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Policy Brief. Especial RIO+20

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Policy Brief

Especial RIO+20

Rio +20 e Cúpula dos Povos:

dissonâncias entre agendas oficias

dos Estados e as reivindicações da

sociedade civil organizada para a

Rio +20

Dezembro de 2011

Núcleo de Desenvolvimento Urbano e Sustentabilidade

BRICS Policy Center / Centro de Estudos e Pesquisas BRICS

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Policy Brief

Especial RIO+20

Rio +20 e Cúpula dos Povos:

dissonâncias entre agendas oficias

dos Estados e as reivindicações da

sociedade civil organizada para a

Rio +20

Dezembro de 2011

Núcleo de Desenvolvimento Urbano e Sustentabilidade

BRICS Policy Center / Centro de Estudos e Pesquisas BRICS

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Autores: Pedro Cláudio Cunca Bocayuva e Sérgio Veloso Colaboração: André Jobim e Flávia Aref

Rio +20 e Cúpula dos Povos: entre economia e

política

1. Sumário Executivo

 

A Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, a Rio+20, que acontecerá na cidade do Rio de Janeiro no mês de junho de 2012, corre o risco de fracassar, a princípio, devido às divergências entre alguns Estados. Dois são os principais pontos a serem debatidos na conferência: Economia verde e uma moldura institucional internacional para promovê-la. Nenhum dos dois pontos é consensual entre as partes. No entanto, por mais que não haja uma definição geral e concreta sobre

economia verde, o ponto que se

anuncia mais complicado para que se construa consenso entre os Estados é a moldura institucional. A esse respeito, é visível um quadro de antagonismos anunciados entre países desenvolvidos e em desenvolvimento.

Ainda assim, a complexa relação entre os Estados e a sociedade civil organizada anuncia um cenário antagônico mais profundo, que pode vir

a criar empecilhos para o sucesso das negociações formais e para o sucesso da Rio+20 a longo prazo. Esse cenário se concretiza na organização, por parte da sociedade civil, de eventos paralelos que visam oferecer contrapontos às decisões tomadas nos processos oficiais. Em paralelo à Rio+20, organizada também na cidade do Rio de Janeiro, no mês de junho de 2012, acontecerá a Cúpula dos Povos da Rio+20 para Justiça Social e Ambiental. Esse evento busca consolidar uma plataforma para aprofundar o debate acerca da noção de justiça ambiental e sua função na construção de sociedades sustentáveis.

O objetivo desse Policy Brief é analisar as bases desse antagonismo entre sociedade civil e Estado. O texto se dividirá da seguinte forma:

i. Na introdução apresentaremos as bases mais gerais dos antagonismos anunciados para a Rio+20;

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ii. Posteriormente, abordaremos as diferenças entre as agendas oficiais dos Estados participantes da Rio+20 e a agenda da sociedade civil organizada. Nessa parte apresentaremos as duas noções fundamentais para o processo formal e para o alternativo: economia verde e

justiça ambiental;

iii. Nas partes seguintes, analisaremos em separado cada uma das noções. Na parte 2 abordaremos a noção de

economia verde como proposta

por Brasil, África do Sul, China, Índia e Rússia em seus respectivos documentos oficiais submetidos à ONU. Na parte 3 apresentaremos a noção de justiça

ambiental como proposta pela

sociedade civil organizada no âmbito da Cúpula dos Povos; iv. Na conclusão argumentaremos

que o sucesso real da Rio+20 depende da complementaridade entre as agendas oficiais e a proposta pela sociedade civil organizada.

2.Introdução

No dia 24 de dezembro de 2009, a Assembléia Geral das Nações Unidas adotou a resolução A/RES/64/236. Por meio dela, acordou-se realizar em junho de 2012, na cidade do Rio de Janeiro, Brasil, a Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável. Também conhecida como Rio+20, a conferência marcará o 40º aniversário da Conferência Mundial sobre o Homem e o Meio Ambiente e o 25º aniversário do Relatório Brutland1. Além disso, celebra os vinte anos da Conferência das Nações Unidas sobre Meio-Ambiente e Desenvolvimento, também conhecida como ECO 92, e os dez anos da Cúpula Mundial sobre Desenvolvimento Sustentável, que aconteceu na cidade sul-africana de Johanesburgo, em 2002. Ambos os eventos deixaram um importante legado na busca global pela sustentabilidade. Da ECO 92 surgiram o Protocolo de Kyoto2, a Agenda 213 e

a Declaração do Rio4, que estabelecem os marcos conceituais e os princípios básicos do desenvolvimento sustentável. Já a Cúpula de Johanesburgo deixou como legado o Plano de Implementação de Johanesburgo5, que buscava construir

bases concretas para a implementação da sustentabilidade em escala global.

