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O PROCESSO DE TRANSFORMAÇÃO DO TRABALHO FAMILIAR LIVRE AO SU- BORDINADO DOS PEQUENOS PROPRIETÁRIOS DE TERRA DE SANTA BÁRBARA D'OESTE

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Academic year: 2021

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O PROCESSO DE TRANSFORMAÇÃO DO TRABALHO FAMILIAR LIVRE AO SU-BORDINADO DOS PEQUENOS PROPRIETÁRIOS DE TERRA DE SANTA BÁRBARA

D'OESTE

Elizandra Maria Aleixo de Oliveira – Universidade de São Paulo elizandra.aleixo@usp.br

RESUMO

Este trabalho propõe-se a apresentar a subordinação da renda camponesa ao capital que ocorre com os pequenos proprietários de terra de Santa Bárbara d’Oeste, e se dá através da agroindústria sucro-alcooleira deste município. Para o desenvolvimento deste artigo tomarei como ponto de partida o resultado obtido diante do trabalho realizado para conclusão de curso de graduação (TCC) onde analisei uma família do bairro rural Olhos d’Água, neste mesmo município. Esta pesquisa identifi-cou que existe a subordinação da renda da terra camponesa ao capital uma vez que esta família sempre cultivou em suas terras a cana-de-açúcar para fornecer às usinas que existiam em Santa Bárbara d’Oeste. Porém, com a desativação gradativa das quatro grandes usinas deste município – Usina Santa Bárbara, Usina Cillos, Usina Azanha, Usina Galvão – acabou restando apenas a Usina Furlan que acabou monopolizando a produção de todo o município. Com isso, a subordinação que existia entre esta família, de pequenos proprietários, e as usinas ficou mais acentuada, pois, a partir da desativação das usinas acabaram-se as alternativas que esta e outras famílias tinham para poder vender seu produto. Ou seja, agora só lhes resta vendê-la à Usina Furlan, que acaba por determinar o preço de compra da cana-de-açúcar. Desta maneira este artigo apresentará de que forma esta su-bordinação acontece com esta família camponesa – pequenos proprietários – deste município e, também, qual o significado da monopolização do comércio da cana por uma única usina.

Palavras-chaves: pequenos proprietários; subordinação; agroindústria; cana-de-açúcar; capital. ABSTRACT

This work proposes to present the subordination of peasant income to capital that occurs with the small owners of land in Santa Barbara d'Oeste, and is done by the agribusiness sucroalcooleira this council. For the development of this article will take as its starting point the outcome before the completion of work for the graduate course (CBT) which examined a family of rural district Olhos D'Água, in the same municipality. This research has identified that there is the subordination of the rent of land to peasant capital since the family always cultivated their land in the sugar cane to provide plants that existed in Santa Barbara d'Oeste. However, with the gradual closing of the four major power plants of this city - Usina Santa Barbara, Usina Cillos, Usina Azanha, Usina Galvão - ended with only the Usina monopolizando Furlan who just the production of the whole council. With this, the tie that existed between this family of small landowners, and the plants became more

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pronounced, because since the closing of plants came up the alternatives to this and other families had to sell his product. That is, now they only sell it to the left Usina Furlan, which ultimately determine the purchase price of sugar cane. Thus this article will present how this happens with this subordination peasant family - small owners - this city, and also what the meaning of the monopolization of trade of the cane by a single plant.

Key words: small landowners; subordination; agribusiness; sugar cane; capital. OBJETIVO

Este trabalho tem como objetivo apresentar o resultado das análises feitas sobre o trabalho familiar dos pequenos proprietários de terra do bairro rural Olhos d’Água, localizado no município Santa Bárbara d’Oeste, em meio à esta produção agrícola brasileira que tem estimulado o cultivo de pro-dutos voltados à fabricação de agrocombustíveis. Busca-se apresentar também de que maneira o trabalho destes pequenos proprietários de terra tornaram-se subordinados ao capital da agroindústria sucroalcooleira de Santa Bárbara d’Oeste, além de demonstrar de que forma ocorreu a monopoliza-ção da produmonopoliza-ção sucroalcooleira pela Usina Furlan neste município.

REFERENCIAIS TEÓRICO-METODOLÓGICOS A produção sucroalcooleira no Brasil

Ao longo de três séculos Portugal tinha como primordial objetivo em relação à colonização do Bra-sil a acumulação de riquezas e o fortalecimento do Estado, através da produção voltada para o mer-cado europeu. Portugal, aproveitando-se da experiência obtida na produção do açúcar, que fora de-senvolvida anteriormente ao descobrimento da América Portuguesa nas ilhas do Atlântico, propor-cionou-lhes firmarem contatos comerciais que permitiam a alocação do produto no mercado euro-peu. Sobretudo, relacionados a esses fatores, contribuiu também para a inserção do cultivo da açúcar no Brasil o fato de haver aqui uma imensa área de terras agriculturáveis onde a cana-de-açúcar poderia ser produzida em grande escala. (FERLINI, 2003:18-20)

