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2010 GOMES - REFLEXOES DA APLICABILIDADE DA LEI MARIA DA PENHA QUANTO A ACAO PENAL NA AGRESSAO CONTRA MULHER NO MUNICIPIO DE JI-PARANA

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(1)

UNIVERSIDADE FEDERAL DE RONDÔNIA – UNIR – CAMPUS DE CACOAL DEPARTAMENTO ACADÊMICO DO CURSO DE DIREITO

MAURICIO NOGUEIRA GOMES

REFLEXÕES DA APLICABILIDADE DA LEI MARIA DA PENHA

QUANTO A AÇÃO PENAL NA AGRESSÃO CONTRA MULHER NO

MUNICÍPIO DE JI-PARANÁ

Trabalho de Conclusão de Curso Monografia

Cacoal - RO 2010

(2)

GOMES, Mauricio Nogueira. Reflexões da Aplicabilidade da Lei Maria da Penha Quanto a Ação Penal na Agressão contra Mulher no Município de Ji-Paraná. Implícitas na Constituição – Cacoal/ RO. Ano 2010. 57 fls. enc. 30 cm. Monografia – Universidade Federal de Rondônia – Campus Cacoal.

(3)

MAURICIO NOGUEIRA GOMES

REFLEXÕES DA APLICABILIDADE DA LEI MARIA DA PENHA

QUANTO A AÇÃO PENAL NA AGRESSÃO CONTRA MULHER NO

MUNICÍPIO DE JI-PARANÁ

Monografia apresentada à Universidade Federal de Rondônia – UNIR – Campus de Cacoal como requisito parcial para a obtenção do grau de Bacharel em Direito, sob a orientação da professora Esp. Irene Yoko Taguchi Sakuno.

Cacoal - RO

(4)

MAURICIO NOGUEIRA GOMES

REFLEXÕES DA APLICABILIDADE DA LEI MARIA DA PENHA

QUANTO A AÇÃO PENAL NA AGRESSÃO CONTRA MULHER NO

MUNICÍPIO DE JI-PARANÁ

Esta monografia foi julgada aprovada para obtenção do grau de Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Rondônia – UNIR – Campus de Cacoal, mediante apresentação à Banca Examinadora, formada por:

______________________________________________ Professora Esp. Irene Yoko Taguchi Sakuno

Orientadora

________________________________________________ Professor Esp. Telmo Moura Passarelli

1º Membro

________________________________________________ Professora Ms. Maria Priscila Berro

2° Membro

__________________

Nota Final

Cacoal – RO 2010

(5)

Dedico este trabalho a minha

querida esposa Maria

Rosemary e meus filhos Cecília Lara e Luíz Felipe, por todo amor e carinho, por todo estimulo e atenção dedicados dia-a-dia, compreendendo-me nas horas, mais difíceis.

(6)

Meu agradecimento especial a Deus, por estar presente em todos os momentos da minha vida, me fazendo acreditar,

que poderia seguir

caminhando em busca dos meus objetivos;

A minha esposa e filhos, por total compreensão, paciência, estimulo e dedicação dispensada a mim;

Aos meus pais que sempre me orientaram a seguir pelos caminhos da paz, honestidade justiça e amor;

A minha adorável

orientadora professora Irene Yoko Taguchi Sakuno, por ter acreditado e incentivado a

importância da minha

pesquisa;

Aos funcionários do Fórum de Ji-Paraná e da Delegacia de Defesa da Mulher de Ji-Paraná, que não mediram esforços para contribuírem com o desenvolvimento do meu trabalho.

(7)

Pertence à mulher o dom de ensinar a arte da paz ao mundo em luta sedento

deste néctar”

(Gand)

(8)

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 9

1 CONTEXTUALIZAÇÃO DA LEI MARIA DA PENHA: LEI 11.340/2006 ... 12

1.1 ASPECTOS HISTÓRICOS DA LEI 11.340/2006 - LEI MARIA DA PENHA ... 12

1.2 A VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E SEUS ASPÉCTOS CONCEITUAIS ... 14

1.3 DA LEI Nº 11.340/2006 E AS FORMAS DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA CONTRA A MULHER ... 17 1.3.1 Violência física ... 20 1.3.2 Violência psicológica ... 20 1.3.3 Violência sexual ... 22 1.3.4 Violência patrimonial ... 23 1.3.5 Violência moral... 25

2 A VIOLÊNCIA DOMÉSTICA NO CONTEXTO DO JUIZADO ESPECIAL CRIMINAL ... 28

2.1 Reflexões da aplicação da lei 9.099/95 nas questões de violência doméstica ... 29

3 DA CONVENÇÃO SOBRE A ELIMINAÇAO DE TODAS AS FORMAS DE DISCRIMINAÇAO CONTRA A MULHER ... 32

4 REFLEXÕES DA LEI 11.340/2006 NA ÓRBITA DA AÇÃO PENAL ... 35

5 PEQUISAS REALIZADAS NO MUNICÍPIO DE JI-PARANA ... 41

5.1 DELEGACIA DE DEFESA DA MULHER (DDM) ... 41

5.2 FÓRUM DO MUNICÍPIO DE JI-PARANÁ ... 41

5.3 PESQUISA DE CAMPO EM JI-PARANÁ ... 42

CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 45 REFERÊNCIAS ... 47 APÊNDICE A ... 50 APÊNDICE B ... 52 ANEXOS A ... 54 ANEXOS B ... 56

(9)

RESUMO

GOMES, Mauricio Nogueira. Reflexões da aplicabilidade da Lei Maria da Penha quanto à ação penal na agressão contra mulher no município de Ji-Paraná, 57 folhas. Trabalho de Conclusão de Curso Universidade Federal de Rondônia – Campus de Cacoal – 2010.

O presente trabalho almeja mostrar Reflexões da aplicabilidade da Lei Maria da Penha, quando se discute sobre a transação penal, se a ação a ser proposta é condicionada ou incondicionada a representação e que diante de tais dúvidas e impasses em relação a esta matéria seja dada maior garantia e segurança à mulher, recaindo sobre o Estado por meio do Ministério Público a titularidade desta ação penal, visando com isso uma proteção maior à mulher que fica, assim, desincumbida desta responsabilidade, ou seja, de decidir se quer ou não representar criminalmente contra o agressor, ficando livre de ser refém da própria Lei. Com o advento da Lei em comento, o agressor passa a ter consciência que responderá criminalmente e será punido se culpado for, podendo ser condenado e com isso se submeter à restrição judicial que lhe será imposta, além de que, ao deixar de ser réu primário perderá todos os benefícios em caso de vir a cometer outra agressão contra a mulher. Assim, não se permite que a Lei Maria da Penha, criada para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, seja interpretada de forma benéfica ao agressor.Assim, com base no levantamento de referências bibliográficas e pesquisa exploratória descritiva, analisa-se a questão da Reflexões da aplicação da Lei Maria da Penha, os aspectos conceituais, formas de violência contra as mulheres; a violência doméstica no contexto do juizado especial criminal; a reflexões da aplicação da lei 9.099/1995 nas questões de violência doméstica; da convensão de todas as formas de discriminação contra a mulher; reflexões da lei 11.340/2006 na órbita da ação penal, pesquisa de campo realizada em Ji-Paraná, no forum do municipio; na delegacia de defesa da Mulher e por por ultimo pesquisa de campo junto as mulher vitima de agressões. O método utilizado será o dedutivo e a partir dos dados encontrados com a pesquisa de campo, pretende-se demonstrar por meio de gráficos a falha da Lei Maria da Penha, tendo como base dados registrados no município de Ji-Paraná (RO).

