UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS Instituto de Geociências
THAÍS DE PAULA MARTELETO
GADOLÍNIO ANTRÓPICO COMO TRAÇADOR DA PRESENÇA DE ESGOTOS SANITÁRIOS EM ÁGUAS SUPERFICIAIS
CAMPINAS 2018
THAÍS DE PAULA MARTELETO
GADOLÍNIO ANTRÓPICO COMO TRAÇADOR DA PRESENÇA DE ESGOTOS SANITÁRIOS EM ÁGUAS SUPERFICIAIS
DISSERTAÇÃO DE MESTRADO APRESENTADA AO INSTITUTO DE GEOCIÊNCIAS DA UNICAMP PARA OBTENÇÃO DO TÍTULO DE MESTRA EM GEOCIÊNCIAS NA ÁREA DE GEOLOGIA E RECURSOS NATURAIS
ORIENTADORA: PROFA. DRA. JACINTA ENZWEILER
ESTE EXEMPLAR CORRESPONDE À VERSÃO FINAL DA DISSERTAÇÃO DEFENDIDA PELA ALUNA THAÍS DE PAULA MARTELETO E ORIENTADA PELA PROFA. DRA. JACINTA ENZWEILER
CAMPINAS 2018
Agência(s) de fomento e nº(s) de processo(s): CAPES ORCID: http://orcid.org/0000-0003-3225-8543
Ficha catalográfica
Universidade Estadual de Campinas Biblioteca do Instituto de Geociências
Marta dos Santos - CRB 8/5892
Marteleto, Thaís de Paula, 1990-
M361g Gadolínio antrópico como traçador da presença de esgotos sanitários em águas superficiais / Thaís de Paula Marteleto. – Campinas, SP: [s.n.], 2018.
Orientador: Jacinta Enzweiler.
Dissertação (mestrado) – Universidade Estadual de Campinas, Instituto de Geociências.
1. Águas superficiais. 2. Águas subterrâneas. 3. Quelatos. 4. Traçadores (Química). 5. Efluentes. I. Enzweiler, Jacinta, 1955-. II. Universidade Estadual de Campinas. Instituto de Geociências. III. Título.
Informações para Biblioteca Digital
Título em outro idioma: Anthropogenic gadolinium as tracer of presence of wastewater in
surface waters Palavras-chave em inglês: Surface waters Groundwaters Chelates Tracers (Chemistry) Wastewaters
Área de concentração: Geologia e Recursos Naturais Titulação: Mestra em Geociências
Banca examinadora:
Jacinta Enzweiler
Sueli Yoshinaga Pereira Miriam Gonçalves Miguel
Data de defesa: 28-03-2018
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS INSTITUTO DE GEOCIÊNCIAS
AUTORA: Thaís de Paula Marteleto
“Gadolínio antrópico como traçador da presença de esgotos sanitários em águas superficiais”
ORIENTADORA: Jacinta Enzweiler
Aprovada em: 28 / 03 / 2018
EXAMINADORES:
Profa. Dra. Jacinta Enzweiler – Presidente
Profa. Dra. Sueli Yoshinaga Pereira
Profa. Dra. Miriam Gonçalves Miguel
A Ata de Defesa assinada pelos membros da Comissão Examinadora, consta no processo de vida acadêmica do aluno.
AGRADECIMENTOS
Agradeço, em especial, à Profa. Jacinta Enzweiler, pela orientação durante a pesquisa, nas conversas em sua sala, no laboratório, nos campos e nas reuniões com o grupo.
Agradeço aos meus pais, Donalde e Silvana, que sempre me apoiaram durante toda a realização do mestrado e da minha vida.
Agradeço ao meu companheiro e amigo, Luiz, pelos momentos compartilhados. Agradeço a todos da IBEP-Uberlândia, em especial ao Pastor Balmir e sua esposa Neusa pelas intercessões.
Agradeço à Margareth Navarro e à Aparecida pelo suporte nas análises laboratoriais. Agradeço à Divisão de Engenharia e Manutenção da Prefeitura do campus da Unicamp, em especial ao engenheiro Demércios Bueno Baú e à Tecnóloga em Meio Ambiente Renata Castagnato pelas informações a respeito do sistema de saneamento do campus.
Agradeço à Divisão de Meio Ambiente da Unicamp, ao biológo Paulo de Tarso pelo entusiasmo e cuidado dispensados, e ao veterinário Francisco de Assis, o “Chico”, pela ajuda no reconhecimento das áreas de amostragem.
Agradeço à Prefeitura Universitária pela autorização de acesso às APPs do campus e ao pessoal da manutenção do Parque Hermógenes Leitão Filho em Barão Geraldo/SP.
Agradeço aos setores de radiologia e diagnóstico por imagem do Hospital das Clínicas da Unicamp, do Centro Infantil Boldrini e do Centro Médico de Campinas pelas informações fornecidas para esta pesquisa.
Agradeço ao Bruno Mortatti pela ajuda, companhia no laboratório e pelos esclarecimentos de minhas dúvidas repentinas.
Agradeço ao pessoal da antiga Sala 14 da Pós do IG Unicamp: à Verônica, Raísa, Paola, Érica e Emanuel. Obrigada pelos cafés, conversas e ensinamentos.
Agradeço aos meus companheiros de graduação e mestrado, em especial ao Igor, Isabela, Jéssica, Marina, Nádia e Rafaela por estarem sempre por perto para ouvir minhas questões e dúvidas e por toda ajuda para “desopilaaaar” das mesmas. Agradeço ao João Ponte e João Motta pelos auxílios tecnológicos prestados.
Agradeço a Val, Cris, Gorete, Ana Beatriz e Valdir pela ajuda e auxílio nos assuntos relacionados à pós-graduação.
Por fim, agradeço à CAPES pela concessão de uma bolsa de mestrado e auxílio durante o período de pesquisa e ao IG-Unicamp pela infraestrutura disponibilizada para execução
desta.
SÚMULA CURRICULAR
Thaís de Paula Marteleto
É geóloga (2015) pela Universidade Estadual de Campinas. Iniciou seu Mestrado no Instituto de Geociências da UNICAMP em 2016, tendo como tema principal de sua pesquisa o uso de gadolínio antrópico como traçador de efluentes sanitários nas águas superficiais do campus da Unicamp e Distrito de Barão Geraldo/SP. Durante o período do mestrado foi responsável pelo uso do analisador de carbono do laboratório de Geoquímica do IG-Unicamp. Também participou do Congresso Brasileiro de Geoquímica (2017) no qual realizou apresentação oral de seu trabalho. Ainda durante o mestrado atuou como Estagiária PED (Programa de Estágio Docente) das disciplinas “Geoquímica Analítica” e “Geoquímica”, no IG/UNICAMP (2016 e 2017, respectivamente).
Durante a graduação realizou duas pesquisas de Iniciação Científica com os respectivos temas: “Banco de dados de materiais didáticos em geologia e geologia de petróleo e difusão na internet, para integrar pesquisa e ensino” (2012-2013) e “Eutrofização em estuários: uso de íons fosfato, nitrato e sílica em águas estuarinas da Baixada Santista (SP) como marcadores de ambientes impactados” (2014-2015).
RESUMO
GADOLÍNIO ANTRÓPICO COMO TRAÇADOR DA PRESENÇA DE ESGOTOS SANITÁRIOS EM ÁGUAS SUPERFICIAIS
A composição química das águas naturais reflete a dinâmica de processos que ocorrem na (sub)-superfície terrestre. Ela é continuamente modificada e pode ser afetada por atividades antrópicas. A contribuição antrópica de constituintes às águas naturais, seja pela descarga de resíduos urbanos, industriais ou pelo uso e ocupação do solo, resulta no incremento das concentrações de vários constituintes nas águas impactadas.
O gadolínio é um dos elementos terras raras (ETR) que apresenta propriedades paramagnéticas, motivo pelo qual alguns quelatos sintéticos de Gd são empregados como agentes de contraste em exames de ressonância magnética (RM). Os quelatos de Gd destinados a este fim são muito estáveis e solúveis, não são metabolizados e são rapidamente eliminados via urinária. Consequentemente, concentrações anômalas de Gd têm sido registradas em corpos d’água de áreas urbanas densamente povoadas que dispõem de infraestrutura médica avançada e têm sido atribuídas ao uso crescente de quelatos de Gd.
