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ALEXANDRO FERNANDES PRESSUPOSTOS EPISTEMOLÓGICOS HUME: CÉTICO OU NATURALISTA?

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Academic year: 2021

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ALEXANDRO FERNANDES

PRESSUPOSTOS EPISTEMOLÓGICOS HUME:

CÉTICO OU NATURALISTA?

FACULDADE DE EDUCAÇÃO SÃO LUÍS

JABOTICABAL – SP

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ALEXANDRO FERNANDES

PRESSUPOSTOS DA EPISTEMOLOGIA DE HUME:

CÉTICO OU NATURALISTA?

Trabalho apresentado à Faculdade de Educação São Luís, como exigência parcial de Conclusão de Curso de Licenciatura Plena em Filosofia.

Orientador: Profº. Ms. Fábio Rodrigo Leite

FACULDADE DE EDUCAÇÃO SÃO LUÍS

JABOTICABAL – SP

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AGRADECIMENTOS

Especialmente à minha amada esposa pela oportunidade de ir em busca da realização de meus sonhos e concluir mais uma etapa da minha vida, apoiando e direcionado-me para o caminho do bem. Sua dignidade, perseverança e sapiência foram fatores preponderantes impulsionando-me a seguir para o caminho do conhecimento.

Aos professores do curso em especial: Profº. Fábio Rodrigo Leite, meu orientador, pela sua atenção e confiança atribuída, sem a qual, não teria realizado este artigo; Profº. Emerson Rodrigo Camargo, por proporcionar debates calorosos contribuindo para com a minha formação; Profº. Carlos Eduardo Mangili; Profº. Divino Aizza pela sua amizade e compreensão. Enfim, agradeço a todos que foram mais do que mestres e amigos, compreendendo minhas dificuldades e transmitindo seus conhecimentos proporcionando-me uma outra visão de mundo.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO... 08

2 UMA BREVE HISTÓRIA DO CETICISMO ACADÊMICO E PIRRÔNICO...11

3 HUME ENTRE OS CETICISMOS ACADÊMICO E PIRRÔNICO...14

CONSIDERAÇÃO FINAL...... ....21

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LISTA DE QUADROS

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“Andei reunindo pedacinhos de papel onde estas anotações vadias foram feitas e ofereço-as ao leit or, sem que pretenda convencê-lo do que penso nem convidá -lo a repensar suas idéias. São palavras que, de modo canhestro, aspiram enveredar pelo avesso das coisas, admitindo-se que elas tenham um avesso, nem s empre perceptível, mas às vez es curioso e surpreendente”.

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RESUMO

Este artigo tem por objetivo apresentar ao leitor a característica real do pensamento empregado por David Hume, enquanto identifica os pontos centrais de sua teoria epistêmica, bem como a pretensão de caracterizar sua filosofia diante da díade ceticismo/naturalismo, discussão frequentemente abordada ao longo da História da Filosofia. A partir disso, procura contrapor e conciliar a interpretação do ceticismo Pirrônico e Acadêmico, para destacar o ceticismo em Hume e caracterizar, no interior da filosofia cética, qual tipo de ceticismo melhor se adapta a seu pensamento.

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1 INTRODUÇÃO

O empirismo surge como forte opositor ao racionalismo, através de uma nova proposta para explicar a origem do conhecimento humano. Segundo os empiristas, a origem de todo o conhecimento desenvolve-se por meio de dados sensoriais (sentidos). O empirismo tem como principais expoentes: John Locke, George Berkeley e, principalmente, David Hume, fonte do presente estudo.

Tanto no Tratado da natureza humana (T), como na Investigação acerca do

entendimento humano (IEH), Hume descreve como se desenvolve o processo do

conhecimento bem como a origem deste processo, no qual, concomitantemente, revela-nos um dos pontos centrais de sua teoria, ou seja: o conhecimento se dá por meio da observação e experiência, isto é, o princípio de todo conhecimento está fundado nas percepções. Esta, diz ele, podem ser divididas em dois momentos como impressões e ideias, as quais, por sua vez, distinguem-se em simples e complexas,1 diferentemente da concepção inatista desenvolvida por Descartes2.

