Editorial
A Cadernos de Educação, mantendo sua política editorial de variar seus números entre publicações temáticas e publicações que reúnem diversos temas e diferentes abordagens metodológicas, apresenta, como segundo número deste ano, um conjunto de artigos que representam a multiplicidade de abordagens teórico-metodológicas da área da educação e das áreas afins. Esta publicação reúne desde entrevista, artigos de autores estrangeiros, artigos de autores brasileiros e, ainda, uma resenha.A revista começa com uma entrevista com Bernard Charlot, intitulada Professores, alunos, escola, saber – relações atravessadas pela contradição. A entrevista foi feita por Helena Beatriz Mascarenhas de Souza. Na entrevista, Charlot, reconhecido internacionalmente pelo seu estudo das relações com o saber, principalmente a relação dos alunos de classes populares com o saber escolar, aborda diversos aspectos de suas reflexões teórico-metodológicas, desde o fracasso escolar das crianças oriundas das classes populares, a contradição enquanto método, o papel da formação na produção da identidade profissional dos professores, até sua referência em Michel de Certeau.
O artigo seguinte é de um professor da África do Sul radicado nos Estados Unidos da América da Norte. Bekisizwe S. Ndimande, no texto Lutas Docentes nas Escolas Públicas para negros na África do Sul apartheid, apresenta as reformas curriculares na África do Sul pós-apartheid. Caracteriza essas reformas como práticas e políticas conservadoras que apresentam efeitos maléficos para a educação democrática. Descreve um panorama político e histórico da formação de professores na África do Sul, discute os desafios importantes da educação
baseada em resultados pós-apartheid e sugere como se pode melhorar o trabalho docente nesses tempos de reformas neoliberais. Completando os artigos de autores estrangeiros, a espanhola Begoña García Pastor, em seu artigo ¿Qué entienden las y los gitanos por educación?, faz uma reflexão crítica sobre cultura e educação, mostrando a impossibilidade de construir sociedades verdadeiramente democráticas sem promover a participação de toda a cidadania. Trata-se de um estudo etnográfico desenvolvido em uma comunidade cigana.
Dando início aos artigos de autores nacionais, Adriéle Cristina de Souza, Cristiane Aparecida Ribeiro Bueno e Ireni Marilene Zago Figueiredo apresentam o artigo Os programas de promoção automática e de correção da defasagem idade-série como alternativas para melhorar o fluxo escolar no ensino fundamental. Neste texto as autoras analisam os programas que procuraram enfrentar as altas taxas de evasão e de repetência nas primeiras séries do ensino fundamental. Mostram as diferenças presentes nas políticas dos anos 80 e dos anos 90 do século XX e as similaridades no sentido da busca de critérios de produtividade e de racionalidade econômica. O artigo seguinte é de Elton Luiz Nardi e se intitula Descentralização na gestão de políticas municipais de educação: democratização e afirmação de projetos locais. Nele o autor analisa o recurso político da descentralização na gestão de políticas municipais de educação e sua adoção por governos comprometidos com projetos locais orientados para uma gestão democrática. Com base em pesquisa de uma gestão municipal, conclui que a descentralização, em contraponto com a municipalização, se processa na medida em que os sujeitos locais aprimoram sua percepção acerca dos modelos de descentralização.
O próximo artigo, Proposta de filosofia para o Estado de São Paulo: a autonomia do educador problematizada a partir de Was ist Aufklärung, de Kant, de Samuel Mendonça, analisa a proposta curricular do estado de São Paulo para a disciplina de Filosofia. Tendo esta disciplina, no ensino médio desse estado, a cultura como vetor, o autor problematiza a autonomia enquanto possibilidade do distanciamento da preguiça e da
covardia, elementos que deixam o homem no estado de menoridade, segundo Kant, referencial teórico adotado no artigo.
Em seguida apresentamos artigo de Maria Auxiliadora N. de Figueiredo Nery, intitulado
Cursos de pedagogia: novas demandas na economia baseada em conhecimento. Com base nas transformações capitalistas ocorridas no final do século XX e início do século XXI, as autoras desenvolvem uma reflexão sobre as novas demandas geradas aos cursos de Pedagogia. Concluem que é importante preparar o pedagogo para uma atuação que transponha as fronteiras das escolas e alcance outros tipos de organização tanto empresariais como governamentais e não-governamentais. O artigo seguinte é de Lígia Cardoso Carlos e Maria de Fátima C. R. Pereira, A escrita como dispositivo de formação em educação. O texto focaliza a escrita como dispositivo de formação de professores em educação, tomando por base dois estudos realizados com docentes dos anos iniciais da escolarização básica, um em Portugal e outro no Brasil. Em ambos constataram o potencial formativo da escrita, bem como a definição de novas formas de organização e encaminhamento das práticas educativas.
