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A defesa da concorrência e o princípio da eficiência administrativa

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Academic year: 2021

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE

CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS

DEPARTAMENTO DE DIREITO PÚBLICO

TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO

MAX TORQUATO FONTES VARELA

A DEFESA DA CONCORRÊNCIA E O PRINCÍPIO DA

EFICIÊNCIA ADMINISTRATIVA

ORIENTADOR: Prof. Dr. OTACÍLIO DOS SANTOS SILVEIRA NETO

NATAL/RN

2017

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MAX TORQUATO FONTES VARELA

A DEFESA DA CONCORRÊNCIA E O PRINCÍPIO DA

EFICIÊNCIA ADMINISTRATIVA

Monografia apresentada ao Programa de

Pós-Graduação em Direito da Universidade Federal do

Rio Grande do Norte, como requisito para a

conclusão do Curso de Especialização e Direito

Administrativo.

NATAL/RN

2017

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Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN. Sistema de Bibliotecas - SISBI.

Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN - Biblioteca Setorial do CCSA. Varela, Max Torquato Fontes.

A defesa da concorrência e o princípio da eficiência administrativa / Max Torquato Fontes Varela. - 2017.

65.: il.

Monografia (Especialização em Direito Administrativo) - Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Centro de Ciências Sociais Aplicadas, Programa de Pós-Graduação em Direito. Natal, RN, 2017.

Orientador: Prof. Dr. Otacílio dos Santos Silveira Neto.

1. Direito Administrativo - Monografia. 2. Defesa da Concorrência – Monografia. 3. Sistema Brasileiro - Defesa da Concorrência - Monografia. 4. Conselho Administrativo - Defesa Econômica - Monografia. 5. Eficiência Administrativa - Monografia. I. Silveira Neto, Otacílio dos Santos. II. Universidade Federal do Rio Grande do Norte. III. Título.

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SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO...3

2. A DEFESA DA CONCORRÊNCIA NO

BRASIL...5

2.1. ASPECTOS HISTÓRICOS E CENÁRIO

ATUAL...5

2.2. SISTEMA BRASILEIRO DE DEFESA DA CONCORRÊNCIA. DESTAQUE

PARA A REPRESSÃO AOS CARTÉIS E PARA AS NORMAS DO COMPLIENCE COMO EXEMPLOS DE REPRESSÃO E PREVENÇÃO ÀS INFRAÇÕES CONCORRENCIAIS...11

2.2.1. OBSERVAÇÕES SOBRE A REPRESSÃO AO

CARTÉIS...20

2.2.2. OBSERVAÇÕES SOBRE O MÉTODO DO

COMPLIANCE...25

2.3. CONCLUSÕES

INTERLOCUTÓRIAS...26

3. O PRINCÍPIO DA EFICIÊNCIA ADMINISTRATIVA NO

BRASIL...29

3.1. A NORMATIVIDADE DOS PRINCÍPIOS NO

BRASIL...29

3.2. PRINCÍPIO DA

EFICIÊNCIA...33

4. NECESSIDADE DE APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA EFICIÊNCIA ADMINISTRATIVA NOS ÓRGÃOS DA DEFESA DA CONCORRÊNCIA NO BRASIL...39

4.1. DEFESA DA CONCORRÊNCIA COMO INSTRUMENTO AO

DESENVOLVIMENTO...45

4.2. DEFESA DA CONCORRÊNCIA COMO UM DEVER DO

ESTADO...49

5. CONCLUSÃO...60 REFERÊNCIAS...62

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A DEFESA DA CONCORRÊNCIA E O PRINCÍPIO DA

EFICIÊNCIA ADMINISTRATIVA

No presente trabalho busca-se fazer uma contextualização entre o direito concorrencial brasileiro e seu sistema de defesa da concorrência e a necessidade da aplicação da norma da eficiência administrativa nos órgãos de defesa da concorrência no Brasil. Para tanto, analisa-se primeiramente os aspectos históricos da defesa da concorrência no Brasil até se chegar ao cenário atual com um moderno Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência - SBDC. A monografia busca como objetivo demonstrar a importância de se aplicar o princípio da eficiência administrativa no Brasil, com sua inconteste força cogente, aos órgãos do SBDC, principalmente o Conselho Administrativo de Defesa Econômica – CADE, para, com isso, a defesa da concorrência, que é considerada no texto como um monopólio da atividade administrativa estatal, se consolidar como um instrumento de desenvolvimento econômico e social no país.

Palavras-chave: Defesa da Concorrência. Sistema Brasileiro de Defesa da

Concorrência. Conselho Administrativo de Defesa Econômica. Eficiência Administrativa.

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DEFENSE OF COMPETITION AND THE PRINCIPLE OF ADMINISTRATIVE EFFICIENCY

This paper seeks to contextualize the Brazilian competition law and its system of defense of competition and the need to apply the rule of administrative efficiency in defense agencies in Brazil. To do so, we first analyze the historical aspects of the defense of competition in Brazil until we reach the current scenario with a modern Defense of Competition Brazilian System. The objective of the monograph is to demonstrate the importance of applying the principle of administrative efficiency in Brazil, with its undisputed cogent force, to these Sistem bodies, especially the for Economic Defense Administrative Council in order to defend competition, which is considered in the text as a monopoly of state administrative activity, to consolidate itself as an instrument of economic and social development in the country.

Keywords: Defense of competition. Competition Defense Brazilian System.

Administrative Economic Defense Administrative Council. Administrative Efficiency Rule.

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1. INTRODUÇÃO

Há diversas maneiras de se iniciar a redação de um texto, contudo, há apenas uma forma de começar a conhecer qualquer objeto que se pretenda, qual seja: por meio do corte.

O ato de se fazer cortes metodológicos é operação tão basilar que muitas vezes se faz sem se dar conta disso. Tudo aquilo que se chega ao sentido humano é limitado. Por exemplo, não importa a gigantesca gama de sons que exista no mundo natural, aos ouvidos do homem só são perceptíveis sete oitavas, assim como aos seus olhos só são perceptíveis luzes emitidas a certas frequências, pelo que não se permite observar mais distante que alguns quilômetros e coisas menores que alguns milímetros.

Se de um lado o corte se apresenta como limite da condição humana de absorver toda a complexidade do mundo, do outro lado, delimitar algo dentro da imensa gama de coisas existentes no mundo natural, permite ao sujeito se deter sobre objeto que queira e conhece-lo mais afundo. Sendo assim, “viver é recortar o mundo”, conforme escreveu Pontes de Miranda1, citado por Lucas Galvão de Britto.

Antes de introduzir o objeto de estudo desta pesquisa, importa explanar que este trabalho, realizado a partir de pesquisas bibliográficas, utilizou doutrina especializada em livros e artigos científicos, legislação geral e específica e casos concretos, assim como informações veiculadas em outras fontes como revistas jurídicas e internet, com o objetivo de identificar alguns aspectos relevantes do direito da concorrência brasileiro e os relacionar com o princípio da eficiência no Brasil.

Para tanto, o processo de pesquisa iniciou-se com uma abordagem histórica do direito da concorrência no Brasil, chegando-se ao seu cenário atual, levando em conta a evolução do direito antitruste até os dias de hoje, que se apresenta com um moderno e engendrado Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência. Ainda, é feita a seleção do cartel, como emblemática infração à concorrência e do compliance importante instituto de prevenção às lesões à concorrência, o que se expôs no Capítulo 2 e seus tópicos.

1 PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. O Problema Fundamental do Conhecimento. Porto Alegre: Globo, 1937, p. 27. In GALVÃO DE BRITTO, Lucas. O Lugar e o tributo. São Paulo: Noeses, 2014, p. 1.

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Em seguida, no Capítulo 3, ingressou-se no estudo do princípio da eficiência, explicando-se a normatividade, atributo de todos os princípios jurídicos, e as características peculiares da eficiência no Brasil. Abordou-se ainda, a partir dos levantamentos e já trabalhados individualmente, a relação existente entre a defesa da concorrência e o princípio da eficiência administrativa, dedicada no Capítulo 4, ressaltando-se a defesa da concorrência de modo eficiente como dever do Estado e instrumento de desenvolvimento. Por fim, o trabalho será encerrado com as conclusões sobre o tema abordado.