(10)

ABSTRACT

GOMES, Maurício Nogueira. The lack Reflections in Maria da Penha Law about prosecution on

assault against woman in Ji-Paraná Town. Final Project. Federal University of Rondônia – Cacoal Campus – 2010.

This paper aims to show the lack Reflections in Maria da Penha Law applicability when discussing the criminal transaction, if the action to be proposed is conditional or unconditional to representation and facing such doubts and dilemmas in relation to this subject should create a greater security and safety to women, taking into account the State ownership of this criminal action through the Public Ministry, aiming a greater women protection who is thus discharging this responsibility, i.e., to decide whether or not represent criminal action against the aggressor, felling free of being prisoner to its own law. In advent of the Law under discussion, the aggressor is now aware about criminal liability and if guilty should be punished and maybe convicted and thus to be submitted to a judicial restraint, which will be imposed, and that, when letting to be a first-time offender the aggressor may lose all benefits in case of another aggression against women. So, it cannot be allowed that Maria da Penha law which was designed to reduce domestic violence against women is interpreted in a way that benefits the aggressor. Thus, based on a referential survey and on a descriptive exploratory study that the lack of effectiveness, the law’s definitions, forms of violence against women, domestic violence in the context of the Special Criminal Court; the Reflections of the law 9.099/2005 in domestic violence issues, the agreement of all forms of discrimination against women, the Reflections of the law 11340/2006 in orbit of prosecution are analysed, as well as a field research conducted in Ji-Parana, in the County Court, the police station to defend women and finally a field research with female victims of assault. The method used is deductive and the data collected in the field research, the failure of Maria da Penha Law will be demonstrated through charts, based on data recorded in Ji-Paraná (RO).

(11)

INTRODUÇÃO

Procura-se incessantemente buscar a tutela jurídica da mulher, pois a historia da humanidade mostra a mulher fragilizada que sempre foi submissa ao seu companheiro, ficando na maioria das vezes em segundo plano.

Assim, costuma-se dizer que menina é frágil e o menino é forte. Essas são frases arraigadas na cultura brasileira. Com efeito, pode se verificar que, desde criança, a mulher é ensinada e orientada a ser dependente, meiga, submissa e cuidar dos outros. É orientada a viver para os outros, deixando de lado seus próprios desejos. O homem, por sua vez, desde sua infância é incentivado a ser o dominador, para tanto, lhe é ensinado a ser independente, a enfrentar de forma heróica suas dificuldades, reprimir seus medos, fraquezas e angústias, para que seja notado na sociedade como um ser superior em relação ao sexo feminino.

Desse modo, desde criança, as brincadeiras ou diversões são diferentes para os meninos e meninas. Neste contexto, o menino é estimulado a jogar bola, brincar com armas, ser o xerife que prende os bandidos, brincar com carrinho; ele deve aprender a ser agressivo, dinâmico e forte. É levado a buscar sempre atividades competitivas, onde suas vitórias e conquistas o deixam em evidência Em relação à menina, em que a brincadeira favorita é imitar sua mãe, nos afazeres domésticos, assim, brinca com bonecas como se fossem seus filhos, fazem comidinhas e limpam a casa. Ainda imitando sua genitora, procura portar-se de forma delicada, submissa e bastante prestativa, além de exteriorizar sentimentos de alegria, disposição e disponibilidade.

Este é o ambiente doméstico em que as pessoas normalmente se desenvolvem, onde as relações sociais desiguais estão presentes e começam a ser assimiladas como se fossem regras a serem seguidas, o que justifica a conduta do homem de sempre querer mandar, e da mulher, em obedecer, o que traz à tona essa distribuição desigual de poder que gera a submissão feminina e que muitas vezes, extrapolando os limites, levam às condutas de agressões físicas e psicológicas reprimidas pelo direito.

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Para combater essa violência doméstica, movimentos vêm sendo realizados para a construção de uma sociedade mais justa e digna, com respeito ao direito à cidadania da mulher, procurando criar, desenvolver e fortalecer, a participação feminina em todos os espaços, públicos e privados em igualdade de condições.

Desse modo, os objetivos deste trabalho são: analisar Reflexões da aplicação da Lei Maria da Penha nos casos de agressões ocorridas contra as mulheres residentes no município de Ji-Paraná/RO, uma vez que a lei deixa uma falha em relação à seqüência do processo, pois a mulher é quem terá essa decisão; verificar quantidade de ocorrência de agressões contra mulher e inquéritos policiais instaurados entre os anos de 2007 e 2010; fazer um levantamento junto à Delegacia Defesa da Mulher (DDM) para averiguar quantas desistências de representação ocorreram nos três últimos anos; pesquisar no Fórum do município de Ji-Paraná/RO a quantidade de desistências da ação penal ocorridas nos últimos três anos e analisar, junto às mulheres selecionadas no município de Ji-Paraná/RO, quais as razões das desistências de não prosseguir ação penal contra o agressor. Para averiguar os motivos das desistências, foi aplicado um questionário misto anonimado, para trinta mulheres. Este universo será delimitado ao ser considerado apenas os dez primeiros registros ocorridos em cada ano, ou seja, nos anos de 2007 a 2009, serão, portanto, analisados trinta questionários.

A finalidade do presente estudo se concentra na necessidade de demonstrar que com a mudança da ação penal passando de condicionada para incondicionada, minimizará as agressões e constrangimentos à mulher, fazendo com que não seja alvo do agressor para forçá-la a desistir de representá-lo criminalmente, e para que o processo prossiga até o seu curso final, podendo ser condenado ou absolvido. E se for condenado, ficará com restrições e perderá os benefícios se cometer outros delitos.

Para realizar essa pesquisa, foram feitos levantamentos e estudos das referências bibliográficas relacionados aos aspectos históricos da Lei nº 11.340/2006 – Lei Maria da Penha; os aspectos conceituais da violência doméstica; a competência dos Juizados Especiais para dirimir os crimes de violência desta natureza; reflexões da aplicação da Lei nº 9.099/1995; os aspectos legais da Convenção sobre a eliminação de todas as formas de discriminação contra a mulher; reflexões da Lei Maria da Penha na órbita da ação penal, pesquisa de campo no municipio de Ji-Paraná. Será realizado, também, um estudo de campo junto à Delegacia de Defesa da Mulher (DDM), do município de Ji-Paraná/RO, para se averiguar as quantidades de ocorrências registradas de agressões contra as mulheres, bem como a quantidade de inquéritos instaurados e quantos agressores foram representados pelas vitimas, no período compreendido entre os anos de 2007 a 2010. Foram analisadas, também,

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as desistências de representar por parte da vítima, neste período.

Foi-realizada pesquisas junto ao fórum do município de Ji-Paraná/RO para saber a quantidade de desistências em audiência preliminar e por último proceder-se-á à pesquisa de campo com questionário misto para colher as informações junto às dez primeiras mulheres que ingressaram com queixa-crime a cada ano, neste município, para a averiguação dos motivos das desistências, ou seja, de não representar o agressor, tanto na Delegacia Defesa da Mulher como em Juízo. Assim, será de trinta, o total de mulheres que serão abordadas com o questionário. Para complementar a pesquisa, serão analisados os processos arquivados no fórum de Ji-Paraná, em decorrência da desistência da mulher vitima de agressão.

O desenvolvimento deste trabalho dar-se-á em cinco capítulos além da Introdução, sendo que o primeiro abordará aspectos históricos da lei Maria da Penha; aspectos conceituais e as formas de violência contra a mulher, o segundo argumentará a violência doméstica contexto do juizado Especial Criminal e reflexões da Lei nº 9.099/1995, o terceiro enfatizará a convenção e eliminação de todas as formas de discriminação contra a mulher, o quarto analisará a reflexões da Lei nº 11.340/2006 na órbita da ação penal, e o ultimo capitulo será feito a análise da pesquisa realizada no município de Ji-Paraná.

