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A resolução do locatário financeiro em sede de cumprimento defeituoso

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Academic year: 2020

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Declaração

Nome: Paula Cristina Pereira Monteiro

Endereço eletrónico: paucrispmon@hotmail.com Telefone: 912 682 770

Número do Bilhete de Identidade: 14320245

Título dissertação: A resolução do locatário financeiro em sede de cumprimento defeituoso

Orientador: Professor Doutor Fernando de Gravato Morais Ano de conclusão: 2017

Designação do Mestrado: Mestrado em Direito dos Contratos e da Empresa

É AUTORIZADA A REPRODUÇÃO INTEGRAL DESTA TESE APENAS PARA EFEITOS DE INVESTIGAÇÃO, MEDIANTE DECLARAÇÃO ESCRITA DO INTERESSADO, QUE A TAL SE COMPROMETE;

Universidade do Minho, ___/___/______

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Agradecimentos

Quero agradecer ao Exmo. Professor Doutor Fernando de Gravato Morais, por me ter dado a honra de aceitar a orientação de esta dissertação, pela sua disponibilidade e indispensáveis conselhos.

À minha família, que me incentivou não só nesta fase, como sempre me apoiou desde o início da licenciatura, sendo que devo um especial obrigado aos meus pais e ao meu irmão, por terem sido o meu maior apoio.

Agradeço também às minhas amigas, pelas palavras de ânimo que nunca faltaram ao longo deste percurso.

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Resumo

É frequente em um contrato de locação financeira, observar uma situação na qual o locador financeiro exige o direito à resolução do contrato, baseado em um incumprimento contratual por parte do locatário financeiro, devido à falta de pagamento das rendas.

Contudo, o nosso estudo irá focar-se concretamente no direito à resolução do contrato por parte do locatário financeiro, devido à existência de um cumprimento defeituoso. O nosso Código Civil menciona brevemente o cumprimento defeituoso do contrato, todavia estipula contratos que podem ser exercidos de forma defeituosa.

Assim sendo, analisaremos (se possível) a responsabilidade das partes envolvidas no cumprimento defeituoso, ou seja, se o locatário financeiro tem legitimidade para agir contra o locador financeiro (contraparte no contrato de locação financeira) ou contra o fornecedor (sujeito exterior ao contrato de locação financeira).

Consequentemente, investigaremos se o locatário financeiro pode resolver o contrato de compra e venda ou o contrato de empreitada, e se também pode resolver o contrato de locação financeira.

Por fim, se o locatário financeiro pode resolver estes contratos, procederemos a explorar os seus efeitos e prazos para o seu exercício.

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Abstract

It is common in a contract of financial lease, to notice a situation in which the lessor demands for the right of a contract termination, based on a breach of contract by the lessee, for the failure of paying the rentals.

Nevertheless, our study is going to focus concretely in the right of a contract termination by the lessee, due to the existence of a faulty compliance.

Our Civil Code mentions briefly the faulty compliance of the contract, however stipulates contracts which can be exercised in a defective manner.

Therefore, we will analyze (if possible) the responsibility of the parts involved in the faulty compliance, that is, if the lessee has the legitimacy to act against the lessor (counterparty in the contract of financial lease) or against the provider of the asset (outsider party of the contract of financial lease).

Consequently, we will inquire whether the lessee can terminate the purchase and sale contract or the works contract, and also if he can terminate the financial lease contract. Ultimately, if the lessee can terminate these contracts, we will proceed to explore its effects and deadlines for its exercise.

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Índice

Agradecimentos ... iii

Resumo ... iv

Abstract ... vii

Abreviaturas ... xi

1. Cumprimento Defeituoso (noção) ... 1

2. Os contratos de compra e venda e de empreitada em sede de cumprimento defeituoso ... 11

2.1. O contrato de compra e venda ... 11

2.2. O contrato de empreitada ... 14

2.3. Consequências do cumprimento defeituoso ... 16

2.3.1. Em especial: o exercício do direito de resolução ... 17

2.3.2. Em especial: o exercício do direito à indeminização ... 19

2.3.3. Prazos ... 20

3. A resolução do contrato ... 23

3.1. Caraterísticas ... 23

3.2. Efeitos ... 23

3.3. Resolução do contrato em sede de cumprimento defeituoso ... 25

4. O contrato de locação financeira e a responsabilidade das partes pelos vícios do bem locado ... 27

4.1. Responsabilidade do locador financeiro ... 27

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5. O direito de resolução do locatário financeiro no contrato e venda ou de

empreitada ... 37

5.1. Exercício dos meios de defesa do locatário em virtude da sub-rogação da posição do locador ... 37

5.2. Inadmissibilidade do exercício do direito de resolução ... 40

5.3. Admissibilidade do exercício do direito de resolução ... 41

5.3.1. Efeitos da resolução no contrato de compra e venda ... 42

5.3.2. Prazos para o exercício da resolução ... 44

5.4. Do direito de indemnização cumulado com o direito de resolução .... 44

6. Efeitos da resolução do contrato de compra e venda/empreitada no contrato de locação financeira ... 47

6.1. Manutenção do contrato de locação financeira ... 47

6.2. Resolução do contrato de locação financeira ... 49

6.2.1. A resolução do contrato de locação financeira no estrangeiro ... 49

6.2.2. A resolução do contrato de locação financeira em Portugal ... 51

6.2.3. Efeitos no tempo da resolução do contrato de locação Financeira ... 53

Conclusçõess ... 55

Bibliografia ... 59

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Abreviaturas

• al(s). – alínea(s) • art. - artigo • arts. – artigos • apud – citado por

• BMJ – Boletim do Ministério da Justiça • CC – Código Civil

• Cfr. – Conferir

• CJ – Coletânea de Jurisprudência • Cit. – Citado

• FDUC – Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra • FDUP – Faculdade de Direito da Universidade do Porto • ed. – edição

• et al. – entre outros • Idem – o mesmo

• Ibidem – mesma obra e mesmo sítio • Op. cit. - opus citatum/ obra citada • p. – página

• pp. – páginas

• ROA – Revista da Ordem dos Advogados • Sep. – Separata

• s.n. – sine nomine • ss. – seguintes

• STJ – Supremo Tribunal de Justiça

• TRG – Tribunal da Relação de Guimarães • TRL – Tribunal da Relação de Lisboa • TRP – Tribunal da Relação do Porto • TSJ – Tribunal Supremo de Justicia • Vd. - Vide

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1. CUMPRIMENTO DEFEITUOSO (NOÇÃO)

O cumprimento corresponde à “obrigação de pagar o preço a uma prestação pecuniária”1, ou seja, numa relação obrigacional, o credor tem direito a uma prestação e o dever de prestar uma obrigação perante o devedor. Sendo assim, a vantagem do credor na relação obrigacional será a satisfação dos seus interesses2.

O devedor no cumprimento da sua obrigação, tem que a cumprir pontualmente conforme os artigos 406º nº 1 e 762º nº 1 do Código Civil3.

Porém, é frequente nas relações contratuais o não cumprimento das obrigações. Consequentemente, o não cumprimento deve ser caracterizado como a “situação objetiva de não realização da prestação debitória e de insatisfação do interesse do credor, independentemente da causa de onde a falta procede”4.

O não cumprimento das obrigações é composto por três modalidades: o não cumprimento definitivo, a mora e o cumprimento defeituoso.

Por sua vez, a terceira modalidade (em regra geral) divide-se em três tipos de casos: “o cumprimento em termos não coincidentes com o programa da prestação dos deveres principais ou primários, o não cumprimento ou impossibilitação dos deveres secundários”, e por último, “a violação de deveres acessórios de conduta”5. O primeiro caso, refere-se a um mau cumprimento da própria obrigação principal, ou a um cumprimento deficiente no modo qualitativo da prestação que foi acordada entre as partes. O segundo caso, apesar do devedor ter cumprido a obrigação principal de forma exata e esperada, não o fez no cumprimento das prestações acessórias; houve um mau cumprimento de outras obrigações que o contrato se lhe exigia (mesmo sendo obrigações laterais à principal). O terceiro caso, compreende o não cumprimento de

1 Pedro ROMANO MARTÍNEZ, Direito das Obrigações (parte especial) – Contratos: Compra e venda,

Locação, Empreitada, 2ª ed., Coimbra, Almedina, 2003, p. 52.