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2. A DEFESA DA CONCORRÊNCIA NO BRASIL

Ao se tratar da defesa da concorrência no Brasil, far-se-á uma breve menção histórica da matéria, alocando seus principais pontos no decorrer da evolução dos seus atributos ao longo do tempo e, depois, focar-se-á no que se julga ser seus principais temas, sem buscar esgotar a matéria nem tratar, na minúcia, todos os institutos que envolvem essa área do direito.

2.1.ASPECTOS HISTÓRICOS E CENÁRIO ATUAL

Este ponto se inicia com um breve histórico expondo como se situa a normativa da concorrência no Brasil. Tal modo, antes de se falar nos mecanismos antitruste do país, vale observar que, tal sistema de regras só existe porque, há algum tempo, a noção de um sistema econômico totalmente liberal se deflagrou como inviável na prática.

O ideal Adam Smith2, de mercados perfeitamente equilibrados por si só (concorrência pura), em que pesem todos os benefícios amplamente conhecidos da “revolução liberal”, não se mostrou plenamente sustentável.

Contudo, houve a maturação da percepção, no decorrer da história, de que a concorrência não era uma perfeição, como teorizada, dada as deficiências dos mecanismos de mercado, como a ausência clara de bens homogêneos e a interferência desequilibrada dos agendes de mercado, tanto privados como estatais, dentre outros fatores. Tal maneira, não há descenso na necessidade que surgir de o Estado intervir de forma a assegurar a manutenção do equilíbrio dos mercados.

Assim, seguindo a tendência da regra nos países democrático-republicanos capitalistas do mundo, como se verá, a livre iniciativa e a livre concorrência tiveram franco espaço na prateleira constitucional, contudo, vinculada a uma fiscalização estatal sobre elas, para fins de se garantir, a partir delas, o bem-estar da sociedade. E, como se discorrerá, tal atividade fiscalizatória, monopolizada pelo Estado, para ter sentido jurídico-constitucional, deve ser prestada de maneira concatenada à norma-princípio da eficiência administrativa.

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A livre concorrência, exerceu seu papel fundamental no processo de integração e natural limitação do poder econômico dos empresários. A competição sadia é, sem dúvidas, instrumento central para o avanço de mercado de um determinado pais ou região.

Para se manter como estado social e ao mesmo tempo concorrencial, ou seja, saudável do ponto de vista jurídico, o Estado, e somente ele, deve intervir nos chamados “abusos” de poder e “distorções de mercado”. Não por outro motivo, João Bosco Leopoldino da Fonseca, trouxe ensinamento de que a atuação de intervenção do Estado operou-se a partir do momento em que as grandes concentrações passaram a representar um perigo para a organização do mercado, mormente quando se trata no potencial dando às demais empresas e, ao fim ao cabo, aos consumidores do mercado3.

Em outro censo, em que pese o perigo da liberdade de mercado total, o contrapeso dessa liberdade tem de ser, como quase tudo em direito, proporcional. Celso Antonio Bandeira de Mello, analisando os artigos 170 e 174 da Constituição Federal, explicou que o Estado não pode impor aos particulares atendimentos as suas diretrizes e intenções, de modo que o planejamento econômico do Estado jamais poderá se compatibilizar com qualquer anacrônico sistema “cartorial” que fez vigorar setores, nos quais empreendimentos da produção ou da comercialização no mercado interno ficavam pendendo de “outorgas governamentais”, e ainda, dentro dos limites das “cotas” “deferidas” pelo Poder Público aos grupos empresariais que as recebessem.

Para o doutrinador, “tal sistema seria a “negação da livre concorrência, além de se constituir em manifesta supressão da liberdade de iniciativa, convertida, por tal meio, em autêntico privilégio desfrutável por alguns”.4

Voltando-se ao fio evolutivo dos aspectos históricos no Brasil, a defesa da concorrência teve seu início na década de 30, tendo sido introduzida com a Constituição de 1934, tornando-se uma preocupação estatal mais evidente, uma vez que, antes disso o mercado era liberal clássico, controlando-se por si só.

Porém, a força da intervenção estatal no mercado só veio com a regulamentação de preços e eliminação dos artifícios e fraudes na venda de mercadorias,

3 FONSECA, João Bosco Leopoldino da. Lei de Proteção da Concorrência, Rio de Janeiro: Forense, 2007, p. 18.

4 BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Malheiros, 2008, p. 785.

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com o Decreto-lei 7.666/45 o qual listou os atos contrários, na época, à economia nacional, criando-se a Comissão Administrativa de Defesa Econômica, já com a expressão CADE. Aquele órgão tinha a missão de verificar e acordos restritivos da concorrência que tivessem efeito no equilíbrio da produção e consumo, regulação de preços, equalização de produção e exclusividade de distribuição de mercadorias, atuando em grande aspecto com as atribuições primárias da entidade atual.5

No ano seguinte, em 1946, com a Constituição Federal, em seu art. 148, havia a determinação de que a lei deveria reprimir toda forma de abuso do poder econômico, principalmente das uniões e agrupamentos de empresas individuais ou sociais que tivessem por fim dominação de mercado nacionais, com eliminação da concorrência e

abuso arbitrário dos lucros.

Todavia, apenas em 1962, com a publicação da Lei 4.137/62 que foi regulamentada à repressão do abuso do poder econômico com a criação do atual Conselho Administrativo de Defesa Econômica – CADE, para análise e repressão, o que se espera de um Estado eficiente em face a exageros de poder que ultrapassem o limite da concorrência normal.

Logicamente, essa autarquia legal, criada pelo legislador não tem o condão de contra afirmar a livre iniciativa, sendo tal princípio, de modo declarado, um dos “fundamentos da ordem econômica” e um dos “princípios” reitores dela. Ora, conforme lição de Celso Antônio Bandeira de Mello, “um fundamento constitucional que pudesse ser arredado por obra da legislação ordinária ou um princípio que esta pudesse menoscabar, a toda evidência, nada valeriam”. O autor arremata seu raciocínio citando frase cabal de Geraldo Ataliba, pois, caso isso ocorresse, “seria o mesmo que construir uma fortaleza e colocar-lhe portas de papelão”.6

Note-se que se escreve as palavras “abuso” e “eliminação” de modo destacado, pois, o poder econômico não é proibido. Nem o aumento dos lucros, nem a

dominação de mercados são defesos. O que não se permite é o abuso, com intuito ilegal

de destruir, eliminar, um oponente ou um grupo rival no mercado, sob pena de se violar o equilíbrio jurídico da concorrência.

5 Lei de Proteção da Concorrência, Rio de Janeiro: Forense, 2007, p. 54. 6 Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Malheiros, 2008, p. 786.

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Em que pese existir no papel, a referida Lei 4.137/62 não teve ampla efetividade na realidade brasileira, segundo Paula Forgioni7, pois não foi possível identificar atuação linear e constante, como se tem hoje, de uma política econômica que tenha como uma de suas premissas a busca da defesa da concorrência.

Após tal caminho, o direito da defesa da concorrência como conhecemos hoje, alicerçada num coeso “Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência – SBDC”, bem minucioso, completo e atual, veio surgir com a promulgação da Constituição Federal de 1988 e as subsequentes Leis 8.137/90 e 8.844/94 que culminaram na Lei 12.529/11, vigente atualmente.

Na Constituição Federal, logo em seu art. 1º, a livre iniciativa aparece como fundamento da República Federativa do Brasil e no art. 170, como fundamento da ordem econômica, cuja livre concorrência é um de seus princípios.8 Ao passo que a defesa do

consumidor e a redução das desigualdades regionais e sociais, como contrapontos lógicos, inegavelmente, também são princípios da ordem econômica.

Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil uma sociedade livre, porém, solidária e justa, cujo desenvolvimento é garantido pela matriz constitucional, a qual designa erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais, além de promover o bem de todos, tudo conforme os mandamentos do art. 3º da Constituição Federal o qual é complementado pelas normas do art. 5º, XXIII, por meio do qual a propriedade deverá atender, sempre, a sua função social.

