• Nenhum resultado encontrado

Contraposições explanatórias acerca do empresário individual e da empresa individual de responsabilidade limitada

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "Contraposições explanatórias acerca do empresário individual e da empresa individual de responsabilidade limitada"

Copied!
45
0
0

Texto

(1)

GIOVANI DOS SANTOS DE SÁ JUNIOR

CONTRAPOSIÇÕES EXPLANATÓRIAS ACERCA DO EMPRESÁRIO INDIVIDUAL E DA EMPRESA INDIVIDUAL DE RESPONSABILIDADE LIMITADA

Ijuí (RS) 2019

(2)

GIOVANI DOS SANTOS DE SÁ JUNIOR

CONTRAPOSIÇÕES EXPLANATÓRIAS ACERCA DO EMPRESÁRIO INDIVIDUAL E DA EMPRESA INDIVIDUAL DE RESPONSABILIDADE LIMITADA

Trabalho de Conclusão do Curso de Graduação em Direito objetivando a aprovação no componente curricular Trabalho de Curso - TC.

UNIJUÍ - Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul.

DCJS - Departamento de Ciências Jurídicas e Sociais.

Orientadora: MSc. Etiane da Silva Barbi Köhler

Ijuí (RS) 2019

(3)

Dedico este trabalho a todas as pessoas que me auxiliaram nesse começo dessa longa caminhada de desbravamento da ciência que estuda o direito.

(4)

AGRADECIMENTOS

Agradeço, primeiramente, à minha orientadora, Professora Etiane Köhler, pela paciência despendida, assim como por todos os lampejos esclarecedores de sabedoria que me possibilitaram compreender a matéria pesquisada, auxiliando a construir, paulatinamente, os conhecimentos que aqui pude depositar, desde a época em que tive a oportunidade de ter sido estagiário na Procuradoria Geral do Município de Ijuí.

Agradeço, também, a Deus por me dar forças para concluir a pesquisa, assim como suportar todas as intempéries consectárias do término da graduação. Agradeço de igual modo ao meu anjo protetor, por sempre estar comigo e me escudar em todos os momentos.

Agradeço, ainda, de maneira muito especial, à minha namorada Leticia Thais Ribeiro, pelo auxílio e companheirismo nas madrugadas transpassadas em claro para o término dessa monografia.

Nesse mesmo sentido, agradeço à minha família, em especial, ao meu pai Giovani dos Santos de Sá e aos meus tios Rene Tabile Dias, Daniele Pascoal, Eliane Kemp Miller e Chris Miller, por possibilitarem a minha graduação.

Agradeço, por fim, a todos os meus professores que tive desde o ensino fundamental até a graduação, servidores públicos do Poder Judiciário, advogados, procuradores do Município de Ijuí, enfim, todos os operadores do direito que, incidentalmente, me auxiliaram nessa empreitada compartilhando os seus conhecimentos para que eu pudesse compreender o direito.

(5)

“É necessário fazer outras perguntas, ir atrás das indagações que produzem o novo saber, observar com outros olhares através da história pessoal e coletiva, evitando a empáfia daqueles e daquelas que supõem já estar de posse do conhecimento e da certeza.” Mario Sergio Cortella

(6)

RESUMO

As relações oriundas das atividades comerciais possuem regramento próprio definido e regido pelo Direito Empresarial. No ordenamento jurídico pátrio há diversas espécies de sujeito de empresa, entretanto, a presente pesquisa explorará tão somente as que desenvolvem suas atividades de maneira singular, seja através de um Empresário Individual (pessoa natural), seja através de uma Empresa Individual de Responsabilidade Limitada (pessoa jurídica). Pretende-se, também, elucidar de maneira metódica a história que circunda as transmutações legais e teóricas, atentando-se a todas as conjecturas políticas e sociais de cada época. Ainda, vislumbra-se tecer as definições teóricas, as características e possibilidades de responsabilização patrimonial dessas duas espécies de sujeito de empresa. No mesmo sentido, verificar a ocorrência da unificação do Direito Civil e Empresarial, assim como o aporte das novas teorias correlacionas à atividade, agora, denominada empresarial. Por derradeiro, passa-se a análise de jurisprudências que em seus bojos de fundamentação carregam vícios pela inobservância do que preconiza a legislação empresarial vigente, bem como do que assinala a doutrina moderna acerca dos institutos compulsados.

Palavras-Chave: Direito Comercial. Direito Empresarial. Empresário Individual. Empresa Individual de Responsabilidade Limitada. Afetação Patrimonial. Jurisprudências.

(7)

SOMMARIO

Le relazioni derivanti da attività commerciali hanno le proprie regole definite e regolate dal diritto commerciale. Esistono diversi tipi di soggetti aziendali nel paese, tuttavia questa ricerca esplorerà solo quelli che sviluppano le loro attività in modo singolare, sia attraverso un singolo imprenditore (persona fisica), sia attraverso una società individuale a responsabilità limitata (persona giuridica). Ha anche lo scopo di chiarire in modo esauriente la storia che circonda le trasmutazioni legali e teoriche, tenendo conto di tutte le congetture politiche e sociali di ogni epoca. Tuttavia, si prevede di tessere le definizioni teoriche, le caratteristiche e le possibilità di responsabilità patrimoniale di queste due specie di soggetto aziendale. Allo stesso modo, per verificare il verificarsi dell'unificazione del diritto civile e commerciale, nonché il contributo delle nuove teorie relative all'attività, ora denominate affari. Infine, vi è l'analisi della giurisprudenza che, nel suo nucleo di ragionamento, porta i vizi per la non osservanza di ciò che la legislazione commerciale attuale sostiene, così come ciò che la moderna dottrina sugli istituti obbligatori sottolinea.

Parole Chiave: Diritto Commerciale. Diritto Commerciale. Imprenditore Individuale. Società a Responsabilità Limitata Individuale. Asset Asset. Giurisprudenza.

(8)

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 9 1 RETROSPECTIVA HISTÓRICA DO DIREITO COMERCIAL ... 11 1.1 A evolução do Direito Comercial desde a era medieval até a contemporaneidade ... 12 1.2Concepções teóricas modernas do Direito Comercial brasileiro... 18 1.3 Transmutação ampliativa: o aporte das teorias de Direito Empresarial ao ordenamento jurídico brasileiro ... 22 2 DO EMPRESÁRIO INDIVIDUAL E DA EIRELI ... 26 2.1 Conceitos, características e limitações das duas espécies ... 27 2.2 As formas e possibilidades de afetação e responsabilização patrimonial .. 31 2.3 Ponderações zetéticas acerca dos erros teóricos jurisprudenciais referentes às peculiaridades das duas espécies de sujeitos de empresa abordadas ... 35 CONCLUSÃO ... 41 REFERÊNCIAS ... 43

(9)

INTRODUÇÃO

Vislumbra-se incomensurável o quão mutável é o denominado Direito, antes Comercial, agora, Empresarial. Em expressa virtude disso, cabe ao operador do direito se atentar a todas essas transformações ao passo que ocorrem, sob pena de demonstrar inabilidade em uma área exponencialmente necessária para a resolução de diversas contendas administrativas e judiciais. Assim, é imperioso ter em seu arsenal teórico o pleno domínio desse instituto, desde as regras gerais até suas profundas nuances decorrentes de interpretação legislativa ou jurisprudencial.

Nesse panorama, propõe-se, em um primeiro momento, a reconstrução histórica científica do Direito Comercial, até, enfim, a sua alteração de nomenclatura, perpassando diversos momentos históricos com cenários políticos e sociais que influenciaram diretamente nessas transmutações. Portanto, se elucidará a incidência estatal quando da avocação da função de ser o ente regulador das atividades mercantis, assim como de todo o exercício da empresa, respeitada a autonomia privada.

Como sabido, tendo em vista que o Brasil foi um país inteiramente colonizado por exploradores, na maioria das vezes, europeus, muito das legislações alienígenas foram incorporadas ao ordenamento jurídico pátrio da época, inclusive, mesmo após a declaração de independência política, com a proclamação da república federativa.

