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Judicialização na assistência farmacêutica de medicamentos contidos no RENAME 2013 no estado de Pernambuco

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Judicialização na assistência farmacêutica de medicamentos contidos no RENAME 2013 no estado de Pernambuco

Rafaela Souza Silva1; Flávio Henrique Lagos Guimarães2 e Rosali Maria Ferreira da Silva3

Resumo

Justificativa: A cada ano, tem aumentado o número de ações judiciais que solicitam

procedimentos, produtos e tratamentos; e muitas vezes estes são fornecidos pelo SUS e estão presentes na RENAME 2013. Por isso é necessária a compreensão dos motivos da judicialização na saúde, identificação dos medicamentos que estão como Demanda Judicial, e a quantificação de demandas/ pacientes. Dessa forma será possível a contribuição com o acesso de medicamentos básicos à população pernambucana. Podendo assim ocorrer um decréscimo nos processos de judicialização. Objetivos: Identificar o número de demandas judiciais no Estado de Pernambuco de medicamentos contidos RENAME 2013. Caracterizar medicamentos por Componentes: CBAF, CEsAF, CEAF e insumos. E identificar a influência dos custos do estado na Farmácia de Ação Judicial com aquisição desses medicamentos. Metodologia: Estudo do tipo qualitativo exploratório e quantitativo analítico de corte transversal (abril de 2014); realizado na Gerência de Planejamento e Execução de Demandas Judiciais da Secretaria de Saúde do estado de Pernambuco. Coleta de dados feita por caracterização dos produtos farmacêuticos da Demanda Judicial por componentes de acordo com a RENAME 2013; e pesquisa da influência da aquisição desses medicamentos na Farmácia de Ação Judicial com o seus custos para o estado de Pernambuco.

Resultados: Dos 803 Produtos Farmacêuticos na Farmácia de Demanda Judicial 677

são medicamentos (84,31%), e observou-se que 226 desses medicamentos (28,14%) fazem parte da RENAME 2013. Identificou-se que dos 226: 94 são CBAF (13,88%); 11 são CEsAF (1,67%); 121 são CEAF (17,87%); e 07 são Insumos Farmacêuticos (1,03%). Já em relação aos custos se observou que as demandas judiciais interferem no ciclo da assistência farmacêutica principalmente na aquisição. Esta é dificultada, pois devido à emergência da demanda, muitas vezes não é possível comprar obedecendo à lei de licitações n. 8.666 de 1993, o que pode favorecer compras a preços elevados no mercado varejista, e grandes atrasos para atender ao paciente. Conclusões: Um número expressivo de demandas judiciais do estado de Pernambuco está representado por medicamentos constantes na RENAME 2013. Isso provoca a judicialização destes produtos para o estado que muitas vezes não é o responsável por eles, que é o caso dos medicamentos básicos por diversos motivos como: não padronização do município; problemas no processo de aquisição; irregularidades no abastecimento; baixa cobertura na rede de atenção básica. Esse fato implica em custos ao tesouro estadual por algo que deveria ser obtido normalmente por um valor mais baixo no mercado, além das multas por atraso. Essa judicialização também gera transtornos e custos a população que tem direito a ter acesso aos medicamentos básicos em seu próprio município.

Palavras-chave: Assistência farmacêutica. Decisões judiciais. Judicialização.

Medicamentos essenciais. Política nacional de medicamento.

1,3

Departamento de Ciências Farmacêuticas, Universidade Federal de Pernambuco.

2

Gerência de Planejamento e Execução de Demandas Judiciais - Superintendência de Assistência Farmacêutica da Secretaria Estadual de Saúde de Pernambuco.

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Justificativa

A cada ano, tem aumentado o número de ações judiciais que solicitam procedimentos, produtos e tratamentos; e muitas vezes estes são fornecidos pelo SUS e estão presentes na RENAME 2013. No caso dos medicamentos básicos que são de responsabilidade do Município, quando não estão disponíveis pra população podem gerar processos sobre o Estado, e caberão a ele todos os custos pelo cumprimento das ações.

