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Processo

133/15.9T9RMR.E1

Data do documento 4 de fevereiro de 2020

Relator

Carlos Berguete Coelho

TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA | PENAL

Acórdão

DESCRITORES

Suspensão provisória do processo > Prosseguimento dos autos > Contraditório

SUMÁRIO

I – Determinada em sede de instrução a suspensão provisória do processo e, decorrido o respectivo prazo, o juiz não deve revogar a suspensão e ordenar o prosseguimento dos autos, sem que aos arguidos seja dada a possibilidade de se pronunciarem sobre os motivos do incumprimento.

II - O Tribunal, ao não ter determinado, pelo menos, a notificação dos arguidos, para o efeito de se pronunciarem quanto ao incumprimento que se deparava, incorreu em omissão de acto essencial para a descoberta da verdade, conducente a nulidade nos termos do art. 120.º, n.º 3, alínea d), do CPP, afectando a validade dos actos subsequentes.

TEXTO INTEGRAL

Acordam, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora

1. RELATÓRIO

Nos autos em referência, do Juízo de Instrução Criminal de Santarém do Tribunal Judicial da Comarca de Santarém, na sequência da suspensão provisória do processo determinada em instrução e decorrido o período dessa mesma suspensão, proferiu-se decisão de prosseguimento dos autos e pronúncia nos seguintes termos, no que ora releva:

I.

Findo o Inquérito, em 03.02.2016, o Ministério Público deduziu acusação, em processo comum e com a intervenção do Tribunal singular, contra os arguidos:

(2)

MF…, Lda., (…); JM, (…);

NM, (…); e SM, (…);

Imputando-lhes a prática dos factos aí descritos, suscetíveis de configurar a prática de um crime de abuso de confiança contra a Segurança Social, na forma continuada, previsto e punido pelo disposto no art. 30.º, n.ºs 1 e 2, do Código Penal, e no art. 107.º, n.ºs 1 e 2, com referência ao art. 105.º, n.ºs 1 e 4, alíneas a) e b), e art. 7.º (quanto à sociedade arguida), todos da Lei n.º 15/2001 de 05.07.

*

Após ter sido declarada aberta a instrução, foi proferida decisão, em 20.04.2016, suspendendo provisoriamente o processo pelo período de 24 meses, com a injunção de “pagamento, pelos arguidos, do capital em dívida à Segurança Social, acrescidos dos juros de mora legalmente devidos e custas do processo administrativo, de forma faseada ou integral, conforme melhor entenderem” (cfr. folhas 436). *

Compulsados os autos e decorrido o período da suspensão provisória do processo, verifica-se que o I.S.S., I.P. – Centro Distrital de Santarém informou os autos de que foi efetuado, no mês de janeiro de 2013, um pagamento no valor de 700,00€ (setecentos euros), pelo arguido JM; encontrando-se, ainda em dívida, o valor de 55.867,58€ (cinquenta e cinco mil, oitocentos e sessenta e sete euros, e cinquenta e oito cêntimos) – cfr. folhas 468 a 470.

*

O Ministério Público promoveu o prosseguimento dos autos, nos termos do disposto no art. 282.º, n.º 4, alínea a), do Código de Processo Penal.

*

Durante o período de suspensão provisória do processo, os arguidos nunca nada disseram. *

II.

A suspensão provisória do processo na fase da instrução tem por efeito suspender a instrução e, portanto, também a prolação de despacho instrutório.

Assim, caso não venham a ser cumpridas as prestações e regras de conduta, o juiz deve proferir decisão de pronúncia, atenta a existência de factos que indiciavam suficientemente o crime e que constituíram o fundamento da suspensão provisória do processo.

Por sua vez, se tiverem sido cumpridas as prestações e regras de conduta, o juiz deverá proferir uma decisão de não pronúncia.

Para proferir as referidas decisões não é necessária a convocação de novo debate instrutório – cfr. Paulo Pinto de Albuquerque, Comentário do Código de Processo Penal à Luz da Constituição da República e da

(3)

Convenção Europeia dos Direitos do Homem, 3.ª Ed., pp. 775.

Como acima se referiu, o período da suspensão provisória do processo decorreu, verificando-se que os arguidos não cumpriram a injunção que lhes foi imposta, nem justificaram este incumprimento.