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1 CONTEXTUALIZAÇÃO DA LEI MARIA DA PENHA: LEI Nº 11340/2006

1. 1 ASPECTOS HISTÓRICOS DA LEI 11.340/2006 - LEI MARIA DA PENHA

Conta a história da humanidade que desde os tempos bíblicos a mulher tem enfrentado gravíssimas violações em seus direitos mais elementares, tais como o direito à vida, à liberdade e a disposição de seu próprio corpo. Olhando sob esse ângulo, Dias (2010) ensina que embora não se possa concluir esta visão de cunho religioso, talvez tenha sido ele o responsável pela disseminação da violência no seio familiar e social. Salienta a forma em que o casal educa e prepara os meninos e as meninas para a convivência social, faz surgir a diferença imposta pelo machismo e a religiosidade.

Na sociedade antiga, a mulher tinha pouca expressão, era vista como um reflexo do homem, e tida como objeto a serviço de seu amo e senhor. Desse modo, assevera Dias, (2010) que a mulher era vista, também, como instrumento de procriação. Enfim, era a mulher a fêmea, sendo por muitas das vezes comparada mais a um animal do que um ser humano.

Destaca Oliveira (2004) que a partir de 1970 a violência conjugal começa a ser vista para além de um caráter psicopatológico individual. Isso se dá em virtude do movimento feminista que garante a visibilidade à violência contra a mulher, ressaltando as proporções endêmicas do fenômeno como prova de que ele está associado aos valores culturais que desprestigiam e submetem as mulheres. O tema aparece então, estreitamente ligado a uma discussão política.

Oliveira (2004) enfatiza, ainda, que na realidade o feminismo se faz presente desde a Revolução Industrial Européia, lutando principalmente pelo direito ao trabalho e voto das mulheres; ele perde seu fôlego após algumas conquistas e tem seus argumentos cooptados pelas forças políticas tradicionais que mantinha o poder. Mais tarde o movimento renasce, criticando essa primeira etapa por não elaborar uma contra cultura capaz de desafiar a sociedade a mudar o papel da mulher. A luta, a partir de então, deveria atingir as raízes do que se passou a chamar de cultura patriarcal e nela o lugar da mulher na família, era visto como um caminho adequado a este fim.

Com o passar dos tempos, vários grupos de mulheres foram se organizando para fundar abrigos e cobrar apoio dos governos. Nesse sentido, Oliveira (2004) ressalta que no final da década de 1970 já existiam cerca de 150 abrigos só na Inglaterra e Gales. Nos Estados Unidos, o movimento em defesa das vitimas de violência conjugal começou em 1973,

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portanto, mais tarde. Iniciou-se com o estudo que apontavam para a alta frequência e severidade da violência contra a mulher, o que gera a criação de abrigos.

Ao escrever o trabalho “Lei Maria da Penha: uma conquista do Direito Internacional”, Campos (2010), ensina que a Declaração Universal dos Direitos do homem, reconhecida como o marco da elevação de princípios de dignidade e igualdade da pessoa humana, buscou revigoramento e enriquecimento dos Direitos Humanos de forma continua, de maneira que estes sejam protegidos diante das relações sociais e interestatais e da dinâmica das mesmas no mundo contemporâneo. A partir de 1975, com base no entusiasmo do movimento feminista ocorrido em 1970, iniciou-se a década da mulher que foi organizada pela ONU. Assim, estabeleceu-se o contexto no qual a crítica às instituições, órgãos e grupos relacionados aos Direitos Humanos, restaurou-se para denunciar a negligencia com o qual estava sendo tratados os direitos da mulher.

Em 1979 foi aprovada a Convenção sobre a eliminação de todas as formas de discriminação contra a mulher e neste sentido, destaca Campos (2010) que esta foi, até então o documento mais importante e complexo em prol dos direitos da mulher. Tal instrumento conclamava os países signatários a adotarem todas as medidas necessárias a suprimir a discriminação contra a mulher, em suas diversas formas de manifestação. Entretanto, a própria violência exercida contra a mulher dificulta o acesso à Convenção e a outros grandes Tratados de Direitos Humanos.

No mês de agosto do ano de 2006 foi sancionada a Lei nº 11.340, também intitulada Lei Maria da Penha. Segundo Ávila (2007), a referida lei é fruto de um projeto enviado pela ministra da Secretaria Especial de Política para as Mulheres, Nilcéia Freire, ao Congresso Nacional, no ano de 2004 e recebe este nome em homenagem a farmacêutica Maria da Penha Maia Fernandes.

Explica Ávila (2007) que a Lei nº 11.340/2006 cria mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos do artigo 226 § 8° da Carta Magna, da Convenção Interamericana para prevenir, punir e erradicar a violência doméstica e Familiar contra a Mulher e alterar o Código de Processo Penal, e a Lei de Execução Penal.

Enfim, no dia 22 de setembro de 2006 entrou em vigor a Lei, que foi batizada como Lei Maria da Penha, em homenagem à cearense Maria da Penha Maia Fernandes, que se tornou símbolo da luta que visa coibir a violência doméstica. O fato de ter sofrido as agressões perpetradas por seu marido, bem como a omissão do Estado neste caso, fez com que a referida lei se popularizasse com o seu nome.

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Em 1983, Maria da Penha Maia foi vítima de diversas agressões e de tentativa de homicídio, que após ter sido ameaçada duas vezes pelo marido, o professor universitário de economia Marco Antonio Herredia Viveiros (colombiano, naturalizado no Brasil), com uma arma de fogo e eletrochoque, acabou sendo baleada pelas costas. Com essa atitude, reavivou a discussão acerca da proteção dos direitos da mulher.

Conforme dados constante na reportagem da revista Mátria (2007 p.5), publicado pela Confederação Nacional dos trabalhadores em Educação (CNTE), no mesmo ano em que aconteceram os fatos, mais especificamente no mês de junho, começaram-se as investigações sobre o caso, sendo a denúncia apresentada ao Ministério Publico Estadual somente em setembro de 1984. Num Brasil ainda sem diretrizes especificas, houve demora no julgamento e Maria da Penha acionou a Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos estados Americanos (OEA), que em 2001 condenou o Brasil com base na Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra mulher. Nesta oportunidade, a vítima Maria da Penha assim desabafou: “Só me senti recompensada com a condenação. Dela surtiram a mudança da legislação e a implementação da disciplina Direitos Humanos, a partir do ensino fundamental. Esse foi o saldo positivo do meu sofrimento”. [ grifo nosso ]

Este caso culminou na condenação de Herredia em 2002 a oito anos de prisão, onde cumpriu dois deles em regime fechado e agora se beneficia do semiaberto, com essa condenação de Herredia, Maria da Penha tomou mais fôlego e tornou-se símbolo da luta feminina.

Ressaltam Rabelo e Saraiva (2006) que diante da denúncia, a Comissão da Organização dos Estados Americanos (OEA), órgão internacional responsável pelo arquivamento de comunicações decorrentes de violação desses acordos internacionais, publicou o Relatório nº 54, de 2001, que dentre outras constatações, recomendou a continuidade e o aprofundamento do processo reformatório do sistema legislativo nacional, a fim de mitigar a tolerância estatal à violência doméstica contra a mulher no Brasil. A sanção dessa lei representa, assim, um avanço na proteção da mulher vítima de violência familiar e doméstica, incluindo-se, também, uma inovação legal quanto às formas familiares já positivadas.