O objetivo deste trabalho foi caracterizar a distribuição espacial e quantificar anomalias de Gd antrópico dissolvido nas drenagens e corpos d’água da área do campus da Unicamp e Lagoa Chico Mendes, localizada no Parque Ecológico Hermógenes Freitas Leitão Filho, ambos no Distrito de Barão Geraldo (Campinas/SP), e confirmar o potencial deste elemento como traçador do vazamento de efluentes sanitários das tubulações de afastamento. A rede de afastamento de esgotos da área é antiga e a ocorrência de vazamentos é plausível. As drenagens da área de estudo são pequenas, mas atravessam locais com diferentes usos e ocupações do solo. Na área há laboratórios de três hospitais que empregam quelatos de Gd em exames de RM.Comparado com outros parâmetros usados para a mesma finalidade, o Gd antrópico é um traçador de elevada sensibilidade para rastrear a presença de esgotos sanitários em águas e a sua determinação é relativamente simples e de baixo custo.
Sessenta e duas amostras de águas superficiais e subterrâneas foram analisadas quanto aos constituintes maiores e traço, incluindo os ETR, e carbono orgânico dissolvido. As concentrações dos ETR em várias amostras de água normalizadas aos valores do PAAS (Folhelho Australiano Pós-Arqueano) mostraram anomalias significativas de Gd, em particular nos pontos em que drenagens desaguam na Lagoa Chico Mendes, nas proximidades da confluência das redes de efluentes e de águas pluviais do campus. A quantificação das anomalias de Gd e das concentrações de Gd antrópico nestes pontos produziu valores elevados, e ao mesmo tempo transientes, desses dois parâmetros. A correlação destes resultados com os de outras espécies dissolvidas de origem antrópica confirma que o excesso de Gd nas drenagens deve-se a vazamentos de efluentes brutos das redes de afastamento da área de estudo. Conclui-se que a presença de Gd antrópico em corpos d’água é um parâmetro eficiente para detectar vazamentos de efluentes, especialmente na área de estudo, onde as drenagens são independentes e de primeira ordem, e laboratórios médicos empregam quelatos de Gd.
ABSTRACT
ANTHROPOGENIC GADOLINIUM AS TRACER OF PRESENCE OF WASTEWATER IN SURFACE WATERS
The chemical composition of natural waters reflects the dynamics of processes occurring on the terrestrial (sub)-surface. It is continuously modified and can be affected by anthropogenic activities, which can add various constituents to pristine water, either from urban discharge, industrial waste or land use, impacting the concentrations of several components of watercourses.
Gadolinium is one of the rare earth elements (REE) that exhibits paramagnetic properties and its chelates serve as contrast agents in procedures by magnetic resonance imaging (MRI). Gd chelates used for such purpose are very stable and soluble, they are not metabolized but quickly eliminated in urine. Consequently, anomalous Gd concentrations registered in water bodies of densely populated urban areas with available advanced medical infrastructure have been attributed to that use of Gd chelates.
This work aimed to characterize the spatial distribution, quantify the Gd anthropogenic anomalies in the drainage and water bodies and confirm it as a tracer of the leakage of sanitary effluents from the separation pipes. The study area was the campus of Unicamp and Chico Mendes lagoon of the Ecological Park Hermógenes Freitas Leitão Filho, both in the Barão Geraldo District (Campinas/SP). The sewage network in the area is old, and the occurrence of leaks is plausible. The local drainages are small, but the land occupation is complex and varied, and laboratories of three hospitals of the area employ Gd chelates in MRI. Compared to other sewage tracers in water, anthropogenic Gd is a highly sensitive, and its determination is relatively simple and low cost.
Sixty-two surface and groundwater samples were analyzed for major and trace constituents, including the REE, and dissolved organic carbon. The REE concentrations in several water samples normalized against PAAS (Post-Archean Australian Shale) values showed significant Gd anomalies, particularly at two sampling points where the drainages discharge into the Chico Mendes lagoon, nearby the convergence of the effluent and pluvial water networks. The quantified Gd anomalies and its respective anthropogenic contribution at these points produced high, and at the same time, transient values for the two parameters. The correlation of these results with other dissolved anthropogenic species confirms that the Gd excess in the drainages is due to leakings in the sewage network. The study showed that the presence of anthropogenic Gd in water bodies is a parameter to detect effluent leaks, especially in the study area, where the drainages are independent and of the first order, and medical laboratories employ Gd chelates.
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Figura 3.1- Bacias e sub-bacias hidrográficas do município de Campinas, destaque para a área de
estudo (retângulo tracejado em vermelho). (Adaptado de: IGC 2006). ... 28
Figura 3.2 – Mapa geológico da região de Campinas/SP com enfoque para a área de estudo
(pontilhado vermelho) e direção de fluxo superficial (setas pretas). (Adaptado de: Perrota et al. (2005) e IG (2009)). ... 30
Figura 3.3- Fotos do campus da Unicamp em 1976 (à esquerda) e no final da década de 1990 (à direita),
ao lado esquerdo está a drenagem principal, atualmente parcialmente canalizada (linha tracejada), e a LCM. (Fonte: SIARQ). ... 33
Figura 3.4 - Rede de coleta e afastamento de efluentes e galerias pluviais da área de
estudo...36
Figura 3.5- Localização dos pontos amostrados na área de estudo, drenagens e lagos (azul), pontos
(vermelho), instalações hospitalares (amarelo) e direção do fluxo de acordo com a cota do terreno (setas laranjas). ... 36
Figura 3.6 - Localização dos pontos situados dentro do campus da Unicamp e ilustração de suas
características. ... 37
Figura 3.7 - Localização dos pontos situados na Lagoa Chico Mendes, no Parque Ecológico
Professor Hermógenes Freitas Leitão Filho. ... 38
Figura 5.1- Representação gráfica da diferença relativa obtida no balanço de cargas das amostras,
círculos vermelhos: águas superficiais, círculos azuis: águas subterrâneas dos poços tubulares e círculo amarelo: água da torneira. ... 52
Figura 5.2– Pluviograma com a precipitação acumulada (mm) para as campanhas de amostragem, as
setas vermelhas indicam os dias ou intervalo de coleta. ... 59
Figura 5.3– Diagrama de Piper da composição das amostras dos poços tubulares e água da torneira do
prédio do Laboratório de Geoquímica do IG (T-LG). ... 60
Figura 5.4- Diagramas dos ETR normalizados pelo PAAS dos pontos amostrados dentro do campus
da Unicamp. ... 72
Figura 5.5- Diagramas dos ETR normalizados pelo PAAS dos pontos amostrados na Lagoa Chico
Mendes e ponto RSL e duplicatas. ... 73
Figura 5.6- Diagrama dos ETR normalizados pelo PAAS para as amostras do poços tubulares e água
da torneira do Laboratório de Geoquímica da Unicamp. ... 74
Figura 5.7- Diagrama dos ETR normalizados pelo PAAS para as amostras do Ribeirão Anhumas
(An1-1, An1-2 e An1-3) e a amostra An16 do trabalho de Campos (2014). ... 74
Figura 6.1– Relação entre ∑ETR e turbidez nas amostras de água superficial coletadas na área do
campus da Unicamp e LCM. ... 76
Figura 6.2– Diagrama dos padrões das concentrações dos ETR normalizados pelo PAAS da amostra
LI-3, do poço FEF e de alguns rios mundiais (dados de Bau & Dulski 1996, Bau et al. 2006). ... 77
os dois elementos. Os pontos vermelhos representam as amostras com anomalia de Gd enquanto os pontos azuis as amostras sem anomalia. ... 79
Figura 6.4 – Variações espaciais e temporais das razões Gd/Gd* nos pontos da área de estudo, (a)
pontos dentro do campus da Unicamp e (b) pontos na LCM e ponto RSL. ... 80
Figura 6.5– Setorização das águas superficiais da área de estudo em um perfil SE-NW segundo as