Importa, portanto, proferir despacho de pronúncia. *

III. Decisão:

Pelo exposto, nos termos dos acima citados normativos legais, decido:

a) Pronunciar, para julgamento em processo comum e com a intervenção do Tribunal singular, mercê do incumprimento das injunções impostas, os arguidos:

MF… Lda., com o NIPC----, com sede na Estrada Nacional…, Rio Maior;

JM, filho de…, natural de Oliveira de Frades, nascido em 25.07.1973, residente em Arcozelo das Maias;

NM, filho de…, natural de Oliveira de Frades, nascido em 02.06.1982, residente em Arcozelo das Maias; e

SM, filho de …, natural de Oliveira de Frades, nascido em 12.01.1977, residente em Moçarria;

Pela prática dos seguintes factos:

1. A primeira arguida é uma sociedade por quotas, matriculada na Conservatória do Registo Comercial de Rio Maior, sob o n….., a qual tem como objeto a atividade de desmancha de aves, preparação de produtos à base de carnes, avicultura, centro de abate de aves, produção e comercialização de aves e produtos à base de carnes.

2. Os arguidos, JM, NM e SM, exerceram as funções de gerentes da sociedade arguida desde a data da sua constituição pelo menos até ao final do ano de 2014, tomando as decisões diárias relativas à laboração e gestão da sociedade, incluindo o pagamento e processamento das remunerações, agindo em nome daquela.

3. Durante os meses de janeiro de 2013 a março de 2014, no exercício normal da sua atividade, os arguidos, por si e em nome da sociedade identificada em 1., na qualidade de sócios gerentes desta, procederam ao pagamento das remunerações dos trabalhadores da referida sociedade e dos membros dos órgãos sociais, tendo, em cada um dos referidos meses, procedido à dedução e retenção no valor das mesmas do montante referente às contribuições por estes legalmente devidas à Segurança Social, as quais se encontram elencadas a folhas 48 e 49 dos autos e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.

(4)

4. O montante total das contribuições retidas e não entregues perfaz o valor de €56.567,58.

5. Os arguidos, por si e em nome da sociedade identificada em 1., não procederam à entrega dos valores referidos em 3. e 4, ao Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, nem nos prazos legalmente estipulados, isto é, até ao dia 15 do mês seguinte àquele a que diziam respeito, nem nos 90 dias subsequentes ao termo de tal prazo, nem nos 30 dias posteriores ao dia da notificação, para realizar tal facto.

6. Durante o período de tempo referido em 3., os arguidos, por si e em nome da sociedade identificada em 1., atuaram motivados por falta de fiscalização do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, quanto à falta de entrega dos valores em causa.

7. Ao agir da forma supra descrita, os arguidos por si e em representação da sociedade identificada em 1. quiseram e conseguiram eximir-se à obrigação de entregar as quantias referidas em 3. e 4., no prazo, para tanto, legalmente fixado, bem sabendo que estavam obrigados a proceder à sua entrega no referido prazo.

8. Agiram os arguidos sempre de forma livre, deliberada e consciente, sabendo que a sua conduta era proibida e punida por Lei.

*

Os arguidos incorrem, assim, na prática de um crime de abuso de confiança contra a Segurança Social, na forma continuada, previsto e punido pelo disposto no art. 30.º, n.ºs 1 e 2, do Código Penal, e no art. 107.º, n.ºs 1 e 2, com referência ao art. 105.º, n.ºs 1 e 4, alíneas a) e b), e art. 7.º (quanto à sociedade arguida), todos da Lei n.º 15/2001 de 05.07.

(…).

Notificados dessa decisão, os arguidos vieram arguir a nulidade da mesma.

Foi, então, proferido despacho, agora recorrido, do seguinte teor:

Os arguidos JM, NM e SM vieram arguir a nulidade do despacho de pronúncia, invocando que o mesmo “violou as disposições constantes dos arts. 120.º, n.º 2, alínea d) e 61.º, n.º 1, alínea b), ambos do Código de Processo Penal”, acrescentando que o princípio do contraditório ficou comprometido com tal decisão instrutória, uma vez que, na sua perspetiva, o despacho de pronúncia foi deduzido “automática e mecanicamente”.

