FERRAMENTAS DE AVALIAÇÃO ERGONÔMICA EM ATIVIDADES AGRÍCOLAS: CONTRIBUIÇÃO NA QUALIDADE DE VIDA NO TRABALHO
Maria de Lourdes Santiago Luz
Universidade Estadual de Maringá mlsluz@uem.br
Syntia Lemos Cotrim
Universidade Estadual de Maringá syntialceng@gmail.com
João Alberto Camarotto
Universidade Federal de São Carlos camarotto@dep.ufscar.br
Resumo
A ergonomia no contexto do trabalho agrícola tem como objetivo buscar melhoria das condições de trabalho, auxiliar a compreender técnicas de produção para a organização do trabalho bem como conceber sua organização futura . Este trabalho apresenta o estudo realizado na Fazenda Experimental de Iguatemi, onde surgiu a necessidade de se avaliar a carga de trabalho e os constrangimentos ergonômicos a que são expostos os agentes universitários, com a função de auxiliar operacional agropecuário. O trabalho teve como base a metodologia de intervenção Análise Ergonômica do Trabalho (AET), utilizando múltiplas fontes de evidências retratadas por meio das ferramentas de avaliação ergonômica, que transparece a ação do trabalhador imerso em um contexto real.
Palavras-Chave: Análise Ergonômica do Trabalho, Ferramentas de avaliação,
Agricultura, Esforços biomecânicos.
1. Introdução
As demandas direcionadas aos ergonomistas, referente ao trabalho agrícola, podem ser organizadas em torno de três grandes objetivos: buscar melhoria das condições de trabalho (segurança ou carga de trabalho, organização de trabalho); auxiliar a compreender a introdução de novas técnicas de produção para a organização do trabalho e conceber a organização futura do trabalho ou concepção de novas edificações (CERF;SAGORY, 2007).
Este trabalho apresenta o estudo, parte de um projeto de pesquisa (LUZ et al, 2010), que adveio de uma demanda do Centro de Ciências Agrárias e Diretoria de
Assuntos Comunitários da Universidade Estadual de Maringá, preocupados com a sustentabilidade da Fazenda Experimental de Iguatemi. Após contatos iniciais, primeiras visitas para apresentação e reconhecimento do ambiente de trabalho, emergiu a necessidade de se avaliar a carga de trabalho e os constrangimentos ergonômicos a que são expostos os agentes universitários, com a função de auxiliar operacional agropecuário.
2. Materiais e Métodos
Para estudos sobre o trabalho e o contexto no qual está inserido, a ergonomia utiliza a metodologia própria de intervenção que é a Análise Ergonômica do Trabalho (AET) (GUÉRIN et al, 2008), sendo o fio condutor a atividade, que transparece a ação do trabalhador imerso em um contexto real.
Assinala-se que é raro que uma só técnica permita produzir informação adequada e, com frequência, é útil combinar várias delas para melhor apreender as maneiras segundo as quais a atividade se organiza no tempo e no espaço (CERF;SAGORY, 2007). Desta forma, a observação sistemática e a aplicação do questionário de percepção adaptado de ERGOAÇÂO (2003), confrontados com o método OWAS (Ovako Working Posture Analysing System) foram as técnicas de coleta de dados que propiciaram informações elucidativas e complementares sobre os esforços biomecânicos afeto ao auxiliar operacional. Por meio do questionário obteve-se informações sobre o perfil profissiográfico do auxiliar operacional, as atividades na jornada de trabalho, os esforços biomecânicos conjuntamente com a aplicação do Diagrama das Áreas Dolorosas de Corlett e Manenica. O Sistema OWAS trata de um sistema prático de registro desenvolvido para superar as dificuldades em analisar e corrigir más posturas que são categorizadas em: classe 1 – postura normal, que dispensa cuidados, a não ser em casos excepcionais; classe 2 – postura que deve ser verificada durante a próxima revisão rotineira dos métodos de trabalho; classe 3 – postura que deve merecer atenção em curto prazo e classe 4 – postura que deve merecer atenção imediata (IIDA, 2005). A Figura 1 ilustra a codificação proposta pelo método, o qual permite evidenciar 252 tipos de posturas de trabalho, combinando os segmentos das costas, braços, pernas e peso.
Figura 1: Codificação e classificação das posturas pela combinação de variáveis conforme o Sistema OWAS
Fonte: Iida, 2005
De acordo com as informações colhidas por meio do questionário de percepção (10 respondentes de setores diferentes) designou-se o setor da avicultura para iniciar a coleta de dados e observações mais aprofundadas. Foi realizado um acompanhamento do setor de criação de frangos para abate e galinhas de postura, onde foram analisadas as tarefas dos funcionários, a maneira como estas são realizadas, as consequências do trabalho e as condições proporcionadas aos trabalhadores.
Durante a realização das observações sistemáticas e verbalizações concomitantes dos auxiliares operacionais, obteve-se a descrição das tarefas, sendo acompanhado e cronometrado os tempos de execução das operações e como estas eram executadas, assim como, foram utilizados os registros fotográficos e filmagem para se analisarem as posturas e caracterizar o ambiente de trabalho do funcionário.
