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A gravidez gemelar, a saúde mental materna, a vinculação pré-natal materna e a satisfação conjugal durante a gestação

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UNIVERSIDADE DE LISBOA FACULDADE DE PSICOLOGIA

A GRAVIDEZ GEMELAR, A SAÚDE MENTAL MATERNA, A VINCULAÇÃO PRÉ-NATAL MATERNA

E A SATISFAÇÃO CONJUGAL DURANTE A GESTAÇÃO

Vanessa Alexandra Custódio Malta

MESTRADO EM PSICOLOGIA CLÍNICA E DA SAÚDE

Área de Especialização em Psicologia Clínica Dinâmica

2022

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UNIVERSIDADE DE LISBOA FACULDADE DE PSICOLOGIA

A GRAVIDEZ GEMELAR, A SAÚDE MENTAL MATERNA, A VINCULAÇÃO PRÉ-NATAL MATERNA

E A SATISFAÇÃO CONJUGAL DURANTE A GESTAÇÃO

Vanessa Alexandra Custódio Malta

Dissertação orientada pelo Professor Doutor João Manuel Rosado de Miranda Justo

MESTRADO EM PSICOLOGIA CLÍNICA E DA SAÚDE

Área de Especialização em Psicologia Clínica Dinâmica

2022

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i Agradecimentos

Ao Professor Doutor João Justo, por aceitar orientar a minha dissertação de Mestrado, pela permanente prontidão e disponibilidade, apoio incondicional, profissionalismo, paciência, cuidado, atenção e dedicação na partilha dos valiosos ensinamentos. Pelo constante incentivo e motivação, juntamente com a valorização do trabalho desenvolvido indispensáveis para a sua concretização e finalização. Obrigada pelo seu entusiasmo contagiante à profissão, vital para lidar com todos desafios e adversidades no percurso. Foi um privilégio trabalhar e aprender consigo, muito obrigada.

A todos os professores, com quem tive a sorte de aprender sobre Psicologia. Pelo vosso profissionalismo, dedicação, investimento e amor à profissão. Pelo brio na partilha dos vossos preciosos conhecimentos para que a nossa aprendizagem seja sempre a melhor. Muito obrigada são uma autêntica fonte de inspiração.

Aos colegas, que tive a felicidade de conhecer e que enriqueceram esta maravilhosa caminhada na Psicologia, experienciando-a ao meu lado. A aprendizagem e crescimento conjunto, o suporte e apoio permanente, a vossa amizade. Juntos aprimorámos a nossa resiliência e perseverança perante os inúmeros desafios, mas também festejamos as nossas conquistas. Obrigada por me ensinarem tanto, cada um é único e especial, cresci muito como pessoa graças a vocês. Vocês sabem quem são, jamais vos esquecerei.

À minha mãe, pelo amor incondicional, pela eterna presença em tudo na minha vida.

Por acreditar sempre em mim, nunca duvidar das minhas capacidades e permitir que possa ser aquilo que sonhar, incentivando sempre o meu crescimento e a minha felicidade. A minha maior fonte de inspiração, alimentando a minha força para tornar possível, aquilo que acharia que seria impossível realizar. Obrigada à vida por existires e seres minha mãe.

À minha família, por serem a base, o suporte, o porto seguro da minha vida. Por acreditarem em mim, motivarem e encorajarem a concretizar tudo aquilo que ambicionar ao longo da vida. Muito obrigada por mostrarem e ensinarem a importância do amor.

Às minhas amigas, pela amizade incondicional, o amor, carinho e afeto. Pela paciência, compreensão, incentivo e motivação. Obrigada por estarem sempre presentes.

A todas as minhas participantes, pela amabilidade e disponibilidade em participarem na minha dissertação. Por terem contribuído para que esta investigação fosse realizável, foram essenciais, sem vocês nada disto teria sido possível. Eternamente grata!

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iii Resumo

Introdução: A gravidez gemelar coloca questões psicológicas muito importantes, ao nível da saúde mental da grávida e da relação materno-fetal, não esquecendo a possibilidade de ocorrências obstétricas. Objetivo: Determinar como, na gravidez gemelar, se articulam a satisfação conjugal, os estados emocionais negativos e a vinculação pré-natal materna.

Metodologia: As participantes (N = 42) eram mulheres grávidas de gémeos, entre 18 e 38 anos de idade e com idade gestacional acima das 9 semanas. Instrumentos: Questionário Sociodemográfico e Clínico, Escala de Ansiedade, Depressão e Stress (Lovibond & Lovibond, 1995; versão portuguesa de Pais-Ribeiro, Honrado & Leal, 2004), Escala de Vinculação Pré- Natal Materna (Condon, 1993; versão portuguesa de Camarneiro & Justo, 2007, 2010) e Escala de Avaliação da Satisfação em Áreas da Vida Conjugal (Narciso & Costa, 1996). As respostas foram obtidas online utilizando a plataforma Qualtrics. Hipóteses: HG1, a satisfação conjugal dá um contributo significativo para explicar a variância da depressão, da ansiedade e do stress vividos na gravidez gemelar; HG2, a satisfação conjugal dá um contributo significativo para explicar a variância da vinculação pré-natal materna durante a gravidez gemelar; HG3, a depressão, a ansiedade e o stress desempenham um papel mediador na relação entre a satisfação conjugal e a vinculação pré-natal na gravidez gemelar. Resultados: HG1, a satisfação conjugal dá um contributo significativo para explicar os estados emocionais negativos. HG2, apenas a satisfação conjugal na sexualidade contribui para explicar a qualidade da vinculação materna e a vinculação pré-natal materna. HG3, apenas a depressão desempenha um papel mediador na relação entre a satisfação conjugal na sexualidade e a qualidade da vinculação materna, bem como com a vinculação pré-natal materna. Conclusões: Os estados emocionais negativos desempenham papéis importantes face à relação materno-fetal. Na satisfação conjugal, a sexualidade ganha relevo face aos outros aspetos da conjugalidade. A mediação entre satisfação conjugal e a relação materno-fetal apenas é operada pela depressão. Estas conclusões devem ser tidas em conta pelos profissionais de saúde na sua intervenção com as gestantes gemelares.

Nesse sentido, esta investigação talvez contribua para os avanços na qualidade do auxílio que os profissionais de saúde proporcionam no acompanhamento das grávidas de gémeos.

Palavras-chave: gravidez gemelar, satisfação conjugal, vinculação pré-natal materna, estados emocionais negativos.

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v Abstract

Introduction: Twin pregnancy raises very important psychological issues, in terms of the pregnant woman's mental health and the maternal-fetal relationship, as also in obstetric terms.

Goal: To determine how, in twin pregnancy, marital satisfaction, negative emotional states and maternal prenatal attachment influence each other. Methodology: Participants (N = 42) were women experiencing twin pregnancy, between 18 and 38 years of age and with a gestational age above 9 weeks. Instruments: Sociodemographic and Clinical Questionnaire; Anxiety, Depression and Stress Scale (Lovibond & Lovibond, 1995; Portuguese version by Pais-Ribeiro, Honrado & Leal, 2004); Maternal Prenatal Attachment Scale (Condon, 1993; Portuguese version by Camarneiro & Justo, 2007, 2010), and the Satisfaction Assessment Scale in Areas of Marital Life (Narciso & Costa, 1996). The answers were obtained online using the Qualtrics platform. Hypotheses: HG1, marital satisfaction makes a significant contribution for the explanation of the variance of depression, anxiety and stress experienced in twin pregnancy;

HG2, marital satisfaction makes a significant contribution for the explanation of the variance of maternal prenatal attachment during twin pregnancy; HG3, depression, anxiety and stress play mediating roles in the relationship between marital satisfaction and prenatal attachment in twin pregnancy. Results: HG1, marital satisfaction makes a significant contribution for the explanation of negative emotional states. Relative to HG2, only marital satisfaction in sexuality contributes to explain the quality of maternal prenatal attachment and the total of maternal prenatal attachment. HG3, only depression plays a mediating role in the relationship between marital satisfaction in sexuality and the quality of maternal prenatal attachment, as well as with the total of maternal prenatal attachment. Conclusions: Negative emotional states play important roles in the maternal-fetal relationship. For marital satisfaction, sexuality gains prominence compared to other aspects of marital relationships. The mediation between marital satisfaction and maternal-fetal relationship is only operated by depression. These conclusions should be taken into account by health professionals in their intervention with women experiencing twin pregnancy. In this sense, this investigation may contribute for advances in the quality of assistance that health professionals provide in the follow-up of pregnant women with twins.

