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Processo 1355/17.3T8OER-A.L1-6 Data do documento 14 de maio de 2020 Relator Adeodato Brotas

TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA | CÍVEL

Acórdão

DESCRITORES

Notificação > Interpelação > Carta > Direito à prova > Conhecimento do mérito > Despacho saneador

SUMÁRIO

1– Não se podem confundir os conceitos jurídicos “notificação” e “interpelação” com o facto material “envio” da carta (e respectivo conteúdo); será esse facto material, “envio” da carta (e respectivo conteúdo), que permitirá (depois) concluir se, em termos jurídicos, os fiadores foram ou não interpelados.

2– O “envio” (da carta) pode ser provado por outros meios de prova que não (apenas) o registo da carta ou sequer o aviso de recepção, mormente, por confissão (maxime, judicial provocada) ou por prova testemunhal.

3– Não se pode decidir, logo em sede de sanador/sentença e sem a produção de outros meios de prova, que o embargado não provou o “envio” de cartas aos fiadores.

4– Isto porque o Direito à Prova inclui a faculdade de oferecer, no momento que a parte entenda mais oportuno, os meios de prova sobre esse facto, o direito de produzir esses meios de prova e o direito a ver ponderadas, em conjunto, a totalidade das provas produzidas.

(Sumário elaborado pelo Relator).

TEXTO INTEGRAL

Acordam na 6ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa:

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1– Por apenso à execução para pagamento de quantia certa que contra eles (e outro) move Banco, SA, vieram os co-executados, F. P. e M. P., deduzir oposição à execução, por meio de embargos, pugnando pela respectiva procedência e consequente extinção da execução e, subsidiariamente, se determine que o exequente apenas pode reclamar dos fiadores as prestações que se forem vencendo nos termos estipulados no contrato.

Alegaram, em síntese, que constituíram-se fiadores de seu filho em dois contratos de mútuo para compra de habitação própria. Por razões diversas, deixaram de contactar com o seu filho, e apenas agora com a execução souberam que ele incumpriu o contrato e que procedeu à entrega do imóvel em dação em cumprimento, ficando ainda em dívida pela quantia de 33 302€. Ignoram como foi feita a avaliação do imóvel e a fixação do remanescente em dívida. Jamais foram interpelados para procederem ao pagamento da dívida; se tivessem tido conhecimento do incumprimento pelo devedor teriam tido a possibilidade de pagar mensalmente as prestações dos mútuos.

Por toda a operação de dação em cumprimento ter sido realizada à sua revelia, não podem sub-rogar-se nos direitos do credor.

A perda do benefício do prazo com a falta de pagamento de uma das prestações não se estende ao fiador; e mesmo que tivesse ocorrido afastamento da regra do artº 782º do CC o fiador deveria ter sido interpelado para por termo à mora a fim de obviar ao vencimento antecipado das prestações.

Como nunca foram interpelados para por termo à mora, não respondem pelos juros.

2– O exequente contestou.

Afirma que os fiadores foram interpelados por cartas de 14/08/2005, 13/02/2014, 15/05/2014 e 30/05/2014, para que procedessem ao pagamento dos montantes em incumprimento dos contratos de mútuo de que se constituíram fiadores, conforme documentos que junta.

Por outro lado, a citação para a acção executiva vale como interpelação.

Não têm razão, os embargantes, ao invocarem a impossibilidade de sub-rogação, visto que em face do disposto no artº 644º do CC ficam sub-rogados nos direitos do credor na medida em que por eles seja satisfeito.

3– Foi declarada não escrita a petição de embargos quanto à executada M. P..

4– Por despacho datado de 23/11/2018 (Refª 115519969), foi determinada a notificação do embargado para juntar aos autos, em 10 dias, documentos comprovativos da expedição/recepção das cartas cujas cópias juntou com a contestação, nos termos e para os efeitos do disposto no artº 590º nº 2, al. c) do CPC.