2 João CALVÃO DA SILVA, Cumprimento e sanção pecuniária compulsória, 4ª ed., Coimbra, Almedina,

2002, p. 61.

3 Rui Sá GOMES, «Breves Notas Sobre o Cumprimento Defeituoso no Contrato de Empreitada», in Ab

Uno ad Omnes, 75 anos da Coimbra Editora, Coimbra, Coimbra Editora, 1998, p. 567.

4 Vd. João de Matos ANTUNES VARELA, Das Obrigações em Geral, 7ª ed., vol. II, Coimbra, Almedina,

2013, p. 60.

5Nuno Manuel PintoOLIVEIRA, Estudos sobre o Não Cumprimento das Obrigações, Coimbra, Almedina,

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obrigações secundárias, ou seja, obrigações autónomas que ao não serem cumpridas não afetam a obrigação principal, todavia são esperadas pelo credor6.

A parte geral das obrigações consagrada no Código Civil, dedica uma secção a partir do artigo 790º ao “não cumprimento”. Conquanto, apenas dedica ao cumprimento defeituoso uma breve menção no artigo 799º nº1, no qual se estabelece a presunção de culpa do devedor7. Para MENEZES LEITÃO, esta norma apesar de suscitar alguma controvérsia, pode ser explicada em virtude de não haver uma distinção no regime probatório no que respeita a danos procedentes da violação do dever principal ou de outros8.

O Código Civil apresenta situações específicas de execuções defeituosas em alguns contratos: no de compra e venda (artigos 905º e ss. e 913º e ss.), na doação (artigo 957º), na empreitada (artigos 1218º e ss.) e na locação (artigos 1032º e ss.).

Algumas das regras consagradas nestes contratos são especiais e até podem ser consideradas “excecionais”, todavia algumas podem ser utilizadas para criar princípios gerais do regime9. Para PESSOA JORGE, como o Código Civil não expõe os termos gerais

do cumprimento defeituoso, esta lacuna deve ser ultrapassada mediante a aplicação das regras gerais do contrato de empreitada10. A maioria da doutrina e da jurisprudência tem entendido que os efeitos específicos do cumprimento defeituoso se encontram não só regulamentados no contrato de empreitada, como no contrato de compra e venda11. Esta lacuna foi abordada primeiramente pelo autor alemão STAUB no terceiro quartel do

século XX, que propôs a integração da violação positiva contratual na doutrina12.

A violação contratual positiva abarca as situações em que a prestação é executada sem atrasos, todavia com vícios13. Segundo MENEZES CORDEIRO, a violação positiva do contrato integrava um terceiro tipo no domínio do incumprimento (ao lado da impossibilidade imputável ao devedor e da omissão da prestação devida). Para o ator

6 Rui Sá GOMES, «Breves Notas Sobre o Cumprimento Defeituoso no Contrato de Empreitada», Cit., pp.

589 e 590.

7Pedro ROMANO MARTÍNEZ, Cumprimento Defeituoso em especial na Compra e Venda e na Empreitada,

Coimbra, Almedina, 2001., p. 26.

8 Luís Manuel Teles de MENEZES LEITÃO, Direito das Obrigações – Transmissão e Extinção das

Obrigações, Não Cumprimento e Garantias do Crédito, vol. II, Coimbra, Almedina, 2002, p. 268.

9 António MENEZES CORDEIRO, «Violação positiva do contrato», ROA, ano 41, vol. I, 1981, p. 140. 10 Fernando PESSOA JORGE, apudJosé João ABRANTES, A excepção de não cumprimento do contrato no

direito civil português: conceito e fundamento, Coimbra, Livraria Almedina, 1986, p. 96.

11 Vd. Acórdão do TRL de 6 de Junho de 2002, Relator Carlos Valverde, disponível em www.dgsi.pt. 12 STAUB, apud MENEZES CORDEIRO, «Violação positiva do contrato», Cit., p. 140.

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esta reunia: a “violação de deveres acessórios”, a “má execução da prestação principal”, e por último, a “declaração eficaz de não pretender cumprir”14.

No cumprimento defeituoso existe indubitavelmente uma violação positiva, uma vez que a execução defeituosa se manifesta na ação positiva do “dare” ou do “facere”. Quando se está perante uma obrigação deste tipo, a regra geral é a de se traduzir numa situação de mora ou o cumprimento definitivo; o comportamento do devedor é negativo, pois alicerça-se numa “omissão da ação devida”. Contrariamente, a execução defeituosa também pode ser positiva, visto que se pode alicerçar em uma “ação devida”, porém imperfeita15.

Na violação contratual positiva em um contrato bilateral, a parte lesada tem direito a uma indemnização pelo não cumprimento ou a resolver o contrato, nomeadamente por duas razões: o credor deixou de ter interesse no cumprimento da contraprestação, ou o fim do contrato foi de forma eminente colocado em causa16.

Estamos diante um cumprimento inexato, quando a prestação realizada não apresenta os requisitos adequados “a fazê-la coincidir com o conteúdo do programa obrigacional, tal como este resulta do contrato e do princípio geral da correção e boa fé”17.

Esta inexatidão pode ser quantitativa ou qualitativa. No primeiro tipo, o credor pode recusar-se a aceitar a prestação parcial, o que importa a mora ou o cumprimento definitivo. Contudo, no segundo tipo de inexatidão, pode estar em causa uma diversidade, tal como uma desconformidade, vício ou até uma falta de qualidade da prestação. De igual forma, também se pode alargar o seu sentido à “existência de direitos de terceiro sobre o seu objeto”. Sendo assim, na maioria de estas situações, o credor pode recusar a prestação e exigir uma nova e exata18.

Para o autor brasileiro CATALAN, mesmo que a coisa tenha sido entregue com uma

qualidade superior à acordada, se houver o incumprimento de deveres laterais de

14 MENEZES CORDEIRO, «A Modernização do Direito das Obrigações», ROA, ano 62, vol. II, 2002, p. 17,

disponível em www.roa.pt.

15 InocêncioGALVÃO TELES, Direito das Obrigações, 7ª ed., Coimbra, Coimbra Editora, 1997, p. 339. 16 Ribeiro de FARIA, Direito das Obrigações, Op. cit., pp. 461 a 464.

17 António Baptista MACHADO, «Pressupostos da Resolução por Incumprimento», in Boletim da

Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra: Estudos em Homenagem a Teixeira Ribeiro, vol. 2,

Coimbra, Universidade de Coimbra, 1979, p. 386.

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conduta (segurança, sigilo, informação, deveres acessórios…), estar-se-á perante um cumprimento inexato19.

Segundo MENEZES LEITÃO, estamos perante um caso de cumprimento defeituoso20,

quando o devedor apesar de prestar a sua prestação, não a presta de forma a corresponder totalmente à obrigação que prometeu21.

Conquanto, ALMEIDA DA COSTA não vai tão longe na interpretação ampla de

cumprimento inexato como CATALAN. Para o autor citado anteriormente, à parte de

abranger a execução defeituosa (da obrigação principal), abrange apenas a violação de deveres acessórios. Adiciona-se “à sua própria configuração, como elemento individualizante, a tipicidade dos danos causados ao credor”, uma vez que este sujeito não os sofreria, se o devedor não tivesse realizado a prestação. Contrariamente, nem a mora nem o não cumprimento definitivo são passíveis de produzir os mesmos danos22. PINTO OLIVEIRA suporta a tese do autor anterior, uma vez que considera que podemos verificar que a ilicitude do cumprimento defeituoso decorre da violação de deveres acessórios “que acompanham o dever de prestação principal”23.

Para VAZ SERRA, o cumprimento defeituoso nem é um caso de não cumprimento, nem é

uma situação de impossibilidade da prestação. Contudo, como não é um cumprimento exato/perfeito ou “pelo modo devido”, o devedor deve ser responsabilizado24.

