A RELAC;Ao ENTRE
SUPPOSITIOE
SIGNIFICATIONA
SUMMA LOGICAEDE GUILHERME DE OCKHAM
Ernesto Perini SANTOSl
• RESUMO : Os conceitos de significatio e de suppositio sao centrais na semi'mtica ockhamiana; a primeira no<;ao e uma propriedade de termos isolados; a segunda, de termos em proposi<;oes . A com preensao da rela<;ao entre os dois e muito importante ; esta em jogo 0 carater atomista ou proposicional de sua semantica. A defini<;ao de cada urn destes termos remete a defini<;ao do outro, nao sendo possivel determinar a priori dade de urn sobre 0 outro a partir de suas defini<;oes . Ambos termos tern excessos em rela<;ao ao outro, cobrem casos nao cobertos pelo outro. A analise destes excessos per mite identificar 0 termo dominante para explica<;ao de tipos diferentes de fen6menos lingiiisticos. Estes tipos de fen6menos sao identificados como campos conceituais diferentes, 0 que permite es tabelecer a prioridade de urn termo sobre 0 outro em campos diferentes da semantica .
• PALAVRAS-CHAVE : Significatio; suppositio; semantica.
I
Qual a relaQ8.o entre significatio e suppositio em Ockham?
AsignificaQ8.o e uma
propriedade do termo tornado isoladamente. Urn signo linguistico e significativo se
traz algo ao conhecimento e pode supor por este algo numa proposiQ8.o . Esta definiQ8.o
n8.o diz que urn termo s6 e significativo numa proposiQ8.o, mas que ele deve poder
entrar numa proposiQ8.o, ou e ele mesmo uma proposiQ8.o. Ser significativo e uma
propriedade pre-proposicional do termo .
AsuposiQ8.o e uma propriedade proposi
cional do termo . Urn termo s6 supae pOI algo numa proposiQ8.o . Voltaremos as defi
niQaes de uma e outra propriedade, mas podemos ja ver que definindo uma ou outra
como prioritaria estamos fazendo uma oPQ8.0 por uma semantica atomista ou propo
sicional. Com efeito , se dissermos que a propriedade fundamental do termo e a signi
ficaQ8.o , diremos que a semantica fundamenta-se em propriedades do termo tornado
isoladamente ; inversamente, se fizermos a oPQ8.0 pela suposiQ8.o, diremos que a se
mantica interessa-se por propriedades que ocorrem em contextos proposicionais . 0
1 Professor de Filosofia - Universidade Federal de Minas Gerais -3 1 270-900 -Belo Horizonte - MG.
que esta em jogo nao e pouco , procuramos definir qual e a instancia fundamental de
uma teoria do signo linguistico, a partir de duas noc;:6es basicas . Determinar assim a
relac;:ao entre significatio e suppositio e uma tarefa importante na compreensao da
semantica ockhamiana. Nao iremos refazer 0 rico debate sobre este tema na literatura
ockhamiana, os comentadores serao considerados somente na medida em que inte
ressar ao argumento .
Nao e possivel dizer que uma noc;:ao se define em virtude da outra. A definic;:ao
de signo linguistico remete a suposic;:ao e inversamente . Vamos inicialmente caracte
rizar a circularidade de definic;:6es . Em seguida, veremos os excessos da suposic;:ao e
da significac;:ao e
0que os caracteriza. Analisaremos, por fim, a relac;:ao entre os dois
excessos , que remetem a casos nos quais nao hcl excesso algum. Esta estrategia nos
permitira estabelecer uma relac;:ao entre suposic;:ao e significac;:ao que nao e de prio
ridade de uma sobre a outra, mas de dominios conceituais diferentes .
II
A definic;:ao de "signo linguistico " faz referencia a propriedade de suPoI :
Compreende-se de outra maneira signo como aquilo que faz vir algo ao conhecimento e esta destinado por natureza a supor por este algo ou a ser adicionado a tal tipo de signo numa pro posic;:ao . . . ou 0 que e destinado a ser composto de tais signos, como a frase. (Ockham, 1989, p.7)2Propomos a seguinte definic;:ao de "signo linguistico" :
Def. signo lingUistico: x e urn signo lingUistico se e somente se x traz 0
conhe
cimento de a, se x e apreendido, a e diferente de x e x pode supor por a numa pro
posic;:ao, fazer parte de uma proposic;:ao ou e uma proposic;:ao .
