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FUNDAMENTOS E CURRÍCULO DA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS

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Academic year: 2022

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CURRÍCULO DA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS

Autoria: Lucimar de Almeida Melo Arruda

Indaial - 2021 UNIASSELVI-PÓS

1ª Edição

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CENTRO UNIVERSITÁRIO LEONARDO DA VINCI Rodovia BR 470, Km 71, no 1.040, Bairro Benedito

Cx. P. 191 - 89.130-000 – INDAIAL/SC Fone Fax: (47) 3281-9000/3281-9090

Copyright © UNIASSELVI 2021

Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri UNIASSELVI – Indaial.

A779f

Arruda, Lucimar de Almeida Melo

Fundamentos e currículo da educação de jovens e adultos. / Lucimar de Almeida Melo Arruda – Indaial: UNIASSELVI, 2021.

148 p.; il.

ISBN 978-65-5646-424-4 ISBN Digital 978-65-5646-425-1

1. Educação de adultos. - Brasil. 2. Educação do adolescente.

– Brasil. II. Centro Universitário Leonardo da Vinci.

CDD 370

Reitor: Prof. Hermínio Kloch

Diretor UNIASSELVI-PÓS: Prof. Carlos Fabiano Fistarol Equipe Multidisciplinar da Pós-Graduação EAD:

Carlos Fabiano Fistarol

Ilana Gunilda Gerber Cavichioli Norberto Siegel

Julia dos Santos Ariana Monique Dalri Jairo Martins

Marcio Kisner Marcelo Bucci

Revisão Gramatical: Equipe Produção de Materiais Diagramação e Capa:

Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI

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APRESENTAÇÃO ...5

CAPÍTULO 1

A Trajetória Histórica da Educação de Jovens E Adultos no Brasil A Partir da Segunda Metade do Século Xx: Campanhas, Programas

Governamentais e Movimentos Populares ... 7

CAPÍTULO 2

Ampliação Democrática Dos Direitos Humanos e Suas Consequências Para As Legislações e

Políticas Públicas Que Amparam a Modalidade da EJA ... 53

CAPÍTULO 3

O Currículo da EJA: Pressupostos Teóricos,

Metodológicos e a Avaliação ... 99

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Para os profissionais da educação, independentemente do Nível, Etapa ou Modalidade de atuação, é imprescindível conhecer as ideias, as práticas pedagó- gicas e a evolução destas em seu percurso histórico para que se possa entender com mais clareza os desafios e as possibilidades do tempo presente.

No contexto atual da Educação Básica Nacional, uma das questões mais desafiadoras para os professores é atuar em alguma das diferentes modalidades que integram o Ensino Fundamental. De acordo com os pesquisadores em edu- cação, uma das principais lacunas deixadas na formação inicial dos novos pro- fessores pelos cursos de Pedagogia no Brasil é não abranger os conteúdos das diferentes modalidades devido às especificidades de cada uma, cuja amplitude não possibilita uma abordagem mais aprofundada na formação inicial.

Quando os temas de algumas modalidades são contemplados, a aborda- gem é sempre muito superficial, sem a devida preparação para lidar com a com- plexidade e com os muitos desafios que compõem as peculiaridades de cada modalidade. Dessa forma, os professores que atuam ou pretendem atuar nesta área da educação básica necessitam adquirir os conhecimentos específicos da modalidade que pretendem atuar em cursos de Especialização.

Em relação à modalidade da Educação de Jovens e Adultos, segundo as lite- raturas que abordam o tema, os desafios são muitos, começando pela diversidade que caracteriza o perfil dos educandos da EJA no contexto brasileiro, nas diferentes etapas da educação Básica nacional, perpassando pelas questões curriculares e metodológicas as quais ainda estão distantes das necessidades educativas destes alunos no sentido de mobilizar eficientemente seus processos cognitivos e contem- plar o mais amplamente possível seus interesses de aprendizagem.

De acordo com a Teoria Histórico Cultural, cada fase do desenvolvimento humano é marcada por uma atividade principal, na qual ocorrem as aprendi- zagens significativas e o desenvolvimento. Na infância, a atividade central é o brincar, na adolescência o estudo e, na fase adulta, o trabalho. Na perspectiva desta abordagem teórica, têm-se as metodologias de letramento e alfabetiza- ção, abrangendo etapas posteriores da escolarização dos educandos da EJA, diferentes das que são utilizadas no trabalho pedagógico com as crianças. Con- tudo, embora os profissionais tenham conhecimento deste fato, na maioria das vezes são estes saberes, de sua formação inicial, que ainda predominam em seu trabalho com educandos da EJA.

Paulo Freire é uma das maiores referências sobre alfabetização e educação de jovens e adultos no contexto brasileiro e também internacional, ele propôs a ca- tegoria trabalho e as relações desta com a cultura e com a política na centralidade de sua proposta político-pedagógica. Na década de 1960, Freire obteve grandes êxitos na alfabetização de trabalhadores rurais, alfabetizando-os em apenas 40 ho-

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ras. Mesmo após a interrupção dos seus trabalhos no Brasil em 1964, seu método inovador seguiu em outros países do mundo com a mesma relevância e eficiência, permanecendo, ainda, nas duas primeiras décadas do século XXI como um dos re- ferenciais teóricos mais lidos e utilizados na educação de jovens e adultos.

No decorrer deste livro conheceremos os principais programas e movimentos de educação e alfabetização de jovens e adultos que sucederam os trabalhos de Paulo Freire no Brasil – denominado Método Paulo Freire, não expressam a to- talidade de suas concepções político-pedagógicas, assim pode se dizer que são muito mais resultados de interpretações e tentativas de adaptação do pensamen- to deste autor do que propriamente sua proposta educativa.

Refletir sobre os diferentes aspectos que envolvem as questões relacionadas à modalidade da EJA no Brasil a partir da segunda metade do século XX até os dias atuais, assim como examinar os Fundamentos Legais e Teóricos que esta modalidade da Educação Básica Nacional é o objetivo central deste livro o qual compõe a Ementa da Disciplina Fundamentos e Currículo da Educação de Jovens e Adultos no Programa de Pós-Graduação Lato Sensu da Uniasselvi.

Este trabalho está organizado em três capítulos que abrangem o estudo da transformação das ideias e das práticas referentes ao ensino, à aprendizagem e à organização curricular da modalidade EJA em seu percurso histórico no Brasil no decorrer da segunda metade do século XX até os dias atuais. Buscamos atra- vés de uma revisitação histórica ampliar a compreensão dos principais fatores envolvidos no surgimento desta modalidade, das perspectivas atuais e futuras em relação às especificidades e aos fundamentos que perpassam sua organização curricular e suas formas de avaliação.

O primeiro capítulo é composto de duas seções que examinam fatores socio- econômicos, culturais e políticos que viabilizaram a adesão, implantação e suces- so de alguns programas, campanhas e movimentos da EJA no Brasil a partir da segunda metade do século XX. Destacando-se as especificidades dos movimen- tos de maior proeminência.

Na segunda seção, apresentamos a história das campanhas e os movimen- tos de alfabetização de Jovens e adultos, como: Sirepa, Cruzada ABC, Mobral, Sistema Paulo Freire, Mova, Ação Educativa e Alfabetização Solidária, identifican- do as especificidades e os aspectos comuns entre cada um.

O segundo capítulo também é composto de duas seções, que apresentam as Diretrizes e Legislações, como: Constituição e o EJA. Diretrizes Curriculares para o EJA e o Plano Nacional de Educação e Políticas Públicas de Educação de Jovens e Adultos.

O terceiro capítulo é dividido em três seções que fazem reflexões sobre o currículo da EJA e sua proposta de ensino e aprendizagem e a avaliação, refle- tindo sobre novas possibilidades para esta modalidade educativa no século XXI.

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C APÍTULO 1

A Trajetória Histórica da

Educação de Jovens E Adultos no Brasil A Partir da Segunda

Metade do Século Xx: Campanhas, Programas Governamentais e

Movimentos Populares

A partir da perspectiva do saber fazer, neste capítulo você terá os seguintes objetivos de aprendizagem:

� Apresentar algumas das principais condições históricas no âmbito social, cul- tural, econômico e político do contexto mundial e nacional, e a relação destes acontecimentos com o nascimento da pedagogia e a nova função social da educação escolar.

