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Versando Rebeldia. Versando Rebeldia

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Academic year: 2021

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Expediente:

Organização: MST

Revisão: Frente Palavras Rebeldes Capa: Gustavo Garcia Palermo

Fotos: Ladan e Elitiel Guedes (disponibilizadas na internet) Diagramação: Fábio Carvalho

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Que seria das revoluções sem seus hinos? Que seria da luta sem os poetas? Que seria do Movimento Sem Terra sem sua mística, sua poesia cotidiana? Este livro, versos de rebeldia, construído a tantas mãos e poesia em si mesmo, é dedicado àqueles e àquelas que poetizam nossa luta.

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Sumário

Prefácio, por Lirinha ...11

Apresentação, por Frente Palavras Rebeldes ... 13

1. Cirandas de enxadas Poema esdrúxulo (Aldenor da Silva Pimentel ) ... 19

Marcha da insensatez e luta do campo (Antônio Galvão) ... 20

Do que é direito (Chico Nogueira) ... 24

Ao Sinhô Doutor (Daniel Castro) ... 25

Sangue (Luann Ribeiro Santos Silva) ... 26

Semeadura (Vanessa Juliana da Silva) ... 27

O sangue jorra! (Antony Josué Corrêa) ... 28

Intervenção (Filipe Augusto Pinto Maia Peres) ... 31

Transformação (Marilia Carla de Mello Gaia) ... 34

A ti, Burguês (Natalia Siufi) ... 36

Quando abril chegar (André Carlos de Oliveira Rocha) ... 38

Tekoha (Eliel Freitas JR) ... 39

À esquerda (José Jusceli dos Santos) ... 40

Oração à Terra Santa (Gustavo Garcia Palermo) ... 42

Aos que permitem a injustiça (Gustavo Garcia Palermo) ... 43

Uma bandeira vermelha cravada no latifúndio (Jane Andréia Cabral e Silva) ... 45

Vida Sem Terra (Lorena Aparecida dos Santos) ... 46

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Se um dia as mulheres enfurecessem (Adriana Novais) ... 55

“Catarina da Mina” (Beatriz Maria de Figueiredo Ribeiro) ... 56

Nenhuma mulher mais ficará calada (Nívea Sabino) ... 57

Marcada pra viver (Rodrigo Moschkovich Athayde) ... 60

Me sufoca (Vitoria Maria Beserra Demarchi) ... 61

Sobreviva (Gustavo Garcia Palermo) ... 63

Para elas (Natália Siufi) ... 64

3. “Se não nos deixam sonhar, não os deixaremos dormir” Vidas Bordadas (Beatriz Maria de Figueiredo Ribeiro)... 69

É sempre tempo de amor (Bruna Matos de Carvalho)... 71

Verdura (Diego Ruas Silva) ... 73

Sonhos e Paixões (Messias Vítor de Oliveira) ... 74

Descansa, é tempo de jogar xadrez-poema hip-hop (Natalia Siufi) ... 76

Queloide (Tatiana Nascimento) ... 78

Sonho Eterno (Maria Elizabete Pereira Guedes) ... 80

Da noite ao dia (André Carlos de Oliveira Rocha) ... 82

Nós (André Carlos de Oliveira Rocha) ... 83

Arte maior (Maria Divina Lopes) ... 84

De/composição (Maria Divina Lopes) ... 85

Placidez (Maria Divina Lopes) ... 86

Chão Nosso (Gustavo Garcia Palermo) ... 88

“Mítico” (Joatan Oliveira Xavier) ... 89

Sei quem sou (Ricardo Jose Caxias Luz) ... 91

Oitava Arte (Afonso Guerreiro e Tereza Maestra) ... 92

4. Nosso pé de poesia Veneno e contra-veneno (Severiano Hermes Telles) ... 97

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Movimento Sem Terra (André Carlos de Oliveira Rocha)... 102

Apocalipse Ambiental (Araci Maria dos Santos)... 103

La VIA (Araci Maria dos Santos) ... 104

Sonho de justiça (Edivaldo Souza Prates) ... 105

Cultura (Fernando Miguel) ... 107

Rasgando o papel (Fernando Miguel) ... 109

Cultura violada (José Jusceli dos Santos) ... 110

Luta de classes (José Jusceli dos Santos) ... 113

Formação do Brasil (Hildebrando Silva de Andrade) ... 115

Amigo comunista (Janderson Silva Santos) ... 117

Massacres: Carajás e Felisburgo (José Lindomar da Silva) ... 119

Desabafo (Maria Emilia de Souza) ... 122

Nosso sorriso (Vanessa Dias Diniz) ... 124

Poema sobre o fragmento de uma tese (Wellington Emiliano de Morais) ... 126

Sem Terra aparecendo (Josiavânia de O. Cardoso) ... 128

Sobre os autores ... 131

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Não há vagas

O preço do feijão

não cabe no poema. O preço do arroz

não cabe no poema. Não cabem no poema o gás a luz o telefone a sonegação do leite da carne do açúcar do pão O funcionário público não cabe no poema com seu salário de fome sua vida fechada

em arquivos.

Como não cabem no poema o operário

que esmerila seu dia de aço e carvão

nas oficinas escuras

- porque o poema, senhores está fechado:

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Prefácio

Não há palavra que deixe de ser

A poesia tem o poder de nos atingir como um sonho.

Quando escrevemos, vira luz misteriosa de antigas orações. Quando falamos, torna-se filha do vento. É o lugar onde a voz, ilusão invisível e impalpável, desloca-se, balançando as folhas da árvore do tempo e, se for mais forte, vira até um ser.

A poesia é uma antimercadoria e, por isso, infalível e iluminada. Com a sua presença é possível a transmutação do pessimismo e da solidão, pois sua dor é, também, a dor do mundo.

A poesia nos oferece um coração sem medo e não permite que bebamos a água do esquecimento.

Por isso, lembro-me de Maria Tebana, Chica Barrosa, Naninha dos Brejos, Maria Rochinha, Mocinha da Passira, Maria da So-ledade, Severina Branca, que foram orientadas a cultivar o silên-cio, mas viveram poetas.

Lembro, também, das incríveis histórias do poeta Fabião das Queimadas, que nasceu no século XIX, sob a lei do ventre livre. E comprou a alforria da mãe com o pagamento das suas

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canto-E como esquecer de Lula Calixto? Que me levou pra conhecer a escola onde dava aula de samba de coco. Fomos bem cedinho, contornando a pedra vermelha, molhando os pés no orvalho da ramagem rasteira. Era um assentamento do MST. Guardo forte lembrança. Preservar a memória é se libertar.

E agora aqui, convidado pela Frente de Palavras Rebeldes, faço uma pequena apresentação do livro que reúne 60 poesias sele-cionadas na Semana de Arte e Cultura da Reforma Agrária, rea-lizada em Belo Horizonte, em julho de 2016. Estive presente nes-se inesquecível festival ou nessa grande festa da colheita, onde música, poesia, teatro, dança, artes visuais e uma feira, com as produções do movimento, deram seu testemunho, depoimento, prazer e denúncia.

Os 60 poemas apresentados na mostra “Versando Rebeldia” ver-sam sobre luta e ternura, falam da roça, da rua, das estradas, dos acampamentos. Mensagens codificadas do recomeço, do desejo, da injustiça, da esperança, da transformação.

Vamos à leitura!

Quando a poesia toma o poder, um novo mundo se faz.

Que esse livro viva, feito o fogo, com sua capacidade de modifi-car as coisas.

José Paes de LIRA Lirinha

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“Sabemos de cor nossas cantigas”, nossas poesias, nossas canções fazem parte da semeadura antiga que herdamos dos povos da terra. Estiveram em longas noites e céus de estrelas. Nos afugen-tam o medo.

Apresentação

Versando Rebeldia

Neste livro, a nossa poesia de es-pantar o medo e atirar pedras con-ta a história de processos de lucon-ta cheios de uma proporcional carga de brutalidade e beleza; de

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violên-como produção de alimentos saudáveis como cultivo intrín-seco de relações hu-manizadoras. A humanidade des-se projeto esteve no colorido da Feira da Reforma Agrária, no

sabor das nossas cozinhas regionais, no calor no peito e lágrimas nos olhos quando cantadas as nossas canções, quando reunidos os nossos poetas e as nossas histórias.