Por esse cenário, pretende-se elucidar como ocorreu a evolução do Direito Comercial a partir de um horizonte investigativo, sopesando, especialmente, as duas espécies de sujeito de empresa, sendo uma reformulada e a outra criada com a

(10)

vigência do Código Civil de 2002, visando, justamente, regularizar o exercício da atividade organizada exploratória com subsídios legais corolários do direito posto.

Ademais, abordar-se-á minuciosamente as diferenças existentes entre o Empresário Individual e a Empresa Individual de Responsabilidade Limitada (EIRELI), com escopo de prover um epílogo no que tange às confusões correlacionadas às duas espécies, precipuamente, nas suas distintas formas de afetações patrimoniais decorrentes do inadimplemento de obrigações e possibilidade de solvibilidade através da expropriação de bens.

Destarte, é evidente que a jurisdição – por ser intentada e concretizada por humanos, e, portanto, abre-se margem para erros – reflete os mesmos erros teóricos advindos da falta de domínio dos conceitos de Direito Empresarial, e, nesse viés, serão apontadas tais inconsistências, bem como debatidas as suas resoluções através da apresentação de solução hígida para cada caso compulsado.

Outrossim, quanto à metodologia escolhida, registra-se que essa pesquisa ocorreu de maneira crítica-investigatória, regida com veemência pela aglutinação de doutrinas e demais informações em documentos físicos ou digitais, formando um arsenal teórico com tantos materiais promulgadores de conhecimento quanto bastarem para elucidação do tema em voga, bem como para facilitar a proposição de hipóteses resolutivas.

Por derradeiro, o cerne da presente pesquisa se consubstancia no anelo de desmistificar o Direito Empresarial de modo didático, erradicando as principais causas de confusões de institutos provenientes verdadeiramente da incapacidade de compreensão plena da doutrina e, de igual maneira, das legislações atinentes à matéria.

(11)

1 RETROSPECTIVA HISTÓRICA DO DIREITO COMERCIAL

Em geral, constata-se que as pesquisas que partem da explanação dos flancos das acepções históricas são, até certo ponto, desprezadas erroneamente, calcadas no falso pretexto de que os conhecimentos advindos de uma análise pela retrospectiva se traduzem em meras informações tautológicas que se afastam descomedidamente da aplicação prática. O que será demonstrado nesse capítulo é que tal ideologia não passa de uma cognição mal formulada proveniente do senso comum, uma vez que todas as definições culturais perpassadas através dos grandes lapsos temporais a seguir compulsados são de grande importância para o direito – de qualquer ramo – na atualidade.

A originalidade dos conceitos, institutos, modalidades e características dos mais variados ramos da ciência que estuda o direito são aspectos consectários justamente dos movimentos dos desbravadores doutrinadores antepassados. Assim, por mais que o escoamento do tempo aprovisione alterações ou petrifique definições diversas daquelas no prólogo concebidas, esses institutos jamais terão os seus princípios basilares (historicamente criados) alterados de modo que não reste resquícios das concepções jurídicas dos criadores primários.

É evidente, nesse contexto, que o amor pelo conhecimento se enxerta como um diapasão apaziguador, explicando essas transmutações intelectuais jurídicas, pois, afinal, a filosofia do direito, enquanto matriarca dos conhecimentos até então frutificados, pode ser metaforicamente traduzida como um movimento de sobreposições de hipóteses teóricas que vislumbram, incessantemente e alfim, encontrar uma verdade – acredita-se, intangível – para cada questionamento humano, de qualquer área científica social.

Nesse empenho, por mais que o caminho seja árduo e tempestuoso, consubstanciado em terminologias arcaicas e dispositivos legais já de outrora revogados, o troféu da empreitada emerge a partir do entendimento de que se a concretização do conhecimento se perpetrar nas bases teóricas (provindas do historicismo puro), mesmo que haja a ab-rogação de todo um complexo ordenamento jurídico, na necessária criação de um novo - ou até mesmo na

(12)

manutenção do derrogado - as bases históricas virão novamente à tona e serão aventadas na forma de princípios maiores, como sempre foram.

Inclusive, tais estudos históricos auxiliam na propagação do pós-positivismo, com a jurisdição em sua máxima eficácia, visto que haverá o deslinde de dicotomias legais com fulcro na leitura de seu escopo historial, visando compreender o cerne da existência dos institutos jurídicos, possibilitando uma aplicação baseada na equidade e adaptação da legislação ao caso concreto não somente com sua aplicação literal, mas sim, através da subsunção balanceada de acordo com o caso concreto, sem que isso necessariamente venha ferir a imprescindível segurança jurídica.

No panorama do Direito Comercial, entabula-se um desafio instigante e grandioso, em virtude da sua inescusável complexidade, fazendo com que a investigação através de uma remontagem histórica dos acontecimentos deva ser, no mínimo, informacional e didática, razão pela qual depreende-se a necessidade de justificativa de uma introdução ao passo que se adentra na história propriamente dita, talhada por cenários políticos-sociais diferentes, mas ainda compatíveis com a sociedade atual.

Por derradeiro, giza-se que nenhuma forma de conhecimento pregresso no ramo do direito existe a partir de uma conceituação totalmente original, desconexa de outras vertentes e construções doutrinárias antigas, e, por esse motivo, se evidencia mais ainda a importância da abordagem proferida a seguir, no intento de traçar um caminho lógico-científico na reconstrução do cenário de desenvolvimento do Direito Comercial, até a sua transformação pela readequação terminológica e conceitual.

1.1 A evolução do Direito Comercial desde a era medieval até a contemporaneidade

É cediço que o Direito Comercial é tão antigo quanto o próprio comércio, e, portanto, evidencia-se ser um instituto tão arcaico quanto as próprias relações

(13)

subjetivas não violentas (MIRAGEM, 2010, p. 2), uma vez que se fez necessária a criação de ditames, seja por direito posto, seja por direito consuetudinário, para reger as negociações que visavam à satisfação das necessidades através das permutas mercantis.

Aponta-se, nesse caminho, que as primeiras civilizações da antiguidade a se ter notícia de que praticavam atos de comercialização eram os fenícios, seguidos das civilizações greco-romanas, até a transcendência evolutiva provinda da idade média, com a notável crise concentrada na Europa, partindo, daí, as primeiras concepções de Direito Comercial que mais se assemelham com as noções contemporâneas do ramo (MIRAGEM, 2010, p. 2).

Por essa estrada cognoscível, elucida MIRAGEM (2010, p. 25), que com a influência cristã sobre Roma, e, pelo alastramento desse poderio intervencionista à Europa, houve um momento de menosprezo da Igreja com relação aos atos mercantis, fomentando na queda da utilização das atividades comerciais. Nesse viés, WIEACKER (1980, p. 269) salienta que mesmo que o direito romano tenha auxiliado na propagação das atividades voltadas à comercialização, não é desse momento histórico que o direito propriamente comercial se desenvolve enquanto instituto.

Nesse contexto histórico, MIRAGEM (2010, p. 2-3), ressalta que:

O direito comercial nasceu então para regular estas relações de comércio, inicialmente por intermédio das corporações, para em seguida expandir seu alcance no mesmo grau do desenvolvimento econômico, vindo a transformar-se em direito dos negócios, independente de maiores formalidades.

A partir dessa evolução temporal, o que se altera, em um primeiro momento, é o protagonismo da relação negocial entabulada, que, agora, passa a ser o sujeito que pratica as atividades mercantis, denominados comerciantes, alavancando e avocando os ônus e bônus dessa exploração às próprias partes negociantes, aflorando as primeiras noções de mínima intervenção estatal no que concerne ao domínio do patrimônio privado.

(14)

Com o transpasse do tempo, a sistemática que sobreleva os sujeitos dessas relações são influenciadas pelas tendências de cunho objetivistas, que, em última análise, sustentam a primazia da regência dos atos de comércio sobre o sujeito, passando o ato de comércio a cerne desse ramo do direito (VIVANTE, 1932, p. 6, apud MIRAGEM, 2010). Sendo assim, em tal época, o comerciante ganhava tal nomenclatura no momento em que praticasse quaisquer atos do comércio correlatos à atividade negocial.

