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As proibições de prova e a prova digital: aproximação aos lugares-comuns de um instituto clássico em face de uma nova realidade

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Academic year: 2020

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Universidade do Minho

Escola de Direito

Catarina Rodrigues Santos Costa

outubro de 2017

As proibições de prova e a prova digital

– aproximação aos lugares-comuns de um

instituto clássico em face de uma

nova realidade

Catarina Rodrigues Sant

os Costa As proibições de pro va e a pro va digit al – apro ximação aos lugar es-comuns de um ins

tituto clássico em face de uma no

va realidade

UMinho|20

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Catarina Rodrigues Santos Costa

outubro de 2017

As proibições de prova e a prova digital

– aproximação aos lugares-comuns de um

instituto clássico em face de uma

nova realidade

Trabalho efetuado sob a orientação da

Professora Doutora Flávia Noversa Loureiro

Dissertação de Mestrado

Mestrado em Direito Judiciário

(direitos processuais e organização judiciária)

Universidade do Minho

Escola de Direito

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DECLARAÇÃO

Nome: Catarina Rodrigues Santos Costa

Endereço eletrónico: catarinarscosta@live.com.pt

Título da dissertação: As proibições de prova e a prova digital – aproximação aos lugares-comuns de um instituto clássico em face de uma nova realidade

Orientadora: Professora Doutora Flávia Noversa Loureiro Ano de conclusão: 2017

Designação do Mestrado: Direito Judiciário (direitos processuais e organização judiciária)

É AUTORIZADA A REPRODUÇÃO PARCIAL DESTA DISSERTAÇÃO APENAS PARA EFEITOS DE INVESTIGAÇÃO, MEDIANTE DECLARAÇÃO ESCRITA DO INTERESSADO, QUE A TAL SE COMPROMETE.

Universidade do Minho, ___/___/___

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Ao Didier, por quem sou quem sou. Aos meus tios, Bita e Zé, a quem dedico a minha mais sentida gratidão, por todo o incondicional apoio. Ao meu pai, de quem orgulhosamente herdo o que de mais genuíno há em mim. À minha mãe. Por ser gigante. À memória do meu avô.

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As proibições de prova e a prova digital

– aproximação aos lugares-comuns de um instituto

clássico em face de uma nova realidade

A presente dissertação, na sua essência despertada pela inquietação de que o Direito não acompanhou com diligência a enorme evolução tecnológica que se catapultou sobretudo a partir da década de 80 do século passado, inicia de algumas considerações sobre a essência do instituto das proibições de prova, destacando o regime próprio e autónomo que o caracteriza e o distingue das demais nulidades em processo penal. Chega, por meio desse encadeamento, à análise dos efeitos associados à violação de uma norma proibitiva de prova, nomeadamente no que se refere ao mecanismo do efeito-à-distância e aos limites que a jurisprudência internacional lhe foi apontando.

Versa, após, sobre o conceito de prova digital. Faz uso, como instrumento, de doutrina e jurisprudência sobre a matéria, e à luz das disposições da lei n.º 109/2009, de 15 de setembro, a Lei do Cibercrime, sublinha, sobretudo, as dificuldades próprias características da sua natureza sui generis. Estuda de seguida os tipos de prova digital, e sobre estes apresenta as considerações, essencialmente jurisprudenciais, que vão cabendo e que são próprias de cada tipo em particular.

Expõe, de seguida, o problema que nasce da justaposição entre o cariz constitucional do instituto das proibições de prova e a qualidade agressiva aos direitos fundamentais característica da prova digital, e debate da efetividade da tutela destes direitos em contraposição à natureza tão particular deste tipo de prova. Remete-se a considerações já feitas de capítulos anteriores, e finaliza com observações mais críticas que concetuais, oferecendo uma posição fundamentada sobre de que maneira se coadunam os lugares-comuns já estabelecidos em doutrina e jurisprudência de décadas sobre o instituto das proibições de prova com este novo domínio jurídico da prova digital.

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Exclusionary rules and digital evidence

– approach to the common ground between a classic

institute and a new reality

This dissertation, essentially triggered by the different development paces taken by Law and technology especially close to last century’s turn, considers the essence of the exclusionary rules, reinforcing the self and autonomous regimen that characterizes the figure among the remaining nullities within procedural criminal law. It assesses, then, those effects associated with the violation of the exclusionary rules, namely on its consideration to the fruit of the poisonous tree doctrine and the limitations opposed to this effect pointed out by the United States Supreme Court.

Afterwards, it focuses on the digital evidence concept. Making use, as auxiliary tools, of all doctrine and jurisprudence written subjects, and under the law 109/2009, September 15th, it aims to highlight the particular

difficulties put by its peculiar nature. Following, this essay explores the several types of digital evidence, considering its aspects and drilling down, mainly under a practical point of view, all its peculiarities.

Moving forward, stressing the problematic caused by the overlap between the exclusionary rules and its constitutional essence and the digital evidence aggressive quality in the face of fundamental rights, debating upon the effectiveness of law’s protection over these rights, in contraposition to the particular cornerstones of this kind of evidence. Addressing previous considerations’, it rests over the final deliberations, more critical than conceptual, offering a steady and solid perspective over the subject by accessing common ground between doctrine and jurisprudence of decades over exclusionary rules and this new legal domain, the digital evidence.

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Índice

Introdução ... 1

Capítulo I. As proibições de prova: abordagem à essência do instituto ... 5

1. Conceito e natureza jurídica ... 5

2. O enquadramento jurídico das proibições de prova ... 11

3. Tipos de proibição de prova ... 14

4. A autonomia técnica das proibições de prova ... 19

Capítulo II. O efeito-à-distância das provas proibidas e os seus limites ... 31

1. O efeito-à-distância das provas proibidas ... 31

2. Fruit of the poisonous tree doctrine ... 34

3. O fundamento normativo-constitucional do mecanismo do efeito-à-distância ... 37

4. Os limites do efeito-à-distância das provas proibidas ... 42

4.1. Independent source doctrine ... 45

4.2. Inevitable discovery limitation ... 50

4.3. Purged taint limitation ... 55

5. Posição adotada ... 61

Capítulo III. A prova digital ... 66

1. Notas introdutórias e enquadramento problemático ... 66

2. Conceito e natureza ... 71

3. Características e princípios ... 74

4. A Lei do Cibercrime ... 80

4.1. Evolução legislativa ... 81

4.2. As disposições processuais da Lei do Cibercrime ... 84

4.3. Articulação da Lei do Cibercrime com o C.P.P. e a lei n.º 32/2008, de 17 de junho ... 88

5. Dificuldades colocadas pela natureza da prova digital ... 101

6. A fragilidade e a fiabilidade da prova digital ... 105

Capítulo IV. Os tipos de prova digital ... 111

1. Prova digital como meio de prova e método de obtenção de prova ... 111

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3. Os tipos de prova digital ... 124

3.1. As interceções telefónicas e de comunicações ... 125

3.2. As mensagens de SMS e de correio eletrónico ... 133

3.3. O acesso ao conteúdo de telemóveis ... 135

3.4. As conversas telefónicas em alta voz ... 137

3.5. O endereço de IP ... 139

3.6. A localização celular ... 143

3.7. O localizador de GPS ... 147

3.8. As imagens de videovigilância ... 149

Capítulo V. A prova digital e os direitos, liberdades e garantias ... 154

1. O cariz constitucional das «proibições de prova digital» ... 156

2. A qualidade agressiva da prova digital aos direitos, liberdades e garantias ... 161

3. A efetividade da tutela aos direitos, liberdades e garantias em face da natureza sui generis da prova digital ... 165

Capítulo VI. Reflexão final: os lugares-comuns do instituto das proibições de prova e seus mecanismos em confronto com a nova problemática da prova digital ... 176 Bibliografia ... 199 Referências bibliográficas ... 199 Referências jurisprudenciais ... 209 Internacionais ... 209 Nacionais ... 209