Urn signo linguistico significa aquilo por que pode SUpOI. A suposic;:ao a que
O ckham faz referencia aqui e a suposic;:ao pessoal (Sp) ; pela definic;:ao, urn signo sup6e
por aquilo que significa,
0que e proprio da suposic;:ao pessoal. A definic;:ao da supo
sic;:ao pessoal, pOI sua vez , faz referencia ao significado do termo .
De maneira geral, a suposic;:ao e pessoal quando 0 termo sup6e por seu signi
ficado . . 3
Propomos a seguinte definic;:ao de "suposic;:ao pessoal" :
Def. suposir;ao pessoa1: x sup6e em suposic;:ao pessoal por a se e somente se x
significa a , x ocupa a posic;:ao de sujeito ou predicado numa proposic;:ao e x fica no
lugar de a .
2 "Aliter accipitur sign um pro ilia quod aliquid facit in cognition em venire e t natum est pro ilia supponere vel tali addi in propositione . . . vel quod natum est componi ex talibus, cuiusmodi est ora tio. " Somme de Logique doravante sera citada como SL.
3 "Suppositio personalis, universaliter, est ilia quando terminus supponit pro suo significato .. . " , (SL, p.201).
As definic;oes sao circulares , nao e possivel dizer, a partir das definic;oes , qual
a
noc;ao prioritaria,4 como parece pretender Loux ( 1 979, p .420). Deve-se observar, com
Panaccio , que esta circularidade de definic;oes nao e tao grave quanto
0seria numa
construc;ao axiomatica (1984) . Na ordem da definic;8.o , como diz ainda Panaccio , nao
M prioridade . Mas nao M so circularidade de definic;oes entre significatio e suppositio,
M tambem excessos num e noutro caso . Urn termo po de supor por algo que nao
significa e significar algo por que nao supoe . Nosso proximo passo sera examinar
estes excessos, para esclarecer a relac;ao entre estes dois conceitos na Summa 10gicae
de Ockham.
III
A suposic;ao excede a significac;ao quando urn termo em suposic;ao simples (SS)5
ou em suposic;ao material (SM)6 supoe por algo que nao significa. Estes casos podem
ser identificados genericamente
anoc;ao contemporanea de menc;ao, em oposic;ao ao
usa, que se identifica com a suposic;ao pessoal. Nos dois casos, os termos sao tornados
nao significativamente . Quais sao as condic;oes de tal excesso? Inicialmente, as con
dic;oes gerais da suposic;ao. Podemos definir "suposic;ao" sem considerar seus dife
rentes modos, da seguinte forma :
Def. Suposir;ao : urn termo x supoe por a se e somente se x esta na posic;ao de
sujeito ou predicado numa proposic;ao e x fica no lugar de a .
As condic;oes da suposic;ao, independentes d e seu modo, sao :
a)
0termo estar numa proposic;ao ;
b)
0termo estar em posiC;8.o de sujeito ou predicado ;
c)
0termo ficar no lugar de alguma coisa.
A condic;ao (a) restringe a propriedade de suposic;ao em relac;ao
asignificac;ao,
pois urn termo e significante independentemente de sua inserc;ao proposicional,
0que nao ocorre com a suposic;ao . A condic;ao (b) refere-se a "termo " no sentido pri
meiro do Capitulo 2 :
o nome "termo" compreende-se de tres modos . Num sentido, chama-se "termo" tudo aqui-10 que pode ser a copula au a extrema de uma proposic;:ao categorica, a saber 0 sujeita au a predicada au ainda uma determinac;:ao de um extrema au de um verba 7
4 " The conclusion of this is tha t, according to the order of definition, neither the n otion of signification n or tha t of supposition is logically prior to the other one in Ockham 's semantics" (Panaccio, 1 984, p . 67).
5 "Suppositio simplex est quando termin us supponit pro intentione animae, sed n on tenetur significative . . . ", (SL, p.20 1 ) .
6 "Suppositio est materialis est quando termin us non supponit significative, sed supponit vel pro voce vel pro scipto" (SL, p.202)
7 "Est autem sciendum quod hoc nomen 'termin us ' tripliciter accipitur. Uno modo vaca tur termin us omne illud quod potest esse copula vele extremum propositionis categoricae, subiectum videlicet vel praedicatum, vel etiam determinatio extremi vel verbi' " (SL, p.8).