Em suma, existe um cumprimento defeituoso ou um mau cumprimento da obrigação, quando a prestação não apresenta a qualidade acordada ou qualquer outra situação pertinente para o interesse do credor, pois apesar de ter sido materialmente concretizada, não foi realizada nos termos acordados25; ou seja, o devedor no cumprimento da sua obrigação realizou uma ofensa à obrigação principal, violando um dever lateral de conduta ou um dever acessório à prestação principal, causando ao credor danos patrimoniais e não patrimoniais, que não teriam regulamentação nos casos das outras

19 Marcos Jorge CATALAN, «Reflexões sobre o cumprimento inexato da obrigação no direito contratual»,

pp. 6 e 7, disponível em http://www.diritto.it/archivio/1/26876.pdf.

20 Mário Júlio de ALMEIDA COSTA refere-se a cumprimento defeituoso ou a cumprimento imperfeito. Cfr.

Mário Júlio de ALMEIDA COSTA, Direito das Obrigações, 11ª ed., Coimbra, Almedina, 2008, pp. 1035 e 1058.

21 MENEZES LEITÃO, Direito das Obrigações, p. 265.

22 ALMEIDA COSTA, Direito das Obrigações, Op. cit., p. 1060.

23 Nuno PINTO OLIVEIRA, Estudos sobre o Não Cumprimento das Obrigações, Op. cit., p. 101.

24 Adriano Paes da Silva VAZ SERRA, «Impossibilidade superveniente e cumprimento imperfeito

imputáveis ao devedor», BMJ, nº 47, (Março) 1955, p. 66.

25 José João ABRANTES, A excepção de não cumprimento do contrato no direito civil português: conceito

e fundamento, Coimbra, Livraria Almedina, 1986, p. 95. Neste sentido, o autor espanhol DIEZ-PICAZO, define o cumprimento defeituoso ou inexato como a situação em que o comportamento do devedor não combina com os “pressupostos reclamados pelo pagamento para que este possa produzir plenos efeitos liberatórios” e satisfatórios. Cfr. DIEZ-PICAZO,apud CATALAN, Cit., pp. 7 e 8.

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modalidades de não cumprimento da obrigação, nomeadamente a mora e o não cumprimento definitivo26.

Deste modo, quanto ao âmbito objetivo do cumprimento defeituoso, podemos analisar o defeito como um desvio à qualidade normal da coisa.

Relativamente ao seu âmbito subjetivo, existe uma interpretação bastante ampla quanto à sua noção: enquadra certos casos de erro, e na maioria dos casos, as partes do contrato não atendem à qualidade especial, e somente têm em vista a qualidade normal do bem. Conquanto, esta interpretação da noção de defeito perde interesse, uma vez que o cumprimento defeituoso afasta o erro. Desta forma, a noção de defeito deve ser uma noção tida em conta como híbrida, ou seja, tem que ser considerada simultaneamente como objetiva e subjetiva: o bem tem que corresponder à “qualidade normal de coisas daquele tipo”, tal como tem que ser adequado ao fim determinado no contrato. Por conseguinte, os vícios são as “imperfeições da qualidade normal do bem com respeito ao fim acordado”. Resumidamente, o defeito da coisa é constituído por um conjunto de vícios e desconformidades27.

O defeito pode ser constituído devido a espetos jurídicos e materiais: quanto aos primeiros, consoante o exposto no artigo 905º do Código Civil, “apenas são admitidos os ónus ou limitações que não excedam os limites normais inerentes aos direitos da mesma categoria”; quanto aos segundos, dizem respeito a imperfeições concernentes ao processo de “conceção, de fabrico, de montagem, de acondicionamento, assim como alterações químicas produzidas na coisa” ou às desconformidades relativas ao acordo ou à má execução do contrato28.

Segundo ROMANO MARTÍNEZ, o cumprimento defeituoso fundamenta-se no exercício de

quatro requisitos:

O primeiro refere-se à violação do princípio da pontualidade, ou seja, a prestação é concretizada de maneira distinta à acordada. Por exemplo: se a prestação foi executada em tempo distinto ao estabelecido no acordo, se a prestação realizada foi de quantidade diversa da devida, se não foi realizada no local acordado, se houve entrega de coisa diversa da estabelecida…

26 CATALAN, Cit., pp. 9 e 10.

27ROMANO MARTÍNEZ, Cumprimento Defeituoso em especial na Compra e Venda e na Empreitada…, Op.

cit., pp. 163 a 166.

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O segundo requisito refere-se ao desconhecimento do defeito por parte do credor, ou seja, este recebeu a prestação por não saber da sua imperfeição, ou tendo conhecimento da sua desconformidade, anuiu com reserva (uma vez que apesar da coisa apresentar um defeito, o credor continua a ter interesse em receber a prestação).

O terceiro requisito diz respeito ao defeito relevante, pois o bom senso exige que o credor não esteja habilitado a demandar a outra parte quando o defeito de cumprimento é diminuto. Desta forma, a importância do defeito tem que ser avaliada caso a caso fundada no princípio da boa fé.

O quarto e último requisito, relaciona-se com os danos típicos, isto é, para haver um cumprimento defeituoso é imprescindível que os prejuízos originados sejam diferentes daqueles que o credor poderia suportar na ocorrência do “não cumprimento definitivo ou de mora”. Os prejuízos não acarretam apenas a obrigação de indemnizar, uma vez que pode haver de igual forma, o dever de “eliminar os defeitos ou o de reduzir a contraprestação”29.

CATALAN não concorda totalmente com os requisitos propostos por ROMANO MARTÍNEZ. O autor não concorda com a necessidade de o credor desconhecer o vício da prestação, tal como não concorda com a necessidade de o defeito ser suficientemente relevante: o credor tem direito a receber exatamente o que foi acordado, tem direito a esperar o principal efeito da relação obrigacional: que é a coisa em perfeitas condições. Caso contrário, existe uma violação do princípio da confiança30.

O credor tem o direito de rejeitar a prestação defeituosa que lhe é presenteada, de acordo com o principio da boa fé consagrado no artigo 762º nº 2 do Código Civil, e devido a uma interpretação extensa do principio da integralidade do cumprimento (art. 763º nº 1 do CC)31.

Conforme ROMANO MARTÍNEZ, ao cumprimento imperfeito pode ser aplicado analogicamente as regras da mora ou do não cumprimento definitivo, porém não é possível equiparar o cumprimento defeituoso a estas figuras, visto que a “omissão de cumprimento” e uma “conduta indevida” não são a mesma realidade32.

No caso do devedor se constituir em mora (artigo 804º do CC), o credor ainda tem interesse na prestação, pois trata-se de um incumprimento temporário. Deste modo, o

29ROMANO MARTÍNEZ, Cumprimento Defeituoso…, Op. cit., pp. 129 a 136.

30 CATALAN, «Reflexões sobre o cumprimento inexato da obrigação no direito contratual», Cit., p. 9. 31ROMANO MARTÍNEZ, Cumprimento Defeituoso…, Op. cit., pp. 142 e 143.

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devedor tem a obrigação de reparar o defeito, ou tem que substituir a prestação defeituosa.

Na situação de o devedor se constituir em incumprimento definitivo da obrigação (artigo 808º do Código Civil), o credor perde definitivamente o interesse na prestação, uma vez que esta vai ficar terminantemente por cumprir.

Se o credor se recusar a realizar a sua prestação, e o devedor consequentemente não cumprir a sua, estamos na mesma perante um cumprimento definitivo e total se o credor ainda mantiver o interesse no cumprimento da contraprestação33.

A maioria da doutrina34 defende que o artigo 801º nº 2 do Código Civil, permite ao lesado perante o incumprimento da contraparte, duas vias:

pode requerer uma indemnização por incumprimento, em que estão abrangidos todos os prejuízos sustentados (todavia mantendo a sua prestação). Estamos perante o “interesse contratual positivo”35, no qual a indemnização tem como objetivo posicionar o “credor na situação em que estaria se o contrato tivesse sido cumprido pontualmente”36;

ou, pode exigir o direito de resolução, o que significa que há uma eficácia retroativa que lhe possibilita desvincular-se da sua obrigação e, pode pedir a restituição do que já tenha prestado. A este direito, acresce o direito de indemnização pelos prejuízos provenientes da não conclusão do contrato – o chamado “interesse contratual negativo”37.