Não assiste razão aos reclamantes.

(5)

este Tribunal teve em consideração que “Durante o período de suspensão provisória do processo, os arguidos nunca nada disseram”, não obstante tenham estado presentes no debate instrutório realizado no dia 20.04.2016, na qual ficaram cientes que o período de suspensão provisória do processo era o de 24 meses, o qual se encontrava largamente ultrapassado aquando da dedução de despacho de pronúncia.

Acrescem que os arguidos, durante a fase de instrução (contrariamente ao que sucede, por vezes, na fase de inquérito, não obstante se discorde da fundamentação da fundamentação do ac. do TRC de 18.10.2017, proc. n.º10/16.6GBGRD.C1, disponível em www.dgsi.pt) encontravam-se regularmente representados por advogado e conheciam as consequências do incumprimento da injunção impostas.

O I.S.S. veio esclarecer que tal injunção não foi cumprida no período em causa.

Os arguidos nunca nada disseram ao Tribunal.

O princípio do contraditório, no âmbito do processo penal, em face de todo o exposto não poderá assumir uma vertente “paternalista” do arguido, quando este estava ciente de que decorreu o período de suspensão provisória do processo e, não só não cumpriu aquilo a que se obrigou, por sua própria iniciativa, perante um Tribunal, como em nenhum momento se dirigiu perante o Tribunal revogando a sua concordância quanto à injunção imposta.

Pelo exposto, e nos termos dos citados normativos legais, decido julgar totalmente improcedente a invocada nulidade processual.

Notifique.

Os referidos arguidos JM, NM e SM interpuseram, em requerimento conjunto, recurso desse despacho, formulando as conclusões:

1. O recurso ora submetido à mui douta e criteriosa apreciação de Vossas Excelências vem do douto despacho datado de 22/11/2018 que decide pela improcedência do requerimento apresentado pelos arguidos em 11/06/2018, arguindo nulidade do despacho de pronúncia.

2. Recorrem os arguidos por não se poderem conformar com tal douta decisão, por lhes parecer, salvo o devido respeito, que muito é, ter a Meritíssima Juiz de Instrução feito uma menos correcta interpretação e aplicação do direito.

3. No âmbito da suspensão provisória do processo foi imposta aos arguidos injunção de “pagamento pelos Recorrentes do capital em dívida à Segurança Social, acrescidos de juros de mora legalmente devidos e custas do processo administrativo, de forma faseada ou integral, conforme melhor entenderem”.

(6)

4. Injunção que os Recorrentes se viram impossibilitados de cumprir.

5. Em 11/06/2018, concluindo verificado o incumprimento da injunção imposta aos Recorrentes, a Meritíssima Juiz de Instrução automática e mecanicamente revogou a suspensão provisória do processo e proferiu o douto despacho de pronúncia.

6. Sem que para tanto tenha diligenciado por qualquer forma pelo apuramento da existência de culpa dos arguidos nesse incumprimento, respectivo grau e/ou verificado a existência de circunstancias que objectivamente os tenham impedido de cumprir e sem que os Recorrentes tenham sido notificados para exercerem previamente o contraditório.

7. Omitindo-se assim qualquer ponderação ou juízo de culpa dos arguidos no incumprimento daquela injunção, bem como a omissão aos mesmos de qualquer oportunidade de o justificar.

8. Pelo que os Recorrentes arguiram a nulidade do despacho de pronúncia, sustentando a sua posição na alínea d) do n.º 2 do artigo 120.º e alínea b) do n.º 1 do artigo 61.º, ambos do CPP, bem como nas garantias de defesa e no princípio do contraditório constitucionalmente consagrados no n.º 1 e 5 do artigo 32.º da CRP.

9. Nulidade que foi julgada totalmente improcedente por douto despacho datado de 22/11/2018 e com o qual os Recorrentes não podem minimamente concordar.

10. Sempre foi intenção dos Recorrentes cumprir a injunção que lhes havia sido imposta, mas apenas não o conseguiram em face das fortes dificuldades e restrições sentidas no decorrer daquele período.

11. Circunstâncias que teriam dado a conhecer aos autos se para tanto tivessem sido notificados para se pronunciarem quanto ao eventual incumprimento das injunções, antes de operada a revogação da suspensão provisória do processo.