Tendo em vista essa situação, é necessária a compreensão dos motivos da judicialização na saúde, a identificação dos medicamentos que estão como Demanda Judicial, e a quantificação da demandas/pacientes por Farmácia Regional de Pernambuco. Dessa forma será possível auxiliar os Municípios em sua gestão de aquisição, a contribuição com o acesso de medicamentos básicos à população pernambucana, podendo ocorrer um decréscimo nos processos de judicialização.

Objetivos

Objetivo geral:

 Analisar as demandas judiciais no Estado de Pernambuco que apresentam necessidades de medicamentos contidos na RENAME 2013.

Objetivos específicos:

 Identificar o número de demandas judiciais no Estado de Pernambuco de medicamentos contidos Relação nacional de medicamentos essenciais (RENAME 2013).

 Caracterizar medicamentos por Componentes: componentes básicos da assistência farmacêutica (CBAF), componente estratégico da assistência farmacêutica (CEsAF), componente especializado da assistência farmacêutica (CEAF) e insumos farmacêuticos.

 Identificar a influência dos custos do estado de Pernambuco na Farmácia de Ação Judicial com aquisição dos medicamentos contidos na RENAME 2013.

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1 BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos. Departamento de Assistência Farmacêutica e Insumos Estratégicos. Relação Nacional de Medicamentos Essenciais: Rename 2013 – 8. ed. – Brasília : Ministério da Saúde, 2013. 200 p.

Metodologia

Esse trabalho consiste em um estudo do tipo qualitativo exploratório e quantitativo analítico de corte transversal (abril de 2014), com dados primários e secundários. A pesquisa foi realizada na Gerência de Planejamento e Execução de Demandas Judiciais que pertence a Superintendência de Assistência Farmacêutica (SAF).

O alvo da pesquisa são as demandas de medicamentos contidos na RENAME 2013 de pacientes ativos em abril de 2014 da Farmácia de Ação Judicial do estado de Pernambuco. E as informações sobre as ações judiciais foram coletadas no relatório mensal da base de dados Sistema de Gestão da Assistência Farmacêutica (SisGAF) da Secretaria de Saúde do estado de Pernambuco.

Na primeira etapa foi feito uma caracterização dos produtos farmacêuticos da demanda judicial por grupos (medicamento, produtos para saúde, e produtos para nutrição) a fim de filtrar o desejado. E a partir da seleção dos medicamentos fez-se uma segunda filtragem com a caracterização dos medicamentos por componentes de acordo com a RENAME 2013.1 E para uma melhor compreensão dos dados trabalhados realizou-se uma pesquisa na literatura sobre os motivos das decisões judiciais no Brasil, e identificou-se a estrutura da Farmácia Judicial de PE para auxiliar na analise das demandas no estado.

Num segundo momentos realizou-se uma pesquisa sobre a influência gerada pela aquisição desses medicamentos na Farmácia de Ação Judicial em relação aos seus custos para o estado de Pernambuco. Essa análise levou em consideração o funcionamento das etapas do ciclo da assistência farmacêutica.

O programa Microsoft Office Excel® 2003 foi utilizado para o processamento dos dados, permitindo análise desses, a tabulação, cálculos, alem da montagem de tabelas e gráficos para facilitar a pesquisa.

Resultados

Para apoiar todos os 184 municípios de Pernambuco mais a ilha de Fernando de Noronha, foram criadas as 12 Gerências Regionais de Saúde (Geres). Cada uma dessas unidades administrativas da Secretaria Estadual de Saúde é responsável por uma parte das cidades, atuando de forma mais localizada na atenção básica, na reestruturação da rede hospitalar, nas ações municipais, no combate à mortalidade infantil e às diversas

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endemias. O modelo de gestão da Saúde permite que as particularidades de cada região recebam atenção na hora de decidir ações e campanhas.