Para VAZ SERRA, parece duvidoso que se aceite a solução do interesse negativo (apesar

de ser uma solução atraente por decorrer da eliminação das obrigações efeito da resolução do contrato), pois o devedor é responsável pelos prejuízos causados pela celebração do contrato, como se tivesse realizado um contrato nulo culposamente. Por um lado, o credor não pode esperar ficar na situação que estaria no caso do contrato ser cumprido, pois tem que ficar na situação que estaria se o contrato não tivesse sido realizado: tem que ver reparados os prejuízos sofridos, consequência de acreditar na conservação do contrato (interesse negativo). Por outro lado, a resolução do contrato pode não significar a eliminação das obrigações: os contraentes podem ficar

33 Cfr. art. 801º ex vi 808º nº1, 2ª parte do CC. Vd. RIBEIRO DE FARIA, Direito das Obrigações, Op. cit.,

p. 469.

34 De acordo, por exemplo, com GALVÃO TELES, ANTUNES VARELA, RIBEIRO DE FARIA et al. cfr.

MENEZES LEITÃO, Direito das Obrigações…, Cit., p. 257.

35 MENEZES LEITÃO, Direito das Obrigações…, Cit., p. 257.

36 VAZ SERRA, «Impossibilidade superveniente e cumprimento imperfeito imputáveis ao devedor», Cit., p.

37.

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desobrigados de realizar as respetivas prestações, sem que o lesado se encontre na situação que estaria se o contrato tivesse sido cumprido38.

Quanto aos danos causados, segundo MENEZES LEITÃO, estes “podem corresponder à

frustração das utilidades causadas pela prestação (interesse de cumprimento) ou extravasar desse âmbito (danos exteriores)”. No caso de os danos corresponderem à primeira situação, o credor tem direito a exigir uma indemnização pelo não cumprimento. Todavia, se se tratar de um contrato sinalagmático, pode ainda exigir a exceção de não cumprimento e a resolução do contrato causada pelo não cumprimento. Se pertencer à segunda situação, a indemnização é externa ao dever de realizar a prestação, assim que haverá uma cumulação com a ação de cumprimento39.

Estas situações podem não se verificar, quando o cumprimento defeituoso suceder antes do vencimento da obrigação e o devedor prossiga à reparação dos defeitos ou à substituição da prestação antes do vencimento40. Nesta situação, o cumprimento defeituoso demonstra autonomia perante as outras modalidades de não cumprimento41. O cumprimento defeituoso pode provocar prejuízos ao credor diferentes dos danos resultantes da mora ou do cumprimento definitivo42.

Posto isto, o regime jurídico do cumprimento defeituoso alberga um grande leque de hipóteses, o que implica que as consequências derivadas do cumprimento imperfeito podem não estar em harmonia com todas as situações.

Existe a necessidade de recorrer às regras gerais do cumprimento e do incumprimento das obrigações, às normas da impossibilidade culposa e da mora, tal como às regras especiais de certos contratos43.

Deste modo, podemos concluir que o regime que se aplicará ao cumprimento defeituoso vai depender dos fatores da situação em concreto, ou seja, vai estar subordinado à

38 VAZ SERRA, «Impossibilidade superveniente e cumprimento imperfeito imputáveis ao devedor», Cit.,

pp. 38 e 39.

39 MENEZES LEITÃO, Direito das Obrigações…, Cit., p. 268.

40 Inocêncio GALVÃO TELES apresenta o seguinte exemplo: um vendedor realiza a entrega de animais

antecipadamente ao prazo estipulado de entrega. Contudo, ao se aperceber que estes estavam doentes, substitui-os por outros saudáveis ainda antes da data de entrega. Cfr. GALVÃO TELES, Direito das

Obrigações, 7ª ed., Coimbra, Coimbra Editora, 1997, p. 338.

41 Ibidem.

42 MENEZES LEITÃO, Direito das Obrigações…, Cit., p. 257. Voltando ao exemplo citado na nota 40,

imagine-se que os animais doentes foram colocados em contato com os animais do vendedor e acabaram por contagiá-los. É uma situação que origina danos que não aconteceriam se o devedor se encontrasse em mora ou não cumprisse definitivamente a sua obrigação. Vd. GALVÃO TELES, Direito das Obrigações,

Op. cit., p. 338.

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“espécie de negócio”, ao “fim da obrigação”, e, como é obvio, às suas “circunstâncias próprias”44.

Na prestação cumprida de forma defeituosa por parte do devedor presumido (art. 799º nº 1 do CC), este será responsabilizado pelos danos causado ao credor (art. 798º do CC). No artigo 798º do Código Civil, estamos perante casos de “culpa no não cumprimento”, uma vez que se instala a presunção de culpa do devedor por este estar possibilitado de cumprir, porém não o faz por culpa sua. A razão de esta presunção de culpa deve-se ao facto de se querer reforçar o “vínculo creditório”. Assim, como não exime a culpa, não estamos perante um caso de responsabilidade objetiva. Sustenta-se a exigência de culpa, uma vez que a responsabilidade deve estar baseada no pressuposto subjetivo (na “reprovação ou censura do agente”). Caso contrário, se não existisse esta presunção de culpa, o credor seria obrigado a provar a culpa do devedor como se de um elemento constitutivo do exercício dos seus direitos se tratasse45.

Pode-se fazer então fazer uma interpretação ampla do artigo 798º do Código Civil: o cumprimento defeituoso é quando o devedor não cumpre parcialmente, assim que existe uma responsabilidade por todos os danos causados ao credor46; ou uma interpretação mais restrita: se quem falta com culpa à sua obrigação tem que indemnizar a contraparte, então na evidência de um cumprimento defeituoso, o devedor apenas pode ser responsabilizado se tiver agido com dolo ou negligência47.

Por conseguinte, o devedor tem que provar que foi cuidadoso, que se esforçou a cumprir a sua obrigação com diligência de acordo com o princípio do “bom pai de família”48; ou, tem que provar que apesar de não ter sido extraordinariamente zeloso, não se coibiu de cumprir a obrigação com cautela, ou seja, que não agiu de forma negligente49.

O quesito mais discutível da natureza jurídica do cumprimento, está em determinar o momento em que o ónus da prova do cumprimento defeituoso é atribuído ao credor.

44 Acórdão do STJ, de 15 de Outubro de 1980, citado por ABRANTES, em A excepção de não cumprimento

do contrato, Op. cit., p. 96.

45 GALVÃO TELES, Direito das Obrigações, Op. cit., pp. 359 e 360. Neste sentido, VAZ SERRA, «Falta de

cumprimento parcial do contrato – Resolução», BMJ, nº 251, (Dezembro) 1975, p. 156: Se o “cumprimento defeituoso dos contratos equivale à falta de cumprimento (…), (e) o contraente (…) é responsável para com o outro (;) na responsabilidade contratual, o credor não carece de provar a culpado devedor, incumbindo a este demonstrar que a falta de cumprimento não procede de culpa sua ou que tenha direito legal de não cumprir”.

46 Arts. 562º e 566º nº 2 do CC.

47 FARIA, Direito das Obrigações, Op. cit., p. 473. 48 Cfr. arts. 487º nº 2 ex vi 799º nº 2 do CC.

(24)

Segundo VAZ SERRA, é suficiente que a prestação tenha sido exercida em termos gerais

de acordo com o conteúdo da obrigação50. Segundo a regra da “aceitação como cumprimento”, o ónus da prova da existência de defeitos da prestação apenas recai sobre o credor, no caso de este aceitar o cumprimento da obrigação como lícita (tanto no momento anterior ou posterior da concretização da prestação); por último, segundo a regra da “realização da prestação em condições que significam normalmente ter ela correspondido ao conteúdo da obrigação”, o ónus de demonstrar os defeitos da prestação realizada pertence ao credor na maioria das situações em que prevaleça um direito apoiado nesses defeitos51.