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5– Em 10/12/2018, o embargado solicitou a concessão de novo prazo de 10 dias (Refª 13701972).

6– Foi indeferida a concessão de novo prazo ao embargado.

7– Após a realização de audiência prévia, foi proferido saneador/sentença, com o seguinte teor decisório: “DECISÃO

Decide-se assim, nos termos e pelos fundamentos expostos, julgar totalmente procedentes os presentes embargos de executado, com a consequente extinção da execução relativamente ao embargante.

Custas pelo exequente – artigo 527º do CPC.”

8– Inconformado, o exequente/embargado interpôs o presente recurso, apresentando as seguintes CONCLUSÕES:

a)- Vem o presente recurso interposto da douta sentença de fls. (…) que julgou “totalmente procedentes os presentes embargos de executado, com a consequente extinção da execução relativamente ao embargante” F. P..

b)- Na perspectiva do Recorrente, a reapreciação/reponderação da matéria de facto contestada conduzirá a diferente conclusão quanto procedência dos embargos de executado.

c)- Para efeitos do disposto no artigo 640.º do Código do Processo Civil, o Recorrente não se conforma com a resposta dada à matéria de facto, designadamente ao facto não provado, a saber:

“A) O exequente enviou aos executados as cartas datadas de 14.08.2005, 13.02.2014, 15.05.2014 e 30.05.2014, cujas cópias juntou em sede de contestação, contendo comunicação relativa ao montante das prestações em atraso nessa data, solicitando a sua regularização e que esse não pagamento tornaria as restantes prestações vencidas”.

d)- Depois as conclusões alcançadas quanto às questões de direito analisadas nos autos padecem, salvo devido respeito, de manifesto erro.

e)- Os documentos juntos com os nºs 1 a 8 com a contestação, que correspondem à cópia das cartas datadas 14.08.2005, 13.02.2014, 15.05.2014 e 30.05.2014, expedidas para o Embargante e M. P. para que estes, procedessem ao pagamento dos montantes então em incumprimento, por conta dos contratos de mútuo que serviram de base à presente execução, careciam ter sido valorados de forma diferente pelo douto tribunal a quo.

f)- Tanto mais que estes documentos – entre todos, os documentos junto com os n.ºs 5 a 7 - não foram objecto de qualquer impugnação por parte do embargante.

g)- Resultando, destes, a interpelação de ambos os fiadores, desde logo o embargante F. P., para proceder ao pagamento do incumprimento, que aos 15/05/2014, somava o valor de €286,46 respeitante às prestações vencidas em 10/04/2014 e 10/05/2014, reiterado aos 30/05/2014 – cfr. documentos juntos à contestação com os nºs 5 a 7.

h)- Os quais não foram objecto de qualquer impugnação por parte do embargante, pelo que carecia o facto não provado A) ter sido dado como provado - artigos 374.º n.º 1 e 376º nºs 1 e 2 todos do Código Civil i)- O meio de prova supra elencado aponta, assim, em sentido oposto ao da douta sentença recorrida

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devendo alterar-se a decisão da matéria de facto – cfr. artigo 342º do Código Civil.

j)- Pelo que deve proceder o presente recurso, sendo alterada a decisão sobre a matéria de facto, considerando-se Provado o facto A) de tal decisão.

k)- Decidiu ainda a douta sentença ora Recorrida, não considerar interpelados os fiadores para regularização do incumprimento verificado; Cremos que mal.

l)- Desde logo reitera-se tudo o já supra alegado quanto à impugnação da matéria de facto, resultando manifesto que o Exequente, aqui Recorrente, designadamente por cartas datadas de 14.08.2005, 13.02.2014, 15.05.2014, 30.05.2014, interpelou os fiadores, nomeadamente o aqui Embargante para que estes, procedessem ao pagamento dos montantes então em incumprimento, por conta dos contratos de mútuo que serviram de base à presente execução, cfr. Docs. 1 a 8 juntos com a contestação.