anomalias encontradas. (A) Águas com ausência ou pouca influência antrópica, de composição quase pristina; (B) Águas com influência antrópica e pontos como LS e LM com anomalias pronunciadas de Gd; (C) Águas com baixas anomalias de Gd, com interferência antrópica e possível contato com águas subterrâneas e (D) Águas que representam a mistura de todas as contribuições da área de estudo. ... 83
Figura 6.6– Comparação das concentrações de Gd antrópico e de B como indicadores para efluentes
nas águas superficiais da área de estudo, com exemplo das amostras RRA-1, LS-4 e LM-2, em ordem espacial. ... 84
Figura 6.7– Relações entre razões Gd/Gd* e concentrações de COD, (a) nas amostras com Gd/Gd* ≤
1,8, círculos azuis; (b) nas amostras com altas razões Gd/Gd*, círculos vermelhos e (c) em todas as amostras da área de estudo. ... 86
Figura 6.8– Relações entre alguns constituintes sugeridos como indicadores de fontes antropogênicas
em águas fluviais. ... 87
Figura 6.9 – Relações entre alguns constituintes sugeridos como indicadores de fontes antropogênicas
em águas fluviais. ... 87
Figura 6.10 – Representação das porcentagens de Gd natural e antrópico presentes nas amostras que
exibiram razões Gd/Gd* acima do background (> 1,3). A amostra Mn 2-2 representa o background da área de estudo. ... 89
LISTA DE TABELAS
Tabela 3.1– Pontos de amostragem de água, suas coordenadas UTM e breve descrição. ... 35
Tabela 5.1- Resultados dos parâmetros físico-químicos, cátions e ânions maiores e COD (mg∙L-1) das
amostras... 57
Tabela 5.2 – Dados de precipitação das campanhas de amostragem. ... 59
Tabela 5.3 - Resultados da análise por SF-ICP-MS e Q-ICP-MS (excluindo os ETR) para as amostras
de água (µg·L-1). ... 65
Tabela 5.4 - Resultados de ETR obtidos para as amostras de águas por SF-ICP-MS em ng·L-1. Apenas
as amostras dos pontos Mn 1a e An1 foram obtidos por Q-ICP-MS em ng·L-1. ... 70
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
CI Cromatografia de Íons
CID Carbono Inorgânico Dissolvido COD Carbono Orgânico Dissolvido
DI Desionizada
DSIS Divisão de Sistemas e Manutenção da Unicamp
Eh Potencial de oxi-redução em relação ao eletrodo padrão de hidrogênio ETE Estação de Tratamento de Esgoto
ETR Elementos Terras Raras
GPS Global Positioning System (Sistema de Posicionamento Global)
HREE Elementos Terras Raras Pesados
ICP-MS Inductively coupled plasma mass spectrometry (Espectrometria de Massas com Plasma Indutivamente Acoplado)
ICP-OES Inductively coupled plasma optic emission spectrometry (Espectrometria Ótica de Emissão com Plasma Indutivamente Acoplado)
IUPAC International Union of Pure and Applied Chemistry (União Internacional de Química Pura e Aplicada)
LD Limite de Detecção
LDPE Low-density Polyethylene (Polietileno de Baixa Densidade) LREE Elementos Terras Raras Leves
MR Material de Referência
MRC Material de Referência Certificado
NRCC National Research Council Canada (Conselho Nacional de Pesquisa do Canadá) OD Oxigênio Dissolvido
ORP Potencial de oxi-redução P.A. Para Análise
PAAS Post-Archean Australian Shale (Folhelho Australiano Pós-Arqueano) PFA Perfluoralcóxido
pH Potencial Hidrogeniônico
USGS United States Geological Survey (Serviço Geológico dos Estados Unidos)
SUMÁRIO
AGRADECIMENTOS ... v
SÚMULA CURRICULAR ... vii
RESUMO ... viii
ABSTRACT ... ix
LISTA DE ILUSTRAÇÕES ... x
LISTA DE TABELAS ... xii
LISTA DE ABREVIAURAS E SIGLAS ... xiii
SUMÁRIO ... xiv
Capítulo 1 - INTRODUÇÃO ... 16
1.1. Elementos Terras Raras ... 18
1.1.1 Ecotoxicologia dos ETR nos ambientes geoquímicos ... 19
1.1.2 ETR em sistemas aquáticos ... 20
1.2. Gadolínio antrópico e anomalias associadas ... 21
Capítulo 2 - OBJETIVOS ... 27
Capítulo 3 - ÁREA DE ESTUDO E PONTOS DE AMOSTRAGEM ... 28
3.1. Parque Ecológico Professor Hermógenes Freitas Leitão Filho - Lagoa Chico Mendes .. 31
3.2. Gestão da Água e Sistema de Saneamento na Unicamp ... 32
3.3. Campanhas de amostragem e localização dos pontos amostrados ... 34
Capítulo 4 - MATERIAIS E MÉTODOS ... 42
4.1. Determinação da Alcalinidade por titulação acidimétrica ... 44
4.2. Determinação de íons maiores por cromatografia de íons... 45
4.3. Determinação de carbono orgânico dissolvido (COD) ... 46
4.4. Determinação de elementos-traço por ICP-MS ... 46
4.5. Controle de qualidade ... 48
4.6. Cálculo de anomalias de ETR ... 49
4.7.1 Cálculo da porcentagem de Gd antrópico ... 49
Capítulo 5 – RESULTADOS ... 51
5.1. Garantia de Qualidade ... 51
5.2. Resultados das análises das amostras ... 53
5.2.1 Parâmetros físico-químicos ... 53
5.2.3 Elementos-traço ... 61
5.2.4 ETR e quantificação de anomalias ... 64
Capítulo 6 - DISCUSSÃO ... 75
6.1. Ocorrência natural e antrópica de ETR nas águas superficiais e subterrâneas ... 75
6.1.1 Anomalias de Gd e sua origem antrópica ... 78
6.1.2 Distribuição espacial e temporal das anomalias de Gd ... 79
6.1.3 Gd antrópico e constituintes associados a efluentes ... 84
6.1.4 Quantificação da porcentagem de Gd antrópico ... 88
Capítulo 7 - CONCLUSÕES ... 90 REFERÊNCIAS ... 92 APÊNDICE ... 105 APÊNDICE A ... 105 APÊNDICE B ... 106 APÊNDICE C ... 107 APÊNDICE D ... 109
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CAPÍTULO 1 - INTRODUÇÃO
A composição química das águas naturais reflete a dinâmica de processos que ocorrem na (sub)-superfície terrestre e é modificada constantemente por equilíbrios de troca iônica, precipitação, mistura e diluição, fracionamento e reciclagem de nutrientes, troca de gases com a atmosfera e pela descarga de resíduos urbanos e industriais (Gibbs 1970, Faure 1998). Os principais constituintes dissolvidos nas águas naturais superficiais são Na+, K+, Mg2+, Ca2+, Cl– , HCO3–, SO42–, NO3–, H4SiO4. Entretanto, compilações de dados composicionais de rios ao redor do mundo (Livingstone 1963, Meybeck 1979, Berner & Berner 1987) indicam que a introdução antrópica desses e outros constituintes em águas superficiais pode resultar em concentrações significativamente maiores em relação às águas naturais. A geoquímica de sistemas fluviais em áreas urbanas é indissoluvelmente ligada à alteração da paisagem e de modificações quanto ao uso e ocupação do solo (Jasechko et al. 2016).
A classificação das águas naturais pode ser feita através de cálculos de equilíbrio químico entre as principais espécies dissolvidas e visualizadas graficamente em diagramas. Piper (1944) sugeriu um diagrama baseado em dois gráficos ternários correlacionando os principais cátions e ânions nas águas naturais a partir das suas concentrações presentes. O diagrama de Piper ainda é um dos mais utilizados em hidrogeoquímica, contudo é mais adequado para águas de composição mais pristina. Stiff (1951) propôs um diagrama com base nos íons maiores presentes nas águas, o qual é útil para comparar diferentes tipos composicionais em uma mesma área de estudo. Gibbs (1970) usou a composição química de águas superficiais, do oceano e de chuva para classificá-las segundo a quantidade de sólidos totais dissolvidos (STD) em função da razão Na/(Na+Ca) e de Cl/(Cl+HCO3). O diagrama resultante apresenta uma distribuição de pontos com três campos de fatores predominantes distintos, isto é, evaporação/precipitação, dominância da rocha e precipitação. O diagrama de Gibbs (1970) tem sido usado para demonstrar a influência antrópica na composição de águas superficiais. Exemplos são o aumento do pH e das concentrações de Ca2+ e HCO3– quando águas levemente ácidas entram em contato com tubulações de concreto (Hatt et al. 2004, Wright et al. 2011). Adicionalmente, Hem (1970, 1989) já tinha realizado revisão acerca dos processos químicos, geológicos e hidrogeológicos que controlam a composição natural das águas. Além de constituintes originados da interação água-rocha, diversos contaminantes antrópicos podem ocorrer em águas a depender da disposição inadequada de resíduos sólidos e líquidos, seja de natureza domiciliar ou industrial.