Keywords: twin pregnancy, marital satisfaction, maternal prenatal attachment, negative emotional states.

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vii Índice

Resumo ... iii

Abstract ... v

1. Enquadramento Teórico ... 1

1.1. Gravidez do ponto de vista psicológico ... 1

1.2. Gravidez do ponto de vista biomédico ... 2

1.3. Transição para a parentalidade ... 3

1.3.1. Tornar-se mãe ... 7

1.4. Gemelaridade ... 9

1.4.1. Gestação múltipla ... 9

1.4.2. Desafios psicológicos e práticos ... 11

1.5. Saúde mental dos pais de gémeos ... 14

1.6. Vida emocional e vinculação pré-natal ... 17

2. Problema de Investigação, Objetivos e Hipóteses Gerais ... 21

2.1. Problema de Investigação ... 21

2.2. Relevância do Problema de Investigação ... 21

2.3. Objetivo de Investigação ... 21

2.4. Hipóteses Gerais ... 21

3. Metodologia ... 22

3.1. Definição de Variáveis ... 22

3.2. Operacionalização de Variáveis ... 22

3.2.1. Questionário Sociodemográfico e Clínico ... 22

3.2.2. Escala de Ansiedade, Depressão e Stress ... 23

3.2.3. Escala de Vinculação Pré-Natal Materna ... 24

3.2.4. Escala de Avaliação da Satisfação em Áreas da Vida Conjugal ... 25

3.3. Hipóteses Específicas ... 26

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3.4. Procedimento ... 30

3.4.1. Critérios de Inclusão na Amostra ... 30

3.4.2. Recolha de Dados Online ... 30

3.4.3. Critérios de Exclusão na Amostra ... 31

3.5. Participantes ... 31

4. Testagem das Hipóteses ... 34

4.1. Testagem da Hipótese Geral 1 ... 34

4.1.1. Testagem das Hipóteses Específicas relativas a HG1 ... 34

4.1.2. Testagem da Hipótese Específica 25 ... 35

4.1.3. Testagem da Hipótese Específica 26 ... 35

4.1.4. Testagem da Hipótese Específica 27 ... 35

4.1.5. Testagem da Hipótese Específica 28 ... 36

4.2. Testagem da Hipótese Geral 2 ... 36

4.2.1. Testagem da Hipótese Específica 32 ... 36

4.2.2. Testagem da Hipótese Específica 34 ... 37

4.3. Testagem da Hipótese Geral 3 ... 37

4.3.1. Testagem da Hipótese Específica 50 ... 37

4.3.2. Testagem da Hipótese Específica 54 ... 38

5. Discussão e Conclusões ... 39

Referências ... 47

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ix Índice de Tabelas

Tabela 1 – Estatística descritiva das variáveis sociodemográficas das participantes ... 32

Tabela 2 – Estatística descritiva das variáveis clínicas das participantes ... 33

Tabela 3 – Análise de regressão relativa à testagem de HE25 ... 35

Tabela 4 – Análise de regressão relativa à testagem de HE26 ... 35

Tabela 5 – Análise de regressão relativa à testagem de HE27 ... 36

Tabela 6 – Análise de regressão relativa à testagem de HE28 ... 36

Tabela 7 – Análise de regressão relativa à testagem de HE32 ... 37

Tabela 8 – Análise de regressão relativa à testagem de HE34 ... 37

Tabela 9 – Análise de regressão relativa à testagem de HE50 ... 38

Tabela 10 – Análise de regressão relativa à testagem de HE54 ... 38

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xi Índice de Anexos

Anexo I – Consentimento Informado

Anexo II – Questionário Sociodemográfico e Clínico

Anexo III – Escala de Ansiedade, Depressão e Stress (EADS-21) Anexo IV – Escala de Vinculação Pré-Natal Materna (EVPNM)

Anexo V – Escala de Avaliação da Satisfação da Vida Conjugal (EASAVIC) Anexo VI – Análise da Consistência Interna da Subescala Ansiedade

Anexo VII – Análise da Consistência Interna da Subescala Depressão Anexo VIII – Análise da Consistência Interna da Subescala Stress Anexo IX – Análise da Consistência Interna da Escala Total (EADS)

Anexo X – Análise da Consistência Interna da Subescala Qualidade da Vinculação Materna Anexo XI – Análise da Consistência Interna da Subescala Intensidade da Preocupação Materna Anexo XII – Análise da Consistência Interna da Escala Total (EVPNM)

Anexo XIII – Análise da Consistência Interna da Subescala Intimidade Emocional Anexo XIV – Análise da Consistência Interna da Subescala Sexualidade

Anexo XV – Análise da Consistência Interna da Subescala Comunicação/Conflito Anexo XVI – Análise da Consistência Interna da Subescala Funções Familiares Anexo XVII – Análise da Consistência Interna da Subescala Rede Social

Anexo XVIII – Análise da Consistência Interna da Subescala Autonomia Anexo XIX – Análise da Consistência Interna da Escala Total (EASAVIC)

Anexo XX – Estatística Descritiva das Variáveis Sociodemográficas e Clínicas avaliadas em Escalas Nominais

Anexo XXI – Estatística Descritiva das Variáveis Sociodemográficas e Clínicas avaliadas em Escalas Intervalares

Anexo XXII – Testagem do Ajustamento à Distribuição Normal Anexo XXIII – Estatística Descritiva das Variáveis Psicométricas

Anexo XXIV – Análise da Regressão relativa à testagem da Hipótese Específica 25 Anexo XXV – Análise da Regressão relativa à testagem da Hipótese Específica 26 Anexo XXVI – Análise da Regressão relativa à testagem da Hipótese Específica 27 Anexo XXVII – Análise da Regressão relativa à testagem da Hipótese Específica 28 Anexo XXVIII – Análise da Regressão relativa à testagem da Hipótese Específica 32 Anexo XXIX – Análise da Regressão relativa à testagem da Hipótese Específica 34

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xii Anexo XXX – Análise da Regressão relativa à testagem da Hipótese Específica 50

Anexo XXXI – Análise da Regressão relativa à testagem da Hipótese Específica 54

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1 1. Enquadramento Teórico

1.1. Gravidez do ponto de vista psicológico

A gravidez define-se pelo período em que a mulher está grávida (o período entre a fecundação e o parto) em que ocorre a gestação do embrião/feto (ACOG, 2019). Sendo um dos períodos mais desafiantes e exigentes no desenvolvimento humano, é neste período que se incrementa a vulnerabilidade para o aumento de distress psicológico (Obrochta, 2020), acontecendo diversas mudanças, tanto fisiológicas quanto psicológicas, para a mulher grávida, plausíveis de influenciar a sua vida, do companheiro e do casal, estabelecendo-se como um período de crise no ciclo de vida (Alves & Bezerra, 2020; Costa et al., 2010).

A mulher grávida terá que preparar-se psicologicamente em domínios como: o cognitivo, com o ensaio de papéis e tarefas; o afetivo, ou o ligar-se à criança e o relacional, como o reestruturar das relações pessoais, incluindo o novo elemento na sua identidade e aprendendo a aceitar o feto como pessoa (Canavarro, 2001). As mudanças na identidade principiam-se assim que a mulher percebe que está grávida, pois deixa de ser uma pessoa singular e passa a viver com as transformações que a condição de ser mãe origina (Camarneiro, 2011).

A gravidez não se estabelece como uma experiência estática e breve, mas plena de crescimento e mudança, enriquecimento e desafio. Um dos desafios mais importantes é o inaugurar de uma nova identidade, não apenas do bebé, mas incluindo a sua como mãe, do companheiro como pai e dos pais como avós (Colman & Colman, 1994). Xavier (2000) completa que cada gravidez é única e cada um reage de forma própria ao encadeamento dos acontecimentos fisiológicos e, além disso, cada mulher pode reagir de forma desigual de gravidez para gravidez.