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A Rio+20 será, portanto, uma oportunidade para que o comprometimento político para o desenvolvimento sustentável possa ser renovado ao mesmo tempo em que os progressos alcançados e as lacunas ainda existentes sejam avaliadas. Dois temas essenciais serão tratados durante a conferência: economia verde no contexto do desenvolvimento sustentável e da erradicação da pobreza; e uma arquitetura institucional para o desenvolvimento sustentável. Dessa forma, a Rio+20 busca fortalecer o paradigma de sustentabilidade como um objetivo comum a todas as nações, sejam elas já desenvolvidas ou em desenvolvimento.

No que diz respeito ao processo de discussão formal proposto pela ONU, os diversos encontros preparatórios para a conferência já anunciam o quão difícil será a consolidação de um cenário de consenso absoluto entre as partes. Esse quadro fica ainda mais visível quando contrastada a posição de países desenvolvidos e em desenvolvimento. Por um lado, a União Européia propõe que o PNUMA seja convertido em uma agência especializada cuja função seria fiscalizar o processo de transição para a economia verde6. A sugestão européia é complementada pela proposta enviada, em conjunto, por

Colômbia e Guatemala que sugere o estabelecimento de Metas Globais de Sustentabilidade7. Na visão de Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul, essas propostas não seriam viáveis, pois criariam empecilhos para suas estratégias de crescimento econômico e desenvolvimento social. Os BRICS, cada um a seu modo, propõem que o Conselho Econômico e Social das Nações Unidas (ECOSOC) seja reformado a fim de aumentar sua capacidade de implementação de medidas que facilitem e auxiliem os processos de transição para a

economia verde, sem que isso se

converta em empecilhos para países em desenvolvimento8.

No entanto, há ainda um segundo conjunto de antagonismos que tornam ainda mais complexo o cenário global no qual se insere a Rio+20. Na história das conferências mundiais sobre desenvolvimento e sustentabilidade, foram se consolidando e ficando cada vez mais claras certas incompatibilidades entre os interesses e aspirações estatais e as demandas e reivindicações da sociedade civil organizada. Com o intuito de explicitar essas incompatibilidades e fortalecer a atuação da sociedade civil global, organizações não-governamentais e movimentos sociais de todo o globo vêm organizando, desde o início da década de 90, eventos paralelos às

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conferências e cúpulas oficiais. Dessa forma, pretende-se criar espaços mais amplos e diversos que possibilitem a construção de paradigmas alternativos aos apresentados nos encontros oficiais.

Um dos momentos mais emblemáticos desse processo foi o Fórum Global 92, paralelo à Eco 92, do qual participaram, segundo informa a ONG Vitae Civilis, uma média de 4000 militantes de Organizações Não-Governamentais de todo o mundo. Com caráter complementar à Declaração do Rio e à Agenda 21, o Fórum Global deu origem a um conjunto de 30 tratados9 que afirmam e legitimam a luta por direitos e pelo fim das desigualdades sociais como tema central para a busca pela sustentabilidade global. Vinte anos depois, o Comitê Facilitador da Sociedade Civil Brasileira para a Rio+20convoca organizações da sociedade civil e movimentos sociais de todo o mundo para a Cúpula dos Povos da Rio+20 por Justiça Social e Ambiental10. A Cúpula dos Povos

busca aprofundar discussões acerca da noção de justiça ambiental, contrapondo-a a noção de economia

verde, tema central do evento oficial.

Nesse PolicyBrief, procuraremos demonstrar e analisar os principais fundamentos dos antagonismos entre os interesses estatais e as

reivindicações da sociedade civil organizada. Dessa forma, buscaremos construir um quadro geral de análise que consiga situar a busca pela sustentabilidade no contexto dos diversos antagonismos anunciados para a Rio+20.