Na atualidade, tem-se uma aproximação dessas teorias no sentido de que há relação entre os conceitos subjetivos e objetivos, ao passo que se regulamenta as relações jurídico-privadas, no que tange ao exercício dessas atividades mercantis (MIRAGEM, 2010, p. 3).

Em contrapartida, CARVALHO (1937, p. 60) pondera no que se refere às distinções entre as teorias:

[...] não se concebiam um absolutamente distinto do outro; consideravam-se sempre reunidos, mas o elemento subjetivo não era muitas vezes mais do que um pressuposto ideal. A fusão dos dois elementos, em começo completa em todos os atos de comércio, em muitos se torna mais teórica e ideal do que efetiva. De fato era o elemento objetivo que imprimia a muitos atos o caráter comercial, desde que, em última análise, sobre a qualidade do ato se fixava a ficção de ser o comerciante o autor.

Os pontos iniciais de estruturação do Direito Comercial que denominam-se institutos, necessariamente se enraízam a diversas matrizes. No lado das disciplinas dos títulos de crédito, o seu epílogo é constatado na movimentação mercantil das cidades lombardas (italianas). Por outro lado, no que se correlaciona às obrigações atidas como comerciais, observa-se como precursoras as atividades comerciais entre as regiões de Flandres, Champanha, Alemanha Central, dentre outras (WIEACKER, 1980, p. 269).

Concomitantemente a isso, FERREIRA (1927, p. 19) afirma que:

(15)

da atividade comercial naquele tempo eram as denominadas corporações de ofício, associações de profissionais cuja filiação era pressuposto do exercício da atividade comercial. A admissão como membro destas corporações, de sua vez, era dificultada por exigências diversas. Em primeiro lugar, o candidato a integrá-las deveria ser aprendiz do ofício, por período fixado no regulamento respectivo. Deste ascendia à condição de companheiro e daí a artífice propriamente dito. Esta passagem, todavia, não se dava sem desafios. Estas corporações espalharam-se por toda a Europa, sendo conhecidas na Alemanha, Inglaterra, França Escandinávia e Países Baixos também como hansas.

Ainda, de comentar que, no século XIV, o comerciante francês era incumbido de peregrinar todo o território gálico, perpassando todas as cidades francesas, para que se aperfeiçoasse no seu trabalho comercial. Após, o processo continuava com a execução de sua obra-prima, e, em seguida, a apreciação desse trabalho pelos jurados, que concederiam ou negariam a permissão para o comerciante estruturar o seu próprio estabelecimento (FERREIRA, 1927, p. 27).

Nessa seara, é oportuno frisar que o apogeu do direito das sociedades teve seu gênese com as companhias comerciais do século XVI, que eram espécies de sujeitos de empresa similares às sociedades por quotas, em período anterior à propulsão do capitalismo na Europa Central. No mesmo interregno, evidencia-se algo muito característico do Direito Comercial, que é a sua não submissão às fronteiras políticas nacionais, haja vista que as atividades mercantis não cingiam-se a atuações internas, e, sim, expandiam-se às conexões comerciais entre distintas regiões (WIEACKER, 1980, p. 269).

Por anteâmbulo às concepções teóricas modernas do Direito Comercial, FRANCO (1993, p. 52-53) preconiza que:

A tendência moderna do direito comercial indica uma retomada desta característica marcadamente internacional, bem como o reforço à crescente publicização dos seus conteúdos, como conseqüência da sua relação com a atividade econômica em geral e seu revestimento de interesse público, a ser defendido pelo Estado. Nota-se, todavia, que esta defesa estatal, longe dos moldes com os quais atuou no passado, inspira-se em novo paradigma, originário das incompatibilidades entre a tendência de internacionalização e as velhas pretensões do dirigismo econômico, e mesmo deficiências do sistema político-institucional.

(16)

Outrossim, no tocante à intervenção estatal, salienta-se que, mesmo através de uma mínima atuação (como se vislumbra a partir de uma visão liberalista), o Estado possuiu a suma importância enquanto ente encarregado de normatizar as relações envoltas pelo Direito Comercial, tendo como contraponto a internacionalização das relações econômicas decorrentes da estruturação ampliativa denominada de globalização.

Através desse momento, portanto, que a intervenção estatal emerge enquanto regulamentação econômica, nem sempre tão imediata quanto à dinâmica do mercado comercial, mas entabulando, assim, as bases para segurança jurídica desse instituto (MIRAGEM, 2010, p. 15).

À luz dessas ideologias históricas em constante transformações, é que se assentam as primeiras impressões e conotações históricas corolárias do estudo do Direito Comercial como uma vertente em ascensão (histórica e fática), que vai, ano após ano, se adaptando e adequando para prover o atendimento às mais basilares necessidades advindas da exploração de atividades econômicas com a validação estatal no que tange às necessárias regências das normas positivadas.

Por conseguinte, guinando de um cenário internacional mais voltado à Europa, pela grande influência sob os países da América-latina, aporta-se o momento de enfoque ao panorama de desenvolvimento do Direito Comercial Brasileiro, que se insurge a partir de premissas históricas totalmente conexas às teorias europeias, advindo de uma construção paulatina, em razão das dificuldades normalmente políticas evidenciadas pelas crises nacionais de repercussão geral.

Nessa esteira, aduz MIRAGEM (2010, p. 6) que:

No Brasil, o incremento da atividade comercial esteve vinculado de modo estreito com sua situação política, em especial, nos primórdios, às relações estabelecidas com Portugal. Durante a fase colonial da história brasileira, a dimensão do direito comercial estará vinculada, enfaticamente, à tradição jurídica portuguesa e suas alterações ao longo dos anos. Quaisquer informações sobre o direito comercial neste período passam, obrigatoriamente, pelas ordenações portuguesas, parte da estrutura jurídica lusitana desde o século XV.

(17)

Com relação à inauguração positivista do Direito Comercial pátrio, denota-se que o direito vigente no período colonial quedou sem significativas alterações, após a instituição das Codificações Filipinas. Entretanto, houve uma atividade legislativa hermenêutica memorável logo em seguida, conforme leciona REQUIÃO (1995, p. 15):

[...] a atividade de interpretação e integração das normas sofreu substanciais alterações ao longo do tempo, muito por conta da Lei de 18.08.1769, designada Lei da Boa Razão. Teve este diploma o condão de autorizar a invocação subsidiária de normas de direito estrangeiro das nações "de boa, depurada e sã jurisprudência". Esta lei, que de resto operou importante evolução do direito em geral, em relação à disciplina comercial, tem marcada importância, uma vez que torna possível a influência direta do Código de Comércio francês de 1807 e, mais tarde, das codificações espanhola (1829) e portuguesa (1833), lançando os sedimentos à construção do direito comercial pátrio.

Por outro viés, assinala-se que o referido Código Português de 1833, de idêntica forma, foi afligido pelo grande problema do Direito Comercial até os dias atuais, qual seja, a incapacidade de o direito posto conseguir acompanhar o desenvolvimento da atividade mercantil, tendo em mira que a progressão das atividades de negociação são demasiadamente voláteis e, em virtude disso, aborda MIRAGEM (2010, p. 8):

Algumas décadas depois já abundavam em Portugal leis extravagantes, como a de sociedades anônimas (1867) ou de marcas e patentes (1883). Isto determinou a necessidade de elaborar-se novo Código, o que coube a Veiga Beirão, que veio a ser promulgado em 1888.

Destarte, no Brasil, giza-se que as legislações inseridas ao seu ordenamento jurídico, eram (e de certo modo, até hoje são) inspirações provenientes de normas importadas de outros países europeus, e, consecutivamente, os mesmos problemas evidenciados nas legislações internacionais, reverberaram de sobremodo idêntico com o agravamento oriundo das intensas crises políticas concebidas por um país, recentemente, declarado independente de seus colonizadores.