m)- Isto é, o Recorrente demonstrou, à saciedade, de acordo com o artigo 342.º do Código Civil, ter efectuado a interpelação válida e eficaz do Recorrido, à luz do artigo 224.º do Código Civil.

n)- De todo o modo, o que apenas por cautela e mero dever de patrocínio se concede, a omissão da interpelação apenas teria impacto no plano da constituição em mora e nas respectivas consequências: situação que sempre se verificaria, no limite, com a citação para presente a acção executiva.

o)- Donde que, e por mero dever de patrocínio, a interpelação pretendida resultaria sempre dos próprios autos, como vem defendendo a generalidade da Jurisprudência e Doutrina.

p)- A douta sentença em recurso, ao assim não concluir, violou, designadamente, o artigo

610.º, n.º 2, alínea b) do Código de Processo Civil que preceitua que ”Quando a inexigibilidade derive da falta de interpelação ou do facto de não ter sido pedido o pagamento no domicílio do devedor, a dívida considera-se vencida desde a citação.”.

q)- Sem prejuízo do que supra ficou dito, sublinha-se que a fiança é uma garantia especial que obriga pessoalmente um terceiro, que é o fiador, perante o credor, assumindo aquele uma obrigação da mesma natureza da obrigação principal (art. 627º C. Civil).

r)- Pelo que, como expressamente se estipula no artigo 634.º do mesmo diploma, a fiança tem o conteúdo da obrigação principal e cobre as consequências legais e contratuais da mora ou da culpa do devedor. s)- Extraindo-se do sobredito preceito que, para que se tenha por incumprida a obrigação e verificada a responsabilidade do fiador pelo incumprimento, seja pela mora seja por indemnização fundada no incumprimento culposo do devedor principal, não é necessária a sua interpelação.

t)- Pelo que, não obstante se tenha efectivamente verificado a interpelação do Embargante, caso tal não tivesse sucedido, o que por mero dever e cautela de patrocínio se assume, sempre se concluiria pela desnecessidade de interpelação do ora Embargante.

u)- Depois, decidiu a douta sentença a quo que “por facto voluntário do Exequente inexiste a possibilidade de sub-rogação do credor para com o fiador, o que implica a exoneração deste da fiança que por essa causa se extingue (artigo 653.º do Código Civil)” Salvo devido respeito, entende-se que mal.

v)- Conforme dispõe o artigo 644.º do Código Civil “O fiador que cumpriu a obrigação fica sub-rogado nos direitos do credor, na medida em que estes foram por ele satisfeitos” - (sublinhado nosso).

w)-Ou seja, é desde logo pressuposto da sub-rogação, o pagamento; que nos termos confessados pelos próprios fiadores não se verificou.

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x)- Não tendo, sequer, alegado, da capacidade para o indicado pagamento que resultou, assim, igualmente indemonstrada.

y)- Pelo que, nessa parte, andou também mal, estamos em crer, a douta sentença.

z)- Depois, não é verdade que o exequente renunciou, tout court, às hipotecas; diferentemente, o exequente, aceitou a dação, em cumprimento parcial da divida – a saber, €146.500,00 - do imóvel que lhe havia sido justamente dado em garantia (hipoteca); renunciando, de modo consequente, a esta.

aa)- Valor este – do imóvel, para efeitos de dação – que o fiador questionou sem, no entanto, adiantar da razão / da medida do desacerto deste.

bb)- Ou seja, o exequente, usou da hipoteca, para se pagar; mas, como fez extrajudicialmente, com o acordo do mutuário / devedor, recorreu, para tanto, à dação em cumprimento, parcial, da dívida.

cc)- Que não exige o acordo do fiador. – cfr. artigo 837º e seguinte do Código Civil. dd)- Não pode, é certo, beneficiar da hipoteca que foi inicialmente

constituída a favor do Exequente; porém, nem tal faria qualquer sentido, porquanto as garantias que aos fiadores assistem, são aquelas que ainda subsistem à data em que operar a sub-rogação