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A Lei Maria da Penha cria mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher. Segundo relatório da Organização Mundial da Saúde, a maioria das violências cometidas contra a mulher ocorre dentro do lar ou junto à família, sendo o agressor o companheiro atual ou o anterior. E pior, as mulheres agredidas ficam, em média, convivendo um período não inferior a dez anos com seus agressores.

Escreve Maciel (2009) que a mulher parece estar condenada a viver com a condição reservada a ela, ou seja, viver com a tarefa de proteger em vez de cuidar de si mesma, de atentar para as suas próprias perspectivas e seus anseios. Em relação ao seu espaço na sociedade, corresponde mais as expectativas que a seus anseios. Da mesma forma, se relaciona mais às expectativas que percebem ser dirigidas do exterior para ela, na forma do costumes e hábitos característicos de cada época. A supremacia masculina fere a dignidade feminina, o esperado em relação ao papel feminino sempre foi o de acolhedora das necessidades do outro.

Assim, inicialmente é preciso identificar o âmbito de abrangência da lei ora comentada, ou seja, o que é violência doméstica. Ainda que a lei não seja a sede adequada para emitir conceito, o legislador definir bem a violência doméstica (art. 5°) e identificar suas formas (art. 7°). A absoluta falta de consciência social do que seja violência doméstica é que acabou condenando este crime a invisibilidade.

Com efeito, a lei em questão define a violência doméstica no caput do art. 5° e as formas como estas ocorrem, no art., 7°, in verbs:

Art. 5o Para os efeitos desta Lei, configura violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial.

Art. 7o São formas de violência doméstica e familiar contra a mulher, entre outras:

I - a violência física, entendida como qualquer conduta que ofenda sua integridade ou saúde corporal;

II - a violência psicológica, entendida como qualquer conduta que lhe cause dano emocional e diminuição da auto-estima ou que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz, insulto, chantagem, ridicularização, exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação;

III - a violência sexual, entendida como qualquer conduta que a constranja a presenciar, a manter ou a participar de relação sexual não desejada, mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da força; que a induza a comercializar ou a utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, que a impeça de usar qualquer método contraceptivo ou que a force ao matrimônio, à gravidez, ao aborto ou à prostituição,

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mediante coação, chantagem, suborno ou manipulação; ou que limite ou anule o exercício de seus direitos sexuais e reprodutivos;

IV - a violência patrimonial, entendida como qualquer conduta que configure retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades;

V - a violência moral, entendida como qualquer conduta que configure calúnia, difamação ou injúria (BRASIL, 2006).

Verifica-se, portanto, que a Lei Maria da Penha além de conceituar o termo violência domestica, preocupou-se também em descrever as formas como estas se concretizam.

Observa-se, contudo, que para se chegar ao conceito de violência doméstica faz-se necessária a conjugação desses dois dispositivos, razão pela qual Dias, (2010) ensina que deter-se somente no art. 5° é insuficiente, pois são vagas as expressões “qualquer ação ou omissão baseada no gênero”, “âmbito de unidade doméstica”, “âmbito da família” e “relação íntima de afeto”. Da mesma forma, apenas do art. 7º também não se retira o conceito legal de violência contra mulher, impondo-se a interpretação conjunta destes dois artigos. Desse modo, o conceito de violência doméstica traduz-se como sendo qualquer das ações elencadas no art. 7º (violência física, psicológica, sexual, patrimonial ou moral) praticada conta a mulher em razão de vínculo de natureza familiar ou afetiva.

Desse modo, convém citar a contribuição de Werba (2004) que ao conceituar a violência, evidencia ser a violência como sendo qualquer ato de violação aos direitos humanos de qualquer pessoa independentemente de qualquer característica de gênero, raça, etnia, idade, condição econômica ou social. Enfatiza que se a violência ocorre pelo fato da vítima pertencer a um determinado gênero, no caso, se for uma mulher, considera ser esta uma violência de gênero ou violência contra a mulher. Assim, explica que são atrocidades cometidas em função das diferenças não admitidas constitucionalmente, que ocorrem com o emprego de força física, ameaças psicológicas, econômica, dentre outros, que tem o condão de se caracterizar como ato violento e reprovado pelo direito.

A violência também é definida de forma genérica por Teles e Melo (2003) quando se expressarem no sentido de que a violência, em seu significado mais freqüente, quer dizer uso de força física, psicológica ou intelectual para obrigar outra pessoa a fazer algo mesmo sem a manifestação de sua vontade; assim, passa o agente a constranger e tolher a liberdade da agredida, ao lhe incomodar, impedindo-a de exteriorizar seu desejo, sob constante ameaça ou até mesmo espancamentos, que podem levá-la até a morte. Entende, portanto, ser um meio de coagir, de submeter outrem ao seu domínio por constituir um ato de violação dos direitos essenciais do ser humano.

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Nota-se que esse entendimento conduz à idéia de que a violência concerne à restrição considerável da liberdade e integridade alheia, de forma a lhe impor uma vontade que não condiz com o interesse do outro e, para tanto, faz uso de medidas constrangedoras, as quais reprimem e submetem os outros de maneira coerciva ou impositiva.

Por sua vez, a violência de gênero se apresenta como forma mais extensa e se generalizou como uma expressão utilizada para fazer referência aos diversos atos praticados contra as mulheres como forma de submetê-las a sofrimento físico, sexual e psicológico, aí incluídas as diversas formas de ameaças, não só no âmbito intrafamiliar, mas também abrangendo a sua participação social em geral, caracterizando-se pela imposição ou pretensão de imposição de subordinação e controle do gênero masculino sobre o feminino.

Saffioti (apud Araújo et al., 2004), relatam que a violência de gênero é um conceito mais abrangente do que o termo violência contra a mulher, pois além de alcançar as mulheres, incluem também as crianças e adolescentes. Aduzem que a violência de gênero acontece nas relações de poder onde se entrelaçam as categorias de gênero, classe, raça e etnia. Traduzem uma forma particular da violência global representada pela ordem patriarcal que atribui aos homens a prerrogativa de dominar e controlar as suas mulheres, podendo para isso usar a violência.

Pelo conceito, percebe-se que a ordem patriarcal é vista como um fator importante na realização da violência de gênero. Enfatiza que a dominação masculina se materializa como se fosse uma dominação simbólica na sociedade, corpos e mentes, discursos e práticas sociais e institucionais.

Desse modo, pode-se observar que para ser o crime previsto na Lei n° 11.340/2006, é condição sine qua non que a conduta lesiva seja baseada no gênero, ou numa relação de afeto em que esteja presente a submissão de uma das partes à outra.

1.3 DA LEI N° 11.340/2006 E AS FORMAS DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA CONTRA A MULHER.

Ao analisar a Lei Maria da Penha, Dias (2010, p.64) evidencia as sequelas decorrentes do reconhecimento do delito como violência doméstica, em face do aumento da pena do artigo 61, II, “f” do Código Penal, que sujeita o réu as demais vicissitudes que impõe a Lei. Assim, mesmo que o crime possa ser reconhecido como de pequeno potencial ofensivo, a ação não tramita nos Juizados Especiais Criminais, mas sim nas Varas Criminais, enquanto

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não instalados os (JVDFMs) - Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher. Por essa razão, o réu deixa de fazer jus às benesses da Lei nº 9.099/1995.

A Lei Maria da Penha traz em seu bojo, no artigo 7° e incisos, as formas de violência doméstica contra a mulher, in verbs:

Artigo 7º. São formas de violência doméstica e familiar contra a mulher, entre outras:

I – a violência física, entendida como qualquer conduta que ofenda sua integridade ou saúde corporal;

II – a violência psicológica, entendida como qualquer conduta que lhe cause dano emocional e diminuição da auto-estima ou que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz, insulto, chantagem, ridicularização, exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação.