7 FORGIONI, Paula. Fundamentos do antitruste. São Paulo: RT, 2013, p. 35.

8 Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: I - a soberania; II - a cidadania; III - a dignidade da pessoa humana; IV - os valores sociais do trabalho e da livre

iniciativa; V - o pluralismo político.

Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: I - soberania nacional; II - propriedade privada; III - função social da propriedade; V - livre

concorrência; V - defesa do consumidor; VI - defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento

diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação; VII - redução das desigualdades regionais e sociais; VIII - busca do pleno emprego; IX - tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no País. Parágrafo único. É assegurado a todos o livre exercício de qualquer atividade econômica, independentemente de autorização de órgãos públicos, salvo nos casos previstos em lei.

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Tão intensa é a preocupação constitucional com esses bens jurídicos que a Lei Maior os mencionou em diferentes qualidades ou funções, conferindo-lhes uma acentuada ênfase. Por tudo isso, voltando-se a uma interpretação sistemática, por meio da se analisa a constituição como um todo, um sistema, e de uma perspectiva teleológica, diante da qual se procura observar a finalidade da norma, percebe-se que não só a preservação da liberdade de concorrer, ou seja, da garantia do direito a entrar no mercado (livre iniciativa) como do direito de permanecer no mercado (livre concorrência), o Estado Brasileiro, no caminho da superação do liberalismo “puro”, intenta ao equilíbrio

da concorrência como uma série de bens jurídicos nacionais sociais que foram tutelados.

Diga-se, a concorrência no Brasil é liberada, porém deve ser equilibrada, sem abusividade. A conclusão que se chega é que a Constituição prevê a livre concorrência limitada ao natural concorrente e não ao concorrente desleal.

Isso está previsto no sistema constitucional pátrio e também deve ser tutelado pela norma infraconstitucional. Tanto é que, v.g., em 2003, o constituinte derivado por via da edição da Emenda Constitucional 42, que introduziu o art. 146-A, determinou que a lei complementar poderá estabelecer critérios especiais de tributação, com o objetivo de

prevenir desequilíbrios da concorrência, sem prejuízo da competência de a União, por

lei, estabelecer normas de igual objetivo.

Voltando-se à regulamentação da concorrência lícita no Brasil, a Lei Antitruste em sua parte geral, nos seus art. 2º e 3º define sua área de atuação em todo território nacional com a constituição do CADE e da Secretaria de Acompanhamento Econômico do Ministério da Fazenda, tendo sido criado, formalmente, um verdadeiro aparato de ferramentas (ex lege) para a Administração Pública atuar, de maneira eficiente, na busca de promover, com sua intervenção, quando necessária, o desenvolvimento econômico brasileiro, buscando agir, assim, de uma maneira curvada à norma constitucional da Eficiência Administrativa.

Quando assim o faz, ao definir a aplicação legal no território e quais são os órgãos aplicadores, o legislador estabelece o dever-poder da Administração Pública brasileira de legitimar o equilíbrio do mercado brasileiro, em sua noção de atividade administrativa e soberana.

Tal maneira, expôs Michel Temer que “território não é noção que se possa apanhar no mundo natural, mas no mundo jurídico. Com efeito, será território do Estado

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aquele no qual atue com soberania.”9 Por isso, a Lei 12.529/11 em seu art. 4º, de modo expresso, indica que o CADE “é entidade judicante com jurisdição em todo o território nacional, que se constitui em autarquia federal, vinculada ao Ministério da Justiça, com sede e foro no Distrito Federal, e competências previstas nesta Lei”.

O CADE, como entidade estatal que o é, atua perante todo país com a função administrativa, quando provocado ou de ofício, de analisar o caso concreto à luz da lei! É o que se amolda à lição clássica de Gregorio Robles, de que toda conduta pode ser descrita nos termos de um procedimento, “da mais simples a mais complexa, chama-se conduta a um conjunto de movimentos ordenados para a consecução de uma ação ao qual se atribui significado unitário.”10

Nesse prisma, a Lei Antitruste vem confirmando que o Estado brasileiro, por meio de seu aparato fiscalizatório do mercado-concorrência, tem, como serviço ou função administrativos, a defesa da concorrência brasileira, incluindo a que envolva concorrência internacional se o caso envolver empresa nacional.11

Como articulou Otacílio dos Santos Silveira Neto: “Já não era sem tempo. A economia brasileira há anos patina em baixos índices de crescimento econômico, insuficientes para alavancarem o desenvolvimento econômico do pais.” O professor, em pensamento que se endossa neste trabalho, entendeu que, dentro de tal contexto, uma das

9 TEMER, Michel. Território Federal nas Constituições Brasileiras. São Paulo: RT, 1975, p. 4. 10 ROBLES, Gregorio. O Direito como Texto. São Paulo: Manole, 2005, p. 12-13.

11 Art. 2º Aplica-se esta Lei, sem prejuízo de convenções e tratados de que seja signatário o Brasil, às práticas cometidas no todo ou em parte no território nacional ou que nele produzam ou possam produzir efeitos. (...) § 1º Reputa-se domiciliada no território nacional a empresa estrangeira que opere ou tenha no Brasil filial, agência, sucursal, escritório, estabelecimento, agente ou representante. § 2º A empresa

estrangeira será notificada e intimada de todos os atos processuais previstos nesta Lei,

independentemente de procuração ou de disposição contratual ou estatutária, na pessoa do agente ou representante ou pessoa responsável por sua filial, agência, sucursal, estabelecimento ou escritório instalado no Brasil.

Art. 10. Compete ao Presidente do Tribunal: (...) XI - firmar contratos e convênios com órgãos ou entidades nacionais e submeter, previamente, ao Ministro de Estado da Justiça os que devam ser celebrados com organismos estrangeiros ou internacionais; e

Art. 28. Constituem receitas próprias do Cade: (...) IV - os recursos provenientes de convênios, acordos ou contratos celebrados com entidades ou organismos nacionais e internacionais;

Art. 40. A recusa, omissão ou retardamento injustificado de informação ou documentos solicitados pelo Cade ou pela Secretaria de Acompanhamento Econômico constitui infração punível com multa diária de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), podendo ser aumentada em até 20 (vinte) vezes, se necessário para garantir sua eficácia, em razão da situação econômica do infrator. (...) § 3º Tratando-se de empresa estrangeira, responde solidariamente pelo pagamento da multa de que trata o caput sua filial, sucursal, escritório ou estabelecimento situado no País.

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grandes alterações da nova lei antitruste brasileira foi precisamente a “indução ao Estado de promoção de políticas públicas que difundam a concorrência no país.”.12

Nesse sentido, passa-se a uma análise mais acurada do mencionado Sistema Brasileiro que induz e fiscaliza a livre concorrência em busca de eficiência na promoção, pela sua função, do bem comum de todos, com o intento legal da proteção do próprio mercado.

2.2.SISTEMA BRASILEIRO DE DEFESA DA CONCORRÊNCIA. DESTAQUE PARA A REPRESSÃO AOS CARTÉIS E PARA AS NORMAS DO COMPLIENCE COMO EXEMPLOS DE REPRESSÃO E PREVENÇÃO ÀS INFRAÇÕES CONCORRENCIAIS.

A Lei Antitruste renovada em 2011 endossa o sistema de fiscalização e controle estatal da concorrência denominado SBDC formado pelo “Conselho Administrativo de Defesa Econômica – CADE” e pela “Secretaria de Acompanhamento Econômico do Ministério da Fazenda”, os quais detêm todas as atribuições previstas na legislação ordinária citada.

A lei atual manteve os órgãos da lei anterior, como a Secretaria do CADE, o seu tribunal, a Procuradoria e a previsão das atribuições do Ministério Público perante o CADE, este o qual, conforme previsão do art. 5º da lei, é constituído pelo Tribunal Administrativo de Defesa Econômica13, com competência para função eminentemente

12 SILVEIRA NETO, Otacílio dos santos. O cumprimento da função social da propriedade no novo Direito Antitruste brasileiro. Revista de Direito Público da Economia – RDPE, Belo Horizonte, ano 11, n. 44,

out/dez 2013, p. 183-200.