12. Conforme vem sendo maioritariamente defendido pela doutrina e jurisprudência, sempre se impunha a notificação dos arguidos para que se pronunciassem, querendo, quanto ao eventual incumprimento e para que se pudesse ponderar ou ajuizar a eventual existência de culpa nesse incumprimento.

13. É certo que a alínea a) do n.º 4 do artigo 282.º do CPP dispõe que o processo prossegue quando o arguido não cumpra as injunções no prazo estabelecido.

14. Todavia, a revogação provisória do processo não podia operar automaticamente, mas antes carecia da averiguação por parte do Tribunal a quo dos motivos e circunstâncias daquele eventual incumprimento.

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15. De forma a apurar a existência de incumprimento culposo e grosseiro por parte dos Recorrentes.

16. Grau de culpa que era fundamental para que se decidisse pela revogação da suspensão provisória do processo, tal qual se encontra previsto para a revogação da suspensão da execução da pena.

17. Pelo que se conclui que tribunal a quo devia ter averiguado de motu proprio a existência de cumprimento/incumprimento das injunções impostas aos Recorrentes, convidando-os a exercer o contraditório, querendo, a fim de apurar, em caso de incumprimento, as razões que o motivaram e o grau de culpa.

18. Contraditório que sempre se impunha em respeito do preceituado na alínea b) do artigo 61.º do Código de Processo Penal e n.º 5 do artigo 32.º da CRP.

19. Desta forma garantindo ao arguido a oportunidade de se pronunciar quanto ao alegado incumprimento e de tomar conhecimento da intenção da Meritíssima Juiz de Instrução de revogar a suspensão provisória do processo e de proferir despacho de pronúncia.

20. Impedindo a existência de decisão surpresa e permitindo aos Recorrentes exercerem o seu direito de defesa constitucionalmente previsto no n.º 1 e 5 do artigo 32.º da CRP.

21.Donde se impunha concluir verificada a invocada nulidade da decisão de levantamento automático da suspensão provisória do processo e subsequente pronúncia dos Recorrentes, sem que antes se tenha promovido a sua notificação para se pronunciarem, querendo, quanto ao eventual incumprimento.

22. Tudo assim por violação do disposto na alínea d) do n.º 2 do artigo 120.º do Código de Processo Penal, bem como do direito de defesa e do princípio do contraditório constitucionalmente garantidos no n.º 1 e 5 do artigo 32.º da CRP.

23. Entendem ainda os Recorrentes que n.º 4 do artigo 281.º do CPP, conjugado com a alínea b) do n.º 1 do artigo 61.º do CPP, quando interpretados no sentido que é de revogar a suspensão provisória do processo e/ou de proferir despacho de pronúncia em face da verificação pura e simples do incumprimento de uma qualquer injunção naquele âmbito imposta, sem prévia audição do arguido e sem lhe conceder oportunidade de demonstrar que tal incumprimento não é culposo, é inconstitucional por violadora do direito de defesa do arguido e do princípio do contraditório, ambos previstos no n.º 1 e 5 do artigo 32.º da CRP.

24. Ao decidir como decidiu, salvo o devido respeito, violou o Meritíssimo Tribunal a quo as normas dos artigos 61.º/1-b), 120.º/2-d) e 282/4-a), todos do CPP, artigos 55.º e 56.º do CP e artigo 32.º/1 e 5 da CRP.

(8)

Termos em que, nos mais de Direito e com o mui douto suprimento de Vossas Excelências,

deve dar-se provimento ao presente recurso e, em consequência, revogar-se a douta decisão recorrida, substituindo-se a mesma por nova douta decisão que declare verificada a nulidade arguida e anule a decisão proferida pelo Tribunal a quo, que determinou o prosseguimento do processo por não terem sido cumpridas as injunções fixadas e pronunciou os arguidos, em face disso, ordene a notificação dos Recorrentes para se pronunciarem quanto ao eventual incumprimento da injunção.

O recurso foi admitido.