� Refletir sobre as relações de trabalho e educação da sociedade capitalista a partir do século XIX que impulsionaram o surgimento das campanhas, progra- mas e movimentos de alfabetização e educação de jovens e adultos no Brasil na segunda metade do século XX.

� Apresentar as Propostas de alfabetização e educação de Jovens e Adultos ocorridas no Brasil que foram consideradas de maior proeminência.

� Compreender a especificidade, o sentido e a contribuição dessas formas de realizar educação junto a diferentes sujeitos, grupos e comunidades populares.

� Discorrer sobre os pontos principais do Método Paulo Freire e sua proposta educativa político-pedagógica.

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Fundamentos e Currículo da Educação de Jovens e Adultos

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1 CONTEXTUALIZAÇÃO

Este capítulo é composto de duas seções. A primeira aborda de modo breve alguns acontecimentos econômicos e políticos que estão relacionados ao surgi- mento da modalidade da Educação de Jovens e Adultos (EJA) no contexto da Educação Básica Nacional impulsionada por campanhas, programas e movimen- tos de alfabetização e educação de jovens e adultos ocorridos no Brasil a partir da segunda metade do século XX.

Reflete também sobre as relações entre trabalho e a educação na sociedade capitalista, identificando o contexto no qual surge a Pedagogia como ciência da educação e a nova função social da educação escolar, discorre também sobre a compreensão das principais teorias pedagógicas do século XX em relação às questões da marginalidade e da exclusão social e o papel da educação escolar na superação dessas questões.

Na segunda seção são apresentadas as propostas de alfabetização e edu- cação de jovens e adultos ocorridas no Brasil que foram consideradas de maior proeminência, buscando compreender a especificidade dessas ações, o sentido e a contribuição dessas formas de realizar educação junto a diferentes sujeitos, grupos e comunidades populares.

2 O IMPACTO DA CRISE DO

CAPITALISMO LIBERAL NO INÍCIO DO SÉCULO XX E AS NOVAS

CONFIGURAÇÕES POLÍTICAS OCORRIDAS NOS DIFERENTES PAÍSES DO MUNDO E NO BRASIL

A Educação de Jovens e Adultos (EJA) tem na categoria trabalho e nos con- ceitos a ela relacionados seu eixo articulador central. Este pressuposto é reconhe- cido pelos profissionais da educação, principalmente os que atuam nesta área e também pelos diferentes referenciais Teóricos e Legais que amparam a modalida- de da EJA, no âmbito da Educação Básica Nacional, como iremos constatar no decorrer dos próximos capítulos.

Assim, a relevância de entender melhor as relações de trabalho no contexto da sociedade capitalista frente às diferentes configurações assumidas por este

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Fundamentos e Currículo da Educação de Jovens e Adultos

sistema em seu processo de reprodução histórica. Esta contextualização se faz necessária para que possamos compreender a forma que as mudanças ocorridas no contexto econômico interferem no âmbito da educação escolar, trazendo novas demandas educativas e também a necessidade permanente da educação identi- ficar estes condicionantes a fim de lidar melhor com eles, buscando superá-los.

Saviani (2005) e Aranha (1989) destacam a impossibilidade de compreender a história da Educação Contemporânea sem antes compreender o movimento do capital e a forma que ocorrem as relações de trabalho e da produção da existên- cia humana na sociedade capitalista, pois os reflexos das questões socioeconô- micas estão presentes no âmbito da educação escolar como um dos condicionan- tes mais significativos das ações pedagógicas.

Na concepção da Pedagogia Histórica Crítica, formulada por Saviani (2005), a atuação da escola ultrapassa os aspectos estritamente pedagógicos e tem atrás de si condicionantes sociopolíticos que configuram diferentes concepções de ho- mem e de sociedade com diferentes pressupostos sobre o seu papel social.

A seguir, examinaremos algumas condições históricas do contexto mundial que impeliram a ampliação da escolarização no Brasil e as principais concepções e práticas pedagógicas vigentes na educação escolar básica nacional no século XX.

No Ocidente, desde o século XVI, quando o modo de produção feudal foi gra- dativamente sendo substituído pelo modelo de produção capitalista, ocorreram di- versas transformações nas relações econômicas, sociais, culturais e políticas que culminaram com a instituição definitiva da sociedade capitalista, a qual foi ampa- rada por toda uma estrutura ideológica, política, jurídica, cultural e educativa.

O modo de produção capitalista – em seu percurso histórico, também sofreu muitas transformações, assumindo sempre novas configurações, mas permanece vigente como atual modelo econômico predominante no planeta.

Manacorda (2004) e Aranha (1989) entendem que a consolidação do capita- lismo como novo modelo econômico na Europa já a partir do século XVII impeliu a transferência de grandes contingentes populacionais do campo para a cidade e das oficinas artesanais para as fábricas, fazendo aumentar cada vez mais o nú- mero de crianças e jovens ociosos pelas ruas das cidades.

Aranha (1989) salienta que o fenômeno da crescente urbanização, consequ- ência do capitalismo industrial, na nova forma de organização do trabalho exigia também novas especificidades do homem trabalhador. Por isso, a instrução ten- de, embora lentamente, a universalizar-se e a laicizar-se, mudando destinatários, especialistas, conteúdos e objetivos.

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O novo problema urbano também confere para a educação escolar um novo papel, impelindo, assim, o surgimento da Pedagogia tal como a concebemos hoje.

Anteriormente, a Pedagogia se restringia a uma forma de relação em que o mestre recebia os poucos alunos e o único saber pedagógico verdadeiramente estabelecido consistia em conhecer a matéria a ser ensinada, ou o domínio do conteúdo. A nova realidade, com aumento de crianças de idades diferentes fre- quentando a escola por um tempo mais prolongado, evidencia que ensinar não é fácil e que o mestre tem que enfrentar muitos problemas de disciplina, de mo- tivação e de organização de classe para ensinar os conteúdos. Assim, formula- -se uma nova questão para as instituições escolares: como ensinar grupos de crianças (povo) durante um período contínuo em um dado local, fazendo que elas aprendam mais, mais rápido e melhor?

Conforme Gauthier (2010, p. 13), “ensinar exige a instalação de todo um siste- ma de regras e procedimentos, que devem englobar a totalidade da vida da classe”.

A Pedagogia é entendida por Gauthier (2010) como um discurso e uma prá- tica de ordem que visam contrapor-se a toda forma de desordem na classe, ou Método que rege a totalidade da vida escolar, dos micros acontecimentos aos aspectos mais gerais da chegada dos alunos a sua saída, do primeiro dia do ano escolar ao último.

Desta forma, a nova função social da escola e o nascimento da Pedagogia também se configuram como possibilidades de universalização do ensino.

Para Aranha (1989, p. 153), no contexto do Iluminismo não havia mais sentido atrelar a educação à religião, como faziam as escolas Confessionais, nem aos inte- resses de uma classe, como queria a aristocracia. Assim, a escola deveria ser leiga e livre, ou seja, não religiosa e independente de privilégio de classe. Dessa forma, surgiram algumas ideias, nem todas efetivamente realizadas, tais como: tornar o ensino a cargo do Estado, a obrigatoriedade e a gratuidade do ensino elementar.

O processo de universalização do ensino se inicia já no século XVIII, mas, concretiza-se somente no século XIX devido à crescente participação e interven- ção do Estado.

De acordo com Aranha (1989), as principais características da educação eu- ropeia em meados do século XVIII e início do século XIX foram: universalidade, gratuidade, estatização, laicidade do ensino, reformas educacionais, problemati- zação dos métodos pedagógicos e escolarização da infância.

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Fundamentos e Currículo da Educação de Jovens e Adultos

O caráter central que a escola passa a ter na sociedade moderna decorrente da sua expansão e de seus novos objetivos não visava somente à instrução, mas, à formação do cidadão conhecedor dos seus direitos e cumpridor de seus deve- res – o cidadão patriótico, detentor de uma consciência nacional. Contudo, estes objetivos por si só não suprimiram o caráter segregador do sistema educacional dualista; com uma escola para o povo e outra para a elite.