(apenas essas se transmitem).

ee)- Por outro lado, a sua desoneração só se justifica, caso a inexistência das aludidas garantias derivem de facto (positivo ou omissão) decorrente da actuação do credor (v. art.º 653.º do C. Civil).

ff)- Ou seja, o Banco credor não prescindiu da garantia hipotecária que detinha a seu favor, ao invés, foi pago – pela dação - na medida dessa garantia (hipoteca).

gg)- A simples impossibilidade dos fiadores beneficiarem de uma garantia (hipoteca) que caducou, por força da dação em pagamento do imóvel, que beneficiou mutuário e fiadores, não é, pois, equivalente a afirmar que existe a impossibilidade de sub-rogação no direito do credor e, logo, à desoneração do fiador embargante.

hh)- Em conclusão, merece provimento o recurso interposto nos autos, carecendo ser alterada a decisão da matéria de facto, passando o facto não provado A) a considerar-se provado e a douta sentença revogada e substituída por outra que considere improcedentes os embargos de executado e ordene o prosseguimento da execução, também contra o executado fiador, embargante.

ii)- A douta sentença recorrida ao assim não decidir, violou, assim, o disposto nos artigos

342.º, 374.º n.º 1 e 376.º n.ºs 1 e 2, 627.º, 634.º, 644.º, 653º todos do Código Civil, artigo 610.º n.º 2 alínea b) do Código Processo Civil.

NESTES TERMOS, deve ser o presente recurso considerado procedente e, em consequência ser alterada a decisão da matéria de facto, passando o facto não provado A) a considerar-se provado e a douta sentença revogada e substituída por outra que considere improcedentes os embargos de executado e ordene o prosseguimento da acção executiva contra todos os executados.

9- Não foram apresentadas contra-alegações.

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II– FUNDAMENTAÇÃO.

1-Objecto do Recurso.

É sabido que o objecto do recurso é balizado pelo teor do requerimento de interposição (artº 635º nº 2 do CPC/13) pelas conclusões (artºs 635º nº 4, 639º nº 1 e 640º do CPC/13) pelas questões suscitadas pelo recorrido nas contra-alegações em oposição àquelas, ou por ampliação (artº 636º CPC/13) e sem embargo de eventual recurso subordinado (artº 633º CPC/13) e ainda pelas questões de conhecimento oficioso cuja apreciação ainda não se mostre precludida.

Assim, em face das conclusões apresentadas pela recorrente, são as seguintes as questões que importa analisar e decidir:

a)- A impugnação da Matéria de Facto;

b)- A revogação da sentença, com decisão de improcedência dos embargos à execução.

Vejamos estas questões.

Previamente, importa considerar a matéria de facto decidida pela 1ª instância. ***

2– Factualidade decidida pela 1ª instância.

A)-Factos assentes

1.– No dia 13 de Janeiro de 2004, foi celebrada escritura de compra e venda e mútuo com hipoteca e fiança, mediante a qual, o então, “Banco…”, concedeu um empréstimo a P. P. no montante de €114.000,00, destinado à aquisição da fracção autónoma, destinada a habitação, designada pela letra “N”, que constitui o 5º andar, esquerdo, com um espaço na garagem e uma arrecadação no sótão, do prédio urbano em regime de propriedade horizontal sito na Rua …, valor e a reembolsar em 30 anos, em 360 prestações mensais constantes e sucessivas de capital e juros, vencendo-se a primeira no dia 05.02.2004. 2.– Em garantia do bom pagamento da quantia mutuada acrescida dos juros que forem devidos e ainda das despesas judiciais e extrajudiciais, o mutuário constituiu hipoteca sobre a fracção autónoma adquirida, a favor do então “Banco…”.

3.– Por seu turno, os executados F. P. e M. P. declararam constituir-se “fiadores e principais pagadores por tudo quanto venha a ser devido ao Banco, em consequência do empréstimo que o mutuário contraiu junto do referido Banco e aqui titulado, com expressa renúncia ao benefício da excussão prévia, dando o seu acordo a todas e quaisquer modificações de taxa de juro e alterações de prazo que venham a ser convencionadas entre o Banco credor e o devedor”.