17
difusas. As primeiras constituem os efluentes domésticos e industriais, e as difusas são aquelas dispersas por escoamento superficial urbano e rural de resíduos e produtos químicos (Prado 2004). A contribuição antrópica de constituintes oriundos de áreas intensamente urbanizadas aos sistemas geoquímicos vem aumentando consideravelmente nas últimas décadas e, no início dos anos 1990 culminou com a definição do termo “geoquímica urbana”. Este termo constitui a interface entre geoquímica ambiental e poluição urbana (Lyons & Harmon 2012). Deste modo, o lançamento de esgotos e de águas pluviais captadas em meio urbano em rios e drenagens contribui significativamente para a denominada síndrome dos cursos d’água ou fluxos urbanos (em inglês – urban stream syndrome), que se caracteriza pela alteração das características biogeoquímicas das águas (Connor et al. 2014). Além disso, em áreas com relevante crescimento urbano ocorrem alterações na geomorfologia fluvial principalmente devido a diferenças litológicas, vegetação, inclinação do terreno e estruturas urbanas como estradas e canalização de drenagens (Chin 2006). Hatt et al. (2004) também observaram que o grau de impermeabilidade e a conexão de drenagem, a qual é definida pela proporção de superfícies impermeáveis diretamente conectadas ao curso d’água, em 15 sub-bacias em Melbourne (Austrália), contribuíram significativamente para o aumento de concentrações de compostos e contaminantes inorgânicos e orgânicos nestes cursos d’água. Estes contaminantes frequentemente constituem traçadores da situação do corpo d’água (Williams et al. 2013). O pH, a condutividade elétrica e constituintes dissolvidos (Cl-, NO2-, NO3-, HCO3-, NH4+, Na+, Ca2+, B e Gd) são parâmetros citados constantemente para demonstrar a introdução de efluentes sanitários em cursos d’água. Barber et al. (2011) estudaram o impacto de efluentes tratados em cursos d’água usando uma abordagem Lagrangiana, isto é, um certo volume de água é monitorado durante a sua trajetória ao longo da drenagem sob condições naturais. Além disso, contribuições advindas de águas marginais e à montante de um fluxo principal são relevantes para a variação da concentração de contaminantes ao longo do curso d’água e podem impactar a qualidade da água à jusante (Barco et al. 2008, Eshleman 2004). Richards et al. (2017) utilizaram traçadores presentes em fossas sépticas, como cloreto e amônio, além de alguns parâmetros físico-químicos como STD, turbidez, CE e alcalinidade, para estabelecer seu potencial de contaminação em sistemas hídricos em função da diluição e estabeleceram razões como parâmetros para descargas de efluentes no rio Ythan e Don, no nordeste da Escócia.
As águas naturais também contêm elementos-traço, isto é, constituintes cujas concentrações tendem a ser < 1 mg L-1, mas que dependem das respectivas abundâncias na crosta continental e de suas mobilidades durante o transporte e o intemperismo (Gaillardet et
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al. 2014). Dentro desse conjunto, destacam-se os elementos terras raras (ETR), cujas concentrações e variações naturais no ambiente são de grande interesse geoquímico.
1.1. Elementos Terras Raras
Os ETR compreendem o grupo três da tabela periódica, isto é, escândio, ítrio e a série dos lantanídeos (La-Lu). Com grande frequência, em geologia o termo ETR refere-se somente à série La-Lu, com inclusão ou não do Y. Os ETR se caracterizam pelo estado de oxidação trivalente e pela contração lantanídica, que diz respeito à diminuição do raio iônico ao longo da série. Ce e Eu também podem ser encontrados nos estados de oxidação tetravelente e bivalente, respectivamente. Os ETR são elementos litófilos e as suas propriedades químicas, geoquímicas e mineralógicas fazem deles traçadores de processos petrogenéticos, intempéricos, hidrogeológicos e também ambientais. São subdivididos em leves (ETRL: La (Z = 57) ao Gd (Z = 64) e pesados (ETRP: Tb (Z = 65) ao Lu (Z = 71)) (Castor & Hedrick 2006, USGS 2011) e apresentam comportamento geoquímico coerente em sistemas naturais. A coerência dentro do grupo se baseia na carga e raio iônico, que faz com que em processos de cristalização fracionada de minerais, os ETR entrem na estrutura cristalina ao mesmo tempo (Goldschmidt 1937). Desta maneira, o efeito da variação natural da sua abundância, isto é, dos ETR de número atômico par serem mais abundantes que os impares é suavizado pela normalização das concentrações obtidas nos meios amostrados em relação a condritos e/ou folhelhos. Como resultado do seu uso crescente em inúmeras aplicações tecnológicas, e a sua consequente introdução no ambiente, os ETR já foram denominados micro poluentes ou micro contaminantes emergentes (Kulaksız & Bau 2013).
Os usos e aplicações dos ETR são caracterizados pela alta especificidade e valor unitário agregado (Haxel et al. 2002). O consumo de ETR está ligado à indústria tecnológica e diversas aplicações têm sido descobertas para seu incremento em outras áreas.
Aparelhos eletroeletrônicos necessitam de vários ETR para seu funcionamento e/ou funcionalidades. Por exemplo, tubos de raios catódicos e telas de cristal líquido contém Eu sob a forma de Eu2O3, (Haxel et al. 2002, Harben 2002). O érbio (Er) é utilizado como revestimento em cabos de telecomunicações de fibra óptica, pois amplifica sinais transmitidos. O Ce, que é o ETR mais abundante possui dezenas de aplicações. O óxido de Ce (CeO2) é adequado como um agente de polimento de vidro, desde espelhos comuns a lentes de alta precisão. A tecnologia de ímãs permanentes tem sido revolucionada por ligas contendo Nd, Sm, Gd, Dy ou Pr. Algumas características dos ETR são seus altos pontos de fusão, a baixa eletronegatividade e a
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boa resistência à corrosão (BRASIL 1997). Por isto, são empregados em conversores catalíticos de controle da poluição automotiva. Novas tecnologias na fabricação de lâmpadas que contém Y, La, Ce, Eu, Dy e Tb para iluminação institucional são alternativas para redução das emissões de CO2 (Haxel et al. 2002).
Algumas aplicações baseiam-se na baixa toxicidade do metal utilizado, por exemplo, baterias contendo La-Ni-H recarregáveis estão substituindo gradativamente as antigas baterias com Ni-Cd em computadores e as de Pb nos automóveis. Outro avanço de aplicação de alta tecnologia para os ETR consiste na refrigeração magnética. Do Gd3+ até o Tm3+, os elementos possuem grandes momentos magnéticos e têm sido usados para produzir materiais magneto-calóricos com potencial de uso para aquela finalidade (Haxel et al. 2002).
Em alguns países, como China e EUA, os ETR também têm sido usados para suplementar a dieta de animais domésticos e como fertilizantes para promover o crescimento de plantas (Migaszewski & Gatuszka 2015).
Amplo uso de ETR também se aplica na medicina diagnóstica, especificamente em imageamento por ressonância magnética (RM), em que são utilizados agentes de contraste baseados em quelatos de Gd que fornecem precisão e resolução nas imagens geradas por esta técnica (Weinmann et al. 1984).
1.1.1 Ecotoxicologia dos ETR nos ambientes geoquímicos
Os ETR não são elementos químicos essenciais para sustentar a vida e o conhecimento do papel que exercem nos organismos, especialmente em processos bioquímicos, é insuficiente (Migaszewski & Gatuszka 2015). O aumento significativo do uso de ETR principalmente na indústria de alta tecnologia tem levado a um incremento destes elementos no ambiente, e desta forma, eles têm sido incluídos no grupo dos chamados contaminantes emergentes.
A exploração, produção e processamento de minérios de ETR geram enormes quantidades de rejeitos, que constituem um risco ambiental (Haxel et al. 2002). Adicionalmente, os minerais que possuem ETR geralmente possuem tório (Th) em sua estrutura, e, portanto, podem emitir radiação. Por outro lado, nos seus depósitos mais frequentes, a matriz de carbonato de minerais com ETR pode aumentar o pH das águas e dos solos (Migaszewski & Gatuszka 2015).
O desconhecimento acerca do grau de contaminação ambiental e/ou humana e da ecotoxicologia dos ETR justifica-se pela ainda pequena quantidade de estudos quanto às relações entre saúde e exposição a estes elementos através das matrizes ambientais.
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Os fertilizantes enriquecidos em ETR têm sido utilizados na China para aumentar a germinação das sementes, o crescimento das raízes, aumentar o teor de clorofila e a resistência da planta (Hu et al. 2004). Mas efeitos adversos também podem ocorrer nestas situações. O estudo experimental de d'Aquino et al. (2009) indicou efeitos negativos na germinação de sementes e no crescimento das plantas, quando tratadas com nitrato enriquecidos com ETR.
Os potenciais efeitos toxicológicos dos ETR em baixa dosagem durante um longo período de tempo sobre a saúde humana ainda são desconhecidos (Pagano et al. 2015 a e b). Martino et al. (2016) demonstraram efeitos negativos da exposição de Gd de origem antrópica na calcificação em espécies de ouriços-do-mar na costa norte-ocidental da Sicília, na Itália.
Com relação ao Gd, os agentes de contraste baseados em quelatos utilizados em exames de RM podem eventualmente e, principalmente, em pessoas com insuficiência renal levar a incidência de fibrose nefrogênica sistêmica (Broome 2008, Idée et al. 2008).