(18)

É nesse cume que se possibilita o avanço da história do Direito Comercial Brasileiro, através de ideologias modernas, inovadas pela chegada do espírito reformador e progressista do século XIX, precipuamente, pela constatação da imprescindível criação de um visionário Código Comercial, que a seguir será compulsado.

1.2 Concepções teóricas modernas do Direito Comercial brasileiro

Com a proclamação da independência da República Brasileira (1822), o Império republicano editou, em 1823, uma lei que determinou a permanência da vigência das legislações portuguesas. “Observa-se, neste primeiro momento, a vigência de diplomas dos séculos XVII e XVIII relativamente à atividade comercial (MIRAGEM, 2010, p. 8).

Cerca de 10 anos após esse período, surgiu a necessidade de elaboração de um Código Comercial, e, conforme explicita CARVALHO (1937, p. 92).

Em 1832, saindo o país dos tumultos da abdicação de Pedro I no ano anterior, as iniciativas para redação da codificação comercial se ampliaram, sendo designada comissão de comerciantes para realização da tarefa. Compreendeu o projeto a divisão da matéria em três partes, sendo a primeira relativa às pessoas do comércio (contratos e obrigações), a segunda sobre comércio marítimo e a terceira sobre as quebras. As fontes imediatas da elaboração do projeto observam-se na sua exposição de motivos, a qual indica sua inspiração, quanto à primeira parte, nas codificações francesa, espanhola e portuguesa, relacionando os motivos para o sensível afastamento em relação à legislação estrangeira nas demais partes.

O Código Comercial brasileiro entrou em vigor em 1850, após a sua definitiva aprovação pelas câmaras legislativas e era dividido em três partes. A primeira versava sobre Do Comércio em Geral, a segunda, Do Comércio Marítimo, e, por fim, a terceira, Das Quebras. O Título Único, Da Administração da Justiça nos Negócios e Causas Comerciais, era subdividido em dois capítulos, quais sejam, Dos Tribunais e Juízos Comerciais e Da Ordem do Juízo nas Causas Comerciais (MIRAGEM, 2010, p.10).

(19)

Analisando esse instrumento legislativo existente desde 1850, depreende-se que ele foi criado com o aproveitamento das contribuições jurídicas importadas da legislação estrangeira, sem carecer de características voltadas às problemáticas nacionais, suprindo as necessidades básicas inerentes àquele período histórico (MIRAGEM, 2010, p. 10).

Com efeito, é de se evidenciar que a atividade comerciária não quedou dependente tão somente do Código Comercial de 1850, mas, também, debruçou-se em regulamentos oriundos de Decretos, uma vez que, naquele tempo, era comum que a regulamentação aparentemente comercial (pura) abordasse searas diversas, necessitando, portanto, de auxílios de instrumentos normativos para além do códex.

A despeito desse ponto específico da história, afere CARVALHO (1937, p. 108) que em virtude da descomedida intervenção estatal na criação de regulamentações ex-officio, constata-se uma avocação de funções para além da necessidade da época, revogando ou alterando diversas disposições do Código Comercial, estabelecendo, por derradeiro, a premissa latente de que o comércio se curvaria ao Estado.

No que concerne ao Direito Comercial voltado às espécies de sujeito de empresa, o direito societário teve o seu zênite devido à Lei n.º 3.150, de 1882, conforme elucida MIRAGEM (2010, p. 12):

Em relação ao direito societário, o ápice legislativo do período deve-se à Lei 3.150, de 04.11.1882. Esta Lei, que foi submetida à intensa discussão parlamentar precedente à sua aprovação, e regulamentada pelo Dec. 8.821, de 30 de dezembro do mesmo ano, revogou as disposições do Código Comercial que faziam necessária a autorização estatal para a constituição e funcionamento das companhias de comércio. Nesse sentido, instituiu-se a partir desta Lei o sistema de livre criação das sociedades anônimas, espécie mais moderna de sua formação.

Muito embora o Código Comercial promulgado tenha inovado significativamente todo o sistema comercial brasileiro, é evidente que, como já esclarecido, a evolução das formas e tipos de negociações ensejariam em uma rápida defasagem dos dispositivos comerciais até então vigentes, e, por essa razão,

(20)

o Estado lançou mão de Decretos, durante todo o século XIX, regulamentando todas as atividades cambiárias a partir da emissão de títulos de créditos, bem como a disposição acerca das instituições financeiras, sem olvidar, enfim, dos procedimentos falimentares (MIRAGEM, 2010, p. 13).

Mesmo com esses aparentes avanços legais, é notável o quão moroso o sistema de cunho legislativo acabou sendo pela sua evidente falta de capacidade de evolução em dinamismo tal como as relações advindas do comércio, talvez pela insegurança aportada pelas rápidas transformações, ou, até mesmo, pelas burocracias corolárias dos trâmites para se promulgar o instrumento legislativo, assim como as suas posteriores – e necessárias – atualizações.

Em 1911, houve a edição da Lei n.º 2.378 que possuía o escopo de promover a autorização governamental para a criação de anteprojetos que visavam a reforma nos campos de direito penal e comercial (MIRAGEM, 2010, p. 14). Nessa oportunidade, em caminho contrário do que antes trilhado, foi apresentada uma anteproposta tendente a unificar o direito civil e o direito comercial, tendo sido terminantemente rejeitada pelo Senado, haja vista que, na mesma época, estava em voga a criação de um novo Código Civil (sancionado em 1916).

Inobstante, ressalta-se que, nesse determinado marco histórico, as teorias modernas já estavam sendo tecidas e encaminhadas para o que se denomina de unificação das matérias cíveis, mesmo que não pertençam necessariamente ao mesmo ramo de direito, ainda assim, compadecem do mesmo cerne de regulação da vida cotidiana através do direito civilista.

Nessa perspectiva inovadora, salienta MIRAGEM (2010, p. 17):

Do ponto de vista histórico, a discussão que inicialmente se pautou na autonomia do direito comercial em relação à disciplina civil, evoluiu para a idéia de conveniência da unificação: em um só corpo legal o direito das obrigações, esparsamente tratado em ambas as codificações de direito privado. Nesse sentido, argumentavam os entusiastas da unificação que esta acabaria por gerar enormes vantagens do ponto de vista prático, entre as quais, a eliminação da controvérsia eventual sobre o direito aplicável.

(21)

Por consequência das dicotomias oriundas da aplicação, ou não, do Direito Comercial, VIVANTE (1932, p. 11) elucida que muito poder acabou ficando concentrado nas decisões dos juízes e isso resultou em insegurança jurídica, uma vez que os entendimentos eram díspares quanto da incidência ou não das normas conflitantes, partindo na análise de enquadramento subjetivo do caso concreto à lei.

O que se primordialmente temia na época era a possibilidade de o Direito Comercial sofrer alterações negativas supervenientes do confronto com normas de Direito Civil, à vista de que as regulamentações excepcionais - tipicamente das relações mercantis - poderiam gerar confusões quanto à aplicabilidade frente ao Direito das Obrigações ou até mesmo as regras gerais de responsabilização civil, sem mencionar ainda o fato de que, em cognição preliminar, haveria um retrocesso ao se ponderar o cenário de exclusividade em detrimento da unificação legal.

Assinala-se oportunamente que estas concepções teóricas não deveriam ter sido encaradas como um problema. De fato, há um certo receio quanto aos choques consectários dessa unificação, entretanto, em virtude de que, desde a criação do primeiro Código Comercial pátrio, sempre houve a regulamentação própria do ramo de Direito Comercial, visando, justamente, alavancar mais segurança às partes negociantes, e, ainda, oportunizando a gerência estatal, resguardada a autonomia advinda do direito privado.

Desse modo, concebem-se por temerárias as vertentes que impugnaram a unificação dos códigos pela simplória razão de confusão legal. Uma solução plausível para defender a tese da unificação seria a definição, com efeito erga

omnes, da aplicação do Direito Comercial às relações comerciais, e, somente em

casos onde não se observa atividade mercantil, enquanto aplicação subsidiária e residual, a incidência das normas de Direito Civil.