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Lista de abreviaturas e siglas

ac. – acórdão

al., als. – alínea, alíneas art., arts. – artigo, artigos C.P. – Código Penal

C.P.P. – Código de Processo Penal

C.R.P. – Constituição da República Portuguesa C.T. – Código do Trabalho

cf. – conferir

FBI – Federal Bureau of Investigation i.e. – id est

n.º, ns.º – número, números p., pp. – página, páginas proc. – processo

S.T.J. – Supremo Tribunal de Justiça ss. – seguintes

SWGDE – Scientific Working Group on Digital Evidence

T.C. – Tribunal Constitucional

T.J.U.E. – Tribunal de Justiça da União Europeia T.R.C. – Tribunal da Relação de Coimbra

T.R.E. – Tribunal da Relação de Évora T.R.G. – Tribunal da Relação de Guimarães T.R.L. – Tribunal da Relação de Lisboa T.R.P. – Tribunal da Relação do Porto

v.g. – verbi gratia, por exemplo vs. – versus

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Introdução

Nos domínios mais complexos e, arriscamos, mais relevantes do direito processual penal encerra-se certamente a matéria da Prova. É-o porque seja precisamente dela que o tribunal faça uso para fundar a sua convicção de condenar ou absolver o arguido. Para o que nos interessa, a Prova é, na nossa área de formação, «a» questão.

Resultou-nos desde sempre que, deste nosso trabalho, esta matéria seria a pedra basilar: tocou-nos especialmente o alcance das consequências do entendimento que se tomasse sobre as várias problemáticas levantadas pela mesma. Resolvemos, por isso, aprofundar os nossos conhecimentos nesta parte.

O tema que concretamente nos propomos tratar resulta, na verdade, da conjugação de duas matérias de especialíssima importância no direito processual penal de hoje: o instituto das proibições de prova e a prova digital.

Designadamente, o instituto das proibições de prova guarda para si algumas das mais fortes controvérsias do processo penal português. E, nomeadamente, o mecanismo do efeito-à-distância das provas proibidas e os limites que lhe são apontados acendem discussões de manifesto reflexo prático no processo, do que é perfeitamente demonstrativa a jurisprudência na matéria.

E vamos além disto. De facto, aqui o que se pretende é que esta matéria do instituto das proibições de prova sirva, quase que meramente, de base introdutória para o segundo dos temas que compõem o objeto do presente estudo: a prova digital. Mas não é só assim; vejamos:

Não nos demoraremos em tecer considerações críticas sobre o instituto das proibições de prova e o mecanismo do efeito-à-distância das provas proibidas. Para tanto, teríamos que sobre eles nos debruçarmos exclusiva e extensivamente, e entendemos que, sobre isto, já muito se disse e se escreveu. Resolvemos, por isso, seguir outro caminho.

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Limitar-nos-emos, no fundo, a explaná-los conceptualmente, sublinhando o cariz constitucional de que comungam, para que daí possamos passar ao que realmente nos interessa: a prova digital e um estudo crítico sobre de que maneira naquele instituto, com especial enfoque na sua natureza jurídica e cariz constitucional, se enquadram os meios de obtenção de prova nascidos deste novo conceito de prova.

O problema que o instituto das proibições de prova representa resume-se, metaforicamente, a uma encruzilhada em que se põe o Estado de Direito: se de um lado se apresenta a necessidade de assegurar um processo penal efetivo, capaz na sua missão de perseguir a Justiça Penal, do outro se apresenta a necessidade de assegurar um processo penal justo, capaz na sua missão de respeitar e fazer respeitar os direitos, liberdades e garantias mais fundamentais do que ocupa o que nos atrevemos a dizer ser a figura central do processo penal, o acusado. O problema, explicava Gomes Canotilho, é um de ponderação de valores e balanceamento de bens jurídicos1.

É precisamente em produto da natureza fundamental dos direitos que o instituto existe para acautelar que entendeu o legislador constituinte reconhecer às proibições de prova dignidade constitucional2, conforme

estudaremos adiante. E neste sentido, não constitui a Justiça um valor absoluto, mas antes um constitucional: quando sejam os métodos de obtenção de prova constitucionalmente proibidos, em salvaguarda de valores que resultam maiores daquela ponderação de que acima falávamos, a prova obtida não pode, assim, ter-se, inquinada de vício de inconstitucionalidade. Não se pode admitir que a Justiça, valor constitucional, se possa querer perseguir a qualquer custo.

No seguimento daquele raciocínio, afigura-se-nos que o instituto das proibições de prova é, muito mais, mas fundamentalmente, um mecanismo disciplinador da atuação dos órgãos formais de controlo, obrigados a orientar a sua atividade de recolha de prova por ele.

1 CANOTILHO, J.J. Gomes, Direito Constitucional e Teoria da Constituição, 7ͣ Edição, Almedina, 2003, p. 1240.

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Ora, a constante metamorfose da sociedade atual causa sempre, como é natural, especial impacto nos domínios mais proeminentes de um país: a Justiça, como é o caso. O que implica dizer tanto é dizer da exigência de que estas transformações se façam acompanhar de leis atuais, capazes de dar resposta aos novos problemas que o avanço impõe. É, para o que aqui nos aproveita, o mesmo que dizer que o desenvolvimento tecnológico suscita problemáticas recém-nascidas que, para se a elas dar resposta, levantam a necessidade de instrumentos específicos.

É a prova digital. E a nós nos parece, este novo meio de prova, a juntar ao Cibercrime no rol das maiores preocupações do índice de criminalidade de um número crescente de países, representa um caminho que urge percorrer-se na busca de soluções legais.

E mais. É que a prova digital aparenta, palpita-nos mais que qualquer outra, deter um potencial acrescentado para ferir direitos, liberdades e garantias que o nosso ordenamento jurídico constitucionalmente consagra e cuja proteção ali acautela. Julgamos, ao fazer uso da prova digital como meio essencial de provar certa verdade, caminhamos na tão ténue fronteira com o risco imenso de ferir direitos fundamentais que a nossa Lei Fundamental encerra em si.

É incontornável, pensamos nós. E não obstante a prova digital possa ser fulcral para desvendar a verdade por trás de número crescente de crimes, é-o também que se advirta firmemente que a mesma pode consubstanciar um perigo quando os limites à sua obtenção não estejam claríssimos e não seja a mesma objeto de um controlo rigoroso, seja em razão da sua natureza, da forma como se apresenta ou do método de se apreender.

E se já tanto não nos interessam as escutas telefónicas, sobre o que se nos afigura já se ter dito a esmagadora maioria do que se pode dizer, interessar-nos-á sempre, pelo menos, desenhar o paralelismo entre o seu regime como consta e as proibições de prova que lhe estão associadas e os novos meios de prova digital, ao que se somará o correio eletrónico, o

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acesso a conteúdo de telemóveis, o endereço de IP, a localização de GPS, as imagens de videovigilância, e por aí vai.

Exploraremos, mas principalmente debateremos e procuraremos por elaborar uma crítica humilde mas informada e aprofundada, a procurar concluir quanto do que já se estabeleceu no que se refere às proibições de prova clássicas tem aplicação a estes novos meios de prova. Buscaremos por saber, atentos à natureza tão sui generis da prova digital, se, de que maneira e em que medida pode ainda garantir-se uma proteção efetiva dos direitos, liberdades e garantias do cidadão, nomeadamente na pessoa do acusado, tutela primeira do instituto das proibições de prova. E, finalmente, sob o raciocínio de que quaisquer normas constitucionais que permitam restrições aos direitos fundamentais devem sempre acautelar o núcleo essencial do dispositivo do art. 18.º da C.R.P., e a não admitir-se um efeito-dominó radical do efeito-à-distância da prova proibida, veremos se não se frustrará, ainda mais aqui em diante de uma prova com as características da digital, o espírito dos ns.º 1 e 8 do art. 32.º do mesmo diploma, que determinam a nulidade, com a devida interpretação, das provas secundárias obtidas mediante violação de direitos fundamentais.