3. As agendas oficiais e as

reivindicações da sociedade civil na

Rio+20

O dia primeiro de novembro de 2011 marcou o prazo final para que cada país submetesse às Nações Unidas um documento oficial contendo os princípios e propostas a serem defendidas na Rio+20. De modo geral, os BRICS apresentam posições e propostas similares, tanto no que diz respeito à noção de economia verde quanto à moldura institucional para a promoção da sustentabilidade. Todos rechaçam a proposta européia de transformar o PNUMA em uma agência especializada cuja função seria fiscalizar os processos de transição para a economia verde. Como contraponto, os BRICS propõem, cada um a seu modo, que o Conselho Econômico e Social das Nações Unidas – ECOSOC seja fortalecido e consolidado como o principal aporte institucional para a promoção da sustentabilidade na escala global.

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Criado em 1946, em consonância com os princípios da Carta das Nações Unidas, o ECOSOC reúne representantes tanto dos governos dos Estados membros da ONU, como do setor privado e acadêmico. Além disso, conta com mais de 3200 ONGs registradas para consulta. Segundo argumenta o governo brasileiro no

Documento de Contribuição Brasileira à Rio+20, o ECOSOC, por ser uma

instância de coordenação para ações conjuntas entre diversos setores da sociedade, “é lugar natural para se pensar em reformas na área de governança para o desenvolvimento sustentável”11. Nesse sentido, a Rio+20 seria uma oportunidade única para lançar o processo de reforma e fortalecimento do ECOSOC, tornando-o um ftornando-ortornando-o fundamental para a implementação do desenvolvimento sustentável.

No que concerne à relação entre Estados e sociedade civil organizada, reformar e fortalecer o ECOSOC significaria, a princípio, aumentar a participação de organizações não-governamentais e movimentos sociais na governança global para o desenvolvimento sustentável.

No entanto, o ponto fundamental de antagonismo entre as agendas oficiais e as reivindicações da sociedade civil não se limitam à forma como a sociedade civil participará da

governança para a sustentabilidade.

Segundo argumentam os

organizadores da Cúpula dos Povos, em documento desenvolvido no Seminário Internacional de Metodologia do Fórum Social Temático12, que aconteceu em Porto

Alegre, nos dias 22 e 23 de outubro de 2011, o debate proposto pelo processo oficial da ONU é limitado à questão da

economia verde e não avança em

questões centrais, como desigualdades sociais e lutas por direitos.

Nos estudos realizados pelo eixo de Desenvolvimento Urbano e Sustentabilidade do BRICS Policy

Center, os quais resultaram numa série

de BRICS Monitors e em dois Policy

Briefs, foram analisados documentos

oficiais dos países BRICS, da União Européia, da Colômbia e da Guatemala. A seleção desses documentos se deu em função dos antagonismos anunciados no que se refere à arquitetura institucional proposta por esses países. No entanto, se os documentos evidenciam certas discordâncias para o quadro institucional, no horizonte da transição para a economia verde é consenso entre os Estados que sustentabilidade não pode significar o sacrifício da capacidade global de crescimento econômico. Daí a necessidade de aprofundar o debate acerca da

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Nesse contexto, inovações tecnológicas, que busquem o uso de recursos renováveis e a diminuição de emissão de gases e dejetos poluentes, aparecem como a principal solução para a conquista da sustentabilidade sem que se sacrifique capacidade de crescimento econômico.

Na perspectiva dos organizadores da Cúpula dos Povos, todavia, inovações tecnológicas seriam soluções ilusórias, pois elas não dariam conta das principais contradições internas do sistema capitalista como um todo. As agendas oficiais dos Estados não colocam em discussão as principais contradições do atual sistema econômico, tais como desigualdade e concentração de renda, super-exploração e precariedade do trabalho, deterioração ambiental, concentração da estrutura fundiária, direito à cidade e a serviços sociais de qualidade. Como contraponto a esse quadro de discussões limitadas que oferecem soluções ilusórias, a sociedade civil organizada no âmbito da Cúpula dos Povos propõe contrapor o conceito de economia verde ao de

justiça social e ambiental. Nesse

sentido, a Cúpula dos Povos pretende avançar na conquista de uma nova agenda, construída no decorrer das diversas edições do Fórum Social Mundial, que visa

“a defesa dos bens comuns e do livre acesso ao conhecimento e à cultura, a centralidade da sustentabilidade social e ambiental em qualquer projeto alternativo, a economia do bem estar e da gratuidade, a busca do bem viver como propósito da vida, a organização do poder político em moldes plurinacionais e baseados na democracia participativa, a relação entre direitos e responsabilidades coletivas [e] o reordenamento geopolítico mundial”13.