O estado de PE é dividido em 12 regionais de saúde, onde 8 regionais absorvem as demandas judiciais da Assistência Farmacêutica. Sendo a sua estrutura em abril de 2014:

 Farmácia Especial Metropolitana - Recife;

 Farmácia PE unidades: Petrolina, Afogados da Ingazeira, Garanhuns, Caruaru, Salgueiro;

 Farmácia do Interior (realiza entrega domiciliar) – Limoeiro e Arcoverde;

 Oricuri e Serra Talhada – Tem Farmácia, mas não absorve demanda judicial;

 Palmares e Goiana – Não tem Farmácia do Estado.

Pode-se afirmar que as ações judiciais são um dos maiores desafios que os gestores estaduais do SUS enfrentam atualmente. Este tema tem sido objeto de inúmeras publicações que analisam a questão tanto sob o enfoque da saúde como do direito. Trata-se de uma questão complexa, multifacetada, que envolve múltiplos saberes, exigindo avaliação e análise que extrapolam os propósitos desta publicação. No entanto, é imprescindível que se promova o diálogo entre cidadãos, legisladores, gestores de saúde e operadores do direito para efetivar o direito à saúde pelo fortalecimento do SUS.

Baseada em pesquisas na literatura, observou-se que os motivos que levam a demanda judicial e que ocorrem em PE são:

 Usuário sem ou com baixo acesso a informação sobre como ser atendido;

 Medicamentos básicos constantes na RENAME não disponíveis na rede SUS – não aquisição dos municípios;

 Medicamentos do CEAF onde o usuário está fora dos critérios de inclusão do protocolo clínico e diretrizes terapêutica / MS;

 Medicamentos não constantes no SUS- RENAME 2013;

 Atuação da indústria farmacêutica nos serviços de saúde;

 Prescrições: produtos de marca, produtos importados, novas tecnologias em saúde – novos produtos não disponíveis no SUS.

 Medicamentos sem registro na ANVISA;

Uso “off label” - O uso é dito off label quando há indicação de uso que não consta na bula do medicamentos que foi registrado na ANVISA.

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2 Ana Luiza Chieffi, Rita Barradas Barata. Judicialização da política pública de assistência farmacêutica e eqüidade. Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, 25(8):1839-1849, ago, 2009.

É importante lembrar ainda que os pedidos judiciais podem se referir a receitas médicas que são compostas de vários itens, podendo essas receitas conterem medicamentos disponíveis pelos programas de assistência farmacêutica do SUS, explicando-se, assim, a sua presença nas demandas judiciais. Por exemplo, é comum uma prescrição de insulina especial estar associada à insulina humana NHP ou regular, ao ácido acetilsalicílico de 100mg e a uma atorvastatina ou sinvastatina.2

A partir do sistema obteve-se o dado de 2.994 Pacientes/reclamantes atendido (ativos no SisGAF) com ações judiciais contra o Estado de Pernambuco. Já o relatório mensal nos forneceu o número de 803 Produtos Farmacêuticos na Farmácia de Demanda Judicial.

Na caracterização por grupo encontrou-se: 677 Medicamentos (84,31%); 84 Produtos para saúde (10,46%); 42 Produtos para nutrição (5,23%);

E na caracterização dos 677 Medicamentos percebeu-se que 226 (33,38%) constam na RENAME 2013 e 451 (66,62%) não constam. Ou seja, um terço dos medicamentos da demanda judicial pertence à RENAME 2013.

Dos 226 da RENAME verificou-se que 94 são do Componente básico - CBAF (13,88%); 11 são do componente estratégico - CEsAF (1,62%); 121 são do componente especializado - CEAF (17,87); e 07 são Insumos Farmacêuticos (1,03%).

