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Evidência molecular para a via aérea de infecção do Mycobacterium leprae e o papel dos portadores assintomáticos na persistência da hanseníase

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Academic year: 2021

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MINIS≤ÉRIO DA ED≥CAÇÃO ≥NIVERSIDADE FEDERAL DE ≥BERLÂNDIA

FACULDADE DE MEDICINA

PROGRAMA DE PÓS-GRAD≥AÇÃO EM CIÊNCIAS DA SAÚDE

SÉRGIO ARAÚJO

EVIDÊNCIA MOLECULAR PARA A VIA AÉREA DE INFECÇÃO DO MYCOBACTERIUM LEPRAE

E O PAPEL DOS PORTADORES ASSIN≤OMÁ≤ICOS NA PERSIS≤ÊNCIA DA HANSENÍASE

≥BERLÂNDIA 2016

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SÉRGIO ARAÚJO

EVIDÊNCIA MOLECULAR PARA A VIA AÉREA DE INFECÇÃO DO MYCOBACTERIUM LEPRAE

E O PAPEL DOS PORTADORES ASSIN≤OMÁ≤ICOS NA PERSIS≤ÊNCIA DA HANSENÍASE

Tese apresentada ao Programa de Pós-graduação em Ciências da Saúde, Faculdade de Medicina, Universidade Federal de ≥berlândia, como parte dos requisitos para obtenção do título de Doutor em Ciências da Saúde.

Orientadora: Profª. Drª. Isabela Maria Bernardes Goulart Coorientador: Prof. Dr. Luiz Ricardo Goulart

≥BERLÂNDIA 2016

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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) Sistema de Bibliotecas da UFU, MG, Brasil. A663e

2016 Araújo, Sérgio, 1983 Evidência molecular para a via aérea de infecção do Mycobacterium leprae e o papel dos portadores assintomáticos na persistência da hanseníase / Sérgio Araújo. - 2016.

130 p. : il.

Orientadora: Isabela Maria Bernardes Goulart. Coorientador: Luiz Ricardo Goulart.

Tese (doutorado) - Universidade Federal de Uberlândia, Programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde.

Inclui bibliografia.

1. Ciências Médicas - Teses. 2. Hanseníase - Teses. 3. Mycobacterium leprae - Teses. 4. Epidemiologia - Teses. I. Goulart, Isabela Maria Bernardes. II. Goulart, Luiz Ricardo. III. Universidade Federal de Uberlândia. Programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde. IV. Título.

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SÉRGIO ARAÚJO

EVIDÊNCIA MOLECULAR PARA A VIA AÉREA DE INFECÇÃO DO MYCOBACTERIUM LEPRAE

E O PAPEL DOS PORTADORES ASSIN≤OMÁ≤ICOS NA PERSIS≤ÊNCIA DA HANSENÍASE

Tese apresentada ao Programa de Pós-graduação em Ciências da Saúde, Faculdade de Medicina, Universidade Federal de ≥berlândia, como parte dos requisitos para obtenção do título de Doutor em Ciências da Saúde.

≥berlândia, 29 de fevereiro de 2016.

COMISSÃO EXAMINADORA

Presidente: Isabela Maria Bernardes Goulart (Orientadora)

Examinadores: Prof. Dr. David Nascimento Silva Teixeira (UFTM/MG) Profª. Drª. Denise von Dolinger de Brito Röder (UFU/MG) Prof. Dr. Marco Andrey Cipriani Frade (USP/SP)

Profª. Drª. Patrícia Sammarco Rosa (ILSL/SP)

As sugestões da comissão examinadora e as normas PGCS para o formato da tese foram contempladas.

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Agradecimentos

À Profa. Dra.Isabela Maria Bernardes Goulart que como orientadora foi uma acompanhante importante nesta jornada de aprendizagem, me auxiliando nas turbulências deste processo árduo, mas gratificante. Ao Prof. Dr. Luiz Ricardo Goulart que como coorientador foi além de um mestre, um amigo.

À minha esposa e companheira Cíntia Aparecida da Silva Araújo que me acompanhou na luta diária em busca deste título. Aos meus filhos Arthur Andrade Araújo e Theo Andrade Araújo por serem meus motivos para vencer os desafios e as maiores conquistas da minha vida.

À minha mãe Julia Ione Vieira Araújo por seu carinho e amor incondicional me amparando durante toda minha vida. Ao meu pai Reny Alan Araújo por sua dedicação e conselhos que me mantiveram na busca pelo conhecimento. Aos meus irmãos Alessandra Araújo e Reny Alan Araújo Júnior que compartilharam alegrias e me ajudaram nos momentos difíceis. A minha avó Emerenciana Ferreira, por seu carinho e amor. Aos meus avós Pedro Araújo e Lídia Gonçalves Araújo (que deus a tenha) por seu exemplo de vida. A todos familiares que sempre me apoiaram.

Aos amigos do grupo de pesquisa, do laboratório, dos trabalhos, dos lugares por onde andei neste longo caminho, por terem compartilhado suas palavras amigas e me emprestado um pouco de suas forças nos momentos que precisei.

Aos membros do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde e da Universidade Federal de Uberlândia que me proporcionaram esta possibilidade de expandir meus conhecimentos. A CAPES pelas bolsas de pesquisa no Brasil e nos Estados Unidos durante o Programa de Doutorado Sanduíche no Exterior. E as outras fontes financiadoras das pesquisas quais estive envolvido: o CNPq, a FAPEMIG e o Ministério da Saúde.

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RESUMO

A hanseníase persiste como problema de saúde pública, particularmente no Brasil, segundo país mais endêmico do mundo. Os mecanismos de infecção e a cadeia de transmissão não estão completamente elucidados. Neste estudo investigamos a rota de infecção do Mycobacterium leprae, da exposição das vias aéreas, colonização e disseminação pela corrente sanguínea. Este é o primeiro estudo a avaliar no mesmo indivíduo a detecção de DNA de M. leprae pela reação em cadeia da polimerase quantitativa em tempo real (qPCR) no vestíbulo nasal, mucosa de conchas nasais, e amostras de sangue periférico; além de sorologia anti-PGL-I por ensaio imunoenzimático de ligação (ELISA), e da resposta de hipersensibilidade tardia pelo teste de Mitsuda. Foram incluídos 113 pacientes com hanseníase e 104 contatos domiciliares de pacientes com hanseníase (HHCs). Resultados foram explorados por estatísticas bivariadas e por análise de correspondência múltipla. Positividade para DNA entre os pacientes foi de: 66,4% (75/113) em swab nasal, 71,7% (81/113) em biópsia de concha nasal, 19,5% (22/113) em amostras de sangue, e soropositividade de 62,8% (71/113); com o aumento de positividades em direção ao polo multibacilar (MB) do espectro clínico. As quantidades médias de M. leprae detectado nas diferentes amostras de pacientes foram: 1.8E+07 bacilos/ml em swabs nasais, 4.1E+07 bacilos/ml em biópsias nasais, e 9.3E+03 bacilos/ml em amostras de sangue. Relações estatisticamente significantes foram observadas em todas as comparações pareadas entre os testes, com uma intrincada congruência entre todos os resultados dos pacientes (P<0,05). A positividade entre HHCs foi de: 49% (51/104) para swab nasal, 53,8% (56/104) para biópsias nasais, 6,7% (7/104) para sangue, e 18,3% (19/104) para anti-PGL-I. As quantidades médias de M. leprae entre as diferentes amostras foram: 1.8E+04 bacilos/ml em swab nasal, 1.3E+05 bacilos/ml em biópsia nasal, e 1,4E+04 bacilos/ml em sangue. As médias dos índices ELISA dos HHCs de pacientes PB foram menores do que contatos de MB (P=0,0037). A análise de correspondência múltipla dos dados dos HHCs revelou associações entre: os resultados positivos para qPCR no sangue e anti-PGL-I, e resultados positivos para qPCR em swab e biópsia de concha nasal. A comparação entre os valores médios obtidos para os pacientes em relação aos HHCs demonstrou que para ambos locais no nariz (superfície e mucosa), e para sorologia anti-PGL-I, as médias diferiram significativamente (P<0,0001). Durante o período mínimo de seguimento de 5 a 7 anos, de 104 HHCs, 7 desenvolveram hanseníase (6,7%). O risco para o adoecimento foi estimado comparando os resultados de HHCs que desenvolvem doença com aqueles que não foram afetados. Positividade na passagem ou mucosa nasal não foi determinante para desenvolvimento da doença; no entanto, a presença no sangue aumentou o risco [RR / LR + 5,54 (IC 95% 1,30-23,62)], assim como a soropositividade [LR + 3,69 (IC 95% 1,67-8,16); RR 5,97 (IC 95% 1,45-24,5)]. Nossos resultados enfatizam a rota aérea de infecção como predominante. As frequências de positividade entre HHCs revelou que: M. leprae está disseminado entre eles; HHCs estão expostos a um grande número de bacilos, independente da manifestação clínica do caso índice; e que, HHCs abrangem um grupo identificável de indivíduos que contribuem para o risco de infecção para eles e, muito provavelmente, para os outros.