O credor no caso de cumprimento defeituoso, tem a possibilidade de se munir de vários meios de reação. Pode exigir a eliminação do defeito (a sua reparação) ou no caso de não ser possível a sua eliminação, exigir a sua substituição. De igual forma, pode usar a exceção de não cumprimento e recusar-se a cumprir a sua prestação enquanto o defeito não for suprimido, ou exigir a redução da contraprestação no caso de haver uma perda do valor da prestação. Se os defeitos não são eliminados ou a prestação não é substituída, a prestação é julgada como “não cumprida de forma parcial”52, logo o credor tem direito a pedir a redução da contraprestação e a pedir a resolução do contrato. Note-se que existe de igual maneira o direito de indemnização fundado nos danos causados pela prestação defeituosa53.

Conquanto, o meio de defesa utilizado deve ser proporcional à gravidade do cumprimento defeituoso. O credor deve exercer os seus direitos de acordo com o princípio da boa fé, de modo a não abusar do mau cumprimento da contraparte com o objetivo de não realizar a sua própria obrigação. Por exemplo, A vende uma coisa com um pequeno defeito a B que facilmente pode ser reparada. B não pode alegar o instituto da exceção de contrato não cumprido54.

50 Adriano VAZ SERRA, apud NUNO PINTO OLIVEIRA, Estudos sobre o Não Cumprimento das Obrigações,

Op. cit., p. 100.

51 NUNO PINTO OLIVEIRA, Estudos sobre o Não Cumprimento das Obrigações, Op. cit., p. 101. 52 Vd. art. 802º ex vi parte final do nº1 do art. 808º do CC.

53ROMANO MARTÍNEZ, Cumprimento Defeituoso…, Op. cit., pp. 145 e 146.

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2. OS CONTRATOS DE COMPRA E VENDA E DE EMPREITADA EM

SEDE DE CUMPRIMENTO DEFEITUOSO

O cumprimento defeituoso tem uma abordagem sui generis nos contratos da compra e venda (artigos 905º e ss.) e na empreitada (artigos 1218º e ss.).

No primeiro contrato, apesar de apresentar alguns preceitos específicos conforme o caso em questão, pode remeter para o instituto do erro consagrado nos artigos 905º e 913º ou para “as normais gerais do não cumprimento” estabelecidas no artigo 918º do presente Código. Por sua vez, o segundo contrato em especial apresenta um regime próprio para o tratamento deste tema55.

2.1 O contrato de compra e venda

No contrato de compra e venda, a coisa é considerada defeituosa se conter um vício ou uma desconformidade relativamente ao que foi acordado56.

Conquanto, apenas se aplica o regime da venda de coisas defeituosas, se o comprador desconhecer o defeito da coisa vendida sem culpa. Por conseguinte, deve-se realizar uma diferenciação entre defeito oculto e defeito aparente. O primeiro defeito, consiste naquele que de forma plausível é ignorado pelo comprador ao não ter sido detetado mediante um exame zeloso, de tal forma que seja totalmente desconhecido por este. Consequentemente, o segundo defeito é caracterizado pelo efeito inverso, ou seja, o defeito seria aparente, se realizado um exame diligente, a desconformidade fosse notável. Por sua vez, o defeito conhecido (seguindo o bom senso) é aquele que é dado a conhecer ao comprador, seja pela contraparte, terceiro, ou até por ele mesmo se ter apercebido devido à sua destreza57.

Quanto ao regime jurídico do contrato de compra e venda relativamente ao cumprimento inexato, há lugar a duas teorias: a teoria da garantia defende que existe um regime diferente conforme esteja em causa um defeito de direito ou da coisa, ou seja, o vendedor tem que ceder a coisa sem “defeito de direito” e, se esta estiver vinculada a outros encargos, estar-se-á no âmbito de incumprimento do contrato58; a teoria do

55Cumprimento Defeituoso em especial…, Op. cit., pp. 27 e 28.

56 ROMANO MARTÍNEZ, Direito das Obrigações (parte especial) …, Op. cit., p. 130. 57 Idem, pp. 132 e 133.

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cumprimento defende que o vendedor tem que realizar uma prestação sem defeito, isto é, tem que entregar uma “coisa conforme”59.

Quando o bem vendido não possui a qualidade asseverada, considera-se que a prestação é defeituosa. Relativamente ao contrato de compra e venda, esta regra encontra-se no artigo 913º nº1 do Código Civil, enquanto no contrato de empreitada, está consagrada no artigo 1218º nº 1 do Código Civil.

Quando o defeito da coisa ocorre após a celebração do contrato, ou seja, é superveniente, não impede que se apliquem as regras concernentes ao incumprimento, pertinentes ao vício da coisa. Desta forma, o artigo 918º do Código Civil quanto às situações de defeito superveniente, remete para as normas do incumprimento, porém não impede que posteriormente se apliquem os artigos 913º e ss. do Código Civil relativamente às especificidades próprias provenientes dos vícios. Em contrapartida, este regime aplica-se também no caso de “venda de coisa indeterminada de certo género que se revela defeituosa no momento da concentração60”.

O regime do cumprimento defeituoso é aplicado tanto no caso da prestação da coisa devida apresentada com defeito, como no caso em que a prestação da coisa foi diversa da devida61. Por exemplo, existe um cumprimento defeituoso na venda de um frigorífico com uma deficiência no sistema de congelação, tal como na entrega do eletrodoméstico com a cor branca quando foi acordado a cor cinzenta, pois as duas situações apresentam uma desconformidade. Como refere ROMANO MARTÍNEZ, o “comprador tem de verificar

o desvio à qualidade contratual”62.

Sendo assim, para que exista o defeito da coisa, tem que subsistir um vício que permita desvalorizar ou impedir a realização do fim a que se destina, não obstante de se manifestar após à celebração do contrato (logo que na altura já existisse de forma proeminente).

Por conseguinte, podemos retirar três consequências da compra e venda de coisas defeituosas: primeiramente, como se trata de um cumprimento defeituoso, aplica-se as regras gerais da responsabilidade contratual redigidas nos artigos 798º e ss do CC; em segundo lugar, o artigo 913º nº 1 do CC remete para a secção anterior (quanto à compra e venda de bens onerados); por último e em terceiro lugar, institui-se nos artigos 914º e

59 Idem, p. 151.

60 ROMANO MARTÍNEZ, Direito das Obrigações (parte especial) …, Op. cit.., p. 133. 61 ROMANO MARTÍNEZ, Direito das Obrigações (parte especial) …, Op. cit.., p.135. 62 Ibidem.

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ss do CC algumas especificidades relativamente à compra e venda de coisas defeituosas63.

Posto isto, em termos gerais cabe ao comprador provar o defeito da coisa segundo o artigo 342º nº1 do CC, e considera-se o vendedor culpado se a coisa entregue for defeituosa (mediante o artigo 799º nº1 do CC).

Uma vez que o defeito tenha sido comprovado e a presunção de culpa do vendedor não tenha sido ilidida, o comprador tem direito a recusar a entrega da coisa defeituosa (regime geral do não cumprimento das obrigações). Deve-se ainda referir que o Código Civil não prevê propriamente o direito de recusa da entrega da coisa, contudo esta ilação pode ser retirada do artigo 763º nº 1 do CC, que sustenta o “princípio da integralidade do cumprimento”. Ora, se um credor não pode ser obrigado a aceitar uma prestação em que a quantidade não foi a acordada, também não pode ser forçado a aceitar uma prestação em que a qualidade está desconforme com a combinada. O comprador pode invocar a exceção de não cumprimento devido à recusa de aceitar a coisa defeituosa64. No regime da venda de coisas defeituosas, quanto às coisas específicas, deve ser analisado numa ótica de incumprimento contratual, assim que se fundamenta no regime do erro ou do dolo do comprador. Na ordem jurídica portuguesa, a regulamentação da venda de coisas defeituosas salienta a pertinência que o comprador concede à base negocial, em detrimento do conteúdo do acordo negocial.