2.1 TEORIA DA ESCOLA DUALISTA

Essa teoria foi elaborada por C. Baudelot e R. Establet (1971), chamada de

“teoria da escola dualista”, porque os autores se empenham em mostrar que a es- cola, que pese a aparência unitária e unificadora, é uma escola dividida em duas (e não mais do que duas) grandes redes, as quais correspondem à divisão da so- ciedade capitalista em duas classes fundamentais: a burguesia e o proletariado.

Aranha (1989) enfatiza que a educação Nacional desde o século XIX teve como objetivo central a formação do cidadão. No entanto, as mobilizações em prol deste ideário se intensificaram somente no decorrer do século XX, impelidas por acontecimentos de outros países. No continente europeu a substituição da livre concorrência pela formação do capitalismo de monopólios gerou, no início do século XX, grandes disparidades sociais pela excessiva concentração de renda.

Os choques entre as potências imperialistas, decorrentes da colonização, culmi- nam no conflito armado da Primeira Grande Guerra (1914-1918).

Na primeira guerra mundial ocorre a Revolução Russa, em 1917, e é instau- rado o primeiro governo socialista na Rússia inspirado na doutrina marxista.

Após a Primeira Guerra Mundial, 1918, os EUA passaram a ter grande in- fluência econômica na maior parte dos países do mundo, entre os quais o Brasil.

Neste período, a influência dos EUA é marcante até na Europa. Contudo, em 1929 ocorreu a quebra da bolsa de valores em Nova York, o que fez necessário uma nova reorganização política. A quebra da bolsa de valores de Nova York trou- xe falências, retração de mercado e desemprego em massa, causando a pauperi- zação da classe média e aumentando a degradação do proletariado, o que exigiu maior interferência estatal na economia, a qual passou do modelo capitalista libe- ral para o capitalismo de organização.

Entretanto, o clima de insegurança e insatisfação na maior parte dos países do mundo contribuiu para a expansão de ideologias de extrema-direita e extrema- -esquerda. O totalitarismo de extrema-esquerda com o Comunismo implantado

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na União Soviética em 1917 antes do término da primeira Guerra Mundial. Na Europa, o totalitarismo de extrema-direita prospera com o Fascismo e Nazismo.

Uma das proposições centrais do Regime Totalitário do Fascismo e Nazismo era combater o Comunismo implantado na antiga URSS e também o capitalismo Libe- ral. Em 1922, sobre o regime fascista, Mussolini assume o governo da Itália e, em 1933, no regime Nazista, Adolf Hitler assume o governo da Alemanha.

Nos países da América Latina, neste período, ocorreu a ascendência dos sistemas políticos denominados populistas. Segundo Souza (2020), o populismo – situação política experimentada na América Latina entre as décadas de 1930 e 1960, teve como grande contexto propulsor a crise de 1929. Os exemplos de experiência populistas podem ser compreendidos na ascensão dos governos de Juan Domingo Perón (1946-1955/1973-1974), na Argentina; Lázaro Cárdenas (1934-1940), no México; Gustavo Rojas Pinilla (1953-1957), na Colômbia; e Getú- lio Vargas (1930-1945/1951-1954), no Brasil.

Este autor observa que, nessa época, várias das nações latinas, vistas como portadoras de uma economia periférica, viveram uma fase de desenvolvimento econômico seguido pelo crescimento dos centros urbanos e a rearticulação das forças sociais e políticas.

O populismo permitiu a participação política de grupos sociais que historica- mente foram marginalizados das arenas políticas latino-americanas, mas, esse tipo de ação das camadas populares junto ao Estado não pode ser confundida com o exercício da democracia plena, ainda que tenha viabilizado as possibilida- des de crescimento dos movimentos em prol da alfabetização e educação de jo- vens e adultos no contexto brasileiro, os quais se intensificam na década de 1940, atingindo seu apogeu em 1964, pouco antes da implantação da Ditadura Militar.

Nesse período, a educação foi considerada como um fator de segurança na- cional, tendo em vista o alto índice de analfabetismo da população, o qual, se- gundo os documentos da época, em 1945, abrangia aproximadamente 50% dos brasileiros. A estagnação econômica do país também foi relacionada à falta de educação escolar do povo.

2.2 EDUCAÇÃO E TRABALHO:

FORMAS DE RELAÇÕES NA

SOCIEDADE CAPITALISTA

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Fundamentos e Currículo da Educação de Jovens e Adultos

2.2.1 Perspectiva da Pedagogia histórica crítica em relação à educação escolar

A Educação de Jovens e Adultos é concebida como uma modalidade educativa emergente de lacunas do sistema educacional regular, a qual compreende um con- junto muito diverso de processos e práticas formais e informais relacionadas à aquisi- ção ou à ampliação de conhecimentos básicos, de competências técnicas e profissio- nais, ou de habilidades socioculturais (FRIEDRICH; BENITE; PEREIRA, 2010).

Nesse contexto, diversidade e complexidade de situações e ações são os conceitos que melhor definem a modalidade EJA no Brasil no decorrer de sua tra- jetória histórica, a qual se configura como uma mistura entre saberes e conteúdos sistematizados, no âmbito da escola, e de saberes e conteúdos assistemáticos resultantes de interações e aprendizagens em outras instituições socializadoras.

Na ótica destes autores, a educação de jovens e adultos no Brasil estende- -se por quase todos os domínios da vida social, tanto em ambientes escolares quanto em outros espaços de convívio socioculturais e de lazer, instituições re- ligiosas e, nos dias atuais, também com o concurso dos meios de informação e comunicação à distância.

Para Friedrich (2010, p. 389), embora os termos educação de adultos, edu- cação popular, educação comunitária e educação não-formal sejam muitas vezes utilizados como sinônimos, eles não o são. Segundo Brandão (1985, p. 42), a educação de adultos na perspectiva da Cultura Popular significa a busca de uma cultura permanente de uma forma de vida, extensão cultural, atualização, renova- ção e reeducação.

Conforme a UNESCO, a educação de adultos do ponto de vista da Cultura Popular representa o esforço contínuo que todo ser humano deve realizar para compreender o mundo, exprimir sua personalidade e estar à altura de suas res- ponsabilidades como indivíduo e como membro das diversas sociedades às quais pertence. Além disso, a UNESCO entende a educação de adultos como uma es- pecialidade dentro da educação. Em relação à educação popular, Brandão (1984, p.84) a concebe como uma prática que lida, fundamentalmente, com conhecimen- to e, por isso, o conhecimento é sua matéria prima. Este autor entende que não é só a educação que se ocupa com o conhecimento, tampouco ele é produzido somente pela educação: ele nasce e se desenvolve à medida em que as pessoas pensam e refletem sobre a experiência vivida em todas as práticas e para pensar sobre esta experiência não é necessário participar de experiências educativas.

Por isso, a educação popular é uma prática, entre as outras, que reflete so- bre o que está sendo criado, transformado, desenvolvido ou destruído, neste caso especifico, o conhecimento das camadas populares.

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A educação popular objetiva criar tipos de relações em que a reflexão crítica e sistemática das experiências populares retorne a estas próprias experiências e consolide formas de acumulação de poder e exercício de crítica das relações so- ciais que subordinam de diversos modos as classes populares.

No Brasil, o termo educação não-formal acompanha o conceito difundido na América Latina que se dirige à educação de adultos vinculada a organismos não governamentais.

Demerval Saviani (2005, p. 13) caracteriza a educação como uma prática social que se desenvolve no seio da sociedade global, uma atividade humana essencial que consiste no ato de produzir direta e intencionalmente em cada indi- víduo singular a humanidade que é produzida histórica e coletivamente pelo con- junto dos homens. O meio através do qual os indivíduos de cada geração e de cada forma de sociedade incorporam à produção histórica humana desenvolvida ao longo dos tempos.

Mas Saviani estabelece a diferença entre o saber da educação escolar e o saber produzido por outras Instituições socializadoras, tendo em vista que o ato pedagógico de transmissão e apropriação do saber historicamente acumulado pe- las gerações de cada sociedade tem especificidades próprias, as quais são objeto de trabalho da educação escolar.