A gravidez é reconhecida como uma fase gratificante na vida dos casais, ainda assim pode tornar-se num período de crise (Heinicke, 2002), com potencial para comprometer o ajustamento psicológico individual e a qualidade da relação conjugal (Canário, 2015; Xavier, 2000). A gravidez representa um estádio muito importante, onde os pais encaram a incerteza sobre o futuro e se preparam para mudanças major. Este é um momento tido como crucial, pela

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2 mudança e adaptação que principiam e pelo modo como os casais vivem estes desafios (Ramsdell et al., 2019). Relvas e Lourenço (2001) referem que a adaptação a esta vivência (gravidez) não se circunscreve apenas na mulher, mas também no homem e no casal em conjunto, visto que o nascimento de um filho tem um proeminente impacto na vida de cada indivíduo e do sistema familiar.

A gravidez define-se enquanto vivência de uma “crise específica” (Dyer, 1963) que integra uma série de tarefas desenvolvimentais (Colman & Colman, 1994). É uma crise não patológica, originando novas exigências para a grávida, como de mudança e adaptação à sua nova identidade enquanto mãe (Cordeiro, 1994).

Diversos estudos confirmam que a adaptação psicológica à gravidez está associada a alguns fatores individuais, relacionais e sociais (e.g., Xavier, 2000). Exemplos como as variáveis sociodemográficas (e.g., idade materna, o estatuto conjugal, o nível educacional, a paridade, o estatuto ocupacional durante a gravidez) e as variáveis relacionadas com a gravidez (e.g., planeamento da gravidez) apresentam-se como importantes para o resultado da gravidez.

As adaptações psicológicas e respetivas tarefas correspondentes à vivência da gravidez caracterizam-se por uma sequência de três fases, “coincidindo” com os três trimestres da gravidez: o primeiro trimestre, identificado como a fase de integração; o segundo trimestre, a fase de diferenciação e o terceiro trimestre como fase de separação (Colman & Colman, 1971).

O progresso de esta vivência permitirá à mulher que se aceite “como um ser que traz dentro de si outro ser, que em relação a si é potencialmente diferente e autónomo e do qual se vai separar”

(Justo, 1986, p. 12), integrando a ideia de um novo elemento na sua esfera pessoal, familiar e social.

1.2. Gravidez do ponto de vista biomédico

A gestação define-se como o período de desenvolvimento do embrião (considerado feto a partir das 8 semanas), ou seja, é o período desde a formação do embrião até ao nascimento do bebé (recém-nascido), cerca de 38 semanas após a fecundação (ACOG, 2019).

Durante a gestação, o feto prepara-se para a vida autónoma. No decorrer de este período, são as competências sensoriais e comportamentais, vitais à sobrevida do bebé à nascença sem

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3 uma total dependência da mãe, que são adquiridas (Figueiredo, 2006). O feto mostra-se, desde o início, suscetível à influência do ambiente, tal como corroboram alguns estudos que reportam o efeito de diversas substâncias como o consumo de determinadas substâncias por parte da mãe, na gestação e no estado do bebé à nascença (Bruin et al., 2010; Jaddoe et al., 2010; Pereira et al., em revisão, citado por Figueiredo, 2021). Contudo, o feto similarmente influencia a mãe, tal como demonstram outros estudos que aludem ao seu efeito na iniciação do parto (Almli et al., 2001; Romero et al., 2007) e no estado psicológico da progenitora (DiPietro et al., 2004).

Reconhece-se que a mãe, o pai e o bebé estão em interação permanente, ao nível biológico e psicológico, desde o início da gravidez/gestação. Relativamente ao impacto do ambiente uterino no crescimento e desenvolvimento do feto, esta interação tem sido explicada por, pelo menos, dois processos de desenvolvimento (Figueiredo, 2021).

A teoria da programação fetal – em inglês, fetal programming theory (Barker, 2004) – empregue na psicologia, na recente teoria da programação desenvolvimental (Ellis & Giudice, 2019), determina que as características do ambiente uterino modelam o desenvolvimento de certas características específicas do feto, favorecendo uma melhor resposta às particularidades do ambiente que enfrentará depois do nascimento. Isto permitirá antecipar e tornar o indivíduo mais capaz de lidar com as particularidades do ambiente no qual terá de sobreviver à nascença (Figueiredo, 2021).

A saúde mental da mãe é uma importante condição para proporcionar um ambiente intrauterino facilitador do desenvolvimento e saúde da criança (Figueiredo, 2005b). Vale a pena evidenciar que a saúde e o desenvolvimento do feto são diretamente determinados pelo estado de saúde, incluindo o estado de saúde da mãe durante a gestação, e são indiretamente determinados por outros fatores que interferem na saúde, incluindo o estado de saúde mental da mãe (Figueiredo, 2021).

1.3. Transição para a parentalidade

A gravidez é o período em que a mulher e o homem iniciam o seu papel de mãe e pai, ao exercerem a parentalidade. Ao conseguirem promover as condições necessárias ao crescimento e desenvolvimento do embrião/feto, ambos começam a exercer a sua função enquanto pais, isto é, a parentalidade (Figueiredo, 2011; 2005a; 2013). O conjunto de mudanças

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4 psicológicas que sucedem nestes pais contribuirá para o desenvolvimento e exercício da parentalidade. Estas mudanças inscrevem-se num processo desenvolvimental designado como transição para a parentalidade, iniciando-se na gravidez e progredindo no pós-parto (Cowan &

Cowan, 2000; Figueiredo & Lamela, 2014).

É de salientar que, no decorrer da gravidez, verificam-se mudanças biológicas e psicológicas que estimulam e preparam a mulher e o homem para a parentalidade, onde asseguram as condições necessárias ao crescimento e desenvolvimento do feto e, tendo isso em vista, necessárias à sobrevivência da criança (Figueiredo, 2013). As mudanças biológicas e psicológicas que preparam ambos os pais para a parentalidade são impulsionadas pela presença do feto. Verifica-se que o aumento do envolvimento emocional da mãe e do pai com o bebé é ativado na presença dos movimentos fetais e do visionamento ecográfico do feto e outras práticas e normas socioculturais (Kleinveld et al., 2007; Samorinha et al., 2009) quanto ao efeito do feto nas mudanças biológicas da mãe. Ainda assim, tanto as mudanças biológicas (e.g., DiPietro et al., 2004) quanto as psicológicas ativadas pela presença do feto se relacionam e potenciam entre si de forma sinergética (Corning, 1998).

Uma forte associação entre as mudanças biológicas relacionadas com a gravidez e o parto e as mudanças psicológicas necessárias ao exercício da parentalidade também se verifica consequentemente (Figueiredo, 2013). Como as mudanças hormonais decorrentes do processo de gravidez, parto e amamentação, resultam no aumento de produção de oxitocina, são necessárias a um melhor exercício da parentalidade, ou seja, à prestação dos cuidados para a sobrevivência do bebé (Carter & Porges, 2013; Mileva-Seitz et al., 2011).

Os autores atribuem à presença simultânea de estímulos biológicos, psicológicos, e sociais, a ativação, na gravidez e no pós-parto, da resolução das tarefas necessárias à aquisição dos elementos comportamentais que assegurarão uma parentalidade adequada. Estas tarefas destinam-se a permitir a prestação de cuidados apropriados às necessidades do feto/bebé e são realizadas por ambos os pais, per se, e pelo casal, em conjunto. A resolução de estas tarefas desencadeará uma transição desenvolvimental (no que se refere a cada pai) e uma transição familiar (no que se refere ao casal) – a transição para a parentalidade (Figueiredo, 2014;

Figueiredo & Lamela, 2014). No que diz respeito à transição desenvolvimental, uma das tarefas principais consta, em termos individuais, no processo de os pais se tornarem pais, e integrarem esse elemento na sua identidade própria (Colman & Colman, 1994). Relativamente à transição

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5 familiar, uma das tarefas principais traduz-se na aceitação e no ajustamento do sistema conjugal e familiar a um novo membro, o bebé (McGoldrick & Carter, 1982).

A transição para a parentalidade advém e origina um conjunto de mudanças a diferentes níveis como o biológico, psicológico e o social que asseguram a parentalidade. Para que tal suceda é indispensável a resolução de um conjunto de tarefas, ao nível do indivíduo, do casal e da família. Qualquer transição representa uma mudança de um para outro estado/estatuto, num período curto de tempo, permitindo uma melhor adaptação do indivíduo às novas exigências do ambiente (o novo elemento na família). A transição para a parentalidade requer processos de mudança prolongados que se interligam com a reorganização da vida do indivíduo, tanto no seu mundo interno como no seu comportamento perante e com os outros (Cowan & Cowan, 2000).