Por isto, deve-se realizar uma diferenciação entre o regime da venda de coisas defeituosas e o cumprimento defeituoso: no primeiro regime, o “comprador encontra-se em erro sobre as qualidades da coisa”; porém no segundo regime, o “comprador tem direito a receber, em cumprimento da estipulação negocial, uma coisa com qualidades diferentes daquelas que possui a coisa efetivamente (mas indevidamente prestada)”. Sendo assim, segundo TEIXEIRA DE SOUSA, esta distinção leva a que seja necessário não

tratar um caso de cumprimento defeituoso como uma situação de venda de coisa defeituosa65. Para o autor, o cumprimento definitivo implica um acordo de vontades sobre a prestação da coisa e regula-se pelo conteúdo do negócio; diversamente, a venda de coisa defeituosa alicerça-se no erro do comprador sobre as qualidades do bem, assim

63 Ibidem.

64 ROMANO MARTÍNEZ, Direito das Obrigações (parte especial) …, Op. cit., p. 136.

65 Miguel TEIXEIRA DE SOUSA, «O cumprimento defeituoso e a Venda de coisas Defeituosas», in Ab Uno

(28)

que se afere pela relevância da base negocial66. Conquanto, a sua posição não é aceite por parte da doutrina, uma vez que a venda de coisas defeituosas pode constituir um caso de incumprimento ou de cumprimento defeituoso67.

2.2 O contrato de empreitada

No contrato de empreitada estamos perante um caso de cumprimento defeituoso, quando o empreiteiro entrega a obra sem ter “sido realizada nos termos devidos”, ou seja, o cumprimento realizado não se adequa à “conduta devida”. Sendo assim, quando a obra é realizada com vícios68 (imperfeições que eliminam ou reduzem o valor da obra69 ou a sua capacidade para seguir o uso expresso no contrato70, normalmente por “violação das regras especiais de segurança”) ou desconformidades (divergências relativamente ao que foi acordado), origina-se um cumprimento defeituoso71. Posto isto, estes vícios e desconformidades podem-se traduzir como defeitos que a obra apresenta. O cumprimento defeituoso da obra pode ser equiparado em alguns casos ao não cumprimento definitivo ou de mora: se o defeito for eliminado num certo período de tempo estamos dentro da mora, se continuar a existir, estamos perante um incumprimento definitivo. Posto isto, o cumprimento defeituoso apenas deterá autonomia, quando o dono da obra ao não ter conhecimento dos defeitos da obra, a aceita sem reserva, ou no caso de os conhecer, a aceita com reserva72.

Deve-se identificar mais uma vez, os tipos diferentes de defeitos:

Quando o empreiteiro devia-se ter apercebido do defeito ao agir com o normal cuidado a contruir a obra, designa-se de defeito aparente. Assim que para efeitos de eliminação da responsabilidade do empreiteiro, este tipo de defeito assemelha-se aos defeitos que o dono da obra conhecia na altura da aceitação (artigo 1219º do CC). Conclui-se que há uma presunção legal de conhecimento dos defeitos aparentes. Diversamente, quando o

66 Miguel TEIXEIRA DE SOUSA, «O cumprimento defeituoso e a Venda de coisas Defeituosas», Cit., p.

572.

67Idem, p. 570.

68 As imperfeições podem estar presentes nos materiais usados pelo empreiteiro, nas operações de

aplicação dos materiais, no método utilizado, ou na sua própria execução. Cfr. MARIANO,

Responsabilidade Contratual do Empreiteiro pelos Defeitos da Obra, Op. cit., 49.

69 A redução do valor da obra não é calculada segundo a expetativa do dono da obra, mas sim através do

seu valor normal de mercado. Cfr. João Cura MARIANO, Responsabilidade Contratual do Empreiteiro

pelos Defeitos da Obra, Coimbra, Almedina, 2004, p. 47.

70 Cfr. art. 1208º do CC.

71 ROMANO MARTÍNEZ, Direito das Obrigações (parte especial) …, Op. cit., p. 468. Vd. também

MARIANO, Responsabilidade Contratual do Empreiteiro pelos Defeitos da Obra, Op. cit., pp. 50 e 51.

(29)

dono da obra não conhece o defeito, e este não é detetável seguindo o princípio do “bom pai de família” (seja o dono da obra um especialista ou tenha contratado um técnico), estamos então perante um defeito oculto. Ainda dentro dos defeitos ocultos, deve-se anunciar os vícios redibitórios, que são aqueles que a obra suporta no momento da aceitação e que a faz tornar-se inadequada para o uso irregular, ou lhe reduz o valor73. Como refere RUI SÁ GOMES, uma obra apresenta um vício quando obsta a concretização

do seu fim normal. por exemplo, uma casa sem janelas ou sem impermeabilidade nas paredes, não vai poder impedir que haja uma infiltração de água nas paredes. Contrariamente, o autor não considera defeituosa uma obra, que apesar de não ser adequada ao fim que o dono pretende, apresenta as características que qualquer obra da mesma categoria expõe para exercer uma função ou fim normal74.

As simples alterações da obra devem estar fora da noção de defeito, uma vez que estas podem ou não originar um defeito da obra, tal como podem ou não alterar o fim para o qual foi construída a obra75.

O empreiteiro é responsável não só pelos defeitos existentes à data da entrega da obra, como pelos defeitos posteriores se estes forem resultado do seu cumprimento defeituoso.

Como refere ROMANO MARTÍNEZ, “o cumprimento defeituoso do contrato de

empreitada funda-se na ideia de que o empreiteiro está adstrito a uma obrigação de resultado”, uma vez que tem que “realizar a obra conforme o acordado e segundo os usos e regras da arte”76. O empreiteiro como é um especialista na área, tem a obrigação de comunicar ao dono da obra dos defeitos que eventualmente possam surgir. O empreiteiro tem que agir de acordo com o princípio da boa fé, logo tem que respeitar as “regras de segurança, estabilidade e utilidade da obra, mas também a forma e aspeto estético nos casos limites em que os últimos fatores devem ser considerados relevantes”77.

Quanto ao regime do cumprimento defeituoso do contrato de empreitada, o empreiteiro é responsabilizado “por todos os defeitos relativos à execução dos trabalhos ou à

73 ROMANO MARTÍNEZ, Direito das Obrigações (parte especial) …, Op. cit., pp. 468 e 469.

74 Rui Sá GOMES, «Breves Notas Sobre o Cumprimento Defeituoso no Contrato de Empreitada», Cit., p.

594.

75 Idem, p. 599.

76ROMANO MARTÍNEZ, Cumprimento Defeituoso…, Op. cit., pp. 469 e 470.

77 Rui Sá GOMES, «Breves Notas Sobre o Cumprimento Defeituoso no Contrato de Empreitada», Cit., p.

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qualidade, forma e dimensão dos materiais aplicados, quer quando o contrato não fixe as normas a observar, quer quando sejam diferentes das aprovadas”78.

Como o empreiteiro incorre em uma responsabilidade civil contratual, se lhe impõe uma presunção de culpa79. O ónus da existência do defeito pertence ao dono da obra, assim que cabe a este sujeito prová-lo (artigo 342º nº1 do Código Civil), e indicar a gravidade que acarta ao uso da obra ou à sua desvalorização monetária80. Todavia, o dono da obra apenas tem que provar a existência do defeito, pois cabe ao empreiteiro conseguir afastar a sua responsabilidade mediante a prova de que a causa do defeito lhe é alheio81. Conquanto, o artigo 1219º do Código Civil permite que o empreiteiro seja eximido de responsabilidade, no caso de o dono aceitar a obra com defeitos (parece entender-se ocultos ou aparentes) sem reservas82. Porém, segundo o entendimento de VAZ SERRA, se se tratar de vícios ocultos, a aceitação da obra com ou sem reservas, não impede o dono da obra de poder exercer os seus direitos quando os descobrir, ou seja, a aceitação da obra como isenta de vícios não pode equivaler à renúncia do exercício dos seus direitos, apenas está a anunciar que até aquele momento não encontrou qualquer vício83.