Palavras-chave: Hanseníase. Epidemiologia. Mycobacterium leprae. PCR em Tempo Real Quantitativa (qPCR). Ensaio de Ligação Imuno-enzimático (ELISA). Glicolipídeo fenólico I.

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ABSTRACT

Leprosy persists as public health problem, particularly in Brazil, the second most endemic country in the world. The chain of transmission and mechanisms of infection are not completely understood. Here we investigated the route of infection and disease onset, from airways exposure, colonization, and bloodstream dissemination. This is the first study to evaluate in the same individual the detection of M. leprae DNA through real-time quantitative polymerase chain reaction (qPCR) in nasal vestibule, nasal turbinate mucosa, and peripheral blood samples; in addition to anti-PGL-I serology by enzyme-linked immunosorbent assay (ELISA), and the delayed hypersensitive response through the Mitsuda test (intradermal reaction), of 113 leprosy patients and 104 household contacts of leprosy patients (HHCs). Data exploratory bivariate statistics and multiple correspondence analysis were employed. The DNA positivity among patients: 66.4% (75/113) in nasal swabs, 71.7% (81/113) in nasal turbinate biopsies, 19.5% (22/113) in blood samples, and seropositivity of 62.8% (71/113); with increasing incidences towards the multibacillary (MB) pole of the clinical spectrum. The mean quantities of M. leprae detected in the different patient samples were: 1.8E+07 bacilli/reaction in nasal swabs, 4.1E+07 bacilli/reaction in nasal turbinate biopsies, and 9.3E+03 bacilli/reaction in peripheral blood samples. Statistically significant relationships between every pairwise comparison of data and an intricate multivariate congruence were observed for patients’ data (P<0.05). The positivity among HHCs: 18.3% (19/104) for anti-PGL-I, 49% (51/104) for nasal swabs, 53.8% (56/104) for nasal biopsies, and 6.7% (7/104) for blood samples. The mean quantities of M. leprae among the different samples were: 1.8E+04 bacilli/reaction for nasal swabs, 1.3E+05 bacilli/reaction for nasal turbinate biopsies, and 1.4E+04 bacilli/reaction for peripheral blood samples. The comparison between the mean ELISA indexes obtained for the HHCs of PB patients versus the results from contacts of MB patients were significantly different (P=0.00γ7). The multiple correspondence analysis of HHCs’ data revealed associations between: positive results to both qPCR in blood and anti-PGL-I, and positive results to both qPCR in nasal swab and nasal turbinate biopsies. The comparison between the mean values obtained for patients vs. HHCs, shown that for the both sites in the nose (surface and mucosa), and for the anti-PGL-I, the means differed significantly (P<0.0001). During a minimum follow-up period from 5 to 7 years, out of 104 HHCs, 7 developed leprosy (6.7%). Risk for the disease outcome was estimated comparing results of HHCs WHO develop leprosy with those not affected. Neither nasal passage nor mucosa positivity was determinant of later disease onset; howsoever, blood presence increased the risk for disease development [RR/LR+ 5.54 (IC 95% 1.30 - 23.62)], as well did the seropositivity [LR+ 3.69 (95%CI 1.67 - 8.16); RR 5.97 (95%CI 1.45 - 24.5)]. Our findings strongly suggest that the aerial route of infection and transmission is predominant. The overall frequency of positivity among HHCs revealed that: M. leprae is widespread among them; HHCs experience high bacillary burden regardless of their index case disease manifestation; and that, HHCs comprise a recognizable group of individuals that contribute to the infection risk to themselves and most probably to others.

Key words: Leprosy. Epidemiology. Mycobacterium leprae. Quantitative Real-Time PCR. Enzyme-Linked Immunosorbent Assay. Phenolic glycolipid I.

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S≥MÁRIO

CAPÍ≤≥LOI–REVISÃO BIBLIOGRÁFICA ... 9

CONSIDERAÇÕES GERAIS ... 9

CLASSIFICAÇÃO DA DOENÇA ... 10

PA≤OLOGIA DA HANSENÍASE ... 12

REAÇÕES HANSÊNICAS ... 13

CON≤EX≤≥ALIZAÇÃO HIS≤ÓRICA DA HANSENÍASE ... 15

TRATAMENTO DA HANSENÍASE ... 18

IMUNIDADE CELULAR NA HANSENÍASE ... 21

SOROLOGIA NA HANSENÍASE ... 24

DE≤ECÇÃO DE MYCOBACTERIUM LEPRAE ... 26

RESIS≤ÊNCIA MEDICAMENTOSA NA HANSENÍASE ... 29

SI≤≥AÇÃO A≤≥AL ... 35

JUSTIFICATIVA ... 36

OBJETIVO ... 37

REFERÊNCIAS ... 39

CAPÍ≤≥LOII–ARTIGO:ARAUJO ET AL 2016 ... 59

RESUMO ... 60 IN≤ROD≥ÇÃO ... 61 MATERIAL E MÉ≤ODOS ... 62 RESULTADOS ... 65 DISC≥SSÃO ... 73 REFERÊNCIAS ... 76 CONCL≥SÃO ... 78 APÊNDICE ... 79 ANEXOS ... 87

(9)

C

AP겳LO

I

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CAPÍTULO

I

R

EVISÃO BIBLIOGRÁFICA

C

ONSIDERAÇÕES GERAIS

A hanseníase é uma doença infecciosa crônica que tem como agente causador o Mycobacterium leprae, um bacilo álcool-ácido resistente (BAAR) de crescimento lento e um parasita intracelular obrigatório (GOULART et al., 2002). A hanseníase afeta predominantemente a pele, nervos periféricos, e as mucosas (HASTINGS et al., 1988), visto que os principais sítios afetados pela doença são as regiões mais frias do corpo como as extremidades dos membros e da face (HASTINGS et al., 1968), decorrência da temperatura preferencial de crescimento do bacilo ser entre 27 e 30ºC (SHEPARD, 1965; SHEPARD e MCRAE, 1965).

O M. leprae não é cultivável in vitro e os modelos experimentais in vivo exigem grande adequação técnica (MADEIRA e ROSA, 2000). No homem, o M. leprae é capaz de infectar células do sistema mononuclear fagocitário e apresenta um tropismo singular por células de Schwann produtoras de mielina nos nervos periféricos. O M. leprae apresenta alta infectividade, pois é capaz de infectar um grande número de indivíduos (BARRETO et al., 2012), porém possui baixa patogenicidade, uma vez que, apenas uma pequena parte dos indivíduos infectados apresenta sinais clínicos da doença (GOULART e GOULART, 2009). Os sintomas normalmente aparecem após um longo período de incubação que em média varia de 2 a 7 anos, porem este período pode se estender por décadas (LOCKWOOD e REID, 2001).

O diagnóstico da hanseníase é prioritariamente clínico. A Organização Mundial da Saúde (OMS ou WHO, do inglês World Health Organization) delineia que a hanseníase seja diagnosticada quando ocorre pelo menos um dos três sinais cardinais da doença: manchas avermelhadas ou hipopigmentadas e/ou áreas com perda de sensibilidade; troncos nervosos espessados com perda de sensibilidade e/ou fraqueza nos músculos enervados por estes; e presença de BAAR em amostra de esfregaço intradérmico (WHO, 2012). Porém estes sinais nem sempre são aparentes e clinicamente a hanseníase se manifesta em um amplo espectro influenciado pela relação individual entre o hospedeiro e o parasita (HASTINGS, 1994).

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C

LASSIFICAÇÃO DA DOENÇA

A classificação da doença proposta pela OMS e atualmente aceita em todo o mundo, utiliza-se de parâmetros essencialmente operacionais para determinar o tratamento dos doentes. Esta classificação operacional divide os pacientes entre: um grupo com resposta imune celular contra o M. leprae, capaz de conter a disseminação da infecção no organismo, apresentando poucos bacilos, portanto denominado paucibacilar (PB); e outro grupo que não possui resposta imune adequada para reprimir a disseminação de bacilos, possibilitando a multiplicação do bacilo pelo organismo, denominado multibacilar (MB).

Considerando esta classificação dos casos de hanseníase, em 1981 a OMS formou o primeiro Grupo de Estudos sobre Quimioterapia da Hanseníase que recomendou os regimes de tratamento para hanseníase PB ou MB uma combinação específica de quimioterápicos (rifampicina, clofazimina e dapsona), denominado poliquimioterapia (PQT ou MDT, do inglês multi-drug therapy) (WHO, 1982). Em 1987, na sexta reunião do Comitê de Especialistas em Hanseníase constituído pela OMS (WHO, 1988), foi endossado que todos os casos com identificação da presença de BAAR deveriam ser classificados como hanseníase MB. No ano de 1993, a OMS realizou o segundo Grupo de Estudos sobre Quimioterapia da Hanseníase, qual indicou que onde o exame bacteriológico não fosse disponível, os casos poderiam ser classificados com base no exame clínico, em hanseníase PB (uma a cinco lesões da pele) ou MB (seis ou mais lesões de pele). Quando a forma de classificação estiver duvidosa, recomenda-se que o paciente seja tratado como hanseníase MB.