Esta transição poderá ser facilitada ou dificultada pelas condições do indivíduo e do ambiente e ainda, pela qualidade das relações interpessoais que conseguirão funcionar como um fator facilitador ou dificultador da boa resolução das tarefas necessárias à transição para a parentalidade (Figueiredo et al., 2018). As intervenções psicológicas preventivas ou promocionais, especialmente, se incidirem sobre um contexto interpessoal de apoio ao casal também poderá facilitar o modo como o indivíduo, o casal ou a família lida com esta transição (Pilkington et al., 2015).

Vários autores (e.g., Canavarro, 2001; Canavarro & Pedrosa, 2005; Carvalho et al. 2006;

Colman & Colman, 1994) apresentam as tarefas da transição associadas a um timing. Esta associação ocorre desde a gravidez até ao puerpério (SAMS – Prestação Integrada de Cuidados de Saúde, 2020). As tarefas de transição, associadas à vivência de uma crise específica, implicam que a mulher se adapte, de forma constante, às mudanças decorrentes da sua condição corporal, psicológica, familiar e social, podendo provocar experiências de stress.

As tarefas da transição para a parentalidade são diversas e a sua realização sucede-se e condiciona-se mutuamente. Aceitar a gravidez como primeira tarefa, designa a ambivalência quanto a esta aceitação e ocorre com frequência, não sendo mais frequente no homem quando em comparação com a mulher (Ammaniti, 1991). A necessidade de realizar esta tarefa suplementar permite compreender a presença de mais dificuldades na transição para a parentalidade nos pais que já têm filhos (e.g., Figueiredo & Conde, 2011).

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6 Aceitar estar grávida não é o mesmo que aceitar o feto. Os pais começam por aceitar a gravidez e, subsequentemente, por compreender que a gravidez corresponde à gestação de um bebé – a segunda tarefa (Ammaniti et al., 1992).

A aceitação dará lugar ao início de uma relação com o bebé – terceira tarefa (Figueiredo, 2013; 2014). A relação com o bebé inicia-se com a atribuição de um ou vários possíveis nomes próprios ou características próprias ao bebé, revelando que este já é reconhecido pelos pais com uma individualidade com quem serão capazes de estabelecerem uma relação (Vizziello et al., 1993). Será evidente a manifestação de emoções e comportamentos dos pais para com o bebé, afirmando a sua individualidade e o início de uma relação interpessoal (Figueiredo, 2013; 2014;

Figueiredo & Costa, 2009; Figueiredo et al., 2007).

A quarta tarefa destina-se a reavaliar a identidade própria, no sentido de refletir acerca da identidade materna/paterna e construir (ou reconstruir) uma identidade própria que a integre.

Será vital refletir sobre o que é ser mãe/pai e que tipo de mãe/pai se quer ser, acontecendo com frequência por comparação com os modelos disponíveis na história do desenvolvimento do indivíduo. Especialmente tendo em conta os modelos de parentalidade de que foram alvo na sua infância (Egeland et al., 1988). Reavaliar e reconstruir a relação com os pais e a família alargada é a quinta tarefa, de extrema importância, visto que os assuntos não resolvidos na relação com os pais na infância poderão afetar negativamente a parentalidade (Conde et al., 2011). Neste contexto, o apoio da família é um elemento importante na prestação de cuidados à criança (Ritter et al., 2000).

A sexta tarefa realizada pelo casal é o construir (ou reconstruir) a relação co-parental.

Por coparentalidade compreende-se o envolvimento conjunto e recíproco de ambos os pais nos cuidados e nas decisões a respeito da criança (Feinberg, 2002; 2003). A coparentalidade incide nas interações interparentais, em relação às práticas, funções e expetativas de cada um no desempenho do papel de ambos os pais. Estas interações têm origem na gravidez (Pinto, Figueiredo & Feinberg, 2019) e dizem respeito a decisões que os pais têm de decidir em conjunto e para as quais terão de encontrar uma deliberação comum, devido a referir-se a um terceiro (o bebé), por quem são ambos responsáveis (Figueiredo & Lamela, 2014).

Reavaliar e reconstruir a relação com/entre os filhos é a sétima tarefa, atribuída em particular às mães e aos pais que transitam para uma segunda ou posterior parentalidade. Os

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7 pais precisarão de reenquadrar as relações entre eles em função do bebé e ainda de reenquadrar a sua relação com os outros filhos e entre os outros filhos, em direção a criarem um espaço para receber o bebé (Demick, 2002). A necessidade de realizar esta tarefa suplementar deixa entender a presença de várias dificuldades na transição para a parentalidade dos pais que já têm filhos (e.g., Figueiredo & Conde, 2011).

As características atribuídas ao bebé durante a gravidez são, na sua maioria, configurações idealizadas que nos informam da presença de um bebé imaginário (Ammaniti et al., 1992). Aquelas características permitem que os pais possam lidar melhor com as dificuldades e incentivam a sua motivação durante a gestação do bebé. Aceitar o bebé como pessoa “separada” e com características próprias, a oitava tarefa, informa-nos da presença de um bebé real (Vizziello et al., 1993). Esta tarefa requer considerar e aceitar as características próprias do bebé, independentemente das expetativas dos pais, e incluindo os mais diversos aspetos, como o sexo, as semelhanças físicas e o temperamento, entre outros (Fox et al., 2000).

A nona e última tarefa a realizar na transição para a parentalidade revela-se no exercício da parentalidade manifestado durante a gravidez, do qual se vai originar a boa resolução da sequência das tarefas da transição para a parentalidade (Figueiredo, 2021).

Assim sendo, a transição para a parentalidade é uma complexa transição individual, conjugal e familiar agregada a um conjunto de mudanças biológicas, psicológicas e socioculturais, no processo de os pais se tornarem e agirem enquanto pais (Figueiredo, 2013;

2014). Vista deste modo, a transição é um conjunto de mudanças psicológicas que derivam da concretização das respetivas tarefas da transição para a parentalidade manifestadas a diversos níveis do funcionamento individual, conjugal e familiar possibilitando a prestação de cuidados adequados ao bebé; quer dizer, uma parentalidade adequada (Figueiredo, 2021).

1.3.1. Tornar-se mãe

A maternidade é uma construção psicológica e sociocultural complexa, vista como um processo dinâmico inerente a várias dificuldades. Algumas destas referem-se ao nascimento, e outras são ocasionadas por situações de vulnerabilidade (pobreza, violência, doenças da mãe ou do filho, etc.) (Zittoun, 2015). Segundo Borges e Bastos (2011), a maternidade pode ser compreendida como o resultado da interação entre duas dimensões psicológicas: uma relacional

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8 – a mulher já é, ou vai ser, a mãe de alguém, e outra autónoma – que diz respeito ao impacto pessoal da maternidade na vida da mulher.

Tornar-se mãe ou pai implica a existência de um outro com quem uma relação de parentalidade se estabelece. Nesta relação ocorre uma forma particular de posicionamento do self na interação com o outro, onde condições específicas de simetria são inauguradas e se transformam ao longo da construção do relacionamento (Bastos & Almeida, 2015).

Duarte e Gonçalves (2007, 2011) referem que o conhecimento da transição para a maternidade constituir uma tarefa desafiadora implica muitas nuances emocionais, afetivas e sociais. Sendo assim, a visão cultural desse evento de vida salienta o elemento de realização pessoal da natureza feminina a que a experiência da maternidade conduz. Os sentimentos maternos têm origens biológicas e psicossociais. Algumas destas são elaboradas pelas mulheres, desde os seus primeiros anos de vida, constituindo uma disposição psicológica que servirá de base para o desenvolvimento de uma capacidade e predisposição para cuidar dos outros (Tenorio, 2011).

A transição para a maternidade implica a construção de uma nova identidade materna, envolvendo ainda uma necessária reorganização e acomodação das posições de identidade prévias que constituem o repertório pessoal de cada mulher, sendo caracterizada por uma interação constante entre diferentes, e algumas vezes exigentes, posições de identidade (Duarte

& Gonçalves, 2007, 2011). Tornar-se mãe pode ser visto como um processo contínuo e não linear de aprendizagem, com o emergir de uma diversidade de significados e sentidos, criando um campo semiótico carregado de afeto e ambivalências (Juarez, 2015, citado por Nunes, 2019).