O Ministério Público apresentou resposta, concluindo: 1.ª

Tendo em conta que no douto despacho de decisão instrutória a fls. 431 a 437, a 20/4/2016, resulta de fls. 436 que a Exm.ª Senhora Juíza declarou suficientemente indiciados os factos integradores do crime imputado aos arguidos na Acusação Pública, de abuso de confiança contra a Segurança Social e que tal despacho transitou em julgado,

2.ª

Jamais alguém poderá invocar que o não menos douto despacho de fls. 472 a 477 constitui decisão surpresa.

3.ª

Por outro lado, os arguidos foram notificados, nesse acto, não só da suficiência dos indícios plasmados na Acusação Pública, como também do teor da SPP, do respectivo prazo e dos encargos a suportar, tanto mais que prescindiram da prova a produzir e das conclusões de debate, como se retira de fls. 430 “in fine” e 431, primeiro e segundo parágrafos.

4.ª

Passou a ser, neste contexto, de todo o interesse dos arguidos, caso pretendessem evitar ser julgados por aqueles factos, ou cumprir as injunções anteriormente fixadas ou, se por qualquer razão vislumbrassem dificuldades quanto ao cumprimento, informarem atempadamente o processo no sentido de ser tentada outra solução, eventualmente ainda em sede de SPP.

5.ª

Como qualquer arguido que se preocupasse com tal cumprimento de forma séria, como ocorreu em tantos processos que existem no arquivo deste Tribunal.

6.ª

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cumprir as injunções fixadas, informam atempadamente o Tribunal e, frequentemente, a solução é encontrada ainda no âmbito da SPP, ou por prolongamento de prazo ou por modificação das injunções.

7.ª

Porém, sabendo de tudo isto, porque são imputáveis, os ora recorrentes estiveram desde 20/4/2016 até 12/6/2018 sem nada trazerem ao processo em termos de informação, requerimento, o que fosse.

8.ª

Embora tendo mais que tempo suficiente dentro do prazo que lhes foi fixado, para dar conhecimento ao processo das suas dificuldades.

9.ª

É, pois, lícito afirmar que os arguidos vêm contra “factum proprium” quando pretendem imputar ao Tribunal inércia na marcha do processo por nulidade de pronúncia.

10.ª

Tanto mais que também é de realçar que, nem nas conclusões de recurso os arguidos desvendam quais as (…) “fortes dificuldades e restrições sentidas no decorrer daquele período.”, como se retira da conclusão 10., bem como da 11., as quais poderiam ter plasmado ali, bem como no requerimento correspondente a fls. 486 a 487 verso dos autos.

11.ª

É tanto mais surpreendente que não o tenham feito que tal ausência de factos, mesmo em sede de recurso, retira a este toda e qualquer possibilidade de êxito.

12.ª

Quanto mais não fosse, em nome do princípio da economia processual.

13.ª

Mas, ainda assim, nada de factos que traduzam as dificuldades e restrições invocadas, permanecendo, tais factos, um mistério, se é que existem ou existiram.

14.ª

Regista-se, pois, para além da errada fundamentação de direito, a inexistência qualquer fundamentação de facto por parte dos recorrentes, em todo o seu recurso, para que, mesmo as razões de direito aduzidas, pudessem produzir qualquer efeito.

15.ª

(10)

teriam consistido em interrogatórios de arguidos que nunca especificaram factualmente as razões da sua quase total revelia, no âmbito do processo.

16.ª

Vêm, pois, uma vez mais, contra facto próprio; “sibi imputat”.

17.ª

Finalmente, conclui-se que o despacho recorrido, caso fosse revogado, sendo a continuação lógica, o corolário do despacho de fls. 431 a 437 dos autos, em termos de marcha de processo e a ele agregado sinalagmaticamente, evidenciaria a enorme possibilidade de violação de caso julgado.

18.ª

Por todas estas razões, deverá ser mantido, nos seus precisos termos o despacho impugnado, uma vez que o mesmo fez correcta aplicação da Lei e do Direito.

Neste Tribunal da Relação, o Digno Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer, concordando com o entendimento geral constante da referida resposta e, ainda, suscitando que, decorrido o prazo máximo autorizado para a suspensão do processo, as questões do recurso deixaram de ter finalidade processualmente útil, no sentido que o despacho recorrido deve ser mantido.

Observado o disposto no n.º 2 do art. 417.º do Código de Processo Penal (CPP), os arguidos nada vieram acrescentar.