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Capítulo I

As proibições de prova: abordagem à essência do

instituto

1. Conceito e natureza jurídica

De maneira a podermos compreender verdadeiramente a dogmática subjacente ao primeiro dos temas que compõem o objeto deste nosso trabalho – as “proibições de prova” –, e para bem nos inserirmos nos meandros do problema, julgamos imprescindível estudar o núcleo essencial que lhes inere.

Nascidas da labuta jurisprudencial norte-americana e da doutrina alemã, as proibições de prova, explica Paulo Dá Mesquita, surgem tanto com o fim central de regulação da descoberta da verdade material, como com a missão de afastar a prova a que se chegue por força da violação de imperativos constitucionais3: “firmou-se que as proibições de prova

decorrentes de actos violadores dos direitos fundamentais à privacidade consagrados pela Constituição (...) e as proibições de prova constitucionais constituem remédio para práticas incompatíveis com valores tutelados”, no contexto de que as proibições de prova surgiram por meio do famigerado acórdão norte-americano Mapp vs. Ohio, de 19614 . Germano Marques da

Silva acrescenta que “[e]mbora a sua formulação inicial se deva à jurisprudência norte-americana, a expressão proibição de prova parece ter sido utilizada pela primeira vez por Beling no princípio deste século, mas o tema é agora dos que mais entusiasma a doutrina, não só pelo significado que assume na estrutura processual em ordem à descoberta da verdade, mas também pelo que representa na protecção autónoma dos direitos

3 MESQUITA, Paulo Dá, A Prova do Crime e o que se disse antes do Julgamento – Estudo sobre a Prova no Processo

Penal Português, à Luz do Sistema Norte-Americano, Coimbra Editora, 2011, pp. 209, 218 e 270.

4 MESQUITA, Paulo Dá, A Prova do Crime e o que se disse antes do Julgamento – Estudo sobre a Prova no Processo

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fundamentais, enquanto valores, fins ou instituições do moderno Estado de Direito”5.

Conceptualmente e em termos muito exatos, as proibições de prova, “como uma das instituições mais marcantes do novo ordenamento processual, erigido a partir dos alicerces sediados directamente na Constituição de 1976”6, são um dos meios de que se serve a lei para

proteger os cidadãos contra ingerências abusivas nos seus direitos no quadro de uma investigação criminal7.

Paulo de Sousa Mendes oferecia: “A expressão ‘proibições de prova’ (Beweisverbote) foi inventada por Beling (...) [que] pretendia, através dessa designação, referir que existem limitações à descoberta da verdade material no processo penal, que o Estado se impõe a si mesmo, em parte como forma de respeitar a esfera da personalidade do cidadão investigado, noutra parte também como forma de preservar certos interesses públicos.”8.

Ora, a verdade material (já que a busca pela verdade não é, no nosso ordenamento, pelo menos, um valor absoluto) é aquela a que se chegue por meios lícitos, a verdade licitamente adquirida. Novamente neste ponto, pondera Paulo Dá Mesquita, “admite-se que a verdade material do processo seja distinta da realidade passada dos eventos do mundo exterior supostamente reconstruídos pelo processo, a verdade material obtida há-de, no entanto, corresponder a uma verdade processualmente válida”9, “a

reconstrução da verdade material do evento histórico pode ser condicionada por outros valores, a verdade processual pode, por boas

5 SILVA, Germano Marques da, Curso de Processo Penal II, 4ͣ Edição revista e actualizada, Verbo, 2008, p. 142.

6 ANDRADE, Manuel da Costa, Sobre as Proibições de Prova em Processo Penal, reimpressão, Coimbra Editora,

2006, p. 11.

7 SILVA, Germano Marques da, Curso de Processo Penal II, 4ͣ Edição revista e actualizada, Verbo, 2008, p. 138.

8 MENDES, Paulo de Sousa, Lições de Direito Processual Penal, Almedina, 2013, p. 177.

9 MESQUITA, Paulo Dá, A Prova do Crime e o que se disse antes do Julgamento – Estudo sobre a Prova no Processo

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razões no plano político, ser construída por meios que confinam o acesso à verdade material”10. São as proibições de prova.

O nosso próprio ordenamento jurídico, na impossibilidade de ficar indiferente ao advento dos mais diversos estudos e decisões germânicos e norte-americanos na matéria, consagrou, na C.R.P., art. 32.º, no seu n.º 8, “São nulas as provas obtidas mediante tortura, coação, ofensa da integridade física ou moral da pessoa, abusiva intromissão na vida privada, no domicílio, na correspondência ou nas telecomunicações”. Como sublinha, com propriedade, Paulo Dá Mesquita, há, entre nós, uma grande margem de influência do direito comparado na conceção do instituto das proibições de prova11.

No que se repara é que, em expressão sobretudo das relações de interpenetração que medeiam entre a Constituição e o processo penal, o legislador constituinte não se limitou a propor os valores e definir as balizas a que deveria depois obedecer a configuração do processo penal português, não. Pelo contrário, em vez de referenciar o horizonte político-criminal e axiológico do processo penal, chamou antes a si a conformação normativa e direta dos seus aspetos mais decisivos. Foi assim que, naquele dispositivo constitucional do n.º 8 do art. 32.º da C.R.P., “deu expressão positiva e explícita ao conceito e ao regime das proibições de prova”12.

Incluem, sob o ponto de vista constitucional como depois à luz da legislação ordinária na matéria, meios de prova e métodos de obtenção de prova, por meio a alçar todo e qualquer instrumento utilizado com o

10 MESQUITA, Paulo Dá, A Prova do Crime e o que se disse antes do Julgamento – Estudo sobre a Prova no Processo

Penal Português, à Luz do Sistema Norte-Americano, Coimbra Editora, 2011, p. 264. Acrescenta, no mesmo

sentido, SILVA, Germano Marques da, Curso de Processo Penal II, 4ͣ Edição revista e actualizada, Verbo, 2008, p. 138: “É manifesto que com a proibição de prova se pode sacrificar a verdade, já que a prova proibida, seja qual for a causa da proibição, pode ser de extrema relevância para a reconstituição do facto histórico, pode mesmo ser a única. Um facto pode ter de ser julgado como não provado simplesmente porque o meio que o provaria não pode ser utilizado no processo, porque é um meio de prova proibido e, por isso, não admissível para formar a convicção do julgador.”.

11 MESQUITA, Paulo Dá, A Prova do Crime e o que se disse antes do Julgamento – Estudo sobre a Prova no Processo

Penal Português, à Luz do Sistema Norte-Americano, Coimbra Editora, 2011, p. 270.

12 ANDRADE, Manuel da Costa, Sobre as Proibições de Prova em Processo Penal, reimpressão, Coimbra Editora,

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objetivo de provar determinado facto juridicamente relevante. À leitura dos dispositivos contidos no art. 126.º do C.P.P., que mais não são que um afloramento dos art. 32.º, n.º 8, e 34.º da C.R.P., resulta que àquelas provas ou às provas obtidas por aqueles meios não se pode atender para provar factos que se investiguem em processo penal13.

A base legal das proibições de prova estabelece-se, assim, naquele normativo constitucional. Tratam-se, na realidade, de provas obtidas em violação de direitos constitucionalmente garantidos e relativamente aos quais a Constituição estabelece verdadeiras normas processuais que se obriga que sejam respeitadas. Deste respeito imposto resulta, por um lado, que a discricionariedade do legislador ordinário em produzir leis que excecionalmente incidam sobre aqueles bens constitucionalmente tutelados é muito circunscrita e, por outro, que as provas obtidas mediante modalidades desrespeitosas das regras produzidas pela legislação ordinária em observância da Lei Fundamental para tutela dos direitos constitucionalmente protegidos se deverão considerar diretamente violadoras da Constituição14. É o sumo da natureza jurídico-constitucional

do instituto das proibições de prova.