Em seguida apresentamos o artigo (Im)possibilidades de uma cultura para além da representação, de Franciane Canêz Cardoso e Róger Albernaz Araújo. Nele as autoras abordam uma estética cultural resultante das relações estabelecidas no contexto urbano. Os conceitos de aparelho de estado e máquina de guerra, cunhados por Deleuze e Guattari, são movimentados na busca de uma percepção da cadência cultural na cidade de Pelotas. Refletem sobre uma tendência de conservação das velhas rotinas que perpetuam uma estética cultural histórica.
O próximo artigo, de Sônia Teresinha De Negri, Maurem Ramos e Martine Elisabeth Kienzle Hagen, intitulado Influências na escolha por curso de nutrição em calouros de Porto Alegre (RS), identificam em calouros as influências na escolha pelo curso de Nutrição e suas expectativas através de estudo exploratório. A partir de uma análise
estatística com entrevistas com 135 calouros, concluem ser importante mostrar aos calouros de nutrição as possibilidades de atuação profissional, seu papel na promoção da saúde e as diversidades de atuação, na perspectiva de crescimento da sociedade, na realização profissional e pessoal. Em seguida está o artigo de Adriana Duarte Leon, Creche São Francisco de Paula: uma contribuição para a história da infância de Pelotas. O trabalho analisa a referida creche, primeira a funcionar em turno integral em regime de externato no município de Pelotas. Na busca de compreender este espaço dedicado a “crianças pequenas”, conclui que esta creche surge no município de Pelotas como um espaço que, ao mesmo tempo, propaga o catolicismo e atende às demandas do Estado.
Na sequência temos o artigo Escola: vamos praticar jogos ambientais? Buscando uma pedagogia para valorizar a água, para valorizar a vida, de Nelma Baldin, Simony Aline Dalri, Daiane Aparecida Ciotta Desordi e Julia Fernanda Hoffmann. O estudo que originou o texto teve como objetivo analisar a realidade social no Município de Joinville – SC, com vistas à criação e aplicação de jogos ambientais para o desenvolvimento do estimulo à conscientização ambiental e histórico patrimonial. Os jogos foram elaborados com conteúdos atuais e próximos às crianças, que demonstraram sensibilidade e percepção crítica sobre as intervenções humanas no meio ambiente. Em seguida apresentamos o artigo Resgate histórico de um grupo rural de estudos das plantas medicinais: educação em saúde, de Mateus Casanova dos Santos, Caroline Vasconcellos Lopes, Anelise Miritz Borges, Rita Maria Heck e Maria Cecília Lorea Leite. O artigo descreve o resgate histórico de um grupo de estudos de plantas medicinais do interior rural do município de Pelotas- RS, denominado Grupo Espinheira Santa, por meio de metodologia qualitativa e exploratória. O grupo pesquisado foi percebido como um espaço construído socialmente para a perpetuação dos saberes sobre as plantas medicinais, saúde e organização do espaço.
O último artigo deste número é de Márcia Alves da Silva, intitulado Aspectos teórico-metodológicos da pesquisa em educação. Ele realiza uma
reflexão sobre o desenvolvimento de metodologias científicas para a área de educação, priorizando algumas abordagens qualitativas em educação. Estabelece um diálogo entre as vertentes metodológicas advindas da pesquisa participante e da pesquisa-formação. Após este artigo temos a resenha do livro Discutindo relações de gênero na escola; reflexões e propostas para a ação docente, de Adla Betsaida Martins Teixeira e Adilson Dumont, elaborado por Márcia Ondina Vieira Ferreira. A resenha entusiasma à leitura do livro, uma vez que ele sugere propostas de intervenção sobre as dinâmicas de gênero e sexualidades que se produzem e reproduzem dentro das escolas. São nove capítulos dirigidos a problematizar o gênero e as sexualidades não apenas por meio da discussão teórica, mas pela proposição de oficinas a serem desenvolvidas no ambiente escolar.
Esperamos, mais uma vez, que este número da Cadernos de Educação contribua para a divulgação e disseminação da produção acadêmica, cumprindo papel crucial para a vitalidade da atividade científica.