1.1.2 ETR em sistemas aquáticos
Nos sistemas aquáticos as concentrações e/ou assinaturas dos ETR dependem da composição do meio (Goldstein & Jacobsen 1988, Miekeley et al. 1992, Dia et al. 2000, Pourret et al. 2010). Informações úteis são extraídas de diagramas normalizados, tais como feições de fracionamento ou a presença de anomalias (Gaillardet et al. 2014). O fracionamento de ETR nos sistemas aquáticos é controlado por processos de adsorção e complexação (Goldstein & Jacobsen 1988) além da atividade biológica (Stille et al. 2006). Na água do mar, por exemplo, as concentrações normalizadas dos ETR a um material de referência apresentam padrão com anomalias positivas de La e Gd (De Baar et al. 1991; Zhang & Nozaki 1996) devido às baixas estabilidades dos complexos destes elementos em relação aos ETR vizinhos (Byrne & Kim 1990). Este padrão, porém, não é observado em águas superficiais.
A solubilidade dos ETR é fortemente controlada pelo pH (Smedley 1991). Em condições alcalinas, os ETR tendem a formar complexos com carbonato ou bicarbonato, já em condições ácidas os ETR se encontram na forma livre ou ligados a espécies aniônicas (p. ex. sulfato) se presentes em concentração abundante no meio (Smedley 1991). Os ETRL (La até Gd) são mais adsorvidos a fases sólidas enquanto os ETRP (Tb até Lu) são mais complexados por carbonato. Anomalias negativas de Ce também são frequentes em decorrência da sorção preferencial de Ce4+ nas fases sólidas, comparado com as espécies trivalentes dos demais ETR (Nelson et al. 2003, Leybourne & Johannesson 2008, Kraemer et al. 2015). Diagramas das concentrações dos ETR normalizados com configuração côncava na região dos ETR intermediários foram atribuídas à complexação com matéria húmica (Pedrot et al. 2008).
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Em suma, a distribuição dos ETR em águas é influenciada por condições físico-químicas como pH, Eh, temperatura e composição geral do meio (Gaillardet et al. 2014). A presença de constituintes inorgânicos (CO32–, OH–, SO42–, F–) e orgânicos dissolvidos podem complexar os ETR, enquanto a presença de colóides como óxi-hidróxidos de ferro e de manganês, e argilominerais os adsorvem. A solubilidade dos ETR é inversamente proporcional ao pH. Goldstein & Jacobsen (1988) encontraram menores concentrações de ETRL em rios com maiores valores de pH (~8), em oposição à concentração de ETRP. Os mesmos autores observaram uma tendência crescente no padrão de ETR normalizado ao longo da série dos lantanídeos em diversos rios mundiais de grande porte. Em águas subterrâneas a concentração de ETR também depende de fatores hidrogeológicos, o que inclui vias de fluxo e tempo de residência (Johannesson et al. 2005).
As análises de águas são realizadas em amostras filtradas em membranas com poros cujo diâmetro possui intervalo de 0,45 a 0,22 µm. Nesta fração pode-se encontrar os componentes dissolvidos e partículas de tamanho coloidal (com tamanho numa dimensão de 1 nm a 1µm) abrangendo partículas inorgânicas, macromoléculas e agregados diversos (Stolpe & Hassellöv 2007, Gaillardet et al. 2014). Alguns autores avaliaram a contribuição da fração coloidal às concentrações totais medidas. Por exemplo, Deberdt et al. (2002) empregaram ultrafiltração de amostras de águas de rio e cálculos de especiação e concluíram que a fração coloidal mineral pode conter 60% do total de ETR dissolvidos em pH levemente ácido a básico. Pourret et al. (2007) cruzando os dados de médias mundiais de águas de rios com novos cálculos de complexação dos ETR com matéria húmica, previu que os ETR se encontram predominantemente como complexos orgânicos (≥ 60%) especialmente no intervalo de pH próximo do neutro (entre 5-5,5 e 7-8,5). Estes dados aparentemente antagônicos demonstram a necessidade de se caracterizar bem o meio estudado para se conhecer mais a respeito do comportamento dos ETR no meio aquático.
1.2. Gadolínio antrópico e anomalias associadas
O Gd3+ (Z=64) é classificado como um ETRL e com seus sete elétrons não pareados nos orbitais 4f apresenta alto momento paramagnético (Weigers et al. 1992, Tweedle 1992). Devido a esta propriedade, desde o final dos anos de 1980, o Gd é utilizado como agente de contraste em exames de ressonância magnética (RM) (Pierre et al. 2014). As imagens tridimensionais geradas na RM são resultantes da polarização e excitação dos núcleos dos átomos de hidrogênio das moléculas de água presentes nos tecidos humanos, o que permite a
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detecção e diferenciação de anormalidades funcionais e inflamatórias dos tecidos biológicos (Marthur-de Vré & Lemort 1995, Balci et al. 2005). O contraste entre tecidos sãos e alterados são realçados por íons metálicos como os lantanídeos, especialmente o Gd (Martins & Isolani 2005). Entretanto, o íon em sua forma livre (Gd3+) é altamente tóxico pois apresenta tendência a se precipitar e depositar no fígado, tecidos linfáticos e ossos (Shellock 1999). Adicionalmente, o Gd3+ pode obstruir a passagem de Ca2+ para as células musculares e do tecido nervoso e impedir a transmissão neuromuscular (Bellin 2006).
A fim de diminuir o efeito toxicológico do Gd3+ mas usufruir de suas propriedades paramagnéticas, a indústria farmacêutica produz quelatos de Gd como DTPA (gadopentetato dimeglumina), DOTA (gadoterato meglumina), DO3A-butrol (gadobutrol), EOB-DTPA (gadotexetato dissódico) (Tweedle 1988). Um quelato é um complexo, o qual pode ter estrutura química cíclica ou linear, com um cátion metálico central ligado a dois ou mais grupos funcionais de um único ligante. Esses quelatos de Gd são muito estáveis, isto é, possuem alta constante de associação (log Ka = 22) e são denominados agentes de contraste (Weinnam et al. 1984).
O primeiro agente de contraste baseado num quelato de Gd a ser comercializado foi o Magnevist® (Gd-DTPA)em 1984 (Weinmann et al. 1984) e, desde então, muitos outros foram desenvolvidos. Atualmente, sete quelatos de Gd são aprovados internacionalmente para uso clínico (Bellin 2006). No Brasil, os mais comumente utilizados além do ácido pentacético dietilenotriamina Gd-DTPA (Magnevistan® ou Magnevist®), são o ácido gadotérico (Gd-DOTA (Dotarem®), o gadoxetato dissódico (Gd-EOB-DTPA (Primovist®), gadobutrol Gd(DO3A-butrol) (Gadovist®) e gadoversetamida (OptiMARK®). Em 2006, já havia mais de 5 milhões de aplicações anuais do agente de contraste Gd-DTPA em aproximadamente 101 países (Knopp et al. 2006). A fabricação de agentes de contraste emprega entre entre 5 a 15% das 400 t de Gd produzidas anualmente (Idée et al. 2006, Kulaksiz & Bau 2011a).
O paciente que necessita realizar um exame de RM recebe uma dose (entre 0,1 a 0,3 mmol·kg-1) de um quelato de Gd, que posteriormente é majoritariamente excretado via urinária (Runge 2000, Niendorf et al. 1993). O tempo de meia vida do quelato no organismo é de aproximadamente 1,5 h com eliminação de >95% em até 24 horas (Oskendal et al. 1993). Estudos sobre a estabilidade dos complexos de Gd dentro do corpo humano mostram que pode ocorrer um processo chamado transmetalação com íons endógenos como Fe3+, Cu2+, Zn2+ e Ca2+ o qual tem potencial de liberar os íons Gd3+ dos complexos por dissociação (Mann 1993, Puttagunta et al. 1996, Künnemeyer et al. 2009, Telgmann et al. 2012).