Sendo na verdade: 87 são somente CBAF; 04 são CBAF e CEsAF; 02 são CBAF e Insumos farmacêutico; 01 são CBAF, CEAF e Procedimento Hospitalar; 07 são apenas CEsAF; 120 são só CEAF; e 05 são exclusivamente Insumos Farmacêuticos. Já em relação aos custos, observou-se que as demandas judiciais interferem nas várias etapas do ciclo da assistência farmacêutica, principalmente na seleção e na aquisição. Esta última é dificultada, pois devido à emergência da demanda, muitas vezes não é possível comprar obedecendo à lei de licitações n. 8.666 de 1993, o que pode favorecer compras a preços elevados no mercado varejista, e grandes atrasos para atender ao paciente/reclamante.

Discussão

Em 1971, com a instituição da Central de Medicamentos (Ceme), teve início a Assistência Farmacêutica como política pública. Tinha como missão o fornecimento de medicamentos à população sem condições econômicas para adquiri-los e se caracterizava por manter uma política centralizada de aquisição e de distribuição de

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3 BRASIL. Decreto n. 68.806, de 25 de junho de 1971. Institui a Central de Medicamentos (Ceme). Diário Oficial da União, Brasília; 1971.

4 BRASIL. Conselho Nacional de Secretários de Saúde. Assistência Farmacêutica no SUS / Conselho Nacional de Secretários de Saúde. – Brasília: CONASS, 2011. 186 p. (Coleção Para Entender a Gestão do SUS 2011, 7)

medicamentos.3 Já em 1988, com a promulgação da Constituição Federal, foram introduzidas mudanças de princípios. No Art. 6º estabeleceu a saúde como direito social. E o Art. 23 estabeleceu seu cuidado como competência comum da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios. O Art. 196 estabelece que:

A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação (BRASIL, 1988, p.154).4

Após algumas discussões sobre o direito a saúde, foi estabelecida a Política Nacional de Medicamentos (PNM), publicada pela Portaria GM/MS n. 3916, em 1998.5 Essa Política estabelece diretrizes e prioridades na regulamentação sanitária, no gerenciamento de medicamentos e na organização e gestão da Assistência Farmacêutica no Sistema único de Saúde (SUS), tendo como finalidades principais: garantia da necessária segurança, da eficácia e da qualidade dos medicamentos, promoção do uso racional dos medicamentos; acesso da população àqueles medicamentos considerados essenciais. Esses objetivos, segundo a própria PNM podem ser alcançados com: adoção da Relação de Medicamentos Essenciais, regulamentação sanitária de medicamentos, reorientação da Assistência Farmacêutica, promoção do uso racional de medicamentos, desenvolvimento científico e tecnológico, promoção da produção de medicamentos, garantia da segurança, eficácia e qualidade dos medicamentos, e desenvolvimento e capacitação de recursos humanos.

Um aspecto importante a ser mencionado em relação à PNM é a explicitação do caráter sistêmico e multidisciplinar da Assistência Farmacêutica, definindo-a como:

Grupo de atividades relacionadas com o medicamento, destinadas a apoiar as ações de saúde demandadas por uma comunidade. Envolve o abastecimento de medicamentos em todas e em cada uma de suas etapas constitutivas, a conservação e o controle de qualidade, a segurança e a eficácia terapêutica dos medicamentos, o acompanhamento e a avaliação da utilização, a obtenção e a difusão de informação sobre medicamentos e a educação permanente dos

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5 Ministério da Saúde. Secretaria de Políticas de Saúde. Departamento de Atenção Básica. Política Nacional de Medicamentos, de 1998. 6ª Reimpressão. 40p. Il - (Série C. Projetos, Programas e Relatórios, n. 25). Brasília: Ministério da Saúde, 2002a.

6 Conselho Nacional de Saúde. Resolução n. 338, de 6 de maio de 2004. Aprova a Política Nacional de Assistência Farmacêutica. Diário Oficial da União, Poder Executivo, Seção 1, n. 96, 20 de maio de 2004. Brasília: Ministério da Saúde, 2004c.