Atualmente a mais aceita classificação da hanseníase e predominante nas pesquisas científicas foi proposta por Ridley e Jopling em 1962 (RIDLEY e JOPLING, 1962). Este sistema de classificação subdivide os pacientes de acordo com fatores imunológicos, em cinco grupos distintos: tuberculóide (TT), boderline-tuberculóide (BT), borderline-borderline (BB), boderline-lepromatoso (BL), ou lepromatoso (LL) (RIDLEY e JOPLING, 1966). A variedade das formas clínicas é definida por uma vigorosa resposta imune celular no polo tuberculóide e uma progressiva redução na resposta imune celular em direção ao polo lepromatoso,

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associada com o aumento na carga bacilar, mais lesões na pele e nos nervos. A classificação da hanseníase borderline compreende as formas clínicas da doença que se manifestam em um espectro contínuo entre os grupos polares TT e LL. Um paciente com hanseníase BB pode desenvolver com o tempo características clínicas, bacteriológicas, e histopatológicas mais semelhantes com a doença tuberculóide (BT), denominado “upgrading”, enquanto o desenvolvimento de características mais semelhantes com a doença lepromatosa (BL) é chamado “downgrading” (HASTINGS, 1994).

No Brasil, a hanseníase consta na lista nacional de doenças de notificação compulsória (SAÚDE, 2011) e todos os casos diagnosticados devem ser cadastrados no Sistema de Informação de Agravos de Notificação (SINAN). O SINAN é um instrumento de coleta e registro de dados da Secretaria de Vigilância à Saúde (SVS) do Ministério da Saúde (MS), no qual são cadastradas as informações dos casos de hanseníase diagnosticados em todo o território nacional, pelo preenchimento de uma ficha individual de notificação e investigação para cada paciente (Anexo A). De acordo com a ficha de notificação, o caso de hanseníase deve ser classificado por sua forma clínica e esta considera a classificação de Madri, baseada em uma proposta dos pesquisadores brasileiros Eduardo Rabello e Francisco Acioli Eduardo Rabelo, que foi aceita oficialmente no VI Congresso Internacional de Hanseníase realizado em 1953 na cidade de Madri, na Espanha (ANÔNIMO, 1953). Esta classificação levou em conta dados clínicos e as características de lesões cutâneas apresentadas pelos pacientes, dividindo-os entre as formas: indeterminada (I), tuberculóide (T), dimorfa (D), e virchowiana (V). Consideram-se dois polos estáveis e opostos (T e V), assim como na classificação de Ridley-Jopling (TT e LL), visto que entre estas formas polares são alocados os pacientes instáveis (D), que englobaria os grupos BT, BB e BL da classificação de Ridley-Jopling. Com a evolução natural da doença, o grupo D tende a manifestar características que se assemelham a uma das formas polares definidas. A forma I é considerada uma forma inicial da doença, na qual não se manifestam muitos sinais e sintomas, tão pouco há comprometimento neural grave, podendo esta progredir para uma das formas clínicas no espectro da doença, ou até evoluir para a cura espontânea (OPROMOLLA e URA, 2002).

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P

ATOLOGIA DA HANSENÍASE

A hanseníase indeterminada, considerada a primeira manifestação clínica da hanseníase, é caracterizada pelo aparecimento de manchas hipocrômicas de limites imprecisos e com alteração de sensibilidade, sendo comumente observada alteração sensitiva térmica com preservação tátil e dolorosa. Estas lesões aparecem em qualquer área da pele e podem ser ligeiramente mais secas que a pele normal ao redor. Ainda não há comprometimento de troncos neurais, apenas de ramúsculos nervosos cutâneos (OPROMOLLA e URA, 2002; ARAÚJO, 2003). Apesar de não serem observados bacilos, o exame histopatológico pode revelar a presença de infiltrado inflamatório linfo-histiocitário focal, em torno de vasos, anexos, filetes nervosos e apêndices cutâneos (FLEURY, 2000)

A forte resposta imune celular na hanseníase tuberculóide restringe a localização das lesões, que são bem delimitadas e na maioria dos casos se manifesta como lesão única. Observam-se lesões em placas ou anulares, com bordas papulosas e áreas da pele eritematosas ou hipocrômicas. O desenvolvimento centrífugo lento leva à atrofia no interior da lesão, que pode assumir aspecto tricofitóide com descamação das bordas. Ocorre alteração de sensibilidade tátil, térmica e dolorosa, com queda de pelos (alopecia) e diminuição ou ausência de sudorese (anidrose). A forma neural pura também é observada, na qual não há lesões cutâneas, sendo caracterizada pelo espessamento do tronco nervoso com dano neural precoce e grave, principalmente quando atinge nervos sensitivo-motores (OPROMOLLA e URA, 2002; ARAÚJO, 2003). A histopatologia da hanseníase T não apresenta bacilos, são observados granulomas formados por células epitelióides agrupadas compactamente, usualmente em torno de glândulas sudoríparas, vasos e nervos (FLEURY, 2000).

Nas formas instáveis da hanseníase dimorfa são observadas as mais diversas manifestações clínicas, com comprometimento cutâneo, neural e/ou sistêmico. São observadas placas eritematosas, manchas hipocrômicas com bordas ferruginosas, manchas eritematosas ou acastanhadas, com limite interno nítido e limites externos imprecisos, placas eritemato-ferruginosas ou violáceas, com bordas internas nítidas e limites externos difusos (lesões faveolares). A presença de lesões no pescoço e

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nuca, infiltração assimétrica da face ou dos pavilhões auriculares são características desta forma clínica (OPROMOLLA e URA, 2002; ARAÚJO, 2003). Podem ser detectados BAAR ou não, sendo que no exame histológico os granulomas de células epitelióides são mais frouxos ou células se encontram espalhadas, linfócitos podem ou não estar presentes e macrófagos podem apresentar aspecto vacuolado. Quando observados bacilos, estes se encontram preferencialmente nos nervos, que podem perder sua estrutura normal (RIDLEY e JOPLING, 1966; FLEURY, 2000).

A manifestação da forma multibacilar polar da hanseníase é identificada pela pouca resistência à proliferação de M. leprae, com evolução crônica caracterizada por infiltração cutânea difusa e progressiva, sendo mais acentuada na face e nos membros. Há comprometimento das mucosas das vias aéreas superiores, olhos, testículos, nervos, linfonodos, fígado e/ou baço. Observam-se pápulas, nódulos e máculas. A pele apresenta-se luzidia, xerótica, com aspecto apergaminhado e tonalidade acobreada. Há rarefação de pelos, particularmente nos cílios e supercílios, com ocorrência de queda total de pelos, denominada madarose. Ocorre comprometimento nervoso nos ramúsculos da pele, na inervação vascular e nos troncos nervosos, com deficiências funcionais e seqüelas tardias. A obstrução nasal, rinorréia serossangüinolenta e edema de membros inferiores são sinais precoces da hanseníase virchowiana (OPROMOLLA e URA, 2002; ARAÚJO, 2003). Na histopatologia, são observados múltiplos bacilos íntegros, isolados ou em globias, no interior de macrófagos, filetes nervosos e vasos sanguíneos. Ocorrem agrupamentos de macrófagos, sendo observados também macrófagos com aspecto espumoso, as células de Virchow (RIDLEY e JOPLING, 1966; OPROMOLLA e URA, 2002).

R

EAÇÕES HANSÊNICAS

Sobrepondo à classificação clínica espectral da hanseníase, impõem-se ainda os chamados "estados reacionais", que podem ocorrer durante o curso natural da doença, durante o tratamento e mesmo após o tratamento, quando o paciente já foi considerado curado (NAAFS, 1994). As reações hansênicas podem ser definidas como manifestações clínicas agudas resultantes de alterações no balanço

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imunológico entre o hospedeiro e o M. leprae (SAMPAIO e SARNO, 1998) e são classificadas em dois tipos: reação Tipo 1 (reação reversa e reação de “downgrading”) e reação Tipo 2 [reação de exacerbação ou eritema nodoso hansênico (ENH)] (RIDLEY, 1969).