A humanidade desse projeto está nas construções coletivas da nossa arte, dos nossos espaços poéticos e políticos. E assim, cole-tivamente, declamadores, poetas e poetizas militantes Sem- Ter-ra construíTer-ram ao longo de quatro dias de festival a I MostTer-ra Nacional de Poesia da Reforma Agrária “Luís Beltrame”.

Construiu-se então, em cada dia, um tema articulado aos anseios e realidades dos sujeitos que compõem o movimento: Caldeirão das Bruxas, Iris Poética, Literarte e Viola Enluarada, reunindo gênero, memória, os amores da vida e a luta pela terra.

A experiência da Mostra de Poesia é um fruto colhido de processos em que o MST utiliza a fusão de linguagem como ferramenta no seu projeto de construção de uma cultura política e sensibilizadora que, ao criticar o modelo hegemô-nico de enquadramento da arte e o modelo vigente de produção e reprodução da vida, permite que

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sujeitos expropriados de sua condição criativa reencontrem a possibilidade de criação e atuação artística e intervenção política. Façamos, pois, deste livro, das sessenta poesias declamadas na Mostra de Poesia Luís Beltrame, uma vez mais um ato de memó-ria e transmissão de uma experiência viva da grande e necessámemó-ria capacidade criadora e coletiva de um povo. De um projeto po-pular.

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(18)

CIRANDA DE ENXADAS

Declaro guerra Nas velhas convenções da poesia que matam a poesia do poema, há de se construir o novo, como o sol a despontar para todos em cada verso, ou como a manhã desprovida de sol que entretanto brilha nos olhos.

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Poema esdrúxulo

Aldenor da Silva Pimentel

saiu do facebook e foi à via pública trajava calça jeans e blusa preta básica seu rosto era pintado em estilo gótico

mas preferiu guardá-lo atrás de uma máscara cantou e caminhou com a multidão de anônimos gritou palavras de ordem no seu tom colérico empunha uma bandeira megalomaníaca e também um cartaz com uma frase irônica a marcha foi contida a menos de um quilômetro da entrada principal do Palácio Monárquico deparou-se com a tropa e seu aparato bélico com balas de borracha e spray de ardente líquido escudos, cassetetes e bombas legítimas

que provocavam dor e instalavam o pânico voltou-se contra aquele governo despótico quebrou os vidros com um paralelepípedo foi presa e enquadrada como sendo vândala e apareceu de noite em programa fantástico reparou que vivia situação esdrúxula condenada à torturante pena máxima

(21)

Marcha da insensatez e luta do campo

Antônio Galvão

Sinto cheiro de enxofre O ar nefasto e sombrio das Passeatas e manifestações Os artistas...

Poetas e músicos

São antenas da sociedade Eles escutam a

Alma do povo

E o sentido da História São tocados pelo invisível E sensibilidade

Escutam os ventos, as marés, Furacão, vendaval e o

Inconsciente coletivo Percebem a manipulação Midiática nas redes sociais A manipulação do jornalismo A chantagem dos derrotados Revolta justa dos indignados Pela absurda roubalheira E corrupção

Agora todos ferrados Em processo de depuração

(22)

Existe uma classe política míope Não protege os empregos

As famílias

Não faz as reformas

Política, Urbana, Tributária, Eleitoral e Penal

O ambiente é tenso “O ovo da serpente” Aquecido com a histeria Dos insensatos e

E a adaga dos oportunistas No ninho da intriga

Fecunda ódio, Intolerância,

Busca do bode expiatório O poder e o povo

A omissão e revolta

A vacilação e dívidas sociais O cenário vem translúcido O beijo de Judas

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Tudo advindo Da moléstia

Cancerosa da política Ganância empresarial E agente público desonesto Se o rumo não mudar Para saciar o desejo De sangue e morte Das multidões

Teremos em andamento Um solavanco institucional Vamos todos morrer No abraço

Afogados na Ágora da Democracia

Oxalá seja a penas Uma crise

E meu “pessimismo” Sintoma da meia idade Deus queira que não Exista está infâmia E que a premonição Seja absolutamente Um equívoco Mas cuidados Povo Democrata e Republicando

(24)

A Marcha da Insensatez Está em movimento

A Marcha dos trabalhadores Rurais em campo

Pela defesa da terra Dignidade

E Democracia Viva o Povo da Terra! Dos campos agrários.

(25)

Do que é direito

Chico Nogueira

Quem dirá o que é direito? A quem caberá o direito? E de quem foi feito esquerdo? (que nem de esgueio, liso e lerdo?) e das ilustres palavras afeito? à ferro de forja, o que será feito? E de fazer, quem terá o direito?

Quem será o grande herói, a bater no peito?

(e a bater na gente chucra, que não entende direito?) Quem dirá o que é direito?

(26)

Ao Sinhô Doutor

Daniel Castro

Do Estado, a lei. Do povo, a luta.

O direito que tá no gabinete com ar-condicionado, não é o nosso direito, suado

ensanguentado

com a enxada sempre do lado. A caneta do Sinhô Doutor

não tem a força de mil punhos erguidos. O martelo do Sinhô Juiz

não tem o poder de mil foices que trabalham a terra.

A voz do Doutor Adêvogado

não tem o valor do nosso grito de liberdade. Só se tiver do nosso lado.

Lado-a-lado. Na rua e no Estado.

Aí Sinhô Doutor, de que lado o sinhô está? Do lado de lá ou do de cá?

(27)

Sangue

Luann Ribeiro Santos Silva

Quantas léguas valem o sangue do camponês? quantas vidas perdemos esse mês?

esses anos?

Colonizador! assassino! Libertem Babau!

Não, não nos calaremos!

Queremos a vida que brota da terra,

Agroecologicamente combatemos com flores sua violência Nosso desejo é direito e legítimo por natureza

com a força dos encantados derrubaremos sua estrutura burguesa

a poesia é marreta

os companheiros tombados serão plantados com zelo esse sangue na terra, no olho da juventude é vermelho, é negro, é índio, é nosso em luto e na luta.”

(28)

Semeadura

Vanessa Juliana da Silva

Enquanto houver uma semente De injustiça De desigualdade De misoginia De homofobia De racismo De hipocrisia De violência De antidemocracia Nosso grito Terá valido Nosso grito Terá valor Sigamos em luta Não desanimemos Mulheres, homens Trabalhadora e trabalhador Há um mundo a ser reerguido Pautado na vida

Nosso bem maior

(29)

O sangue jorra!

Antony Josué Corrêa

Verte, como verte a água cristalina da fonte. Mas não é água, é sangue.

Não é vida...é morte...

Vejo o asfalto, seco!!! Áspero!!! Vejo vultos inertes no sangue!! Sangue jorrando no asfalto!! O SANGUE JORRA!! Não estou lá!! Ninguém está!

Estamos sempre tão imersos nesse frenético ir e vir, Que é difícil estar em algum lugar de fato.

O sangue jorra!! Ouço o choro,

Sou inundadx pela tristeza, Estou muito longe.

Longe estão as mães e pais,

As famílias que não podem socorrer e recolher seus mortos. O sangue jorra!!

Sonhadores assassinados,

pois só morre quem vive, e só viveu quem sonhou um dia, São sonhadores combatentes,

Tombados,

Emboscados por humanos,

Por objetos manipulados pelo sistema... O sangue jorra!!

(30)

Não é o sangue que suja o chão, Tão pouco a terra é sujeira, A sujeira está no sistema,

O que contamina não é o sonho,

É a ganância que corrompe o ser humano.

A ideologia é que dissuade e brinca com a sua mente... O sangue jorra!

Assim como os troncos das castanheiras, Postos de pé para que sustentem a lembrança

E persistam dia a dia, como se insistindo para que não esqueçamos, Eu vos peço: Não esqueçam!

Estamos de pé, pelos que tombaram,

Assassinados friamente em El Dourado dos Carajás a 20 anos, Levantamos!!!!

Levantamos, porque escolhemos não nos calar, Podem tentar nos derrubar,

Podem até nos atacar e ferir,

Alvejar, e dilacerar com tiros nosso peito,

Não importa, pois o que levantamos nos transcende, É a vida que alimenta a luta,

(31)

Sabe por quem mais nos levantamos??

Pelos companheiros caídos no dia 07 de abril, Em quedas do Iguaçú, no Paraná,

No acampamento São Tomás Balduíno, Eu não estava lá para defendê-los,

Mas a mim coube lembrá-los, para que haja sentido... Falar de reforma agrária,

É cômodo,

Discurso e debate, mesmo que acalorados, São essenciais, mas cômodos,

Mas não esqueçam, daquelxs que acreditam no que vocês proferem, A ponto de darem suas vidas pela causa!