Para Brandão (1985, p. 25), de campanhas isoladas de alfabetização de emer- gência a projetos amplos de educação e desenvolvimento, os próprios avanços de ideias e métodos desenvolvidos na América Latina, ou traduzidos para cá, amea- çaram tornar a educação de adultos subalternos alguma coisa ao mesmo tempo indispensável, uma conquista irreversível e perigosamente consagradora da legiti- midade de formas de saber institucional serem desigualmente distribuídas.

Em sua obra “Escola e Democracia”, Saviani (2012, p. 3) pontua que segun- do estimativas relativas ao ano de 1970, cerca de 50% dos alunos das escolas primárias desertavam em condições de semi-analfabetismo ou de analfabetismo potencial na maioria dos países da América Latina. Isto sem levar em conta o con- tingente de crianças em idade escolar que sequer tinham acesso à escola e que, portanto, já se encontram a priori marginalizadas dela e que estes dados indicam a realidade da marginalidade relativamente ao fenômeno da escolarização.

Saviani busca entender como as diferentes teorias da educação se posicio- nam em relação ao problema da exclusão e da marginalidade na sociedade do século XX e o papel da educação escolar na superação desta questão. Nesta análise, ele classifica as principais teorias pedagógicas vigentes, em dois grupos, denominando-as de teorias não-críticas da educação e teorias críticas da educa- ção, tais aspectos podem ser notadas no excerto:

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Fundamentos e Currículo da Educação de Jovens e Adultos

Grosso modo, podemos dizer que, no que diz respeito à ques- tão da marginalidade, as teorias educacionais podem ser clas- sificadas em dois grupos. Num primeiro grupo, temos aquelas teorias que entendem ser a educação um instrumento de equa- lização social, portanto, de superação da marginalidade. Num segundo grupo, estão às teorias que entendem ser a educação um instrumento de discriminação social, logo, um fator de mar- ginalização (SAVIANI, 2012, p. 3).

As do primeiro grupo, segundo Saviani, concebem a educação na perspec- tiva da neutralidade sem levar em consideração os condicionantes ideológicos e sociais que influenciam o trabalho pedagógico da escola e as teorias do segundo grupo reduzem a educação escolar à mera reprodutora das condições sociais vi- gentes sem considerar as possibilidades de ultrapassá-las.

[...] enquanto as teorias não-críticas pretendem ingenuamente resolver o problema da marginalidade através da escola sem jamais conseguir êxito, as teorias crítico-reprodutivistas expli- cam a razão do suposto fracasso. Segundo a concepção crí- tico-reprodutivista o aparente fracasso é, na verdade, o êxito da escola; aquilo que se julga ser uma disfunção é, antes, a função própria da escola. Com efeito, sendo um instrumento de reprodução das relações de produção a escola na sociedade capitalista necessariamente reproduz a dominação e explora- ção. Daí, seu caráter segregador e marginalizados Daí, sua natureza seletiva. A impressão que nos fica é que se passou de um poder ilusório para a impotência (SAVIANI, 2012, p. 32-33).

Conforme este autor, em ambos os casos a História é sacrificada. No primei- ro caso, sacrifica-se a História na ideia cuja harmonia pretende anular as contradi- ções do real. No segundo caso, a História é sacrificada na reificação da estrutura social em que as contradições ficam aprisionadas.

Dessa forma, pode-se dizer que ambas as concepções, tanto as das teorias não-críticas da educação quanto as das teorias críticos reprodutivistas não consi- deram a sociedade como produto ou resultado da ação entre os homens. Pois se considerassem a realidade em sua historicidade, ou como produto da ação huma- na, necessariamente teriam que considerar também que os meios que criaram a atual sociedade, ou realidade, são os mesmos que viabilizam sua transformação.

Mediante estas constatações, Saviani cogita a possibilidade de encarar a escola como uma realidade histórica, isto é, suscetível de ser transformada intencional- mente pela ação humana.

Ao constatar a limitada contribuição destas perspectivas teóricas em relação ao seu potencial para lidar com as questões da marginalidade e da evasão escolar, Saviani (2005, p.13) buscou uma terceira alternativa teórica capaz de superar tanto o otimismo ingênuo das teorias não-críticas da educação, quanto o pessimismo das teorias críticas reprodutivistas e propõe uma terceira opção teórica: a pedagogia histórico-crítica, a qual possibilitaria à escola cumprir com seu papel social.

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Conforme Saviani (2005, p. 14), a pedagogia histórico-crítica foi uma respos- ta aos limites das teorias crítico reprodutivistas que explicitam os mecanismos de dominação capitalista presentes na escola pública sob a inculcação ideológica e reprodução das relações de produção capitalistas, bem como pela violência sim- bólica, as quais embora explicitem os condicionantes sociais da educação não vislumbraram saídas, alternativas e propostas práticas para a educação na forma capitalista de produção da existência humana.

A pedagogia histórico-crítica (SAVIANI, 2005, p. 88) procura compreender a questão educacional com base no desenvolvimento histórico objetivo, apresenta uma proposta pedagógica que corresponde aos interesses daqueles que lutam pela transformação da sociedade, pois, entende que a determinação que a escola recebe não é absoluta; há um espaço de ação, embora tênue, em que a educação pode interferir sobre as pessoas e a sociedade, contribuindo para a transforma- ção. Como na sociedade capitalista a escola é a instituição social responsável pela educação das novas gerações, o trabalho pedagógico realizado nesta insti- tuição pode implicar na luta pela superação da atual organização social.

Assim, por meio da utilização das categorias de contradição, historicidade e classe social para a compreensão educação escolar a partir da concepção dialética marxista, Saviani vislumbra uma alternativa pedagógica articulada aos interesses da classe trabalhadora, que embora se sabendo determinada pela or- ganização produtiva, permitisse a professores e alunos agir positivamente sobre os elementos determinantes da instituição escolar através da socialização e apro- priação do saber sistematizado.

Dessa percepção decorrem os principais pressupostos teóricos e práticos que constituem as concepções da pedagogia histórico-crítica, a qual indica que conteúdos, métodos, ações e processos são mais adequados e necessários para alcançar os objetivos delimitados. Para a pedagogia histórico-crítica, a finalidade principal da escola é possibilitar a humanização dos alunos através da socializa- ção e apropriação do saber metódico.

2.2.2 Teorias críticas e Teorias não- críticas da educação

As diferentes concepções pedagógicas da modernidade denominadas conser- vadoras e progressistas que Demerval Saviani (2005) classifica em teorias críticas e teorias não-críticas da educação, modo geral, têm sua origem ou expressam os interesses antagônicos das duas classes sociais da sociedade capitalista, a classe burguesa e a classe proletária, visando a sua superação ou a sua conservação.

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Fundamentos e Currículo da Educação de Jovens e Adultos

Os burgueses detentores dos meios de produção, e os proletários, a maior parte da população, ou composta por aqueles que vendem sua força de trabalho mediante recebimento de salário.

Em sua obra História da Educação, Maria Lúcia Arruda Aranha (1989, p. 170) pontua que as teorias pedagógicas, após a instauração do sistema capitalista a partir do séc. XVI até o séc. XIX, buscavam de um lado justificar e regular a ordem capitalista burguesa que se estabelecia com a política do Liberalismo econômi- co e, de outro lado, condená-la ou reformá-la como propuseram os movimentos Anarquistas e Socialistas.

No ponto de vista de Manacorda (2004 p.299), a expansão das Instituições de ensino a partir do século XVII não eliminou da educação escolar antigas dis- criminações que já faziam parte de uma concepção histórica da cultura Ocidental desde Platão. Embora a escola elementar fosse comum a ambas as classes so- ciais, persiste a continuidade de uma tradição cultural herdada do pensamento de Platão e de sua concepção de educação que preconizava que somente poucos afortunados, os oligói, chegassem aos mais altos graus de instrução, enquanto a maioria, os pollói, fosse dada somente uma instrução de breve duração cujo caráter obrigatório constaria mais no papel do que na realidade. Para este autor, o que ocorreu neste novo contexto foi somente uma variação na intensidade e na forma que a antiga discriminação se apresentou nos diferentes países, em maior ou em menor grau.

[...] A divisão não superada entre instrução desinteressada para “o dizer das coisas da cidade”, isso é, a preparação para as funções da classe dirigente, e a preparação profissional para o fazer produtivo se efetivava na reorganização da es- cola secundária onde ocorria a dicotomia, designando para a elite burguesa a formação clássica e propedêutica, e, para o trabalhadorda indústria e do comércio, o ensino técnico (MA- NACORDA, 2004, p. 299).