Para além deste preceito do n.º 8 do art. 32.º, a C.R.P. oferece ainda um número significativo de dispositivos de valência direta para a doutrina e para a praxis das proibições de prova. Ressaltam, desde logo, a tutela da dignidade da pessoa humana do art. 1.º e da integridade moral do art. 25.º, “matriz material e última do direito das proibições de prova”15.

Dito isto, diremos por palavras nossas, se podemos, com apoio manifesto nos ensinamentos de Manuel da Costa Andrade, que as proibições de prova, de facto, mais não representarão que meios processuais, recebidos da Constituição na lei processual penal e ali

13 ALBUQUERQUE, Paulo Pinto de, Comentário do Código de Processo Penal à luz da Constituição da República e da

Convenção Europeia dos Direitos do Homem, 4ͣ Edição actualizada, Universidade Católica Editora, 2011, pp. 334 e

ss..

14 SILVA, Germano Marques da, Curso de Processo Penal II, 4ͣ Edição revista e actualizada, Verbo, 2008, p. 139.

15 ANDRADE, Manuel da Costa, Sobre as Proibições de Prova em Processo Penal, reimpressão, Coimbra Editora,

2006, pp. 13 e 14. No mesmo sentido, CANOTILHO, J.J. Gomes; MOREIRA, Vital, CRP Constituição da República

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desenvolvidos, de imposição de tutela de direitos materiais que se sobrelevam aos interesses públicos de perseguição penal, e que sendo estabelecidos por lei para proteção de certos direitos ou interesses fundamentais da nossa civilização – mormente os do cidadão na figura do acusado em processo penal – significam, como um todo, um limite à descoberta da verdade material16.

A norma constitucional do n.º 8 do art. 32.º da C.R.P. procura assim controlar, por seu próprio meio, toda a atividade investigatória, desestimulando a prática de atividades probatórias contrárias à lei e assegurando os direitos e garantias fundamentais de todo o indivíduo. Porque a busca da verdade não se pode considerar como um valor absoluto, válida por meio do uso de quaisquer métodos, mas tão-só dos legalmente admissíveis. Afirma-se, por isso, que as proibições de prova são, no âmago, verdadeiros limites à descoberta da verdade material17.

Por conceito, explica Germano Marques da Silva, “as provas proibidas não podem ter efeitos no processo”. Dizer isto é dizer que, se na obtenção de determinado meio de prova se violam regras de proibição de prova, na forma de violação de direitos dos cidadãos, às provas que por esse meio se obtenham não se pode atender no processo, porque são proibidas18.

No ordenamento jurídico nacional, o vetor de proteção dos direitos fundamentais recebeu-se no texto da Constituição de 1976 por meio da integração dos preceitos da Declaração Universal dos Direitos do Homem de 1948 e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem; consequentemente, explica Dá Mesquita, o “enfoque na dignidade humana (é) conformador do núcleo central das provas proibidas que não podem ser utilizadas em Portugal”19.

16 Por todos, ANDRADE, Manuel da Costa, Sobre as Proibições de Prova em Processo Penal, reimpressão, Coimbra

Editora, 2006, p. 188.

17 Código de Processo Penal – Comentários e notas práticas, Magistrados do Ministério Público do Distrito Judicial

do Porto, Coimbra Editora, 2009, pp. 322 e ss..

18 SILVA, Germano Marques da, Curso de Processo Penal II, 4ͣ Edição revista e actualizada, Verbo, 2008, p. 138.

19 MESQUITA, Paulo Dá, A Prova do Crime e o que se disse antes do Julgamento – Estudo sobre a Prova no Processo

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Já em Fevereiro de 1974, Jorge de Figueiredo Dias citava Henkel e explicava o direito processual penal como verdadeiro “direito constitucional aplicado”20. E numa dupla dimensão, aliás, continua: por um

lado, a derivada de os fundamentos do direito processual enformarem os alicerces constitucionais do Estado, e, por outro, a de a concreta regulamentação dos problemas processuais penais ser conformada jurídico-constitucionalmente21.

Ainda Figueiredo Dias, quanto à prova, ensinava que “o próprio pensamento filosófico mais recente veio mostrar que toda a verdade autêntica passa pela liberdade da pessoa, pelo que a sua obtenção à custa da dignidade do homem é impensável. E é bom que isto se acentue, para que se não ceda à tentação de santificar a violação de proibições de prova em atenção ao fim da descoberta de uma (pretensa) verdade material”22.

Mesmo Jorge Miranda e Rui Medeiros, precisamente naquele sentido, acrescentam: não se trata a realização da justiça do caso de um valor absoluto, mas antes de um constitucional, que se não pode querer perseguir a qualquer custo, pelo que quando sejam os métodos de obtenção de prova proibidos pela Constituição, para salvaguarda de outros valores, a prova por esse meio obtida não pode ser utilizada, em circunstância alguma, porque fique “radicalmente” inquinada do vício de inconstitucionalidade, e não pode tolerar-se que a Justiça seja prosseguida por esses meios23. Estamos perante verdadeiros limites impostos à

descoberta da verdade material, ancorados ao princípio fundamental do Estado de Direito democrático do respeito pela dignidade humana24.

20 ANTUNES, Maria João, “Direito processual penal – “direito constitucional aplicado””, in Que Futuro Para o

Direito Processual Penal? – Simpósio em homenagem a Jorge de Figueiredo Dias, por ocasião dos 20 anos do Código de Processo Penal Português, Coimbra Editora, 2009, p. 745.

21 DIAS, Jorge de Figueiredo, Clássicos Jurídicos – Direito Processual Penal, 1ͣ Edição, 1974, reimpressão, Coimbra

Editora, 2004, pp. 74 a 80.

22 DIAS, Jorge de Figueiredo, Clássicos Jurídicos – Direito Processual Penal, 1ͣ Edição, 1974, reimpressão, Coimbra

Editora, 2004, p. 194.

23 MIRANDA, Jorge; MEDEIROS, Rui, Constituição Portuguesa Anotada, Tomo I, 2ͣ Edição, revista, atualizada e

ampliada, Coimbra Editora, 2010, pp. 737 e 738.

24 Cf. arts. 1.º e 2.º da C.R.P., no sentido do exposto em CANOTILHO, J.J. Gomes; MOREIRA, Vital, CRP Constituição

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Gostamos particularmente das palavras de João Conde Correia, quando diz que “[a]s proibições de prova são regras essenciais à caracterização do processo penal de um Estado de direito e é como tal que devem ser tratadas. Não se trata de simples caprichos do legislador ou de excentricidades da doutrina, mas de prescrições fundamentais, que devem ser, religiosamente, observadas no dia a dia dos nossos tribunais. Como referiu (...) WINFRIED HASSEMER, os problemas do processo penal de um Estado de direito estão, normalmente, não na lex lata, mas na forma como o Estado, de facto, trata os cidadãos suspeitos da prática de um crime.”25.

Numa palavra, da «Constituição Criminal» resulta, de facto, uma verdadeira limitação operativa à atividade dos órgãos formais de controlo, de maneira a que, por meio da mesma, se possam proteger os mais elementares direitos reconhecidos ao cidadão e se operem, em resultado, reais limites à descoberta da verdade material: é o produto da consagração do instituto das proibições de prova na Lei Fundamental.

