1
Normas de Boas Práticas em Acupunctura Médica
OBJECTIVO
O presente documento visa estabelecer as normas de boas práticas clínicas no âmbito do exercício da Acupunctura Médica a serem observadas pelos médicos com formação pós-graduada e competência nesta área.
A Acupunctura Médica constitui uma área específica do saber médico e assume-se como terapêutica complementar, não substituindo, mas complementando a Medicina Convencional e representando uma mais-valia na abordagem integral do doente. A Ordem dos Médicos considera a Acupunctura, pela sua especificidade e complexidade clínica, como uma Competência Médica, estando a sua formação técnico-científica e a creditação profissional regulamentada pela Comissão da Competência em Acupunctura Médica
Assim sendo, definem-se os princípios básicos no exercício da Acupunctura Médica que regem a prática ética e profissional do Médico com a Competência em Acupunctura Médica.
DO MÉDICO:
A prática da Acupunctura Médica deverá pautar-se a par de elevado rigor científico, de elevado padrão de profissionalismo e de ética face ao doente e à relação inter-pares
1- A obtenção da Competência em Acupunctura Médica pela Ordem dos Médicos é fundamental para garantir padrões de qualidade no exercício da Acupunctura Médica.
2- Cabe ao Médico, fazendo conhecimento das possíveis abordagens médicas e de acordo com a melhor evidência médica disponível, avaliar se a patologia do doente beneficiará com tratamento de acupunctura.
3- Deverá a Acupunctura ser encarada como terapêutica complementar a outras medidas terapêuticas, pelo que o médico deverá propor ao doente a orientação terapêutica indicada à sua patologia.
4- Deverá o médico referenciar o doente à especialidade que melhor promova a abordagem da sua patologia
5- Compete ao médico informar o doente, se é expectável a Acupunctura promover um benefício absoluto ou relativo da sua patologia
6- Não deverá o médico criar ao doente falsas expectativas nos resultados a alcançar com a Acupunctura e deverá informar, se disponíveis, quais os resultados clínicos estatisticamente previsíveis.
2 CONDIÇÕES ESPECIAIS:
Com o objectivo de promover a segurança da Acupunctura deverão ser observadas as seguintes normas de conduta:
1. Nas situações que constituam contra-indicações relativas ou absolutas à punctura, tais como, no doente anti coagulado ou com alterações da coagulação, deverão ser ponderados individualmente os riscos/ benefícios. 2. A Electroacupunctura em doente com pacemaker é considerada segura
desde que o circuito eléctrico se restrinja aos membros ou face posterior do tronco, não devendo esse mesmo circuito atravessar a região pré-cordial ou a face anterior do tronco. É considerado desejável que nos casos de aplicação de electro-acupunctura o médico se encontre presente durante todo o tratamento.
3. Em doentes com Cardio Desfibrilhadores Implantados (CDIs) a Electro acupunctura deverá ser apenas realizada se fôr a única terapêutica eficaz para o tratamento das queixas do doente. Nos desfibrilhadores intracardíacos, todo o tronco deverá ser excluído do circuito eléctrico. A primeira sessão deverá ser realizada com o CDI com a função de desfibrilhação desligada estando o doente com o ritmo cardíaco monitorizado. Deverá ser reproduzido o protocolo de tratamento de electro acupunctura. Caso não se verifiquem interferências com o funcionamento do CDI, o tratamento poderá então ser efectuado, desde que estejam reunidas condições para suporte avançado de vida durante o decurso do tratamento. Deverá durante todo o tratamento, o doente estar sob a vigilância presencial do médico.
4. É contra-indicação absoluta a passagem de corrente na região pré-cordial. No triângulo cervical anterior é absolutamente proibido a passagem de corrente eléctrica. Quando se efectuar EA na região cervical, o circuito eléctrico não deverá atravessar o triângulo cervical anterior.
5. Nos casos de epilepsia mal controlada, o tratamento deve ser efectuado com precaução, devendo os doentes estar sempre acompanhados pelo médico. A utilização de electroacupunctura exige maior atenção dado que a ocorrência de uma crise convulsiva, mesmo ligeira, pode ser entendida como a causa desencadeante
6. Infecções fúngicas e bacterianas da pele constituem contra-indicação à punctura destes locais. Nas infecções em locais distantes à punctura, deverão ser observadas as medidas de higiene para impedir potencial risco de contágio.