III – a violência sexual, entendida como qualquer conduta que a constranja a presenciar, a manter ou participar de relação sexual não desejada, mediante intimidação, ameaça, coação ou uso de força; que a induza a comercializar ou utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, que a impeça de usar qualquer método contraceptivo ou que a force ao matrimônio, à gravidez, ao aborto ou à prostituição, mediante coação, chantagem, suborno ou manipulação; ou que limite ou anule o exercício de seus direitos sexuais e reprodutivos;

IV – a violência patrimonial, entendida como qualquer conduta que configure retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades;

V – a violência moral, entendida como qualquer conduta que configure calúnia, difamação ou injúria. (BRASIL, 2006)

Nota-se que o artigo 7° ocupou-se de explicar pormenorizadamente a maioria das formas possíveis dessa violência, fazendo depreender-se do texto legal que há outras formas de violência doméstica ou familiar contra a mulher. Neste aspecto, a lei assevera expressamente que essas formas são meramente exemplificativas, uma vez que podem existir outras não previstas na norma especial. Desse modo, Parodi e Gama (2007, p. 157) salientam que:

O art. 7º ocupou-se de estipular um rol exemplificativo de maneiras como as lesões podem se concretizar na vida das vítimas, independente de serem afetas à esfera cível ou criminal. Caminhando pela esteira dos danos materiais e imateriais, o legislador é motivado a construir o presente artigo inclusive por necessidade histórico-sociológica, visto que a maioria dos ilícitos ora definidos possuem um passado nada remoto de preconceitos de tal monta que impediam as próprias ações judiciais...

Apesar disso, é necessário observar que o legislador preocupou-se mais em definir as diversas formas de violência doméstica visando, com isso, a eficácia da proteção ora estudada.

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Com o intuito de ilustrar as várias formas de violência doméstica, Manfroi (2010) apresenta os gráficos abaixo, sendo que o primeiro visa demonstrar as conseqüências dos atos contínuos de violência domestica e o segundo, o ciclo de violência que deve ser evitado para fins de melhor saúde mental e física da mulher no âmbito familiar:

Figura 1: Contínuo da violência e familiar

Fonte: Cartilha informativa e de orientação dos direitos da mulher ( 2010, p. 07)

Figura 2: Fuja deste ciclo contínuo

Fonte: Cartilha informativa e de orientação dos direitos da mulher (2010, p. 07)

Observa-se pelas ilustrações acima as conseqüências negativas que a violência doméstica causa, evidenciando desse modo a necessidade de coibir tais praticas e a alteração na legislação ora em estudo no sentido de que se torne mais eficaz.

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1.3.1 Da violência física.

Nos termos do art. 7º, I da Lei Maria da Penha, entende-se como violência física qualquer conduta que ofenda a integridade física ou a saúde corporal da mulher.

Segundo Dias (2010), ainda que a agressão não deixe marcas aparentes, o uso da força física que ofenda o corpo ou a saúde da mulher constitui vis corporalis, expressão que define a violência física, sendo que esta pode deixar sinais ou sintomas que facilitam a sua identificação, tais como hematomas, arranhões, queimaduras e fraturas. O estresse crônico gerado em razão da violência também pode desencadear sintomas físicos, como dores de cabeças, fadiga crônica, dores nas costas e até distúrbios.

É como aduz Paraguassu e Teixeira (2007), acrescentam ainda que pelo menos uma em cada três mulheres sofre, ou já sofreu, algum tipo de violência física, sexual ou alguma outra forma de abuso. Relatam que o agressor, geralmente, é uma pessoa íntima ou membro da família e que dos casos de violência doméstica denunciado, a maioria refere-se a crimes conjugais, sendo os acusados os maridos, ex-maridos, companheiros, ex-companheiros, namorados, ex -namorados. Salientam que os abusos físicos mais freqüentes são tapas, empurrões, socos, beliscões, surras, homicídios e queimaduras.

Considerando as formas de abusos físicos citados por Paraguassu e Teixeira (2007), comenta Dias (2010) que a integridade física e a saúde corporal são protegidas juridicamente pela lei penal. A violência doméstica já configurava forma qualificada de lesões corporais, tendo sido inserida no Código Penal, em 2004, com acréscimo do § 9º ao artigo 129 do CP que assim dispõe: “se a lesão for praticada contra ascendente, descendente, irmão, cônjuge ou companheiro, ou com quem conviva ou tenha convivido, ou ainda prevalecendo-se o agente das relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade”. (BRASIL,2004).

A Lei Maria da Penha limitou-se a alterar a pena desse delito, diminuiu a pena mínima e aumentou a pena máxima. Assim, Dias (2010) ensina que de seis meses a um ano, a pena passou para de três meses a três anos.

Quanto às lesões culposas, sua tipicidade é excepcional. Portanto, havendo omissão da Lei Maria da Penha, somente as condutas praticas dolosamente configuram violência física.

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Esta forma de violência está prevista no art. 7º, II da Lei Maria da Penha e dispõe que a violência psicológica, entendida como qualquer conduta que lhe cause dano emocional e diminuição da autoestima ou que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz, insulto, chantagem, ridicularizarão, exploração e limitação do direito de ir e vir qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação.

Verifica-se que as proteções da autoestima e da saúde psicológica, não estavam previstas na legislação pátria e que somente com a realização da Convenção para Prevenir e Erradicar a Violência Doméstica, conhecida como a Convenção de Belém do Pará, a violência psicológica passou a ser tutelada e incorporada no conceito de violência contra a mulher.

Destacam Paraguassu e Teixeira (2007) que as mulheres passam anos e anos sofrendo de violências psicológicas ou emocionais, a tal ponto que, desesperadas, cometem desatinos, loucuras, até mesmo o suicídio. Asseveram que para essa violência existem três tipos de crime tipificados no Código Penal Brasileiro que são a calúnia, injúria e difamação, sendo conhecidos como “crimes contra a honra”.

Fazendo um paralelo entre as violências física e psicológica, Dias (2010) ressalta que a violência psicológica consiste na agressão emocional tão ou mais grave que a física, o comportamento típico se dá quando o agente ameaça, rejeita, humilha ou discrimina a vitima, demonstrando prazer quando vê o outro se sentir amedrontando, inferiorizado e diminuído, configurando a vis compulsiva.

A violência psicológica encontra forte alicerce nas relações desiguais de poder entre os sexos, sendo a mais freqüente e talvez seja a menos denunciada, pois a vitima, muita das vezes, nem se dá conta de que agressões verbais, silêncios prolongados, tensões, manipulações de atos e desejos são violência e devem ser denunciados. Dessa forma, na ignorância da vítima, fica o agressor impune.

Para a configuração do dano psicológico não é necessária a elaboração de laudo técnico ou realização de perícia. Segundo Dias (2010), reconhecida pelo juiz sua ocorrência, impõe-se a concessão de medida protetiva de urgência, lembrando aqui que qualquer delito praticado mediante violência psicológica reclama a majoração da pena constante no art. 61, II, “f” do Código Penal Brasileiro.

A violência domestica além de deixar traumas psicológicos na vitima, também fere seus direitos como cidadã, é responsável também pelo desvio de personalidades dos filhos e

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desencadeia baixa na produtividade do trabalho feminino. Ou seja, as mulheres que sofrem estes tipos de agressões têm problemas discriminatórios tem a sua vida afetada.

1.3.3 Violência sexual

Cunha (2007), fazendo menção ao entendimento de Saffopti (1998) diz que o Brasil não dispõe de elementos gerais sobre a violência sexual. Contudo dadas as relações patriarcais de gênero, afirma que é grande o numero de estupros no interior do casamento. Prosseguindo, Cunha (2007) menciona os dados coletados por Lopes (2003) sobre essa conduta ao relatar que na Delegacia especializada de atendimento à mulher (DEAM) de Pernambuco, apenas em 1999, as 254 delegacias registraram 159 homicídios e mais de quatro mil estupros.

