o invólucro que envolve a essência da obra e contém seus elementos temporais e espaciais. Esse invólucro é peculiar por ser único, indissociável da essência da obra de arte e por registrar as transformações físicas e a história das relações de propriedade da obra. A unicidade, por sua vez, tem fundamento teológico, ritualístico. Confere à obra de arte um caráter único, pois a associa a um valor de culto. (ARAÚJO, 2010).

Em suma, a autenticidade é o "aqui e agora" da obra de arte, fundamentado em sua cultura, história, momento. A unicidade é o "caráter único e tradicional da obra". A ruptura da aura do objeto artístico leva à perda desses elementos, que são a essência e a personalidade da obra, e a uma alteração do seu valor de culto. Benjamin reconhece que a obra de arte, em sua essência, sempre pode ser reproduzida. Mas os elementos da aura, mesmo com toda a tecnologia disponível, não são possíveis de serem reproduzidos com perfeição. A autenticidade e a unicidade da obra de arte aurática são, para Benjamin, únicas e não podem ser reproduzidas.

“[...] a obra de arte reproduzida é cada vez mais a reprodução de uma obra de arte criada para ser reproduzida.” (BENJAMIN, 1994). Com a reprodução, a obra de arte perde a autenticidade e unicidade e passa a ser uma produção em série, sem caráter fixo no tempo e no espaço. Além disso,

a obra de arte torna-se cada vez mais perfectível. Diferentemente de artes como a escultura, as novas técnicas permitem a refeitura ou a mudança de rumos na produção. Em seu texto, Benjamin explora o potencial de perfectibilidade do cinema, demonstrando como seu processo de produção é fragmentário, antitotalizante e oferece uma série de alternativas de manipulação das cenas e dos atores, conforme a vontade do diretor. (ARAÚJO, 2010).

O crescimento das artes perfectíveis é, para Benjamin, "mais uma evidência da renúncia de valores eternos pela arte moderna." (BENJAMIN, 1994). A reprodução da obra de arte permite que a mesma seja aprimorada por seus receptores e criadores, de acordo com a perfectibilidade pretendida. Uma película não é filmada apenas uma vez; ela é montada por um profissional com muitas imagens de diversos takes, visando justamente a perfectibilidade. Quanto mais a obra reproduzida for aprimorada (ou alterada), menos ela se aproxima da

forma original a que foi concebida, por mais perfeito que seja esse aprimoramento. Na era da técnica e da reprodutibilidade, o fundamental é distribuir cópias (criar produtos) e faturar (distribuir no mercado), criando sempre novas necessidades de consumo.

Para Benjamin,

a produção artística foi alterada pelo processo da sua reprodutibilidade técnica. O desenvolvimento do processo industrial na produção de obras de arte altera a sua função simbólica. A obra de arte sempre foi reprodutível. Sempre se fizeram cópias dos objetos de arte. No entanto, a indústria altera profundamente os processos de produção / consumo das obras de arte, produzindo uma passagem da obra de arte de um valor de culto para um valor de exibição. (LEITE, 2014).

A mudança simbólica do valor de culto para o valor de exibição leva a uma alteração dos processos de exposição. A exposição, que antes era feita a serviço do ritual, passa a estar a serviço da reprodução serial. Constituiu-se uma mudança de valores que recria o papel da arte na sociedade. "O objeto de arte deixa de ser uma experiência única, vivida no espaço e no tempo, para passar a ser uma experiência com objetos que se sucedem no espaço e no tempo." (LEITE, 2014).

Por todo o exposto, e agora trazendo para o foco principal deste trabalho, qual medida ou critério devemos utilizar na edição de uma execução gravada? Conforme as considerações de Benjamin, para que uma obra de arte -- aqui já direcionando para a música erudita -- seja valorada e conquiste o consumidor final -- o ouvinte --, ela precisa estar "perfeita", dentro das possibilidades e respeitando os limites socioculturais aos quais está inserida. Essa perfeição buscada (e talvez nunca alcançada) só é possível através da edição. Porém, essa edição deve respeitar as nuances interpretativas, bem como preservar dinâmicas, timbre, estilo e características individuais de cada executante. Então, uma vez assumida a importância da edição na música erudita, precisamos de ferramentas adequadas para que esse minucioso trabalho seja realizado satisfatoriamente. Na tecnologia digital, podemos contar com as estações de trabalho (DAW - Digital Audio Workstation).

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