13 Art. 9º Compete ao Plenário do Tribunal, dentre outras atribuições previstas nesta Lei: I - zelar pela observância desta Lei e seu regulamento e do regimento interno; II - decidir sobre a existência de infração à ordem econômica e aplicar as penalidades previstas em lei; III - decidir os processos administrativos para imposição de sanções administrativas por infrações à ordem econômica instaurados pela Superintendência-Geral; IV - ordenar providências que conduzam à cessação de infração à ordem econômica, dentro do prazo que determinar; V - aprovar os termos do compromisso de cessação de prática e do acordo em controle de concentrações, bem como determinar à Superintendência-Geral que fiscalize seu cumprimento; VI - apreciar, em grau de recurso, as medidas preventivas adotadas pelo Conselheiro-Relator ou pela Superintendência-Geral; VII - intimar os interessados de suas decisões; VIII - requisitar dos órgãos e entidades da administração pública federal e requerer às autoridades dos Estados, Municípios, do Distrito Federal e dos Territórios as medidas necessárias ao cumprimento desta Lei; IX - contratar a realização de exames, vistorias e estudos, aprovando, em cada caso, os respectivos honorários profissionais e demais despesas de processo, que deverão ser pagas pela empresa, se vier a ser punida nos termos desta Lei; X - apreciar processos administrativos de atos de concentração econômica, na forma desta Lei, fixando, quando entender conveniente e oportuno, acordos em controle de atos de concentração; XI - determinar à Superintendência-Geral que adote as medidas administrativas necessárias à execução e fiel cumprimento de suas decisões; XII - requisitar serviços e pessoal de quaisquer órgãos e entidades do Poder Público Federal; XIII - requerer à Procuradoria Federal junto ao Cade a adoção de providências administrativas e judiciais; XIV - instruir o público sobre as formas de

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judicante, pela Superintendência-Geral14, órgão tipicamente administrativo, e pelo Departamento de Estudos Econômicos, de índole consultiva. A Secretaria de

infração da ordem econômica; XV - elaborar e aprovar regimento interno do Cade, dispondo sobre seu funcionamento, forma das deliberações, normas de procedimento e organização de seus serviços internos; Vide Decreto nº 9.011, de 2017; XVI - propor a estrutura do quadro de pessoal do Cade, observado o disposto no inciso II do caput do art. 37 da Constituição Federal; XVII - elaborar proposta orçamentária nos termos desta Lei; XVIII - requisitar informações de quaisquer pessoas, órgãos, autoridades e entidades públicas ou privadas, respeitando e mantendo o sigilo legal quando for o caso, bem como determinar as diligências que se fizerem necessárias ao exercício das suas funções; e XIX - decidir pelo cumprimento das decisões, compromissos e acordos. § 1º As decisões do Tribunal serão tomadas por maioria, com a presença mínima de 4 (quatro) membros, sendo o quórum de deliberação mínimo de 3 (três) membros. § 2º As decisões do Tribunal não comportam revisão no âmbito do Poder Executivo, promovendo-se, de imediato, sua execução e comunicando-se, em seguida, ao Ministério Público, para as demais medidas legais cabíveis no âmbito de suas atribuições. § 3º As autoridades federais, os diretores de autarquia, fundação, empresa pública e sociedade de economia mista federais e agências reguladoras são obrigados a prestar, sob pena de responsabilidade, toda a assistência e colaboração que lhes for solicitada pelo Cade, inclusive elaborando pareceres técnicos sobre as matérias de sua competência. §4º O Tribunal poderá responder consultas sobre condutas em andamento, mediante pagamento de taxa e acompanhadas dos respectivos documentos. §5º O Cade definirá, em resolução, normas complementares sobre o procedimento de consultas previsto no §4º deste artigo. 14Art. 13. Compete à Superintendência-Geral: I - zelar pelo cumprimento desta Lei, monitorando e acompanhando as práticas de mercado; II - acompanhar, permanentemente, as atividades e práticas comerciais de pessoas físicas ou jurídicas que detiverem posição dominante em mercado relevante de bens ou serviços, para prevenir infrações da ordem econômica, podendo, para tanto, requisitar as informações e documentos necessários, mantendo o sigilo legal, quando for o caso; III - promover, em face de indícios de infração da ordem econômica, procedimento preparatório de inquérito administrativo e inquérito administrativo para apuração de infrações à ordem econômica; IV - decidir pela insubsistência dos indícios, arquivando os autos do inquérito administrativo ou de seu procedimento preparatório; V - instaurar e instruir processo administrativo para imposição de sanções administrativas por infrações à ordem econômica, procedimento para apuração de ato de concentração, processo administrativo para análise de ato de concentração econômica e processo administrativo para imposição de sanções processuais incidentais instaurados para prevenção, apuração ou repressão de infrações à ordem econômica; VI - no interesse da instrução dos tipos processuais referidos nesta Lei: a) requisitar informações e documentos de quaisquer pessoas, físicas ou jurídicas, órgãos, autoridades e entidades, públicas ou privadas, mantendo o sigilo legal, quando for o caso, bem como determinar as diligências que se fizerem necessárias ao exercício de suas funções; b) requisitar esclarecimentos orais de quaisquer pessoas, físicas ou jurídicas, órgãos, autoridades e entidades, públicas ou privadas, na forma desta Lei; c) realizar inspeção na sede social, estabelecimento, escritório, filial ou sucursal de empresa investigada, de estoques, objetos, papéis de qualquer natureza, assim como livros comerciais, computadores e arquivos eletrônicos, podendo-se extrair ou requisitar cópias de quaisquer documentos ou dados eletrônicos; d) requerer ao Poder Judiciário, por meio da Procuradoria Federal junto ao Cade, mandado de busca e apreensão de objetos, papéis de qualquer natureza, assim como de livros comerciais, computadores e arquivos magnéticos de empresa ou pessoa física, no interesse de inquérito administrativo ou de processo administrativo para imposição de sanções administrativas por infrações à ordem econômica, aplicando-se, no que couber, o disposto no art. 839 e seguintes da Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973 - Código de Processo Civil, sendo inexigível a propositura de ação principal; e) requisitar vista e cópia de documentos e objetos constantes de inquéritos e processos administrativos instaurados por órgãos ou entidades da administração pública federal; f) requerer vista e cópia de inquéritos policiais, ações judiciais de quaisquer natureza, bem como de inquéritos e processos administrativos instaurados por outros entes da federação, devendo o Conselho observar as mesmas restrições de sigilo eventualmente estabelecidas nos procedimentos de origem; VII - recorrer de ofício ao Tribunal quando decidir pelo arquivamento de processo administrativo para imposição de sanções administrativas por infrações à ordem econômica; VIII - remeter ao Tribunal, para julgamento, os processos administrativos que instaurar, quando entender configurada infração da ordem econômica; IX - propor termo de compromisso de cessação de prática por infração à ordem econômica, submetendo-o à aprovação do Tribunal, e fiscalizar

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Acompanhamento Econômico tem como atribuição a promoção da concorrência na sociedade15.

A lei da concorrência no Brasil mantém os ilícitos contra a ordem econômica previstos anteriormente, apresentando mudanças mais notórias na parte institucional dos órgãos que compõem o sistema e no procedimento de averiguação e combate aos ilícitos, com a obrigatoriedade de submissão prévia ao CADE dos atos de concentração de grandes empresas.

No seu sistema, conforme logo se ver no art. 1º da lei, o Estado deve agir com vistas à prevenção e repressão às infrações de ordem econômica, buscando fazer-se

o seu cumprimento; X - sugerir ao Tribunal condições para a celebração de acordo em controle de concentrações e fiscalizar o seu cumprimento; XI - adotar medidas preventivas que conduzam à cessação de prática que constitua infração da ordem econômica, fixando prazo para seu cumprimento e o valor da multa diária a ser aplicada, no caso de descumprimento; XII - receber, instruir e aprovar ou impugnar perante o Tribunal os processos administrativos para análise de ato de concentração econômica; XIII - orientar os órgãos e entidades da administração pública quanto à adoção de medidas necessárias ao cumprimento desta Lei; XIV - desenvolver estudos e pesquisas objetivando orientar a política de prevenção de infrações da ordem econômica; XV - instruir o público sobre as diversas formas de infração da ordem econômica e os modos de sua prevenção e repressão; XVI - exercer outras atribuições previstas em lei; XVII - prestar ao Poder Judiciário, sempre que solicitado, todas as informações sobre andamento das investigações, podendo, inclusive, fornecer cópias dos autos para instruir ações judiciais; e XVIII - adotar as medidas administrativas necessárias à execução e ao cumprimento das decisões do Plenário. Art. 14. São atribuições do Superintendente-Geral: I - participar, quando entender necessário, sem direito a voto, das reuniões do Tribunal e proferir sustentação oral, na forma do regimento interno; II - cumprir e fazer cumprir as decisões do Tribunal na forma determinada pelo seu Presidente; III - requerer à Procuradoria Federal junto ao CADE as providências judiciais relativas ao exercício das competências da Superintendência-Geral; IV - determinar ao Economista-Chefe a elaboração de estudos e pareceres; V - ordenar despesas referentes à unidade gestora da Superintendência-Geral; e VI - exercer outras atribuições previstas em lei.