Então, o sentido não pode ser meramente uma delimitação acadêmica, E isso precisa ser sentido!!

Estão ouvindo isso?

Calem-se por um instante, e ouçam... É a vida que está pulsando e mantém a luta. É o sentido...

E vocês sabem de onde ela vem? Do que sangue que jorra no asfalto, Do sangue que cai sobre a terra,

E verte pelo peito aberto por um projétil ardil. Que sentido isso tem para vocês?

Eis a mística,

Não esquecer...o sentido,

Pois é ao esquecer este sentido do pelo que vale morrer, Que o sistema nos torna alienados,

Não animais, mas meros objetos. Resistamos!!! Lembremo-nos!!”

(32)

Intervenção

Filipe Augusto Pinto Maia Peres

1

É gradativo

de acordo com o crime: traidor assassino socialista trabalhista campesino comunista.

Cadê o exército, rapaz? 2

Às vezes

olhos de mordaça às vezes

olhos e mordaça: Cadê o exército, rapaz? Tá na terra, contra a terra. Vigiando.

(33)

Cadê o exército, rapaz? Tá em Canudos

Massacrando. Não tá não. Esteve. Cadê o exército, rapaz? Tá com as 650 mortes no Pará.

Não tá não. Terceirizou. Fingiu que não viu. Teve. Cadê o exército, rapaz?

Tá vendo os mil assassinatos agrários Todos impunes.

Cadê o exército, rapaz? Tá com a Irmã Adelaide Carajás, Pará.

Não tá não. Teve. Cadê o exército, rapaz?

Tá de novo em Eldorado dos Carajás Pará.

Não tá não. Teve. Continua tendo. Cadê o exército, rapaz? Tá em Quedas do Iguaçu não vendo a PM. Paraná. Teve.

(34)

3

Cadê o exército, rapaz? gritam fazendeiros gritam latifundiários gritam grileiros e seus jagunços

agem milícias particulares as forças policiais

gritam setores do judiciário gritam rentistas

e viva o deísmo de mercado e viva o deísmo demarcado. “”Na fronteira

a chapa é quente”” celebra com orgulho o nobre

o democrata o parlamentar.”

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Transformação

Marilia Carla de Mello Gaia

Meu filho,

você não nasceu sob a lona preta, não sentiu o frio da madrugada

ou esperou a separação da cesta básica pro povão. Quando você veio...

terra repartida, casa de alvenaria, arroz brotando do chão.

Ainda assim nasceu Sem Terra!

Aprendeu o sentido dos punhos erguidos, da luta e da ação. Quando você veio já havíamos chorado

por Corumbiara e Carajás.

Você só conhece essa história da mística que te embalou. Nós te levamos para ver o local dos nossos mortos em Felisburgo... mais de 10 anos depois.

Para você era um campo florido, pra mãe e pro pai, tristeza e solidão.

Fico pensando quando vou te explicar

sobre Reforma Agrária Popular, Agroecologia e Cooperação. Ah, e também sobre Che Guevara, Paulo Freire,

Elisabete Teixeira e o sonho de uma outra nação. Te espero, velhinha, e você me contando que tudo isso se concretizou:

(36)

terra sem sangue; comida sem veneno; escola em movimento; soja sem transgênico; vida em revolução.

Um dia nós fizemos esta opção,

(37)

A ti, Burguês

Natalia Siufi

Arregaçado teu arame farpado e tua terra bem dividida

Quero tua empresa falida Câncer no teu consumo necrosia na tua estupidez Gangrenada tua posição quero tua classe desclassificada tua propriedade arruinada e todos os monumentos Apodrecidos teus heróis, bustos forrados de excrementos Nem teus palácios nem mansões Asfixia nos pulmões de tua vaidade Quero pra todos tua comodidade Esfaqueada tua homofobia Teu machismo e tua misoginia Soco no estômago de tua ambição Úlcera aberta no teu brasão

Cirrose hepática no teu único deus Cuspida a herança de todos os teus e caco de vidro, teus anéis e princesas Quero pra todos as tuas riquezas Atrofiadas tuas cercas elétricas

Anemia profunda em teus carros blindados Vandalismo nos teus bancos

Estragada tua comida veneno Tua transgenia e teu latifúndio E fraturado teu egoísmo

(38)

Pro inferno teu talento nato Abulia a teu fundamentalismo Hematoma no teu amor pequeno Quero pra todos teu trabalho ameno e teu tempo de sobra pra pensar Arrancadas as unhas do teu poder Teu assistencialismo estuporado Quero pra todos o que tem guardado em teus cofres de ouro no exterior E às tuas guerras, pavor

Corte fundo no teu ódio Adoentado cada pódio Agonizada tua mídia escrota rasgada a boca de teu cinismo E arrebentada tua instituição Teu imperialismo em comichão E tua globalização insana Quero pra todos a tua cama e travesseiro macio

E que a igualdade entre no cio multiplicando o produzido E sobrará em teu ser humano depois de tudo engolido Gente ainda aí dentro E já não será inimigo.

(39)

Quando abril chegar

André Carlos de Oliveira Rocha

Pode pairar a injustiça, pode reinar a intolerância, mas tudo será diferente quando abril chegar.

Se a esperança ainda insiste, se a rebeldia aqui resiste, a intransigência que dite quando abril chegar. Quando abril chegar

os latifúndios serão ocupados e nossos mortos serão vingados. Quando abril chegar

a agitação será permanente e a propaganda, cotidiana. As canções serão de luta e o amor será camarada, quando abril chegar.

(40)

Tekoha

Eliel Freitas JR

Luz da alma

Que acessa, ascende A luta A vida A lágrima Que na dor E da dor Irriga a esperança E faz nascer

Gerações após gerações Corações e corpos Espíritos e mentes De guerreiras De guerreiros Que na luta Na vida Na morte Na dor Têm na terra Da terra E com a terra

(41)

À esquerda

José Jusceli dos Santos (Garganta de Ouro)

“A esquerda está perdida foi em vão nossa caminhada. Nossas forças foram suprimidas e a esperança foi sufocada. Não há sonho a ser sonhado. Não há horizonte a ser seguido. Tudo que foi semeado,

colher, não será permitido. As ruas ficarão vazias.

Só há o silêncio aos oprimidos.” A esquerda não está perdida nem foi em vão nossa caminhada. Nossas forças não foram suprimidas e a esperança não está sufocada. Há sim sonho a ser sonhado há horizonte a ser seguido. Tudo que foi semeado,

nem que haja sangue derramado, tudo, tudo, tudo, será colhido! A sede, a fome a fúria por liberdade, não ouvirão a ordem burguesa. E está decidido:

As ruas serão tomadas. Os direitos serão mantidos. A democracia ovacionada. E a consciência de classe dará ritmo ao levante.

(42)

Aos opressores diremos: Não mais as sobras! Aos opressores diremos: Não formamos covardes! Aos opressores diremos: Dividiremos tudo o que tens! Nem favelas, nem mansões. Nem senzalas, nem barões. Haverá lutas, haverá conquistas! O povo dará voz ao povo. O povo dará olhos a justiça.

(43)

Oração à Terra Santa

Gustavo Garcia Palermo

Ó, Terra Santa!

Mostrai-me a verdade das fajutas caras desses homens que te pisam

Mostrai-me a realidade escondida pelos grandes que te cobiçam Ó, Terra Santa!

Dai-me um pouco do nada que nos é distribuído Dai-me aquilo que é meu que não foi bem dividido Mantei-me íntegro no trabalho que tenho exercido

Mantei-me o bucho com o mínimo de alimento preenchido Ó, Terra Santa!

Sua Vida é minha vida Sua morte é minha morte Quem dera eu tivesse a sorte de sequer nem ter nascido Ou será que sou abençoado por ter sobrevivido?