As reações do Tipo 1 ocorrem principalmente em pacientes instáveis (formas BT e BB) com uma potencial defesa imune celular. Na reação reversa há um aumento na imunidade celular com redução no número de bacilos, geralmente como resultado do tratamento, enquanto que na reação de “downgrading” há uma diminuição da imunidade e um aumento correspondente do número de bacilos, ocorrendo geralmente em pacientes ainda não tratados. Clinicamente as duas reações do Tipo 1 são semelhantes, sendo possível diferencia-las apenas histologicamente, pela capacidade do paciente em produzir, ou não, uma imunidade mediada por células (IMC) contra o M. leprae (RIDLEY, 1969).

As reações do Tipo 2 são características da hanseníase polar MB (BL e LL) e podem ocorrer em pacientes tratados ou não. Nestes tipos de reações, ocorre uma exacerbação inflamatória súbita e sistêmica, em muitos casos durante uma recidiva da doença após o tratamento. A manifestação mais frequente da reação Tipo 2 é o ENH, um aparecimento repentino de pápulas, nódulos e placas nodosas de coloração eritematosa, desencadeada pela deposição local de complexos imunes que lesionam o tecido (WEMAMBU et al., 1969).

Associada as reações pode-se observar também a ocorrência de neurite, que também se manifesta de forma silenciosa, com perda sensorial e motora, isto é, o dano funcional do nervo se instala sem quadro clínico de dor e espessamento do nervo, antes, durante ou após alta medicamentosa (LIENHARDT e FINE, 1994)

Os episódios reacionais são considerados uma das principais causas de morbidade e incapacidade na hanseníase, causando danos irreversíveis nos nervos periféricos e resultando na perda da função sensorial e motora, principalmente na face e nos membros, que levam a severas deformidades e ao estigma da doença (LOCKWOOD e SAUNDERSON, 2012).

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C

ONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICA DA HANSENÍASE

A hanseníase é uma das mais antigas moléstias que acometerem a humanidade. Apesar de anedóticas, referências a uma doença cutânea e incapacitante, posteriormente traduzida como lepra, estão descritas nas escrituras mais antigas registradas da humanidade, como na bíblia e nos vedas.

Não obstante, nos últimos anos a ciência tem revelado uma relação milenar entre o M. leprae e o Homo sapiens. O sequenciamento completo do genoma do M. leprae reportado em 2001, com sua peculiar redução genômica evolutiva e pouca variação clonal entre bacilos isolados em todo o mundo (COLE et al., 2001), permitiu que um estudo pioneiro em 2005 demonstrasse associações entre a distribuição geográfica das cepas identificadas globalmente e a migração das primeiras populações humanas infectadas, com provável origem da infecção com M. leprae no crescente fértil, presumido também como lugar de origem do homem moderno (MONOT et al., 2005).

A mais antiga evidência patológica da hanseníase em humanos foi relatada em 2009 na revista Science, uma das mais prestigiadas no meio científico. Neste estudo foram identificadas características da hanseníase lepromatosa (LL) em um esqueleto humano com sepultamento datado de aproximadamente entre 2500 a 2000 anos antes de Cristo (a.C.), encontrado em um sítio arqueológico na Índia (ROBBINS et al., 2009).

A resistente parede celular do M. leprae formada por arranjos complexos de moléculas de carboidratos, lipídios, peptideoglicanos e proteínas, característica do gênero Mycobacterium, permite a preservação do DNA destes microrganismos por milênios (HERSHKOVITZ et al., 2008). O registro mais antigo com identificação molecular do DNA de M. leprae em material extraído de esqueletos humanos foi descrito em um trabalho publicado em 1994, no qual foram analisados esqueletos com indicações patológicas sugestivas de hanseníase e com sepultamento aproximadamente datado de 600 a.C. ± 50 anos (RAFI et al., 1994).

A primeira descrição do Mycobacterium leprae foi atribuída a Gerhard Hinrich Armauer Hansen (1841-1912) (GHOSH e CHAUDHURI, 2015), sobrenome que

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posteriormente originaria a nova nomenclatura da doença, deixando de ser chamada lepra e passando a ser denominada hanseníase no Brasil, alteração motivada principalmente pelo estigma histórico ligado à doença. No ano de 1871 durante suas pesquisas no St. Jörgens Hospital em Bergen na Noruega, Hansen observou ao microscópio no interior de células, corpos bacilares que se tingiam pelo ácido ósmico (ROBERTSON, 2003). Estas células haviam sido coletadas de nódulos granulomatosos subcutâneos (hansenomas) de pacientes com hanseníase. Estes tipos de células já haviam sido estudados e descritos pelo mentor de Hansen, Daniel Cornelius Danielssen (1815-1894) e por Wilhelm Boeck (1808-1875), no livro Traité de la Spédalsked ou eléphantiasis de grecs, publicado em 1848. Um livro que à luz da microscopia e com ilustrações exemplares, é considerado como o primeiro manuscrito médico “realmente” científico. No entanto, os elementos pardos que Danielssen observara nestas células, foram por ele negligenciados, possivelmente porque tinham sido considerados por Rudolf Ludwig Carl Virchow (1821-1902) como meros artefatos formados por lipídeos degenerados. Virchow foi um patologista com grande prestígio internacional e que naquela época havia sido convidado para colaborar com os estudos de Danielssen sobre hanseníase na Noruega (BECHLER, 2012). Contudo, é interessante constatar que em estudos posteriores, Virchow alteraria sua visão inicial classificando estas células como leprazellen (células da lepra em alemão). Estas células comumente observadas em lesões de pacientes MB, atualmente são denominadas células de Virchow e são macrófagos ricos em bacilos e lipídeos que às conferem um aspecto espumoso.

Ao contrário de Danielssen, que acreditava na hereditariedade da hanseníase, Hansen também foi pioneiro ao creditar a etiologia da doença a um microrganismo (HANSEN, 1875), colocando a hanseníase no papel histórico de primeira doença infecciosa com micróbio causador identificado, apesar deste não satisfazer os postulados de Koch (GHOSH e CHAUDHURI, 2015).

No período pré-colonial das Américas, não há evidências da ocorrência de hanseníase entre as tribos indígenas nativas. Devido a este fato, acredita-se que a doença tenha sido introduzida pelos colonizadores europeus e pelo tráfico de escravos africanos. Nos Estados Unidos acredita-se que a hanseníase tenha sido disseminada pelos imigrantes franceses que fundaram a região hoje conhecida

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como o estado da Louisiana. Na América latina, os colonizadores espanhóis teriam transmitido a doença aos habitantes nativos. No Brasil, os portugueses seriam os principais carreadores da enfermidade. Independentemente da origem, as precárias condições socioeconômicas daquele período, o completo desconhecimento e a inexistência de terapêuticas eficazes, contribuíram para a propagação da doença (OPROMOLLA e OPROMOLLA, 2000).

No início do século XX no Brasil, pesquisadores brasileiros influenciaram a divulgação do conhecimento sobre a hanseníase e passaram a protagonizar discussões a respeito da doença nas sociedades e jornais médicos internacionais. Discussões sobre a segregação dos indivíduos afetados pela hanseníase estavam em pauta desde 1897, ano da primeira Conferência Internacional sobre Hanseníase, realizada em Berlim (PANDYA, 2004). Quando Oswaldo Cruz assumiu a direção da Diretoria Geral de Saúde Pública do Brasil, estabelecendo uma reforma sanitária promovida pelo Estado, medidas mais rigorosas foram estabelecidas para o controle da hanseníase. Devido às noções médicas da época que consideravam o doente como um risco para aqueles em seu convívio, Oswaldo Cruz propôs em 1913 a construção do primeiro grande leprosário federal na Ilha Grande, distante da costa o suficiente para evitar a evasão dos doentes e o contágio da população sadia (SANTOS, 2007). Este foi o início de uma era marcada pelo preconceito e isolamento daqueles afetados, aumentando e difundindo o medo a respeito da hanseníase e o avassalador estigma psicossociocultural ainda presente na sociedade atual (OLINTO, 2014). A internação compulsória dos pacientes de hanseníase no Brasil foi legalmente abandonada em 1962, no entanto os muitos pacientes que foram afastados de seus vínculos com o mundo exterior, optaram por permanecer nas colônias (CASTRO e WATANABE, 2009).

Em tentativa de diminuir o estigma e preconceito ligado à denominação da doença como lepra, em 1968 o pesquisador brasileiro Abraão Rotberg propôs a mudança da terminologia para hanseníase, mudança que foi aceita no estado de São Paulo em 1970 (ROTBERG, 1969). O Decreto Federal nº 76.078 de 04 de agosto de 1975 alterou em território nacional a denominação oficial da doença para hanseníase (OPROMOLLA e MARTELLI, 2005).