Karl Marx (1818-1883) analisou as relações de produção no modo capitalis- ta, por meio do método do materialismo histórico dialético, objetivando entender os conflitos que se apresentavam entre as classes; burguesa e proletária. Suas analises são bastante amplas e complexas, envolvem conceitos diversos como:- mercadoria, valor de troca e valor de uso, mais-valia alienação entre outros, mas, o ponto fundamental do seu pensamento político, o qual é relevante para nossa compreensão das questões da EJA em sua trajetória histórica é a compreensão da categoria trabalho e das formas de relações que o trabalho assume no modo de produção capitalista.

Para Marx, o que diferencia o homem dos demais seres da natureza é o tra- balho, o qual é o resultado ou objetivação de capacidades subjetivas que somente

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os seres humanos possuem. Através do trabalho, o homem interfere na natureza adequando-a de acordo com suas necessidades, ou seja, por meio do trabalho o homem cria as suas próprias condições de vida. Conforme Friedrich Engels, em Dialética da Natureza, a alteração da natureza pelos homens e da não natureza enquanto tal constitui a base mais essencial imediata do pensamento humano.

“A aranha realiza operações que lembram o tecelão, e as caixas suspensas que as abelhas constroem envergonham o trabalho de muitos arquitetos. Mas até mesmo o pior dos arquitetos dife- re, de início, da mais hábil das abelhas, pelo fato de que antes de fazer uma caixa de madeira, ele já a construiu mentalmente.

No final do processo do trabalho, ele obtém um resultado que já existia em sua mente antes de ele começar a construção. O arquiteto não só modifica a forma que lhe foi dada pela nature- za, dentro das restrições impostas pela natureza, como também realiza um plano que Ihe é próprio, defínindo os meios e o ca- ráter da atividade aos quais ele deve subordinar sua vontade.”

(COLE, SCRIBNER, 1991, p. 6 apud MARX).

No processo de objetivar seus pensamentos ao fabricar objetos e coisas que existiam somente no âmbito subjetivo, na imaginação ou idealmente, o homem também se transforma, produz cultura e faz a história.

Entretanto, segundo Marx, no modo de produção capitalista se rompe a in- teração entre pensamento e objetivação que se dá por meio do trabalho, o qual perde seu potencial humanizador passando se constituir no oposto do que deveria ser, ou seja, passa a ser um fator de desumanização do homem e ao invés de promover sua humanização.

O pensamento de Marx influenciou todos os campos do conhecimento, prin- cipalmente o das ciências humanas da economia, sociologia, política, psicologia e educação desde o século XIX, permanecendo relevante para entender as rela- ções sociais, as contradições e a tensão de interesses antagônicos entre as duas classes sociais; a classe burguesa e a classe proletária que o caracterizam.

2.2.3 Trabalho, cultura e educação como processo de humanização

A categoria trabalho aparece no pensamento político-educativo de Paulo Freire e nos conteúdos programáticos escolares da alfabetização de jovens e adultos, com priorização da produção coletiva.

De acordo com Freire (1989, p.14), para compreender uma sociedade é im- portante saber de que modo ela organiza o seu processo produtivo e como se

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Fundamentos e Currículo da Educação de Jovens e Adultos

combinam os meios de produção e a força de trabalho, assim como a natureza das relações sociais que se dão na produção, se são relações de exploração ou se são relações de igualdade e de colaboração entre todos.

Nesse sentido, Freire caracteriza a leitura e a escrita como processos cria- tivos da vocação do homem de Ser mais, assim, estas atividades expressam o pleno sentido do termo trabalho como práxis, ultrapassando procedimentos téc- nicos de codificação e descodificação mecânica e alienada de letras e fonemas e até mesmo de palavras geradoras que não podem ser propostas sem considerar o contexto real das experiências e da realidade dos alfabetizandos e educandos.

Freire entendia que nos países anteriormente colonizados, o processo de re- construção nacional demandava uma visão combinada entre infra e superestrutu- ra. Por isso, ele discutiu o significado do trabalho como processo de transforma- ção da natureza não somente para satisfazer as necessidades humanas básicas, mas também o significado desta categoria como princípio educativo.

Ao caracterizar a alfabetização e o ato de estudar como processos ativos, criativos e revolucionários, as ações são articuladas em torno de um objetivo co- mum, o qual possibilita tanto ao educador quanto aos educandos exercitarem seu potencial criativo, comunicativo e expressivo a partir do desvelamento das rela- ções entre o homem, a cultura e o trabalho.

Nas próximas seções veremos que no contexto geral do pensamento políti- co-pedagógico de Paulo Freire e do seu chamado Método Paulo Freire de Alfa- betização e educação de jovens e adultos, tanto nas ações realizadas no Brasil, a partir da década de 1960 e também na retomada dos trabalhos na década de 1980 e, neste meio tempo, durante seu exílio, em países como: Chile, São Tomé e Príncipe etc. há um objetivo comum que une todos os agentes do processo educativo; a categoria trabalho é pensada como processo de transformação da natureza pelo homem e processo de construção da história e da feitura de uma nova sociedade.

Este é um dos pontos principais de Paulo Freire: um objetivo central em torno do qual todos os agentes são articulados para a ação. O aspecto comum entre a maioria dos países onde o Método Paulo Freire foi aplicado é o de serem países anteriormen- te colonizados e que se encontravam em processo de reconstrução Nacional.

Por exemplo, na República Democrática de São Tomé e Príncipe, na África, a ação política foi a reconstrução nacional na qual todo o país estava envolvido. No Brasil, na década de 1960, o tema central dos trabalhos de Freire foi a construção de uma nova sociedade em que o povo, na condição de alfabetizados, teria parti- cipação inédita na construção da história do país, a começar pela escolha do novo

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presidente da República nas eleições de 1965.

Neste contexto, as ações político-pedagógicas tinham como finalidade o cla- ro objetivo de construção de uma nova sociedade, na qual cada indivíduo con- seguia se ver como participante diretamente envolvido no processo, cujo líder estava alinhado com os demais sujeitos e isso não era algo fictício, um projeto aleatório, mas um projeto que partia de uma realidade extremamente significativa para todos os agentes do processo educativo.

Para os alfabetizandos e educandos jovens e adultos, é importante a com- preensão e a valorização dos saberes de sua realidade social por meio de concei- tos da realidade contextual de cada comunidade educativa onde o trabalho peda- gógico ocorre. Por isso, Freire (1989, p. 34) ressalta a importância de desconstruir a idéia de que somente o saber escolarizado tem valor.

Embora a escola seja a matriz do conhecimento, não significa que o saber produzido fora dela seja inferior, mas deve ser o ponto de partida de qualquer trabalho de educação popular orientado para a criação de um conhecimento mais rigoroso por parte das massas populares. Nesta abordagem, o ato de estudar se refere ao direito que o povo tem de conhecer melhor o que ele já conhece em ra- zão de sua prática e também de conhecer o que eles ainda não conhecem.

Freire destaca que a atividade prática da realidade concreta sempre tem uma dimensão técnica, por isso, também é intelectual, e por mais simples que a ativi- dade prática seja, ela é geradora de saber. Disso, a importância de os educandos compreenderem a relação entre trabalho manual e o trabalho intelectual.

Os homens e as mulheres trabalham, quer dizer, atuam e pen- sam. Trabalham porque fazem muito mais do que o cavalo que puxa o arado a serviço do homem. Trabalham porque se tor- naram capazes de prever, de programar, de dar finalidades ao próprio trabalho. No trabalho, o ser humano usa o corpo inteiro.

Usa as suas mãos e a sua capacidade de pensar. O corpo humano é um corpo consciente. Por isso, está errado separar o que se chama trabalho manual do que se chama trabalho intelectual. (FREIRE 1989, p. 34).

Nesta perspectiva, toma-se consciência que os trabalhadores das fábricas e das roças são intelectuais também. Ainda que na sociedadevigente ocorra o menosprezo das atividades que demandam maior uso das mãos, as quais são consideradas inferiores.