Devo me sentir honrado por um dia ter te conhecido

(44)

Aos que permitem a injustiça

Gustavo Garcia Palermo

Não quero de forma alguma cravar em seu peito as verdades sobre os crimes de João, o latifundiário Muito menos lambuzar seus olhos com sangue indígena das mãos de Almir, seu vizinho mercenário

Só quero que saiba que Joana, esposa de Tomé não deveria morrer em vão, de câncer, de João muito menos de hematoma, de Tomé

Nem que Leona, a vadia trans da favela se torne alvo de fluorescentes lâmpadas, nem de facas, balas, homens, palavras Nem de olhares afiados, pontiagudos, fatais Que as palavras destinadas à Maria e Leona não causem ruptura de seus corações nem a ruptura da dignidade

Queria que soubesse, que Tito, o vendedor de doces roubou os doces para vender

(45)

ela bebe e se farta do sangue e da carne de Iberê criança de etnia Caingangue

Iberê foi adubo nas terras de Almir

Saiba que pouco mais ao norte, e mais ao sul Lucas bebe leite de sua mãe no Rio Verde

Que Lucas bebe de sua mãe diclorodifeniltricloroetano Que isto bebe Lucas, e Lucas chora em silêncio

Chamo-te a atenção para Maria, para Ana e Mariana Suas lamas camas deságuam no mar,

já suas vidas silenciadas pela vida choram sufocadas no Doce do Rio

que esse Doce, não é o mesmo que o de Tito Amarga na boca, suja a boca de lama

agora sem cama, nem lama

Mariana nem chora mais, nem mostram mais nem indignação causa mais

Aos que permitem a injustiça Peço apenas que engulam o leite, a carne, o doce, a lama

o sangue, o ar condicionado, o câncer e me responda

(46)

Uma bandeira vermelha cravada no latifúndio

Jane Andréia Cabral e Silva

Lá aonde já não se via mais esperança o verde significava morte

e a carne do boi era a fome dos pobres. Lá onde a terra e o silêncio nos fazia lembrar

de pessoas sem terra e escravidão em tempos de “Paz”. Lá, foi cravada a bandeira vermelha.

A morte agora é do latifúndio

A paz agora é a Paz de crianças, homens e mulheres felizes construindo a sua dignidade.”

(47)

Vida Sem Terra

Lorena Aparecida dos Santos

Lutar Construir Reformar...

Pessoas que sofrem Olhos que choram O frio que bate A fome que rói

O preconceito que destrói Um punho que se ergue Um olhar que brilha Um coração que dispara Não mais se vê um Mais uma multidão

O povo que faz revolução... Na beira da estrada

Há uma família acampada Uma lona estendida Faz sua morada

Ninguém vê, quem vê ignora E pela estrada vão s’embora Um punho que se ergue A multidão que se levanta Indignada...

Somos gente

Somos filhos da terra Somos quem luta Livres e fortes Somos Sem Terra.

(48)

Duelo e Herança

Jose Ferraz de Campos

Silêncio!...

Pende à balança ou à espada no duelo por terra? De lá: a farpa, a tirania, a escravidão...

Daqui; a Arpa, a liberdade o pão... E a terra?

A terra segue num cenário de guerra e de paz... Psiu!

Há mortos...

Os projéteis romperam grades, caminhos, árvores, casas e templos. E ceifaram vidas...

Corumbiara, Carajás, Felisburgo...

Lhes restam memórias, somente, eternas e ardentes. E a impunidade?

Ah! a impunidade inundou palácios a encharcar carpetes e mentes

(49)

A curva do ‘S’

Jane Andréa Cabral e Silva

A curva sempre vai estar ali curveando nossa memória, fazendo um ‘S’ de saudade

provocada pelas balas sangrentas do Estado.

Estará junto à saudade, cravada, plantada, as castanheiras que gritam liberdade e justiça,

recheada por uma juventude que inspira e transpira: rebeldia, alegria e coragem.

(50)

LUGAR DE MULHER É NO

TANQUE... DE GUERRA!

2

Somos homens. E eu vou usar linguagem “de homem”, pra tentar ficar mais claro.

Ninguém nos apalpa no caminho do banheiro, na balada, puxa nosso cabelo ou nosso braço, ou sussurra “vagabundo” no pé do nosso ouvido apenas porque queremos mijar.

Ninguém nos encoxa no metrô ou no ônibus, goza na nossa calça ou no nosso ombro, filma escondido a gola da camisa e publica em site pornô.

Ninguém fotografa nossa bunda e envia por Whatsa-pp. Ninguém coloca câmera escondida pra filmar por baixo de nossas bermudas na rua.

(51)

Nenhuma mulher nojenta ficou se lambendo ou esfregan-do a mão enquanto eu atravesso a rua.

Nenhum assaltante jamais enfiou a mão na minha calça ou tentou me beijar à força.

Ninguém nunca me ameaçou a vida depois de uma bota. Ninguém nunca ameaçou meu emprego a troco de sexo. Nunca tive medo de circular de noite ou de dia e ser víti-ma de um estupro.

Meu salário é oferecido de acordo à minha qualificação e estado do mercado. Só.

Minha liberdade sexual é garantida pelos bagos que carre-go, e, inclusive, quanto mais mulheres eu colecionar, mais foda eu sou.

Ninguém espera que eu largue o trabalho e dedique minha vida aos filhos, quando eles nascerem.

Ninguém vai me chamar de puto se desejar tomar uma cerveja no fim do expediente.

Ninguém vai criar qualquer conceito sobre mim senão baseado nas minhas reais atitudes.

Então, fera, veja em quantos pontos supracitados você se enquadra e me conta como é bacana a vida sem essa vio-lência indireta ou direta, como é simples viver assim. Lembra desse papo quando nomear “vitimismo”, “mimi-mi”, “falta de rola”, “louça pra lavar”, enfim, os clichês que a gente conhece bem.

Não precisa pensar na desconhecida não: pensa na sua mãe, sua irmã, sua companheira, sua filha… Faz o mais forte exercício de empatia do mundo, que é se colocar no lugar delas, volta aqui e me chama de “feministo”. Aguardo ansiosamente.

(52)

Discurso de um morto-vivo de 500 anos atrás.

Idylla Silva Silmarovi Ferreira

Tirada da costela para ser companheira, para servir, para ser a mãe enquanto o homem, o varão o cabron vai e domina, puxada pelos cabelos para a caverna da relação matrimonial arranjada forjada onde você deveria ao menos agradar seu marido sendo mulher, amante, mãe, calada sem reclamar no muidinho do seu hímen que vale ao seu pai o dote o trote de quatro da mula manca rasgada e arrombada que recebe muda moeda de troca de sua menarca presa no sempre livre perfuma-do que depois de tiraperfuma-do já não serve como tu então vá mulher, vá tomar um banho que hoje eu vou lhe usar. Que quando boa serve aos preceitos de um deus de um sexo pecador reprodutivo sem prazer sentindo a ausência de um falo que nunca teve nem nunca terá, você a responsável da má sorte de Adão, você que nos tirou do paraíso do Éden , você Helena que leva homens a morrerem em Troia, você Pandora que traz a escuridão ao mundo, você Medusa que transforma homens em pedra, você Suzana Vieira com seus 10 milhões de brasileiros que amam o seu tico tico cá seu tico tico lá, você cigana Meneghel que leva os baixinhos a perdição, você a nova loira do tchan que desce

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pelas ruas achando que podes caminhar sem a presença de um homem para chamar de seu mesmo que seja eu. Você merece... merece a fúria dos homens em você, encima de você, embaixo de você, dentro de você, nos seus orifícios, mereces o ácido que corrói a sua face e te marca como suja.Joga Pedra na Geni! Joga bosta na Geni! Irás pagar a sua vinda a terra, Madalena. O que dirá o santo padre que vive em Roma ao ver que gritas, que abortas, que cantas, que danças, que curas e que oras nas flo-restas escuras com suas companheiras, o que dirá eu? Salvador do mundo, Füher que limpa e extingue a sua raça, inquisidor, juiz e dono do seu destino enviado por Deus? Pera amoré, Hás de arder no fogo hás de queimar viva em praça hás de sentir as dores de seres o que és. (Batendo panelas) Queime a Bruxa and Military intervention now!!!

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GUERRILHA: Substantivo feminino

Idylla Silva Silmarovi Ferreira

Guerrilha (guer-ri-lha) Substantivo feminino se caracteriza por ações descontínuas de inquietação, emboscadas, o principal es-tratagema é a ocultação e extrema mobilidade das combatentes, chamadas de guerrilheiras. 1 Bando armado de voluntárias trei-nadas militarmente de formas clandestinas, que em geral atacam o inimigo pela sua retaguarda, com o objetivo de importuná-lo. Guerrilheira Substantivo feminino, Aquela que participa de luta armada por causa ideológica, geralmente em oposição ao regime estabelecido.