A Lei n° 11.340/2006 trata no inc. III do art. 7º a questão da violência sexual, ao descrever que:

Entendida como qualquer conduta que a constranja a presenciar, a manter ou participar de relação sexual não desejada, mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da força; que induza a comercializar ou utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, que a impeça de usar qualquer método contraceptivo ou que a force ao matrimônio, a gravidez, ao aborto ou à prostituição, mediante coação, chantagem, suborno ou manipulação; ou que limite ou anule o exercício de seus direitos sexuais e reprodutivos.

O texto legal acima mencionado descreve o conceito de violência sexual, de onde se pode dizer que essa forma de violência é tão grave quanto às demais formas trazidas pela doutrina, pois fere a dignidade da pessoa humana.

Houve uma evolução na doutrina penal, onde se refere ao tema “debito conjugal” no tocante ao dever inerente ao casamento, pois no sistema anterior sequer se reconhecia a prática de estupro do marido com relação à mulher, sob o absurdo argumento de que se tratava de um direito inerente à condição de marido, que o poderia exigir inclusive sob violência.

Com efeito, Cunha (2007) descreve que embora no Novo Código Civil estivesse bem claro que o débito conjugal seria cumprido por ambos os cônjuges, na prática ele só existia para a mulher, isto quer dizer que, quando o homem desejasse ter uma relação sexual, caberia à mulher aquiescer, mesmo que, naquele momento, essa não fosse a sua vontade. Explica que com o homem a situação é bem diferente, porque convencionalmente é ele quem toma a iniciativa, o que vale dizer que o Código Civil de 2003 aboliu o débito conjugal.

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O Código Penal Pátrio foi mais severo em relação aos crimes perpetrados com o abuso da autoridade decorrente de relações domésticas. Assim, assevera Dias (2010) que este Diploma Legal reconhece como circunstancias que sempre agravam a pena o fato de o crime ter sido praticado contra ascendente, descendente, irmão ou cônjuge como descreve o artigo 61, II, e; e com abuso de autoridade ou prevalecendo-se de relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade conforme art. 61, II, f do CP. A Lei Maria da Penha inseriu neste dispositivo legal mais uma hipótese, com violência contra a mulher na forma da lei especifica.

Os crimes que equivocadamente eram nominados de “contra os costumes” em boa hora passaram a ser chamados de “crimes contra a dignidade sexual”. Assim, leciona Dias (2010) que quem obriga alguém, homem ou mulher, a manter relação sexual não desejada pratica o crime de estupro. Relata que, da mesma forma, os outros crimes contra a liberdade sexual configuram violência sexual: violação sexual mediante fraude; assédio sexual; crime sexual contra vulneráveis e satisfação de lascívia. Dessa forma, enfatiza que todos esses delitos, se cometidos contra pessoas de identidade feminina, no âmbito das relações domésticas, familiares ou de afeto constituem violência domestica, e o agente submete-se à Lei Maria da Penha.

1.3.4 Violência patrimonial

Fazendo um breve retrospecto, salienta-se a revogação, nos idos de 1962, do artigo 233 do revogado Código Civil de 1916, que previa: ... “o marido é o chefe da sociedade conjugal, competindo-lhe, portanto, a gestão integral dos negócios e a representação do casal”. Ressalta-se, também, que com o advento do Estatuto da Mulher Casada, a Lei 4.161/1962 introduziu-se no ordenamento jurídico o conceito de co-gestão dos negócios familiares.

Neste contexto, Pavoni (2007) ensina que o referido artigo 233, após sua revogação guardava ainda na sucedânea redação o ranço patriarcal, onde a função de “chefe”, ainda reservada ao marido, seria exercida com a colaboração da mulher. Esclarece que com a promulgação da Constituição Federal de 1988, houve a isonomia efetiva entre direitos e garantias entre homens e mulheres, elevando, dessa forma, a condição da mulher ao ansiado e oportuno patamar igualitário.

Desta forma, Pavoni (2007) diz que no âmbito da lei em evidência, é considerado abuso e violência patrimonial o arbitrarismo por parte do marido ou convivente, quanto à

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gestão do patrimônio, objetos ou instrumental de que faça uso a mulher para seu labor, bem como a guarda ou retenção de seus documentos pessoais, bens pecuniários ou não, da mulher.

Esta espécie de violência encontra-se normatizada no inciso IV da Lei Maria da Penha e traz em seu bojo o seguinte teor:

A violência patrimonial, entendida como qualquer conduta que configure retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores, e direitos ou recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades.

Nota-se que a lei, além de tutelar a integridade física e psicológica da mulher, preocupou-se também com os aspectos patrimoniais, visando punir as condutas do agressor quando este cometer o ilícito de reter, destruir e subtrair bens e valores pessoais da vítima.

Neste mesmo sentido, é o entendimento de Pavoni (2007) ao relatar que o inciso IV do art. 7º cuida da violência patrimonial e refere neste sentido qualquer conduta que configure retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades.

Observação importante é a de Dias (2010), resultado da análise e comparação dos artigos 181 e 182 do Código Penal com o inciso IV do art. 7° da Lei Maria da Penha. Assim, importante descrever o teor destes artigos.

Art. 181 - É isento de pena quem comete qualquer dos crimes previstos neste título,

em prejuízo:

I - do cônjuge, na constância da sociedade conjugal;

II - de ascendente ou descendente, seja o parentesco legítimo ou ilegítimo, seja civil ou natural.

Art. 182 - Somente se procede mediante representação, se o crime previsto neste

título é cometido em prejuízo:

I - do cônjuge desquitado ou judicialmente separado; II - de irmão, legítimo ou ilegítimo;

III - de tio ou sobrinho, com quem o agente coabita.

Os dispositivos acima transcritos tratam da imunidade absoluta nos crimes contra o patrimônio, quando o autor for o cônjuge, ascendentes ou descendentes, ou quem tenha parentesco legítimo ou ilegítimo. Neste caso, Mirabete (2008) ensina que a lei prevê como medida de política criminal, as imunidades absolutas e relativas nos crimes contra o patrimônio, denominadas, as primeiras, de caso de isenção de pena, ou equivocadamente, de escusas absolutórias. Salienta que a imunidade absoluta caracteriza-se pela isenção de pena, de modo que não pode ser instaurado o inquérito policial e muito menos a ação penal contra o

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beneficiário, por falta de interesse de agir, vez que não é possível a imposição de pena, mesmo estando presentes a antijuridicidade e a culpabilidade do fato, tornando inaplicável a sanção penal.

Não havendo interesse de agir e, portanto, uma das condições de ação, o processo deve ser declarado nulo ab initio. Já se declarou, entretanto, a extinção da punibilidade nestes casos, por tratar-se de isenção de pena obrigatória e não facultativa, que exclui qualquer sansão penal, ou seja, qualquer pena ou medida de segurança ou efeito de condenação, como por exemplo o registro no rol dos culpados e a perda do bem. A conduta é ilícita, mas pelo Código Penal, não cabe a aplicação das penas dos crimes contra o patrimônio. Importante mencionar a exceção a essa regra, que vem estabelecida no inc. I do art. 183 que determina a punição nos casos da prática de violência ou grave ameaça, nestes tipos penais. Mirabette (2008)

Em relação à Lei 11.340/2006, os crimes contra o patrimônio possuem outra conotação, vez que não há a extinção da punibilidade como impõe o Código penal. Com efeito, tem-se que a partir da nova definição de violência doméstica que reconhece como tal também a violência patrimonial, não se aplicam as imunidades absolutas ou relativas do art. 181 e 182 do Código Penal quando a vitima é mulher e mantém com o autor da infração vinculo de natureza familiar. Não há mais como admitir o injustificável afastamento da pena ao infrator que pratica um crime contra sua esposa ou companheira, ou, ainda, algum parente do sexo feminino. Comenta Dias (2010) que em relação ao Estatuto do Idoso, o legislador impôs uma regra mais rigorosa, ao prever a dispensa de representação por parte do idoso e expressamente estabelece a não aplicação desta causa de isenção quando a vítima tiver mais de 60 anos.