Cada um admitirá prontamente que há uma diferença considerável ent re as percepções do espírito, quando uma pessoa sent e a dor do calor excessivo ou o prazer do calor moderado, e quando depois rec orda em sua memória esta sensação ou a antecipa por meio de sua imaginação (IE H, 2,3).

As impressões são sensações mais vivazes, fortes, por meio das quais estabelecemos contato direto com os dados, pois são derivadas das experiências cotidianas e são indubitáveis. As impressões podem dividir-se em dois tipos: impressões externas, como cores, sons, aroma, entre outros, ou impressões internas, são referentes as nossas paixões e emoções.

1

HUME D. Tratado da Natureza Humana e Investigação acerca do entendimento humano.

2

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Segundo Hume, as ideias, por sua vez, são cópias das impressões e, como tais, provêm delas, mas são menos vivazes, pálidas, isto é, as ideias não são fontes de conhecimento e não se confundem com as impressões, ou seja, as ideias são

cópias imperfeitas das impressões:

Todas as cores da poesia, apesar de esplêndidas, nunca podem pintar os objetos naturais de tal modo que se tome a descrição pela paisagem real. O pensamento mais vivo é sempre inferior à sensação mais embaçada (IE H, 2,3).

Ao estabelecer uma análise da teoria do conhecimento de Hume , é preciso antes de tudo considerar a divisão que ele faz com relação à estrutura do conhecimento humano: “todos os objetos da razão podem dividir-se naturalmente em dois gêneros, a saber: relações de ideias e questões de fatos” (IEH, 2,3).

O conhecimento referente às relações de ideias está intimamente relacionado ao conhecimento matemático, geométrico e algébrico, que são tipos de conhecimento sobre o qual podemos demonstrar sua verdade a priori, isto é, toda afirmação que é intuitiva ou logicamente certa. As proposições desse tipo de conhecimento são indubitáveis, porém, este tipo de conhecimento nos fornece apenas abstrações.

Por outro lado, o conhecimento referente a questões de fato são formados por juízos provenientes da experiência (juízos empíricos) que expressam conexões, interdependências e relações que descrevem fenômenos concretos. Desta maneira, considera-se que os raciocínios referentes a questões de fato, supõe-se que se relacionam por meio da relação de causa e efeito, e que “é somente por meio dessa relação que podemos ir além da evidência de nossa memória e nossos sentidos” (IEH, 4,4).

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provocará constantes arbitrariedades, as quais não levará a conhecimento algum. Toda proposição referente a questões de fato, não podem ser explicados pela razão, mas sim pela experiência.

Questões de fato, que são o tipo de objetos da razão humana, não são apuradas da mesma maneira, e tampouco nossa evidência de sua verdade, por grande que seja, é da mesma natureza que a precedente. O contrário de toda questão de fato permanece sendo possível, porque não pode jamais implicar cont radição e a ment e o c oncebe com a mesma facilidade e clareza, como perfeitamente ajustável à realidade [...] e seria

vão, portanto, tentar demonstrar sua falsidade. Se ela fosse

demonstrativamente fals a, implicaria uma contradição e jamais poderia s er distintamente concebida pela ment e (IE H, 4,2).

Todo conhecimento referente a questões de fato depende estritamente de nossa confiança na experiência passada enquanto padrão de nossos juízos futuros, ou seja, o conhecimento depende da suposição de que o futuro será sempre conforme o passado ou de que os eventos futuros seguirão o mesmo padrão já observado.

A distinção oferecida por Hume, com relação ao conhecimento baseado em relações de ideias e conhecimento sobre questões de fato permite indicar se o conhecimento relativo às questões de fato nunca poderá obter o mesmo tipo de certeza demonstrativa. Apesar de este tipo de conhecimento não poder ser demonstrado a priori, já que o seu contrário não implica em contradição, mesmo assim o homem atribui certo grau de certeza, confiança, crença e objetividade ao conhecimento relativo às questões de fato. Mas, de que maneira o homem atribui essa confiança? Todos os raciocínios provenientes de dados experimentais dependem da imaginação apoiada em particular no princípio do hábito ou crença. Desta maneira, portanto, supõe-se por meio de inferências que os eventos do passado, seguirão os mesmos padrões no futuro.