Abbey e Valsiner (2005) definem ambivalência como a vivência simultânea de vetores opostos, com o emergir da ideia de múltiplas trajetórias, representadas pelo que é no momento e as possibilidades do que poderá vir a ser. Takei (2015) refere que esse conceito está presente na vivência da maternidade, pois a todo o instante as mães necessitam de tomar decisões sobre os caminhos a seguir, selecionando sugestões sociais, escolhendo seguir orientações médicas ou familiares, decidindo o tipo de parto e a melhor forma de cuidar do bebé. A incerteza inerente à maternidade e os discursos sociais, segundo a autora, funcionam como fontes de informação e, ainda, como guias macro de práticas e do que se constituiu como o “ser mãe".

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9 Tornar-se mãe pode ser experimentado e compreendido como um tipo de rutura ou descontinuidade (Valsiner, 2014) na vida da mulher. Para muitas mulheres, a maternidade é um dos maiores eventos da vida, caracterizado como uma rutura lenta e gradual, mas significativa, com a vida anteriormente conhecida. Assim sendo, é compreendida como uma transição que requisita ajustamentos às novas atividades, reproduzindo mudanças e continuidades na dinâmica do self (Okamoto, 2015). Como tal, a maternidade é um processo que requer a reconciliação de experiências passadas, presentes e futuras, dando significado aos vários acontecimentos que nela emergem, e integrando-os no curso de vida atual (Bastos, 2017).

1.4. Gemelaridade

1.4.1. Gestação múltipla

Os gémeos dizigóticos ou fraternos derivam da fecundação de dois óvulos por dois espermatozóides (constituem dois terços das gestações gemelares), podendo ser ou não do mesmo sexo e com semelhanças entre si equivalentes às dos irmãos não-gémeos. Os gémeos monozigóticos ou idênticos (constituem um terço das gestações) derivam da fecundação de um óvulo por um espermatozóide, originando um zigoto que sofre divisão em fase precoce, resultando em dois ou mais embriões que são do mesmo sexo, possuem genótipos iguais (da Silva et al., 2003) e, além disso, evidenciam fenótipos extremamente semelhantes.

As taxas de gemelaridade tiveram um grande aumento nas últimas três décadas, devido às gestações em idade materna avançada e uso das técnicas de reprodução assistida, incluindo tanto o uso de drogas indutoras da ovulação bem como da fertilização in vitro com transferência de embriões (Eriksson & Fellman, 2007).

O estudo da gemelaridade é especialmente motivado pela correlação positiva entre este tipo de gestação e altas taxas de morbi-mortalidade maternas e perinatais (Corsello & Piro, 2010). Neste tipo de gestação, ocorre um predomínio de morbi-mortalidade perinatal de 3 a 7 vezes mais elevada comparativamente com a gestação única (Hack et al., 2008). A gestação múltipla está relacionada a taxas significativamente maiores de doenças gestacionais maternas quando comparada à gestação com feto único. Doenças como hiperemesis gravidarum, anemia, aborto, síndromes hipertensivas gestacionais e as suas complicações são mais frequentes nas gestações múltiplas (Schwartz et al., 1999; Conde-Agudelo et al., 2000; Ananth et al., 2001;

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10 Ananth et al., 2003; Campbell & Templeton, 2004; Salihu et al., 2005; Catov et al., 2007;

ACOG, 2014; Santana et al., 2016, citado por Coltro, 2017).

O aumento de este tipo de gestação trouxe repercussões na taxa de prematuridade (nascimentos com idade gestacional inferior a 37 semanas) que atinge cerca de 60% das gestações gemelares, sendo que 12% dos gémeos nascem muito prematuros, isto é, com menos de 32 semanas de gestação (Lutz et al., 2012). Os recém-nascidos gémeos têm maiores riscos de morbidade e mortalidade (cerca de 15% da mortalidade perinatal) quando comparados com bebés únicos (Tul et al., 2013). No que se refere à finalização da gestação, verificam-se taxas de cesarianas mais elevadas nas gestações múltiplas do que em gestação única (Conde-Agudelo et al., 2000; Campbell & Templeton, 2004; ACOG, 2014; Santana et al., 2016, citado por Coltro, 2017). As gestações múltiplas são consideradas de risco, pela sua frequência de término prematuro e pelas mais frequentes necessidades de interrupção por cesariana. As mães caracterizadas por estas circunstâncias estarão expostas a maiores riscos cirúrgicos, hemorrágicos, de consumo de anestésicos e outros (da Silva et al., 2003).

O luto após a perda de um gémeo, consequência materna predominante em todas as gestações com desfechos negativos, é um choque profundo vivido pelos pais que acarreta impacto durante toda a vida do casal (Meaney et al., 2017). Segundo estes autores, após um diagnóstico pré-natal de anormalidade fetal e mortalidade elevada, evidencia-se uma clara ausência de preparação parental para se lidar com a informação em causa e com o prognóstico.

Verificou-se a tentativa, por parte dos profissionais de saúde, de mudança de foco da experiência traumática dos pais para o cuidado e concentração no bebé sobrevivente, propondo, um adiamento do luto por meses ou anos (Richards et al., 2015). Como tal, segundo estes autores, será essencial a existência de muitos e adequados serviços de apoio psicológico para estes pais que perdem um filho conseguirem lidar com as necessidades complexas que os afetam.

É de extrema importância uma maior atenção clínica a estas gestantes, pois a pré- eclâmpsia e a eclâmpsia estão associadas a um maior risco de morte materna frequentes neste tipo de gestação (Santana et al., 2016). As complicações fetais mais recorrentes são o crescimento discordante (entre os dois fetos), baixo peso ao nascer e morte fetal. O baixo peso (1500 g-2500 g) e o muito baixo peso (< 1500 g) também foram descritos como episódios frequentes em gestações gemelares, estando correlacionados com o crescimento discordante, a

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11 prematuridade e a hipertensão materna (Neves, 2017; Filho et al., 2015; Nunes et al., 2016;

Proctor et al., 2018; Hayes-Ryan et al., 2019; Santana et al., 2018, citado por Caçapava et al., 2021). Outro estudo verificou, ainda, o aumento de casos de morte fetal em gestações gemelares que não foram resultado de uma fertilização in vitro (Guilbaud et al., 2017).

É de salientar e verifica-se que existe uma maior frequência de complicações maternas e fetais em gestações gemelares, além de taxas elevadas de complicações em relação a gestações únicas (Caçapava et al., 2021).

1.4.2. Desafios psicológicos e práticos

Uma circunstância geradora de muitos conflitos e tensões no self é o nascimento de filhos gémeos, que impõe à mãe decisões sobre como dividir a atenção e cuidados entre dois filhos recém-nascidos, com o acréscimo de dificuldade no caso de estes necessitarem de tratamento especial devido à prematuridade (Beer et al., 2013; Glazebrook et al., 2004;

Goldberg et al., 1986; Lutz et al., 2012; Taubman-Ben-Ari et al., 2010, citado por Nunes, 2019).

Adaptar-se à vida familiar e cuidar de dois recém-nascidos que, por sua vez, podem ter nascido prematuramente, é uma transição que trará muitos desafios psicológicos e práticos para os pais e as suas famílias (Harvey et al., 2014). Apesar do nascimento, incluindo de gémeos, ser visto como um evento feliz, em vez de um evento traumático, esta situação compartilha vários aspetos das experiências de vida negativas, originando um questionamento das crenças básicas sobre a competência pessoal do indivíduo, sobre a vida e sobre o futuro. Muito tem sido estudado sobre o stress e a dificuldade inerentes ao nascimento de um filho mas, menos foi estudado sobre os efeitos da maior sobrecarga relativa à maternidade de gémeos pré-termo.

Ainda menos frequentes são os estudos que investigam as consequências potencialmente positivas de esta experiência única (Taubman-Ben-Ari et al., 2010).

São escassas as orientações baseadas em evidências quanto ao cuidado e apoio às famílias com gémeos, para profissionais que lidam com essa população a longo prazo. Os autores referem ser escasso o que se sabe sobre as necessidades de cuidado social de pais de gémeos (Harvey et al., 2014).