A responsabilidade do empreiteiro pode ser de igual forma excluída, se já havia erros no projeto ou se o defeito foi originado por informações ou instruções incorretas por parte do dono da obra. O mesmo acontece se o empreiteiro se apercebeu da existência de desconformidades, avisou o dono da obra, e este mesmo assim desejou seguir com o plano original84.

2.3 Consequências do cumprimento defeituoso

Em suma, relativamente ao contrato de compra e venda de coisas defeituosas, pode-se então retirar quatro consequências a favor do credor: a reparação ou substituição da coisa, a redução do preço, a resolução e, por fim, a indemnização85.

78 ROMANO MARTÍNEZ, Direito das Obrigações (parte especial) …, Op. cit., p. 471.

79 MARIANO, Responsabilidade Contratual do Empreiteiro pelos Defeitos da Obra, Op. cit., p. 54. 80 ROMANO MARTÍNEZ, Direito das Obrigações (parte especial) …, Op. cit.., p. 471. Vd. também

MARIANO, Cit., p. 58.

81 MARIANO, Responsabilidade Contratual do Empreiteiro pelos Defeitos da Obra, Op. cit., p. 59. 82 Rui Sá GOMES, «Breves Notas Sobre o Cumprimento Defeituoso no Contrato de Empreitada», Cit., p.

607.

83 VAZ SERRA, «Empreitada», BMJ, nº 146, (Maio) 1965, p. 43. 84 Rui Sá GOMES, Cit., p. 614.

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Por conseguinte, o dono da obra tem direito à: eliminação dos defeitos ou a que o empreiteiro lhe realize uma nova obra, que lhe seja reduzido o preço, à resolução do contrato, e também a uma indemnização.

2.3.1 Em especial: o exercício do direito de resolução

No contrato de compra e venda, ROMANO MARTÍNEZ entende que estas pretensões

devem ser exercidas dentro de uma sequência e não alternativamente, ou seja, em primeiro lugar, deve-se tentar reparar o defeito da coisa; caso esta não seja passível de concretizar, seja devido à sua impossibilidade propriamente dita ou, até mesmo, implique um custo demasiado oneroso, deve-se proceder à substituição da coisa. Após a tentativa falhada de estas duas pretensões, poder-se-á então exigir a redução do preço. Finalmente, se o comprador após ter exigido a redução do preço, esta não ter sido satisfatória aos seus interesses, este sujeito pode então pedir a resolução do contrato86. Apesar dos artigos 905º e 913º do CC remeterem para uma anulação, a verdade é que esta expressão foi usada de forma imprópria, uma vez que tanto os pressupostos como os efeitos pertencem à resolução87. Deve-se também referir que a posição da jurisprudência, é na sua grande maioria unânime quanto à aplicação do regime do inadimplemento dos contratos (e não o da anulabilidade)88. O artigo 913º não só consagra o direito à resolução fundamentado na inadequação ao fim, como estabelece como causa a verificação de um vício que conduza à desvalorização (entenda-se significativa) da coisa. Esta diferenciação deve-se ao facto de o vendedor em caso de devolução da coisa poder dar-lhe em princípio outro destino, enquanto o empreiteiro dificilmente o conseguirá fazer89.

O princípio da conservação dos negócios jurídicos limita as situações de resolução às circunstâncias em que o defeito é de tal forma grave, que torna a coisa inadequada face ao fim a que destina, ou a desvaloriza consideravelmente90.

Sendo assim, no contrato de empreitada, segundo o artigo 1222º do CC, o comitente apenas tem direito à resolução do contrato quando o defeito faz com que a obra não seja adequada ao fim a que se destina, ou seja, expressa que a resolução do contrato é

86 ROMANO MARTÍNEZ, Direito das Obrigações (parte especial) …, Op. cit., pp. 140 e 141. 87ROMANO MARTÍNEZ, Cumprimento Defeituoso…, Op. cit., p. 296.

88 ROMANO MARTÍNEZ, Direito das Obrigações (parte especial) …, Op. cit., p. 137. 89 ROMANO MARTÍNEZ, Cumprimento Defeituoso…, Op. cit., p. 198.

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originada por uma “execução imperfeita” (os defeitos fizeram com que a obra não fosse apta a concretizar o fim a que se destina)91.

O direito de resolução só pode ser exercido quando o dono tenha ao seu dispor a obra, pois é a partir de este momento que vai poder verificar a existência de defeitos. Por isto, se a resolução for exercida antes da entrega pelo empreiteiro (uma vez que já é notável a existência de defeitos ainda na execução da obra), tem que ser realizada nos termos do artigo 801º do CC92. Contudo, o dono da obra não pode resolver o contrato se não poder restituir/devolver o que já recebeu (com a exceção da impossibilidade de restituição for imputável ao empreiteiro)9394.

Realizada a resolução do contrato, caso o dono da obra tenha fornecido materiais para a construção da obra, tem direito a que lhe seja restituído os materiais “do mesmo género, qualidade e quantidade ou, na falta destes, do seu valor”95.

De igual forma, se o lesado transformar/usar a coisa após o conhecimento do seu defeito, a resolução deve ser tomada como ilícita, pois o lesado estaria a agir em venire contra factum proprium.

Posto isto, mesmo que o dono da obra ou o comprador tenham exigido que o “defeito fosse eliminado, a prestação substituída ou o preço reduzido”, podem na mesma exigir a resolução do contrato caso o credor não tenha visto os seus direitos satisfeitos, ou se a sua realização não foi na mesma adequada ao fim que o bem realiza96.

O artigo 289º nº1 do CC apenas abrange a devolução do valor correspondente da prestação recebida como consequência da resolução do contrato. Porém, segundo ROMANO MARTÍNEZ, o empreiteiro e o vendedor têm não só a obrigação de proceder à

devolução do preço recebido, como este deve ser acrescido de juros. O autor fundamenta-se avaliando que os juros são frutos civis (art. 212º nº 2 do CC), e a resolução deriva da culpa da parte faltosa, assim que esta deve ser igualada ao

91 Ibidem.

Segundo Rui SÁ GOMES, em «Breves Notas Sobre o Cumprimento Defeituoso no Contrato de Empreitada», Cit., p. 624, o dono da obra pode acionar o direito de resolução tanto no caso de a obra não assegurar o fim especial acordado no contrato, como no caso de não assegurar o fim normal.

92 MARIANO, Responsabilidade Contratual do Empreiteiro pelos Defeitos da Obra, Op. cit., 96. 93 MARIANO, Responsabilidade Contratual…, Op. cit., p. 98.

94 Neste sentido, João CALVÃO DA SILVA na sua obra Compra e venda de coisas defeituosas:

(conformidade e segurança), Coimbra, Almedina, 2001, p. 68, refere o mesmo para o comprador: este

sujeito pode resolver o contrato, logo que haja uma “violação suficientemente grave e inadimplemento definitivo” (já não existe a possibilidade de reparar ou substituir a coisa), porém tem que estar “em condições de restituir a coisa em contrapartida do reembolso do preço ou prove que a impossibilidade de restituição se imputa ao vendedor, por exemplo, perda ou destruição da coisa resultante do próprio vicio que a afetava na conclusão da venda”;

95 ROMANO MARTÍNEZ, Direito das Obrigações (parte especial) …, Op. cit., p. 488. 96 Idem, pp. 299 a 301.

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“possuidor de má fé” no que concerne à restituição dos frutos (expresso no artigo 1271º do Código Civil). De igual forma, os dois sujeitos supramencionados têm que pagar à outra parte as despesas contratuais97.

A resolução de um contrato normalmente é total. Conquanto, se tiverem sido entregues uma multiplicidade de bens, e somente uma parte de estes se encontravam com defeito, é possível que o lesado apenas invoque uma resolução parcial do contrato. Por conseguinte, o preço acordado entre as partes tem que ser reduzido. Todavia, no contrato de empreitada, a maioria da doutrina tem entendido que a resolução neste contrato não pode ser realizada parcialmente, uma vez que por norma, a obra considera-se um “todo indivisível” (logo não pode constituir efeitos parciais). A resolução parcial do contrato de empreitada parece ser aceite apenas nos casos em que a obra seja constituída por elementos independentes98.