Colhidos os vistos legais e tendo os autos ido à conferência, cumpre apreciar e decidir.

2. FUNDAMENTAÇÃO

O objecto do recurso define-se pelas conclusões que os recorrentes extraíram da motivação, como decorre do art. 412.º, n.º 1, do CPP (Simas Santos/Leal Henriques, in “Recursos em Processo Penal”, Rei dos Livros, pág. 48, e Germano Marques da Silva, in “Curso de Processo Penal”, Editorial Verbo, 1994, vol. III, págs. 320 e seg.).

Assim, reside em analisar se se verifica nulidade, decorrente de alegada omissão de diligência e que inquine o prosseguimento do processo e a pronúncia dos arguidos.

Apreciando:

A motivação do recurso e a resposta ao mesmo reflectem o que está em causa, dispensando, aqui, se proceda a acrescida explicitação do processado.

(11)

Cinge-se à discordância dos recorrentes, fundamento para o seu recurso, quanto à improcedência da nulidade que arguiram, por ausência da sua notificação prévia à revogação da suspensão provisória do processo, que culminou na prolação da decisão que acabou por os pronunciar, com o invocado sentido de que, como referem, concluindo verificado o incumprimento da injunção imposta aos Recorrentes, a Meritíssima Juiz de Instrução automática e mecanicamente revogou a suspensão provisória do processo e proferiu douto despacho de pronúncia, Sem que para tanto tenha diligenciado por qualquer forma pelo apuramento da existência de culpa dos arguidos nesse incumprimento, respectivo grau e/ou verificado a existência de circunstâncias que objectivamente os tenham impedido de cumprir e também sem que os Recorrentes tenham sido notificados para exercerem previamente o contraditório, Omitindo-se assim qualquer ponderação ou juízo de culpa dos arguidos no incumprimento daquela injunção, bem como a omissão aos mesmos de qualquer oportunidade de o justificar.

Mais acrescentam que nunca nada disseram porque sempre confiaram poder cumprir a injunção que lhes havia sido imposta, não o conseguiram em face das fortes dificuldades e restrições que sentiram no decorrer daquele período de tempo, Circunstâncias que teriam dado a conhecer aos autos se para tanto tivessem sido notificados para se pronunciarem quanto ao seu eventual incumprimento, antes de operada a revogação da suspensão provisória do processo.

Concluem, pois, que Independentemente da alegada passividade dos Recorrentes que vem referida no douto despacho recorrido, e conforme vem sendo maioritariamente defendido pela doutrina e jurisprudência, sempre se impunha ao Meritíssimo Tribunal a quo a notificação dos arguidos para se pronunciarem, querendo, quanto ao eventual incumprimento e para que se pudesse ponderar ou ajuizar a eventual existência de culpa nesse incumprimento, entendendo que foram violados os artigos 61.º/1-b), 120.º/2-d) e 282/4-a), todos do CPP, artigo 55.º e 56.º do CP e artigo 32.º/1 e 5 da CRP.

A decisão recorrida, apreciando essa nulidade, enveredou pela improcedência, com fundamento em que, não assistindo razão na alegação de que o princípio do contraditório havia sido comprometido:

- Durante o período de suspensão provisória do processo, os arguidos nunca nada disseram, não obstante tenham estado presentes no debate instrutório realizado no dia 20.04.2016, na qual ficaram cientes que o período de suspensão provisória do processo era o de 24 meses, o qual se encontrava largamente ultrapassado aquando da dedução de despacho de pronúncia;

- encontravam-se regularmente representados por advogado e conheciam as consequências do incumprimento da injunção impostas

- O princípio do contraditório, no âmbito do processo penal não poderá assumir uma vertente “paternalista” do arguido, quando este estava ciente de que decorreu o período de suspensão provisória do processo e, não só não cumpriu aquilo a que se obrigou, por sua própria iniciativa, perante um Tribunal, como em

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nenhum momento se dirigiu perante o Tribunal revogando a sua concordância quanto à injunção imposta.

De notar, ainda, que, tendo-se iniciado o período da suspensão provisória do processo (24 meses) em 20.04.2016, com a respectiva notificação do então decidido (fls. 430), se solicitou, em 24.04.2018, por determinação do Tribunal, a informação à Segurança Social acerca do cumprimento da injunção (fls. 462) com resposta em 11.05.2018 (fls. 468).