O Ato de estudar enquanto ato curioso do sujeito diante do mundo é expres- são da forma dos seres humanos, como: seres sociais, históricos, seres fazedo- res, transformadores, que não apenas sabem, mas sabem que sabem e trabalham

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Fundamentos e Currículo da Educação de Jovens e Adultos

na construção de uma nova sociedade. Assim, a ação educativa não consiste em entregar ou de transferir às massas populares a explicação rigorosa ou mais rigo- rosa dos fatos como algo acabado, paralisado, pronto, mas contar, estimulando e desafiando, com a capacidade de fazer, de pensar, de saber e de criar das mas- sas populares (FREIRE, 1989, p. 34).

Na nova sociedade a ser criada, a atividade manual e a intelectual não serão separadas, por isso, as escolas serão escolas do trabalho em que os educandos aprenderão, desde cedo, trabalhando. Ninguém trabalhará para estudar e nem ninguém estudará para trabalhar porque todos estudarão ao trabalharem.

Conforme as palavras de Freire (1989, p. 38),

O que é uma sociedade sem exploradores nem explorados?

É a sociedade em que nenhum homem, nenhuma mulher, ne- nhum grupo de pessoas, nenhuma classe explora a força de trabalho dos outros. É a sociedade em que não há privilégios para os que trabalham com a caneta e só obrigações para os que trabalham com as mãos, nas roças e nas fábricas. Todos são trabalhadores a serviço do bem de todos.

Dessa forma, o ideal de construção de uma nova sociedade almejada pela Educação Libertária não é o mesmo que assumir o poder, como foi o caso da sociedade capitalista, na qual a classe burguesa assume o poder econômico e político, adequando todas as instituições sociais de acordo com seus interesses.

[...]“Não foi, por exemplo - costumo sempre dizer -, a educação burguesa a que criou ou enformou a burguesia, mas a bur- guesia que, chegando ao poder, teve o poder de sistematizar a sua educação. Os burgueses, antes da tomada do poder, simplesmente não poderiam esperar da aristocracia no poder que pusesse em prática a educação que lhes interessava. A educação burguesa, por outro lado, começou a se constituir, historicamente, muito antes mesmo da tomada do poder pela burguesia. Sua sistematização e generalização é que só foram viáveis com a burguesia como classe dominante e não mais contestatória” (FREIRE,1989, p.12).

No Projeto de construção da nova sociedade não haverá nem oprimidos e nem opressores, tampouco classes sociais como se tem atualmente.

Estas considerações sobre as diferentes dimensões da categoria trabalho são relevantes para que possamos ter maior clareza dos diversos fatores que estiveram e ainda estão envolvidos na caracterização da modalidade EJA e da realidade contextual na qual ela se originou.

Assim, destacamos o trabalho, como produtor de cultura e o ato educativo como processo de conscientização e humanização articulados em torno de um

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objetivo comum, visando fazer História e assim construir uma nova sociedade por meio da educação, tal como preconizou o educador Paulo Freire em suas concep- ções pedagógicas.

Na próxima seção abordaremos as principais experiências educativas ocorri- das no contexto brasileiro na modalidade EJA a partir da segunda metade do sé- culo XX, que melhor expressaram estas perspectivas educativas, principalmente as experiências decorrentes do pensamento político de Paulo Freire.

A seguir, examinaremos as principais campanhas e mobilizações contra o analfabetismo de adolescentes e adultos, experiências que segundo Fávero e Mota (2016) revolucionaram as concepções sobre o analfabeto e sobre o analfa- betismo, inovaram materiais didáticos e formaram uma nova geração de educado- res populares, proporcionando assim um salto qualitativo para a EJA.

3 PROPOSTAS DE ALFABETIZAÇÃO E EDUCAÇÃO DE JOVENS E

ADULTOS OCORRIDAS NO

BRASIL NO SÉCULO XX DE MAIOR PROEMINÊNCIA

3.1 CAMPANHAS E MOVIMENTOS DE ALFABETIZAÇÃO E EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS QUE

ANTECEDERAM OS MOVIMENTOS DE EDUCAÇÃO DE BASE (MEB) E DE CULTURA POPULAR (MCP)

Nesta seção apresentaremos uma breve síntese das principais campanhas e mobilizações governamentais contra o analfabetismo de adolescentes e adul- tos e os movimentos de cultura e educação popular que ocorreram no Brasil a partir da segunda metade do século XX. Revisitando também pontos principais do pensamento político e da proposta pedagógica de Paulo Freire para posterior-

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Fundamentos e Currículo da Educação de Jovens e Adultos

mente entendermos melhor seu Método de alfabetização o qual foi tão impactante nos movimentos de alfabetização de jovens e adultos e demais ações educativas ocorridas a partir da década de 1960. Mesmo após a interrupção dos trabalhos em 1964, sua proposta inovadora seguiu em outros países com a mesma rele- vância e eficiência, permanecendo, ainda, nas duas primeiras décadas do século XXI como um dos referenciais teóricos mais lidos e utilizados na educação e na alfabetização de jovens e adultos.

Autores como Gadotti e Romão, (2006) afirmam que já na década de 1940 ocorreram iniciativas e avanços significativos na educação Básica Nacional e tam- bém na EJA. Nesse período, foi regulamentado o Fundo Nacional de Ensino Pri- mário (FNEP), criado pelo professor Anísio Teixeira, objetivando garantir recursos permanentes para o ensino primário a fim de resolver os problemas das desigual- dades econômicas e culturais existentes entre os diferentes municípios país.

Também foi fundado o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI) com a intenção de qualificar mão de obra para o mercado de trabalho.

De acordo com Borges (2009, p. 23) e Paiva (1973), a história da educação de jovens e adultos no Brasil tem três períodos distintos. O primeiro entre os anos de 1946 a 1958, quando foram organizadas as campanhas nacionais de alfabe- tização de caráter oficial, com o objetivo de erradicar o analfabetismo no país.

Conforme Tabela 1.

TABELA 1 – CAMPANHAS E MOVIMENTOS DA EJA OCORRIDOS NO BRASIL ENTRE O PERÍODO DE 1946 ATÉ 1958, SEGUNDO ORDEM

CRONOLÓGICA PROPOSTA POR BORGES (2009) E PAIVA (1973) Campanhas e movimentos Data Patrocinado Local onde ocorreu Campanha de Educação

de Adolescentes e Adultos (CEAA).

1947

Governo Federal, com verbas do Ministério da educação, do ensino pri- mário.

Em todos os municípios do país. Destinava-se a adolescentes e crianças que não foram escolari- zados em idade própria.

Campanha de Educação Ru- ral (CNER), em 1952 ocorre a 2ª Campanha Nacional de Er- radicação do Analfabetismo.

1952

Governo Federal, com verbas do Ministério de Saúde e da Agricultura.

Em todos os municípios do país.

Mobilização Nacional contra o Analfabetismo (MNCA) e Sistema Rádio Educativo Na- cional (SIRENA).

A partir de 1955 até

1960

Governo Federal Em todos os municípios do país.

FONTE: Adaptado de Borges (2009) e Paiva (1973)

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Segundo Borges (2009, p. 26), a primeira Campanha Nacional de Alfabetiza- ção de Adultos, organizada por iniciativa oficial federal, foi a “Campanha de Edu- cação de Adolescentes e Adultos” (CEAA), em 1947, quando o Governo brasileiro lança, pela primeira vez, uma campanha de classes de alfabetização em todos os municípios do país.

Esta Campanha foi organizada e coordenada por Lourenço Filho, de 1947 até 1950, de acordo com Borges (2009, p. 27) que se reporta a Fávero (2003, p.1), o qual afirma que “Campanha de Educação de Adolescentes e Adultos” (CEAA), criada pelo Governo Federal, com verba do ensino primário, foi uma ação educa- tiva para alfabetizar adolescentes e adultos não atendidos na idade normal da es- colarização, considerada normal de 7 a 10 anos de idade. Pretendia não somente a alfabetização, mas uma educação de base para estes educandos, segundo ex- pectativas da UNESCO.

Para estes autores, a Educação de Base, neste período, definida pela UNES- CO objetivava reposição de todo o conteúdo da escola primária, até mais sofisti- cada que a nossa escola primária, (brasileira) porque era integralizada e pautada nas experiências dos países ricos, desenvolvidos. Destinava-se a adolescentes e crianças que não foram escolarizados em idade própria. Abordava conteúdos de alfabetização como: leitura, escrita, iniciação ao cálculo, higiene, moral e civismo, uma série de coisas, até um pouco de extensão agrícola, que estava começando neste período.