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12 A exigência para com a mulher de assumir novos papéis, por vezes, diminuindo ou deixando de desempenhar outros e impondo uma reorganização do sistema familiar, advém com a chegada de um novo membro na família (dependente). Assim, adaptar a vida familiar aos cuidados a oferecer a dois recém-nascidos pré-termo é uma transição que costuma apresentar muitos desafios psicológicos e práticos para os pais e suas famílias (Harvey et al., 2014). Será, por sua vez, essencial o apoio social para uma adaptação saudável a este novo acontecimento, onde o apoio do cônjuge/companheiro é considerado pelas mães como o mais importante, seguido do apoio das suas próprias mães (Dessen & Braz, 2000; Rapoport, 2003).

Isaacs e Andipatin (2020) afirmam que este período pode fomentar a vulnerabilidade psicológica da mulher, essencialmente se esta experienciar ou tiver vivido uma gravidez de alto risco, surgindo um conjunto de problemas emocionais como medo, culpa, choque, luto, frustração, preocupação, solidão e isolamento. Existindo uma ameaça à saúde durante a gravidez, as mulheres tornam-se mais vulneráveis ao sofrimento psicológico. O próprio rótulo de gravidez de “alto risco” está associado a maior sofrimento.

As mulheres grávidas, ao serem notificadas sobre a gestação gemelar, exercem de forma inconsciente uma atitude face aos dois futuros bebés, como se eles fossem um só. Reflexos de esta atitude podem ser observados na maneira de vestir, no quarto único, no corte do cabelo, nos mesmos brinquedos e nos nomes escolhidos frequentemente semelhantes. Estes aspetos, possivelmente, transmitem a dificuldade em discriminar a dualidade dos(as) filhos(as). Neste sentido a similitude pré-existente de um ponto de vista físico, aparentemente, ganha força na forma como os dois bebés são cuidados individualmente pela mãe (Jabbour & Marques, 2000).

Jabbour e Marques (2000) comprovaram que a escolha da família no conservar da similaridade entre os bebés está intimamente ligada com o seu receio de que ambos se sintam menos valorizados em relação ao outro. Consideram que, se não se relacionarem com os(as) seus(suas) filhos(as) de forma idêntica, irão induzir uma competição entre eles, na busca pela conquista daquilo que o outro possui.

No que diz respeito ao nome próprio, verifica-se uma forma de identificação, para que o sujeito possa ser distinguido face a um conjunto. Na gemelaridade, é comum os progenitores escolherem nomes semelhantes para os seus bebés, percecionando-se aqui mais uma maneira de perda da própria identidade; com isto, percebem os(as) seus(suas) filhos(as) como

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13 possuidores de uma identidade única. Inconscientemente, consideram adequados os nomes serem parecidos, já que nasceram juntos e viveram em conjunto experiências quotidianas similares (Jabbour & Marques, 2000).

O autor Plank (1964), citado por Dorneles e Schimdt (2015) estudou a relação dos nomes de gémeos e percebeu que aqueles podem ser considerados de três formas diferentes.

Em 62% dos casos, foram observados nomes que se iniciam sempre com a mesma letra. A segunda forma mais escolhida (com 17%) ocorre quando as letras iniciais diferem mas a forma de pronúncia e o som são muito próximos. A terceira alternativa, com 21% dos casos, refere-se a nomes de gémeos que podem ser considerados diferentes, isto é, sem nenhuma semelhança.

Dorneles e Schimdt (2015) citam que a psicanalista Piontelli através da ultrassonografia conseguiu identificar a reprodução de diversas interações vivenciadas ao longo da vida intrauterina e reproduzidas pelos irmãos após o nascimento. Em situações de morte de um dos fetos, verificou-se que o bebé sobrevivente ao nascer e ao longo dos primeiros meses de vida apresentava sinais como, ausência de sono, grande agitação e ansiedade, percebidos tanto nas atividades lúdicas, quanto na relação que exercia com sua mãe. Foi possível concluir que a relação de intimidade entre os gémeos inicia-se com enorme intensidade na vida intrauterina.

Assim sendo, a ausência de um deles por morte fetal conduz a problemáticas para o bebé que não conseguirá elaborar o luto sozinho, vivenciando uma dor e temores relativos à ausência de sinais compatíveis com a vivência intrauterina (Caron, 2000).

Numa pesquisa observacional e qualitativa realizada com gémeos dizigóticos e as suas mães, identificaram-se questões relevantes sobre a relação mãe-bebés gémeos. Verificou-se que a notícia sobre a gravidez gemelar provocou nestas mães sintomas de ansiedade e medo, pela tamanha complexidade e desafio que enfrentariam. Contudo, nos primeiros meses dos bebés, com o aparecimento dos resultados do investimento materno, a mãe comprovava estar recompensada e satisfeita com a sua nova estrutura familiar. Salientou-se, nesta investigação, o quanto a qualidade do investimento psíquico dos cuidadores adultos representa no foco principal do desenvolvimento dos bebés durante o seu primeiro ano de vida (Lucion &

Escosteguy, 2011).

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14 1.5. Saúde mental dos pais de gémeos

A condição de vulnerabilidade a doenças ou deficiências físicas e neurocognitivas e, ainda, o risco de morte a que estão submetidos os bebés pré-termo, em especial gémeos pré- termo, comprova a associação entre nascimento pré-termo e distúrbios emocionais significativos, sintomas de depressão e stress nos pais. Os estudos têm verificado que esses sintomas podem diminuir a sensitividade materna para os sinais do bebé, prejudicando a qualidade da interação materno-infantil (Beer et al., 2013).

As mães de gémeos exibem maior nível de tensão, mais sensação de peso, stress e exaustão, bem como maiores taxas de depressão e ansiedade do que as mães de filhos únicos, ademais ao serem significativamente mais propensas a acharem a maternidade difícil e de conseguirem menos prazer com as crianças (Ellison et al., 2005; Olivennes et al., 2005).

Uma revisão da literatura realizada por Andrade, Martins, Angelo e Martinho (2014) sobre saúde mental dos pais de gémeos identificou alguns fatores psicossociais que influenciam essa experiência. A ansiedade pré-natal e a prematuridade apresentaram-se como fatores de risco para o stress e a depressão materna. Segundo Noy, Taubman-Ben-Ari e Kuint (2015), o ser ou não o primeiro filho é um fator que interfere no bem-estar das mães. Verificam-se, em várias investigações, maiores níveis de stress em relação às habilidades maternas em mães primíparas de gémeos. Para além disso, mães de gémeos nascidos prematuramente relataram mais sentimentos negativos em relação aos seus bebés e menor bem-estar comparativamente a mães de apenas um bebé pré-termo (Noy et al., 2015).

Noy et al. (2015) mencionam que estudos recentes identificaram crescimento pessoal entre mães como parte da experiência normal da maternidade e indicaram que menores recursos internos (operacionalizados como os padrões de vinculação) e maiores recursos externos (definidos como a qualidade da relação do casal e apoio da avó materna) contribuem para esse desenvolvimento. Andrade et al. (2014) identificaram que bem-estar pessoal pré-natal, satisfação conjugal antes do nascimento e a existência de suporte funcional, financeiro e conjugal contribuíram para um maior bem-estar das mães de gémeos, funcionando como fatores de proteção contra transtornos mentais.

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15 Segundo Ellison e Hall (2003), a investigação sugere que nascimentos múltiplos resultam em maiores taxas de divórcio e insatisfação conjugal. Contudo, se os casais souberem renegociar os seus papéis e os seus relacionamentos, tal pode levar a um aumento da satisfação e estabilidade conjugal. Um estudo das autoras com mães de gémeos e filhos únicos sugere que a disposição do marido ou companheiro para compartilhar as tarefas domésticas e atividades de cuidados com as crianças pode ser um fator significativo para estabilizar o casamento após o nascimento coincidente de vários filhos.

A investigação de Noy et al. (2015) mostrou que uma boa relação do casal, destacada por uma parentalidade compartilhada, com uma elevada concordância entre o casal em relação à educação e responsabilidades com o filho, está positivamente associada ao crescimento materno. Como as questões parentais são o foco e os principais desafios enfrentados neste período, os investigadores comprovaram que o compartilhamento das novas funções ajuda as mães a superarem as dificuldades de cuidar de recém-nascidos, facilitando o crescimento pessoal. Isso corrobora os estudos de Taubman-Ben-Ari et al. (2010), indicando que, nas situações de stress, as mulheres que possuem mais recursos externos podem expandir a sua perceção de si mesmas e do seu ambiente, vivenciando um crescimento mais significativo.