Aquela que está vestida com as roupas e as armas de Anita Gari-baldi, com os caminhos abertos pelas matas, campos, rios, aque-la que sobrevive e reexiste todos os dias, aqueaque-la que acorda peaque-la manhã e cuida dos filhos e da casa, aquela que acorda meio dia e não cuida de ninguém, aquela que teme andar na rua a noite mas ainda assim anda, aquela que é mestre em química, mate-mática, física, que joga futebol, aquela que não deseja nenhum homem, aquela que deseja mulheres, aquela que deseja homens e mulheres, aquela que não se importa, aquela que não abaixa a cabeça que levanta a voz, aquela mãe solteira que cria os filhos

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primeiros pelos, aquela que se depila que não se depila, aquela que é depiladora, manicure, cabeleireira, aquela filha da puta que não quis parir e abortou, aquela que sai de saia curta, aquela que sai de burca, aquela jovem que fuma maconha também, aquela que escreve poesias, que canta, que dança, aquela das giras de candomblé, aquela umbandista, crista, budista, aquela que não vai pagar a conta, aquela violada, violentada, aquela assassinada, aquela na prisão, aquela que é silenciada e a que vai gritar, aquela que corta picas e se reclamar também vai cortar as bolas.

Comandanta Ramona, Maria Bonita, Violeta Parra, Pagu, Do-mitila Barrios, Olga Benário, Maria Victoria de Santa Cruz, Fri-da Kahlo, Dandára, e tantas outras companheiras de guerrilhas: PRESENTE !

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Se um dia as mulheres enfurecessem

Adriana Novais

Em fúria não permitiriam que a televisão pautasse sua beleza. Em fúria faliriam todas as clínicas de estéticas.

Jamais transariam sem vontade.

Se um dia as mulheres se enfurecessem

não aceitariam que o Estado regesse seu corpo. Em fúria decidiriam se queriam ou não, ter filhos. Em fúria não usariam roupas desconfortáveis em nome da aparência.

Em fúria usariam apenas a que lhes dessem vontade. Em fúria não permitiriam que a outra apanhasse.

Em fúria revidariam os tapas na cara, os chutes e os ponta pés. Em fúria não seria escrava em sua própria casa.

Se um dia as mulheres se enfurecessem, calariam a boca dos padres e dos pastores que pregam os dever da sua submissão.

Em fúria denunciariam todos os abusos cometidos nas igrejas, no trabalho, nas delegacias, nos hospitais e aqueles cometidos dentro das suas casas.

Em fúria, ensinariam as filhas a se defenderem e os filhos a não estuprarem.

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“Catarina da Mina”

Beatriz Maria de Figueiredo Ribeiro

(Homenagem a Catarina da Mina, escrava que comprando sua alforria se tornou dama da corte em São Luis do Maranhão).

Puxa a bala, nêga

quero comê alfinim de rapadura de coco da praia

ou de jerimum da terra dura Torra a massa, nêga

quero comê farinha puba pro beju guarda um pouco e outro tanto pra jacuba Ordenha a vaca, nêga, quero comê coalhada crua adoçada com gramixó comprado na venda lá da rua Repara, nêga

a esperteza, a minha gula e só tu quem trabalha e eu de banda pra lua “A sinhá é que se engana, deste meu trabalho de mula O sopro do vento inda muda neste dia teu deus que te acuda

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Nenhuma mulher mais ficará calada

Nívea Sabino

Digo que a revolução será debochada Segue comigo vai ser rimada poetizada

Te apresento em versos a maior luta armada -Negra dominando a fala e a palavra por essa eu sei

Que cê não esperava (fez de mim escrava) Filha da... empregada! que procurava vaga na escola “”fraca”” que não era paga

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Sapatão é as minas que irão te mostrar que seu “liliu” na mão diante do meu “não” é uma piada

Ei, macho alfa!

- sofre não! Sofre não...! Nenhuma mulher mais independente da cor ficará calada

enquanto houver outras violentadas Violeta é a cor

que marca a luta de resistência ao roxo que ocê deixou Preta nagô, nagôôô... Vamos dizer do tanto que Dandára lutou

Cê acha mesmo que só barbado resistiu ao escracho!?

Eu sangro!

- Faça-me o favor!

Não passará, enquanto eu não passar! Passar gritando,

denunciando o mundo tosco que nós criamos

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A cada uma hora e meia uma mulher é morta Minha poesia

não mede a fala que põe na cara:

O Brasil é o país que mais mata: mulher preta

transexual e viada.

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Marcada pra viver

Rodrigo Moschkovich Athayde

O cabra marcado pra morrer

marchou sua luta por justiça e liberdade nas várzeas da Paraíba fundou a sua Liga

junto à companheirada, organiza, planta, desafia os coronéis que escravizam, agora se calam trabalhador organizado não gera mais-valia mas dá um trabalho!

o patrão que tem medo, age como cobra acuada se finge de morta e dá o bote na hora exata

a burguesia não olha no olho, não debate, não faz nada sem mostrar a cara, ordena a covardia, e por ela paga

com o conhecimento nos braços, de tiro covarde, João Pedro tombou na estrada

a mulher marcada para viver

ao ver o cabra morrer, tomou atitude inesperada aceitou sua herança e, marchando, abraçou sua intifada à guerra justa sacrificou tudo

seus filhos, seu corpo, sua identidade mas jamais faltou à palavra dada das Ligas Camponesas ao MST Elisabeth ainda marcha

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Me sufoca

Vitoria Maria Beserra Demarchi

Me sufoca o racismo A homofobia O genocídio O ódio gratuito O preconceito O pré conceito Me sufoca o machismo O patriarcado O assédio O estupro As cantadas Me sufoca a religião A ideologia A imposição A dominação A condenação

Me sufoca a falta de tempo A pressa

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O golpe A ditadura A polícia Me sufoca o capitalismo O latifúndio O agrotóxico O transgênico A monocultura Me sufoca a mídia A alienação Os padrões de beleza Me sufoca a exploração A escravidão A submissão A imposição Me sufoca os padrões Os rótulos A perfeição A superficialidade A pressão A avaliação

Me sufoca dar explicações Satisfações

Justificativas E você?

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Sobreviva

Gustavo Garcia Palermo

Saída do ventre de minha mãe, ensanguentada

me mantive respirando, me mantive viva, me mantive sobreviva Amamentada pelo leite dela e da vaca, me mantive alimentada, me mantive nutrida, saudável

Em seus braços esqueléticos me mantive aquecida, confortada, protegida Em casa todos brincavam com o órgão sexual do meu irmão recém nascido mantive minha vagina escondida, retraída, protegida

Ainda criança não pude correr, brigar na rua, falar palavrões então me mantive frágil, indefesa, comportada

A professora e todo mundo me disseram que eu não podia ficar com as pernas abertas

me mantive delicada, pernas cruzadas, me mantive educada Quando crescida fui proibida de expor os seios,

então me mantive bem vestida, tetas escondidas, protegidas

Na adolescência me condenaram por ter pelos nas axilas e no púbis, me mantive rapada, depilada, me mantive delicada

E ainda todos os pelos do meu corpo

e em torno da sobrancelha foram criminalizados, me mantive descolorida, depilada, delicada Desde sempre fui negada à masturbação,

me mantive inocente, contida, me mantive envergonhada

Aos 17 anos engravidei, me mantive puta, exposta, me mantive sozinha Algum tempo depois me casei com o homem dos sonhos,

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Para elas

Natália Siufi

Respira... Abre os poros da pele Que acordar já dá trabalho Numa cidade ensandecida Se fazer voz em avenida Placenta aberta no asfalto Ser raiz, pra não ser galho Que vai no rumo de todo vento; E no meio do caos, tornar-se alento Ser fortaleza, terra, certeza

Na templo-era da opinião Ser Geni, em praça pública Em verso e prosa, ser Rosa E em toda fome, ser Simone Na dor doída, ser Frida Na esquisitice, Clarice

Na luta aguerrida, ser Guariba E desde menina, Coralina Tem coração o seu caminho? Vermelho e escorre o sangue Dança! Profana! Proclama! Plasma no espaço outro amanhã Foge do teu lugar seguro

Vai ser “gouche” nessa vida Nua, aberta, exposta ferida Canta o canto do teu lugar que há de ser a internacional aperta forte teu punho nosso que nem tudo há de ser vigiado que há caminho pra ser cavado

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e há ser-humano ainda, embora pareçam máquinas No meio da rua, atua!