Destarte, com a finalidade de preambular o tópico subsequente, nota-se que as evoluções legais no sentido da unificação dessas matérias foram amplamente debatidas, e, tão somente com a promulgação do Código Civil (2002) a seguir estudado, se pacifica o consenso quanto à alocação de todas as regulamentações

(22)

de Direito Comercial no corpo legislativo civil, inovando todo esse ramo de direito, chegando à sua mais contemporânea definição teórica, inclusive, com a alteração de sua denominação.

1.3 Transmutação ampliativa: o aporte das teorias de Direito Empresarial ao ordenamento jurídico brasileiro

Eis que o grande momento de ampliação das teorias de Direito Comercial adentra o ordenamento jurídico através de ideologias alienígenas, pois advindas do Direito Italiano. É aqui, portanto, que há uma dilatação dos flancos que delimitavam as matérias desse ramo do direito, fazendo com que a sua terminologia fosse amplificada com escopo de adequação à real abordagem e regramento da qual se propunha a definir.

Nesse liame teleológico, a tradição enquanto regra geral de definição era de que o objeto no qual essa ramificação do direito vislumbrava normatizar restaria adstrito à regulação dos direitos, deveres e interesses corolários do exercício de atividades de produção, assim como a circulação de bens e serviços com objetivo econômico, e, tudo, de maneira ampla, para além do comércio propriamente dito, ensejando a premência de alteração no sentido de majoração das arestas – antes limitativas – oriundas da defasada nomenclatura utilizada.

Inobstante, flagra-se que as velozes mutações foram catalisadas por decorrência das inúmeras modalidades de concretização das atividades mercantis, fazendo com que a própria característica da livre exploração da economia (sob o aspecto da mínima intervenção estatal) evoluísse exponencialmente1, não mais

comportando a simplória definição constituída através do único panorama comercial acima explanado.

Nesse sentido, foi necessária a atualização do Direito Comercial para que esses fenômenos econômicos se aconchegassem partindo de uma nova expressão

1 Nessa cognição lógica, nota-se que muito da evolução das atividades comerciais se deve à

ampliação dos campos que possibilitam as negociações, precipuamente, com o protagonismo das plataformas digitais, alavancadas a partir de século XX.

(23)

que vincula-se, verdadeiramente, a todas as relações comerciais com seus regramentos próprios. Assim, a doutrina instituiu a teoria da empresa (com inspiração declarada dos ditames italianos), expandindo a conceituação para Direito Empresarial (MIRAGEM, 2010, p.19).

Conforme assinala Fábio Ulhoa Coelho, entretanto, a atualização da denominação da disciplina, a adoção da teoria da empresa, ou mesmo sua integração a diplomas legislativos típicos de direito civil, não servem por si, para determinar a unificação do direito privado. Comprova esta sua percepção, conforme ele mesmo demonstra o fato de que no direito italiano, passados sessenta anos da unificação legislativa, direito civil e direito empresarial mantêm-se como disciplinas autônomas. (COELHO, 2002, p. 27-28, apud MIRAGEM, 2010, p. 19).

De ponderar, ainda, que essa transmutação ocorreu concomitantemente à entrada em vigor do Código Civil de 2002, que, agora, haja vista a unificação perpetrada, trata a matéria de Direito Empresarial no seu Livro II, da Parte Especial, regulando minuciosamente a teoria subjetiva moderna, com a definição das espécies de sujeitos de empresa, quais sejam, os empresários individuais, a EIRELI e as sociedades empresárias.

Nessa transformação consubstanciada na teoria da empresa, o direito brasileiro pretendeu evidenciar que a sociedade empresária não é apenas uma nomenclatura diferenciada para a designação de sociedade comercial, e sim, uma conceituação inovadora, infinitamente mais ampla, visando à definição das diversas maneiras organizacionais, a partir da reunião de esforços de mais de um sujeito, para perfectibilização da atividade econômica de produção ou circulação de bens ou serviços (COELHO, 2012, p. 22).

Salienta-se, nesse panorama, que o Código Civil vigente (2002), em epílogo, concretizou toda a transição que já de muito vinha acontecendo, transpassando a teoria dos atos do comércio (objetiva), com a derrocada de suas limitações incidentes à disciplina do Direito Comercial (COELHO, 2012, p. 22). Ademais, aponta-se que houve a concretização, uma vez que já haviam teorias tecidas a esse despeito, assim como decisões judiciais e jurisprudências no mesmo sentido,

(24)

alterando, paulatinamente, o sistema jurídico-comercial anterior, ignorando a ausência de amparo legal regulador.

Por essa visão, leciona COELHO (2012. p. 22):

De notar que, a exemplo do verificado há mais de 60 anos, na Itália, onde a teoria da empresa foi criada em 1942, ainda permanecerá no Brasil a bipartição do direito privado (em direito civil e comercial). Diversos dispositivos do CC (por exemplo, o art. 998, que determina seja o ato constitutivo da sociedade simples inscrito no Registro Civil das Pessoas Jurídicas, enquanto o das sociedades empresárias são arquivados na Junta Comercial) apontam para a sobrevivência de dois regimes jurídicos à unificação legislativa do direito privado. Na verdade, a teoria da empresa apenas altera os contornos delimitadores do âmbito correspondente ao direito civil e ao comercial.

Nesse rumo, as definições consagradas no Código Civil atual, dentre as diversas inovações passíveis de destaque, cingem o aspecto subjetivista da incidência das suas regulações, atingindo fatos que vão muito além do Direito Empresarial, possibilitando o deslinde de situações de diversos ramos do direito, inclusive, com a possibilidade de interpretações sistemática e interpretações de dispositivos para a completa subsunção.

Em consonância, é importante rememorar que a incorporação das normas de Direito Empresarial ao Código Civil de 2002, “[...] embora tenha o condão de determinar uma significativa transformação desta disciplina jurídica em razão do conteúdo das normas em vigor, não serve para afetar de qualquer modo sua autonomia (MIRAGEM, 2010, p. 23).

Sob outro prisma, mesmo que seja uma legislação atual, um hígido exemplo de aplicação do Direito Civil apenas residualmente são os casos em que as relações consumeristas não são verificadas, seja pela ausência de um consumidor, fornecedor ou prestador, desqualificando o vínculo entabulado para o enquadramento nas regras gerais de Direito Civil. Portanto, quando há legislação específica sobre o tema, necessariamente deve ser primeiramente intentada a sua subsunção, e, não sendo o caso de aplicação dessa última, residualmente, imperam as regras genéricas.

(25)

Por derradeiro, as críticas que envolviam a possível deturpação da autonomia se mostraram infrutíferas, e, é de se afirmar que o legislador acertou indiscutivelmente com essa unificação legislativa, melhorando significativamente o suporte legal oriundo dos dispositivos inovadores. A consequência lógica dessas alterações pertinentes foi a segurança jurídica elevada ao seu máximo grau (mesmo que imperfeita, pois oriunda de criação humana, e, portanto, passível de erros), à vista de que as relações mercantis possuem um regramento indubitavelmente mais complexo e resolúvel quando deparam-se impasses provindos das relações fáticas.

Em continuidade e fechamento do presente capítulo, superados os principais resgates históricos e teóricos que originaram o cenário empresarial hodierno, o próximo passo de abordagem teórica científica será a análise das espécies de sujeitos de empresa, com enfoque privilegiado nas relações patrimoniais decorrentes das suas respectivas características, através de um cotejo de definições e peculiaridades que afastam e distinguem essas categorias que – invariavelmente – são confundidas e tratadas como se compartilhassem da mesma estirpe.

(26)

2 DO EMPRESÁRIO INDIVIDUAL E DA EIRELI

Em caráter primário, é necessário compreender o que o Empresário Individual e a Empresa Individual de Responsabilidade Limitada (doravante aludida pela sua abreviação “EIRELI”) são dentro de um horizonte de Direito Empresarial, até que, por fim, se explane as suas definições e características legais e doutrinárias, em razão de que não são as únicas categorias subjetivas empresarias existentes no ordenamento jurídico brasileiro.