Este sentido inclui termos simples e complexos,8 tomados significativamente
ou na0 9 Em uma frase como "as moscas engra<;adas chegaram" , 0 termo que supoe
8 " as moscas engra<;adas" , nao apenas "moscas " . Na frase " 'a mesa 8 verde ' 8 uma
frase " , 'a mesa e verde ' esta em SS e
e um termo apenas no sentido acima apontado,j a que 8 um termo complexo tomado nao significativamente . 0 excesso esta indicado
no segundo item, ja que termos supoem por algo que nao podem significar se nao
sao tomados significativamente. 0 item (c)
eum termo primitivo, que identificamos
quando estao realizadas as outras condi90es da suposi9ao lO 0 excesso da suposi9ao
em rela9ao a significa9ao esta portanto em termos (no primeiro sentido do Capitulo 2)
em context os proposicionais tomados nao significativamente. S6 M termos tomados
nao significativamente em contextos proposicionais . Um termo s6 pode estar em SM
ou em SS num contexto proposicional, porque em tais casos deve haver um termo
em suposi9ao SP no outro extrema da proposi9ao ll Para que um termo suponha em
SS ou SM,
enecessario que 0 outro extrema da proposi9ao signifique 0 conceito (SS),
ou 0 som vocal ou a marca escrita (SM) pelo que vai supor 0 termo tomado nao signi
ficativamente . No exemplo acima, "a mesa 8 verde" esta em suposi9ao simples porque
8significada como frase pelo predicado "8 uma frase" . A suposi9ao e
urn conceito que
8 mais amplo que 0 de significa9ao se consider amos os termos em proposi90es .
Quando a significa9ao excede a suposi9ao? Urn termo significa de maneira se
cundaria aquilo por que nao pode supor, 0 que nao depende de um contexto propo
sicional. " Branco " remete, de maneira secundaria,
abrancura, mesmo fora de uma
proposi9ao . 0 que determina 0 excesso da significa9ao neste caso? 0 termo ter mais
de urn significado, isto
e,significar de mais de um modo aquilo que significa. Termos
conotativos sao justamente termos que significam aquilo que significam de mais de
urn modo, 12 em oposi9ao a termos absolutos . 13 Ha uma primeira oposi9ao em rela9ao
asuposi9ao : nao interessa aqui a inser9ao proposicional do termo . Esta oposi9ao
aponta para uma outra, a do sentido de "termo" . No caso anterior, vimos como "ter
mo" 8 tomado no sentido da primeira defini9ao do Capitulo 2. Neste caso, "termo "
etornado no sentido da segunda defini9ao deste mesmo Capitulo .
E
termo todo ele
mento incomplexo, distinto da proposi9ao.
E
neste sentido de "termo" que podemos
falar de termos conotativos e absolutos. Ockham mesmo diz que 8 neste sentido que
8 "Et isto modo etiam una propositio potest esse termin us, sicut potest esse pars proposition is" , (Ibidem). 0 fato de poder ser um elemento complexo opoe este senti do de "termo" ao segundo sentido do Capitulo 2 : "Aliter a ccipitur hoc nomen 'termin us' secundum quod distinguitur contra oration em; et sic omne in complexum vocatur termin us" , (Ibidem).
9 Termos neste sentido podem supor se tomados nao significativamente, contrariamente ao terceiro sentldo do Capitulo 2 : " Tertio modo accipitur 'terminus ' praecise et magis stricte pro illo quos significative sumptum potest esse subiectum vel praedicatum propositionis" (Ibidem).
1 0 Supomos aqui asserc;:oes verdadeiras, 0 que nao infiui no nosso argumento.
1 1 "Sed termin us non in omni propositione potest habere supposition em simplicem vel materialem, sed tunc tantum quando termin us talis compara tur aJteri extremo quod respicit intentionem animae vel vocem vel scriptum " , (SL, p . 204).
12 "Nomen autem connotativum est illud quod significat aliquid primario et aliquid secundario" , (SL, p . 1 6) .
1 3 "Nomina mere absoluta sun t illa quae non significan t aliquid principaliter et aliud vel idem secundario, sed quidquid significa tur per illud nomen, aeque primo significatur. . . " (Ibidem}.
"termo" e tornado na Summa.
14Sao conotativos termos simples, urn termo complexo
nao e dito conotativo .
E
claro que , sendo uma propriedade do termo independente
do contexto proposicional,
0termo aqui nao pode ser tornado nao significativamente,
o que s6 ocorre numa proposi9aO .