Desde então até o início da década de 40 encontrava-se na região Nordeste a hegemonia no que diz respeito à produção tradicional da agroindústria sucroalcooleira do país. Porém, a Segunda Guerra Mundial provocou transformações na área do sistema canavieiro desta região. Pernambuco, que até então era o maior produtor de açúcar do país, teve sua participação reduzida no que diz respeito ao mercado açucareiro, cujo aumento dos custos com transportes que fora reajustado devido ao aumen-to dos cusaumen-tos dos combustíveis importados, acabaram por refletir nos preços do açúcar. (LEITE, 2003:18)

Junto aos efeitos da Segunda Guerra Mundial em relação ao Nordeste, o Estado implementou várias medidas no sentido de dinamizar a produção açucareira/alcooleira do país. Um passo fundamental

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para tal fato foi antes mesmo da Segunda Guerra Mundial, a criação do Instituto do Açúcar e Álcool (o IAA) em 1933 que, entre outros encargos, teria o propósito de fomentar e controlar a produção sucroalcooleira no país (SZMRECSÁNYI, 1979:171-8). Logo houve a criação do Estatuto da La-voura Canavieira, em 1941, o qual procurou proteger os fornecedores de cana, e, mais recentemente o PROÁLCOOL, em 1975, com o objetivo de aumentar a produção de safras agro-energéticas e a capacidade industrial de transformação, visando tanto a obtenção de álcool para a substituição de gasolina como incrementar o uso no setor químico. Desta forma, este último programa apresentou-se como uma “fórmula milagrosa” retomando a continuidade do processo de expansão capitalista da agroindústria sucroalcooleira nacional (BRAY et al, 2000).

Estas, entre outras políticas públicas, contribuíram para a inserção da região Centro-Sul na produ-ção do açúcar e álcool; visto que, no início da década de 1950, São Paulo já atingia o status de mai-or produtmai-or de açúcar do país, sendo até hoje, um dos estados que mais contribui para o desenvol-vimento deste setor.

A decisão de produção de etanol a partir de cana-de-açúcar foi de estratégia política e econômica, envolvendo investimentos adicionais por parte do governo. Tal atitude foi tomada em 1975, quando o governo federal decidiu encorajar a produção do álcool em substituição à gasolina pura, com o objetivo de reduzir as importações de petróleo, então com um grande peso na balança comercial brasileira. Nessa época, o preço do açúcar no mercado internacional vinha decaindo rapidamente, o que tornou conveniente a mudança de produção de açúcar para álcool.

Quase trinta e cinco anos depois do início do PROÁLCOOL, o Brasil vive agora uma nova expan-são dos canaviais com o objetivo de oferecer, em grande escala, o “combustível alternativo”. Porém esta alternativa limita-se somente à classe média cujos carros “flex” podem ser abastecidos com gasolina ou com álcool. Já a maioria dos demais transportes que são utilizados pelos bóias-frias, pelos caminhoneiros, em geral, são e continuam sendo abastecidos pelo diesel. Esse tipo de com-bustível para abastecer os caminhões – o diesel – não é a única alternativa. Desta forma fica eviden-te que o aumento do plantio da cana-de-açúcar nos campos brasileiros para a produção do etanol como combustível não deve ser explicada pela produção de “combustível alternativo”. Existem ou-tros meios, que já estão em prática em ouou-tros lugares do mundo.

Sobretudo a mudança nos campos brasileiros, que têm substituído as áreas destinadas aos plantios de feijão, laranja, tomate e outras culturas insiste em acontecer e o cultivo da cana-de-açúcar avança além das áreas tradicionais, do interior paulista e Nordeste, e espalha-se por outras áreas como o cerrado e a Amazônia. A nova escalada é um movimento comandado pelo governo, da mesma for-ma ocorrida no final da década de 70, quando o Brasil encontrou no álcool a solução para enfrentar o aumento abrupto dos preços do petróleo que importava. A corrida para ampliar unidades e

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cons-truir novas usinas é também movida por decisões da iniciativa privada, convicta de que o álcool terá, a partir de agora, um papel cada vez mais importante como combustível no Brasil e no mundo. Esses acontecimentos, no que diz respeito à produção da cana-de-açúcar no país, só evidenciam que a agricultura passou por uma profunda mudança, em busca de um aumento na produção sucroalcoo-leira, abandonando o padrão de comportamento histórico do conjunto dos antigos engenhos de a-guardente para a modernização destes engenhos e a inserção da agroindústria – monopolista – cana-vieira no Brasil. Estas se formaram com base numa cultura de exploração predatória dos recursos naturais do país e da mão-de-obra de seus trabalhadores, próprias do latifúndio monocultor. Aliás, baixos salários e incorporação contínua de novas terras também foram por muito tempo, e ainda são bases de sua competitividade frente a outros países produtores e que levaram o Brasil a ser o maior produtor e exportador de açúcar de cana do mundo.