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Em condições ambientais, especialmente em ambientes aquáticos, o complexo Gd-DTPA se comporta como um traçador conservativo (Menahem et al. 2016, Verplanck et al. 2005, Kulaksiz & Bau 2007). Contudo, alguns estudos também mostraram que a transmetalação ocorre nestes ambientes, principalmente quando há disponibilidade de íons metálicos como Fe3+, Cu2+, Zn2+ e metais como Y e ETR (Möller & Dulski 2010a). O Gd3+ liberado no sistema é rapidamente adsorvido a argilominerais, especialmente na presença de oxihidróxidos de Fe3+ (Rabiet et al. 2014) diferentemente dos quelatos de Gd. As reações de transmetalação entre os complexos de Gd e os íons metálicos são muito lentas. Por exemplo, se comparado a outros ETR a estimativa de equilíbrio químico é de aproximadamente dezenas de anos. Desta maneira, os complexos de Gd, especialmente os que contêm em sua estrutura o radical -DTPA, podem ser considerados traçadores hidrológicos devido a sua elevada estabilidade permanecendo nestes sistemas por no mínimo dois meses (Möller & Dulski 2010b). Adicionalmente à alta estabilidade, os quelatos de Gd também possuem alta solubilidade e permanecem em efluentes brutos e tratados e são transferidos às águas superficiais. De fato, os quelatos têm sido utilizados em muitos estudos para rastrear a mistura de efluentes com as águas superficiais e subterrâneas (Bau & Dulski 1996, Möller et al. 2000, Knappe et al. 2005, Verplanck et al. 2005, Elbaz-Poulichet et al.2002, Kulaksiz & Bau 2007). Em solos, os quelatos também são móveis pois não adsorvem a partículas ou realizam troca iônica com minerais de argila (Howard 2007, Künnemeyer et al. 2009, Kümmerer & Helmers 2000, Rabiet et al. 2009, Möller et al. 2010a, Telgmann et al. 2012). Contudo, experimentos em coluna realizados por Holzbecher et al. (2005) mostram que o quelato Gd-DTPA pode ser degradado durante a infiltração de água superficial no solo, e nas condições empregadas estimaram sua meia-vida em mais de 100 dias. Estudos recentes investigaram a bioacumulação dos quelatos de Gd em macrófitas aquáticas e descobriram que a sua mobilização para os tecidos das plantas era influenciada por processos físicos como difusão pela diferença de concentração do meio aquático (Braun et al. 2017).
O aumento significativo das aplicações de agentes de contraste baseados em quelatos de Gd em imageamento por RM, especialmente em áreas com infraestrutura médica avançada e densamente populosa, faz com que a introdução deste componente nos sistemas aquáticos represente um excesso definido por anomalias em relação às concentrações naturais esperadas. Por esta razão, a presença de Gd antrópico tem sido observada em águas superficiais e subterrâneas em diversas partes do mundo. Bau & Dulski (1996) foram os primeiros a relatar a ocorrência de Gd antrópico atribuída ao emprego dos agentes de contraste em águas superficiais
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na Alemanha. Desde então, muitos trabalhos relataram o mesmo tipo de anomalia de Gd onde há infraestrutura clínica avançada (Bau et al. 2006, Kulaksiz & Bau 2007, Verplanck et al. 2010). Outros exemplos podem ser citados como na Europa (Möller et al. 2000, Elbaz-Poulichet et al. 2002, Knappe et al. 2005, Rabiet et al. 2005, Morteani et al. 2006), na Ásia (Nozaki et al. 2000, Zhu et al. 2004, 2005, Ogata & Terakado 2006, Mao et al. 2014), na América do Norte (Verplanck et al. 2005, Bau et al. 2006), na América do Sul (Brasil) (Campos 2014, Merschel et al. 2015, Campos & Enzweiler 2016) e na Austrália (Lawrence & Kamber 2006, Lawrence et al. 2009). No Brasil, Campos (2014) e Merschel et al. (2015) registraram a presença de Gd antrópico, respectivamente em águas do rio Atibaia e do Ribeirão Anhumas, ambos na região de Campinas (SP) e no Lago Paranoá (Brasília, DF). Em registro anterior, Cotta & Enzweiler (2009) detectaram anomalias de Gd em águas superficiais da região de Campinas e em água de abastecimento público.
As anomalias são estimadas a partir das razões (Gd/Gd*) calculadas por equações que interpolam ou extrapolam os ETR próximos ao Gd. Podem ser usados Sm e Tb (Bau & Dulski 1996, Bau et al. 2006, Klaver et al. 2014, Knappe et al. 2005, Petelet-Giraud et al. 2009, Rabiet et al. 2005, Tricca et al. 1999) ou Eu e Tb (Elbaz- Poulichet et al. 2002, Nozaki et al. 2000). Estudos recentes propõem o uso dos resultados dos ETRL para os cálculos, destacando Nd e Sm (Kulaksiz & Bau 2007) ou Nd e Eu (Kulaksiz & Bau 2013, Merschel et al. 2015). As anomalias de Gd são esperadas somente em águas que recebem efluentes de esgoto tratados e não tratados em regiões com alto desenvolvimento médico-hospitalar onde imageamento por RM é realizado.
Durante o tratamento de esgoto, os agentes de contraste de quelatos de Gd permanecem na fase dissolvida ao invés de serem transferidos para o lodo (Verplanck et al. 2010). Portanto, anomalias antrópicas de Gd nos padrões de ETR apresentam potencial para uso como traçadores em estudos hidrogeológicos (Dulski et al. 2011). Lindner et al. (2013) identificaram incremento significativo das concentrações de Gd ao longo do canal Teltow, ao sul de Berlin, Alemanha, devido ao influxo de agentes de contraste vindos das ETEs, sobretudo nas amostras coletadas na frente das saídas das tubulações para o corpo d’água. Goullé et al. (2012) coletaram durante 29 dias amostras de efluentes da ETE do hospital da Universidade de Rouen e da planta de tratamento da própria cidade de Rouen e identificaram que as menores concentrações de Gd eram aos finais de semana, período em que não havia a realização ou a quantidade de exames
de RM era muito baixa em relação aos dias considerados úteis. Knappe et al. (1999) e Möller et al. (2000) sugeriram que o Gd de origem antropogênica
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poderia ser usado como traçador da presença de efluentes em cursos d’água. Posteriormente, outros estudos sugeriram o uso das anomalias de Gd antrópico para a detecção em sistemas aquáticos de águas recicladas, as quais incluem águas de reuso de efluentes, precipitação e águas subterrâneas utilizadas para irrigação (Badruzzaman et al. 2013).
Adicionalmente à presença de anomalias de Gd antrópico como traçadoras de esgotos em águas superficiais, o uso de outros traçadores inorgânicos como B, Cl-, NO3-, adoçantes artificiais e fármacos foram sugeridos para esta finalidade (Rabiet et al. 2006). O Gd antrópico apresenta elevada confiabilidade como traçador e a sua determinação por métodos de sensibilidade adequada é relativamente simples e com custo aceitável (Knappe et al. 1999; Bichler et al. 2016). Bichler et al. (2016) também utilizaram as anomalias de Gd juntamente com as concentrações de Cl- e acesulfame (adoçante dietético) na quantificação da infiltração de águas fluviais em aquíferos rasos. Em áreas onde há contato entre águas superficiais e subterrâneas, o sinal transiente do Gd antrópico pode ser útil como traçador de fluxo e de tempo de trânsito de águas subterrâneas (Brünjes et al. 2016). Por esta razão, anomalias de Gd foram relatadas em águas de torneira oriundas de poços de abastecimento que possuem proximidade com cursos d’água afetados por efluentes ou bancos de filtração de ETE, especialmente em países europeus (Tepe et al. 2014).
A ocorrência de anomalias de Gd em águas pluviais (Iwashita et al. 2011) teve sua origem associada a emissões atmosféricas provenientes de fábricas de lentes e vidros e de catalisadores de automóveis, contudo ainda faltam estudos mais consistentes que confirmem esta fonte.
Na área de estudo desta pesquisa, Campos e Enzweiler (2016) mediram anomalias de Gd antrópico em amostras de água coletadas no riacho formado à saída da Lagoa Chico Mendes do Parque Ecológico Prof. Hermógenes Freitas Leitão, vizinho ao campus da Unicamp. Bulia e Enzweiler (2015) quantificaram uma pequena anomalia de Gd antrópico na água subterrânea extraída de um dos poços tubulares usados para o abastecimento complementar de água potável do campus da Unicamp. Apesar da proximidade de hospitais que realizam exames com agentes de contraste, as anomalias de Gd registradas na área ou proximidades do campus são inesperadas, porque os efluentes brutos produzidos localmente são afastados até a uma Estação de Tratamento de Esgoto (ETE) de Barão Geraldo, localizada a alguns quilômetros e seus efluentes tratados são lançados a montante. Entretanto, de acordo com a Divisão de Sistemas e Manutenção da Unicamp (DSIS), a rede de coleta de efluentes do campus é antiga, o que aumenta a probabilidade de ocorrência de vazamentos. Desta forma, com esta pesquisa se
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pretende confirmar a presença do Gd antrópico na área e usá-lo como traçador de efluentes na água superficial, partindo do pressuposto que suas drenagens são somente locais e afluem a cursos d’água que recebem efluentes tratados. Adicionalmente, se tenta empregar Gd antrópico como ferramenta para mapear a localização de vazamentos e auxiliar as futuras melhorias na rede de coleta e afastamento de efluentes da Unicamp e adjacências.