Para Hume, o hábito é o “princípio que torna útil” à experiência e permite ao homem ultrapassar a experiência imediata e chegar ao conhecimento das questões de fato. Quaisquer inferências que tiramos da experiência estão em constante relação com o costume ou hábito, em outras palavras, não são fundamentados por princípios racionais.

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naturais, constituindo-se em uma lei universal, foi atacada com especial atenção por esse filósofo. Essa teoria foi comumente utilizada por vários inté rpretes do racionalismo, servindo como ferramenta para explicar a racionalidade do real (a razão, por iluminar o real, percebe as relações, conexões ou interdependência entre todas as coisas) em termos da relação de causa e efeito, estabelece assim, um vínculo causal entre tudo o que acontece por meio de encadeamentos de raciocínios, buscando justificação por meio da razão.

Segundo Hume (2004), a causalidade desenvolve -se por meio de “repetição e regularidade em nossa experiência, constata-se uma conjunção constante entre fenômenos que, por força do hábito, acabamos por projetar na realidade, tratando-a em algo existente” (IEH, 5,2). Ao analisar o exemplo das bolas de bilhar utilizado por Hume, tudo o que se observa é, apenas o movimento das bolas de bilhar em uma mesa, tudo o que vê é o impacto do taco sobre a primeira bola e, por sua vez, o impacto da primeira bola sobre a segunda, mas a “causalidade propriamente dita não pode ser observada” (IEH, 5,2), ou seja, por mais minuciosa que seja nossa investigação, nunca poderemos encontrar o efeito na suposta causa, mesmo porque todo efeito é totalmente distinto de sua causa. Esse tipo de suposição ou inferência não decorre apenas de um único caso, mas apenas depois de uma longa série de experiências sobre qualquer gênero dado, apoiado por nossa crença , fica-se confiante em relação a um evento particular. Por isto a crença não é nada mais do que o resultado de nossas impressões mais fortes e vivazes que se apresentam por meio dos fenômenos. Assim, ela não possui nenhum aporte metafísico.

Portanto, tudo o que a experiência revela, é uma conjunção constante entre fenômenos, e não uma conexão necessária que chamamos de causalidade. Nesse sentido, o ceticismo presente em Hume torna-se evidente, sendo necessário abordá-lo com maior profundidade.

2 UMA BREVE HISTÓRIA DOS CETICISMOS PIRRÔNICO E

ACADÊMICO

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princípio primordial do cético é contrapor a toda preposição outra equivalente, com a finalidade de obter a suspensão do juízo.

O ceticismo acadêmico, como o próprio nome sugere, tem suas raízes fundamentadas na Velha Academia fundada por Platão, ou seja, surge num período “compreendido como deteriorização das doutrinas platônicas, bem como das ideias sistematizadas pelo seu fundador” (SMITH, 1995). A Nova Academia, termo o qual, é mencionado na história da filosofia, teve como representantes máximos dois grandes filósofos céticos da Antiguidade: em um primeiro momento conta com a figura imponente de Arcesilas, seu fundador. Arcesilas possuía excelentes qualidades intelectuais, pois sempre conseguia obter grandes êxitos em suas críticas, solapando o raciocínio de seus interlocutores. O filósofo cético desenvolvera uma nova forma de pensamento em relação ao conhecimento e verdade, onde sempre argumentava no sentido de que não se deve “afirmar ou negar opiniões com relação à existência e inexistência das coisas e da realidade, e que na falta de assentimento, o mais adequado é suspender o juízo (epoké)” (SMITH, 1995). Justamente por adotar essa posição Arcesilas foi extremamente criticado por Crisipo, o Estóico. As críticas iniciais possibilitaram a Arcesilas desenvolver uma nova posição baseada nos princípios céticos, com a elaboração do critério da razoabilidade (eúlogon). Dessa forma, Arcesilas entendia que, mesmo sendo um cético, poderia posicionar alguma opinião (justificação) em relação às coisas referentes ao fenômeno sem negar ou afirmar algo a respeito.

Com Carnéades, o ceticismo acadêmico ganhou ares mais refinados, isto é, Carnéades se preocupara mais com o desenvolvimento da ação e com o critério de conduta de nossa vida. A representação, segundo ele, tem uma relação constante com o objeto de onde supostamente ela proviria e outra com o sujeito que a percebe, como por exemplo: “se não se pode saber de onde supostamente o objeto provém nem afirmar ou negar sua existência, por outro lado, sabe-se como ele aparece, sem que desta forma possa ser dito algo a respeito de sua realidade. Por conseguinte, não negamos nem afirmamos a realidade das coisas, e podemos dizer apenas o que percebemos por nosso ponto de vista subjetivo” (SMITH, 1995).