2. O enquadramento jurídico das proibições de prova

Posto que está que, produto da natureza fundamental das proibições de prova (ou, por outra, produto da natureza fundamental dos bens jurídicos que o instituto das proibições de prova existe para acautelar), entendeu o legislador constituinte reconhecer-lhe dignidade constitucional, deixou este, ainda assim, ao legislador ordinário, por meio dos amplíssimos termos da letra da norma constitucional, grande margem normativa26.

mesmo sentido, CORREIA, João Conde, A distinção entre prova proibida por violação dos direitos fundamentais e

prova nula numa perspectiva essencialmente jurisprudencial, Revista do CEJ, 1.º Semestre 2006, Número 4 –

Número especial, p. 202.

25 CORREIA, João Conde, A distinção entre prova proibida por violação dos direitos fundamentais e prova nula numa

perspectiva essencialmente jurisprudencial, Revista do CEJ, 1.º Semestre 2006, Número 4 – Número especial, p.

202.

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Assim, ao nível infraconstitucional, o legislador transpôs a regra do art. 32.º da C.R.P. para o art. 126.º do C.P.P., mas mesmo antes desta estabeleceu o preceito do art. 118.º deste último, onde consagra o regime, nas palavras de Paulo Pinto de Albuquerque, do “princípio da legalidade das nulidades”27 (cf. n.º 3 do dispositivo legal).

Interessa-nos o n.º 3 deste art. 118.º do C.P.P., onde se percebe que o legislador almejou estabelecer uma fronteira entre as nulidades processuais (e irregularidades) e as proibições de prova. No entendimento de Manuel Costa de Andrade e da dominante doutrina na matéria, preside a esta distinção a compreensão das proibições de prova como garantia e tutela de bens distintos dos que subjazem às demais nulidades processuais, resposta a vícios estritamente formais, de procura da verdade e perseguição penal28. Consagrou, por isso, expressamente distinto do

regime das nulidades, um tratamento autónomo às proibições de prova, no seguimento dos ensinamentos de Costa de Andrade, de cariz distintamente material29.

Vejamos: ao longo de todo o texto do C.P.P., na consagração de normas genéricas sobre proibições de prova, encontramos proibições de meios de prova por toda a extensão do diploma30, além do dispositivo do

art. 126.º – de proibições de métodos de obtenção de prova –, e dentro do qual cabem as proibições absolutas (dos ns.º 1 e 2) e as relativas (do n.º 3).

É Germano Marques da Silva quem nos ilumina e ajuda a compreender: se a disposição do art. 125.º do C.P.P., sob a epígrafe “Legalidade da prova”, se afigura simples, tem o que se lhe diga, só de maneira a que se compreenda o resto. A regra, aparentemente humilde, o que pressupõe, na realidade, é que existam ou possam existir meios de

27 ALBUQUERQUE, Paulo Pinto de, Comentário do Código de Processo Penal à luz da Constituição da República e da

Convenção Europeia dos Direitos do Homem, 4ͣ Edição actualizada, Universidade Católica Editora, 2011, p. 313.

28 ANDRADE, Manuel da Costa, Sobre as Proibições de Prova em Processo Penal, reimpressão, Coimbra Editora,

2006, p. 196.

29 No mesmo sentido, MATA-MOUROS, Maria de Fátima, Juiz das Liberdades – Desconstrução de um Mito do

Processo Penal, Almedina, 2011, p. 294.

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prova proibidos, e proíbe, precisamente, que esses meios de prova se utilizem no processo penal; a norma consagra, entre nós, a “liberdade da prova”, de maneira que serão admissíveis para a prova de quaisquer factos todos os meios de prova admitidos em Direito contanto que não sejam proibidos por lei31. Na liberdade de prova cabem, portanto, por dedução

lógica, não só os meios de prova tipificados na lei, em regra de numerus

clausus (“sistema de prova tarifada” ou “sistema de prova legal”)32, como

caberão também todos os que não forem proibidos, portanto, os meios de prova atípicos.

E isto permite compreender melhor o que se segue. Se pode parecer, numa primeira leitura, que a regra impressa no art. 118.º do C.P.P. carece de relevância prática, a verdade é que representa “a pedra angular de toda a arquitectura da invalidade processual penal”33. De facto,

num primeiro momento, estabelece-se o sistema de nulidades taxativas (cf. art. 118.º, n.º 1, do C.P.P.), para, de seguida, o legislador consagrar o princípio da irregularidade de todos os demais atos ilegais. O que se denota, na realidade, é uma vontade expressa da lei em separar o regime das nulidades daquele das irregularidades, clarificando-se que, se “a lei não cominar a nulidade, o acto é irregular” (cf. art. 118.º, n.º 2, do C.P.P.).

E, por último, por meio do n.º 3 do mesmo art. 118.º, traça-se a fronteira entre as nulidades e as proibições de prova, plasmando-se na letra da lei que “[a]s disposições do presente título não prejudicam as normas deste Código relativas a proibições de prova”. Voltando às palavras de Costa Andrade, parece que “à semelhança do direito alemão, também o direito processual penal português privilegia a dimensão material substantiva das proibições de prova (...) como instrumentos de garantia e tutela de valores ou bens jurídicos distintos – e contrapostos – dos

31 SILVA, Germano Marques da, Curso de Processo Penal II, 4ͣ Edição revista e actualizada, Verbo, 2008, pp. 136 e

137.

32 SILVA, Germano Marques da, Curso de Processo Penal II, 4ͣ Edição revista e actualizada, Verbo, 2008, p. 137.

33 CORREIA, João Conde, A distinção entre prova proibida por violação dos direitos fundamentais e prova nula numa

perspectiva essencialmente jurisprudencial, Revista do CEJ, 1.º Semestre 2006, Número 4 – Número especial, p.

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representados pela procura da verdade e pela perseguição penal”34.

Concretamente, o legislador consagrou, assim, o princípio do tratamento autónomo das proibições de prova, afastando-o, em consequência, do regime jurídico das nulidades processuais35.

A questão é que, se é verdade que o n.º 3 do art. 118.º do C.P.P. afirma a distinção entre o regime geral das nulidades em processo penal e o regime das proibições de prova em particular, também é verdade que a verificação de uma proibição de prova, por oposição a uma nulidade geral, nem sempre é evidente, e o que se dá é que, com mais frequência do que seria desejável, se faz uso da terminação “nula” a referir-se à prova obtida por meio da violação de uma norma de proibição de prova, sem que com tanto se queira subtrair a mesma do seu regime próprio, o das proibições de prova36.

3. Tipos de proibição de prova

Já para não nos estendermos sobre a destrinça entre “proibições de prova” e “regras de produção de prova”, porque estaríamos a desviar-nos do foco deste nosso trabalho, limitamo-nos a definir-lhes os conceitos, para daí avançarmos.

De facto, as proibições de prova, na doutrina de Gossel trazida a nós por Maria de Fátima Mata-Mouros, “representam meios processuais de

34 ANDRADE, Manuel da Costa, Sobre as Proibições de Prova em Processo Penal, reimpressão, Coimbra Editora,

2006, p. 196.

35 ANDRADE, Manuel da Costa, Sobre as Proibições de Prova em Processo Penal, reimpressão, Coimbra Editora,

2006, p. 194. No mesmo sentido, ALBUQUERQUE, Paulo Pinto de, Comentário do Código de Processo Penal à luz

da Constituição da República e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, 4ͣ Edição actualizada, Universidade

Católica Editora, 2011, pp. 313 e 314, e SILVA, Germano Marques da, Curso de Processo Penal II, 4ͣ Edição revista e actualizada, Verbo, 2008, pp. 85 e ss., 90 e ss. e 143 e 144 e ss..

36 CORREIA, João Conde, A distinção entre prova proibida por violação dos direitos fundamentais e prova nula numa

perspectiva essencialmente jurisprudencial, Revista do CEJ, 1.º Semestre 2006, Número 4 – Número especial, p.