15 Art. 19. Compete à Secretaria de Acompanhamento Econômico promover a concorrência em órgãos de governo e perante a sociedade cabendo-lhe, especialmente, o seguinte: I - opinar, nos aspectos referentes à promoção da concorrência, sobre propostas de alterações de atos normativos de interesse geral dos agentes econômicos, de consumidores ou usuários dos serviços prestados submetidos a consulta pública pelas agências reguladoras e, quando entender pertinente, sobre os pedidos de revisão de tarifas e as minutas; II - opinar, quando considerar pertinente, sobre minutas de atos normativos elaborados por qualquer entidade pública ou privada submetidos à consulta pública, nos aspectos referentes à promoção da concorrência; III - opinar, quando considerar pertinente, sobre proposições legislativas em tramitação no Congresso Nacional, nos aspectos referentes à promoção da concorrência; IV - elaborar estudos avaliando a situação concorrencial de setores específicos da atividade econômica nacional, de ofício ou quando solicitada pelo CADE, pela Câmara de Comércio Exterior ou pelo Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor do Ministério da Justiça ou órgão que vier a sucedê-lo; V - elaborar estudos setoriais que sirvam de insumo para a participação do Ministério da Fazenda na formulação de políticas públicas setoriais nos fóruns em que este Ministério tem assento; VI - propor a revisão de leis, regulamentos e outros atos normativos da administração pública federal, estadual, municipal e do Distrito Federal que afetem ou possam afetar a concorrência nos diversos setores econômicos do País; VII - manifestar-se, de ofício ou quando solicitada, a respeito do impacto concorrencial de medidas em discussão no âmbito de fóruns negociadores relativos às atividades de alteração tarifária, ao acesso a mercados e à defesa comercial, ressalvadas as competências dos órgãos envolvidos; VIII - encaminhar ao órgão competente representação para que este, a seu critério, adote as medidas legais cabíveis, sempre que for identificado ato normativo que tenha caráter anticompetitivo.

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cumprir a função social da propriedade, defesa dos consumidores do mercado e a repressão frontal ao abuso do poder econômico, sendo a coletividade nacional a titular desta proteção legal.

Vale salientar, no aspecto da titularidade do direito previsto ter como destinatários dos direitos a coletividade de certo modo significa, conforme entendimento de Fábio Ulhôa Coelho “ignorar multiplicidade e relativa ‘inconciabilidade’ de posturas, projetos, e objetivos verificáveis em todos os recantos das estruturas sociais”.16

Todavia, entende-se que o aparato legal possui as normas cuja titularidade do direito, ao menos formalmente, é a “coletividade”, com o objetivo direto de proteger/garantir o livre mercado, que o faz em nos citados artigos 6º ao 19.

Para se fazer valer de suas previsões, a própria lei cria competência para os órgãos do SBDC, definindo as atribuições nos seus artigos 15 e 16 do Procurador Federal do CADE e, em seu art. 20, do promotor natural do órgão, qual seja, um representante do Ministério Público Federal perante o CADE

A lei prossegue na definição das infrações contra a ordem econômica e as prescrições penais nos seus artigos 31 a 46, regulando os procedimentos administrativos instaurados para prevenção, apuração e repressão de infrações à ordem econômica nos artigos 48 a 87, incluindo dois grandes institutos, os quais servem eminentemente (1) para promover o estancamento das infrações e dos prejuízos à concorrência e (2) para abranger mais os autores das infrações aumentando o limite subjetivo da atuação do órgão e abrangendo um cenário punitivo maior.

Assim, há a previsão moderna do compromisso de cessação aplicável àquele que pratica o ilícito de efeitos duradouros e se compromete a cessar a prática infracional e do acordo de leniência que prevê redução de pena ou mesmo a extinção da pretensão punitiva de pessoas físicas e jurídicas que forem autoras de infração à ordem econômica, desde que colaborem efetivamente com as investigações e o processo administrativo e que dessa colaboração resulte a identificação dos demais envolvidos na infração e a obtenção de informações e documentos que comprovem a infração notificada ou sob investigação.

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Além disso, atua em controle dos atos de concentração econômica, tornando obrigatória a submissão ao CADE dos Mergers and Acquisitions17dentre os quais, cumulativamente, um dos grupos participantes tenha faturamento formal equivalente ou superior a 400.000.000,00 no ano anterior ao ato e um dentre as outras empresas ou grupos envolvidos tenha faturado equivalente ou superior a 30.000.000,00.18

No que tange às operações na bolsa, de modo a confirmar em regulamento um entendimento já existente, foi anunciado em 2014, pelo presidente do CADE19, que

dentre outras propostas, surgiria a inclusão do art. 109-A no RICADE de modo a prever que “as operações realizadas em bolsa de valores independem da aprovação prévia do CADE para sua consumação e sujeitam-se às disposições estabelecidas nos parágrafos 1º e 2º do art. 109”.

Também tentou-se alocar a expressão “ou em mercado de balcão organizado” de modo a incluir na regulamentação “todos os ambientes de negociação em mercado secundário”, assim, não apenas as operações em bolsa de valores, mas também aquelas em mercado de balcão deveriam estar contempladas.

Todavia, os interessados no caso pugnaram pela inclusão do mercado de balcão e de um art. 109-B para prever a autorização automática de exercício dos direitos políticos nesses casos, porém somente o primeiro pleito foi acolhido,20 ficando a redação

do art. 109-A da seguinte maneira: “As operações realizadas em bolsa de valores ou em

17 M&A, do inglês Mergers and Acquisitions (Fusões e aquisições), termo genérico que se refere à consolidação de empresas ou ativos. Existem diversos tipos de transações classificadas dentro da noção de M&A, as principais são justamente as fusões e aquisições clássicas: Uma fusão significa a combinação de duas empresas de maneira a formar uma nova empresa, já uma aquisição é a compra de uma empresa por outra, sem a formação de uma nova empresa.

18 A Lei Antitruste estabelece referenciais de valores mínimos para que uma operação de fusão/aquisição deva ser apresentada previamente para exame obrigatório de conformidade, de caráter autorizativo. Os valores atuais são de R$ 750.000.000,00 de faturamento bruto anual e R$ 75.000.000,00, conforme incisos I e II, do art. 88 da Lei 12.529/11 e Portaria Interministerial 994/12. Que assim prevê: O Ministro de Estado

da Justiça e o Ministro de Estado Da Fazenda no uso da atribuição que lhes conferem o §1º do art. 88, da Lei 12.529, de 30 de novembro de 2011, resolvem: Art. 1o Para os efeitos da submissão obrigatória de atos de concentração a análise do Conselho Administrativo de Defesa Econômica - CADE, conforme previsto no art. 88 da Lei 12.529 de 30 de novembro de 2011, os valores mínimos de faturamento bruto anual ou volume de negócios no país passam a ser de: I - R$ 750.000.000,00 (setecentos e cinquenta milhões de reais) para a hipótese prevista no inciso I do art. 88, da Lei 12.529, de 2011; e II - R$ 75.000.000,00 (setenta e cinco milhões de reais) para a hipótese prevista no inciso II do art. 88, da Lei 12.529 de 2011.

19 BRASIL. Ministério da Justiça. Conselho Administrativo de Defesa Econômica - CADE. Despacho VMC 75/2014, a Consulta Pública 02/2014, de 19 de fevereiro de 2014.