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que por sua vez, é uma tradução do grego peithô que significa persuadir. Em outras palavras, é uma teoria sobre a nossa aceitação em relação a certas representações. Nas palavras do próprio Carnéades3, “se essa probabilidade implicaria uma crença ou não deixo em aberto, mas seguindo a prática cética darei pelo menos um argumento para cada lado” (SMITH, 1995).

Portanto, a linha de interpretação feita até o momento, pode-se dizer que quando Carnéades mencionou que a verdade absoluta é inapreensível não se trata de dogmatismo negativo conforme muitos apontam. O cético acadêmico admite um meio-termo entre a certeza inacessível e incerteza absoluta. È sobre estes dois pontos vista que reside o pensamento tanto do cético acadêmico como também do pirrônico. Trata-se de uma forma de manifestação cética, isto é, para cada argumento existe outro com a mesma força (eles são equipotentes) e, na falta de bases racionais para decidir entre um e outro, opta-se pela suspensão dos juízos, no caso dos céticos pirrônicos (como será exposto mais à frente). No caso dos acadêmicos, considera-se qual a razoabilidade ou probabilidade de cada um.

O ceticismo pirrônico, por sua vez, tem início com o filósofo Pirro de Elis (365-275 a.C). Daí o nome de ceticismo pirrônico, isto é, aquele ceticismo que tem a sua inspiração em Pirro e não em Sócrates ou Platão, como o ceticismo acadêmico. Com relação ao filósofo fundador (Pirro), têm-se pouquíssimas referências, ou seja, apenas uma vaga ideia de seu pensamento, oo qual antecipa alguns aspectos do ceticismo que foram traduzidos nas obras de Sexto Empírico, sobretudo em suas

Hypothyposes pirronianas.

A base fundamental do ceticismo pirrônico está alicerçada na originalidade de Pirro, que recomendou uma dúvida sistemática sobre todas as coisas, distinguindo entre a realidade e aquilo que aparece para nós (fenômenos). Pirro negou que a realidade pudesse ser conhecida por nós e, segundo ele, não podemos conhecer a natureza das coisas, mas apenas saber como elas aparecem para nós. O grande filósofo cético se interessava mais pela felicidade do que pelos problemas do conhecimento, ou seja, a recusa do conhecimento para ele era um meio de alcançar a felicidade plena. Para ele a prática tinha valor superior a teoria, a maneira de viver é mais importante do que o conhecimento da verdade. O pensamento filosófico desenvolvido por Pirro tem como principal característica o método investigativo e

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dubitativo das coisas, sobretudo da realidade, ou seja, para o cético as coisas são tais como elas se apresentam (fenômeno). Uma das diretrizes do ceticismo pirrônico é não afirmar ou negar nada do que ultrapasse o domínio da evidência empírica. O pirrônico é aquele que tem a capacidade de alcançar a tranquilidade por meio de uma oposição de argumentos, e, na falta de bases racionais para decidir qual argumento é o melhor devido às múltiplas opiniões, o cético encontra -se num estado de indecisão, não lhe restando outra maneira a não ser suspender o juízo.

Com a morte de Pirro, o ceticismo pirrônico passou por diversas transformações até a chegada de Enesidemo que, mesmo opondo-se aos acadêmicos, conservou algumas características, dentre as quais: menos aplicação prática e maior aplicação teórica, onde a preocupação com o conhecimento passou para o primeiro plano e a tra nquilidade, antes tão exaltada por Pirro, adquiriu um caráter secundário. Conforme citado anteriormente, o que se conhece hoje do ceticismo pirrônico, deve-se especialmente a Sexto Empírico, quem por meio de suas obras, organizou e sistematizou todo o pirronismo grego. Sexto Empírico, mesmo não tendo contribuições originais para o pirronismo, expôs com cuidado a doutrina de seus predecessores.