Na sequência, o Ministério Público, com vista no processo, promoveu o prosseguimento dos autos nos termos do disposto no art. 282.º, n.º 4, alínea a), do CPP.

De seguida, proferiu-se a decisão que veio a pronunciar os recorrentes, sem que, dos autos, resulte que, previamente, tivessem sido, os mesmos, notificados para o que entendessem dizer acerca do incumprimento, incluindo quanto à aludida posição do Ministério Público.

E se assim foi, o que não se discute, o Tribunal omitiu diligência relevante e, por isso, aos recorrentes assiste razão.

Na verdade, apesar de que, nos termos do art. 282.º, n.º 4, alínea a), do CPP, “O processo prossegue e as prestações feitas não podem ser repetidas: Se o arguido não cumprir as injunções e regras de conduta”, esse incumprimento haverá de ser avaliado, em moldes idênticos ao que sucede com a falta de cumprimento das condições/a revogação da suspensão da execução da prisão prevista nos arts. 55.º e 56.º do Código Penal e, ainda, tendo em conta o art. 495, n.º 2, do CPP, não se bastando com mera verificação que não redunde como consequência de culpa ou negligência grosseira.

Traduz entendimento que a doutrina e a jurisprudência vêm sufragando, como se constata, mormente, pelo abonado ao recurso.

Assim, deste decorre:

«É este o sentido acolhido por Maia Costa na anotação que faz ao artigo 282.º do Código de Processo Penal:

O incumprimento deverá ser culposo, ou repetido, em termos idênticos aos que o Código Penal prevê para a revogação da suspensão da pena, n art. 56.º, n.º 1, a). Ou seja, o incumprimento não terá que ser doloso, mas deverá ser imputável pelo menos a título de negligência grosseira ao arguido; ou então repetidamente assumido (…) Assim, a constatação do incumprimento não pode conduzir automaticamente à “revogação” da suspensão, devendo o Ministério Público (ou o juiz de instrução, se a suspensão tiver sido decretada nessa fase) indagar das razões do incumprimento, em ordem a decidir-se pelo prosseguimento do processo para julgamento ou pelo decurso do prazo da suspensão, consoante apure haver, ou não, comportamento

(13)

culposo, ou repetido, por parte do arguido António Henriques Gaspar e outros, Código de Processo Penal -Comentado, p. 989, Almedina, 2014».

«Também perfilhado por Paulo Pinto de Albuquerque que entende que:

O incumprimento das condições da suspensão pode ocorrer infringindo o arguido grosseira ou repetidamente as injunções e regras de conduta (…). Não há revogação automática da suspensão provisória do processo, pois ela depende de uma valoração da culpa do arguido no incumprimento. O critério estabelecido é o do incumprimento das injunções e regras de conduta com culpa grosseira ou reiterada do arguido, tal como prevê o artigo 56.º do CP - Comentário do Código de Processo Penal à luz da Constituição da República e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, 4.ª Edição actualizada, p. 768, Universidade Católica Editora, 2011».

Em idêntico sentido, podem citar-se, como resulta igualmente do recurso, os acórdãos do Tribunal da Relação do Porto de 09.12.2015, no proc. n.º 280/12.9TAVNG-A.P1, e do Tribunal da Relação de Coimbra de 18.10.2017, no proc. n.º 10/16.6GBGRD.C1, ambos in www.dgsi.pt.

Ou seja, sempre haverá de aquilatar, quanto possível, as causas do incumprimento, para aferir se devem ser entendidas como reveladoras de falha do arguido que se funde em comportamento culposo, que torne insubsistentes as finalidades que presidiram à suspensão provisória do processo.

Tanto mais que se estará perante a eventualidade do prosseguimento do processo e, designadamente, para julgamento, com a importância que isso inevitavelmente tem na situação do arguido, como decisão que pessoalmente o afecta e relativamente à qual, desde que se mostre viável, deve ser previamente ouvido (art. 61.º, n.º 1, alínea b), do CPP).