3 7. Particular atenção deverá ser dada aos doentes imunocomprometidos, pelo risco de septicemia e aos doentes com patologia valvular, pelo risco de endocardite.
8. Os edemas e linfedemas, por risco de sobre infeção, não deverão ser puncturados.
9. A Acupunctura deverá ser realizada com precaução e só se for considerada a melhor opção terapêutica, já que constitui risco acrescido de lesão para o médico e doente, nas seguintes comorbilidades:
a ) Doentes com patologia psiquiátrica descompensada b) Doentes com elevado grau de ansiedade
c ) Doentes com défice cognitivo d) Doentes com fobia de agulhas
10. Deverá ser sempre obtido o consentimento informado do doente antes do início do tratamento. A ausência deste acordo ou a sua realização em doente não informado da técnica, constituem exercício clínico eticamente incorrecto e má prática clínica
11. A Acupunctura não deverá ser realizada em crianças, em que apesar da autorização de progenitor ou tutor legal, não seja obtida a sua colaboração
DO EQUIPAMENTO:
Deverão ser observados os princípios relativos à segurança, ergonomia e higiene na prática da Acupunctura:
1 – Gabinete de Tratamento
Deverá ser aplicada a legislação em vigor que rege este espaço físico. 2 – Condições de higiene:
Deverão ser aplicados os cuidados básicos observados em qualquer tratamento médico, salientando-se em particular;
a) As agulhas a utilizar serão sempre descartáveis.
Na selecção das agulhas a utilizar deve ser considerado como factor preferencial de escolha a que melhor se adequa à área e local a tratar, minimize o trauma tecidular e maximize o conforto do doente
b) A manipulação das agulhas deverá observar o máximo rigor de forma a evitar ao médico puncturas acidentais
c) Todas as agulhas utilizadas serão tratadas como lixo biológico e deverão ser enviadas para tratamento adequado.
d) O sangue que pode surgir após a exteriorização das agulhas deverá ser sempre considerado potencialmente contagioso, pelo que o médico deverá observar as medidas necessárias à sua protecção.
4 e) Acidentes que impliquem punctura do médico ou de outros com agulha utilizada previamente pelo doente deverão ser documentados e proceder-se à profilaxia apropriada.
DOS PRECEITOS MÉDICOS:
O médico deverá pautar a sua conduta clínica baseado nos princípios gerais de boas práticas no exercício da actualização permanente do conhecimento médico
1. Compete ao Médico estabelecer um diagnóstico clínico da patologia do doente e do benefício da Acupunctura
2. Para tal, deverá proceder a história clínica, exame objectivo, diagnóstico e plano terapêutico
3. Mesmo nas situações de doentes referenciados para a realização de acupunctura, deverá o médico validar o diagnóstico e a indicação desta 4. Em doentes referenciados deverá dar retorno do plano de tratamento
proposto e dos resultados obtidos.
5. Deverá ter implementado na primeira consulta um registo de avaliação clínica, escala de dor e escala de função, quando aplicável, e plano terapêutico, de forma a objectivar resultados obtidos
6. Deverá informar o doente do plano terapêutico e obter a sua concordância.
7. Deverá obter do doente a aceitação da duração e periodicidade dos tratamentos de forma a garantir a optimização dos resultados. Um registo dos locais puncturados ao longo do tratamento deverá ser conservado, bem como do tempo de permanência das agulhas nos tecidos, e a manipulação ou estimulação eléctrica efectuada, devendo ser anotados os parâmetros dessa estimulação (frequência, intensidade, tempo). Poderão ser também registados os efeitos locais observados a ) Metodologia
Cabe ao médico estabelecer um plano sistematizado na abordagem da patologia do doente, que deverá adaptar às particularidades da patologia e à individualidade de cada doente. Sugerem-se no entanto algumas atitudes no exercício desta actividade:
1. A aplicação da Acupunctura no tratamento de patologias deverá ser encarada como uma mais-valia na optimização dos resultados, não devendo prolongar-se indefinidamente. Constitui má prática a manutenção indefinida de um protocolo de tratamento sem resultados previsíveis.
2. Deverá o médico estabelecer o plano de tratamentos e comunicá-lo ao doente:
5 O número de sessões será variável em função da situação clínica e da resposta individual do doente.
Por norma, um limite de 6 sessões constitui um valor consensual para definir a resposta ao tratamento. Caso neste período não se verifique melhoria do quadro clínico, deverá esta técnica ser reavaliada.