176, designadamente: “A identificação prática dos casos de prova proibida, subtraídos ao regime geral das nulidades, não tem sido tarefa fácil. Uma regulamentação, às vezes, algo confusa e deficiente e, sobretudo, uma interpretação incorreta, conduzem, frequentemente, a um resultado final deplorável: a indesejável e, mesmo que porventura bem intencionada, injustificável violação dos mais elementares direitos, liberdades e garantias individuais.”.

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imposição da tutela de direitos materiais, constituindo limites à descoberta da verdade (que têm em si subjacentes o fim – último – de tutela de um direito)”37; já as regras de produção de prova, de sua parte, procuram

meramente disciplinar o procedimento exterior da obtenção de prova, em meios e métodos, certo que a sua violação não implica a consequência de proibição da sua valoração, a sua inutilização, como seria consequência da violação de norma de proibição de prova38. Tudo se reduz, na verdade, ao

facto de uma e outra prosseguirem finalidades, mais que distintas, contrapostas, conforme entre nós explica Manuel da Costa Andrade: “as

regras de produção de prova são «ordenações do processo que devem

possibilitar e assegurar a realização da prova. Elas visam dirigir o curso da obtenção da prova sem excluir a prova. As regras de produção de prova têm assim uma tendência oposta à das proibições de prova. Do que aqui se trata não é de estabelecer limites à prova como sucede com as proibições de prova, mas apenas de disciplinar os processos e modos como a prova deve regularmente ser levada a cabo»”39.

Assim, ao que nos aproveita novamente, dentro das proibições de prova, por oposição às regras de produção de prova, encerram-se duas terminologias de conceito distinto: por um lado, as “proibições de produção de prova” e, por outro, as “proibições de valoração de prova”40.

Ora, as proibições de produção de prova, como a própria designação aponta, referem-se às interdições de gerar, de produzir, certa prova que a lei proíbe, enquanto as proibições de valoração de prova traduzem-se na

37 MATA-MOUROS, Maria de Fátima, Juiz das Liberdades – Desconstrução de um Mito do Processo Penal, Almedina,

2011, p. 291.

38 ANDRADE, Manuel da Costa, Sobre as Proibições de Prova em Processo Penal, reimpressão, Coimbra Editora,

2006, p. 84. No mesmo sentido, DIAS, Jorge de Figueiredo, Clássicos Jurídicos – Direito Processual Penal, 1ͣ Edição, 1974, reimpressão, Coimbra Editora, 2004, p. 446, mormente “[as regras de produção de prova são] meras prescrições ordenativas de produção de prova, cuja violação não poderia acarretar a proibição de valorar como prova (...) mas unicamente a eventual responsabilidade (disciplinar, interna) do seu autor.”.

39 ANDRADE, Manuel da Costa, Sobre as Proibições de Prova em Processo Penal, reimpressão, Coimbra Editora,

2006, p. 85.

40 ANDRADE, Manuel da Costa, Sobre as Proibições de Prova em Processo Penal, reimpressão, Coimbra Editora,

2006, pp. 89 e 90. No mesmo sentido, SILVA, Germano Marques da, Curso de Processo Penal II, 4ͣ Edição revista e actualizada, Verbo, 2008, p. 142.

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impossibilidade legal de considerar, de valorar, determinada prova já carreada para o processo, afastando a possibilidade de que aquela prova sirva para fundamentar a decisão41.

Já dentro da terminologia de proibição de produção de prova, o nosso C.P.P. distingue as “proibições de tema de prova” (ou “temas de prova proibidos”), as “proibições de métodos de prova” (ou “métodos proibidos de prova”), e as “proibições de meios de prova” (ou “meios de prova proibidos”)42.

Designadamente, são os temas de prova proibidos aqueles que a lei não permite, sequer, que sejam investigados (por exemplo, o respeitante ao Segredo de Estado43); os meios de prova proibidos, por outra, serão os que

a lei não permite que se apreciem, porquanto lhes falte um qualquer requisito legal (como seriam, por exemplo, as declarações de um co-arguido sobre o outro, quando o primeiro se recuse responder às perguntas que lhe forem postas sobre os fatos que lhe são imputados44); e

os métodos proibidos de prova, como previstos no art. 126.º no C.P.P., como sejam verdadeiras limitações à descoberta da verdade material, e que carregam como efeito a nulidade do ato proibido, pelo que tudo se há de passar como se a prova, que é proibida, sequer existisse45. Resulta

claro, contudo, parece-nos, que as provas proibidas como plasmadas neste dispositivo legal encerram tanto o conceito de proibição de produção da prova como de proibição da sua valoração, se confrontada a doutrina que vimos estudando com os ns.º 1, 2 e 3 a contrario sensu, do art. 126.º do C.P.P..

41 ANDRADE, Manuel da Costa, Sobre as Proibições de Prova em Processo Penal, reimpressão, Coimbra Editora,

2006, pp. 89 e 90, como SILVA, Germano Marques da, Curso de Processo Penal II, 4ͣ Edição revista e actualizada, Verbo, 2008, p. 142.

42 JESUS, Francisco Marcolino de, Os Meios de Obtenção de Prova em Processo Penal, 2ͣ Edição, revista,

actualizada e ampliada, Almedina, 2015, pp. 91 a 108.

43 V.g. art. 137.º do C.P.P..

44 V.g. art. 345.º, n.º 4, do C.P.P..

45 JESUS, Francisco Marcolino de, Os Meios de Obtenção de Prova em Processo Penal, 2ͣ Edição, revista,

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Pois que, muito em particular quanto aos métodos proibidos de prova, porquanto sejam os que mais nos importam neste nosso estudo, aproveitamos o desenho esquemático oferecido por Manuel Simas Santos e Manuel Leal-Henriques, para estudarmos aqui as várias situações hipotéticas de métodos proibidos de prova previstas no dispositivo legal. Os métodos proibidos de prova podem ser, designadamente, “absolutos” ou “relativos”, conforme caibam, respetivamente, na previsão legal dos ns.º 1 e 2 do art. 126.º do C.P.P., ou na previsão legal do n.º 3 do mesmo artigo. Assim, sê-lo-ão absolutos porque sejam proibidos mesmo que se aproveite do consentimento do sujeito, já que atentam contra direitos não estão na esfera de disponibilidade do mesmo, i.e., indisponíveis; e sê-lo-ão relativos se forem proibidos, mas apenas na falta do consentimento do titular do direito contra o qual se atenta com a prova, já que em causa estarão direitos na esfera da disponibilidade do mesmo, ou seja, disponíveis46.

Ora, da própria letra da lei resulta que no elenco dos métodos proibidos de prova absolutos cabem as provas obtidas mediante tortura, coação e ofensa à integridade física e moral da pessoa47; já dentro do

elenco dos métodos proibidos de prova relativos cabem as provas obtidas mediante intromissão na vida privada, no domicílio, na correspondência e nas telecomunicações48.

Em nota final quanto às proibições de métodos de prova, ou “métodos proibidos de prova” na designação de Francisco Marcolino de Jesus49, observam Simas Santos e Leal-Henriques, o elenco é francamente

dotado de pormenor, embora não exaustivo, e a consequência é a expressamente prevista na letra do dispositivo legal, a da impossibilidade de utilização das provas obtidas por meio da violação destas proibições,

46 SANTOS, Manuel Simas; LEAL-HENRIQUES, Manuel, Código de Processo Penal Anotado – do 1º ao 240º artigos,

3ͣ Edição, Editora Rei dos Livros, 2008, pp. 831 e 832. No mesmo sentido, CORREIA, João Conde, A distinção

entre prova proibida por violação dos direitos fundamentais e prova nula numa perspectiva essencialmente jurisprudencial, Revista do CEJ, 1.º Semestre 2006, Número 4 – Número especial, p. 189.