Existe a necessidade de mães de gémeos obterem informações específicas sobre essa experiência, essencialmente numa vertente mais prática, sendo limitada a existência dessas informações em divulgações científicas e entre os profissionais de saúde. As autoras citam a fala de uma mãe: “Conversar com pessoas que têm um filho de cada vez não responde às minhas perguntas. Quero contato com pais de gémeos” (p. 5). Será essencial incentivar as mulheres gestantes de gémeos a conversarem com outras mulheres que estejam a viver também a mesma experiência ou já tenham passado por ela, ajudando nos seus processos de identificação e sustentando as suas perceções de competência materna (Tchernoukha & Wendland, 2015).

Verifica-se que as mães com uma rede social mais consistente conseguem ter as necessidades emocionais atendidas e, por sua vez, recorrem a mais apoio para si mesmas, contribuindo para uma interação mais sensível com o bebé. Esta capacidade de a mãe responder às necessidades do bebé providencia-lhe uma base segura e este aprende que pode confiar e envolver-se numa relação adequada (Rapoport, 2003).

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16 Alguns autores (Feiring & Lewis, 1978; Kreppner, 1999; Minuchin, 1985; Sroufe &

Fleeson, 1988, citado por Nunes, 2019) revelam que casamentos saudáveis proporcionam mais suporte para os cônjuges, em especial do marido para a esposa, sendo o apoio emocional oferecido pelos pais às mães que mais contribui para o desenvolvimento dos filhos. O pai é um dos membros mais importantes da rede social relativamente ao apoio oferecido à mãe e à família (Dessen & Braz, 2000). Os avós são uma forte referência na transmissão de informações e orientações quanto aos cuidados com o bebé e desempenham uma forte influência na educação e criação dos filhos. Para além disto, são também uma fonte de apoio material e financeiro e muitas vezes os avós auxiliam e assumem a responsabilidade pelos cuidados dos netos (Dessen

& Braz, 2000; Rapoport, 2003).

As redes de apoio social estão cada vez mais reduzidas no que se refere à maternidade, levando a que as mães mais carenciadas fiquem sozinhas nos cuidados com o bebé (Rapoport

& Piccinini, 2006). Nesse sentido, é de extrema importância que o apoio dos profissionais de saúde esteja presente nas famílias em situação de nascimento pré-termo, principalmente, de múltiplos. É importante que estas mães consigam, em conjunto com aqueles cuidadores, identificar a sua rede de apoio e o tipo de suporte que conseguirão receber, ajudando-as a refletir como podem aprimorar e criar a sua rede social de apoio (Vieira et al., 2010).

A vivência da gravidez gemelar requer tanto de recursos internos como externos (Zittoun et al., 2003). Entre estes recursos temos as condições emocionais e os conhecimentos para lidar com os desafios de uma gestação de múltiplos. Este tipo de gestação envolve maiores riscos, o cuidar de mais de um recém-nascido com a possível agravante da prematuridade, e as condições sociais e financeiras exigidas para conseguir sustentar e administrar a logística dos cuidados de dois bebés. É, assim, imprescindível que os preparativos para a chegada de gémeos incluam a obtenção de informações específicas sobre os desafios emocionais e logísticos que essa experiência oferece, incluídos os riscos do nascimento pré-termo e as suas consequências (Lutz et al., 2012; Tul et al., 2013). Evidencia-se a relevância de os pais de múltiplos conseguirem o máximo de informações práticas, psicológicas e intelectuais possíveis, dado que são indispensáveis para lidar saudavelmente com a ansiedade e os conflitos comuns nessa experiência; a procura por estas informações deveria coincidir com o momento da descoberta de gestação múltipla (Malmstrom & Poland, 2004).

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17 Como tal, mães sobrecarregadas, exaustas e adoecidas física, mental, psicológica e emocionalmente terão muito mais dificuldades em ajudar as suas crianças a crescerem e desenvolverem de forma saudável. Esse fornecimento de conhecimentos sobre o que, potencialmente, é mais saudável na construção da relação entre a mãe e seu(s) filho(s) poderá simplificar alguns processos dessa experiência, presenteando recursos importantes para uma mulher que transita por esse caminho de co-construção de uma nova relação consigo mesma e com um novo ser humano (Nunes, 2019).

1.6. Vida emocional e vinculação pré-natal

O bem-estar emocional é vital no decorrer de uma gravidez, pois aquele auxilia na vinculação ao bebé, verificando-se que a desregulação dos afetos, na mulher grávida, trará consequências no desenvolvimento do feto (Sanders, 2008). Segundo Schetter e Tanner (2012), a ansiedade, a depressão e o stress são estados afetivos negativos que potenciam complicações na vivência da gravidez, antecipando o trabalho de parto pré-termo. Como tal, a ansiedade, a depressão e o stress são fatores de risco para a grávida e para o seu bebé, tanto na vinculação como no trabalho de parto (Schetter & Tanner, 2012). Airosa e Silva (2013) comprovaram que, quanto maior a satisfação com a família, amigos, intimidade e atividades sociais, menor serão os sintomas de ansiedade, depressão e stress presentes nas grávidas. Para além disso, no grupo pré-natal, verificaram que, quanto maior a satisfação com as atividades sociais e sobretudo com a família e intimidade, menores seriam os sintomas de ansiedade, depressão e stress presentes neste período gestacional.

A partir da infância, nas experiências com figuras de vinculação significativas, por norma os pais biológicos, desenvolvemos os nossos modelos de vinculação. Essas experiências precoces e os modelos internos contribuirão para formarmos e mantermos relações, com outras pessoas na vida adulta (Bowlby, 1988). Fonseca (2010) invoca que o “vínculo afetivo (...) entre a mãe e o feto, na gestação, é fundamental. (...) tanto a mãe quanto o feto possuem necessidades de adaptação às mudanças (...), a construção do vínculo materno-filial pode contribuir para a satisfação dessas necessidades” (p. 42). A grávida terá hábitos e exibirá a sua alegria através do acariciar da barriga e do falar com o bebé, assinalando a dimensão do cuidado materno-fetal (Alvarenga et al., 2012).

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18 O vínculo materno é a formação de um compromisso emocional que move a mãe a procurar satisfazer as necessidades do filho, desde alimentação e higiene ao carinho e conforto (Maçola, Vale & Carmona, 2010). O vínculo que se institui entre mãe e bebé permite satisfazer carências psíquicas e corporais dele, viabilizando ao bebé, aconchego e segurança. Posto isto, a mãe é a fonte mais segura para a criação das vinculações iniciais da criança que se refletirão, posteriormente, nas suas relações com o meio (Perrelli et al., 2014).

A importância da vinculação pré-natal induz aos progenitores a interiorização precoce do feto, através de certas imagens, expectativas e preocupações, incorporando-a no seio familiar, originando um modelo relacional que será antecessor da relação da tríade pai-mãe- bebé após o nascimento (Piccinini et al., 2009; Righetti et al., 2005, citado por Airosa & Silva, 2013).

Os autores Condon e Corkindale (1997) comprovaram que, quanto menor era a vinculação materna, mais elevados eram os níveis de sintomas depressivos e de ansiedade.

Ainda, Schmidt e Argimon (2009) também salientam que as mulheres com vinculação segura revelam uma vinculação materno-fetal elevada e sintomas depressivos e ansiosos diminutos.

A satisfação conjugal dos homens e das mulheres declina durante a gravidez (Belsky et al., 1985; Parke, 1996), havendo pequena relação com o número de filhos e constituindo um fator importante na vinculação pré-natal dos pais ao feto. No estudo de White, Wilson, Ellander e Persson (1999), verificou-se que as mães aguardando pelo segundo filho apresentavam mais conflitos na família, comparativamente a mães de primeira vez. Depois de o segundo filho nascer, as famílias “mobilizavam-se” numa desorganização familiar, potenciando o risco de uma vinculação pré-natal mal sucedida ao próximo bebé. Verificou-se nas mulheres, o declínio com a satisfação conjugal, sendo este linear e superior, mantendo-se ao longo dos primeiros dois anos (Parke, 1996). No que diz respeito ao momento da gravidez, as mulheres encontram- se mais satisfeitas com a conjugalidade do que os seus maridos/companheiros, mas as diferenças não são significativas (Camarneiro & Justo, 2012).