7 BRASIL. Conselho Nacional de Secretários de Saúde. Assistência Farmacêutica no SUS / Conselho Nacional de Secretários de Saúde. – Brasília : CONASS, 2011.

profissionais de saúde, do paciente e da comunidade para assegurar o uso racional de medicamentos.5

Em 2003, na I Conferência Nacional de Medicamentos, foi realizado com a um amplo debate sobre a Assistência Farmacêutica e, com base nas propostas desse debate, o Conselho Nacional de Saúde (CNS) aprovou e publicou a Resolução CNS n.338, de 6 de maio de 2004, que estabelece a Política Nacional de Assistência Farmacêutica (PNAF), definindo-a como:

Um conjunto de ações voltadas à promoção, proteção e recuperação da saúde, tanto individual como coletiva, tendo o medicamento como insumo essencial e visando o acesso e seu uso racional. Este conjunto envolve a pesquisa, o desenvolvimento e a produção de medicamentos e insumos, bem como a sua seleção, programação, aquisição, distribuição, dispensação, garantia da qualidade dos produtos e serviços, acompanhamento e avaliação de sua utilização, na perspectiva da obtenção de resultados concretos e da melhoria da qualidade de vida da população.6

No Pacto de Gestão (instituído por meio da Portaria GM/MS n. 399, de 22 de fevereiro de 2006) definiu-se que o financiamento referente à Assistência Farmacêutica é de responsabilidade dos três gestores do SUS. O financiamento da Assistência Farmacêutica é de responsabilidade das três esferas de gestão do SUS e pactuado na Comissão Intergestores Tripartite (CIT). A forma de transferência dos recursos financeiros federais foi regulamentada pela Portaria GM/MS n. 204, de 29 de janeiro de 2007 e atualizada pela Portaria GM/MS n. 837/2009; estabelecendo o bloco de financiamento da Assistência Farmacêutica, constituído por três componentes: o componente básico, o componente estratégico e o componente especializado.7

Uma das questões cruciais no SUS é assegurar o acesso a medicamentos considerando que estes insumos são uma intervenção terapêutica muito utilizada, impactando diretamente sobre a resolubilidade das ações de saúde. Isto inclui o acesso a medicamentos do componente básico da assistência farmacêutica. Componente básico

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8 Sant’ana et al. Racionalidade terapêutica: elementos médico-sanitários nas demandas judiciais de medicamentos. Rev Saúde Pública 2011;45(4):714-21.

9 Lei Federal n. 8.666, de 21 de junho de 1993. Regulamenta o Art. 37, inciso XXI, da

Constituição Federal, institui normas para licitações na administração pública e dá outras providências. Diário Oficial da União, n. 116, seção 1, p.8269-8281, 21 de julho de 1993.

da assistência farmacêutica destina-se à aquisição de medicamentos e insumos no âmbito da Atenção Primária em saúde e àqueles relacionados a agravos e programas de saúde específicos, inseridos na rede de cuidados deste nível de atenção.

Mesmo com o crescente avanço no acesso aos medicamentos no SUS, observa-se também um aumento na procura por observa-seu fornecimento através da demanda judicial. Estas vão desde os medicamentos básicos, não incluídos na Relação Nacional de Medicamentos Essenciais (RENAME), até medicamentos prescritos para indicações não previstas em bula, experimentais e sem registro no país.

A RENAME deve orientar as ações de planejamento, seleção de medicamentos e de organização da assistência farmacêutica no SUS, em todos os níveis de atenção. Não é a lista oficial de todos os medicamentos fornecidos pelo setor público, nem somente daqueles destinados à atenção básica. Contudo, Sant’ana et al também enfatizam que o conceito de medicamento essencial prevê a necessidade de medicamentos não contemplados nas listas, desde que clínica e farmacologicamente justificável, para atender condições patológicas específicas não previstas.8

Basicamente, as gerências ou coordenações estaduais têm a responsabilidade de coordenar as atividades relacionadas ao ciclo da Assistência Farmacêutica, que abrange a seleção, programação, aquisição, armazenamento, distribuição e dispensação de medicamentos, além do acompanhamento, da avaliação e da supervisão das ações.