Para finalizar esta seção, expõe abaixo um quadro comparativo entre o ceticismo acadêmico e pirrônico:

Quadro 1 – comparação das escolas céticas: Pirrônica e Acadêmica.

3 HUME ENTRE OS CETICISMOS PIRRÔNICO E ACADÊMICO

David Hume é considerado tradicionalmente como um fi lósofo cético, mas, ao longo da história, vários autores preocuparam-se em elaborar ensaios na tentativa de rejeitar a interpretação cética de sua filosofia, atribuindo a ela outras classificações, dentre as quais a de naturalista: corrente filosófica que tem como

PIRRÔNICO ACADÊMICO

Prático Prático

Teórico Teórico

Investigativo Investigativo

Dubit ativo Dubit ativo

Equipolência Equipolência

Viver de acordo com a natureza Viver de acordo com a natureza

Tranquilidade Tranquilidade

Suspensão total dos Juízos Suspensão parcial Juízos

Razoabilidade

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principal objetivo viver de acordo com as leis da natureza. O que não se pode admitir.

O propósito desta seção que é estabelecer argumentações que servirão como subsídios para destacar o ceticismo em Hume e caracterizar, no interior da filosofia cética, qual tipo de ceticismo melhor se adapta ao seu pensamento.

Após apresentar na Investigação (IEH), as origens dos diferentes tipos de conhecimentos de que dispomos e as etapas nas quais eles se processam, Hume, destina o último capítulo, precisamente, a seção XII, intitulada “Da filosofia acadêmica ou cética”, para evidenciar os tipos de ceticismo, e em especial uma crítica ao ceticismo radical, denominado por ele de pirrônico. Mas não é só, como veremos nas páginas finais deste trabalho, além da desconfiança patente que David Hume, manifesta acerca do conhecimento empírico, ele estende essa desconfiança até mesmo ao poder da razão.

Especificamente no terceiro parágrafo da Investigação, Hume começa a abordar o ceticismo antecedente, o qual teria sido uma espécie de ceticismo bastante recomendada por Descartes. Lembremos que, para Descartes, a dúvida universal instaurada na 1ª meditação não se restringia apenas às nossas opiniões, mas também incidia em nossas próprias faculdades cognoscitivas. O ceticismo antecedente ou radical proposto por Descartes consistia na projeção da dúvida extrema sobre todas as ideias, para, depois, construir, por meio de uma cadeia de raciocínios, deduzida de um princípio primitivo indubitável, todo o corpo do conhecimento. Criticando a pretensão cartesiana, Hume diz o seguinte sobre semelhante método: “contudo, não há semelhante princípio primitivo com prerrogativa sobre os outros princípios evidentes em si mesmos e convincentes, isto é, mesmo que houvesse um princípio primitivo não progrediria um passo além deste princípio utilizando da mesma faculdade da qual se duvida. Portanto, se um ser humano fosse tomado pela dúvida cartesiana, ficaria completamente incurável, por viver em uma constante dúvida hiperbólica” (IEH, 12,2).

Hume (2004) destaca a impossibilidade de sustentação por meio desta posição, utilizando-se de duas argumentações, conforme podem ser encontradas na

Investigação (IEH): primeiro, a tentativa de destruição da razão por meio de

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Com relação ao ceticismo sendo autorrefutante, Hume destaca: “pode parecer uma tentativa muito estranha dos céticos destruir a razão por meio dos argumentos e do raciocínio: no entanto é este o escopo de todas as suas inquirições e disputas” (IEH, 12, 2).

Em relação ao ceticismo radical, encontra-se em Hume a seguinte argumentação: se o ceticismo radical fosse levado a sério, teria como consequência o desaparecimento de toda a humanidade...

[...] toda a vida humana teria de perecer, se os seus princípios

prevalecessem de maneira universal e permanente. Cessaria

imediatamente t odo o discurso e toda a ação; os homens ficarão em total letargia, até que as necessidades da natureza, insatisfeitas, ponham fim a sua miserável existência (IE H, 12, 2).

O que Hume havia se proposto, até então, não era refutar o ceticismo pirrônico ou radical, mas, sim, demonstrar sua invalidez na sociedade, diferentemente de outros sistemas: “um copernicano ou ptolomaico pode, cada um argumentando a seu favor, falar sobre seus específicos sistemas de astronomia, obtendo com êxito ouvintes constantes e duráveis; já, por outro lado, o pirrônico encontraria dificuldade em introjetar sua filosofia, fazendo com que a mesma tivesse influência constante em seu auditório” (HUME, 2004).