Todos estes fatos evidenciam que estamos vivendo em um tempo marcado por intensas mudanças, que são reflexo do processo da mundialização do capital, onde no Brasil, o atual governo Neoliberal tem como principal papel garantir as condições necessárias para o bom funcionamento do mercado capitalista (MARQUES, 2008). Essa mundialização do capital resultou também na reestruturação do Estado, destacando-se, entre outras coisas, a expansão do agronegócio. Isso fez com que, segun-do Moura, houvesse uma transformação no mosegun-do de vida camponês, onde

A expansão dos chamados complexos agroindustriais tem transformado o campo-nês num trabalhador para o capital, sem torná-lo um operário, o que amplia as in-terrogações sobre a natureza da sua vida política e econômica. Neste caso, o que chama atenção, no camponês, é sua integração, subordinada à lógica econômica do capital industrial. (MOURA, 1986:8)

Desta forma, insere-se neste trabalho a importância da abordagem do modo de vida camponês, en-tendida aqui, assim como no trabalho de Bombardi (2004)1, entendendo que o campesinato enquan-to classe social que se reproduz no interior do capitalismo, pois se reproduzem a partir de relações não-capitalistas permitindo assim a reprodução do capital que é de forma ampliada e contraditória, na medida em que, segundo Chayanov (1974), a unidade camponesa tem como objetivo a satisfação das necessidades da família enquanto que no modo de produção capitalista o objetivo é que ocorra a reprodução ampliada do capital, visando o lucro.

É neste atual cenário que este trabalho busca inserir a produção dos pequenos proprietários – en-quanto camponeses que são – de cana-de-açúcar do município de Santa Bárbara d’Oeste, que, da sua fundação até os dias atuais, tem sua economia pautada no cultivo deste produto. Desde fazendas produtoras de aguardente, até as grandes usinas que ali se instalaram para a produção de açúcar e álcool, consolidou-se neste município a agroindústria sucroalcooleira.

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Para tal farei uso dos resultados encontrados diante da experiência obtida através do contato com estes pequenos proprietários de terra do bairro rural Olhos d’Água, localizado no município de San-ta Bárbara d’Oeste que resultou na elaboração do trabalho de conclusão de curso da faculdade de Geografia da Pontifícia Universidade Católica de Campinas em 2007, cujo título A Subordinação dos Pequenos Proprietários ao Modo de Produção Agroindustrial Sucroalcooleiro em Santa

Bár-bara d’Oeste2. Este trabalho proporcionou dar continuidade às minhas pesquisas com o intuito de

abordar de maneira mais ampla e profunda o estudo sobre estes mesmos pequenos proprietários que se encontram hoje, subordinados à agroindústria sucroalcooleira de Santa Bárbara d’Oeste, ou seja, ao monopólio sucroalcooleiro constituído hoje pela Usina Furlan.

Os pequenos proprietários e a agroindústria sucroalcooleira em Santa Bárbara d’Oeste: o estudo da subordinação da renda ao capital.

Localizado na porção leste do estado de São Paulo, Santa Bárbara d’Oeste surgiu quando Dona Margarida da Graça Martins, provinda de Santos, comprou uma sesmaria de duas léguas, ao norte do Rio Piracicaba. Mudou-se para suas terras em 1817 e construiu uma fazenda de engenho. Dentro de suas terras, Dona Margarida doou um pedaço para que fosse construída a capela de Santa Bárba-ra, santa de sua devoção. Com isso, a fundação de Santa Bárbara d’Oeste ficou marcada no dia 4 de dezembro de 1818, assim que a obra foi concluída.

Localização do município de Santa Bárbara d’Oeste - SP

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Essa região, denominada “quadrilátero do açúcar” – que compreende a região das cidades de Soro-caba, PiraciSoro-caba, Mogi Guaçú e Jundiaí – segundo Caio Prado Júnior3, onde antes as sesmarias e-ram doadas, passae-ram a ser vendidas, na época da fundação do município, o que chamou a atenção de vários compradores devido à concentração de terras com aptidão agrícola para a cultura de cana-de-açúcar e de cereais. (PRADO JR, 2004).

Prova desta constatação em relação à qualidade do solo foi o relatório apresentado pelo francês J. Picard em 1902 aos Conselhos de Administração das Sociedades de Piracicaba, Villa-Rafard, Porto-Feliz, Lorena e Cupim – antigas usinas da região na época. Neste relatório, sobre o solo da região, Picar relata que

os solos são formados em geral pela decomposição de rochas primárias eruptivas, si-tuadas imediatamente acima do granito, e das quais não temos com muita freqüência equivalentes na França. O resultado desta composição são solos vermelhos, compac-tos, bastante parecidos com um tijolo mal cozido.

Já em relação ao clima da região, J. Picard continua

O clima é quente: a temperatura média deve ser de 22 a 23 graus; e, deste ponto de vista, a região é bastante conveniente à cana-de-açúcar. Como em quase todas as á-reas tropicais do Hemisfério Sul, há duas estações bem marcadas: a estação quente que começa em setembro e termina por volta de abril; e a estação fresca, que vai de maio à setembro. A primeira é a estação do cultivo; a segunda, a da colheita e do processamento industrial.