Nesse iter, tem-se que a conceituação de empresa deve ser compreendida a partir de uma não materialização de sua existência. Explica-se: a empresa não é algo palpável, ou corpóreo, assim como o estabelecimento (acaso exista). Essa é a primeira distinção que se deve ter em mente quando compulsado o seu conceito, em virtude de que a empresa jamais “se tem” como difundido através do senso comum.

A empresa é uma sequência lógica e organizada de atividades e eventos e não um lugar sujeito ao domínio de um proprietário. Ela é o elemento volátil, um diapasão pelo qual o explorador (Empresário Individual ou EIRELI, dentre outros) se debruçará para extrair o almejado lucro. Deve ser tida como algo abstrato, mas com definição jurídica e fática latente para sua elementar existência.

Por esse sentido, MIRANDA (2009, p. 2) define de maneira genuína a empresa:

Empresa é o organismo que, através de alguns elementos ou, fatores, exercita um comportamento repetitivo e metódico, exteriorizando a atividade do empresário. O empresário é o sujeito que exercita a atividade econômica organizada para a obtenção de lucro da empresa. O empresário poderá ser um empreendedor ou não, tudo irá depender da sua criatividade, e da atividade desempenhada na empresa.

A empresa, à contramão do que se pensa, é uma criação ficta que se concretiza pela associação de sujeitos - ou de modo singular - que vislumbram explorar algum campo negocial no intento de se obter lucro a partir de uma série de atividades, denominadas fatores de produção. Mesmo com essas premissas em

(27)

debate, giza-se que o Código Civil em vigor, embora seja possível depreender essa conceituação a partir da hermenêutica jurídica, não dispõe de maneira expressa o definitivo conceito de empresa.

Destarte, é bem verdade que a empresa é a atividade que o sujeito empresário (seja o empreendedor único ou uma sociedade empresária) praticará e terá como escopo primordial para a boa consecução de sua exploração. Portanto, o que será aventado a seguir são duas espécies de sujeitos de empresas que laboram com essa atividade organizada denominada empresa, que pode ter, ou não, um estabelecimento com o seu patrimônio físico nele alocado.

2.1 Conceitos, características e limitações das duas espécies

Primeiramente, na análise do Empresário Individual, é imprescindível que a compreensão de sua distinção com relação à empresa tenha sido esclarecida de maneira que não paire dúvidas quanto a isso. Partindo dessa ótica, passa-se ao estudo de seu conceito, instituído através do artigo 966 do Código Civil, que estabelece como sendo empresário aquele que exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços, com a ressalva imediatamente posterior – no parágrafo único –, com relação aos profissionais liberais, que não se enquadram nessa conceituação.

Nesse contexto, MIRANDA (2009, p. 8) aduz quanto ao conceito de Empresário Individual:

Baseado no movimento universal que procurou ampliar o campo de incidência do Direito Empresarial, para nele introduzir a prestação de serviços, o Código Civil brasileiro de 2002, que unificou em um só corpo de lei as matérias civil e mercantil, define, em seu artigo 966, o que se entende por empresário, estabelecendo que: “Considera-se empresário quem exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços”.

Afirma-se que esse conceito decorre do artigo 2.082 do Código Civil Italiano (ITÁLIA, 1942) que estabelece, in verbis: “È imprenditore chi exercita

(28)

scambio di beni o di servizi”. Em tradução própria, “é empresário quem pratica

profissionalmente atividades econômicas organizadas para a produção ou troca de bens ou serviços”.

Nesse caminho, destaca-se que:

Não se considera empresário as pessoas naturais que exercem atividade civil profissional em caráter individual, sem uma organização que suplante a sua atuação pessoal. O empresário é o sujeito que exercita a empresa, assim, empresário comerciante é aquele que exercita a empresa individual comercial. (MIRANDA, 2009, p. 08).

Em continuação, o Empresário Individual, ao contrário do que era o antigo comerciante, possui a incumbência de organizar as suas atividades e explorar bens ou serviços através desse excercício que se denomina empresa, assumindo todos os riscos em seu próprio nome, sem a existência de distinção patrimonial, haja vista que não há a criação de uma pessoa jurídica, restando tão somente uma pessoa natural que labora nesses parâmetros.

De mencionar, ainda, que tendo em vista que o Empresário Individual labora com a empresa2 em seu próprio nome, a sua denominação ocorre através da firma

individual, que nada mais é do que a sua assinatura ordinária, podendo ser acrescida, ou não, do tipo de enquadramento para fins de benefícios fiscais.

De outra banda, no que tange à EIRELI, GONÇALVES NETO (2012, p. 160, apud MARQUES, 2016, p. 5) a define como sendo:

[...] agente econômico personificado, constituído por ato unilateral de uma pessoa natural, mediante aporte de um patrimônio mínimo, ou mediante conversão de uma sociedade unipessoal com patrimônio líquido mínimo para o fim de exercer atividade própria de empresário.

O cerne da existência de uma EIRELI é justamente a sua limitação no que se refere à responsabilidade patrimonial desvinculada - a priori - do detentor de seu

2 Conforme já elucidado, esclarece-se que o termo empresa está sendo empregado no sentido da

(29)

capital. É uma benesse inovadora aportada ao ordenamento jurídico, através da Lei n.º 12.441/2011, ao passo que há a limitação proveniente da criação de pessoa jurídica diversa do seu constituinte, sendo que tal benefício anteriormente existia na legislação de cunho comercial tão somente quando da associação de pessoas3.

Ventila-se, também, que a nomenclatura escolhida pelo legislador para definir essa espécie de sujeito de empresa é passível de críticas, considerando, sobretudo, que não se trata de uma empresa, e sim, de um sujeito empresário, tendo em mira que a empresa, por definição, é uma atividade e não um indivíduo que labora explorando a atividade representada pela definição de empresa.

Em comparação ao Empresário Individual, essa é a principal característica desse sujeito de empresa, uma vez que o primeiro responde integralmente com a totalidade de seu patrimônio frente a todas as obrigações contraídas na exploração de bens e serviços pela atividade empresarial, evidentemente, por não constituir pessoa jurídica, em que pese haja a inscrição no Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas, para fins exclusivamente fiscais.

Outro fator preponderante para o entendimento da EIRELI é que, diferentemente do Empresário Individual, para sua constituição, é exigido por lei a dotação patrimonial de valor igual ou superior a cem vezes o salário mínimo nacional vigente à época da sua criação (MARQUES, 2016, p. 5). Portanto, o mero ânimo de criação de uma pessoa jurídica para fins de conceber a EIRELI não basta, sendo necessária a injeção de valor que corresponda à suficiência de capital, com escopo de possibilitar a solvibilidade de suas obrigações, através de uma garantia em pecúnia, frisa-se, penhorável.

Ademais, também faculta-se ao sócio supérstite4 a partir da dissolução de

uma sociedade a criação da EIRELI com o redirecionamento de seu capital para o

3 Salienta-se, nos termos da legislação civil brasileira, que não são todos os casos de associação de

pessoas que resultarão na criação de uma pessoa jurídica.

4 Leia-se no seu duplo sentido semântico-jurídico, por se enquadrar tanto em caso de morte do outro

sócio, ou em caso de retirada espontânea desse mesmo, restando, alfim, um único indivíduo com a possibilidade de concentração de suas quotas na criação da EIRELI, desde que preenchidos seus requisitos legais.

(30)

atendimento das requisições legais, sendo possível, então, a continuidade da exploração de maneira unipessoal (MARQUES, 2016, p. 5).

A sua constituição ocorre para efeitos formais a partir da declaração unilateral de vontade, não existindo, portanto, contrato social, e sim, um ato de constituição, liberto da forma de estruturação de uma sociedade (MARQUES, 2016, p. 5). É uma nova espécie, também, de pessoa jurídica, não sendo confundível com qualquer outra elencada no rol taxativo do artigo 44 do Código Civil brasileiro.