Em 1952 ocorreu a 2ª Campanha Nacional de Erradicação do Analfabetis- mo, ainda na ótica de Borges (2009, p. 27) e Fávero (2003, p. 2), esta campanha assentou-se em bases diferentes da primeira. Teve uma abordagem sociológica e também é curiosa e pouco estudada, foi promovida pelo Ministério de Saúde e pelo Ministério da Agricultura e trabalhou com as populações diretamente a partir das questões de saúde e higiene:

[...] o forte dela está no grupo de sanitaristas, grupo médico, e um pouco com a introdução de algumas técnicas rurais, falan- do em cooperativismo. Há muito poucos dados dessas campa- nhas, assim concretamente, de estatísticas. Agora, se acredita, se descreve, que, na verdade, ela alfabetizou pouca gente. Se confiarmos um pouco em algumas coisas que são ditas, em dez anos não chegou a diminuir 18% do analfabetismo (BOR- GES 2009, p. 27 apud FAVERO, 2003, p. 2).

De acordo com Borges (2009), Fávero (2003) relata que o presidente Jusce- lino Kubitscheck de Oliveira (1955-1960) tinha uma opinião bem pontual sobre as Campanhas, ou seja, “que elas já deram o que tinham que dar”.

Dessa forma, em 1958, Juscelino Kubitscheck, em Petrópolis, Rio de Janei-

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Fundamentos e Currículo da Educação de Jovens e Adultos

ro, convoca grupos de vários estados para relatarem suas experiências no Con- gresso de Educação de Adultos. Nesse congresso ganha destaque a experiência do grupo de Pernambuco liderado por Paulo Freire, o qual era um movimento de educação voltado para o desenvolvimento da educação de adultos e também fa- zia críticas muito fortes à precariedade dos prédios escolares, à inadequação do material didático e à qualificação dos professores.

Neste Congresso, segundo as autoras, se falou muito mais no ensino pri- mário do que na educação de adultos. Todos os Estados trouxeram relatório dos congressos estaduais ou regionais e também teses para ser discutidas.

Em 1958, aparece o relatório do grupo de Pernambuco relatado por Paulo Freire, o qual dizia que o problema não era o analfabetismo e que alfabetizar não era a solução. O problema era a miséria do nordeste. Ou, se enfrentava a miséria do Nordeste, ou a alfabetização era a mesma coisa que tentar enxergar o fim do mar. (FÁVERO, 2003, p. 4).

Para Brandão (1984, p. 24), um dado cuja importância foi pouco ressaltada é o de que a educação popular, pensada um dia no Brasil e depois amadurecida em outros países da América do Sul, não fez crítica apenas à educação de adultos apresentando-se como uma forma alternativa de outra educação para adultos, dirigida a sujeitos pobres de comunidades indígenas, camponesas ou operárias.

Paulo Freire e seus companheiros de equipe em Pernambuco criticaram a totali- dade de um sistema bancário de educação em todos os seus níveis e, em contra- partida, propõem sob bases populares e com objetivos de transformações sociais um outro sistema de educação, no qual a alfabetização de adultos é apenas um dos níveis e toda a educação dirigida a adultos, apenas um conjunto de etapas que inicia com a alfabetização como primeiro estágio, até a universidade popular.

3.1.1 Principais Movimentos de Cultura Popular e Educação de Base ocorridos no Nordeste, Centro-Oeste e Norte do Brasil na década de 1960

Na década de 1960, a efervescência político-social do período compôs o ce- nário propício à experimentação de novas práticas de alfabetização e animação so- ciocultural desenvolvidas pelos movimentos de educação e cultura popular que, em sua maioria, adotaram a filosofia e o Método de alfabetização proposto Paulo Freire.

O segundo período da história da educação de jovens e adultos (EJA) no Brasil de 1958 a 1964 foi marcado pela ideia de um programa permanente para

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enfrentar o analfabetismo, levando, com isso, à criação do Plano Nacional de Alfa- betização de Adultos, coordenado por Paulo Freire.

Conforme Fávero e Mota (2016), o que diferenciou radicalmente estes movi- mentos das propostas anteriores, foi o compromisso explicitamente assumido em favor das classes populares, urbanas e rurais, assim como o fato de orientarem sua ação educativa para a ação política. As principais campanhas e mobilizações governamentais em prol do alfabetismo de adolescentes e adultos e demais movi- mentos de cultura e educação popular deste período constam na Tabela 2.

TABELA 2 – CAMPANHAS E MOVIMENTOS DA EJA OCORRIDOS NO BRA- SIL ENTRE O PERÍODO DE 1958 ATÉ 1964, SEGUNDO ORDEM CRO-

NOLÓGICA PROPOSTA POR BORGES (2009) E FÁVERO (2016) Campanhas e movimentos da

segunda etapa extremamente ativos até março de 1964

Data Patrocinado Local onde ocorreu MCP – Movimento de Cultura Popular 1961-1964

Plano Nacional de Alfabetização de Adultos

Recife

Campanha De Pé no Chão Também se Aprende a Ler

1961-1964 Plano Nacional de Alfabetização de Adultos

Natal Campanha de Educação Popular da

Paraíba (CEPLAR).

(1) Alfabetização-educação de adul- tos pelo rádio (SIREPA - Sistema Rá- dio Educativo da Paraíba);

(2) Aplicação em larga escala do Método Paulo Freire e do movimento de cultura popular adjacente (CEPLAR - Campa- nha de Educação Popular - 1962-1964).

(3)Aplicação do maior programa de reação (pós-abril de 1964), liderado por missionários protestantes e técni- cos norte-americanos (Cruzada ABC - Cruzada de Ação Básica Cristã).

1961-1964 Nesse período na Paraíba ocorreram três importantes Movimentos de alfabetiza- ção popular (de jovens e adultos).

Plano Nacional de Alfabetização de Adultos

Paraíba

Centro Popular de Cultura (CPC), da União Nacional dos Estudantes (UNE),

(1962-1964) Plano Nacional de Alfa- betização de Adultos

Desdobrou-se para vários estados do país.

Primeiras experiências do Sistema Paulo Freire de Alfabetização, reali- zadas inicialmente no MCP.

Plano Nacional de Alfabetização de Adultos

Angicos, no Rio Grande do Norte.

Sistema de Educação de Adultos

Paulo Freire 1963-1964 Plano Nacional de Al-

fabetização de Adultos

Nordeste, Centro-O- este e Norte do país.

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Fundamentos e Currículo da Educação de Jovens e Adultos

Movimento de Educação de Base (MEB), previstas para serem amplia- das no Programa Nacional de Alfabe- tização (PNA).

1961-1967

Plano Nacional de Alfabetização de Adultos. (extinto em 1964 pelo Decreto nº 53.886, em 1964)

Atuação no meio rural do Nordeste, Centro-Oeste e Norte. Pretendia alfa- betizar cinco milhões de jovens e adultos em dois anos.

FONTE: Adaptado de Borges (2009) e Fávero (2016)

A partir de 1961, na Paraíba, ocorreram três importantes movimentos de al- fabetização popular (de jovens e adultos), conforme se pode verificar na Tabela 2:

Alfabetização-educação de adultos pelo rádio (SIREPA - Sistema Rádio Edu- cativo da Paraíba).

Aplicação em larga escala do Método Paulo Freire e do movimento de cultura popular adjacente (CEPLAR - Campanha de Educação Popular).

Aplicação do maior programa de reação (pós-abril de 1964) liderado por mis- sionários protestantes e técnicos norte-americanos (Cruzada ABC - Cruzada de Ação Básica Cristã).

No início de 1964, no auge dos conflitos sociais, atuavam simultaneamente na Paraíba: o SIREPA, com centenas de escolas radiofônicas; a CEPLAR, com cento e trinta e cinco “círculos de cultura”, e o que seria o embrião da Cruzada ABC preparava setecentos monitores para combater a CEPLAR e seu método político-pedagógico.