Em relação a extensão territorial do município que é de 270 km², a área urbana ocupa 60 km². Os outros 210 km² são de área rural, que por sua vez está ocupado com a produção de lavouras tempo-rárias e permanentes, como nos mostram as tabelas a seguir:

TABELA 1. LAVOURAS PERMANENTES/2006 – SANTA BÁRBARA D’OESTE ÁREA PLANTADA

Café (beneficiado) 25 hectares Laranja 225 hectares

ELABORAÇÃO: ALEIXO, E. M. FONTE: IBGE

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TABELA 2. LAVOURAS TEMPORÁRIAS/2006 - SANTA BÁRBARA D’OESTE ÁREA PLANTADA

Arroz (em casca) 100 hectares Batata-inglesa 20 hectares Cana-de-açúcar 12.800 hectares Feijão (em grão) 50 hectares Milho (em grão) 490 hectares

ELABORAÇÃO: ALEIXO, E. M. FONTE: IBGE

As tabelas acima evidenciam que os tipos de lavoura existentes no município – tanto permanentes quanto temporárias - exceto a de-açúcar, não ocupam nem 7% dos 13459 hectares que a cana-de-açúcar ocupa. Esse fato pode ser explicado devido à predominância de um dos produtos de maior importância econômica para a cidade: a cana-de-açúcar – que fica evidenciado na tabela 1. Esta cultura, ao predominar-se sobra as demais, ocupa grandes espaços, cuja característica é típica de latifúndio – grande extensão territorial com produção monocultora.

A indústria do açúcar tomou grande impulso no final do século XIX, com o aumento na demanda desse produto. Nessa época, antes mesmo do estado de São Paulo liderar a produção sucroalcooleira do país, foram instaladas grandes usinas açucareiras no município. Em 1889 era inaugurada por João Frederico Redher a primeira destilaria de álcool, e, logo em 1914 a primeira usina açucareira. Desta, logo surgiram outros grandes centros produtores como a Usina Santa Bárbara, Usina Galvão, Usina Cillos, Usina Azanha e Usina Furlan.

Estas usinas acabaram absorvendo algumas pequenas e médias propriedades da região, fazendo com que houvesse a territorialização do monopólio que se dá a partir da

concentração da propriedade e da posse da terra (com a monocultura) ser um ele-mento definidor do direito dos grandes proprietários de terras (os grupos usinei-ros) extrair renda capitalista da terra (sobretrabalho), é sobretudo, a forma de lhes garantir hegemonia na produção do montante da matéria-prima moída. (THOMAZ JR., 1988, P. 3)

Destas, somente a Usina Furlan está em operação e detém a propriedade de grande parte das áreas agriculturáveis da cidade. Além de controlar a produção sucroalcooleira da cidade, esta usina está expandindo sua área para outros municípios. Em Avaré, no estado de São Paulo, a usina arrendou no início do ano de 2006 cerca de 3 mil alqueires para o plantio da cana e produção do álcool e açú-car.

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Além dela, o grupo Cosan – da família Ometto – que constituiu uma sociedade com outros usinei-ros, comprou diversas usinas de grande representatividade, como as unidades de Rafard, no municí-pio de Rafard; São Francisco, no municímunicí-pio de Elias Fausto; Santa Helena, no municímunicí-pio de Rio das Pedras; Costa Pinto, em Piracicaba; e Bom Retiro, em Capivari. Todos estes municípios são vizi-nhos de Santa Bárbara d’Oeste. Estas usinas citadas estão em pleno funcionamento por todo o redor de Santa Bárbara d’Oeste. Ambas pertencem ao grupo Cosan, que se apresenta hoje como o maior produtor independente de açúcar e álcool do país. Entre os maiores usineiros e controladores deste grupo está o bilionário Rubens Ometto Silveira Mello, considerado segundo a revista Forbes4 o primeiro bilionário do etanol do mundo.

Entretanto, somente neste município o grupo Cosan desativou a sua unidade, que incorporou a Usi-na Santa Bárbara e a UsiUsi-na Galvão. Hoje, este grupo administra e utiliza essas estruturas, caracteri-zando um verdadeiro monopólio territorializado, ao mesmo tempo em que as indústrias de equipa-mentos e impleequipa-mentos agrícolas, empresas intermediárias e os fornecedores de matéria-prima tor-nam-se dependentes diretamente deste modo de produzir, além dos cerca de 580 mil hectares de área cultivada que também utiliza as terras do município para o plantio da cana-de-açúcar. Muito embora as usinas tenham sido desativadas, verificou-se que o cultivo deste produto continuou pre-sente sendo cultivado pelos pequenos proprietários que fornecem à usina.

Essa presença marcante não só da cana-de-açúcar, mas também das grandes usinas que existiram no município e do monopólio concretizado pela Usina Furlan, evidenciam o desenvolvimento do modo de produção capitalista na agricultura. Esta etapa, por sua vez, de acordo com Oliveira

apresenta traços típicos como a presença de grandes complexos industriais a inte-grar a produção agropecuária. Esse processo contínuo de industrialização do cam-po traz na sua esteira transformações nas relações de produção na agricultura, e, consequentemente, redefine toda a estrutura socioeconômica e política no campo. (1995:5).