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T

RATAMENTO DA HANSENÍASE

Antes do surgimento dos antibióticos modernos o óleo de chaulmoogra era usualmente aplicado para o tratamento da hanseníase. O óleo faz parte dos medicamentos utilizados na medicina ayurvédica para o tratamento de diversas doenças da pele. O pesquisador britânico Frederic John Mouat é considerado como quem introduziu o uso do óleo no ocidente, utilizando-o em 1854 como um agente tópico e oral no tratamento de casos de hanseníase (PARASCANDOLA, 2003). A administração tópica apresentava poucos efeitos e a ingestão gerava náusea e desconfortos intestinais. Apesar destas dificuldades, em 1916 no hospital-colônia para pacientes de hanseníase na cidade de Carville, na Louisiana (EUA), o médico Ralph Hopkins realizou um estudo com pacientes que ali residiam, porém os resultados foram decepcionantes com menos de 30% de melhoras (8% pioraram e a taxa de mortalidade foi de 4%) (PARASCANDOLA, 2003; SANTOS et al., 2008).

Em 1908 os pesquisadores alemães Emil Fromm e Jakob Wittmann foram os primeiros a sintetizar o composto 4-[(4-aminobenzeno)sulfonil]anilina, também conhecido como dapsona, porém estavam em busca de um corante azoico e suas pesquisas não exploraram o efeito antibiótico. Foi apenas três décadas depois, em 1937, que Buttle na Inglaterra e Fourneau na França, reportaram simultaneamente a potencialidade do uso da dapsona como um efetivo antibiótico (WOZEL, 1989). Investigações posteriores propiciaram sintetizar os compostos do grupo das sulfas, utilizados para o controle de diversas infecções.

Na hanseníase, as sulfonas foram pioneiramente testadas no hospital-colônia de Carville a partir de 1941, pelo médico norte americano Guy Henry Faget (1891-1947) e sua equipe (FAGET et al., 1943). Na forma do cloridrato “Promin” o medicamento apresentou um efeito terapêutico inigualável no tratamento da hanseníase e esse sucesso passou a ser conhecido mundialmente como “o milagre de Carville” (PARASCANDOLA, 1998).

No Brasil a sulfona foi utilizada pela primeira vez em 1944, no asilo-colônia Padre Bento em Guarulhos, SP (OPROMOLLA, 1997). A dapsona ainda é utilizada até hoje no tratamento PQT da hanseníase.

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A partir da década de 60, relatos sobre resistência medicamentosa à sulfonas na hanseníase passaram a surgir e a gradativamente por em perigo o milagroso tratamento da doença (FLOCH, 1957; REES, 1964; ADAMS e WATERS, 1966; REES, 1967; BROWNE, 1969). Enquanto os casos de resistência à monoterapia aumentavam na década seguinte, diversas novas drogas eram testadas (ANÔNIMO, 1971; SHEPARD et al., 1971). A falta de critérios científicos e de técnicas experimentais dificultava este processo, porém entre os novos compostos dois quimioterápicos se destacaram: a clofazimina (LEVY et al., 1972; AZULAY et al., 1974; RODRIGUEZ et al., 1974; TOLENTINO et al., 1974; TAYLOR e ALEXANDER, 1976) e a rifampicina (REES et al., 1970; HOLMES e HILSON, 1972; LANGUILLON, 1975; REES et al., 1976). O aumento exponencial de casos resistentes ao redor do mundo com relatos de casos com resistência primária a dapsona (PEARSON et al., 1977; GIRDHAR et al., 1978; GUINTO et al., 1981), juntamente com indícios da existência de M. leprae resistente à rifampicina (JACOBSON e HASTINGS, 1976; PATTYN et al., 1976), exigiam uma medida de contenção rápida e eficaz para esta endemia que afetava dezenas de milhares de pessoas no início da década de 80. Em 1982 a OMS instituiu o tratamento da hanseníase pela PQT (WHO, 1982).

Durante décadas seguintes, novas drogas pertencentes às famílias das fluoroquinolonas, ciclinas e macrolídeos foram identificadas como eficazes contra o M. leprae (GROSSET, 2001). Em modelos animais ou em humanos, a minociclina, a ofloxacina e a claritromicina, demonstraram individualmente ou em combinação, atividade contra o M. leprae superior ao das drogas dapsona e clofazimina (JI et al., 1991; JI et al., 1993; GELBER et al., 1995; JI et al., 1996). Nos seres humanos, uma dose única da combinação ofloxacina (400mg) mais minociclina (100mg) foi capaz de matar 68% a 98% de M. leprae viáveis. Além disso, uma única dose de ROM, uma combinação de três drogas [rifampicina (600mg), ofloxacina (400mg) e minociclina (100mg)], foi capaz de matar 99% dos bacilos viáveis (JI et al., 1998). Como resultado de ensaio clínico randomizado (MANE et al., 1997), o sétimo relatório do Comitê de Especialistas em Hanseníase da OMS em 1997, recomendou o uso de uma dose única de ROM para o tratamento de pacientes PB com lesão única (WHO, 1998). Em 2011 uma revisão sistemática concluiu que uma única dose ROM é inferior à PQT no tratamento de pacientes PB, porém não existem evidências

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sobre múltiplas doses ROM e este regime deveria ser comparado à PQT em ensaios randomizados (SETIA et al., 2011).

O Ministério da Saúde brasileiro em comprimento às recomendações da OMS regulamenta o tratamento ambulatorial da hanseníase por meio de esquemas terapêuticos padronizados de acordo com a classificação operacional do paciente. Os casos PB devem ser tratados com regime de 6 doses: rifampicina (600mg) com administração supervisionada mensal e dapsona (100mg mensal e dose diária autoadministrada de 100mg). Na sexta dose, os pacientes PB devem ser submetidos ao exame dermatológico, avaliação neurológica, do grau de incapacidade física e receber alta por cura. Os casos MB devem ser tratados com regime de 12 doses: rifampicina (600mg), dapsona (100mg) e clofazimina (300mg) com administração supervisionada mensal, e dose diária com dapsona (100mg) e clofazimina (50mg) autoadministrada. Na décima segunda dose, os pacientes MB devem ser submetidos ao exame dermatológico, avaliação neurológica, do grau de incapacidade física e receber alta por cura. Pacientes MB que não apresentarem melhora clínica ao final do tratamento devem ser encaminhados para avaliação nas unidades de maior complexidade para verificar a necessidade de um segundo ciclo de tratamento com 12 doses. Em crianças ou adultos com peso inferior a 30 kg deve-se ajustar a dose de acordo com o peso. Em casos de intolerância ou contraindicação esquemas terapêuticos substitutivos com a combinação de ofloxacina e/ou minociclina são recomendados (BRASIL, 2010).

Na última década, duas novas drogas promissoras para o tratamento da hanseníase possibilitam pela primeira vez a combinação de fármacos verdadeiramente bactericidas na PQT, uma vez que, dapsona e clofazimina são considerados apenas bacteriostáticos para o M. leprae. Ambos compostos, a moxifloxacina (uma fluoroquinolona) (PARDILLO et al., 2008; PARDILLO et al., 2009) e a bedaquilina (diarilquinolina R207910 ou TCM207) (FRANZBLAU, 2005; JI et al., 2006; GELBER et al., 2009), têm demonstrado atividade similar à rifampicina, eliminando mais de 90% dos bacilos com apenas uma dose. Estudos clínicos randomizados deveriam ser realizados para comprovar a eficácia superior de novos regimes comparados ao tratamento atual.

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I

MUNIDADE CELULAR NA HANSENÍASE

Embora a hanseníase seja uma doença infecciosa crônica ela também pode ser considerada uma doença imunológica. A resposta imune individual frente ao M. leprae irá determinar a supressão ou o estabelecimento da doença, e quando esta ocorrer, qual manifestação clínica o indivíduo irá apresentar.

O processo imunológico a nível celular está intimamente relacionado aos padrões de citocinas produzidas pelas primeiras células de defesa, à quantidade produzida, ao período de produção e à disponibilidade destas citocinas no sítio da infecção (YAMAMURA, 1992; GOULART et al., 2002; KABELITZ e MEDZHITOV, 2007). Quando a micobactéria entra em contato com os macrófagos do hospedeiro, ele é fagocitado e o macrófago passa a produzir citocinas IL-1, TNF-α e IL-12 que atuam sobre linfócitos T, principalmente CD4+ tornando-os ativados e capazes de produzir suas próprias citocinas. Os linfócitos CD4+ são subdivididos em Th1, que produzem as citocinas 2, IFN- e TNF , e em Thβ que produzem as citocinas IL-4, IL-5, IL-6, IL-8 e IL-10 (SAMPAIO e SARNO, 1998; GOULART et al., 2002; MONTOYA et al., 2009; MODLIN, 2010).

Na hanseníase, a ativação dos linfócitos T-auxiliares 1 (Th1) produz IL-2 e leva à proliferação de elementos da IMC e da hipersensibilidade tardia. Por meio de fatores como o IFN- , os linfócitos Th1 ativam os macrófagos aumentando suas capacidades microbicidas. Além disso, um excesso de IFN- pode suprimir a função dos linfócitos Th2 (OTTENHOFF et al., 2005). No entanto, a citocina IL-4, produzida por linfócitos Th2, suprime a ativação das células Th1 ao mesmo tempo em que promove diferenciação e ativação de células B (GOULART et al., 2000; GOULART et al., 2002; MODLIN, 2010).