3. Caso se verifique uma resposta positiva ou o doente a reporte, poderá esta técnica ser prolongada de acordo com os resultados obtidos, considerando-se que uma média total de 12 sessões será adequada.
4. A periodicidade das sessões é definida de acordo com a situação clínica e período de evolução dos sintomas.
É consensual no início do tratamento que o período entre os tratamentos não ultrapasse uma semana.
5. Após terminar o protocolo de tratamento inicial, e de acordo com a situação clínica individual, poderão ser realizadas novas sessões de tratamento, com a periodicidade adequada.
b ) Prática clínica
Será a prática clínica a determinar a experiência em Acupunctura de cada médico. No entanto, como norma orientadora, alguns princípios devem ser observados:
1. A sedação, sonolência ou sensação de tontura poderão ser efeitos possíveis da Acupunctura durante as primeiras sessões. Em particular risco está a população geriátrica.
Igualmente, doentes particularmente sensíveis poderão referir exacerbação transitória das queixas álgicas.
Como tal constitui boa prática:
a) Informar o doente dos efeitos adversos expectáveis da Acupunctura e Electroacupunctura, esclarecendo da sua transitoriedade e da diminuição da sua relevância ao longo do tratamento.
b) Informar o doente da necessidade de vir acompanhado, para minimizar riscos no transporte após o tratamento.
2. Duração média de cada sessão:
a) Na generalidade das sessões clínicas, considera-se como de máximo benefício terapêutico a duração de tratamento de 20 a 30 minutos, quer as agulhas permaneçam com manipulação manual, quer seja utilizado Electroacupunctura.
6 Atendendo a que a aplicação das agulhas poderá implicar num profissional treinado cerca de 10 minutos, considera-se como tempo médio de tratamento 40 minutos, não incluindo neste tempo a avaliação clínica prévia e posterior ao tratamento. b) Caso se recorra a Electroacupunctura, é fundamental que o
médico tenha o conhecimento detalhado dos efeitos fisiológicos das diferentes correntes eléctricas para a optimização de resultados.
3. Requisitos de segurança:
a) A colocação de agulhas deverá ser realizada em posição de decúbito dorsal ou ventral para maior segurança do doente. Poderá no entanto também realizar-se em posição de sentado, se esta for a mais segura para abordar determinados pontos da região dorsal. No entanto, deve ser assegurado que esta posição possa ser facilmente revertida para decúbito.
b) A marquesa obedece a requisitos especiais, devendo: Ser confortável para o doente durante o tratamento. Possibilitar apoio de cabeça quando em posição de decúbito ventral
Posicionar-se a uma altura que permita ao médico trabalhar numa posição anatomofisiológica correcta e que evite acidentes ao doente.
c) Deverão ser posicionadas e protegidas áreas anatómicas de forma a evitar estiramento de estruturas vasculo-nervosas. d) Durante toda a duração do tratamento deverá o doente estar
acompanhado, quer pelo médico, quer por profissional de saúde conhecedor das particularidades da Acupunctura. Na sua ausência será garantido que o doente possa comunicar qualquer desconforto e que o médico possa de imediato monitorizar o tratamento.
CONCLUSÃO
Pretende este manual de boas práticas ser um guia orientador da prática da Acupunctura Médica. Não pretende impor ou substituir a actividade médica, desde que esta seja promovida baseada no correcto julgamento clínico e na experiência profissional, fundamentada pelo domínio científico da Acupunctura e pelo
7 Bibliografia
1 - British Medical Acupuncture Society Guide of Practices and Complaints,
http://www.medical-acupuncture.co.uk/Default.aspx?tabid=89 , acedido em 10-11-11
2 - White,A, Cummings,M, Filshie, J - An introduction to Western Medical Acupuncture.2008 - 127-161
3 – Thompson JW, Cummings M; Investigating the safety of electroacupuncture with a picoscope, Acupuncture in Medicine 2008; 26; 133-139
4 – Crosley et al; The Heart Rhythm Society Expert Consensus Statement on the perioperative management of patients with implantable defibrillators, pacemakers and arrhythmia monitors: Facilities and patient management; Heart Rhythm. 2011 Jul;8(7):1114-54