É esse processo social (me refiro ao desenvolvimento do modo capitalista de produção na agricultu-ra) que concentra a propriedade e homogeneíza a paisagem, que acontece, segundo Bombardi,

quando o território é produzido pelo capitalismo adquire características específicas que expressam exatamente o tipo de relação que por meio dele se estabelece, onde ficam impressas as relações humanas e as transformações sociais que se dão atra-vés do tempo. (2004)

4Jornal Sem Terra – Abril 2007, em artigo escrito por Ariovaldo Umbelino de Oliveira, “Etanol, o novo mito do agronegócio”.

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Entretanto, o desenvolvimento do modo capitalista de produção da agricultura fez com que houves-se uma transformação nas relações da produção na agricultura, e, conhouves-sequentemente, redefiniu toda a estrutura socioeconômica e política do campo. Diante deste cenário temos os pequenos proprietá-rios de terra que Assim, diante desta nova estrutura imposta, restaram aos pequenos proprietáproprietá-rios, que não conseguiram introduzir o uso de máquinas e insumos modernos em seu processo de produ-ção – que foi instituído nos latifúndios, permitindo-lhes transformarem-se em capitalistas do campo –, três alternativas sugeridas por Oliveira (1995). A primeira seria vender suas pequenas proprieda-des aos granproprieda-des latifundiários. Na segunda, caberia aos pequenos proprietários arrendarem suas terras à produção para estes latifundiários (sujeitando-a ao capital) que “custearia” a modernização. Ou seja, implantaria as máquinas necessárias para que houvesse um aumento e a padronização da produção. Assim, os pequenos proprietários se tornariam trabalhadores assalariados a serviço do capital. (OLIVEIRA, 1995). Já, numa terceira alternativa, coube aos pequenos proprietários produ-zirem em toda a sua propriedade a matéria-prima – no caso, a cana-de-açúcar – para venderem aos usineiros.

No caso de Santa Bárbara d’Oeste, onde temos a territorialização do monopólio da Usina Furlan, os pequenos proprietários do bairro rural Olhos d’Água encontram-se dentro da terceira alternativa como forma de adequar-se ao modo capitalista de produção no campo.

Tendo visto de que forma a agroindústria sucroalcooleira se consolidou no município e como era a vida da cidade na época do funcionamento de todas as suas usinas, que se limitou a apenas uma – a Usina Furlan – cabe agora retratar a relação desta usina para com os pequenos produtores de Santa Bárbara d’Oeste. Para isso, tomar-se-á como base a entrevista realizada a uma família5 proprietária de 16 alqueires de terra. Hoje, 16 alqueires de cana-de-açúcar.

Esta família, assim como gerações anteriores, sempre tirou seu sustento no trabalho pautado na lida da roça. Destes 16 alqueires, 12 são da mãe do chefe da família, o sr. João e os outros 4 são da mãe da mãe da família, a sra. Maria. Nestas terras, eles sempre plantaram diversas coisas: milho, algo-dão, feijão, mandioca, etc., além da cana-de-açúcar. Este plantio aconteceu até meados de 1986, quando uma das usinas em funcionamento começou a arremessar veneno através de avião. Com isso, toda a plantação que estivesse num raio de 5 km acabaria morrendo, em decorrência do arre-messo deste veneno. Desta forma viram-se obrigados a plantar somente a cana-de-açúcar. Este ve-neno não afeta a cana-de-açúcar por esta possuir folhas estreitas.

Para esta família, a época em que todas as usinas estavam em funcionamento, mesmo tendo que parar de plantar outras culturas para cultivar somente a cana-se-açúcar, era um trabalho

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dor cultivá-la, pois havia “concorrência” entre estas usinas; o preço da produção no campo para vender a cana-de-açúcar era o próprio fornecedor quem determinava. Ou seja, os pequenos produto-res mesmo. Houve uma época, há alguns anos atrás, em que um usineiro chegou para o sr. João e lhe disse: quanto o senhor quer por toda esta cana? Pode dizer qual a quantia que eu pago! Ele disse que na época ele pediu muito. Mais do que aquela colheita valeria realmente. Mas estes eram outros tempos. Eram os tempos das “vacas gordas”, segundo o sr. João.

A situação destes pequenos proprietários que forneciam a matéria-prima para as usinas sempre foi boa, pois, segundo o sr. João, se um usineiro não pagasse uma quantia que agradasse, tinha outro interessado que cobriria a oferta. Todas as usinas do município em funcionamento precisavam manter suas produções. Desta forma, um alqueire de açúcar faria falta. Por isso, a cana-de-açúcar era tão valorizada. Eles não se lembram o valor real, pois na época estava em vigor uma ou-tra unidade monetária. Mas, para se ter uma idéia do valor que a cana tinha, eles exemplificaram, baseando-se na história ocorrida com um vizinho, com a seguinte história: em 1976, com a quantia adquirida na venda de 1200 toneladas de cana-de-açúcar era possível comprar – tanto é que este produtor comprou – um trator e uma carregadeira novíssimos. Hoje, para se adquirir estes bens, são necessários vender à usina 10000 toneladas de cana-de-açúcar.