47 V.g. art. 126.º, ns.º 1 e 2, do C.P.P..

48 V.g. art. 126.º, n.º 3, do C.P.P..

49 JESUS, Francisco Marcolino de, Os Meios de Obtenção de Prova em Processo Penal, 2ͣ Edição, revista,

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porque são “nulas”50. E no seguimento reparam os autores que, de facto,

quanto aos métodos proibidos de prova absolutos é assim como consta da lei, sem mais; mas já no que vem a referir-se aos métodos proibidos de prova relativos, se, evidentemente, é verdade que as provas obtidas por meio de violação de proibição de prova seguem aquele regime, salvo se a lei previr a sua legalidade ou, claramente, se o titular consentir com o sopesar da prova para efeitos de formar a convicção do tribunal em condenar ou absolver, caso em que a prova é perfeitamente legal, esta circunstância, por si só, pode representar e representa uma infinidade de nuances à vida prática do julgador51.

Ainda dentro da terminologia das proibições de produção de prova, Kai Ambos e Marcellus Lima fazem uma observação interessante, acrescentando ao elenco já explanado as “proibições relativas de prova”, nas palavras dos autores, “aquelas que (...) limitam a obtenção de provas, no sentido de que somente algumas e determinadas pessoas estão facultadas a produzir, adquirir ou realizar certa produção probatória, estabelecendo-se, em consequência, uma proibição em relação a qualquer outro sujeito”52. Serão estas aquelas provas cuja ordem e obtenção só

pode ter-se quando executada por certa e determinada pessoa, em observância de determinado ritualismo; o que estará em causa, neste caso, será a legitimidade ou ilegitimidade do ordenante ou autor da prova53. É,

por exemplo, o caso da apreensão de correspondência54 e das escutas

50 SANTOS, Manuel Simas; LEAL-HENRIQUES, Manuel, Código de Processo Penal Anotado – do 1º ao 240º artigos,

3ͣ Edição, Editora Rei dos Livros, 2008, p. 832. Relativamente à observação sobre a não taxatividade do elenco apresentado pelo art. 126.º do C.P.P., e no mesmo sentido, as considerações de ANDRADE, Manuel da Costa,

Sobre as Proibições de Prova em Processo Penal, reimpressão, Coimbra Editora, 2006, p. 216.

51 SANTOS, Manuel Simas; LEAL-HENRIQUES, Manuel, Código de Processo Penal Anotado – do 1º ao 240º artigos,

3ͣ Edição, Editora Rei dos Livros, 2008, pp. 831 a 839.

52 AMBOS, Kai; LIMA, Marcellus Polastri, O processo acusatório e a vedação probatória – perante as realidades alemã

e brasileira – com a perspectiva brasileira já de acordo com a reforma processual de 2008 – leis 11.689, 11.690 e 11.719, Livraria do Advogado Editora, 2009, p. 81. No mesmo sentido, SILVA, Germano Marques da, Curso de Processo Penal II, 4ͣ Edição revista e actualizada, Verbo, 2008, p. 143.

53 SILVA, Germano Marques da, Curso de Processo Penal II, 4ͣ Edição revista e actualizada, Verbo, 2008, p. 143.

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telefónicas, na medida em que só podem ser ordenadas ou autorizadas pelo juiz de instrução55.

Finalmente, quanto às proibições de valoração de prova, podem estas ser “dependentes” ou “independentes”, conforme a proibição se funde na violação de uma proibição de produção de prova, ou, não se baseando numa proibição de produção de prova, a proibição de valoração derive diretamente de preceitos constitucionais, respetivamente, certo que, num caso como no outro, não podem contribuir para a formação da convicção do julgador em condenar ou absolver o arguido56.

4. A autonomia técnica das proibições de prova

De facto, de tudo quanto temos exposto, resulta muito claro para nós haver autonomia entre o regime das nulidades gerais em processo penal e aquele que temos vindo a estudar das proibições de prova. Entendemos a intenção do legislador de que não fossem a mesma coisa, desde logo porque, à partida, sequer nascem do mesmo fundamento. O que já não resulta tão claro, contudo, e é preciso então estudá-lo, é a fronteira exata que separa ambos os regimes. Se é verdade, não questionamos, serem dois regimes normativos distintos, facilmente se constata, apesar disso, que o legislador (constituinte e ordinário) não delimitou com precisão a linha entre o que se entende por nulidade processual (geral) ou proibição de prova (prova nula).

Conforme já estudamos, o art. 32.º da C.R.P., no seu n.º 8, com transposição para a legislação ordinária no n.º 1 do art. 126.º do C.P.P., determina (determinam ambos) serem “nulas, não podendo ser utilizadas, as provas obtidas mediante (...), em geral, ofensa da integridade física ou moral das pessoas”. Ora, claro que não se cogita que o que o legislador

55 V.g. art. 187.º, n.º 1, do C.P.P..

56 ANDRADE, Manuel da Costa, Sobre as Proibições de Prova em Processo Penal, reimpressão, Coimbra Editora,

2006, pp. 89 e 90. No mesmo sentido, SILVA, Germano Marques da, Curso de Processo Penal II, 4ͣ Edição revista e actualizada, Verbo, 2008, p. 142.

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tenha intencionado ao fazer uso da expressão “nulas” tenha sido, de maneira nenhuma, reconduzir-se simplesmente ao regime das nulidades gerais em processo penal, mas antes, outrossim, ao regime particular das proibições de prova. O que se discute aqui é, por outra, que o mero uso da expressão “nulas” potencia o escalar de conflitos e divergências doutrinais e jurisprudenciais já nascidos da dificuldade de demarcação do regime das proibições de prova do das nulidades processuais.

Na corrente do largo consenso da doutrina na matéria57, o que

verdadeiramente permite estabelecer, sem margem para dúvidas, a intenção do legislador em demarcar um regime do outro é o dispositivo do n.º 3 do art. 118.º do C.P.P.: “[a]s disposições do presente título [Título V – “Das nulidades”] não prejudicam as normas deste Código relativas a proibições de prova.”. Neste sentido, Germano Marques da Silva explica que “o regime das proibições de prova não há-de reconduzir-se pura e simplesmente ao regime das nulidades, pois se assim fora seria dificilmente explicável o n.º 3 do art. 118.º”58.

Efetivamente, face ao uso da terminologia “nulas” nos dispositivos dos n.º 8 do art. 32.º da C.R.P. e n.º 1 do art. 126.º do C.P.P., já Manuel da Costa Andrade notava que “a autonomia das proibições de prova volta a ganhar vulto no regime normativo que o legislador português lhes adscreve. O que daqui sobremodo releva é a imbricação íntima entre as proibições de prova e o regime das nulidades”59. E mais fundo vai Maria de

Fátima Mata-Mouros ao concluir que “aquela imbricação (que resulta das decorrências do uso da expressão “nulas” na letra da lei, entre as

57 ANDRADE, Manuel da Costa, Sobre as Proibições de Prova em Processo Penal, reimpressão, Coimbra Editora,

2006, pp. 193 e 194, como CORREIA, João Conde, A distinção entre prova proibida por violação dos direitos

fundamentais e prova nula numa perspectiva essencialmente jurisprudencial, Revista do CEJ, 1.º Semestre 2006,

Número 4 – Número especial, p. 177, MATA-MOUROS, Maria de Fátima, Juiz das Liberdades – Desconstrução de

um Mito do Processo Penal, Almedina, 2011, p. 295, MENDES, Paulo de Sousa, “As proibições de prova no

processo penal”, in Jornadas de Direito Processual Penal e Direitos Fundamentais, Coordenação Científica de Maria Fernanda Palma, Almedina, 2004, pp. 146 e 147, e SILVA, Germano Marques da, Curso de Processo Penal II, 4ͣ Edição revista e actualizada, Verbo, 2008, p. 144.