Ainda há lua escondida no céu E um sol pra brilhar nessa aurora Que há de ser tua, tua flora E teu corpo há de ser tua escolha E teu feto e teu desafeto

E punida qualquer violência E existência ao invés de essência. Grita! Berra! Invoca!

Da história de cada fogueira Da vulva rasgada, do véu Que nem todo doce é mel Que nem todo belo cala E frágil é palavra bem forte Que nem todo sul

é contrário ao norte E há que gerar movimento fazer do ofício, seio, sustento e ser mãe e ser a filha, Há que ser protesto ser guerreira, andarilha Há que ser coerente, Há que ser imoral,

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(68)

“SE NÃO NOS DEIXAM

SONHAR, NÃO OS

DEIXAREMOS DORMIR”

3

Instruções para esquivar o mau tempo

Em primeiro lugar, não se desespere e em caso de agitação não siga as regras que o furacão quererá lhe impor. Refugie-se em casa e feche as trancas quando

todos os seus estiverem a salvo. Compartilhe o mate e a conversa com os companheiros, os beijos furtivos e as noites clandestinas com quem lhe assegure

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São coisas simples, mas nem por isso menos eficazes. Diga para o lado bom dia, por favor e obrigado. Dê tudo o que tiver, mas nunca sozinho.

Eles sabem como emboscá-lo na solidão desprevenida de uma tarde. Lembre que os artistas serão sempre nossos.

E o esquecimento será feroz com o bando de impostores que os acompanha. Tudo vai ficar bem se você me ouvir. Sobreviveremos novamente, estamos maduros. Cuidemos dos garotos, que eles quererão podar. Só é preciso se munir bem e não amesquinhar amabilidades. Devemos ter à mão os poemas indispensáveis,

o vinho tinto e o violão. Sorrir aos nossos pais como vacina contra a angústia diária. Ser piedosos com os amigos. Não confundir os ingênuos com os traidores.

E, mesmo com estes, ter o perdão fácil quando voltarem com as ilusões acabadas. Aqui ninguém sobra. E, isto sim, ser perseverantes e tenazes,

escrever religiosamente todos os dias, todas as tardes, todas as noites. Ainda sustentados em teimosias se a fé desmoronar. Nisso, não haverá trégua para ninguém. A poesia dói nesses covardes.

Paco Urondo (1930 – 1976) foi escritor, jornalista, poeta, militante político e guerrilheiro argentino.

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Vidas Bordadas

Beatriz Maria de Figueiredo Ribeiro

(construído a partir de falas recolhidas de camponeses e camponesas dos assentamentos da região sudeste do Pará, vinculados ao programa de alfabetização de jovens e adultos).

Cada página em branco é pra mim que nem se fosse um sonho.

Penso numa vida mais fácil pra sobreviver Só falta um nome pra eu chamar

tal tal dos cacete dos anzol. O problema

é que só sei assinar meu nome malmente. Nunca morei perto de escola,

eu nasci os dente foi dentro da roça e a escola que meu pai me botava era a escola do pé do toco. Só sei que tem ponto parágrafo tem sílaba e interrompimento.

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O meu nome

mesmo com as vista fraca

eu aprendi assinar pelo um desenho Mas o nome que eu desejo agora não é Gregório nem Gerosina nem Risonho nem Pirruncha. A danura dele vou dizer qual é: tá em não poder dizer

nem escrever.

É tal e qual água no chapadão, só se vê de longe

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É sempre tempo de amor

Bruna Matos de Carvalho

É sempre tempo de amor,

mesmo com toda a dor, indiferença e egoísmo. Mesmo com todo o ódio inflamado.

Mesmo que clamem por sangue

e que a violência seja a palavra de ordem de alguns É sempre tempo de amor,

ainda que os medos sejam constantes ainda que a utopia pareça distante ainda que venham as contradições

e mesmo nas nossas fileiras convivamos com a dor É sempre tempo de amor,

apesar das feridas e todo esse sangue apesar das nossas veias abertas

apesar dos nossos continuarem tombando e a vida pareça tão frágil

É sempre tempo de amor,

mesmo quando tudo parece cansaço mesmo quando as derrotas batem à porta

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Pois se entre lágrimas enterramos nossos mortos

a história não nos deixa esquecer e não se deixará repetir, e assim eles se fazem sementes que brotam no caminho as flores de uma nova estação.

Se fazem presentes em sorrisos e luta É sempre tempo de amor,

porque o afeto, o carinho, a ternura não nos faltam e o caminho é também cheio de flores e amores, porque a certeza da vitória não nos falta

e a esperança nunca se apaga em nosso peito.

Porque não nos falta a coragem de seguir construindo um mundo novo, com mulheres e homens novos É sempre tempo de amor,

porque a ousadia e a coragem não se enterram. Podem invadir ou depredar lugares,

Podem nos bater, nos perseguir, nos ameaçar. Não podem nos impedir de sonhar e lutar! Não podem nos impedir de amar!

A despeito de todo ódio seguimos firmes! A despeito de todo ódio o amor resiste! É sempre tempo de amor

porque nada pode deter a primavera e o povo! Porque nada pode deter a primavera do povo! Venceremos!

(74)

Verdura

Diego Ruas Silva

Para quem tem fome a esperança é

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Sonhos e Paixões

Messias Vítor de Oliveira

Já roubaram nossas noites,

roubaram também nosso entardecer, mas não roubarão nossas manhãs... Ainda que não queiram,

a natureza insiste e, na angústia da noite,

o sol, teimosamente, ensaia a su’aurora Já roubaram nossos corpos,

roubaram também nosso descanso, mas não nos impedirão de dormir... Ainda que não queiram,

teremos nossas paixões, nossos desejos e ternuras! Já roubaram nossos filhos,

roubaram também nossos sorrisos, mas não roubarão as nossas vidas... Ainda que não queiram

lutaremos

gritaremos n’alegria,

sabemos de cor nossas cantigas ! Já roubaram nossos brinquedos, roubaram também nossos amores, mas não roubarão nossas utopias... Ainda que não queiram,

sonharemos –

esquecem que, enquanto sonhamos, alimentamos em nós o desejo de vida!

(76)

Já roubaram nossas noites,

nossos corpos, filhos e brinquedos,

roubaram nosso entardecer, descanso, sorrisos amores, mas não roubarão nossas manhãs e utopias...

Ainda que não queiram, lutaremos, sonharemos,

nos apaixonaremos à luz da aurora,

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Natalia Siufi

Não existem só três cores nesse arco-íris, não se resume a ver-de-amarelo ou vermelho meu coração, não se faz política sem discussão, não se sai pra rua sem organização, reunião, debate, de quarteirão em quarteirão, representante de bairro… sabe? Acho que nossos avós sabiam, nossos pais talvez se lembrem… ditadura dureza que massacrou nossa classe, destruiu nossas cozinhas, que eram o público da casa, os espaços de conver-sas, agora com TVS ligadas, Iphones, tomadas-faces-twitadas, ninguém proseia mais nada e a mídia nadando de braçada, determinando caminhos, abrindo estradas, como quem não quer nada, presidindo o país sem presidente, o país estado au-sente, que é pau mandado do exterior. E a Vale do Rio Doce, e a Samarco, e a lama? E a MonSanto com sua microcefalia progra-mada? E a zika social instaurada? Isso não vale panelada? Se a estrela vermelha fosse a sombra era mais fácil. Difícil é expulsar multinacionais, capitais internacionais, impostos, dívidas ile-gais, rediscutir a bancada, explodir a esplanada, tocar fogo nes-sa engrenagem emperrada, onde trabalho é vendido à baciada, e preta e pobre é estuprada e favela é turismo de bacana. Difícil é ter tempo pra conversar, construir, organizar outro mundo possível que tenha de fato cores, que tenha de fato amores, que expulse esses tumores, que pare de tremer nesses rumores, que fortaleça o que é ser público abandonando o indivíduo-e-go-bandido – esse sim roubando nosso espaço, rompendo laço, impedindo abraço. E mais amor com menos polícia é uma vida sem medo, sem tanto brinquedo acessório, onde o ser humano aprende a lavar sua roupa, bancar sua vida e cozinhar seu ali-mento e pra isso tem que ter tempo. O que nos cabe talvez seja roubar de volta o nosso tempo, pra ter tempo de jogar conversa

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fora, desligar os televisores, falar de nossas dores, de tantos di-nheiros tarjas pretas, indústria farmacêutica, hospitais da morte programada, é começar a construir outras estradas, sem tantas bandeiras levantadas... E deixa eles pra lá. Deixa a Dilma lá… isso é golpe de gente sacana, é machista é imperialista, coisa de bacana que quer que o Brasil perca tempo pra continuar cobaia, pra continuar mão de obra barata, pra continuar matéria prima de graça, pra continuar exportando soja cana gado, pra con-tinuar comendo enlatado. Isso não se faz! Da minha boca em movimento tem mais cores e menos lamento! Sigo, vivendo!