Para esta família, a situação começou a piorar quando foi desativada a Usina Azanha, que foi incor-porada ao Grupo Ometto – hoje Cosan. Quando a incorporaram, junto com a Usina Santa Bárbara, preferiram desativá-la, deixando apenas em funcionamento a segunda. Neste momento, a concor-rência que existia entre as usinas Azanha e Santa Bárbara (ambas vizinhas as terras da família en-trevistada) deixou de existir, afunilando as alternativas de mercado consumidor, pois restou somente a segunda e a Usina Furlan.

Até então, o preço da cana-de-açúcar era calculado somente pelo peso. A partir do momento que as usinas passaram a arremessar o gás maturador, que antecipou o ciclo de amadurecimento da cana em dois meses, em relação ao tempo normal, seu preço passou a ser medido também pelo nível de sacarose. Segundo os pequenos proprietários a aplicação deste gás maturador se deve ao fato de o governo pressionar a produção de álcool das usinas, pois, com a cana sendo colhida mais cedo, não irá faltar álcool combustível para consumo.

Para calcular o preço da cana-de-açúcar a partir da sacarose, esta deve estar igual a 12,257 a unida-de. Este número indica que cada tonelada de cana-de-açúcar contém 94 kg de açúcar. A usina mede a sacarose furando a cana-de-açúcar, mas, eles sempre furam em um lugar onde a cana nunca é tão doce. Ou seja, no pior lugar da cana. Desta forma, em relação à sacarose, o preço da cana-de-açúcar dos pequenos proprietários valerá menos do que realmente vale. Ou seja, ela é mais doce do que a

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usina indicará de acordo com a medida feita pela mesma. Em relação à pesagem, esta é feita somen-te na balança da usina. Lá exissomen-tem duas balanças. A balança usada para pesar a cana-de-açúcar dos fornecedores é uma. Mas, quando são os fornecedores que vão comprar as mudas, a pesagem é feita numa outra balança. Isso evidencia que a tara das balanças é diferente. Desta forma, percebe-se que a tara da balança em que os pequenos proprietários pesam suas colheitas de cana-de-açúcar é me-nor, pois assim, a cana sendo leve significa que tem um menor valor (mesmo sabendo que a cana deles pesa mais). Já em relação a balança onde são pesadas as mudas, a tara é maior, pois eles irão pagar um valor maior, acima do que realmente estão levando.

Sr. João relata que em certo momento os fornecedores haviam formado uma cooperativa e tinham a sua própria balança, mas, “por forças maiores”, não se sabe o destino desta balança. Agora, só po-dem pesar na balança da usina.

Atualmente, estes pequenos proprietários só vendem a cana-de-açúcar para a Usina Furlan. Hoje, a cana-de-açúcar é paga a estes pequenos proprietários a quantia de R$ 20,00 por tonelada.

Quem faz o corte da cana-de-açúcar que será vendido à usina é a própria usina. Estes proprietários têm o trabalho de cuidar da cana, desde o seu plantio até a colheita. Ou seja, cultivá-la. O corte é realizado pela usina uma vez por ano, que é o momento em que os pequenos proprietários são pa-gos. Destes R$ 20,00, a usina desconta a quantia de R$ 12,00, que equivale ao gasto que a usina teve na mão-de-obra utilizada para cortá-la, no gasto da colheitadeira para carregar os caminhões e o transporte dos caminhões da terra até a usina. Sendo assim, resta para a família, por tonelada a quantia R$ 8,00 a ser paga pela usina.

Para sabermos quanto eles gastam durante o cultivo da cana-de-açúcar, fez-se o cálculo baseando-se somente em quatro alqueires, pois eles não têm como tirar a base pelos 16 alqueires, já que retiram parte da colheita, semanalmente, para vendê-la aos garapeiros6 da região.

Nestes quatro alqueires são utilizados 60 sacos de adubo. Esta quantidade de adubo equivale a duas toneladas e meio. Cada tonelada custa R$ 900,00. Então, para estes quatro alqueires eles gastam, com adubo, R$ 2250,00. Este adubo pode ser comprado em qualquer lugar, ou pego na usina, para descontarem depois. Com os venenos que devem ser aplicados para acabar com os matos entre as plantações, foram utilizados 25 kg, que hes custam R$ 685,00 (cada 5 kg custam R$ 137,00). Com isso, a despesa que tiveram para o cultivo da cana-de-açúcar nestes quatro alqueires, somando adu-bo e veneno, foi de R$ 2935,00 (R$ 2250,00+R$ 685,00).

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Nesta terra (de quatro alqueires), esta família consegue colher 300 toneladas de cana-de-açúcar. Desta forma, arrecadam ao todo R$ 6000,00. Mas, não podemos nos esquecer que a usina desconta R$ 12,00 por tonelada (para cobrir as despesas da usina durante a colheita). Sendo assim, destes R$ 6000,00 referentes às 300 toneladas de cana-de-açúcar, a usina desconta a quantia de R$ 3600,00 (referente às despesas – R$ 12,00 por tonelada), restando então à eles a quantia de R$ 2400,00. Mas, não se pode esquecer que somando aos R$ 3600,00 gastos pela usina durante a colheita os R$ 2935,00 que já havia gasto no período do cultivo da cana-de-açúcar, conclui-se que esta família obtém um prejuízo de R$ 535,00.