A posição a ser defendida pela sociedade civil organizada no âmbito da Cúpula dos Povos tem caráter reformista mais intenso do que o debate proposto pelo processo oficial das Nações Unidas. A Cúpula dos Povos busca apresentar um novo paradigma anti-hegemônico de sociedade, no qual a busca pelo crescimento econômico é diminuído ante as necessidades de maior justiça ambiental e social, visando à diminuição de situações sistêmicas de desigualdades sociais.

Fica claro, portanto, que tanto Rio+20 quanto Cúpula dos Povos não pretendem limitar suas discussões a questão do meio-ambiente. Se, por um lado, a Rio+20 busca encontrar formas de conciliar sustentabilidade com crescimento econômico, por outro, a Cúpula dos Povos busca uma nova visão geral de sociedade, sustentável do ponto de vista ambiental e, ao mesmo tempo, mais igualitária do ponto de vista social.

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Nas partes seguintes, analisaremos pontualmente os fundamentos da noção de economia verde, como apresentada nos documentos oficiais enviados às Nações Unidas, e os princípios que guiam a idéia de justiça

social e ambiental.

4. Economia Verde no Contexto do

Desenvolvimento Sustentável e da

Erradicação da pobreza

O conceito de economia verde, que se fundamenta nas três dimensões da sustentabilidade – crescimento econômico, desenvolvimento social e proteção ambiental –, busca se firmar como um modelo de desenvolvimento econômico que possibilite a melhoria do bem-estar social, ao mesmo tempo em que reduz significativamente os impactos e riscos sociais e ambientais e a demanda por recursos naturais não-renováveis14. A economia verde se distingue do modelo tradicional de desenvolvimento econômico por meio de investimentos em atividades que aproveitam e potencializam o capital natural, social e humano, considerando em suas decisões os limites do planeta e sua sustentabilidade. Segundo Fernando Lyrio, assessor extraordinário para a Rio+20 do Ministério do Meio Ambiente do Brasil, a economia verde “não é só desenvolvimento econômico, não é só

conservação ambiental, não é só proteção social, mas é a mistura das três coisas”15.

No entanto, é importante frisar que não há uma definição oficial de

economia verde. Por mais que esteja

estruturada sobre as três dimensões do desenvolvimento sustentável, cada país têm sua própria maneira de definir o termo. No quadro em anexo buscamos resumir a maneira como os BRICS definem economia verde.

O Brasil, por exemplo, entende que é necessário um ajuste conceitual para que economia verde possa se concretizar como um conceito de fato sustentável. Nesse sentido, o governo brasileiro entende que a expressão

economia verde inclusiva expressaria

de forma mais eficaz o caráter sustentável da noção16. Dessa forma,

abrir-se-ia espaço na conferência para debates e negociações mais aprofundadas acerca de políticas sociais que visam o crescimento econômico ao mesmo tempo em que garantem inclusão social e proteção ambiental. Dessa forma, as políticas de proteção e promoção social ganhariam força, tornando-se prioridade e servindo como atenuador do custo da transição para padrões sustentáveis de crescimento e desenvolvimento econômico.

A África do Sul, por sua vez, define

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atividades econômicas relacionadas à “produção, distribuição e consumo de bens e serviços que resultam no bem-estar social, sem expor futuras gerações a riscos ambientais ou escassezes ecológicas”17. A definição

acima citada baseia-se em certos princípios chaves que, como defende o governo sul-africano, devem ser consensuais. Uma economia verde deve se pautar em eficiência de recursos, diminuição da emissão de carbono, utilização de recursos renováveis, promoção de padrões de consumo e produção sustentáveis, reconhecimento econômico e fiscal do valor dos recursos naturais e proteção social. Além disso, a erradicação da pobreza, por meio da criação de empregos baseados em tecnologias limpas e sustentáveis, deve ser um objetivo fundamental.

A definição proposta pelo governo sul-africano tem um caráter mais pragmático do que a brasileira. Busca conciliar crescimento econômico e desenvolvimento social com sustentabilidade ambiental por meio da criação de empregos verdes baseados em tecnologias baseadas em recursos renováveis.

Índia e China, por sua vez, definem

economia verdepor meio do princípio

das responsabilidades comuns, porém

diferenciadas. Ambos entendem que

países desenvolvidos deveriam rever

seus padrões não-sustentáveis de consumo e arcar com suas responsabilidades históricas, decorrentes de seus processos de industrialização.