A lei Maria da Penha reconhece como violência patrimonial o ato de “subtrair” objetos da mulher, o que nada mais é do que furtar. Assim, se subtrair para si coisa alheia móvel configura o delito de furto, quando a vitima é mulher com quem o agente mantém relação de ordem afetiva, não se pode mais admitir a escusa absolutória. O mesmo se diga com relação aos crimes de apropriação indébita e ao delito de dano. É violência patrimonial “apropriar” e “destruir”, os mesmos verbos utilizados pela lei penal para configurar tais crimes. Perpetrados contra a mulher, dentro de um contexto de ordem familiar, o crime não desaparece e nem fica sujeito à representação, o que não ocorre no campo do Direito Penal.

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A Lei Maria da Penha descreve no inciso V do art. 7º, que: “a violência moral, entendida como qualquer conduta que configure calúnia, difamação ou injúria”.

Do texto legal transcrito, observa-se que o crime de violência moral prevista na Lei Maria da Penha, engloba os tipos penais da calúnia, difamação e injúria. Diversamente do que ocorreu quanto ao crime de violência patrimonial, o Código Penal e a Lei em estudo encontram-se em harmonia.

A violência moral encontra proteção penal nos delitos contra a honra: calunia, difamação e injúria. São denominados delitos que protegem a honra, mas, cometidos em decorrência de vínculos de natureza familiar ou afetiva, configuram, violência moral.

Buscando traçar as diferenças entre estes tipos penais, assevera Dias (2010) que na calúnia, o fato atribuído pelo ofensor à vítima é definido como crime, enquanto que na injúria não há atribuição de fato determinado, mas na difamação há a imputação de fato ofensivo à reputação da vítima. Esclarece que a calúnia e a difamação atingem a honra objetiva e o crime de injúria atinge a honra subjetiva. Ao comentar acerca da consumação do delito, comenta que a calúnia e a difamação consumam-se quando terceiros tomam conhecimento da imputação e quanto à injúria, diz que esta se consuma quando o próprio ofendido torna conhecimento da imputação.

Adentrando para a esfera da violência doméstica, estes delitos, quando são perpetrados contra a mulher no âmbito da relação familiar ou afetiva, devem ser reconhecidos como violência doméstica, impondo-se o agravante da pena acrescentado no artigo 61, II, “f” do Código Penal. De modo geral, não concomitantes à violência psicológicas e dão ensejo, na seara civil, à ação indenizatória por dano material e moral.

Com efeito, acrescenta Jesus (2010), ao fazer a síntese das inovações importantes introduzidas pela lei n° 11.340/2006 no Código Penal, que este Diploma Legal passou a prever a violência doméstica ou familiar contra a mulher como uma circunstância agravante genérica. Desse modo, o inciso “f” do artigo 61, passou a ter nova redação, como se verá no quadro a seguir mencionado:

Redação antiga Nova redação Comentário

f) com abuso de autoridade ou prevalecendo-se de relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade; Código Penal de 1940

f) com abuso de autoridade ou prevalecendo-se de relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade, ou com violência contra mulher, na forma da lei especifica; “na forma da lei especifica significa de acordo com o art. 5º da Lei 11.340/2006”

Houve inserção de mais um agravante genérica na relação do art. 61 do CP violência contra a mulher, inciso II, alínea f, parte final, aplicável a todos os crimes. O conceito de violência contra a mulher, art. 5º da Lei Maria da Penha. Observa-se que menciona violência sem especificação

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Figura 3: Inovação no código penal Fonte: Jesus (2010 p.75)

Observando o inciso X do art. 5º da Carta Magna, relata Pavoni (2007) que a violência moral refere-se ao dano ou tentativa de dano contra a honra ou imagem da mulher. Neste sentido, qualquer forma de conduta que viole sua intimidade ou idoneidade, prolatando calunias, atribuindo-lhe falsamente atos que não praticou, ou a difamando, revelando segredos ou fatos que só dizem respeito a ela mesma ou ao âmbito de sua intimidade, ou ainda maldizendo-a, prolatando juízos escusos ou ofensivos, são harmônicos com o tipo em epigrafe.

Sendo assim, nota-se que com o advento da nova Lei nada mais justo que a mulher tenha um amparo legal. Nesta seara, é louvável a atividade do legislador que inseriu no art. 7º, I, II, III, IV, V, da Lei 11.340/2006, garantias de efetiva proteção à mulher, tendo em vista a peculiaridade da situação fática da vítima em relação à sua família e ao seu agressor, sendo na maioria das vezes é agredida, insultada, maltratada verbalmente e submetida a expor seus problemas domésticos perante a comunidade em que vive. (BRASIL, 2008).

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2 A VIOLÊNCIA DOMÉSTICA NO CONTEXTO DO JUIZADO ESPECIAL CRIMINAL

A violência doméstica, na maioria das vezes, é classificada juridicamente como lesão corporal leve, sendo, por isso, encaminhada ao chamado Juizados Especiais Criminais Referem Sallete, (2005) e Milher (1999) que esses juizados, também conhecidos como juizados de pequenas causas, priorizam os procedimentos mais rápidos e simplificados visando com isso evitar que os casos simples, sejam resolvidos por meio da conciliação evitando o procedimento ordinário que levam anos até serem julgados. Verifica-se, então, que há uma preocupação em tornar a resposta do judiciário mais célere e eficiente para os chamados crimes de menor potencial ofensivo, também conhecido como crime anão por serem crimes considerados de menor gravidade. Daí porque dizer que no Juizado Especial Criminal vigoram os princípios da informalidade, da simplicidade do processo e da celeridade.

Miller (1999), da mesma forma, ensina que o maior número de mulheres, vitima de violência domestica, ao noticiarem o fato criminoso à autoridade policial é encaminhado a esse Juizo. Argumenta que isso acontece porque, na maioria das vezes, a lesão corporal praticada contra a mulher é tida como crime de menor potencial ofensivo cuja pena máxima prevista não excede a um ano de reclusão ou detenção.

Em consonância com esses entendimentos, Koener et al (2002) afirmam que o processo tradicional, além da exigência de se observar a sequência de uma série de fases, estas impediam, por exemplo, que as partes fizessem acordos, a decretação da suspensão do processo ou a efetivação da transação. Enfatizam que as negociações até poderiam ocorrer, porém elas eram colocadas à margem da legalidade. Desse modo, os juizados especiais criminais abrem espaço para haver esse tipo de negociação e evita que o acusado da prática de determinado delito entre no sistema de Justiça criminal, que tem como ponto final a penitenciária.

Nesse mesmo sentido, Milher (1999), esclarece que a Justiça Especial Criminal possibilita aos implicados comportarem um acordo, abrangendo a indenização por eventuais danos materiais ou morais sofridos pelo ofendido, bem como pode o Ministério Público fazer uma proposta de pena a ser cumprida pelo autor do delito. Ensina, ainda, que o fim social a que se destina o Juizado é justamente permitir à população maior acesso à justiça para resolver o litígio de maneira mais célere, bem como pelo fato das penas aplicadas ao ofendido

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não terem o caráter coercitivo e sim, ao contrário, buscam um meio de reeducar o indivíduo.