3. Resultados e Discussões
Por meio do questionário de percepção constatou-se que 90% dos funcionários entrevistados sentem algum tipo de desconforto. Para discussão neste artigo, destacou-se a análise da atividade no tratamento de frangos de corte e galinhas de postura. Para os auxiliares operacionais, as tarefas de limpeza de galpão e transporte de ração são consideradas as mais pesadas e que geram maior constrangimento físico. Constata-se que estes constrangimentos ocorrem devido a forma como se executam essas atividades, os auxiliares realizam as operações de carga e descarga das sacas de ração manualmente e nestas condições não se
atentam aos cuidados com a postura adequada. Por meio do Diagrama de Áreas Dolorosas, a principal área de desconforto destacada pela pesquisa foi a coluna baixa. As observações sistemáticas contribuíram com o registro e a compreensão de como o auxiliar para dar conta de efetuar a tarefa, executa a atividade. A Tabela 1 ilustra, como exemplo, algumas sequências operacionais e o resultado da classificação das posturas.
Tabela 1: Tratamento de frangos e galinhas de postura
Sequência Operações Postura
OWAS
Tempo de execução (min.)** 1 Mexer comedouros com a mão (6 vezes por dia). 2-1-4-1 Tmo= 10' 2 Carregar trator ou carroça 4-1-3-3 Tmo= 11' 3
Descarregar as sacas de ração no barracão dos frangos e no barracão das galinhas Colocar sacas empilhadas em cima dos paletes no galpão.
4-1-3-3 Tmo= 14' 4 Distribuir ração nos comedouros/ box das galinhas
poedeiras, arrastando o balde de ração (35kg). 4-1-4-1 Tmo= 53'
** Tmo = Tempo médio da operação - refere-se ao tempo médio de execução da operação
As operações 2 e 3 (carga e descarga de ração), por meio da combinação das variáveis, cuja postura corporal apresenta-se com a coluna inclinada e torcida em conjunto com as pernas flexionadas, manuseando carga de 50 kg, classifica-se como classe 4 em desconforto, necessitando de intervenção imediata. A operação de distribuição de ração aos comedouros, também, evidenciaram a postura laboral como inadequada e necessita de mudanças imediatas. Para as operações de mexer comedouros e encher baldes de ração apresentaram uma classificação na categoria 3, o que significa que a curto prazo também são prejudiciais. A Figura 2 ilustra o manuseio da ração nos comedouros e com a movimentação de carga das sacas com ração.
A análise pelo OWAS foi condizente com as informações coletadas pelo questionário de percepção, uma vez que a principal queixa do auxiliar do setor de avicultura em relação às tarefas que lhe causavam maior cansaço físico eram as operações de carregar e descarregar as sacas de ração. A operação de encher os comedouros no galpão das galinhas de postura compreende, também, o arraste do balde de ração (30kg/40kg) pelo corredor do galpão, acompanhando o enchimento por box, além de ser altamente repetitiva, obriga o funcionário a entrar de box em box e realizar a ação com a postura curvada. O diagnóstico obtido, por meio da confrontação de diferentes ferramentas, para a análise do trabalho do auxiliar operacional contribuem para uma validação das informações e demandas referente às tarefas. O questionário é válido, sobretudo, quando se necessita obter um levantamento de informações abrangentes, rápido e de menor custo, sendo utilizado para se fazer um levantamento inicial das situações que requerem as análises mais profundas e medidas corretivas. A combinação do sistema OWAS e o Diagrama de Áreas Dolorosas possuem a vantagem da simplicidade e fácil entendimento, servindo para mapear os locais de trabalho e equipamentos, as tarefas que apresentam maior gravidade (acima da classe 3). Desta forma, o esforço do analista pode ser direcionado para os fatores prioritários, na busca de contribuir com melhorias para qualidade de vida no trabalho.
Referências
CERF, M.;SAGORY,P. Agricultura e desenvolvimento agrícola. In: Ergonomia. FALZON, Pierre (Editor). São Paulo: Edgard Blucher, 2007.
ERGO&AÇÃO. Fundamentos de ergonomia. 2003. Disponível em: <http://www.si mucad.dep.ufscar.br/dn_fundamentos.pdf>. Acesso em: 21 mai. 2010
GUÉRIN, F. et al. Compreender o trabalho para transformá-lo. 4ª reimpressão. São Paulo: Ed. Edgar Blücher, 2008.
IIDA, I. Ergonomia: Projeto e Produção. 9ª reimpressão São Paulo: Ed. Edgar Blücher, 2003.
LUZ, M. L. S. et al. Qualidade de Vida no Trabalho sob a abordagem de estudos ergonômicos: projeto piloto na Fazenda Experimental de Iguatemi. (2010) Disponível em: www.sgp.uem.br: 8080/sgp/índex.html. Acesso em: 20 mar. 2011.