As duas potências asiáticas entendem que a Rio+20 deve contribuir para a criação de meios para que países em desenvolvimento transitem para a economia verde sem terem que arcar com custos proibitivos. Um dos pontos centrais da forma como a Índia entende economia verde é a necessidade dos países desenvolvidos transferirem tecnologia sustentáveis para países em desenvolvimento. A transferência tecnológica aceleraria o processo de transição para uma economia sustentável, reduzindo os impactos ambientais, ao mesmo tempo em que aumentaria a oferta de

emprego, reduzindo,

conseqüentemente, o nível de desemprego.

A Federação Russa, por sua vez, em uma postura mais conciliatória, entende que o conceito de economia

verde deve ser aplicado de acordo

coma realidade de cada país. No que diz respeito aos países em desenvolvimento, economia verde

seria a promoção de estabilidade em um contexto de produção e consumo sustentáveis.

Do ponto de vista da sociedade civil organizada, nenhuma dessas

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sugestões e definições conceituais acima citadas são suficientes para erradicar pobreza e diminuir as desigualdades sociais no plano global. A noção de economia verde, na forma apresentada pelos documentos elaborados pelo comitê organizador da Cúpula dos Povos, já citados nesse texto, expressa a predominância dos interesses econômicos sobre os sociais. O principal objetivo seria a conciliação dos interesses de crescimento econômico com a resolução dos problemas ambientais por meio de uma modernização

ecológica.

O termo modernização ecológica, por sua vez, se refere a uma série de estratégias de cunho neoliberal cujo objetivo central é o enfrentamento do impasse ecológico sem considerar sua relação com a questão da desigualdade social e das lutas por direitos. Nessa perspectiva, o debate ecológico em curso deixa de interpelar de forma ampla o modelo desenvolvimentista, e dessa forma, “naturaliza seus pressupostos atuais em seus três âmbitos: acerca do que se produz, de como se produz e para quem se produz” (ACSELRAD, 2009, p. 15).

Na forma como a sociedade civil organizada no âmbito da Cúpula dos Povos entende essa questão, a noção de economia verde não é suficiente

para se alcançar sustentabilidade em seus três pilares, pois não lida de forma contundente com o contexto de desigualdade social global. Economia

verde é uma noção que busca

fortalecer as bases ambientais de um modelo econômico baseado no mercado e não em medidas de proteção e igualdade social. Como contraponto à idéia de economia verde, a Cúpula dos Povos busca legitimar e aprofundar a luta por justiça social e

ambiental, próximo ponto a ser

analisado.

5. Justiça Ambiental e Social

Por meio da noção de economia

verde, a busca por parâmetros

sustentáveis de desenvolvimento econômico é interpretada de maneira meramente técnica. Economia verde e

modernização ecológica seriam, então,

noções convergentes e fundamentais para a promoção da sustentabilidade no plano global. Do ponto de vista da sociedade civil organizada, ambas as noções são insuficientes para processar uma adequação sócio-ambiental capaz de modificar a matriz de produção e consumo global e reduzir injustiças e assimetrias sociais sistêmicas. Na perspectiva da sociedade civil organizada no âmbito da Cúpula dos Povos, a noção

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de um processo que aprofunda o processo de declínio da esfera pública e dos bens públicos em função da ênfase proprietária de certificação e controle, gerando uma idéia de ativos e mercado ambiental privado.

Como contraponto a esse processo, surgiu nos Estados Unidos da década de 1980 o Movimento de Justiça Ambiental (MJA). Esse movimento buscava articular lutas de caráter social, territorial, e ambiental com lutas por direitos civis contra o declínio da esfera pública e ascensão da ideologia neoliberal. Da percepção de que o declínio da esfera pública é responsável pelo aprofundamento do quadro de desigualdade sócio-ambiental, surge uma proposta alternativa que estrutura um conjunto de plataformas voltadas para a realização da justiça ambiental. Como definida pelo movimento norte-americano, justiça ambiental se refere ao tratamento justo que todas as pessoas, independente de raça, cor, renda ou gênero devem ter no que “diz respeito à elaboração, desenvolvimento, implementação e aplicação de políticas, leis e regulações ambientais” (ACSELRAD, 2009, p. 16). A partir dessa avaliação, a questão ambiental é muito mais um problema social do que um desafio de ordem técnica.