58 SILVA, Germano Marques da, Curso de Processo Penal II, 4ͣ Edição revista e actualizada, Verbo, 2008, p. 145.

59 ANDRADE, Manuel da Costa, Sobre as Proibições de Prova em Processo Penal, reimpressão, Coimbra Editora,

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proibições de prova e o regime geral das nulidades processuais penais) não dispensa a diferenciação entre as duas figuras. Aceitá-lo seria negar autonomia às proibições de prova, o que, desde logo, anularia razão de ser à ressalva contida no art. 118.º, n.º 3”60.

O que se pretende dizer é que é precisamente o n.º 3 daquele art. 118.º a pedra angular que permite afirmar com certeza a autonomia técnica das proibições de prova do regime das nulidades gerais em processo penal61, porquanto negá-lo seria nada mais e nada menos que

negar relevância jurídico-prática ao espírito do dispositivo legal62.

Se tudo isto é verdade, também não deixa de o ser que não podemos, só assim, apoiar-nos na letra da norma e no espírito que possa resultar claro se lhe quis imprimir para estabelecer esta autonomia que procuramos destrinçar. É que, a atentarmos apenas àquilo, não chega a ser possível, com seguro grau de clareza e de certeza, avaliar a extensão desta autonomia e as consequências práticas que dela decorrem.

Desenvolveram-se, a este propósito, duas relevantes correntes doutrinárias que procuram fixar melhor o âmago do problema relativo à independência destes dois regimes que discutimos: por um lado, aqueles que defendem a autonomia dogmática e jurídica e, por outro, os que defendem uma autonomia (meramente) dogmática das proibições de prova em face ao regime das nulidades.

Para a corrente doutrinária que defende uma autonomia completa, dogmática e jurídica, das proibições de prova quanto ao regime das nulidades63, a materialização do dispositivo do n.º 3 do art. 118.º do C.P.P.

60 MATA-MOUROS, Maria de Fátima, Juiz das Liberdades – Desconstrução de um Mito do Processo Penal, Almedina,

2011, p. 295.

61 CORREIA, João Conde, A distinção entre prova proibida por violação dos direitos fundamentais e prova nula numa

perspectiva essencialmente jurisprudencial, Revista do CEJ, 1.º Semestre 2006, Número 4 – Número especial, p.

175.

62 A tudo isto já fomos aludindo nos títulos anteriores, mormente supra, 2. O enquadramento jurídico das

proibições de prova.

63 Entre outros, BELEZA, Teresa Pizarro, Tão amigos que nós eramos: o valor probatório do depoimento de

co-arguido no processo penal português, Revista do Ministério Público, Ano 19, N.º 74, Abril – Junho 1998, pp. 43 e

ss., como CORREIA, João Conde, A distinção entre prova proibida por violação dos direitos fundamentais e prova nula

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deu-se simplesmente para auxiliar o intérprete da lei a demarcar a estrutura das nulidades do regime das proibições de prova. Efetivamente, parece entender-se aqui que, por mera demarcação legal, presente naquele dispositivo, a autonomia entre ambos os regimes é de tal ordem que vai muito além da simples marca da independência entre um e outro na letra da lei: o pensamento filia-se na ideia de que a autonomia é tal que, para todos os efeitos, não se ampara sequer a aplicação das proibições de prova do art. 126.º do C.P.P. no complexo legal dos arts. 118.º e ss. do C.P.P., porque o regime do primeiro, nas palavras de Helena Morão, não “padeça de qualquer incompleição”64.

De facto, como resume precisamente Helena Morão, “entende esta doutrina que o teor do artigo 118/3 do Código de Processo Penal significa que os artigos 118 e seguintes nunca encontram aplicação em matéria de proibições de prova. (...) a nulidade mencionada nos artigos 32/8 da Constituição e 126 do Código de Processo Penal não é uma nulidade em sentido técnico-processual, mas uma nulidade dotada de uma independência técnica completa em face do regime das nulidades processuais, cuja consequência jurídica específica é a impossibilidade total

de utilização”65.

Por outra, há aqueles que defendem uma autonomia (meramente) dogmática das proibições de prova em face das nulidades processuais penais, deixando por notar, sob o ponto de vista jurídico, essa independência; defende esta corrente da doutrina que o que há é uma independência conceptual, sustentada pelo facto de que o que permite verdadeiramente distinguir os dois regimes é a circunstância de que o que

especial, pp. 191 e ss., MEIREIS, Manuel Augusto Alves, O Regime das Provas Obtidas pelo Agente Provocador em

Processo Penal, Almedina, 1999, p. 222, e PIMENTA, José da Costa, Código de Processo Penal Anotado, 2ͣ Edição,

Rei dos Livros, 1991, pp. 378 e 398.

64 MORÃO, Helena, O Efeito-à-Distância das Proibições de Prova no Direito Processual Penal Português, Revista

Portuguesa de Ciência Criminal, Ano 16, N.º 4, Outubro – Dezembro 2006, p. 596. No mesmo sentido, BELEZA, Teresa Pizarro, Tão amigos que nós eramos: o valor probatório do depoimento de co-arguido no processo penal

português, Revista do Ministério Público, Ano 19, N.º 74, Abril – Junho 1998, pp. 43 e ss..

65 MORÃO, Helena, O Efeito-à-Distância das Proibições de Prova no Direito Processual Penal Português, Revista

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define as proibições de prova é a sua natureza de limite à descoberta de verdade material, enquanto as nulidades dão antes resposta a vícios de natureza formal – exclusivamente formal – do processo66. De um lado, está

em causa um problema de natureza substancial, ao passo que, do outro, um problema de natureza exclusivamente formal.

Germano Marques da Silva diz, precisamente, que “[a]s proibições de

prova são verdadeiras limitações à descoberta da verdade, barreiras

colocadas à determinação dos factos que constituem objecto do processo”67, enquanto é João Conde Correia que, completando no mesmo

sentido, explica que “num Estado de direito a descoberta da verdade não é um valor absoluto e as proibições de prova (...) apresentam-se como compreensíveis e claras limitações ao total esclarecimento daquela”68,

finalizando a afirmar que “[e]mbora também exista uma certa articulação entre elas [as nulidades] e os direitos fundamentais, está em causa apenas o regular funcionamento do processo de forma a que ele decorra segundo as formalidades previstas na lei”69.

Mesmo Manuel da Costa Andrade corrobora que “[a] fidelidade ao programa legislado aponta, assim, para uma compreensão das proibições de prova assente seguramente na doutrina e nos princípios subjacentes ao regime das nulidades, mas aberta também e necessariamente a tópicos excêntricos e alheios a esta figura”70. Numa outra versão desta mesma

orientação doutrinária, Germano Marques da Silva afirma que “é no título dedicado às nulidades que o CPP inscreve o preceito segundo qual as

66 CORREIA, João Conde, A distinção entre prova proibida por violação dos direitos fundamentais e prova nula numa

perspectiva essencialmente jurisprudencial, Revista do CEJ, 1.º Semestre 2006, Número 4 – Número especial, pp.

177 e 178 e 184, assim como SILVA, Germano Marques da, Curso de Processo Penal II, 4ͣ Edição revista e actualizada, Verbo, 2008, p. 142

67 SILVA, Germano Marques da, Curso de Processo Penal II, 4ͣ Edição revista e actualizada, Verbo, 2008, p. 142.

68 CORREIA, João Conde, A distinção entre prova proibida por violação dos direitos fundamentais e prova nula numa

perspectiva essencialmente jurisprudencial, Revista do CEJ, 1.º Semestre 2006, Número 4 – Número especial, p.

178.

69 CORREIA, João Conde, A distinção entre prova proibida por violação dos direitos fundamentais e prova nula numa

perspectiva essencialmente jurisprudencial, Revista do CEJ, 1.º Semestre 2006, Número 4 – Número especial, p.

184.

70 ANDRADE, Manuel da Costa, Sobre as Proibições de Prova em Processo Penal, reimpressão, Coimbra Editora,

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