A preocupação com a conjugalidade durante a gravidez prende-se com a influência que esta pode ter nas vinculações futuras da criança. Isabella e Belsky (1985) mencionam que a satisfação conjugal positiva durante a gravidez do primeiro filho induz o nascimento de bebés que terão padrões de vinculação seguros no fim do primeiro ano de idade. As mães de crianças

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19 com vinculação insegura, um ano após o parto, experienciam uma diminuição nos aspetos positivos do casamento e um aumento dos seus aspetos negativos, em comparação com as mães de bebés que estabelecem vinculações seguras. Concebe-se que os responsáveis pelo aumento de esta vinculação dos progenitores ao feto são a excitação, o orgulho e o efeito da novidade (Lorensen et al., 2004).

A satisfação conjugal e as suas dimensões (funcionamento conjugal, amor e zonas focadas no casal, no próprio e no outro) diminuem com o nascimento dos filhos. A chegada de um filho ou mais, no casamento, irá trazer mudanças relativamente à natureza dos vínculos, acarretando desafios desenvolvimentais para ambos os membros do casal (Isabella & Belsky, 1985). Segundo White et al. (1999), existe um aumento da conflitualidade em famílias que aguardam pelo segundo filho. Apesar de não se registarem diferenças quanto ao interesse sexual, as mães de múltiplos tiveram com menos frequência atividade sexual (Olivennes et al., 2005).

Numa investigação de Lorensen et al. (2004), verificou-se que as multíparas tinham mais sintomas depressivos no período pré-natal do que as primíparas. No que se refere aos homens, comprovou-se que os futuros pais pela primeira vez têm menos ansiedade do que aqueles que já têm filhos, mas a diferença não é estatisticamente significativa (Condon &

Esuvaranathan, 1990). Posto isto, a intensidade da preocupação e a vinculação pré-natal global são significativamente superiores nas primigestas em relação às multigestas, mas a qualidade da vinculação materna é semelhante nos dois grupos de grávidas, atuando como área de proteção dos segundos bebés (Camarneiro & Justo, 2012). Segundo o estudo de Camarneiro e Justo (2012), conclui-se que a satisfação conjugal de homens e mulheres é superior na primeira gravidez. Para além disso, a qualidade da vinculação materna e paterna não é diferente de acordo com a quantidade de filhos.

A gemelaridade pode trazer ao subsistema familiar múltiplas vulnerabilidades e dificuldades ao nível da gestão diária, com a sobrecarga de trabalho na realização repetitiva de rotinas familiares e consequente privação de horas de sono, tendo sido estes alguns dos fatores stressores identificados em famílias de gémeos (Ellison & Hall, 2003).

Os nascimentos múltiplos aumentam as necessidades económicas das famílias (Ellison

& Hall, 2003; Ellison et al., 2005), verificando-se uma percentagem de mulheres de famílias de

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20 gémeos com trabalho remunerado inferior comparativamente a outras mães. Metade das mães de gémeos não regressam aos seus empregos (um ano após o parto), enquanto as outras mães trabalham, cerca de vinte horas semanais. Como tal, a situação económica das famílias de gémeos agrava-se e, para além disso, afeta o estatuto social que para algumas mães irá influenciar a sua saúde mental (Glazebrook et al., 2004). O desistir da sua profissão e carreira para algumas mães significa perder parte da sua identidade e independência (Ellison & Hall, 2003).

Com isto tudo, alguns autores (Colpin et al., 2000; Bryan, 2002) defendem a importância de os casais com filhos gémeos de receberem informação específica e de suporte, para se sentirem preparados e capazes no cuidado dos gémeos, recomendando aconselhamento e orientação pré-natal. Para além disto, as mães de gémeos deveriam ter a oportunidade de usufruírem da discussão sobre as suas experiências pessoais e sentimentos com os profissionais.

Estes deveriam ter consciência das adversidades experienciadas por estes pais e, também, dar a conhecer novas estratégias a adotar (Damato, 2005). Como tal, estes cuidados dirigidos às famílias de gémeos deviam iniciar-se no momento do diagnóstico (Rodrigues et al., 2006). O acompanhamento dos pais de gémeos deve ser garantido por profissionais de saúde especializados, durante a gravidez e após o nascimento, neste contexto familiar. É notória a extrema relevância de conhecer os problemas das famílias com gémeos, de modo a assegurar um apoio preciso às suas necessidades (Garel et al., 2006).

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21 2. Problema de Investigação, Objetivos e Hipóteses Gerais

2.1. Problema de Investigação

A presente investigação pretende responder à seguinte questão relativamente à gravidez gemelar “Quais os fatores que afetam psicologicamente as grávidas multigestas durante a sua vivência da gravidez gemelar?”.

2.2. Relevância do Problema de Investigação

Existem fatores que afetam psicologicamente uma grávida durante uma gravidez múltipla. A reação ao diagnóstico de gravidez múltipla e o nível de satisfação conjugal poderão levar a maiores níveis de ansiedade, depressão e stress durante a gravidez. Será fundamental investigar e intervir sobre a reação ao diagnóstico de gravidez múltipla, esperada ou inesperada, permitindo assegurar um melhor acompanhamento e apoio social da grávida em conjunto com a satisfação conjugal que contribuirá para esse mesmo suporte. Do mesmo modo, a diminuição da saúde mental da grávida pode contribuir para potenciar os riscos associados a este tipo de gravidez e, ainda, afetar a vinculação pré-natal materna.

2.3. Objetivo de Investigação

O objetivo de esta investigação é determinar como é que na gravidez gemelar se articulam a satisfação conjugal, os estados emocionais negativos (depressão, ansiedade e stress) e a vinculação pré-natal materna.

2.4. Hipóteses Gerais

HG1: A satisfação conjugal dá um contributo significativo para explicar a variância da depressão, da ansiedade e do stress vividos na gravidez gemelar.

HG2: A satisfação conjugal dá um contributo significativo para explicar a variância da vinculação pré-natal materna durante a gravidez gemelar.

HG3: A depressão, a ansiedade e o stress desempenham um papel mediador na relação entre a satisfação conjugal e a vinculação pré-natal na gravidez gemelar.

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22 3. Metodologia

3.1. Definição de Variáveis

Em HG1, a variável independente é a satisfação conjugal e as variáveis dependentes são a depressão, a ansiedade e o stress. Em HG2, a variável independente é a satisfação conjugal e a variável dependente é a vinculação pré-natal materna. Em HG3, as variáveis mediadoras são a depressão, a ansiedade e o stress na relação entre a satisfação conjugal e a vinculação pré- natal materna. As variáveis a controlar dizem respeito aos aspetos sociodemográficos e clínicos que caraterizam as participantes da amostra.

3.2. Operacionalização de Variáveis

3.2.1. Questionário Sociodemográfico e Clínico

O Questionário Sociodemográfico e Clínico (Anexo II) foi elaborado para caracterizar a amostra em estudo, sendo recolhidos dados pessoais e clínicos referentes à gravidez.

As variáveis sociodemográficas tidas em conta foram as seguintes: data de nascimento (dd/mm/aa); nacionalidade; escolaridade (número de anos de estudo com sucesso); profissão;

estatuto ocupacional/laboral (estudante / doméstica / desempregada / empregada por conta própria / empregada por conta de outrem / outro); principal fonte de rendimento familiar (fortuna herdada ou adquirida / lucros de empresa / vencimento mensal fixo / vencimento variável (por semana, horas ou tarefa) / pensões); conforto do alojamento (casa ou andar luxuoso, enorme, com máximo conforto / casa ou andar espaçoso e confortável / casa ou andar modesto, bom estado de conservação com cozinha e casa de banho / casa ou andar modesto a necessitar de remodelação ou obras de recuperação / casa, andar, quarto sem conforto); aspeto do bairro onde habita (bairro residencial elegante, caro / bairro residencial bom, confortável / ruas comerciais, ruas estreitas e antigas / bairro populoso, sem vista desafogada / bairro social);

estatuto conjugal (solteira / casada / divorciada / união de facto / viúva / outro); anos de vida conjugal.

As variáveis clínicas abordadas foram as seguintes: tempo de gestação (em semanas);

gravidez planeada (sim / não); gravidez desejada (sim / não); caso a gravidez não tenha sido espontânea, precisou de ajuda médica para engravidar (sim / não); se sim, qual/quais as técnicas que foram utilizadas; no total, quantas vezes esteve grávida; número total de filhos; alguma vez

Referências

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