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mercado de balcão organizado independem da aprovação prévia do CADE para sua consumação e sujeitam-se às disposições estabelecidas nos §§ 1º e 2º do art. 109”.

Observa-se, assim, que a norma previu a dispensa da aprovação prévia do CADE em todos os ambientes de negociação em mercado secundário para consumações das operações, ainda que sejam de notificação obrigatória, ficando suspensos os direitos políticos desde a realização da operação até que ocorra a aprovação pelo CADE, salvo autorização prévia quando o exercício for necessário para a proteção do pleno valor do investimento.

Portanto, diante da inviabilidade da aplicação da norma geral às operações realizadas no âmbito das bolsas e mercados de balcão, o CADE confirmou a possibilidade de se realizar tais operações sem prévia notificação, mas, por outro lado, deixou claro que tais operações não estão dispensadas de sua análise em definitivo e, mais ainda, regulamentou remédio comportamental imediato para os agentes envolvidos: o não exercício dos direitos políticos.

Tal ato de concentração não terá efeito antes de aprovado pelo CADE ou enquanto perdurar o prazo de 240 dias para que o órgão detém para analisar o caso. À parte, além disso, o CADE também pode apreciar, depois de ocorrido, ato de concentração que não sejam de submissão prévia obrigatória.

Ainda, vedados atos de concentração que impliquem em eliminação da concorrência em parte substancial de mercado relevante. O art. 88, em seus §5º e §6º, veda atos que que possam criar ou reforçar uma posição dominante ou que possam resultar na dominação de mercado relevante de bens ou serviços, contudo a entidade pode autorizar a operação, desde que sejam observados os limites estritamente necessários para atingir os objetivos cumulativos ou alternados de aumento da produtividade ou da competitividade, de melhora na qualidade de bens ou serviços, ou de propiciar a eficiência e o desenvolvimento tecnológico ou econômico e ainda que sejam repassados aos consumidores parte relevante dos benefícios decorrentes.

A Lei 12.529/11, dentre as já mencionadas reformulações pontuais que procedeu no SBDC, também inaugurou um novo momento da defesa da concorrência no Brasil, quando exige a submissão prévia de atos de concentração ao CADE. E, ainda, é cediço, que a atual lei melhorou a estrutura de pessoal da autarquia, reduziu a esfera penal dos ilícitos anticoncorrenciais, hoje limitadas à conduta de cartel, maneira pela qual, não

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é preciso muito esforço para pesquisadores da área, para perceber que as modificações foram efetivas. Nas palavras de Marcus de Freitas Gouvêa:21

Nos últimos quatro anos a mídia noticia as ações do CADE com frequência nunca antes vista e a autarquia avança em áreas inéditas no direito brasileiro, como a regulamentação do processo de consulta e a publicação do guia para análise de consumação prévia de atos de concentração (gun jumping) e o guia para programas de compliance da concorrência. Pouco se avançou, contudo, neste mesmo período na aplicação privada, também chamado enforcement privado, da lei antitruste.

O autor explica em seu recente trabalho que o direito antitruste comporta três sistemas de aplicação, o penal, o administrativo e o privado. O primeiro deles é baseado no Código de Processo Penal, no Código Penal e na Lei 8.137/9022 com redação dada pela Lei 12.529/11, sendo a persecução penal pública, cabendo ao Ministério Público a investigação e a denúncia dos crimes desta natureza, hoje limitados às práticas de cartel. O segundo deles, administrativo, compete ao SBDC, como já visto vastamente, composto pela Secretaria de Acompanhamento e pelo CADE, diante dos quais cabe a atribuição de combate a ilícitos concorrenciais, sendo, sem dúvidas mais amplo do que o sistema penal, constituindo as infrações administrativas quaisquer condutas anticompetitivas, nos termos do art. 36, da Lei Antitruste.23

A norma não trata, pois, ao menos diretamente, como dito, de interesses individuais, mas de direitos coletivos, cujo titular não pode ser especificado. Entretanto, é notório que a lei da concorrência prevê infrações capazes de lesionar direitos de concorrentes, fornecedores, distribuidores e varejistas.

21 GOUVÊA. Marcus de Freitas. Aplicação Privada da Lei Antitruste no Brasil. Revista da Defesa da Concorrência. RDC, Vol. 5, nº 1. Maio 2017, p. 205.

22 Art. 4° Constitui crime contra a ordem econômica: I - abusar do poder econômico, dominando o mercado ou eliminando, total ou parcialmente, a concorrência mediante qualquer forma de ajuste ou acordo de empresas; II - formar acordo, convênio, ajuste ou aliança entre ofertantes, visando: a) à fixação artificial de preços ou quantidades vendidas ou produzidas; b) ao controle regionalizado do mercado por empresa ou grupo de empresas; c) ao controle, em detrimento da concorrência, de rede de distribuição ou de fornecedores. Pena - reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos e multa.

23Art. 36. Constituem infração da ordem econômica, independentemente de culpa, os atos sob qualquer

forma manifestados, que tenham por objeto ou possam produzir os seguintes efeitos, ainda que não sejam alcançados: I - limitar, falsear ou de qualquer forma prejudicar a livre concorrência ou a livre iniciativa; II - dominar mercado relevante de bens ou serviços; III - aumentar arbitrariamente os lucros; e IV - exercer de forma abusiva posição dominante. Entre estes atos, estão incluídas condutas individuais e concertadas, horizontais e verticais, tentadas e consumadas, de monopólio e cartel, práticas predatórias, venda casada, recusa de contratar, exclusividade, fixação de preço de revenda, discriminação e diferenciação de preços, entre outras.

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A própria lei da concorrência, em seu art. 47, prevê que os prejudicados por atos que constituam infração da ordem econômica24, podem ingressar em juízo para fazer cessar a prática ou para obter indenização por danos, de maneira autônoma, vale dizer, não é necessário a condenação prévia do infrator pelo CADE.

Neste contexto, surge o terceiro sistema de aplicação do direito antitruste, o sistema privado. Este sistema pode se subdividido em dois subsistemas, o coletivo e o individual e visar dois objetivos, a cessação da conduta e a reparação pelo dano.

Pelo sistema coletivo, nos termos do art. 82, da Lei 8.078/90, Código de Defesa do Consumidor - expressamente mencionado pelo art. 47, da Lei Antitruste - o Ministério Público, os entes federados e as associações que incluam entre seus fins institucionais a defesa dos interesses e direitos concorrenciais e consumeristas, podem propor ação civil pública, nos termos da Lei 7.347/85, postulando a cessação da conduta e a reparação do dano, desde que presentes seus requisitos, notadamente a violação de direitos individuais homogêneos ou difusos.

Retomando-se novamente a atenção para o foco do trabalho, notadamente o controle administrativo em busca da defesa da concorrência lícita, a pedido da professora Paula A. Forgioni, Celso Fernandes Campilongo25 examinou o processo de representação formulada pela Associação Brasileira de Bebidas – Abrabe contra a Ambev, perante o CADE, tratando-se, em síntese, de consulta sobre suposta infração à ordem econômica, decorrente de “aumento dos custos dos rivais” e a respeito do cabimento da medida preventiva por parte da Ambev, exame jurídico do qual se tira algumas lições importantes. O festejado jurista argumentou para demonstrar que na ocasião a “nova garrafa AmBev de 630ml” da Cerveja SKOL, ao invés de comandar vantagem decisiva, aumentava os custos dos rivais, diminuía a competição por preços e no limite, fechava o mercado, reduzindo a quantidade e variedade de produtos diferenciados. Para ele a

24 Art. 47. Os prejudicados, por si ou pelos legitimados referidos no art. 82 da Lei n o 8.078, de 11 de setembro de 1990, poderão ingressar em juízo para, em defesa de seus interesses individuais ou individuais homogêneos, obter a cessação de práticas que constituam infração da ordem econômica, bem como o recebimento de indenização por perdas e danos sofridos, independentemente do inquérito ou processo administrativo, que não será suspenso em virtude do ajuizamento de ação.

25 CAMPILONGO. Celso Fernandes. Aumento dos custos rivais na concorrência – Parecer do Processo Administrativo 08012.002474/2008-24 do CADE. Revista de Direito Administrativo – RDA, Rio de Janeiro, v. 260, p. 285-313, maio/ago. 2012.