2.3.2 Em especial: o exercício do direito à indemnização

Além da resolução, também se deve abordar o direito à indemnização, uma vez que este meio jurídico pode ser cumulado com qualquer das pretensões levadas a cabo pelo comprador.

A indemnização proveniente do cumprimento defeituoso dos contratos de empreitada e de compra e venda, tem as suas normas consagradas nos artigos 908º e ss., 915º e 1223º do Código Civil, porém está sujeita aos termos gerais consagrados nos artigos 562º e ss. do Código Civil (restituição da situação existente antes da celebração do contrato). Segundo ROMANO MARTÍNEZ, estes termos gerais aplicam-se dificilmente ao

cumprimento defeituoso. O autor explica que a indemnização pode ser pedida no caso de haver um inadimplemento imperfeito: se o comprador ou o dono da obra resolverem o contrato, têm direito a pedir cumulativamente uma indemnização pelo “interesse contratual negativo” (artigos 801º nº 2, 908º, 909º e 1223º do Código Civil), que como bem diz LARENZ, “restitui-se a situação, como se a parte lesada não tivesse confiado no

contrato que celebrou”. A indemnização opera assim, como um complemento dos deveres de restituição, uma vez que se pretende obter a “eficácia retroativa da resolução dos contratos” 99. A indemnização pode consistir em uma restauração natural ou

97 Idem, p. 304. 98 Idem, pp. 308 e 309. 99 Idem, pp. 309 a 312.

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semelhante, sendo que o seu quantum não pode ser influenciado pelo grau de culpa do lesante100.

Na venda de coisas defeituosas existe apenas uma responsabilidade objetiva, e o vendedor será responsabilizado mediante o grau da sua culpa. Tal como já foi referido, a indemnização não pode ser pretendida em substituição da resolução do contrato (ou qualquer outra pretensão), e sim apenas em suplemento de esta, uma vez que o que se pretende com a indemnização é a reparação do prejuízo excedente101.

Segundo CURA MARIANO, o empreiteiro com o exercício do direito de resolução, tem que indemnizar o dono da obra pelos “danos emergentes e lucros cessantes provocados pela celebração e pelo cumprimento do contrato”. Refere ainda, que com a indemnização, o dono da obra não pode obter vantagens que resultariam do cumprimento do contrato, pois já se estaria no âmbito do “interesse contratual positivo”. Deste modo, a indemnização tem que abarcar apenas as despesas que o dono da obra sofreu, e os benefícios que deixou de ter com a celebração do contrato de empreitada102.

2.3.3 Prazos

Cabe por fim, abordar os prazos do exercício das pretensões a que tem direito o vendedor, mais concretamente, o direito de resolução.

No contrato de compra e venda, para que haja uma responsabilidade por cumprimento defeituoso, é indispensável que o defeito seja denunciado103. O comprador tem que anunciar ao vendedor o tipo de defeito que a coisa padece, ou seja, tem que o informar que a coisa contém um vício ou não se adequa à qualidade combinada. A denúncia não é necessária no caso de o vendedor ter agido com dolo (artigo 916º nº 1 do CC)104. É do entendimento geral, que no caso de o empreiteiro ter agido com dolo, ou seja, tentou esconder os vícios de que padecia a obra, não se aplicam os prazos supramencionados e sim os do regime geral do dolo consagrados nos artigos 253º a 286º do CC105.

100 MARIANO, Responsabilidade Contratual do Empreiteiro pelos Defeitos da Obra, Op. cit., p. 106. 101 ROMANO MARTÍNEZ, Direito das Obrigações (parte especial) …, Op. cit., pp. 139 e 140.

102 MARIANO, Responsabilidade Contratual do Empreiteiro pelos Defeitos da Obra, Op. cit., pp. 105 e

106.

103 Vd. art. 916 nos 2 e 3 do Código Civil.

104 ROMANO MARTÍNEZ, Direito das Obrigações (parte especial) …, Op. cit., p. 142. Neste sentido, VAZ

SERRA, «Caducidade: Empreitada – Venda de coisas defeituosas», BMJ, nº 293, (Fevereiro) 1980, p. 254:

“o comprador tem, pois, de denunciar os vícios e defeitos ao vendedor” nos prazos estipulados por lei, pois caso contrário, “a ação de anulação não pode ser instaurada”.

(35)

Na maior parte dos casos, a denúncia tem que ser realizada nos 30 dias subsequentes ao conhecimento do defeito por parte do comprador, e “dentro dos 6 meses após a entrega da coisa”. Caso se trate de um bem imóvel, os prazos são, respetivamente, de 1 e de 5 anos106.

No contrato de empreitada, o dono da obra se após a aceitação da obra descobrir defeitos, tem que no prazo de 30 dias proceder à respetiva denúncia diante do empreiteiro (artigo 1220º nº1 do CC). Na situação de estar em causa “a construção, modificação ou reparação de imóveis destinados por sua natureza a longa duração”, o prazo de denúncia prorroga-se para 1 ano após o descobrimento dos defeitos (artigo 1225º nº 2 do CC).

O artigo 1220º nº2 do CC equipara o reconhecimento dos defeitos por parte do empreiteiro à denúncia.

Os direitos do dono da obra estão consagrados nos artigos 1221º e ss. do CC, porém estão sujeitos a prazos de caducidade considerados diminutos107. O artigo 1224º nº 2, 2ª parte do CC estabelece o prazo de 2 anos “a contar da entrega da obra, para o caso de defeitos ocultos que forem descobertos e denunciados após a aceitação”, uma vez que é a partir da entrega da obra que o seu dono vai ter uma grande probabilidade de encontrar os seus defeitos108.

106 Verificar art. 916º nº 2 do Código Civil.

107 Cfr. Art. 1224º nº1 e nº 2, 1ª parte do Código Civil.

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3. A RESOLUÇÃO DO CONTRATO

3.1 Caraterísticas

Segundo ÁLVAREZ VIGARAY, a resolução de um contrato bilateral pelo não comprimento da contraparte é em princípio uma anomalia. O autor justifica-se, explicando que o não cumprimento da obrigação não destrói o vínculo jurídico entre as partes pois a parte lesada pode sempre reivindicar os seus direitos pela via judicial109. A resolução do contrato bilateral por não cumprimento é composta por três requisitos: “reciprocidade das obrigações, inexecução de uma ou várias das obrigações contratuais, (e por último, o) prévio cumprimento do credor que pede a resolução”110.

A resolução por não cumprimento do contrato não pode ser exercida nos casos em que o dito incumprimento não tenha sido gravoso e importante, uma vez que se assim não fosse, estar-se-ia a colocar em causa o principio da boa fé111.

Segundo BARASSI, o não cumprimento deve ser de tal forma grave, que viole a

pretensão da parte lesada na concretização do contrato (se o não cumprimento fosse previsível nunca o contrato teria sido realizado)112.

Sendo assim, a resolução convencional verifica-se, quando perante o não cumprimento de uma das partes, as mesmas chegam a um acordo quanto à resolução do contrato sem a necessidade de se partir para a via judicial113.

3.2 Efeitos

Esta resolução, pode dar lugar também a um direito de indemnização à parte lesada e tem efeitos retroativos114, ou seja, as partes ficam em uma situação como se nunca tivessem celebrado o contrato115.

109 Rafael ÁLVAREZ VIGARAY, La resolución de los contratos bilaterales por incumplimiento, 3ª edição,

Granada, Comares, 2003, p. 92.

110 ÁLVAREZ VIGARAY, Op. Cit., p. 175. 111 Idem, p. 213.

112 BARASSI, apud ÁLVAREZ VIGARAY, Op. Cit., p. 214. 113 ÁLVAREZ VIGARAY, Op. Cit., p. 323.

114 Idem, p. 324.

Referências

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