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CAPÍTULO 2 - OBJETIVOS
O objetivo geral da pesquisa de mestrado foi confirmar a presença de anomalia de Gd antrópico dissolvido nas drenagens e corpos d’água da área do campus da Unicamp e na Lagoa Chico Mendes, no Parque Ecológico Hermógenes Freitas Leitão Filho, localizados no Distrito de Barão Geraldo (Campinas/SP), avaliar sua distribuição e atestar o potencial deste elemento como traçador do vazamento de efluentes sanitários das tubulações de afastamento. Para alcançar o objetivo geral, foram definidos os seguintes objetivos específicos:
a) Mensurar as concentrações dos ETR e de outros constituintes nas águas superficiais da área de estudo por meio de coletas sistemáticas e da análise geoquímica de amostras de água;
b) Relacionar as concentrações de Gd com as de Nd e outros parâmetros (pH, condutividade elétrica, carbono orgânico dissolvido, Cl-, NO2-, NO3-, HCO3-, NH4+, Na+, Ca2+ e B) mais frequentemente associados com a presença de efluentes em corpos d’água.
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CAPÍTULO 3 - ÁREA DE ESTUDO E PONTOS DE AMOSTRAGEM
O campus da Unicamp encontra-se no Distrito de Barão Geraldo (DBG), no centro-norte do município de Campinas, leste do estado de São Paulo. O município, com área de 796,4 km², é dividido em nove macrozonas, as quais abrangem Áreas de Planejamento (APs) e as Unidades Territoriais Básicas (UTBs) (PDMC 2006). O DBG possui 71,95 km2 de área e se encontra na macrozona 3. Seus limites são o corredor da rodovia D. Pedro I – SP 65 ao sul, a rodovia Adhemar Pereira de Barros - SP 340 a leste, e o ribeirão Quilombo e as divisas com os municípios de Sumaré e Paulínia/SP a oeste (SEPLAMA 2006). A macrozona 3 abriga instituições de ensino, de pesquisa e de saúde de grande porte (Unicamp, Pucc, Centro Infantil Boldrini (CIB), Hospital das Clínicas (HC), Centro Médico de Campinas (CM)), bairros residenciais e expressiva quantidade de estabelecimentos comerciais e industriais.
Os principais cursos d’água do município de Campinas são os rios Atibaia, Jaguari (a leste) e Capivari Mirim e Capivari (a sudoeste). Na região centro-norte encontram-se os ribeirões Anhumas e Quilombo (Figura 3.1).
Figura 3.1- Bacias e sub-bacias hidrográficas do município de Campinas, destaque para a área de estudo
(retângulo tracejado em vermelho). (Adaptado de: IGC 2006).
A rede de drenagem de Campinas contempla riachos e ribeirões que convergem para as bacias do rio Atibaia/Jaguari e Capivari. O DBG está inserido na sub-bacia do ribeirão
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Anhumas, afluente da margem esquerda do rio Atibaia, e que é intensamente afetado por atividades antrópicas e recebe diretamente os efluentes de pelo menos cinco estações de tratamento de esgoto (SANASA).
Geomorfologicamente, a região está na transição entre o Planalto Atlântico e a Depressão Periférica e, geologicamente, está no contato entre a Bacia Sedimentar do Paraná e o Embasamento Cristalino (IG 1993). A Bacia Sedimentar do Paraná abrange a porção oeste e sua composição é principalmente de arenitos, folhelhos e ritmitos do Grupo Itararé com idade carbonífera e, basaltos e diques de diabásio da Formação Serra Geral. O Embasamento Cristalino abrange a porção leste de Campinas e se caracteriza pela presença de granitos do Complexo Itapira, Jaguariúna, e Socorro, e gnaisses graníticos, gnaisses tonalíticos, migmatitos, paragnaisses, mica xistos e biotita gnaisses do Complexo Varginha Guaxupé, de idade neoproterozóica (Perrota et al. 2005). A Figura 3.2 apresenta o mapa geológico da área de estudo com maior detalhe juntamente com as cotas de nível do terreno e segundo este mapa a maior parte da área abrange diabásios e diamictitos, além da ocorrência de aluviões nas drenagens estudadas.
A hidrogeologia da área de estudo abrange três sistemas aquíferos: Diabásio, Tubarão e Cristalino (IG 1993). O sistema aquífero Diabásio possui escala local, enquanto o Tubarão e Cristalino são de escala regional (Yoshinaga-Pereira & Silva 1997). O primeiro é composto por rochas intrusivas básicas correlacionáveis aos basaltos da Formação Serra Geral, o segundo é constituído por rochas sedimentares do subgrupo Itararé e o último possui rochas do Embasamento Cristalino. Bulia & Enzweiler (2013) caracterizaram as águas subterrâneas da área de estudo pela amostragem da água de poços de abastecimento da Unicamp e sugeriram que estes são influenciados, principalmente por rochas como diabásio, arenito e, alguns estão localizados em zonas onde há contato entre diferentes rochas como arenito, granito e diabásio.
Quanto às águas superficiais, na área de estudo há corpos d’água de classificação lêntica e lótica. Os ecossistemas lênticos compreendem represamentos como lagos, lagoas e os lóticos são os de água corrente. Os primeiros interferem na dinâmica natural dos cursos d’água e, que associada a interferências antrópicas como a canalização e o uso e ocupação do solo, afetam diretamente a composição das águas. As águas superficiais da área do estudo convergem para o ribeirão das Pedras, afluente do ribeirão Anhumas que deságua no rio Atibaia no município de Paulínia/SP.
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Figura 3.2 – Mapa geológico da região de Campinas/SP com enfoque para a área de estudo (pontilhado vermelho) e direção de fluxo superficial (setas pretas).
Adaptado de: Perrota et al. (2005) e IG (2009)).
PMil
PROTEROZOICO MÉDIO Complexo Itapira
PROTEROZOICO SUPERIOR Suíte Granítica Jaguariúna
PSγjP
Gnaisses indiferenciados, anfibolito e possíveis rochas cálcio-silicáticas Biotita-granitos foliados rosa-acinzentados de granulação média a grossa
Subgrupo Itararé
CPiD
CPiR Ritmitos turbidíticos
Associação faciológica de diamictitos maciços ou com granodecrescência ascendente.
CARBONÍFERO-PERMIANO
JKb Diabásios cinza escuros a pretos, finos ou muito finos
JURÁSSICO-CRETÁCEO QUATERNÁRIO
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3.1. Parque Ecológico Professor Hermógenes Freitas Leitão Filho - Lagoa Chico Mendes
O Parque Ecológico Professor Hermógenes Freitas Leitão Filho foi fundado em 1983 pelo professor e pesquisador de mesmo nome por iniciativa da Unicamp, a qual também o designou coordenador do parque no período de 1983-1994 (Martins et al. 2001). Com uma área estimada de 152.000 m² e a maior parte correspondendo a Lagoa Chico Mendes (LCM), o parque é administrado desde 1996 pela Secretaria do Verde, Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável sob responsabilidade da Prefeitura Municipal de Campinas. Por estar localizado muito próximo a áreas como a Unicamp e bairros residenciais, o parque é frequentado pela população para lazer e a prática de atividades físicas.
O parque já foi alvo de investigações e estudos, sobretudo de caráter ambiental. Por ser um barramento artificial e um ponto de convergência das águas das áreas adjacentes, a LCM se constitui como um alvo de grande interesse. A principal razão e indagamento destes estudos diz respeito ao recebimento de efluentes pela lagoa advindos das áreas adjacentes a ela. Em 2002, a CETESB (Companhia Ambiental do Estado de São Paulo) emitiu um parecer técnico (nº 028H/00/CPr CL) o qual menciona a presença na água da LCM da alga Cylindrospermopsis raciborskii e outros organismos do grupo das cianobactérias (cianofíceas), as quais reduzem o nível de oxigênio dissolvido na água e liberam toxinas potencialmente bioacumuladoras na cadeia alimentar (CETESB 2002). O parecer recomendou a não utilização da água seja para contato primário ou abastecimento e que a população evitasse o consumo de peixes pescados na saída da LCM. Medeiros et al. (2007) fizeram uma avaliação da situação da LCM e constataram a diminuição, em uma ordem de grandeza, na quantidade de coliformes termotolerantes em relação ao laudo apresentado pela CETESB em 2003, quando seu valor era 2,2x106 NMP/100 ml (número mais provável por 100 ml de amostra) para 2,4 x105 NMP/100 ml em 2007. Esta quantidade ainda ultrapassa em seiscentas vezes o limite recomendado pelo Resolução CONAMA nº257/2000 (4,0x102 NMP/100 ml). Dagnino (2007) retomou as discussões sobre o lançamento de esgoto da universidade para a LCM e produziu um mapa com os possíveis pontos de despejo, os quais seriam os pontos nomeados neste presente trabalho de LM e LI. Em 2014 ocorreu uma mortandade de peixes na lagoa, e o tema de esgotamento sanitário irregular foi retomado, com novas suspeitas sobre a universidade (Verzignasse 2014). A Unicamp tem realizado, desde então, ações mitigadoras na LCM a fim de eliminar todo e qualquer lançamento de efluentes na lagoa bem como minimizar os danos decorrentes dos eventos passados. As ações mitigadoras abrangem a aeração em tubulação de águas pluviais
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para manter a oxigenação da lagoa, a instalação de barreira absorvente para contenção de óleos graxos, a varrição por hidro jateamento e a sucção de sólidos. Adicionalmente, análises da água realizadas anualmente estão dentro dos limites aceitáveis determinados pelos órgãos públicos responsáveis, conforme informação obtida junto à Divisão de Sistemas da Unicamp (DSIS).