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inovação pode ser importante fomentadora da concorrência se introduzir vantagem decisiva de custo ou qualidade e, por consequência, reduzir preços e expandir produção.

Afirma que a “concorrência que conta” é aquela que comanda uma vantagem

decisiva de custo ou qualidade e que atinge não a fímbria dos lucros e das produções das

firmas existentes, mas suas fundações e suas próprias vidas. Esse tipo de concorrência produziria, a longo prazo, expansão da produção e redução dos preços. A inovação desejada pela concorrência seria, então aquela correspondente à geração de uma nova ideia que pode comandar uma vantagem decisiva de custo ou qualidade e, por consequência, reduzir preços e expandir produção.

Citando Miguel Moura e Silva26, quem afirmou que “a tecnologia é encara pelo direito da concorrência como um dado de fato; o que importa é o papel que ela desempenha no jogo concorrencial e de que modo eventuais práticas restritivas que tenham por objeto a sua aquisição, transmissão (ou respectivo entrave), podem contrariar as finalidades próprias daquele normativo”, Campilongo define o seguinte:

Para o direito da concorrência, o papel da inovação no jogo competitivo é muito relevante. Inovação concorrencialmente desejável é a que não contraria as finalidades próprias da defesa antitruste. Aumento da eficiência produtiva e dos benefícios para o consumidor (menor preço, melhor qualidade, diversidade de opções), especialmente a longo prazo, devem ser os motes da inovação pró-concorrência.

(...)

Compete à dessa da concorrência incentivar o livre desenvolvimento das inovações com efeitos pró-concorrência, porém proibir, os artifícios que sejam denominados inovação embora não tenham o condão de introduzir vantagem decisiva de custo ou qualidade e, por consequência, reduzir preços e expandir produção.

Finalizando-se o esboço sobre o direito da defesa da concorrência no Brasil, não se cumpre o papel, como inicialmente justificado na instrução de se analisar todos os institutos que envolva o direito concorrencial brasileiro, porém, vale o destaque para dois

26 MOURA E SILVA, Miguel. Inovação, transferência de tecnologia e concorrência. Coimbra: Almedina, 2003, p. 32. In CAMPILONGO. Celso Fernandes. Aumento dos custos rivais na concorrência – Parecer do Processo Administrativo n. 08012.002474/2008-24 (CADE). Revista de Direito Administrativo – RDA. Rio de Janeiro, v. 260, maio/ago 2012, p. 285-313.

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temas que julgamentos de realce, tanto de índole clássica e controle de ilicitude, que é o caso dos famigerados cartéis, quando de essência atual e de prevenção de ilícitos como o

compliance, dos quais se tratará a seguir.

2.2.1. OBSERVAÇÕES SOBRE A REPRESSÃO AO CARTÉIS

Conforme exposto, não é o caso, nesta narrativa, de se sair em busca de análise pormenorizada de uma a uma das espécies infracionais contra a concorrência, de modo que se elegeu o que se entende aqui como a mais emblemática e talvez a mais grave delas: o cartel.

Dentre as condutas lesivas ao direito da concorrência, a prática de cartéis é considerada a mais gravosa. Na lição de Paula Forgioni27, os cartéis podem ser definidos como “acordos entre concorrentes, atuais ou potenciais, destinados a arrefecer ou neutralizar a competição entre eles e que têm seu objeto ou efeito tipificado nos incisos do art. 36, caput, da Lei 12.529 de 2011”.

Em um mercado cartelizado, os preços dos produtos são maiores que os que seriam praticados em um ambiente competitivo, além de ser reduzido o incentivo para a inovação. Nesse contexto, os danos provocados pelo cartel oneram a economia como um todo. Os efeitos do cartel podem atingir tanto os consumidores finais quanto os demais compradores (distribuidores) e fornecedores (que podem ou não ser participantes da prática anticompetitiva), em relações horizontais ou verticais, e que pagam um preço acima do valor de mercado.

Por essa razão, o CADE dedica vultosos esforços na prevenção e repressão desse ilícito concorrencial. A prática de cartel é, obviamente, proibida no Brasil e o infrator pode ser responsabilizado tanto no âmbito administrativo (art. 36 da Lei 12.529/11), quanto no penal (art. 4ª da Lei 8.137/90) e civil (art. 47 da Lei 12.529/11).

Uma das formas de prevenção e repressão dessa infração à ordem econômica, no âmbito civil, se dá através do chamado “private antitrust enforcement”, ou seja, por meio do estímulo às ações privadas de reparação de danos. A admissibilidade desse tipo de demanda no Judiciário Brasileiro é lastreada pelo art. 47, da Lei de Defesa da Concorrência, que prevê a possibilidade de ingresso em juízo pelo prejudicado, tanto para

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a obtenção da cessação da conduta infratora, quanto para o recebimento de indenização por perdas e danos sofridos, independentemente do inquérito administrativo, que não será suspenso pelo ajuizamento da ação.

Todavia, nos moldes analisados por Yane Pitangueira Dantas28 inda que desempenhe um papel de suma importância no combate a prática de cartéis, a busca por esse tipo de reparação, no Brasil, ainda não é expressiva (apesar de vir registrando um grande crescimento).

Por isso, a articulista entendeu que, no que tange a reparação de prejuízos individuais sofridos por fornecedores e compradores da cadeia produtiva, vislumbra-se a possibilidade de utilização do sistema arbitral como meio alternativo para a resolução da controvérsia. Em seu entendimento, a submissão à arbitragem de demandas indenizatórias para reparação de danos individuais provenientes da prática de cartéis traz consigo inúmeros benefícios, sugerindo em seu estudo que a vantagem na sua aplicação se dá, resumindo-se, na articulação entre a persecução pública e privada a condutas anticompetitivas.

De certo modo, a integração entre atuação individual nos moldes civis reparatórios e a atuação coletiva, como qualquer somatório de forças em um dado interesse, não se negue, tem sua importância argumentativa. Contudo, foge ao corte estabelecido neste trabalho, que é tentar elucidar a eficiência na atuação Estatal, via SBDC, para prevenção e repressão das infrações concorrenciais em busca da saúde do mercado pátrio.

Em análise do mais conhecido tipo de cartel, o praticado entre postos de combustíveis, o conselheiro do CADE, Carlos Emmanuel Joppert Ragazzo29, aprofundou, com números, a discussão do tema trabalhando de maneira minuciosa os mecanismos de priorização que o CADE (Estado) deve ter para se tonar mais eficiente nos procedimentos administrativos de cartel no mercado de revenda de combustíveis.

28DANTAS, Yane Pitangueira. A Arbitragem como Meio Alternativo na Resolução de Demandas

Indenizatórias Decorrentes da Prática de Cartéis e a Minuta de Resolução do CADE submetida à Consulta Pública 05/2016. Revista de Defesa da Concorrência - RDC, Vol. 5, n. 1, maio 2017 p. 232.

29 RAGAZZO, Carlos Emmanuel Joppert; e RODRIGUES, Eduardo Frade. Mecanismos de priorização: o caso dos procedimentos administrativos de cartel no mercado de revenda de combustíveis. Revista de Direito

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Para o citado professor, apesar de os processos administrativos de investigação de cartéis no mercado de revenda de combustíveis representarem uma parte significativa do estoque de casos em curso no SBDC, o número de condenações alcançadas é baixo, o que denota uma alocação ineficiente de recursos para o processamento moroso de casos com pouca chance de êxito.

Ele informa que, com o intuito de solucionar esse problema, o CADE desenvolveu mecanismos de triagem mais rigorosos (indicador de atuação mais eficiente da autarquia). Adicionalmente, sugeriu medidas de advocacia da concorrência e o acirramento de sanções no setor de combustíveis, no que, de maneira cirúrgica expôs, in

verbis:

Efetividade tomou-se a palavra de ordem para todo o setor público. É preciso atingir resultados concretos e significativos para a sociedade. É claro que esse compromisso não poderia ser diferente para os órgãos que integram O Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência (SBDC), hoje composto pela Secretaria de Acompanhamento Econômico (Seae), do Ministério da Fazenda, pela Secretaria de Direito Econômico (SDE), do Ministério da Justiça, e pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), entidade julgadora do Sistema. Não é fácil enxergar os benefícios de uma política de concorrência, mas eles se traduzem em preços mais baixos, maior qualidade dos produtos e inovação tecnológica.