De acordo com o que foi dito acima, torna-se evidente que Hume não defende nenhum tipo de ceticismo radical ou pirrônico. Mas isso não significa que Hume não tenha sido cético. Pelo contrário, ele adota e recomenda o que chama de filosofia cética, no entanto, que utiliza frequentemente argumentos céticos em suas obras.

Segundo Stroud (2008), não há dúvidas de que Hume, como um filósofo, acredita que essas conclusões (céticas) negativas são corretas, pois elas apresentam uma parte significativa de sua contribuição para a filosofia. Sendo assim, a recomendação de Hume ao que chama de ceticismo, não é simplesmente uma recomendação, mesmo porque, segundo ele, não são críveis na vida cotidiana, ou seja, as conclusões céticas para ele, não servem como um conjunto de princípios para guiar nosso pensamento e conduta, pois a “natureza emergirá a tempo, a fim de controlar nossos impulsos” (IEH, 12).

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naturais, onde o primeiro é responsável pelo desenvolvimento de nossas dúvidas, proporcionando meios para não nos fiarmos em tudo o que nos é apresentado por nossos sentidos ou, de igual modo, no que nos é fornecido pela razão. O segundo aspecto refere-se a nossas inclinações naturais, e diz respeito ao direcionamento de nossa vida cotidiana. Diante dessa óptica das inclinações naturais, Hume diz que seguir as necessidades da natureza não é o melhor para maior parte da humanidade, pois os homens são naturalmente aptos a serem afirmativos e dogmáticos em suas opiniões, lançando-se, muitas vezes precipitadamente, a erros e ilusões. Por isso, Hume pensa que uma pequena tintura de pirronismo poderia abater o orgulho das pessoas e ajudá-las a alcançar um grau de dúvida, precaução e modéstia, que em todo escrutínio e decisão deveriam sempre acompanhar um pensador justo.

Para muitos intérpretes, quando Hume adota os princípios da natureza como nosso guia, ele assume uma postura naturalista, mas, se nos livrarmos do imediatismo de leituras preconcebidas e estabelecermos uma reflexão profunda, perceberemos que: “se submetermos-nos às forças da natureza sob certas condições pode ser uma forma de ceticismo” (Stroud, 2008). Sendo assim, concomitantemente, aproximaremos Hume de alguns céticos antigos (pirrônicos), que encontraram uma maneira de viver livres de perturbações ao seguirem suas inclinações naturais.

Segundo Hume (2004), “alguns dos céticos parecem ter pensado que poderiam alcançar um estado feliz somente se não tivessem convicções ou crenças”. Todavia, nosso filósofo pensava que ninguém poderia viver sem convicções ou crenças, mas, ao mesmo tempo, via-se nesta velha tradição cética pelo menos em sua recomendação em face do que é mais completamente natural. Por esta razão, Richard Popkin (1966, p.89) chama Hume de pirrônico.

Hume, na verdade, defende um ceticismo moderado ou mitigado que, ao mesmo tempo, poderia ser durável e útil, se o bom senso e a reflexão corrigissem até certo ponto nossas dúvidas indiferenciadas, ou seja, a dúvida, com certo grau de prudência, deve sempre acompanhar o homem que raciocina corretamente. Mas de que forma o ceticismo mitigado se origina? A resposta a essa pergunta, trataremos de construí-la passo a passo a fim de evitar precipitações e erros.

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pirrônico” porque “quaisquer dúvidas a que chegarmos” serão instáveis e produzirão somente “pasmo e confusão momentânea”, mas, concomitantemente, explicita ele que, se não chegarmos a estas dúvidas céticas, a solução não seria solução nenhuma. Por outras palavras, Hume não nega o ceticismo, ele nos alerta para que não fiquemos inteiramente convencidos da dúvida pirrônica, devido a sua impossibilidade de ser desenvolvida na prática. Hume pensava que ninguém poderia viver sem convicções ou crenças, por isso recomendava que a única maneira de nos livrarmos das dúvidas excessivas estava no forte poder do instinto ou hábito.