3.2. Gestão da Água e Sistema de Saneamento na Unicamp
Todas as diretrizes e ações da universidade seguem a Lei Estadual nº 5005/1986 que rege o Sistema de Conservação do Solo e Água no Estado de São Paulo. Entretanto muitas decisões e ações relativas à infraestrutura da universidade, tomadas no início da sua implantação, atualmente estão em desacordo com a legislação ambiental vigente. Um exemplo é a canalização da drenagem principal que atravessa o campus, pois conforme a Lei nº 12.727/2012 do Código Florestal uma distância de 15 a 30 m deve ser respeitada para obras próximas aos cursos d’água naturais de até 10 metros de largura. Isto é evidenciado na Figura 3.3 (à esquerda e à direita) que reproduz fotografias aéreas do campus da Unicamp de 1976 e, do final da década de 1990 e início dos anos 2000. Na fotografia de 1976, no lado esquerdo, observa-se a drenagem principal em seu curso natural, com vestígios de mata ciliar e com construções nas proximidades como as do IFGW e do IFCH. Com a expansão da universidade, na fotografia à direita, a drenagem principal já se encontra canalizada junto à rua Bertrand Russell. Muitos institutos de pesquisa e faculdades foram construídos praticamente sobre a drenagem canalizada. Exemplos são prédios do IFGW (Instituto de Física Gleb Wataghin), IMECC (Instituto de Matemática, Estatística e Computação Científica) e o IG (Instituto de Geociências). Costa et al. (2005) elaboraram mapa de impermeabilização do solo da bacia do ribeirão Anhumas e identificaram que a área de estudo apresenta locais com variação na porcentagem de impermeabilização devido às áreas construídas. A porção mais SE do campus da Unicamp é considerada muito permeável (0-20%), enquanto que conforme se avança em direção SE-NW, a impermeabilização do solo aumenta e chega a níveis de classificação permeável (20-50%) a pouco permeável (85-95%).
Segundo a DSIS o consumo de água e geração de efluentes na universidade equivalem aos de um município de 10 mil habitantes. A circulação diária dentro do campus de Barão Geraldo é de 50 mil pessoas. Com uma área de 450.000 m², o campus apresenta diversidade com relação ao uso do solo e na geração de efluentes. Atualmente, a demanda hídrica da universidade para consumo humano e de outras atividades é de 54 milhões de litros ao mês, o que corresponde a um custo de 2 milhões de reais. Parte da demanda (40%) é abastecida com água subterrânea extraída
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de poços tubulares perfurados na área do campus. A universidade possui quatro poços, e dada a sua proximidade com institutos e órgãos, são nomeados de acordo com os mesmos: IMECC, IB (Zoologia) (Instituto de Ciências Biológicas), GM (Ginásio Multidisciplinar) e FEF (Faculdade de Educação Física). Atualmente, o poço GM está desativado. O monitoramento da qualidade das águas subterrâneas é realizado periodicamente pela universidade segundo a Portaria do Ministério da Saúde nº 2914/2011 que dispõe sobre os procedimentos de controle e de vigilância da qualidade da água para consumo humano e seu padrão de potabilidade e segundo a Resolução Estadual SS nº65/2005.
Figura 3.3- Fotos do campus da Unicamp em 1976 (à esquerda) e no final da década de 1990 (à direita),
ao lado esquerdo está a drenagem principal, atualmente parcialmente canalizada (linha tracejada), e a LCM. (Fonte: SIARQ).
Em relação ao esgotamento sanitário, de acordo com a DSIS e com a Figura 3.4, o sistema utilizado pela universidade é do tipo separador, comumente adotado no Brasil. Este sistema separa as águas pluviais e de infiltração em linhas de tubulações independentes da rede de afastamento de efluentes (Além Sobrinho & Tsutya 1999, Medeiros 2006). Contudo, a disposição dos emissários de afastamento de efluentes e das tubulações de galerias pluviais, apresentam pontos de confluência, e alguns foram amostrados neste trabalho. Os esgotos da Unicamp são diversificados devido a dinâmica das atividades e instalações da universidade, a qual dispõe de hospital, restaurantes, sanitários, oficinas, laboratórios, hotel e piscinas. Os efluentes brutos produzidos localmente são afastados até a Estação de Tratamento de Esgoto (ETE) Barão Geraldo e segue a Resolução CONAMA nº 430/2011 e o Decreto SP nº 8468/1976 (Art. 18 e Art. 19A). Entretanto, a rede de coleta de efluentes do campus é antiga, e a ocorrência de vazamentos ainda nos dias atuais é possível.
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Figura 3.4– Rede de coleta e afastamento de efluentes e galerias pluviais da área de estudo.
3.3. Campanhas de amostragem e localização dos pontos amostrados
As campanhas de amostragem de águas superficiais ocorreram num período de 14 meses, com coletas em agosto de 2016, janeiro, maio, setembro e outubro de 2017. Adicionalmente, dois pontos foram amostrados em abril de 2017 por três dias consecutivos em campanha independente. A definição da localização dos pontos baseou-se na hidrografia local, acessibilidade aos corpos d’água e objetivos do estudo. Procurou-se ajustar as datas das coletas das águas superficiais de forma a abranger períodos com diferentes condições sazonais. As coletas ocorreram entre 17 e 25 de agosto de 2016, 04 e 11 de janeiro, 04 a 06 de abril, 18 e 25 de maio de 2017, e, 25 de setembro e 02 de outubro de 2017, no período da manhã. Adicionalmente, em 03 de outubro de 2017, foi efetuada uma amostragem de águas subterrâneas em quatro poços tubulares de abastecimento do campus da Unicamp, do quais três são operacionais. A Tabela 3.1 e a Figura 3.5 apresentam os pontos amostrados e suas coordenadas UTM. As Figuras 3.6 e 3.7 ilustram as características de cada ponto, que serão descritos a seguir.
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Tabela 3.1– Pontos de amostragem de água, suas coordenadas UTM e breve descrição.
Pontos Longitude (mE)
Latitude
(mS) Descrição
BR 286983 7476032 Ponto RSL – branco de amostragem
Mn 1 288622 7474613 Manilha que direciona água de drenagem com nascente na Fazenda Argentina
Mn 2 288476 7474652 Extravasor da barragem do ponto Mn 1
LC 288506 7474603 Lago próximo ao CEMA-Unicamp
LB 288362 7474391 Lago paralelo à Av. Magalhães Teixeira
RRA 288203 7474781 Riacho formado a partir das duas nascentes à SE-NW
AR 288169 7474799 Afluente do riacho RRA (SW-NE)
LS 287671 7475797 Manilha na saída do lago FUNCAMP e de águas pluviais da parte norte da universidade e adjacências
LM 287509 7475680 Três manilhas com fluxo da drenagem principal e galeria de águas pluviais
LI 287253 7475696 Manilha da drenagem IB para a LCM e de águas pluviais da parte oeste da universidade e adjacências
RP 287000 7475983 Travessia na saída da LCM
RSL 286983 7476032 Extravasor na saída da LCM
IMECC 287855 7475415 Poço tubular ativo
IB 287566 7474809 Poço tubular ativo
FEF 287216 7475664 Poço tubular ativo
GM 287328 7475477 Poço tubular desativado
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Figura 3.5- Localização dos pontos amostrados na área de estudo, drenagens e lagos (azul), pontos (vermelho), instalações hospitalares (amarelo) e direção do fluxo
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Figura 3.6 - Localização dos pontos situados dentro do campus da Unicamp e ilustração de suas características.
Ponto AR Ponto Mn 1 Ponto RRA Ponto Mn 2 Ponto LC Ponto LB
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Figura 3.7 - Localização dos pontos situados na Lagoa Chico Mendes, no Parque Ecológico Professor Hermógenes Freitas Leitão Filho.
Ponto LM: estação seca Ponto LM: estação chuvosa
Ponto LS Ponto LI