Busca-se, então, a construção de um meio ambiente seguro e produtivo para todos, que remete a dimensões tanto ecológicas quanto físicas, sociais, políticas, culturais e econômicas. O ponto de partida de tal definição foi aconclusão de que impactos ambientais estão desigualmente distribuídos. Como afirmam Cole e Foster (2001), riscos e acidentes ambientais são mais prováveis de acontecer em áreas habitadas por minorias étnico-raciais. Dessa forma, o Movimento de Justiça Ambiental entra no embate direto pela luta por direitos civis. A noção de justiça ambiental associa desigualdade social com discriminação e segregação étnico-racial territoriais, que impulsionam as formas de desenvolvimento desigual.

No decorrer das várias edições do Fórum Social Mundial, foram sendo consolidadas diversas propostas e plataformas, articulando diversas organizações não-governamentais e movimentos sociais de vários países, cujo objetivo era fortalecer a luta por

justiça ambiental. Essas propostas e

plataformas defendem quenovos horizontes utópicos, baseados em valores e experiências que remetem a outras formações sociais e modos de produção, devem nortear as discussões acerca da sustentabilidade. As noções de economia solidária e social, de direito à cidade e à natureza,

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de desenvolvimento de propriedade social e comum compõem o cerne das estratégias de ação e princípios que norteiam as lutas por horizontes alternativos e utópicos.

A noção fundamental de bem-viver, que defende o direito à ampla proteção social, é aspecto fundamental desse posicionamento contrário à globalização hegemônica de caráter neoliberal. Dessa forma, movimentos e redes internacionais ligadas ao tema da justiça ambiental têm sido enfáticos na perspectiva de lutar contra a privatização do patrimônio ambiental comum e no fortalecimento da política como fator de proteção social e regulação da atividade econômica.

As organizações e movimentos sociais cujas lutas e ações práticas se baseiam na noção de justiça ambiental entendem que é necessário outro modelo de desenvolvimento, que não exponha nenhum grupo social ao risco da poluição tóxica e que se baseie nummodelo de produção e consumo socialmente justo. Nessa perspectiva, sustentabilidade seria muito mais uma questão de justiça social do que uma plataforma tecnológica que consuma menos recursos e emita menos poluentes.

6. Conclusão

O pano de fundo da luta por

justiça ambiental, que se expressa

tanto no início do movimento nos EUA quanto no processo de organização da Cúpula dos Povos, é a dicotomia entre economia e política. O discurso empregado pela sociedade civil organizada no âmbito da Cúpula dos Povos, baseado na noção de justiça

ambiental e na busca de alternativas à

globalização hegemônica, defende que órgãos políticos regulem a atividade econômica de forma a diminuir situações de segregações étnico-raciais e assimetrias sociais e valorizar o bem-viver. Há, então, uma valorização da atividade política sobre a atividade econômica com o intuito de garantir proteção social e ambiental. É essa dicotomia que norteia os antagonismos entre sociedade civil e as agendas oficiais dos Estados.

Em todos os documentos oficiais estatais analisados para esse

Policy Brief, a palavra justiça não foi

mencionada uma única vez. Na forma como os discursos oficiais articulam a busca pela erradicação da pobreza com economia verde, o fortalecimento da economia de mercado e a adequação dos meios de produção a parâmetros tecnológicos sustentáveis de exploração de recursos e geração

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de energia são elementos centrais e indispensáveis.

Por meio da economia verde, espera-se que a própria racionalidade de mercado, se baseada em um vetor tecnológico limpo, seja capaz de reduzir pobreza e promover um ambiente de inclusão social. As necessidades econômicas se sobrepõem às necessidades políticas e sociais, consolidando um cenário de antagonismos que enfraquece qualquer busca por consenso na Rio+20.

Concluímos, portanto, que as discussões e negociações para o sucesso da Rio+20 não são ameaçadas unicamente pelas dificuldades de se gerar consenso no sistema interestatal. São ameaçadas, porém, de forma muito mais contundente por esse antagonismo entre a busca pelo fortalecimento da economia de mercado, como desejam em tom uníssono os Estados, e a busca por mais justiça social e ambiental, como deseja a sociedade civil organizada. A complementaridade de ambas as agendas, por meio da inserção na agenda das discussões oficiais propostas pelas Nações Unidas da noção de justiça ambiental, é, a nosso ver, aspecto fundamental para que a Rio+20 se concretize como uma conferência bem sucedida.