Se fizermos este cálculo proporcional, deduzindo que toda a área da cana-de-açúcar destinar-se-á para a venda total à usina, veremos que dos 16 alqueires eles teriam um prejuízo de R$ 2140,00. Como? Foi calculado o prejuízo obtido nos quatro alqueires, e este se multiplicou por quatro, que resultou do prejuízo obtido pelos 16 alqueires. Se não bastasse este cálculo para analisar a renda desta família, dos R$ 2400,00 que deveria ser pago por toda a colheita (referente aos quatro alquei-res), este valor não é pago totalmente pela usina, pois ela retém 20% do total a ser recebido (destes R$ 2400,00), retendo assim a quantia de R$ 480,00. Desta forma, no ato da entrega da colheita, por estes quatro alqueires, receberiam somente R$ 1920,00. Os 20% retido pela usina será recebido pelos pequenos proprietários aproximadamente seis meses depois. Mas, se no dia da entrega o valor da tonelada era R$ 20,00, a família, logicamente, receberia os R$ 480,00. Mas, geralmente, quando forem receber esta retenção a usina paga pelo valor do dia (seis meses depois da entrega), e não pelo valor do dia que a colheita foi entregue. Ou seja, neste dia nunca é o mesmo valor. É sempre menos, pois a usina justifica “que o açúcar não teve saída”, então, está valendo menos do que R$ 20,00 a tonelada, de quando foi entregue. E o casal se pergunta: quem afirma que o açúcar que fi-cou no estoque não foi produzido com a cana-de-açúcar das nossas terras? Mas, não obtém respos-tas.

Então, de que forma esta família, que se encontra hoje, subordinada a este monopólio sucroalcoolei-ro, consegue tirar forças para continuar trabalhando na lida da terra e para o simples fato de sobre-viverem neste mundo capitalista?

Quando era pago um bom preço pelo cultivo da cana-de-açúcar, eles investiram em imóveis na ci-dade. Hoje, estes imóveis lhes rendem os aluguéis que lhes são pagos mensalmente. Além disso, para eles o lucro da lida da terra no cultivo da de-açúcar sai da venda de alguns feixes de cana-de-açúcar aos produtores de garapa – os garapeiros. Cada feixe (que contém aproximadamente 13 canas-de-açúcar) é vendido pelo valor de R$ 5,00. O garapeiro que mais compra, adquire

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semanal-mente 40 feixes. Sendo assim, deste único garapeiro, eles tiram uma renda de R$ 800,00 mensais (R$ 200,00 por semana), fora os demais garapeiros para quem eles vendem.

Uma alternativa que poderia lhes render mais seria arrendar a terra para a usina. Hoje, a usina paga, pelo arrendamento, a quantia de 33 toneladas de cana-de-açúcar (R$ 660,00) para cada alqueire de terra. Desta forma, ao arrendarem seus 16 alqueires, acabariam recebendo R$ 10560,00 por ano. Sem nenhum desconto. Todo o trabalho do cultivo da cana-de-açúcar ficaria por conta da usina. Mas, como 12 alqueires pertencem à mãe do sr. João ele entra somente com o trabalho, e os outros 4 alqueires pertencem a mãe da d. Maria, que também entra com o trabalho, se esta terra fosse ar-rendada eles não teriam nenhum lucro, pois o valor do arrendamento iriam totalmente para os ver-dadeiros donos (as mães deles). Mas eles insistem em trabalhar na terra desta forma, pois arrecadam os 100% da renda da terra obtidos na venda da cana-de-açúcar para a garapa. Este valor não é divi-dido para os verdadeiros donos da terra.

Eles afirmam que sempre trabalharam no cultivo desta terra. Não só eles como todas as outras famí-lias (cerca de 24) que vivem no bairro. Sempre tiveram prazer em trabalhar na labuta da terra. Mas, afirmam também que a maneira como estão recebendo pelo cultivo da cana-de-açúcar atualmente lhes tornam praticamente escravos. Portanto, se estes 16 alqueires fossem desta família, já teriam arrendado à usina há algum tempo.

Percebe-se que, diante das falas e dos relatos, que o que ocorre com esta família é a subordinação da renda camponesa ao capital que ocorre neste caso, em duas esferas (BOMBARDI, 2004:253). Na primeira a família está subordinada ao capital industrial na medida em que eles deixam parte de sua renda para a aquisição de ferramentas, adubos e demais insumos químicos. Na segunda esfera, aca-bam por subordinarem-se ao capital comercial quando vendem seu produto (a cana-de-açúcar) para a usina, sem restar-lhes outro “consumidor” para poderem determinar seus preços.