4.– Nessa sede, mais declararam que “a fiança ora constituída manter-se-á plenamente em vigor enquanto subsistir qualquer dívida de capital, juros ou despesas, contraída por qualquer forma, imputável ao indicado devedor”.

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5.– Do documento complementar anexo à mencionada escritura e que faz parte integrante da mesma consta, para além do mais, na cláusula 9ª “As importâncias em dívida cujo pagamento seja obrigação emergente deste contrato tornar-se-ão imediatamente exigíveis em caso (…) de incumprimento por parte do mutuário de quaisquer obrigações dele decorrentes (…)”.

6.– No mesmo dia, 13 de Janeiro de 2004 foi celebrada escritura de mútuo com hipoteca e fiança, mediante a qual o então “Banco…”, concedeu um empréstimo ao mutuário P. P. no montante de €50.000,00, destinado a fazer face a compromissos financeiros anteriormente assumidos pelo primeiro outorgante e à aquisição de equipamento para a sua residência, a liquidar em 30 anos, em 360 prestações mensais constantes sucessivas de capital e juros, vencendo-se a primeira no dia 05 de Fevereiro de 2004.

7.– Em garantia do bom pagamento da quantia mutuada acrescida dos juros que forem devidos e ainda das despesas judiciais e extrajudiciais, o mutuário constituiu hipoteca sobre a fracção autónoma adquirida, a favor do então “Banco.”.

8.– Por seu turno, os executados F. P. e M. P. declararam constituir-se “fiadores e principais pagadores por tudo quanto venha a ser devido ao Banco, em consequência do empréstimo que o mutuário contraiu junto do referido Banco e aqui titulado, com expressa renúncia ao benefício da excussão prévia, dando o seu acordo a todas e quaisquer modificações de taxa de juro e alterações de prazo que venham a ser convencionadas entre o Banco credor e o devedor”.

9.– Nessa sede, mais declararam que “a fiança ora constituída manter-se-á plenamente em vigor enquanto subsistir qualquer dívida de capital, juros ou despesas, contraída por qualquer forma, imputável ao indicado devedor”.

10.– Do documento complementar anexo à mencionada escritura e que faz parte integrante da mesma consta, para além do mais, na cláusula 8ª “As importâncias em dívida cujo pagamento seja obrigação emergente deste contrato tornar-se-ão imediatamente exigíveis em caso (…) de incumprimento por parte do mutuário de quaisquer obrigações dele decorrentes (…)”.

11.– No dia 25 de Fevereiro de 2009 foi celebrada escritura de Dação em Cumprimento e Renúncia de Hipoteca, mediante a qual, para pagamento de parte da dívida decorrente dos empréstimos supra referidos, que ascendia, nessa data, ao montante global de €179.802,20, procedeu-se ao pagamento de parte da dívida, no montante de € 146.500,00, valor atribuído à fracção autónoma dada de hipoteca ao Banco, através da dação em cumprimento parcial, continuando o mutuário devedor do remanescente, no montante de €33.302,20.

12.– Nessa mesma data e escritura, a procuradora do então “Banco…”, declarou renunciar, em nome da sua representada, às hipotecas registadas a seu favor, autorizando os respectivos cancelamentos.

13.– O exequente não comunicou aos executados, na qualidade de fiadores, as condições, valores e data prevista para a celebração de escritura de dação em cumprimento do imóvel hipotecado a seu favor e de renúncia às hipotecas constituídas a seu favor.

14.– O exequente não comunicou aos executados, na qualidade de fiadores que após a entrega do imóvel pelo mutuário, o valor da dívida perfazia €33.302,20.

15.– O executado P. P. deixou de efectuar o pagamento das prestações acordadas e ainda em dívida, em 10.05.2014.