Para Borges (2009, p. 31), as campanhas são qualitativamente diferentes de outras ações educativas. O aspecto fundamental que as diferencia segundo esta autora que se reporta a Fávero (2003, p. 4), é que:

[...] elas não entram pela educação pura, entram pela cultura, entram pela cultura popular, isso se dá totalmente diferente.

Você vai partir do que o povo conhece, do que ele sabe e vai tentar fazer um instrumental de alfabetização, que na verdade é mais do que isso é um instrumental de educação popular que vai mexer com a cabeça das pessoas. Você vai fazer uma ação educativa que tem um movimento que parte da cultura, de como homens e mulheres vivem, na cidade e no campo, como é que eles vêem essa realidade, como você pode criticar essa realida- de para instrumentalizá-la para uma mudança de base estrutural no país. Esse é um grande movimento do começo dos anos 60.

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Borges, (2009, p. 30) destaca como exemplos significativos da influência de Freire: o Movimento de Educação de Base (MEB) e o Movimento de Cultura Po- pular do Recife (MCP), ambos iniciados em 1961; os Centros Populares de Cul- tura da União Nacional dos Estudantes – CPC/UNE, além de outras iniciativas de caráter regional ou local.

Estes movimentos de alfabetização e educação de jovens e adultos começa- ram ser vistos pelas elites econômicas brasileiras como um dos principais fatores responsáveis por mudanças sociais e políticas.

Segundo Scocuglia (2003, p.2) na região Nordeste, com seus 59,8% de anal- fabetos, a proporção de novos eleitores conscientizados pelo Método Paulo Freire cresceria significativamente nas eleições presidenciais marcadas para 1965. Além do mais, no Nordeste havia um candidato natural à presidência (ou à vice) ou, no mínimo, um forte cabo eleitoral das esquerdas, Miguel Arraes. Também havia camponeses organizados em conflito com proprietários rurais, além da crescen- te participação política, nas maiores cidades nordestina, de sindicatos operários, bem como de estudantes universitários e secundaristas.

3.2 CRUZADA ABC, MOVA e MOBRAL

No terceiro período da história da EJA, conforme consta na Tabela 3, com a implantação do governo militar no país desenvolveu-se a Cruzada ABC e o Movi- mento de Alfabetização Brasileira (MOBRAL).

Conforme Borges (2009, p. 35) e Brandão (1987, p. 12-13), o Programa Na- cional de Alfabetização que seria desenvolvido no país por Paulo Freire e sua equipe não chegou a passar do papel para o seu primeiro Círculo de Cultura.

A extinção do PNA se deu pelo Decreto nº 53.886, em 1964. Para substituí- -lo, a ditadura implantou a Cruzada da Ação Básica Cristã (Cruzada ABC) a fim de neutralizar as ações das Ligas Camponesas. Segundo Borges (2009, p. 35), a Cruzada ABC surgiu com a proteção do Estado, mas, sobretudo, com dinheiro dos americanos, da Aliança para o Progresso.

A Cruzada ABC foi intensa e vigorosa na Paraíba, definiu-se contrária ao Método Paulo Freire e aos outros movimentos que vinham na linha do próprio Movimento de Educação de Base freiriano. Pretendia contestar política e pedago- gicamente os programas anteriores de alfabetização de adultos, particularmente o Sistema Paulo Freire, adotado oficialmente pelo governo deposto.

(30)

Fundamentos e Currículo da Educação de Jovens e Adultos

Scocuglia (2003) acredita que o apoio e a convergência de propósitos que os movimentos de alfabetização de adultos progressistas haviam encontrado no go- verno Goulart; a Cruzada ABC encontra nos governos militares, após abril de 1964.

TABELA 3 – CAMPANHAS E MOVIMENTOS DA EJA OCORRIDOS NO BRASIL A PARTIR DE MARÇO DE 1964 SEGUNDO ORDEM

CRONOLÓGICA PROPOSTA POR FÁVERO (2016) Campanhas e movimentos da segunda etapa

extremamente ativos até março de 1964 Data Local onde ocorreu SIREPA – Sistema Rádio Educativo da Paraíba 1959-1969 Paraíba

Cruzada ABC – Movimento de Ação Básica Cristã 1962-1969 Pernambuco

Projeto João Barro 1967-1974 Maranhão

Alfabetização Funcional (Incra/Ancarpe) 1968-1970 Em todos os Estados do país MOBRAL – Movimento Brasileiro de Alfabetização 1968- 1985 Em todos os Estados do país.

Ensino Supletivo (MEC) 1972-1980 Em todos os Estados do país.

PAF-UFSCar – Universidade Federal de São

Carlos Projeto de Alfabetização de Funcionários 1980-1984 São Paulo

Fundação Educar 1986-1992 Em todos os Estados do país.

PEJ/PEJA – Programa de Educação de Jovens e Adultos

Início em

1985 Rio de Janeiro MOVA/SP – Movimento de Alfabetização de

Jovens e Adultos da Secretaria Municipal de São Paulo

Início em 1989

Secretaria Municipal de São Paulo, ampliando-se para demais Estados do país.

Projeto Zé Peão Início 1990 Paraíba

SEJA/MOVA – Prefeitura Municipal de Porto

Alegre: Palavras de Trabalhador 1997-2004 Porto Alegre FONTE: Adaptado de Fávero (2016)

3.3 PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS DOS MOVIMENTOS DE CULTURA POPULAR E EDUCAÇÃO DE BASE 3.3.1 Ação Educativa

Paulo Reglus Neves Freire nasceu em Pernambuco, em 1921, e faleceu em 1997, é considerado o maior pedagogo do século XX, o brasileiro com mais títulos de doutorados honoris causa, filósofo e escritor da terceira obra mais citada em trabalhos de ciências humanas do mundo: Pedagogia do Oprimido. Em sua obra,

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Política e Educação, Freire (1997, p. 65-66) pensa a educação como processo permanente e como dimensão necessária da prática social exatamente como as demais práticas que ocorrem em todos os setores da sociedade.

“Enquanto prática social a prática educativa, em sua riqueza, em sua complexidade, é um fenômeno típico da existência, por isso mesmo fenômeno exclusivamente humano. Daí, também, que a prática educativa seja histórica e tenha historicidade. A existência humana não tem o ponto determinante de sua ca- minhada fixado na espécie. Ao inventar a existência, com os materiais que a vida lhes ofereceu, os homens e as mulheres inventaram ou descobriram a possibilidade que implica neces- sariamente a liberdade que não receberam, mas que tiveram de criar na briga por ela”.

Nesta perspectiva, o processo educativo consiste em conscientização para a liberdade por meio do desvelar da realidade de cada comunidade educativa sobre sua condição de seres sociais, históricos e fazedores de cultura, portanto, potencialmente aptos a criar uma nova sociedade na qual eles possam ter uma vida digna e humana sem opressão e exploração. Esta conscientização demanda entender que as desigualdades sociais são resultado da ação humana, por meio da qual o homem faz as suas próprias condições de vida agindo e transformando a natureza para atender as suas necessidades.

Assim, os sujeitos do processo educativo concebem-se capazes de mudar a realidade ao engajar no projeto de construção de uma nova sociedade, um projeto no qual cada um está diretamente envolvido e não apenas representado.

Segundo Scocuglia (2019, p. 17-18), a luta para fazer da educação uma prá- tica da liberdade, um processo de conscientização pelo diálogo, uma ação cultural em defesa dos oprimidos, um exercício do direito ao conhecimento e um processo de ser mais dos homens e das mulheres; Paulo Freire construiu sua história e in- fluenciou outras tantas histórias acreditando no papel que a educação pode ter em uma revolução cultural, a qual ele chamou de consciente participação do povo.

A realidade social, objetiva, que não existe por acaso, mas como produto da ação dos homens, também não se transforma por acaso. Se os homens são os produtores desta realidade e se esta, na inversão de práxis, se volta sobre eles e os condi- ciona, transformar a realidade opressora é tarefa histórica, é tarefa dos homens. Ao fazer-se opressora, a realidade implica a existência dos que oprimem e dos que são oprimidos. Es- tes, a quem cabe realmente lutar por sua libertação juntamente com os que com eles em verdade se solidarizam, precisam ga- nhar a consciencia crítica da opressão, na práxis dessa busca (FREIRE, 1989, p.37-38).

Referências

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