A seleção deve ser realizada por uma Comissão ou Comitê de Farmácia e Terapêutica (CFT) ou Comissão de Padronização de Medicamentos, com o objetivo de estabelecer relações nacionais, estaduais e municipais de medicamentos, definindo aqueles que serão disponibilizados pelo SUS para a Atenção Primária, e para a atenção de média e alta complexidade.

A aquisição envolve diferentes setores técnicos e administrativos e deve ser permanentemente qualificada, considerando os aspectos jurídicos (cumprimento das formalidades legais), técnicos (atendimento às especificações técnicas), administrativos (cumprimento dos prazos de entrega) e financeiros (disponibilidade orçamentária e financeira e avaliação do mercado). Além das prerrogativas legais estabelecidas pela Lei 8.666 e suas atualizações9, a Lei n. 9.787/1999 determina que:

‘as aquisições de medicamentos, sob qualquer modalidade de compra, e as prescrições médicas e odontológicas de medicamentos, no âmbito do SUS, adotarão obrigatoriamente a

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10 Ministério da Saúde. Lei 9.787, de 10 de fevereiro de 1999. Altera a Lei n. 6.360, de 23 de setembro de 1976, que dispõe sobre a vigilância sanitária estabelece o medicamento genérico, dispõe sobre a utilização de nomes genéricos em produtos farmacêuticos e dá outras providências. Diário Oficial da União; Poder Executivo, de 11 de fevereiro de 1999.

11 Lei Federal n. 8.080/90. Dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação e o funcionamento dos serviços correspondentes e dá outras providências. Diário Oficial da União, Poder Executivo, Brasília, 20 set. 1990.

12 DANTAS et al. Manual de Atuação do Ministério Público Federal em Defesa do Direito à Saúde. Brasília: Escola Superior do Ministério Público da União, Brasília: 2005. 107p.

Denominação Comum Brasileira (DCB) ou, na sua falta, a Denominação Comum Internacional (DCI)’ (artigo 3º), sendo que, ‘nas aquisições de medicamentos a que se refere o caput desse artigo, o medicamento genérico, quando houver, terá preferência sobre os demais em condições de igualdade de preço’.10

A fundamentação jurídica das ações judiciais que tramitam nas secretarias estaduais de saúde (SES) para fornecimento de medicamentos está baseada na garantia do direito à saúde e à vida. Ao organizar o SUS, a Lei n. 8080, de 1990, em dispositivo do Capítulo I, dos Objetivos e Atribuições do SUS, estabelece, no artigo 6º que:

“Estão incluídas ainda no campo de atuação do Sistema Único de Saúde (SUS):

I – a execução de ações: ...

d) de assistência terapêutica integral, inclusive farmacêutica”.11

No entanto, outros fatores estão envolvidos com as ações judiciais. Sobre o tema, manifesta-se o Ministério Público Federal:

A demanda por medicamentos tem se expressado no crescente número de ações judiciais individuais e coletivas, sobretudo as individuais. Os estudos sobre o tema ressaltam, em geral, o impacto negativo deste aumento exponencial para a gestão, o orçamento público e o uso racional dos procedimentos terapêuticos. O debate atual tem dado especial atenção para as ordens judiciais que determinam o pagamento ou o fornecimento imediato pelos gestores do SUS, de determinado medicamento e/ou procedimento não disponibilizados pelo sistema público de saúde brasileiro, ou de uso não autorizado no Brasil.12

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13 SCHEFFER, M.; SLAZAR, A. L.; GROU, K. B. O Remédio via Justiça: um estudo sobre o acesso a novos medicamentos e exames em HIV/Aids no BRASIL por meio de ações judiciais. Série Legislação Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Programa Nacional de DST e Aids. Brasília: Ministério da Saúde, 2005.