A rigor, nao se deveria falar em "ser tornado" de modo algum, ja que urn termo
s6 e tornado de tal ou tal modo em uma proposi9aO . Convem esclarecer
0sentido de
"ser tornado significativamente " . Urn termo esta em SP quando e tornado signifi
cativamente, e isto a distingue dos outros tipos de suposi9aO . Termos tornados em
SP e apenas termos tornados em SP sup6em pOI seu significado. Ora, termos em SP e
apenas eles sao tornados significativamente, assim, " supor pOI seu significado " e " ser
tornado significativamente" sao equivalentes, nos dois casos identificamos os term os
em SP. 15 Assim, se consideramos
0significado de urn termo, tratamos daquilo porque
sup6e se tornado significativamente .
E
claro que, tratando do excesso da significa9aO
sobre a suposi9aO, urn termo significa algo por que sup6e e algo pOI que nao pode
SUpOI.
IV
Ora, num e noutro caso a possibilidade dos excessos refere-se a urn termo no
qual nao ha excesso , seja urn termo em SP, seja urn termo que nao significa nada por
que nao possa SUpOI. Urn termo que sup6e em SS ou SM sup6e por aquilo que nao
significa e esta possibilidade e ela mesma coordenada pOI urn termo em SP, que sup6e
por aquilo que significa. A possibilidade da suposi9aO exceder a significa9aO refere-se
a urn termo cujos supposita identificam-se aquilo que significa.
Termos que significam algo por que nao sup6em sao termos que tern uma signi
fica9aO primaria e uma significa9aO secundaria. Eles significam aquilo que significam
os termos principais a partir dos quais foram impostos , pelo que nao podem SUpOI.
Esta referencia ao significado principal aparece no Capitulo 33 de SL, no terceiro sen
tido de "significar" :
Compreende-se "significar" de outro modo quando se diz que e significado aquilo a partir do que 0 som vocal foi imposto ou aquilo que e significado de modo primario pelo conceito prin cipal ou pelo som vocal principal. Deste modo, dizemos que "branco" significa a brancura, porque "brancura" significa a brancura, pelo que contudo 0 signo "branco" nao sup6e.16
1 4 " Visa aequivocatione istius nominis 'termin us ' prosequendum est de divisionibus termini incomplexi" (SL, p . l 0) . N a verdade, a o dizer que a suposi<;:ao trabalha com outro sentido de termo, dizemos que Ockham nao usa 0 mesmo sentido de "termo" ao longo de toda Summa. Parece-nos, contudo, que ele usa 0 sentido 2 de "termo" nos capitulos que se seguem a esta declara<;:ao, mesmo se, para sabe-lo, seja preciso ver qual sentido e operacional.
15 Ockham diz que nao basta dizer que urn termo sup6e por seu significado para estar suposi<;:ao pessoal, e preciso dizer que e tornado significativamente. Esta precisao, diz Biard , deve-se aos diferentes tipos de Significado (Ct. 1 989, p.80), mas pode ser desconsiderada; alguns importantes comentadores 0 fazem : ct. Loux, 1 974, p.24; Karger, 1 984, p.90 ; Adams, 1 987, p . 346; Panaccio, 1 99 1 , p . 37. Boehner acredita ser necessario a precisao, mas sua ex plica<;:ao parece-nos redundante (ct. 1992, p . 237).
16 "Aliter a ccipitur 'significare ' quando illud dicitur significari a quo ipsa vox imponitur vel illud quod primo modo significatur per conceptum principalem vel vocem principalem. Et sic dicimus quod 'album ' significa t albedinem,
Nao entraremos aqui na discussao deste trecho, que envolve uma relaQao entre
signos nem sempre considerada pelos comentadores. Basta notar como "branco" re
mete
abrancura, que nao significa de modo primario, pelo que portanto nao pode
SUpOI. Por que "branco" significa a brancura neste sentido de "significar" ? Porque
significa aquilo a partir do que foi imposto . "Branco " remete justamente aquilo que
esignificado por "brancura" , que , sendo urn termo absoluto, supae por aquilo que
significa .
E
justamente isto que queriamos estabeleceI. Urn e outro excesso remetem
a situaQoes nas quais na
o ha excessos, ou seja, a termos em SP ou a termos absolutos .