Pacientes com hanseníase TT têm uma forte imunidade celular, mas apresentam baixa produção de anticorpos. Esse modelo de imunidade é refletido em granulomas que se formam em torno dos nervos e produzem dano neural sensorial periférico e lesões de pele secundárias (DE FREITAS e SAID, 2013). Nesses pacientes, observa-se uma resposta imune celular específica com participação de linfócitos, principalmente do tipo TCD4+, típico do padrão Th1. Desse modo, M.

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leprae é raramente visto e a resistência ao patógeno é forte, a julgar pela ativação in vitro de linfócitos de pacientes em respostas aos antígenos de M. leprae (MODLIN e REA, 1988). As citocinas que predominam nas lesões da forma clínica TT são típicas do padrão Th1 (IL-2 e IFN- ) e atuam no sentido de aumentar a IMC (MODLIN, 2010).

Pacientes com hanseníase LL não apresentam significativa resposta celular ao M. leprae e nas lesões de pele encontram-se macrófagos jovens pouco diferenciados e um pequeno número de células T, predominantemente do tipo CD8+ (GOULART et al., 1996). Nesse polo, predomina a imunidade humoral tipo Th2, a qual exibe altos títulos de anticorpos específicos contra o glicolipídeo fenólico I (PGL-I), antígeno específico de M. leprae, presente nos tecidos e soro de pacientes BL e LL, sem, no entanto, conferir proteção efetiva contra o bacilo (SPENCER e BRENNAN, 2011). A elevada titulação da citocina TGF associada à presença do PGL-I desempenha uma ação supressora da imunidade celular em lesões hansênicas na derme e secretada sistemicamente induz efeitos pró-inflamatórios, atuando como moduladora nas reações inflamatórias agudas de ENH, sendo também associada à resposta imune Th2 em formas MB de hanseníase (GOULART et al., 2000).

Até pouco tempo, as células T CD4+ eram caracterizadas em um modelo bifásico de diferenciação nos subtipos Th1 ou Th2, dependendo das citocinas que produziam. Porem recentemente diversas subpopulações de células T também envolvidas com a resposta imune foram descritas e caracterizadas, e atualmente os subtipos de células T são distinguidos não só pelas citocinas, mas também pela expressão de fatores de transcrição, incluindo os subtipos Th17, Th9, T-auxiliar folicular (Tfh) e as células T-reguladoras (Treg) (HIRAHARA e NAKAYAMA, 2016).

Células TCD4+CD25+Foxp3+ com antígenos e funções características são descritas como células Treg, pois suprimem ativamente a resposta imune a antígenos próprios e antígenos tumorais e inibem o desenvolvimento de doenças autoimunes, assim como controlam a resposta inflamatória a bactérias, vírus, parasitas e fungos, contribuindo para a persistência do agente infeccioso (KAUFMANN e KABELITZ, 2010). Pesquisas têm demonstrado um predomínio de

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células Treg, especialmente produtoras de IL-10 (Th3), nas formas do polo lepromatoso da doença, indicando um papel supressor da resposta imune (PALERMO et al., 2012; FERNANDES et al., 2013) e eventual persistência da infecção pelo M. leprae (KUMAR et al., 2013; BOBOSHA et al., 2014).

Os Linfócitos Th17, secretores da citocina IL-17 que têm ação pró-inflamatória, estão envolvidos na defesa contra microrganismos e na mediação de inflamação (KAUFMANN e KABELITZ, 2010). Na hanseníase, a resposta Th17 foi descrita como relacionada à imunopatogenia da reação Tipo 2 (MARTINIUK et al., 2012) e relacionada a forma LL (SAINI et al., 2013).

Diante da complexidade dos mecanismos da resposta imune, torna-se difícil determinar as causas da anergia celular em pacientes LL, a qual pode ser resultante de defeitos no processamento e apresentação do antígeno aos linfócitos T, ou então devido à ausência de linfócitos reativos ao M. leprae. Nas lesões de pacientes LL há predomínio de linfócitos T supressores ao contrário do que ocorre na forma TT, na qual predomina os linfócitos T auxiliares. Além disso, pode haver deficiência na produção de citocinas estimuladoras e reguladoras (GORODEZKY et al., 2004; SADHU et al., 2016).

A capacidade individual de gerar uma resposta imune celular específica contra o M. leprae pode ser mensurada pelo teste de Mitsuda, uma ferramenta importante no prognóstico dos casos de hanseníase que foi introduzida oficialmente no VI Congresso Internacional de Hanseníase de 1953 em Madri (ANÔNIMO, 1953). Este é um teste intradérmico, no qual é injetada uma suspensão de bacilos mortos que desencadeia no local uma reação de hipersensibilidade tardia do tipo granulomatosa. O resultado é obtido após 21 a 28 dias e é graduado de acordo com a medida em milímetros (mm) do diâmetro da enduração (não do eritema) no local da injeção. Em geral são considerados positivos resultados maiores ou iguais (≥) a 5 mm. Pacientes MB, especialmente aqueles com formas clínicas BL e LL, apresentam deficiência no combate ao M. leprae e consequentemente seus resultados são negativos no teste de Mitsuda. Do outro lado, pacientes PB, particularmente TT, são reativos ao teste e apresentam resultados positivos. Em pacientes borderline, verifica-se que a positividade da reação diminui gradualmente

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a partir do polo TT, à medida que a resposta imune celular diminui em direção ao polo LL (DHARMENDRA e LOEW, 2012). Em indivíduos sadios a positividade ao teste de Mitsuda é associada a uma menor probabilidade de este desenvolver a doença posteriormente (GOULART et al., 2008).

S

OROLOGIA NA HANSENÍASE

No início dos anos 80, o grupo do pesquisador Patrick Brennan, da Universidade Estadual do Colorado (EUA), descreveu o PGL-I, uma molécula predominante na parede celular do M. leprae e altamente antigênica, principalmente na estimulação da produção de imunoglobulina do tipo M (IgM) (HUNTER e BRENNAN, 1981; HUNTER et al., 1982; CHO et al., 1983). Esta molécula da parede celular não é apenas antigênica, mas também está envolvida no processo patogênico da invasão de células de Schwann (NG et al., 2000) e na regulação negativa da resposta imune inflamatória, o que permite a persistência de M. leprae no organismo (SPENCER e BRENNAN, 2011).

O potencial do PGL-I ser utilizado na sorologia da hanseníase tem sido testado e comprovado até os dias atuais. A soropositividade anti-PGL-I em indivíduos com hanseníase MB é alta, visto que a titulação dos anticorpos é diretamente proporcional à carga bacilar (CHO et al., 2001). Contudo, em pacientes PB, com raros bacilos, a sorologia anti-PGL-I tem utilidade limitada (LOBATO et al., 2011a; SPENCER e BRENNAN, 2011). O mesmo grupo que descreveu o PGL-I nativo, apresentou posteriormente a síntese da porção antigênica sacarídea do PGL-I, os compostos: dissacarídeo natural-octil (ND-O) e trissacarídeo natural-fenol (NT-P), com potencial utilização na sorologia (FUJIWARA et al., 1984).

Os testes sorológicos anti-PGL-I são capazes de detectar anticorpos não só entre os pacientes de hanseníase e muitos estudos relatam a detecção de anticorpos específicos contra o M. leprae em população sadia e em contatos domiciliares de pacientes com hanseníase (MENZEL et al., 1987; DESFORGES et al., 1989; ILANGUMARAN et al., 1996). Esta positividade indica que estas pessoas foram expostas ao bacilo, e que este conseguiu infectar uma célula fagocítica e

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posteriormente elicitar uma resposta imune humoral com produção de anticorpos pelos linfócitos B, caracterizando assim, em um indivíduo assintomático, uma infecção subclínica (LOBATO et al., 2011a).

Vários grupos utilizaram procedimentos pós-genômicos para descobrir novos antígenos com potencial para utilização no diagnóstico sorológico da hanseníase (SPENCER et al., 2005; ARÁOZ et al., 2006; REECE et al., 2006; DUTHIE et al., 2007; GELUK et al., 2011). Estes estudos têm explorado sequências específicas do DNA de M. leprae para a identificação de proteínas ou peptídeos que possam ser adequados ao sorodiagnóstico dos diferentes estágios e formas clínicas da hanseníase. No entanto, a identificação de antígenos específicos do M. leprae é uma tarefa complexa, devido a poucas informações sobre a função de proteínas expressas ou sobre o estágio metabólico do microrganismo durante a infecção e progressão da doença (AKAMA et al., 2009; WILLIAMS et al., 2009).