7. Referências Bibliográficas

 

ACSELRAD, H. O que é Justiça

Ambiental. Rio de Janeiro: Garamond,

2009.

COLE, L. W.; FOSTER, S. R. From the

Ground Up: Environmental Racism and

the Rise of Environmental Justice Movement. New York: New York University Press, 2001.

                                                                                                               

1 O relatório completo pode ser encontrado

no site http://www.un-documents.net/wced-ocf.htm (último acesso, 05/12/2011)

2Para mais informações sobre o Protocolo

de Kyoto, como a situação da ratificação do protocolo, favor consultar o site

http://www.mct.gov.br/index.php/content/vie w/4006.html (último acesso, 05/12/2011)

3 Mais informações sobre a Agenda 21

podem ser encontradas no site http://www.un.org/esa/dsd/agenda21/ (último acesso, 05/12/2011)

4

 A  Declaração  do  Rio  pode  ser  

encontrada  na  íntegra  no  site  

http://www.mma.gov.br/sitio/index.

php?ido=conteudo.monta&idEstrutur

a=18&idConteudo=576

 (último  

acesso  05/12/2011)  

5 O Plano de Implementação de

Johanesburgo pode ser encontrado na íntegra, em português, no site www.mma.gov.br/estruturas/ai/_arquivos/pi joan.doc (último acesso, 05/12/2011)

6 O documento oficial enviado pela União

Européia pode ser encontrado no site http://www.uncsd2012.org/rio20/content/do cuments/240contribution%20of%20the%20 EU%20and%20its%20MS%20to%20the%2 0UNCSD.pdf (último acesso, 05/12/2011)

7 O documento oficial enviado pelo governo

colombiano a ONU pode ser encontrado no site

http://www.uncsd2012.org/rio20/content/do cuments/372Insumos%20de%20Colombia

(15)

                                                                                                                                                     

%20al%20Borrador%200%20Rio20.pdf (último acesso, 05/12/2011)

8 Para maiores informações sobre as

divergências de propostas dos países desenvolvidos e em desenvolvimento, ver http://bricspolicycenter.org/homolog/upload s/trabalhos/254/doc/573711903.pdf (último acesso 25/11/2011).

9Todos  os  tratados  podem  ser  encontramos  

na  íntegra  no  site  

http://vitaecivilis.org/home/index.php?optio n=com_zoo&task=item&item_id=164&Itemi d=151 (último acesso 07/02/2012)

10 Nome ainda provisório.

11 O documento encontra-se disponível na

íntegraem

http://www.mma.gov.br/estruturas/182/_arq uivos/rio20_propostabr_182.pdf (último acesso em 25/11/2011)

12 Documento disponível na íntegra em:

http://fmejsa.forummundialeducacao.org/do cs/Relato_Seminario_FST_portugues.pdf (último acesso 26/11/2011)

13Fragmento retirado do documento

intitulado “Crise Capitalista, Justiça Social e Ambiental”, que apresenta a metodologia a ser seguida no Fórum Social Temático Preparatório para a Cúpula dos Povos da Rio+20, que acontecerá em janeiro de 2012, na cidade de Porto Alegre. O

documento pode ser encontrado na íntegra em http://fmejsa.forummundialeducacao.org/do cs/Metodologia_F%C3%B3rum%20Social %20Tem%C3%A1tico_portugues.pdf (último acesso 26/11/2011). 14http://vitaecivilis.org/economiaverde/imag es/stories/pub/encerramento/Quadro_Refer encial_da_EV_DN_Rumo_a_Rio_mais20_ OK.pdf (último acesso em 20/10/2011)

15http://clippingmp.planejamento.gov.br/cad

astros/noticias/2011/8/24/economia-verde- tem-conceito-elastico-e-serve-para-todos-os-fins (último acesso em 20/10/2011)

16http://www.mma.gov.br/estruturas/182/_ar quivos/rio20_propostabr_182.pdf (último acesso em 25/11/2011) 17http://www.uncsd2012.org/rio20/content/d ocuments/368South%20Afric%20Inputs%2 0to%20the%20United%20Nations%20Conf erence%20on%20Sustainable%20Develop ment.pdf (último acesso 22/11/2011) (tradução do autor)

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