Fazendo-se triagem de processos de cartel no mercado de revenda de combustíveis. Averiguaram que somente entre janeiro e agosto de 2010, foram encaminhados ao CADE mais de 575 processos30, entre averiguações preliminares e

processos administrativos de infração à ordem econômica e atos de concentração entre empresas, segundo o Ministério da Justiça.

Ragazzo, auxiliado pelo assessor, à época, Eduardo Frade Rodrigues, verificou que a SDE, responsável por instruir os processos de infração à ordem econômica, o estoque de processos administrativos, averiguações preliminares e outros procedimentos, em fevereiro de 2010, somava mais de 500 casos, 2 também divididos entre número bastante reduzido de servidores.

30BRASIL. Ministério da Justiça CADE. CADE em números. Disponível em:

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Entre os processos de infração submetidos à SDE para investigação, análise e posterior encaminhamento ao CADE para julgamento, se destacam, em razão de seu volume, os processos de investigação de cartéis no mercado de revenda de combustíveis, originados de centenas de denúncias nos mais diversos municípios brasileiros. Segundo informado pela SDE, 4 entre os diversos segmentos de mercado objeto de investigação na Secretaria, a revenda de combustíveis e derivados de petróleo é o que recebe o maior número de denúncias de prática de cartel – uma média de quatro por semana, superando 200 denúncias anuais.31

O grande número de denúncias encaminhadas à SDE reflete, claramente, a frustação dos consumidores e de órgãos que defendem seus direitos, como o Ministério Público, com os preços de um produto utilizado direta e corriqueiramente pela população, que afeta pesadamente o seu bem-estar econômico e que, além de tudo constitui um mercado cuja dinâmica é facilmente observável por seus usuários, que têm fácil acesso às alterações de preços e às diferenças e semelhanças entre os diversos postos.32

Contudo, não obstante o elevado número de denúncias e de investigações em curso na SBDC, até tal data da publicação do artigo referido, apenas 7 delas resultaram em condenações pelo CADE. Todas as demais foram e continuam sendo arquivadas. E o voto objeto do presente comentário não foge a essa regra. A AP 08012.001198/2007-04, foi julgada pelo CADE em abril de 2010 e, tal como a maioria absoluta dos processos de objeto semelhante julgados antes dela, trata de representação de cartel em face de postos de combustíveis (no caso, em Curitiba-PR), ao final arquivada ante a ausência de provas suficientes.

Sendo assim, constatou-se que se perdia e recursos que poderiam ser devotados à investigação de casos que, efetivamente, têm chances concretas de êxito e, consequentemente, de gerar efeitos positivos sobre o bem-estar do mercado e dos consumidores. E, buscando-se a inversão daquela tendência e objetivando maior

31 BRASIL. Ministério da Justiça. Conselho Administrativo de Defesa Econômico - CADE. Averiguação Preliminar 08012.001198/2007-04. Representante: Senador Flávio Mas, Representado: Postos de Combustíveis de Curitiba, relator Conselheiro Carlos Emmanuel Joppert Ragazzo, DF, 28 abr. 2010, Diário Oficial da União, Brasília, 10 maio 2010.

32Para que se tenha uma ideia, no início de 2010, dos 503 processos em estoque na SDE, 120 (22,6)

tinham como objeto investigações de cartéis entre vendedores de combustíveis. Como consequência desse elevado percentual, dos 370 processos administrativos e averiguações preliminares encaminhadas ao CADE pela SDE, entre 2007 e 2009, 56 (15%) trataram desse tema. Fonte: BRASIL. Ministério da Justiça. Conselho Administrativo de Defesa Econômico - CADE. Averiguação Preliminar n. 08012.001198/2007-04.

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eficiência administrativa na atuação do Poder Público – ou seja, reduzir o gasto de recursos com a análise de casos sem chance de êxito e concentrar esforços em mais condenações - , os voto propuseram que se deveria estabelecer, de modo claro e aplicável, mecanismos de triagem mais rigorosos, que sejam capazes de selecionar, de maneira efetiva, as denúncias e investigações de cartéis no mercado de revenda de combustíveis que devem ser arquivadas sumariamente.

Tal maneira, como base na jurisprudência do CADE, identificaram, de forma sistematizada, as três principais circunstâncias que, isolada ou cumulativamente, geram a maioria esmagadora das denúncias de cartel nesse mercado: (i) semelhança entre os preços de revenda dos postos concorrentes; (ii) reajustes de preços, por parte dos concorrentes, em datas próximas ou simultâneas; e (iii) preços superiores aos cobrados em municípios próximos.

Em seguida, demonstraram, com base em análise econômica e concorrencial já bastante estabelecida, que nenhuma dessas circunstâncias, em conjunto ou isoladamente, é capaz, por si só, de provocar uma condenação por prática de cartel.

Reconhece-se que, em mercados caracterizados por produtos homogêneas, transparência de preços, interdependência das estratégias mercadológicas e relevância dos volumes comercializados, como é o caso do mercado de combustíveis, preços semelhantes e reajustes próximos são características também presentes na concorrência normal entre os agentes. Afora isso, os diversos fatores que diferenciam cada município podem explicar as variações de preços entre localidades distintas.

Diante disso, embora reconheça que a presença dessas circunstâncias possa denotar eventual existência de um cartel (tanto é que por isso, possivelmente, surgem tantas denúncias), a decisão também revela que essas mesmas características podem coexistir perfeitamente em uma situação de concorrência, conforme tem sido reconhecido pelo CADE reiteradamente.

Em suma, para que houvessem mais condenações de postos revendedores por formação de cartel, em benefício da coletividade e eficiência do mercado consumidor, necessário serie (e ainda é) que as denúncias tragam sempre fatores ou provas adicionais que demonstrem que o paralelismo entre os concorrentes não é simplesmente decorrente da dinâmica do mercado em questão (paralelismo plus).

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2.2.2. OBSERVAÇÕES SOBRE O MÉTODO DO COMPLIANCE

Para fins de finalização do tópico dedicado à concorrência, após selecionar e se ater ao objeto cartel, tema referente aos procedimentos repressivos, passa-se a tema de natureza mormente preventiva, o compliance.

Há três motivos principais pelos quais os programas de compliance, especialmente aqueles voltados ao direito concorrencial e à anticorrupção, ganharam destaque recentemente no Brasil33.

Primeiramente, as reformas legislativas promovidas por meio da Lei 12.846/13 e do Decreto 8.420/15, com a inclusão dos chamados “programas de integridade” como critérios de diminuição de multa por meio do art. 7º, VIII da lei e do art. 18, V do decreto, supramencionados.

Não há de se negar, que atualmente, no clima que o Brasil vem vivendo nos últimos anos, além da figura da “colaboração premiada”, pela qual pessoas físicas com vistas de terem suas penas amenizadas, colaboram com o sistema legal para receber a diminuição como espécie de prêmio, o “compliance” ganhou imediata atenção do mundo jurídico, exponencialmente do setor privado.

O segundo motivo é que é cediço que, institucionalmente, a implantação efetiva desse tipo de programa só acontecerá em jurisdições nas quais o enforcement das leis esteja devidamente consolidado, já que há duas principais motivações para seu estabelecimento: o medo da punição – o qual só se apresentará se a possibilidade de punição for real – e o senso de obrigação.

Por fim, como terceira motivação, é que atualmente as empresas serão tanto mais suscetíveis à implementação de compliance quanto maiores forem seus incentivos para fazê-lo, incentivos os quais não se resumem à certeza de punição (negativos), mas também estão relacionados à mitigação de penalidades (positivos), trata-se de questão de punibilidade.

33 LACHNIT, Eva. Compliance Programmes in Competition Law: Improving the Approach of Competition Authorities, p. 33. In MATTIUZZO, Marcela. Concorrência e corrupção – programas de compliance no debate jurídico-institucional brasileiro. Revista da Defesa da Concorrência - RDC, Vol. 5, n. 1, maio 2017 p.

Referências

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