Em conformidade com o que foi citado acima, Popkin (1966) nos diz o seguinte: “se não podemos evitar a crença e o raciocínio humano porque julgamos que sejam tão naturais, não precisamos então, refutá-los por meio de princípios céticos”. Ainda segundo o referido autor, “aceitar a inevitabilidade de crenças e convicções seria meramente uma extensão legítima do princípio pirrônico de viver de acordo com a natureza”.

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com relação ao conhecimento abstrato e metafísico, cujo conteúdo foge completamente de seu alcance.

Robert Fogelin (1983) defende que o ceticismo moderado de Hume seja resultante de dois fatores causais: a dúvida radical pirrônica e a propensão natural para crer. Lívia Guimarães (1996) apresenta o ceticismo humeano como pirrô nico extremado em relação à teoria e acadêmico mitigado quanto às ações. Malherbe(1992). por outro, lado qualifica sua ciência, isto é, a ciência da natureza humana de dogmática na vida comum e cética na filosofia. Por último, Peter Strawson (1985) afirma que Hume teria adotado dois níveis de conhecimento em sua filosofia, a saber, o filosófico, que não nos oferece segurança contra o ceticismo, e o pensamento empírico diário, no qual as pretensões do pensamento crítico são superadas pela natureza.

De acordo com a leitura dos diversos intérpretes acima citados, torna-se clara a recomendação da busca do ceticismo mitigado ou acadêmico feita por Hume, talvez por ser ela a melhor ou única maneira de ser realizada naturalmente, ou seja, para que essa busca possa surgir, não é necessário extraí-la da filosofia abstrusa. Sendo, portanto, a mais feliz da condição humana, Hume não reluta em crer ou enunciar os fatos da natureza humana , de que da sua concepção depende do melhor tipo de vida para o ser humano. Portanto, a busca da filosofia cética é a melhor maneira de dar expressão adequada para todas as tendências ou propensões naturais que constituem o ser humano, fazendo-nos distanciar cada vez mais das pretensões vazias e incertas da razão.

Segundo Hume (2004), tudo aquilo que descobrimos por meio da razão e que chamamos de conhecimento não é mais do que mera probabilidade. Por causa dessa afirmativa, nosso filósofo, ao longo do tempo, foi fortemente atacado, sendo até chamado de filósofo irracionalista, termo por nós considerado paradoxal. Mas, por qual motivo, Hume nos diz que o conhecimento obtido pela razão não é mais do que mera probabilidade? E o que nosso filósofo entende por razão no contexto dos argumentos céticos?

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razão deve considerar-se como uma espécie de causa, que é efeito da verdade, mas que frequentemente pode ser impedido pela interrupção de outras causas, degenerando em probabilidade e esta pode ser em maior ou menor grau.

O fato de a razão, faculdade que o filósofo julga ser falível, não determinar necessariamente que tenhamos veracidade e fidelidade absoluta em nosso conhecimento, possibilitando o surgimento de erros, faz com que, novamente, a probabilidade seja introduzida. À medida que fazemos sucessivas inspeções em nosso entendimento, ficamos inseguros de sua veracidade, resultante do enfraquecimento lógico bem como a falta de evidência da crença.

Os fatos descritos anteriormente deixam claro que a razão rejeitada por Hume é a razão dos raciocínios abstratos que fornecem deduções e conclusões inaceitáveis para o senso comum. Dessa forma, e apenas dessa forma, podemos considerá-lo como sendo um filósofo irracionalista. Um dos exemplos bastante utilizado por ele é o da infinita divisibilidade da extensão, em que, segundo ele, a razão esquece os seus limites e lança-se para deduções abstratas, atingindo resultados contraintuitivos. Se na vida ordinária a infinita divisibilidade da extensão não nos causa repugnância, os raciocínios profundos nos mostram que, partindo de premissas aceitas por todos, chegamos, no caso em questão, a conclusões absurdas, mesmo que por uma cadeia de raciocínios claros. Tal é o caso da divisibilidade ao infinito da extensão.