Recentemente, um teste sorológico quantitativo rápido para a detecção de infecção por M. leprae foi desenvolvido com base na detecção de anticorpos IgM contra o ND-O (PGL-I sintético) e anticorpos IgG contra a proteína LID-1 (proteína quimérica formada pela fusão de duas proteínas identificadas pelo grupo do Infectious Diseases Research Institute) (DUTHIE et al., 2014a). A combinação destes dois antígenos (NDO-LID) em um único teste foi reportada como uma potencial ferramenta para ser utilizada como um alerta para o exame físico ou para o acompanhamento dos indivíduos positivos a fim de permitir o diagnóstico precoce (QIONG-HUA et al., 2013), também como um teste de diagnóstico para a hanseníase MB (DUTHIE et al., 2014b). No entanto, não se sabe ao certo as vantagens destes antígenos em relação ao PGL-I e estudos prospectivos de longa duração devem ser realizados para esclarecer estas preposições.

Testes sorológicos utilizados em pesquisas de investigação populacional, os chamados screenings, podem ser importantes ferramentas para auxiliar no diagnóstico precoce de novos casos, principalmente dos pacientes com hanseníase MB (GOULART e GOULART, 2009). A detecção de anticorpos específicos contra o PGL-I apresenta positividade de 13% a 25% no grupo dos contatos de pacientes com hanseníase, além de estudos já terem demonstrado uma associação entre a

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soropositividade anti-PGL-I em contatos e um risco maior de adoecer (GOULART et al., 2008; MOURA et al., 2008).

Ainda hoje, o maior desafio no desenvolvimento de um teste sorológico para o diagnóstico específico da hanseníase é a identificação de antígenos que diferenciem entre a exposição e a doença; e naqueles indivíduos soropositivos, diferencie com alta sensibilidade e especificidade o estágio e a forma clínica da doença.

D

ETECÇÃO DE

M

YCOBACTERIUM LEPRAE

O M.leprae é um microrganismo do reino Monera, filo e classe Actinobacteria, ordem Actinomicetales, família Mycobacteriaceae composta pelo único gênero Mycobacterium. Observado em microscopia, o M. leprae é um bacilo em forma de bastonete, reto ou levemente encurvado com extremidades arredondadas, apresentando aproximadamente 1 a 8 µm de comprimento e 0,2 a 0,5 µm de diâmetro. Possui divisão binária muito lenta, é Gram-positivo e um bacilo álcool-ácido resistente (BAAR).

Na técnica de coloração de Ziehl-Neelsen para microscopia, desenvolvida em 1882 por Franz Ziehl (1857-1926) e Friedrich Neelsen (1854-1894), a fucsina confere ao bacilo uma coloração avermelhada. Esta característica é devido ao elevado teor de lipídeos estruturais na parede celular, que provoca uma grande hidrofobicidade, dificultando a ação dos mordentes e diferenciadores de corantes aquosos (SHEPARD e MCRAE, 1968). Algumas modificações na técnica de Ziehl-Neelsen, como realização do procedimento a frio e o método Fite-Faraco, podem auxiliar na obtenção de um melhor resultado.

O exame de baciloscopia ainda é considerado o padrão ouro de diagnóstico laboratorial em hanseníase e o resultado é importante para identificar os pacientes com maior carga bacilar e com maior risco de recidivas. O exame de baciloscopia e a obtenção do índice baciloscópico (IB) procedem da coleta de esfregaço intradérmico dos dois lóbulos auriculares, dos dois cotovelos, dos dois joelhos e de áreas infiltradas ou lesões.

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Após a realização de procedimentos laboratoriais de coloração da lâmina e observação em microscopia ótica com imersão à óleo, o resultado é negativo quando nenhum bacilo é encontrado em cem campos e é positivo quando se encontra pelo menos um bacilo em cem campos examinados. Como na coloração de BAAR são necessários no mínimo 10.000 bacilos por grama de tecido para detecção confiável (SHEPARD e MCRAE, 1968), a sensibilidade é baixa, principalmente em pacientes com hanseníase PB, na qual os bacilos são raros ou indetectáveis.

Uma das grandes limitações no estudo da hanseníase sempre foi a incapacidade do cultivo de M. leprae em meio de cultura artificial. Em 1960, Charles Shepard (1914-1985) obteve êxito ao demonstrar que era possível sustentar uma infecção localizada com multiplicação limitada de M. leprae em coxim plantar de camundongos (Swiss Webster CFW) infectados com bacilos obtidos de biópsias de pacientes com hanseníase. Dependendo da quantidade inoculada, em geral era possível obter multiplicação em períodos de 9 a 12 meses, também era possível realizar a passagem das cepas para novos camundongos (SHEPARD, 1960b).

Em busca de modelos animais para pesquisa na hanseníase, na década de 1970, o grupo norte americano do laboratório do NHDP (do inglês National Hansen’s Disease Programs), localizado dentro da área do hospital-colônia de Carville na Louisiana, realizou experimentações com o tatu-galinha (Dasypus novemcinctus) e observaram que este animal não apresentava defesa contra o M. leprae, possibilitando uma infecção disseminada com comprometimento dos nervos periféricos, linfonodos, baço e fígado. A susceptibilidade natural do tatu permitiu a obtenção de grandes quantidades de, M. leprae, visto que, de um grama de tecido do baço ou fígado de um animal infectado era possível obter 1010 bacilos (KIRCHHEIMER e STORRS, 1971; KIRCHHEIMER et al., 1972; STORRS et al., 1974; BINFORD et al., 1976).Este mesmo grupo de pesquisa foi o primeiro a reportar em 1977 a ocorrência da infecção natural em tatus (MEYERS et al., 1977). Os tatus são atualmente considerados como um importante modelo animal para a hanseníase, porem não são adequados para a manutenção e propagação de cepas isoladas de M. leprae, usualmente mantidas em camundongos.

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A obtenção de M. leprae em grande quantidade e de fontes não humanas abriu novas perspectivas para o estudo deste microrganismo tão incompreendido. Durante os anos 80, a descrição e os estudos de moléculas específicas, assim como o surgimento de novas tecnologias, impulsionou as pesquisas sobre o agente causador da hanseníase. No final da década de 80, três trabalhos demonstraram a possibilidade do uso da reação em cadeia da polimerase (PCR, do inglês polymerase chain reaction) para detecção específica do DNA de M. leprae (HARTSKEERL et al., 1989; WOODS e COLE, 1989; WILLIAMS et al., 1990).

A PCR é uma técnica relativamente rápida, específica e sensível, que permite a amplificação e identificação do DNA de M. leprae em amostras contendo pequenas quantidades de bacilos, potencializando a uso de ferramentas moleculares laboratoriais não só na pesquisa, mas também para auxiliar no diagnóstico de hanseníase, na classificação dos pacientes e no monitoramento do tratamento com a PQT (GOULART et al., 2007). A PCR tornou-se uma técnica com múltiplas aplicações e passível de utilização em amostras coletadas das mais diversas fontes, abrindo assim uma gama imensa de novas possibilidades para investigar sobre os diversos aspectos da hanseníase. A partir da PCR foi possível o sequenciamento do genoma completo do M. leprae (COLE et al., 2001), a identificação dos poucos genótipos do bacilo (TRUMAN et al., 2004) e da provável origem da infecção em humanos (MONOT et al., 2005), assim como diversas outras descobertas de não seriam possíveis sem uma técnica mais precisa e menos trabalhosa do que a baciloscopia.

O desenvolvimento da técnica de PCR em tempo-real quantitativa (qPCR) melhorou a sensibilidade e a especificidade na detecção do DNA de M. leprae. Um estudo particular que descreveu um técnica de qPCR para detecção do gene repetitivo RLEP do genoma de M. leprae, por meio da amplificação e hibridização de sonda específica, indicou a potencial detecção de aproximadamente 10 bacilos em uma amostra, com quantificação da carga bacteriana pela interpolação com o número de moléculas de DNA de um controle padrão conhecido (TRUMAN et al., 2008).

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R

ESISTÊNCIA

M

EDICAMENTOSA NA HANSENÍASE

Desde sua introdução, qualquer quimioterapia com antibióticos está sujeita ao desenvolvimento de resistência medicamentosa, que pode ser devido a uma ampla variedade de mecanismos bioquímicos e fisiológicos. É crucial para a prevenção e controle efetivo das doenças infecciosas que a resistência aos antibióticos seja monitorada para compreender este mecanismo molecular. As mutações genéticas em determinadas regiões genômicas necessárias para a atividade antimicrobiana de fármacos em patógenos bacterianos, as chamadas regiões determinantes de resistência às drogas (RDRDs), são um dos principais elementos funcionais na redução da atividade antibiótica (DAVIES e DAVIES, 2010).