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Queloide

Tatiana Nascimento

aguardando...

aguardando aguardente no balcão rangente, rangendo os dente atento em tudo que se movimente

um soluço menor que fosse o impulso jamais pego no susto, sagaz que nem capataz mas incapaz

de cagüete.

“tu é macho ou enfeite? diz!” “tu é macho ou enfeite rapaz!” tu é macho ou enfeite.

dis-confiado de herança no sangue matreiro de avô pai filho espíri-to mineiro, mas capitão de maespíri-to não,

nem invente, tome tento – ou aguardente. entorna um tanto pro santo, cadê esse mé, são Tomé, ou José?, como

que vó benzedeira dizia?, rezava, desfazia mau-olhado relento banzo espinhela-caída tristeza cancro encosto maleita dor de cotovelo quebranto,

já falei…

coração partido? já falei…

banzo?

era Antônio, era, o santo? curandeiro que nem ela, há de ser lázaro, lazarento, de chagas y miséras, era?

era nada, atotô mesmo, y no fim credoemcruz só pá dá o migué nus cristaneiro, padrinho da sé,

frouxo no lé-ro mas de ferro na fé

diz que é tomé mesmo, memória é tudo inventança, axé num testa mais, quem tem fé taca é pedra nas criança das iabás,

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y tomé nem páreo tem, gêmeo forçado bastardo excomungado sincretizado demonizado nada é puro mesmo halo todo pra ele amém.

cadêssaguardente, moço?, um bucado de tempo esperando, moço, coração ralentando, o olho pesando, um troço

aqui dentro mole

que nem caldo de cana por isso metia logo era bala, comia era xana, na gana de assim mascarar a sofrência, a dormência,

a verguenza-macheza toda armada,

armadurada faixada, fingido mais duro que o pau, que a pura rapa do tacho

desgraço colonial açucado & doído…

que nem engenho fodido em sua memória latifundial: canavial margurado, caroçado, esgarçado dói que nem dor de dente,

quelóide latente na pele preta da alma da gente y… opa, finalmente!, a dose vem certa,

vira de um gole, eh quente, rasga a guela inclemente, ardendo rente aperta, desce outra pa gente?,

moditalagá esse dissabor, será se conserta?, se cura?. tsc. desce é reta. só num dói mais que disamor a história turva da garapa aguardida, amarga é a lida desse lado da cerca-fronteira

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Sonho Eterno

Maria Elizabete Pereira Guedes

A bela menina sonhava em fugir nas asas do vento ir longe, muito longe onde ia o pensamento E pediu para o passarinho - Me ensine a voar? Me leva daqui para o alto. pra lua eu alcançar? O passarinho bem sério respondeu sem hesitar. - És pequena, não tens asas vais no chão te esborrachar. Fica quieta no seu canto é bonito o seu lugar. Mas a menina sonhava ir fundo, além do mar

onde ninguém pudesse chegar E pediu para os peixinhos na beirada de um rio - Me leva nesta água me ensine a nadar?

Os peixinhos bem contentes e ela alegre a cantar

felizes foram para sempre viver noutro lugar

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Se quiser ver a menina quando a saudade chegar olhe por cima das águas nas noites de lua clara

(83)

Da noite ao dia

André Carlos de Oliveira Rocha

Cai a noite na Curva do “S” e nossos mortos

ainda não foram dormir. As estrelas vêm me falar de ti, contam de coisas que já sei. De repente... se escondem, como que omitindo as palavras

que me interessam.

Nossos mortos não dormem como não dormem meus sentimentos,

pensamentos, futuros e passados.

Então, o sol vem beijar a lua e as músicas falam de ti. Por que calas?

Por que não falas por ti mesma? Talvez assim, a vida se organize e lutar será novamente um ato de paixão.

(84)

Nós

André Carlos de Oliveira Rocha

Quando você chegou meu espírito lutador sorriu.

Agora estamos completos, não temos mais medo e a rua será nossa.

Nossos bonés, imponentes, bandeira como armas, marchamos, movendo-se como o rio-mar,

vento geral no Guajará. Na praça, viramos à esquerda. Na dúvida, sempre virar à esquerda. O temor, agora, está do outro lado. Que não durmam,

porque nós estamos sonhando novamente. Juntos, não temeremos mais a morte.

(85)

Arte maior

Maria Divina Lopes

É arriscado desejar o improvável. Mesmo que seja flor,

mesmo que seja bela, mesmo que seja tangível, mesmo que seja possível. Degustamos a presença, como se fosse fruta, como se fosse vinho, como se fosse canto, como se fosse carne, como se fosse festa,

(86)

De/composição

Maria Divina Lopes

Um sistema orquestrado aprisiona o movimento da existência.

Desnudo minhas fraquezas diante do que vejo, ao revelar meu rio de preocupações.

Meu refúgio de indignação, meus pedaços de afetividade, minha fração inteira de inspiração

confrontam-se cotidianamente com a de/composição da sociabilidade humana.

É áspero o arranjo que compõe os dias atuais,

consente um sustento racionado para uma sinfonia de famintos automatizados,

produz uma diversão que artificializa a alegria, e uma arte que não sensibiliza.

Tudo é vendido, comprado, mercantilizado. Até mesmo a lágrima

vira mercadoria e embrutece o amor. Amor,

(87)

Placidez

Maria Divina Lopes

A chama ainda quente

interrompe essa intolerável placidez; com fúria, desabafos e gemidos. Antecipo o infinito para mostrar-te

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Chão Nosso

Gustavo Garcia Palermo

Das três coisas que me mantém vivo água, comida e chão

faço dela vinho dela pão

e dele revolução da água embebedo da comida enfarto do chão revolto o pedaço que é meu que é nosso

é nosso exijo, reclamo é nosso

o grão do pão que não tem dono reconheço, estabeleço

não tem dono é nosso

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exijo, repito, determino o chão a revolta a água a liberdade o grão é nosso inteiramente nosso”

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“Mítico”

Joatan Oliveira Xavier

Com a

Noite naufragada Veio o seu despertar Nos olhos espelhados

Um Prisma transpassado em luz Algas marinhas Luminescentes As pétalas do bem-me-quer A quimera de toda aurora A esperança remanescente de Tempos de outrora Não

Tocou seu sorriso

Este tempo em descompasso. Cenário das desventuras A lágrima que lhe aflorou Esta pétala desprezada E uma flor agora Estéril

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Sobre ela

deslizo meu olhar enquanto me ensinas

uma magnífica forma de ver Fecham-se os olhos,

Cessa-se a luz, acende-se a alma. É como o sol crepuscular,

que quando leva consigo a luz É hora de sonhar.

(92)

Sei quem sou

Ricardo Jose Caxias Luz

Sou gente/correndo/buscando identidade/me vejo índio/ amazônica/urbano/ribeirinho/preto/caboclo/cabano/sou um/ me falta chão/na imensidão/fincar o pé/escrever a própria história/ recontar os fatos/vivenciar/construir com novos atos/valores/ replantar/conquistar a identidade/na Amazônia paraoara/ no campensinato latino/me vejo livre/forte/colhendo vida melhor/ sou parte/parte de um todo/membro do povo/eis quem sou/ sou gente/sem-terra/latino/camponês/com pressa/quebrando arames/ cercas/construindo barracos/roçando/plantando/cheirando o fruto/ partilhando/sou gente/gente do povo.

(93)

Oitava Arte

Afonso Guerreiro e Tereza Maestra

Luta e artes se misturam,

A mística da nossa história nos presenteia com desafios Se alguém pergunta “por que resistir?”

Respondo “porque não vencemos ainda”.

Para deixar de sofrer temos que lutar até a vitória! Que toda nossa dor se transforme em força, Que nossa vida seja dedicada à ARTE DE LUTAR.

Não temos escolha, façamos, então, assim: A arte da classe tra-balhadora.

O vermelho do nosso sangue é a tinta que pinta o quadro da nossa luta,

Dissolveremos as partes grossas com gotas do nosso suor Da nossa voz se ouvirá o grito dos cânticos,

entoado por vozes falhas, roucas de gritar com força suficiente para que o mundo ouça...