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16.– Os executados F. P. e M. P. foram citados para a execução em 30.05.2017, em ….

Factos Não Provados

A)-O exequente enviou aos executados as cartas datadas de 14.08.2005, 13.02.2014, 15.05.2014 e 30.05.2014, cujas cópias juntou em sede de contestação, contendo comunicação relativa ao montante das prestações em atraso nessa data, solicitando a sua regularização e que esse não pagamento tornaria as restantes prestações vencidas.

3- As Questões Enunciadas.

3.1- A Impugnação da Decisão Sobre a Matéria de Facto.

O embargado/apelante insurge-se contra a decisão da 1ª instância de considerar não provado o envio das cartas de interpelação aos fiadores, dizendo que juntou cópia dessas cartas e que não foram impugnadas pelo embargante (a embargante mulher deixou de o ser, face à decisão de considerar não escrita a petição de embargos, quanto a ela, por falta de pagamento de taxa de justiça) e, por isso, deveria ter sido considerado provado o envio dessas cartas.

O embargante/apelado não contra-alegou.

A 1ª instância fundamentou a sua decisão de considerar não provado o envio das mencionadas cartas do seguinte modo:

“Os factos não provados assim resultaram porquanto não obstante a alegação da mencionada interpelação, nem com a apresentação do requerimento executivo, nem com a contestação, nem em reposta a convite formulado pelo Tribunal nesse sentido, ou em sede de audiência prévia, a cuja dispensa de realização se opôs, o exequente juntou aos autos comprovativo bastante da expedição das cartas, cujas cópias, juntou em sede de contestação, designadamente recibos de aceitação e entrega de carta registada nos serviços postais, avisos de recepção das mesmas, o que se impunha, à luz do disposto nos artigos 342º do Código Civil, 423º e 572º, d), do CPC, uma vez que o embargante colocou tal factualidade em causa através da posição assumida na petição de embargos quanto à invocada interpelação.”

Será assim?

Coloca-se a questão de saber se o tribunal recorrido podia, logo no saneador e sem produção de outros meios de prova, decidir, sem mais, que não se provou que o embargado tenha enviado as cartas cujas cópias juntou aos autos.

Pois bem, em primeiro lugar, importa salientar que nem nas escrituras dos contratos de mútuo com constituição de hipoteca e constituição de fiança, nem nos documentos a elas anexos, se exige que as comunicações entre as partes sejam feitas mediante carta registada com aviso de recepção, ou sequer por

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meio de carta registada.

Por conseguinte, não se vislumbra com que fundamento a 1ª instância “notificou” o embargado para juntar aos autos “…documentos comprovativos da expedição/recepção das cartas cujas cópias juntou com a contestação, nos termos e para os efeitos do disposto no artº 590º nº 2, al. c) do CPC…”.

Em segundo lugar, importa ter presente que o teor/conteúdo (e destinatários e moradas e datas) das cartas não foi impugnado pelo executado/embargante.

Em terceiro lugar, não se podem confundir os conceitos jurídicos (não) “notificação”, (invocada pelo embargante) e “interpelação” (invocada pelo embargado) com o facto material “envio” da carta (e respectivo conteúdo); será esse facto material, “envio” da carta (e respectivo conteúdo), que permitira (depois) concluir se, em termos jurídicos, os fiadores foram ou não interpelados. Aliás, é conhecido o conceito de interpelação: o acto através do qual o credor intima o devedor para que cumpra, rectius, realize a prestação devida.

Portanto, face à falta de impugnação do conteúdo das cartas juntas, o (único) facto relevante que permitirá concluir pela realização da “interpelação” ou falta dela é a demonstração do envio das cartas, já que os destinatários, respectivas moradas e conteúdos não foram impugnados.

Não se confunda, igualmente, “envio” (da carta) com “recepção” (da carta): o artº 224º nº 2 do CC soluciona a questão.