Vimos no inicio do texto como os casos principais da suposiQao (Sp), que de
termina a possibilidade do desvio da suposiQao, e da significaQao (termos absolutos),
a partir do qual sao impostos os term os cuja significaQao excede a suposiQao, remetem
urn ao outro, ou seja, nao saimos da circularidade das definiQaes .
A passagem pelos excessos nos indica, contudo, campos diferentes dominados
ou pela suposiQao ou pela significaQao . A suposiQao
e 0conceito central no nivel
proposicional.
Inicialmente, Ockham quer tomar a nor;;ao d e referencia padrao ou suppositio pessoal como conceitualmente anterior a nor;;ao de sentido ou significatio; ele quer dizer que nao h8. relar;;ao palavra-mundo semanticamente mais fundamental do que aquelas envolvidas no funcionamento de urn termo como artificio de referencia (referring device) em contextos proposicionais normais. (Loux, 1979, p 423)17
Considerada no nivel proposicional, a linguagem tern como conceito central
asuposiQao . 0 sentido de "termo" usado na definiQao de "suposiQao" considera a lingua
gem ja formada, ja constituida em proposiQaes ;
0 termo ai e 0 resultado da consideraQaode sua funQao sintatica em proposiQaes . Se toda lingua gem for proposicional, a su
posiQao e 0
conceito central.
Mas toda linguagem
eproposicional em Ockham?
A complexidade desta relar;;ao entre significar;;ao e suposir;;ao manifesta-se no aspecto te leol6gico dos enunciados que concernem ao signo e a significar;;ao. 0 signo esta destinado a supor , ele e definido por esta aptidao ao mesmo tempo em que ele e colocado como anterior. Resumindo, a significar;;ao e colocada como suposir;;ao potencial. (Biard, 1989, p 93)18
quia ' albedo' significat albedinem, pro qua tamen albedine non supponit hoc signum ' album' " (SL, p. 100).
1 7 0 segundo ponto de que Loux trata, que entender 0 sentido de urn termo "is rather to be understood in terms of recognitionaJ skills or identi[jcatory abilities" (p.423), nao se deve a prioridade da suposi�ao sobre a sigmfica�ao, mas ao nominalismo de Ockham (Cl. Panaccio, 1 984, p.63).
18 A interpreta�ao de Biard, assim como a De Rijk ( 1 982), favorece a suppositio, as expensas da significatio. Em ambos os casos, a abordagem e mais historica. Parece claro, tanto em De Rijk quanto em Biard ( 1 989), que a evolu�ao da logica medieval parte da ideia de significa�ao atemporal e independente de contexto de urn termo em dire�ao a ideia de suposi�ao, e Ockham e, neste como noutros pontos, fundamental artifice da mudanGa. Isto nao significa, no entanto, nem que Ockham tenha realizado toda a passagem na sua obra, nem que devamos projetar evolu�6es que se realizaram plenamente depois dele e eventualmente a partir dele como acabadas na
o signo assim definido e 0 signo linguistico . Ele s6 e signo lingilistico na medida
em que pode entrar numa proposiQao , que e aquilo que
0diferencia de outros tipos
de signo . 0 fato de ser destinado a fazer parte de uma proposiQao, supondo ou nao,
distingue "signo linguistico" de "signo" no Capitulo 1 de SL.
Urn signo linguistico que pode entrar numa proposiQao nao esta contudo ne
cessariamente numa proposiQao .
It
dificil justificar esta posiQao na Summa , porque
urn signo nao esta num contexto proposicional se considerarmos sua genese a partir
da experiencia, que nao
etematizada na Summa . Assim, na Orclinatio, que trata da
teoria do conhecimento, podemos ler :
todo ato judicativo pressupoe na mesma potEmcia 0 conhecimento incomplexo dos termos, porque pressupoe 0 ato de apreensao, e o ato de apreensao a respeito de urn certo complexo pressupoe o conhecimento incomplexo dos termos . . . (Ockham, 1967, p.21}19
Esta passagem refere-se a termos mentais, mas a propriedade de ser signifi
cativo fora de contextos proposicionais pode ser transferida a termos convencionais
a eles associados . Do ponto de vista da origem da significaQao, a linguagem nao e
necessariamente proposicional, ou antes os termos nao estao necessariamente em pro
posiQoes. Ao contrario , a apreensao de complexos (proposiQoes) pressupoe a apreen
sao de incomplexos (termos), que sao, portanto, anteriores e podem existir no intelecto
sem as proposiQoes . Ora, deste ponto de vista, nao a suposiQao, mas a significaQao,
eprioritaria.