14 Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Programa Nacional de DST/Aids. O Remédio via Justiça. Um estudo sobre o acesso a novos medicamentos e exames em HIV/AIDS no Brasil por meio de ações judiciais. Ministério da saúde, Secretaria de Vigilância em Saúde, Programa Nacional de DST e Aids. Brasília: Ministério da Saúde, 2005a 136p.

15 Conselho Nacional de Secretários de Saúde. CONASS documenta 5. Assistência Farmacêutica: Medicamentos de Dispensação em Caráter Excepcional. Conselho Nacional de Secretários de Saúde Brasília: CONASS, 2004.

16 GANDINI, J. A. D.; BARIONE, S. F.; SOUZA, A. A judicialização do direito à saúde: a obtenção de atendimento médico, medicamentos e insumos por via judicial – critérios e experiências. Brasília, DF: BDJur, 2008.

17 Vera Lúcia Edais Pepe et al. A judicialização da saúde e os novos desafios da gestão da assistência farmacêutica. Ciência & Saúde Coletiva, 15(5):2405-2414, 2010.

No SUS, as primeiras ações judiciais para fornecimento de medicamentos estavam relacionadas, principalmente, ao acesso a medicamentos antirretrovirais para o tratamento da Aids. A partir de 1996, com a introdução da terapia combinada para o tratamento da Aids, o número de ações judiciais para fornecimento desses medicamentos aumentou significativamente e teve grande impacto no orçamento público, chegando a consumir em uma Unidade da Federação, no ano de 2001, cerca de 80% do orçamento estadual previsto para a compra de medicamentos.13,14

Nas secretarias estaduais de saúde essas ações demandavam o acesso a medicamentos de alto custo ou de difícil acesso. Levantamentos feitos pelo CONASS junto às SES mostram que os medicamentos demandados judicialmente vão se alterando ao longo do tempo. Assim, em 2003, a maior parte dos medicamentos solicitados estavam relacionados ao tratamento da hepatite viral crônica C, doença de Alzheimer, doença de Parkinson, fibrose cística, esclerose múltipla, Aids, doença de Gaucher e asma. Atualmente, as demandas estão relacionadas, principalmente, ao fornecimento de medicamentos para a área oncológica e para doenças de origem genética.15

A ampliação do acesso à justiça e a lentidão do processo de efetivação dos direitos fundamentais sociais deu origem ao fenômeno da judicialização. Entre eles, está o direito à saúde e à assistência farmacêutica.16

Não existem estatísticas nacionais representativas sobre as demandas judiciais. Esta demanda tem tido papel importante como via alternativa do cidadão ao acesso a medicamentos no SUS.

Três características comuns encontradas nos estudos realizados em diferentes estados e municípios17:

1 - A maioria dos pedidos é individual e são deferidas considerando apenas a prescrição médica.

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2- Sobre os medicamentos citados, alguns já constam nas listas da assistência farmacêutica, outros não.

3 - Em todos os estado e municípios pesquisados há um crescimento da demanda e dos gastos com medicamentos.

As demandas judiciais interferem no ciclo da assistência farmacêutica. Sendo na seleção, ao desconsiderar a importante etapa que elenca os produtos que devem compor as listas oficiais. E na aquisição também é dificultada, pois, devido à emergência da demanda muitas vezes, não é possível comprar obedecendo à lei de licitações n. 8.666 de 1993, o que pode favorecer compras a preços elevados no mercado varejista.

A cada ano, tem aumentado o número de ações judiciais que solicitam procedimentos, produtos e tratamentos; e muitas vezes estes são fornecidos pelo SUS e estão presentes na RENAME 2013. No caso dos medicamentos básicos que são de responsabilidade do Município, quando não estão disponíveis pra população podem gerar processos sobre o Estado, e caberá a ele todos os custos pelo cumprimento das ações.