O princípio do contraditório, constitucionalmente assegurado pelo art. 32.º, n.º 5, da Constituição da República Portuguesa, abrange, na sua extensão processual, conforme Gomes Canotilho/Vital Moreira, in “Constituição da República Portuguesa Anotada”, Coimbra Editora, 2007, volume I, pág. 523, todos os actos susceptíveis de afectar a sua posição (...), devendo estes ser selecionados sobretudo de acordo com o princípio da máxima garantia de defesa do arguido.

Traduz-se, pois, no dever de o juiz ouvir as razões do arguido em relação a assuntos sobre os quais tenha de proferir uma decisão.

E revertendo ao concreto, embora os aqui recorrentes, durante o período da suspensão provisória do processo, “nunca nada disseram”, o que se pode associar a desinteresse, não consentia que o Tribunal não tivesse assumido o impulso de os notificar para se pronunciarem acerca dos motivos do objectivo incumprimento, para, assim, permitir que viessem exercer a sua defesa.

(14)

Não obstante, é certo, não se tolerasse que desconhecessem aquilo a que estavam obrigados e as consequências do incumprimento, afigura-se que essa diligência era, de todo o modo, necessária para avaliar a sua medida de responsabilidade por essa falta.

De forma diversa, como se procedeu, extraiu-se ilação que, correcta interpretação daquele art. 282.º, n.º 4, alínea b), não teria consentido.

Acresce que a concessão da possibilidade de os recorrentes se terem pronunciado no âmbito em causa não assume, contrariamente ao fundamentado no despacho recorrido, vertente paternalista do contraditório, mas, sim, e unicamente, expressão do dever de que, apesar da inércia daqueles, o Tribunal viesse a tomar a solução mais justa, para o que, pelo menos, tentaria salvaguardar que conhecesse, na plenitude, as circunstâncias subjacentes ao incumprimento.

Se essas circunstâncias não relevassem para justificar o incumprimento, então redundaria no prosseguimento dos autos, mas não, como o Ministério Público vem defender na sua resposta ao recurso, de que aos recorrentes se impunha que, antes e agora, as reportassem, quando, como sucedeu, não se lhes deu a aludida oportunidade prévia.

Finalmente, não é a circunstância de o período da suspensão provisória do processo se ter mostrado decorrido à data da prolação da decisão revogatória que invalida que essa oportunidade devesse ter sido efectivamente concedida.

Como se consignou naquele acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 09.12.2015, se esse prazo em causa tiver sido preenchido na sua totalidade, como é a presente situação, não haverá possibilidade de determinar a prorrogação do prazo em face de uma situação considerada justificante do incumprimento das medidas. Mas isso não implica que não se proceda a essa averiguação das condições do incumprimento e da imputação culposa deste último aos arguidos. Sem que para isso o decurso do prazo -que também terá sempre de ser gerido pelo próprio tribunal face à averiguação da situação de incumprimento que se lhe exige – possa funcionar numa verdadeira preclusão do exercício de garantias processuais que devem ser efectivas e que não dependem (por mera ficção ou presunção) do mero decurso da passagem do tempo.

Crê-se, pois, que o Tribunal, ao não ter determinado, pelo menos, a notificação dos aqui recorrentes, para o efeito de se pronunciarem quanto ao incumprimento que se deparava, incorreu em omissão de acto essencial para a descoberta da verdade, conducente a nulidade nos termos do alegado art. 120.º, n.º 3, alínea d), do CPP.

Verificada tal nulidade, fica afectada a validade da decisão subsequente que, prosseguindo o processo, pronunciou os recorrentes (art. 122.º, n.ºs 1 e 2, do CPP).

(15)

3. DECISÃO

Em face do exposto, decide-se:

- conceder provimento ao recurso interposto pelos arguidos e, em consequência,

- revogar o despacho recorrido e determinar que seja substituído por outro que julgue procedente a nulidade suscitada e ordene a notificação dos arguidos para, em dez dias, esclarecerem o que tiverem por conveniente relativamente à falta de cumprimento da injunção imposta, declarando-se como inválida a subsequente decisão que, acolhendo o prosseguimento do processo, os pronunciou.

Sem custas (art. 513.º, n.º 1, do CPP, a contrario sensu).

Processado e revisto pelo relator.

04.Fevereiro.2020

_______________________ (Carlos Jorge Berguete)

_______________________ (João Gomes de Sousa)

Referências

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