Considerando a linguagem urn conjunto de proposiQoes , a suposiQao
e 0con
ceito principal; considerando a linguagem do ponto de vista do surgimento da signifi
caQao a partir da experiencia, isto e, a partir de uma teoria do conhecimento, a significaQao
e
0conceito principal.
It
interessante observar como ambos aparecem no texto da
Summa , no qual poderiamos esperar que apenas a suposiQao dominasse . Os dois ex
cess os encontrados indicam precisamente que os dois conceit os centrais da seman
tica ockhamiana sao alternadamente dominantes no texto mesmo da Summa e em
campos bern precisos .
Ha uma mudanQa do sentido de "termo " ,
0que e urn fato importante quando
se trata justamente da 16gica dos termos ,
0tema da primeira parte da Summa . Os
fatos relevantes tambem nao sao os mesmos . Nao e a mesma coisa, com efeito, re
ferir -se
aorigem do significado de urn termo na experiencia e referir -se
aorganizaQao
de termos numa proposiQao . Ha uma mudanQa de ponto de vista, ou seja, os fatos
considerados relevantes num contexto nao
0sao em outro . Nao interessa saber
0termo mental a partir do qual urn termo convencional foi imposto para saber em que
tipo de suposiQao esta. Inversamente, a inserQao proposicional de urn termo nao e
relevante se vamos considerar a imposiQao de urn termo .
sua obra, mesmo que elas se encontrem ai como tend en cia ou in n uce.
19 " quod omnis actus iudicativus praesupponit in eadem potentia notitiam incomplexam terminorum, quia presu pponit actum aprehensivum. Et actus aprehensivus respectu alicuius complexi presupponit notitiam incomplexam terminorum . . . " ; este texto e citado em Panaccio, 1 984, p.68.
Se podemos definir onde cada noc;ao e dominante, nao podemos separa-Ias de
maneira estanque . Da linguagem ja organizada em proposic;oes, somos remetidos a
relac;ao entre termos que se explicam a partir da origem da significac;ao . E , inversa
mente ,
0signo lingiifstico, mesmo quando definido antes de sua inserc;ao proposi
cional, define-se como lingiifstico pela possibilidade da inserc;ao proposicional. Esta
e a circularidade de definic;oes . Ha uma outra circularidade, que nos remete de urn
e outro excessos a casos nos quais nao ha excesso .
Sugerimos assim que existem na prime ira parte da Summa dois dominios con
ceituais distintos, que consideram aspectos diferentes da linguagem e usam diferen
tes sentidos de "termo" . Num destes dominios, onde "termo" e definido como elemento
simples e a linguagem e consider ada a partir de sua origem na experiencia, a noc;ao
de significatio e mais importante. No outro dominio, on de "termo" e definido a partir de
sua func;ao sintatica e consideram-se as relac;oes entre os signos, a noc;ao de suppositio
e prioritaria. Devemos estar atentos as ferramentas conceituais usadas em cada caso
para entender que noc;ao e dominante em cada momenta e que aspectos da lingua
gem sao relevantes . Esta e uma distinc;ao de metodo, dirfamos hoje, para abordar
aspectos diferentes da teoria do signo lingiiistico . Nao sao abordagens contraditorias,
mas complementares . Ha uma duplicidade de metoda que procura se adequar a com
plexidade dos fen6menos abordados . Se esta duplicidade nao e tematizada par
O ckham, ela e pelo menos praticada, como acreditamos ter mostrado parcialmente
neste texto .
SANTOS, E .
P . Suppositioand
significatioin Ockham's
Summa Logicae. TranslFormlAr;ao (Sao Pa ulo),v. 19, p . 195-203, 1996 .
• ABSTRACT: Significatio and suppositio are central notions in Ockham 's semantics; the former is propriety of isolated terms, the later, of terms in propositional contexts. Understanding the relation between both notions is important to determine the atomistic or propositonal character of Ockham 's semantics. The definition of each term refers to the other, not allowing any priority of one of them. Both terms exceed one another, covering cases which are outside the scope the other. We identify, through the analysis of this excess the dominant term for the explanation of different kinds of linguistic phenomena. These different kinds of phenomena are identified with two different conceptual fields, each term (suppositio and significatio) being dominant in one field.
• KEYWORDS: Significatio; suppositio; semantics.
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