A determinação do genoma (COLE et al., 2001) e a pouca variabilidade genética (MONOT et al., 2009) proporcionaram possibilidades de explorar o mecanismo molecular da resistência aos medicamentos neste bacilo clinicamente e socialmente importante. Mutações em RDRDs têm sido identificadas dentro dos genes rpoB, folP1 e gyrA, associadas com a resistência à rifampicina, dapsona e ofloxacina, respectivamente. Casos de resistência a outras drogas alternativas utilizadas no tratamento da hanseníase, tais como, a minociclina e clofazimina, ainda não foram relatados (MATSUOKA, 2010).

A rifampicina é um dos únicos medicamentos a ser consistentemente bactericida contra o M. leprae. Ela tem como alvo a subunidade beta ( ) da polimerase de RNA codificada pelo gene rpoB, e quando se liga a esta molécula inibe a transcrição do RNA mensageiro dependente de DNA. Mutações em RDRDs nos códons 407, 410, 420, 425 ou 427 do gene rpoB foram identificadas em cepas resistentes à rifampicina (MATSUOKA, 2010; WILLIAMS e GILLIS, 2012).

O atual tratamento PQT da hanseníase foi parcialmente definido para minimizar o desenvolvimento de cepas resistentes a dapsona, inicialmente recomendada como monoterapia. Ela tem como a alvo a diidropteroato sintetase (DHPS), codificada pelo gene folP1, e inibe a síntese do ácido fólico por competição com o ácido para-aminobenzóico (PABA). Isolados resistentes à dapsona têm

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demonstrado mutações missense em RDRDs nos códons 53 e 55 do gene folP1 (MATSUOKA, 2010; WILLIAMS et al., 2014).

A ofloxacina é uma droga substitutiva no tratamento da hanseníase. Ela se liga as subunidades da DNA girase e inibe a replicação do DNA. Mutações RDRDs dentro desta região altamente conservada (codificada pelos genes gyrA e possivelmente gyrB), têm sido associadas com resistência à ofloxacina em M. leprae (CAMBAU et al., 2002; YOKOYAMA et al., 2012; VEZIRIS et al., 2013).

Ao longo dos últimos anos, cepas de M. leprae resistentes a um ou mais antibióticos na PQT, têm sido crescentemente relatadas em todo o mundo. Do mesmo modo, tem sido observado um aumento do número de casos de recidiva de hanseníase, atingindo no Brasil 4% dos casos novos registrados em 2014 (SINAN), que, juntamente com os casos de falência terapêutica poderiam agir na seleção de cepas com mutações associadas à resistência medicamentosa (SINGH e COLE, 2011). Em combinação com o surgimento da hanseníase multidroga resistente primária (WILLIAMS et al., 2013), este conjunto de circunstâncias podem comprometer as medidas de controle existentes.

A inoculação em pata de camundongo e o teste de suscetibilidade neste modelo ainda são definitivos para determinar a resistência do M. leprae, no entanto, o fato de alguns isolados de M. leprae não se multiplicarem e de muitos meses serem necessários para atingir o crescimento satisfatório das cepas que sobrevivem; dificultam a aplicação prática desta metodologia. Desta forma, o sequenciamento do DNA (produto da PCR com alvo as RDRDs) foi a metodologia proposta pela OMS para a vigilância global da resistência medicamentosa em hanseníase a ser desenvolvida em laboratórios de referência (WHO, 2009). Embora concebível, o sequenciamento de DNA não está disponível para a vigilância da resistência medicamentosa como rotina nas comunidades mais endêmicas, ou não é eficiente em termos de custo para ser aplicável para pesquisas de grande porte com muitas amostras. A técnica emergente da análise da dissociação em alta resolução (HRM, do inglês: High Resolution Melting) evita os procedimentos de sequenciamento do DNA subsequente à PCR em tempo real com resultados promissores para as

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RANSMISSÃO DA HANSENÍASE

Os mecanismos de infecção e da transmissão da hanseníase não estão completamente elucidados. A transmissão da hanseníase ainda é ativa e ocorre apesar do acesso global ao tratamento eficaz com a PQT; o fator primário associado à cura e a principal estratégia no controle da doença.

Os indivíduos portadores de hanseníase sem tratamento, especialmente aqueles com manifestação MB, são geralmente considerados como a principal fonte de transmissão. No entanto, após trinta anos de uma campanha global para eliminação da doença, novos casos são detectados em grandes proporções nas regiões endêmicas (BARRETO et al., 2012) e em lugares não tão endêmicos, casos são diagnosticados entre pessoas que relatam não terem contato anterior com pacientes (ABIDE et al., 2008; MARCOS et al., 2015). Estas observações indicam que deve haver outras fontes de infecção não reveladas (MATSUOKA et al., 1999; LAVANIA et al., 2006; LAHIRI e KRAHENBUHL, 2008; TRUMAN et al., 2011; SHARMA et al., 2015; MOHANTY et al., 2016)

O modo de transmissão da hanseníase é ainda um assunto amplamente discutido na comunidade científica atual. O trato respiratório superior tem sido considerado por muito tempo como um importante portal de entrada e saída de bacilos de M. leprae (SHEPARD, 1960a; 1962; DAVEY e REES, 1974; REES e MCDOUGALL, 1977; GREEN et al., 1983), principalmente depois de estudos em meados dos anos 70 terem demonstrado as similaridades com o modo de transmissão da tuberculose (REES e MEADE, 1974) e a infecção aérea experimental em camundongos (REES e MCDOUGALL, 1977). Entretanto, diversas teorias ainda refutam esta proposta (BRANDSMA et al., 2008). A pele também é considerada entre uma das principais portas de entrada e saída de M. leprae (PEDLEY, 1977; KOTTEESWARAN et al., 1980; GIRDHAR, 2005; JOB et al., 2008; GHORPADE, 2011). As evidencias da derme como porta de entrada em grande maioria são relatos de casos de lesões hansênicas em lugares onde ocorreu um trauma ou inoculação acidental (GHORPADE, 2002; ACHILLES et al., 2004; BRANDSMA et al., 2005; GHORPADE, 2009a; b) e também de estudos epidemiológicos que demonstram que na maioria dos casos com apenas uma lesão,

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estas se localizam em áreas expostas do corpo (HORTON e POVEY, 1966; ABRAHAM et al., 1998). Como local de saída, a pele de pacientes LL apresenta um grande número de bacilos em todas suas camadas, inclusive na camada queratinosa (SATAPATHY et al., 2005; JOB et al., 2008), porém esta é uma característica de pacientes LL, que não é uma forma clínica prevalente, e a emergência de bacilos da epiderme intacta é improvável (PEDLEY, 1970).

Muitas hipóteses foram propostas sobre as possíveis fontes de infecção não identificadas a partir das quais o M. leprae, e consequentemente a hanseníase, poderia ser transmitido. Entre estas potenciais fontes de transmissão incluem: o ambiente (solo e água) (DESIKAN, 1977; BLAKE et al., 1987; DESIKAN e SREEVATSA, 1995; MATSUOKA et al., 1999; VAEREWIJCK et al., 2005; LAVANIA et al., 2006; TURANKAR et al., 2012; MOHANTY et al., 2015; 2016), insetos vetores (incluindo o Aedes aegypti) (GEATER, 1975; KIRCHHEIMER, 1976; NARAYANAN et al., 1977; NARAYANAN et al., 1978; BANERJEE et al., 1991; SREEVATSA et al., 1992; SREEVATSA, 1993), amebas de vida livre (LAHIRI e KRAHENBUHL, 2008; DRANCOURT, 2014; WHEAT et al., 2014), primatas (HAGSTAD, 1983; GORMUS et al., 1988; HAMILTON et al., 2008; ISHII et al., 2011), o tatu (JOB et al., 1986; WALSH et al., 1988; TRUMAN, 2005; 2008; TRUMAN et al., 2011; BALAMAYOORAN et al., 2015; SHARMA et al., 2015); e até mesmo que os bacilos poderiam ser transmitidos, por transmissão vertical ou amamentação(GIRDHAR et al., 1981; MELSOM et al., 1982; DUNCAN et al., 1983; BRUBAKER et al., 1985), e por transplante de órgãos (MODI et al., 2003; LAUNIUS et al., 2004; SHIH et al., 2005; GASINK et al., 2006; GUDITI et al., 2009; ARDALAN et al., 2011; TRINDADE et al., 2011). Cada uma dessas preposições traz uma contribuição importante para a nossa compreensão atual da cadeia de transmissão da hanseníase.

Considerando as vias aéreas, o nariz demonstra uma importância irrefutável na etiopatogenia da hanseníase. O papel central do nariz na patologia foi demonstrado e ilustrado por fotomicrografias em uma publicação do médico brasileiro Humberto Cerrutti na Revista Brasileira de Leprologia em 1944. Neste estudo, em apenas 14 das 116 biópsias da mucosa nasal avaliadas foram observadas características normais deste tecido celular (CERRUTI, 1944). Um estudo da década de 90 demonstrou também que mesmo na hanseníase neural

Referências

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