Tendo em vista essa situação, é necessária a compreensão dos motivos da judicialização na saúde, a identificação dos medicamentos do CBAF que estão como Demanda Judicial, e a quantificação da demandas/pacientes por Farmácia Regional de Pernambuco. Dessa forma será possível auxiliar os Municípios em sua gestão de aquisição, a contribuição com o acesso de medicamentos básicos à população pernambucana, podendo ocorrer um decréscimo nos processos de judicialização.

É consenso que o uso da via judicial para o fornecimento de medicamentos presentes nas listas oficiais públicas é uma forma legítima de garantir o pleno exercício do direito à assistência individual terapêutica, que integra o direito à saúde na lei brasileira. Os problemas de gestão da AF relacionados à judicialização da saúde não se restringem à entrega de medicamentos incorporados ou não nas listas oficiais públicas.

Há características específicas desta demanda, que vem exigindo um tipo de atuação do gestor, administrativa e judicial, diferenciada para responder às ordens judiciais, evitar o crescimento de novas demandas e preservar os princípios e as diretrizes do SUS. Um exemplo é o fato de praticamente todos os pedidos judiciais formulados terem concessão de tutela antecipada (liminar). Esta concessão implica a determinação de entrega imediata do medicamento pelo gestor, sem que este seja ouvido anteriormente sobre o pedido do reivindicante, e tem gerado dificuldades na

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18 Portaria nº 1.555, de 30 de julho de 2013. Dispõe sobre as normas de financiamento e de execução do Componente Básico da Assistência Farmacêutica no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). Diário Oficial da União, Poder Executivo, 31 de julho de 2013.

gestão da AF para o cumprimento da ordem judicial, ao mesmo tempo em que é necessário atender à demanda ordinária do sistema de saúde.

Diante da realidade das demandas judiciais visualiza-se que a fragilidade no acesso a medicamentos básicos tem gerado indicadores de saúde não satisfatórios devido à restrição do acesso pelo poder judiciário. Essa fragilidade dos municípios na garantia dos medicamentos básicos tem como conseqüência a judicialização.

Possíveis causas para essa judicialização é a não padronização do município; problemas no processo de aquisição; irregularidades no abastecimento; baixa cobertura na rede de atenção básica, entre outros motivos.

Segundo a Portaria 1.555/13, o financiamento (por hab./ano) deve ser18:

 CP Federal – R$ 5,10

 CP Estadual (LAFEPE) – R$ 2,36

 CP Municipal – R$ 2,36

Onde qualquer erro no repasse desse financiamento, ou uso inapropriado desse recurso pode gerar ações contra o Estado. E dessa forma ocorrerá custos extra que podem ser diretos ou indiretos. Os diretos são devido à aquisição dos medicamentos que são de sua responsabilidade. E os indiretos pelo gasto com estrutura de pessoal, logística, e outros.

O custo anual direto em medicamentos básicos pode não ser tão significativo se comprado a outros gastos do Estado. No entanto, é um dinheiro que poderia está sendo usado em outras áreas da saúde, como o pagamento que mais profissionais em hospitais do governo. Além do fato que os pacientes também possuem, muitas vezes, custos altos para o recebimento desse medicamento, quando na verdade deveria ter o acesso fácil em seu próprio município.

Conclusões

Um número expressivo de demandas judiciais do estado de Pernambuco está representado por medicamentos constantes na RENAME 2013, o que talvez seja devido ao não cumprimento dos municípios no fornecimento desses medicamentos a população. Essa situação provoca a judicialização destes produtos para o estado que muitas vezes não é o responsável por eles, como é o caso dos medicamentos básicos por diversos motivos como: não padronização do município; problemas no processo de aquisição; irregularidades no abastecimento; baixa cobertura na rede de atenção básica.

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Esse fato implica em custos ao tesouro estadual por algo que deveria ser obtido normalmente por um valor mais baixo no mercado, além das multas por atraso. Essa judicialização também gera transtornos e custos a população que tem direito a ter acesso aos medicamentos básicos em seu próprio município.

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