Até a vitória! Até a vitória! Até a vitória! O teatro será o nosso campo de batalhas, versado na arte da luta, teatro de guerrilha

Nos mais diversos campos de batalha da luta de classes. Que toquem os clarins,

Levantem as bandeiras, Escolas em formação, Levantes da cultura.

(94)

Tremam a batucada, Cantemos nossos hinos, Dancemos a liberdade. Nas barricadas e trincheiras, De pé, punhos erguidos, Para gritar nossa poesia,

Pintaremos nossos quadros de utopia.

Para esculpir o novo homem e a nova mulher, E fomentar a liberdade.

(95)
(96)

NOSSO PÉ DE POESIA

4

Se os mais humildes não nos compreendem será melhor jogar fora os poemas e ficarmos calados. O poeta diz: se meus versos são bons para meus amigos e enfurecem os meus inimigos então é que sou mesmo poeta e devo continuar cantando.

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(98)

Veneno e contra-veneno

Severiano Hermes Telles

Toneladas de veneno no nosso Brasil é jogado Boa parte deste produto chega aqui contrabandeado Pessoas morrem de câncer em um hospital lotado Até o leite materno vai pro filho envenenado O agrotóxico é coisa séria e ele nunca vem sozinho O avião de um fazendeiro, quando ele voa baixinho 30 por cento cai na lavoura, o resto vai pros vizinho Chega nas crianças da escola, mata abelha e passarinho Mas a pequena propriedade muita coisa nos ensina Cuida da mata nativa, corre a água cristalina A alimentação é saudável e cheia de vitamina

O MST nos dá um exemplo que a esperança não termina É o maior produtor de arroz orgânico da América Latina Quem produz e quem consome, vamos aumentar a parceria Aprovar leis mais severas, que nos dê mais garantias

As pessoas e a natureza convivendo em harmonia E teremos comida saudável em nossa mesa todo dia

(99)

Viúvas de Felisburgo

Ana Maria de Lima

I

Senhores Doutô da lei, Hoje eu vim desabafa Coisas que eu sei E num posso me cala. Sou viúva de Felisburgo

Viúva do Iraguiar, do Miguel, do Francisco, Do Juvenal e do Joaquim,

Tenho que conta

Dessa dor que dói em mim. Doutô, aquele sábado Num sai da minha memória Meus companheiro tombado Que ficaram na história. A gente oiava a terra Toda manchada

Era sangue e mais sangue E nóis num querditava. II

Meus minino, veno o pai Ali na terra tombado, Eles gritava: acorda pai Com os zoio tudo nublado. Me deu uma angústia Vê meus mininu iludido

(100)

Pensano que o pai tava vivo Mesmo com o corpo tudo ferido. Num deram um tiro só não Doutô Foram três, cinco, oito, treze Num queria só matá

Queriam acaba.

Eu abraçada com meus fio Parecia o fim do mundo

Fio seu pai foi carpir outras terras Bem longe de Felisburgo.

Fiquei tão perdida Que eu nem parecia eu Num sabia como dizer: Fio seu pai morreu. III

E era tanto sangue Doutô Que moio todo o chão No mais a dor

Profunda no coração. E o sô Adriano Chafik Com ar de vitória

(101)

Que deve ser cumprida Ainda mais quando vem, E tira na bala a vida. Só Deus dá a vida Só ele pode tirá Nóis vamo agora Mandá denunciá. IV

Mas gente, Doutô Nóis rezo,

Nóis de luto, lutô E nóis choro.

Um choro que não acaba Uma dor que a gente padece Um vazio que nada preenche E a justiça que num acontece. Quando pensei: nada mais tenho Para sofrer nessa vida

Nos chega uma Reintegração de Posse Para ser cumprida.

Pode Senhores da Lei? É muito sofrimento É muita injustiça

Isso não tem cabimento! O que nóis vem pedi Não é nenhum absurdo Cumpra a Lei:

(102)

V

O resto nóis vai tocando A dor, os fio sem pai... Pouco é nossa esperança

Mas planta é nossa única vingança. VI

Cadeia é pra bandido Seja ele major ou capitão O sô Adriano Chafik Tem que ir pra prisão.

SOMOS TODOS FELISBURGO Das Viúvas somos solidárias Pedimos aos Doutô

(103)

Movimento Sem Terra

André Carlos de Oliveira Rocha

Por onde andei, plantei

esperança e vida transformada; finquei a bandeira encarnada, anunciando a Reforma desejada. Por onde andei, ocupei

o latifúndio atrasado; cortei arame farpado,

reivindicando a Reforma do arado. Por onde andei, resisti

à força da bala arbitrária;

enfrentei jagunços e a Justiça reacionária, esperando a Reforma necessária.

Por onde andei, produzi alimento coletivo e são; colhi lavoura, fruto e pão, construindo a Reforma do chão. Por onde andei, espalhei

a rebeldia necessária;

organizei as classes camponesa e proletária, pra conquistar a Reforma Agrária.

(104)

Apocalipse Ambiental

Araci Maria dos Santos

Sobrevoei vastos cemitérios de arvores tomba-das, onde aves choram seus ninhos esmagados, onde bichos desolados nas tocas agonizam. Vida interrompida abre alas, a clorofila envenenada quer passar.

Mirei escombros fúnebres riachos do vale do aço. Voçorocas do tijuco, tumbas de nascentes, gan-grenada terra devastada, crateras engolindo mata e grão, aquíferos extintos no útero indefeso desse chão.

Naveguei águas paradas na parede de concreto armado, onde exausta a picareta esbarra, onde a historia do antigo vira lama, no espúrio lucro da barragem que tudo afoga em nome do progresso sem ordem da nação tudo afoga.

Mirei escombros fúnebres riachos, naveguei águas paradas na parede de concreto armado, sobrevoei cemitérios vastos de arvores tombadas,

(105)

La VIA

Araci Maria dos Santos

Eu vi as cores e as formas variadas

dos diversificados países no seu símbolo maior. Eu vi as cores das bandeiras do povo

enfeitar as praças campos e rodovias.

Eu vi o menino gritando, ouvi um coro ecoando na busca da dignidade.

Bandeira vermelha cobrando terra, agricultor cobrando casa, homem querendo justiça e pão.

Bandeira branca juventude rural e gente inundada que perdeu seu chão. Bandeira azul de estudante de luta que saiu do campus pro mutirão.

Bandeira lilás, mulheres que deixaram o escritório, o fogão e o roçado e marcham buscando transformação. Todos atrelaram as bandeiras

e amarraram a uma bandeira verde que não era do Brasil. A bandeira do Brasil é linda e nos representa em qualquer país, mas a nova bandeira representa o mundo.

Arrebanham organizações comprometidas com causas determinantes para mudanças benéficas na sociedade. Bandeiras em lutas juntadas na causa comum

de um outro mundo possível.

Onde o som do maracá e a força do bater do pé tenha respeito do branco quando o índio dança o toré, onde a palavra compa-nheiro não seja chavão nem só referencia a Che,

onde o resultado da ação mostra a força do querer.

Onde mulheres, homens e crianças fazem atos que determinam a garra do povo que carrega a bandeira que nos ensina,

(106)

Sonho de justiça

Edivaldo Souza Prates

Ao meu povo brasileir A verdade eu vou contar Do que aconteceu na cidade Lá no sul do Pará

Essa cidade é conhecida E todos já ouviram falar Pois ela é chamada Eldorados Carajás Na BR 150

Bem pertinho de lá Aconteceu um fato triste Mas precisamos lembrar O sol estava quente Posso garantir a voceis Era dezessete de abril E o ano noventa e seis Naquele dia a policia

(107)

21 pessoas mortas Não se sabe a razão Usaram armas potentes Além de foice e facão 69 feridos

Nessa grande tirania Por isso até hoje

Vivem em grande agonia Almir Gabriel e Paulo Cãmara Era os fulanos de tal

Foi eles que autorizaram o uso Da força policial

Essa tragédia pra justiça Está caindo em esquecimento Quase todos os culpados Não foi levado a julgamento 20 anos se passaram

E os movimentos só se une Eles estão pensando que este fato Vai ficar assim impune

Tanto sangue derramado Pra conquistar nossos direitos Iremos dizer para justiça Que lutar não é defeito Vamos todos juntos pra luta E esquecer isso jamais Viva o MST

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