2.1 REFLEXÕES DA APLICAÇÃO DA LEI 9.099/1995 NAS QUESTÕES DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA.

Antes da mudança da legislação penal, existiam as funções desenvolvidas pela autoridade policial, que exerciam intimidações e resolviam os conflitos seguindo os padrões culturais que são ate compartilhados entre a polícia e a população. Seguindo esse raciocínio, Korner et al (2002), mencionam que se uma questão da violência doméstica fosse levada à polícia, haveria desestímulo, evidenciando um ponto negativo a ser evitado. Hoje, esta questão é dirimida segundo as normas do Juizado Especial Criminal, onde está acontecendo a mesma coisa. Essa banalização revela a grande necessidade e preocupação no sentido de repensar o que vem a ser realmente a conciliação, o que é esse processamento informal dos conflitos, qual é o perfil das pessoas e do espaço no qual ele é feito.

Em outras palavras, o que é preciso fazer é solucionar esses dilemas, tentando buscar delinear o perfil do mediador, que no entender de Korner et al (2002), pode ser a pessoa do padre, pode ser “sua excelência, o comissário, ou outros”.

Assim, embora tenham a aparência de serem suficientes para atenderem grande parcela de casos concretos, muito se questiona acerca da adequação dos juizados especiais criminais diante da violência doméstica a que se expõe um grande número de mulheres.

Esclarece Sallete (2005) que um dos motivos diz respeito ao fato de que mesmo quando a lesão corporal é leve, ela costuma ser recorrente e que raramente a mulher agredida leva o seu caso ao conhecimento do judiciário assim que ocorre na primeira vez, pois os fatores emocionais e sociais costumam conter esse tipo de iniciativa. Outro motivo está relacionado à natureza da convivência existente entre o agressor e a vítima, eis que esta pressupõe certo grau de confiança e afetividade, ou seja, o lado emocional do relacionamento.

É por esta razão que a violência doméstica, ainda quando produz lesões consideradas leves, merece ser classificada de forma diferenciada tendo em vista a violação do vínculo que une a vítima e o agressor, ou seja, quando o marido ou o companheiro agride sua mulher, esta agressão não deve ser juridicamente classificada da mesma forma que uma agressão praticada por um estranho. Bater na esposa ou na companheira deve ser classificado como algo mais grave do que bater em um estranho, ainda que a lesão provocada seja semelhante, pois o tipo de relação entre os cônjuges deve funcionar como elemento agravante.

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Alem dessa questão técnica é também muito criticado pelo movimento feminista o entendimento jurisprudencial predominante nos casos de violência doméstica. Sendo encaminhados aos juizados especiais, esses são submetidos, primeiramente a fase de conciliação, na qual vítima e agressor tentam chegar a um acordo mediado pelo conciliador que procura conduzir as partes a um entendimento equilibrado.

Nesse sentido, enfatiza Araujo (2003) que na prática da Lei nº 9.099/1995 há indícios de ineficácia social, assim, explica que o artigo 69, caput, determina o encaminhamento das partes e do registro do fato, formalizado através do Termo Circunstanciado de Ocorrência (TCO), imediatamente ao Juizado Especial Criminal, para que ali seja realizada a audiência preliminar. Entretanto, contata-se a quase impossibilidade de se dar efetividade a esta previsão legal, isto porque o artigo 70 estabelece que depois de formalizado o TCO, deve a vítima retornar para o local onde o agressor se encontra para juntos comparecerem à Delegacia a fim de formalizar o compromisso de comparecimento ao Juizado Especial Criminal, saindo dali com a data da audiência previamente marcada.

Desse modo, observa-se que a Lei nº 9.099/1995 em alguns aspectos revela efeitos prejudiciais porque neste caso a vítima volta, logo após o registro do fato na Delegacia de policia, em contato com o agressor, o qual encara esse registro na Delegacia como um ato de agressão, quando não um comportamento de insubordinação por parte da vítima. O registro do fato torna-se, assim, um novo motivo de conflito, a ensejar nova violência. Durante este lapso temporal situado entre o registro da ocorrência e a audiência preliminar no Juizado Especial Criminal, a vítima fica totalmente desprotegida e refém do agressor.

Comenta Araujo (2003) que esta postergação da audiência preliminar pode não ser prejudicial à solução judicial de crimes de menor potencial ofensivo que não caracterizem violência contra a mulher, mas neste campo seus efeitos são nefastos, em virtude das especificidades deste tipo de violência, que se vêm se destacando freqüentemente. Ao explicar que estas práticas têm efeitos malignos, diz que a distância temporal entre o registro do fato na Delegacia e a audiência de conciliação faz com que a vítima reconsidere seu posicionamento, o que é normalmente tido como ato de coragem, ao considerar como parâmetro de análise sua relação afetiva ou sua dependência econômica, ou ainda ao ser submetida a diversos tipos de pressões, sobretudo da família do agressor, ou deste próprio, quando não de uma ameaça criminosa.

Assim, essa vítima tende a desistir do procedimento policial instaurado, muitas vezes comparecendo na delegacia no dia seguinte ao registro do fato, para a desistência, ou procurando o Juizado Especial Criminal para o mesmo fim. Não sendo possível a desistência

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antes da primeira audiência, a vítima opta por não comparecer à audiência ou por aceitar um acordo com seu agressor, e não sua punição, como normalmente pretendia no início, ao procurar a intervenção policial, no calor dos fatos.

Evidenciando outro ângulo negativo, descreve Sallete (2005), que a solução da conciliação em muitos casos tem sido o pagamento de uma cesta básica à mulher. Embora na lei não haja nenhuma menção a esse tipo de pena, essa solução se espalhou por todo o Brasil, e com ela as suas críticas, que destacaram dois problemas sociais que fundamentam esse tipo de acordo. O primeiro diz respeito à banalização e tolerância velada à violência doméstica. Importante salientar que tolerância não significa aprovação, mas já é o suficiente para reduzir a gravidade do crime. Em segundo lugar, estão o posicionamento geralmente conservador do direito brasileiro e dos costumes arraigados na sociedade, que consagram o casamento como um bem público a ser preservado a todo custo, fazendo com que a família muitas vezes seja considerada algo mais valioso que a própria integridade física e psicológica da mulher.

O quadro descrito até aqui é bastante pessimista. No entanto, isso não deve levar à paralisação das mobilizações e movimentos de mulheres e homens para transformações socioculturais e jurídicas. Muitas mudanças foram conquistadas em contextos ainda mais conservadores e outras estão a caminho. No que diz respeito à violência doméstica, há um projeto de lei que pretende implementar transformações profundas da legislação, retirando os casos de violência doméstica dos juizados especiais; além disso, relata Sallete (2005) que há o projeto de reforma do Código Penal que pretende alterar a classificação dos crimes sexuais e retirar expressões discriminatórias da legislação, como por exemplo, o de mulher honesta. Há ainda conquistas recentes em razão da aprovação do novo código civil e, antes disso, transformações estruturais trazidas pela constituição de 1988, que positivou a igualdade formal entre homens e mulheres.

O acúmulo de vitórias é um estímulo para novas mobilizações, mas, por outro lado, uma visão realista é imprescindível para que não mascarem as discriminações que ainda persistem. É com a conscientização de todos que o processo tenso e difícil de transformação da sociedade em prol da igualdade de gênero surtirá os efeitos benéficos esperados pela lei e é com a eliminação de uma das expressões mais graves da discriminação contra a mulher, a violência doméstica, que se fará a diferença para uma sociedade mais justa e equitativa.

Referências

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