Como forma de contrastar a opinião dada por aqueles que defendem a divisibilidade infinita da extensão, Hume, oferece outro argumento a favor da divisão finita da extensão, mesmo porque, para nosso filósofo, o espaço não pode ser entendido como infinitamente divisível devido à capacidade limitada de nossas faculdades mentais. Tudo o que consideramos como infinito parte das ideias que acrescentamos ao objeto, ou seja, a ideia de infinitude não parte do pressuposto da objetividade dada pela inspeção de nosso raciocínio, pois o mesmo é impossibilitado de demonstrar de forma concreta e, sim, parte de nossas próprias construções subjetivas.

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Portanto, podemos concluir que se a ideia de divisão finita da extensão tem em sua base a mesma equipolência da divisibilidade infinita extensão, então, vemos que a razão por si só esbarra na própria razão oferecendo dois tipos de raciocínios contraditórios. Ao deparar-se com essa dificuldade em decidir qual raciocínio devesse tomar como fiável, Hume, ao invés de suspender totalmente os juízos como proposto pelos céticos pirrônicos, opta por considerar aquele que lhe é mais razoável e de provável aceitação. Assim, assume uma postura cética acadêmica, segundo a qual, como vimos, o fato de manifestar uma opinião não significa estar assentindo ou não sobre o objeto, mas apenas estar considerando, mesmo que momentaneamente, aquele que apresenta menos dificuldade para o entendimento humano. Pois, segundo Hume (2001), “todos hão de concordar que as demonstrações que são difíceis de serem compreendidas por causa de seu caráter abstrato não podem ter dificuldades que as enfraqueçam, ou seja, se uma demonstração for correta, não deve admitir nenhuma oposição e, se não o for, é nada além de um sofisma”. Por conseguinte, tratar dessas questões por meio de objeções e resposta é o mesmo que dizer que a razão pode emaranhar-se, em alguns casos, em um jogo de palavras sem sentido, os quais, em sua complexidade, são, inclusive, usadas por alguns filósofos na tentativa de esconder sua debilidade.

Portanto, diante das argumentações propostas, podemos considerar nosso filósofo com um cético acadêmico, mediante a postura aprese ntada em relação aos fatos descritos e também pela sua recusa em aceitar na totalidade o ceticismo pirrônico, por considerá-lo excessivo ou radical para ser aplicado na prática pelo ser humano.

CONSIDERAÇÃO FINAL

A elaboração deste artigo proporcionou o contato com diversas literaturas, permitiu-nos ampliar nossos conhecimentos, sempre com o fim de divulgar o pensamento e a postura do ceticismo de Hume, que ao longo da história foi combatido por muitos filósofos.

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questões de fato e, ainda, às relação de ideias (campo em que a razão atua por excelência). Acreditamos, por isso, que nele encontramos todas as características necessárias presentes em um filósofo para ser considerado como cético.

Por meio das argumentações descritas no artigo, ficou evidenciado, no entanto, que Hume é um filósofo cético acadêmico por considerar que o homem é incapaz de suspender totalmente os juízos sobre as coisas, ao contrário do que sustenta o ceticismo pirrônico, para o qual não poderíamos manter nenhum tipo de opinião, suspendendo, assim, todo juízo. E no que se refere a sua postura naturalista, esta não seria nada mais do que uma concepção inerente ao ser humano.

É evidente que mesmo com toda demonstração apresentada , este artigo é incipiente diante de várias objeções que se possam ter referentes ao tema, sobretudo devido à complexidade envolvida.

REFERÊNCIAS

DESCARTES. R. Meditações Metafísicas: São Paulo: Abril Cultural, 1973. (Coleção Os Pensadores).

FOGELIN. R. Tendência do Ceticismo de Hume: Cambridge Companion to Hume. Cambridge University Press, 1993. Trad. Plíno Junqueira Smith, 2007.

GUIMARÃES. L. Hume entre o Academicismo e o Pirronismo. Revista Kriterion, Belo Horizonte, n 93, 1996.

HUME, D. Investigações sobre o entendimento humano. Trad. José Oscar de Almeida Marques. São Paulo: UNESP, 2004.

HUME, D. Tratado da natureza humana. Trad. Déborah Danowski. São Paulo: UNESP/Imprensa Oficial do Estado, 2001.

EMPÍRICO, S. Hypothyposes pirronianas. Trad. Danilo Marcondes. Publicada originalmente na revista O que nos faz pensar, número 12, setembro de 1997, p 115-122.

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Referências

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