Nessa perspectiva, salienta NETO (2012, p. 165, apud MARQUES, 2016, p. 6, 165):

A Eireli não se confunde com a pessoa do empresário, concebida como pessoa, ela ingressa no mundo jurídico como sujeito de direito, podendo dispor livremente de seus bens, inclusive da totalidade deles. Assim, sendo pessoa e não objeto, a Eireli não pode ser alcançada por ato de constrição judicial, como arresto, sequestro, penhora etc. Pode ser apreendido o estabelecimento ou universalidade de direito, conjunto de bens que formam seu patrimônio, bens que ela seja proprietária ou titular.

No tocante ao nome empresarial da EIRELI, esse sim, deve ser necessariamente distinto do nome de seu titular, inobstante o fato de que parte do nome de seu constituinte pode ser utilizado na criação (MARQUES, 2016, p. 6). Ainda, autoriza-se a elaboração de um nome fantasia, podendo ser vinculado à atividade empresarial a ser explorada. A firma será dada através da presentação5,

ou seja, o seu titular assinará com a sua própria denominação, entretanto, em nome da EIRELI, pois, como de muito sabido, é pessoa de direito ficta, e necessita de auxílio gerencial para a sua operacionalização.

Ainda, importante frisar, que, diferente das sociedades empresárias (outra espécie de sujeito de empresa), o capital da EIRELI não se divide em quotas, e isso se justifica pelo simples fato de que, como não há mais de um titular, não há o que

5 Nota-se que o instituto da presentação se difere da representação. Enquanto no primeiro há a

perfectibilização de atos em decorrência de que a pessoa jurídica é fictícia e necessita desse amparo físico para a sua plena existência e movimentação obrigacional, no segundo, uma pessoa que tem (ou teve) a capacidade de agir em próprio nome, por liberalidade ou força de lei (lato sensu), defere poderes para terceiro agir em seu lugar.

(31)

se dividir. Isso implica na indivisibilidade de seu capital, no sentido da plena gerência do seu constituinte.

Destarte, é plausível que os mandatários do povo tenham se atido à criação desse novo instituto empresarial, com a consequente criação de um novo sujeito de empresa, que possui a finalidade de assegurar o empreender de pequeno porte, através da cisão patrimonial existente entre a pessoa física que comanda, e a pessoa jurídica que responde, possibilitando a devida limitação de afetação patrimonial, salvo casos específicos em lei, autorizadores da desconsideração da personalidade jurídica.

2.2 As formas e possibilidades de afetação e responsabilização patrimonial

Em princípio, passa-se à atenta análise da responsabilidade do Empresário Individual no adimplemento de suas obrigações contraídas, haja vista que essa ponderação é habitual em sede judicial, precipuamente, nos feitos de caráter executivo, uma vez que diversos juristas não têm por definido os traços e as normas regimentais dessa estruturação de afetação, perfazendo, em muitos casos, erros crassos quando da persecução das dívidas exequendas por intermédio da expropriação patrimonial.

Nessa senda, é válido destacar - mais uma vez -, agora, nas palavras de FARIA (2014, p. 2) que o “[...] empresário individual, conquanto esteja inscrito no Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas, não é considerado pessoa jurídica, pois equivale a um comerciante exercendo atos de comércio individualmente”.

Por esse prisma, em razão de que o exercício da empresa pelo Empresário Individual não pode ser vinculado à ideia de criação de uma pessoa jurídica distinta da física, é que ocorre a famigerada confusão patrimonial, à vista de que todos os bens em nome desse empreendedor são passíveis de afetação, inexistindo limitação quanto a orbita empresarial ou particular, em regra, podendo todo esse montante responder pelas dívidas contraídas.

(32)

No mesmo sentido, alude FARIA (2014, p. 2):

Desta ilação se conclui que a responsabilidade do empresário individual é ilimitada, podendo seus bens pessoais serem atingidos por qualquer ato da firma individual. Esta responsabilidade ilimitada do empresário individual foi fundamento da criação pelo legislador do empresário individual de responsabilidade limitada - EIRELI, evitando assim, que os bens do empresário individual fossem atingidos no caso de constrição judicial.

Oportunamente, salienta-se que quando há referência à afetação patrimonial, é elementar compreende-la como a possibilidade de credores, tanto na esfera judicial quanto extrajudicial6, se valerem da expropriação – de maneira compulsória

ou voluntária – dos bens encontrados em nome do devedor para a solvência de suas dívidas e remição7 de eventual débito inadimplido.

Nesse passo, mister aludir que as notificações extrajudiciais, assim como a citação judicial, podem ser perfectibilizadas sem sequer mencionar a existência de Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica (CNPJ), importando na qualificação apenas o apontamento do Cadastro de Pessoa Física (CPF), visando o afastamento de casos de homonímia. Portanto, irrelevante se o ato contiver apenas a informação de número do CNPJ ou do CPF, sendo preferível o último, conforme explicitado.

É válido rememorar, ainda, que, conforme esclarece FARIAS (2014, p. 2):

Não se cuidará de desconsideração da personalidade jurídica, conforme art. 50 do Código Civil ou art. 592, II, do Código de Processo Civil, porquanto na desconsideração se pressupõe a existência da pessoa jurídica, que é um instrumento técnico-jurídico desenvolvido para facilitar a organização da atividade econômica, o que, como visto acima, não é o caso, já que o empresário individual permanece sendo pessoa física. De igual maneira, não será o caso de redirecionamento da execução, porquanto o redirecionamento, também pressupõe a existência de pessoa jurídica.

6 Reporta-se como exemplo pertinente de afetação patrimonial na esfera administrativa os casos de

alienação fiduciária de bens imóveis que, quando do inadimplemento da contraprestação aventada, pode-se haver um procedimento de venda extrajudicial desses bens através de arremates em leilão, prescindindo ação judicial, revertendo-se a quantia percebida para resolução do pacto, e eventual sobra, restituída ao devedor.

7 Remição pelo viés do verbo remir, enquanto uma forma de pagamento de dívidas oriundas

(33)

Consigna-se a necessidade de utilização desse instrumento de desvio temporário8 da personalidade jurídica nos casos em que a obrigação inadimplida

decorra de uma EIRELI, e não de um Empresário Individual, evidenciando mais uma explanação das diferenças de ambas as espécies de sujeitos de empresa.

Em prosseguimento, guinando da responsabilização do Empresário Individual para a exploração das modalidades de afetação patrimonial (assim como suas limitações) atinentes à EIRELI, é necessário ter em mente que a criação dessa espécie e, também, a sua justificativa existencial, provém da primazia da necessidade de proteção do patrimônio do pequeno sujeito empresário.

Para tanto, não se pode olvidar que os terceiros (sejam sujeitos ativos ou passivos das relações negociais) também necessitam de segurança jurídica para haver por concretizado bilateralmente o princípio da confiança9, e em razão disso, o

legislador atribuiu à EIRELI uma característica peculiar, traduzida pelo tabelamento de um capital mínimo enquanto requisito formal para validação de sua existência e eficácia no mundo jurídico.

Dessa maneira, em primeira cena, tem-se que o patrimônio padrão afetável da EIRELI é, primordialmente, o seu capital constituinte, equivalente a cem vezes o salário mínimo vigente no momento de sua criação, inobstante o fato de que ela concomitantemente possa ser proprietária de diversos outros bens que guarneçam o seu estabelecimento, acaso exista.

Nesse cenário, destaca XAVIER (2013, p. 201, apud ANDRADE 2014, p. 59) que:

Diante disso, a responsabilidade patrimonial está afeta à empresa individual, e não ao empresário, uma vez que ela tem patrimônio próprio que responde por suas obrigações. No entanto, segundo José Tadeu Neves Xavier, a lei 12.441/11 ao conceber a figura da

8 Insurge-se como temporário, uma vez que frente a terceiros não haverá a desconsideração da

personalidade jurídica, sendo válida tão somente no caso sub judice, perfazendo efeitos inter partes.