Ora bem, esse facto material “envio” (da carta) pode ser provado por outros meios de prova que não (apenas) o registo da carta ou sequer o aviso de recepção, mormente, por confissão (maxime, judicial provocada) ou por prova testemunhal - pense-se no depoimento testemunhal da pessoa que “enviou” a carta, ou da testemunha que esclareça o mecanismo ou modo de funcionamento do envio de cartas do género.

Assim sendo, decidir, logo no saneador, que “não se provou o envio” (das cartas) implica limitar/impedir, de modo definitivo, o direito do embargado a produzir prova sobre o facto que alegou: que enviou aquelas cartas aos fiadores.

Como é sabido, o Direito à Prova ergue-se como um dos corolários do Direito de Acção e Defesa, plasmado no artº 20º da Constituição da República Portuguesa, que garante a todos o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos.

Implica que as partes possam oferecer e produzir as suas provas, controlar as provas dos adversários e discretear sobre o valor e resultado de uma e outras (Isabel Alexandre, Provas Ilícitas em Processo Civil, Almedina, 19998, apud Sara Rodrigues Campos, (In)admissibilidade de Provas Ilícitas, Almedina, 2018, pág. 30).

O Direito a um Processo Equitativo pressupõe o Direito à Prova como elemento essencial do processo civil: quando um Estado assume a tarefa de julgar segundo ideias de justiça deve garantir ao cidadão o direito à prova (Gerhard Walter, Il diritto alla prova in Svizzera, apud Pedro Trigo Morgado, Admissibilidade da Prova Ilícita em Processo Civil, Petrony, 2016, pág. 37).

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do direito de acção ou de defesa e a possibilidade de oferecer ao juiz os elementos necessários para demonstrar os fundamentos das próprias alegações (Da mihi factum et dabo tibi ius: dá-me o facto dar-te-ei o dirdar-te-eito). Ou seja, o dirdar-te-eito de uma parte utilizar todas as provas de que dispõe por forma a demonstrar a verdade dos factos em que funda a sua pretensão – recorde-se que o artº 341º do CC define a prova como a função de demonstrar a realidades dos factos.

Por outro lado, o direito à prova pressupõe igualmente que a prova possa ser feita pelos meios e nos momentos processuais que mais convierem às partes, embora, claro está, com respeito pelos limites decorrentes da lei.

Pressupõe ainda a faculdade de contradizer as provas apresentadas pela outra parte ou coligidas pelo tribunal ou de apresentar prova em contrário.

Pressupõe, também, o direito à valoração, pelo juiz, da totalidade das provas apresentadas e usadas na formação da sua convicção.

Ora bem, do que fica dito é fácil perceber que o embargado tinha direito à prova do facto que alegou: o “envio” das cartas aos fiadores.

Direito à Prova esse que inclui a faculdade de oferecer, no momento que entender mais oportuno, os meios de prova sobre esse facto, o direito de produzir esses meios de prova e o direito a ver ponderados o conjunto da totalidade das provas produzidas.

O mesmo é dizer que o tribunal da 1ª instância não podia ter decidido, logo no saneador, que o embargado não provou o envio as cartas aos fiadores.

Desse modo, não pode concluir-se, nessa fase processual, pela falta de prova do envio das cartas aos fiadores.

O processo tem de prosseguir os seus termos com vista à produção de prova sobre aquele facto, com realização de audiência prévia com enunciação dos termos do litígio e temas de prova, pronúncia sobre meios de prova que as partes entendam indicar e designação da audiência final.

Do que se expôs, importa anular o saneador/sentença, ordenando que os autos prossigam os seus termos.

***

III–DECISÃO.

Em face do exposto, acordam na 6ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa anular o sanedor/sentença proferido nos autos, ordenado que os autos prossigam os seus termos com a realização da audiência prévia, enunciação dos termos do litígio e temas de prova, pronúncia sobre meios de prova e designação da audiência final.

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Lisboa, 14 de Maio de 2020

(Adeodato Brotas) (Octávia Viegas) (Maria de Deus Correia)

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