9 Tal princípio é consagrado tanto pela doutrina, quanto pela jurisprudência, como sendo um dos

(34)

EIRELI se aproxima mais ao modelo do patrimônio separado do que o de afetação, mas com características próprias, diferenciando da sociedade unipessoal. Esse autor esclarece que o patrimônio de afetação destaca bens do patrimônio de determinado sujeito de direito, atribuindo-lhe um regime jurídico diferenciado do restante do patrimônio, mas sem modificar a titularidade, e o patrimônio separado também de destaca uma parte dos bens, dando-lhe determinada finalidade, mas com nova titularidade, sendo este o caso da sociedade unipessoal.

Ademais, explica TOMAZZETE (2012, p. 61, apud ANDRADE 2014, p. 59) que:

Será desconsiderada a personalidade jurídica, aplicando subsidiariamente as regras imputadas às sociedades limitadas, nos casos de distribuição fictícia de lucros com prejuízo do capital social (art. 1.059 do CC), deliberação infringente do contrato social ou da lei (art. 1.080 do CC), superavaliação de bens para formação do capital social (ar. 1.055, §1º do CC).

Frisa-se, ainda, que a pessoa física e a pessoa jurídica responderão com a integralidade de seus bens, acaso sejam flagrados negócios realizados em incompatibilidade com a legislação em vigor, ensejando em hipótese de desconsideração da personalidade jurídica, à luz do artigo 1080 do Código Civil brasileiro.

Em idêntico contexto, alude REQUIÃO (2013, p. 117, apud ANDRADE, 2014, p. 60) que é de grande importância a identificação ou especialização do objeto da empresa individual de responsabilidade limitada, pois tudo o que o empresário fizer que não estiver contido no objeto, pode, inclusive, ser motivo que autoriza a afetação do patrimônio privativo do titular dessa espécie de sujeito de empresa.

Por derradeiro, é visível que mesmo havendo o véu fictício que separa o patrimônio da pessoa jurídica de seu titular (sendo ele necessariamente uma pessoa física), ainda assim, é possível que haja a subversão dessa proteção, quando verificadas as irregularidades acima discriminadas.

Pelo todo explanado, verdadeiramente há uma gigantesca diferença entre um Empresário Individual e uma EIRELI, e, mesmo com todas as características

(35)

específicas de cada espécie, ainda há confusão entre as duas, motivo pelo qual se passa aos esclarecimentos teóricos – e no que couber, práticos – dos principais fatores que levam até mesmo juristas renomados a quedarem em equívoco.

2.3 Ponderações zetéticas acerca dos erros teóricos jurisprudenciais referentes às peculiaridades das duas espécies de sujeitos de empresa abordadas

Em atenção a todas as informações apresentadas em compêndio na presente pesquisa, é possível afirmar que, embora o Empresário Individual e a EIRELI detenham especificidades e regramentos que afastem de plano a sua incompreensão, é forçoso concluir que erros são cometidos pela complexidade da matéria envolta pelo Direito Empresarial, que, aqui, pretende-se a desmistificação de maneira didática.

Na análise jurisprudencial acerca de tais imbróglios, a problemática se instaura com mais evidência:

APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE ATIVA. FIRMA INDIVIDUAL. LEGITIMIDADE DO EMPRESÁRIO INDIVIDUAL DE LITIGAR EM NOME DE SUA EMPRESA. A autora é comerciante individual, havendo nítida confusão e inter-relação entre a sua pessoa, e a pessoa jurídica que representa. A jurisprudência pátria é uníssona ao afirmar que, tratando-se de firma mercantil individual, a pessoa jurídica se confunde com a pessoa física de seu proprietário. [...]. Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul. Apelação Cível n.º 70013617535. (BRASIL, 2005). (Grifou-se).

É nítido, que, mesmo que esse fragmento de ementa se depreenda de um caso explanado em 2005, jamais a figura do Empresário Individual possuiu condão de criação de pessoa jurídica, e, sendo assim, nunca houve a necessidade da decretação de confusão patrimonial entre ambos. Portanto, flagra-se o erro pela inexistência de criação de pessoa jurídica a partir do exercício da atividade empresarial individual.

(36)

AGRAVO DE INSTRUMENTO. ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA. PESSOA JURÍDICA. EMPRESÁRIO INDIVIDUAL. CONFUSÃO PATRIMONIAL ENTRE PESSOA FÍSICA E JURÍDICA. COMPROVAÇÃO DA ISENÇÃO DA DECLARAÇÃO DE IMPOSTO DE RENDA DO PROPRIETÁRIO. EMPRESA BAIXADA. PRESUNÇÃO DE AUSÊNCIA DE RENDIMENTOS. PRECEDENTES JURISPRUDENCIAIS. DECISÃO REFORMADA. RECURSO PROVIDO. Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul. Agravo de Instrumento n.º 70082047135. (BRASIL, 2019). (Grifou-se).

Transpassados quatorze anos da publicação do aresto anterior, eis que no ano de 2019 é possível encontrar a mesma inconsistência teórica quanto ao Empresário Individual. Mais uma vez, renomados juristas atuantes como desembargadores referem a existência de pessoa jurídica decorrente das atividades do Empresário Individual de sobremodo errôneo.

Ainda, no mesmo panorama, veja-se:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. CASO CONCRETO. MATÉRIA DE FATO. EMPRESA INDIVIDUAL. CONFUSÃO PATRIMONIAL. BLOQUEIO VIA BACENJUD E RENAJUD SOBRE BENS DA PESSOA FÍSICA. POSSIBILIDADE. O empresário individual possui personalidade jurídica diversa da pessoa física apenas para fins fiscais. Ausência de distinção entre o patrimônio da firma individual e o da pessoa física. Agravo de instrumento provido. Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul. Agravo de Instrumento n.º 70078616646. (BRASIL, 2018). (Grifou-se).

No caso em comento, mesmo havendo erro quanto à menção de que a personalidade jurídica é diversa apenas para fins fiscais, já se vislumbra um panorama mais aceitável, tendo em vista que, realmente, a existência de um número de Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica serve exclusivamente para o controle estatal dos tributos a serem cobrados, em nada importando para a esfera da responsabilização patrimonial. Enfim, equivoca-se a decisão ao passo que afere a existência de uma personalidade jurídica diversa da física.

Em continuidade, mais erros são evidenciados, agora no que tange à desconsideração da personalidade jurídica, conforme transcrição da ementa:

Referências

Documentos relacionados

AUTHORS’CONTRIBUTIONS Paola Pasquali 0000-0003-1504-0665 Approval of the final version of the manuscript; Elaboration and writing of the manuscript; Obtaining, analyzing

Somente com importante comprometimento motor de ambos os membros ou de um com no mínimo 5cm de encurtamento do membro comprometido Descrição do comprometimento motor Sim

A organização poderá prorrogar o prazo para a inscrição e até permitir inscrições para o EVENTO no local de entrega de kits, caso não tenha sido atingido o número máximo de

Telefone: Celular*: E-mail*: DISCIPLINAS: Opção 1*: Opção 2: DATA E ASSINATURA* Eu, , candidato(a) a Aluno(a) Especial do Mestrado em Comunicação e Territorialidades

www.catanduva.sp.gov.br | www.imprensaoficialmunicipal.com.br/catanduva | Lei Municipal nº 3.833, de 27 de dezembro de 2002 Diário Oficial assinado digitalmente conforme MP nº

O consultor Frederico Bussinger, com larga expertise em transporte público, autor do texto “Transporte Coletivo: Direito do Cidadão, Dever do Estado”, escrito há

Torna-se, por isso, necessário identificar os segmentos mais lucrativos e determinar qual a melhor opção ao escolher uma das três alternativas existentes: uma estratégia de

3.1.3 Os serviços de manutenção corretiva serão solicitados mediante abertura de chamado da Secretaria de Tecnologia da Informação e Comunicações do Tribunal, via telefone ou