Hoje, esta família, como já foi dito anteriormente, se vêem sem autonomia para produzirem quais-quer outros produtos para venderem a quem quiser, tendo que produzir a cana-de-açúcar e vendê-la à usina, mas não pelo preço que estes pequenos proprietários estipulam e sim pelo preço de compra determinado pela usina. Trabalham em suas terras sem o recurso do trabalho assalariado, utilizando unicamente o trabalho seu e de sua família. Percebe-se que concomitantemente ao crescimento de sua dependência em relação ao capital temos efetivamente a sujeição da renda da terra destes pe-quenos proprietários ao capital. Ou seja, estes pepe-quenos proprietários estão subordinados ao mono-pólio da agroindústria sucroalcooleira, mas não tiveram seus instrumentos de produção expropria-dos, o que impede com que eles sejam expulsos da terra, porém, acabaram subordinando sua renda ao capital, que neste caso se dá com a agroindústria sucroalcooleira. (MARTINS, 1990:175)

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Porém, o que identifica-se nesta pesquisa é que diferentemente dos colonos estudado por Tavares dos Santos (1978, p.70), estes conseguiam se reproduzir diante do desenvolvimento do modo de produção capitalista que acabou subordinando-os, pois ocorria a combinação de duas atividades econômicas (além do cultivo da uva para vender à indústria vinícola): a produção de meios de vida e produção de mercadoria. Percebe-se que no caso da família analisada a subordinação é ainda mai-or, pois além de cultivarem somente a cana-de-açúcar para vendê-la a agroindústria sucroalcooleira, eles não produzem seus meios de vida. Ou seja. Tudo o que lhes é necessário para se reproduzirem – me refiro aqui aos alimentos – é obtido através de compra nos mercados. Já em relação à produ-ção de mercadoria, eles reservam uma pequena parcela da cana-de-açúcar, que é cultivada para a usina, para vender aos garapeiros da região.

Portanto, diante de todos os processos que caracterizam o modo capitalista de produção na agricul-tura, esta pesquisa propõe investigar a subordinação da renda da terra camponesa ao capital dos pequenos proprietários de terra de Santa Bárbara d’Oeste diante da territorialização do monopólio sucroalcooleiro, analisando, para isso, o processo que levou à subordinação destes pequenos propri-etários, alterando – ou não – seu modo de produzir, pois sempre trabalharam no cultivo da cana-de-açúcar e sempre tiveram como determinar seus preços devido à forte concorrência entre as usinas existentes no município. Porém, hoje, com a monopolização, a situação já não é mais favorável a eles, como antes.

Para o desenvolvimento desta pesquisa, tenho como hipótese – identificada a partir do resultado obtido com a elaboração do TCC – que existe uma maneira de insubordinação. É o que Tavares dos Santos (1978) chama de produção de mercadorias. Ou seja, a família analisada encontrou um meio de não se submeterem totalmente à usina na medida em que direcionam uma parte de seu cultivo para vendê-la aos garapeiros – para fabricação da garapa – da região. Desta forma, a família anali-sada viu que sua renda é maior com a venda da cana-de-açúcar aos garapeiros do que a que é ganha com a venda à usina. Portanto, a partir desta hipótese, este trabalho propõe-se analisar se, com os demais pequenos proprietários do município, existem – ou não – outros meios de insubordinação de renda ao capital.

Sobre isso, Tavares do Santos é ímpar ao revelar quem – de acordo com o que foi constatada anteri-ormente – esta “dependência” nada mais é do que o fruto da subordinação da renda da terra ao capi-tal industrial e comercial que se dá quando o camponês subordina sua produção aos grandes usinei-ros.

O modo capitalista de produção da agricultura, que se encontra em sua fase monopolista e capitalis-ta (OLIVEIRA, 1983), gerou a concentração da produção sucroalcooleira em Sancapitalis-ta Bárbara d’Oeste. Ou seja, um verdadeiro monopólio constituído hoje pela Usina Furlan.

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Este fato se efetivou a partir do momento em que todas as usinas foram desativadas. Porém, o gran-de questionamento gran-desta pesquisa foi a origem da cana-gran-de-açúcar com a qual a usina produz seu açúcar e álcool. Com isso, descobriu-se que na cidade, embora as usinas tenham sido desativadas, o cultivo deste produto continuou presente no município graças à existência dos pequenos proprietá-rios.

Percebe-se que são estes pequenos proprietários, os fornecedores da cana-de-açúcar, quem sempre abasteceram as usinas permitindo assim que se a produção agroindustrial sucroalcooleira de Santa Bárbara d’Oeste continue se desenvolvendo.

Portanto, atualmente, com o auge do etanol como alternativa para gerar combustível limpo, o cam-po vive no mesmo embalo que viveu na écam-poca do PROÁLCOOL. Afirmo que este embalo atual é ainda mais acirrado. Os pastos deixaram de ser pastos para cultivarem a cana-de-açúcar. Até mes-mos o cultivo de grãos como soja e feijão foram substituídos por esta cultura. Tudo isso, segundo Fernandes (2008:46) é reflexo do agronegócio da cana que tem disputado estes territórios produti-vos, oferecendo maior renda pelo uso das terras até então utilizada por outras culturas. Ainda, de acordo com Fernandes, sobre o agronegócio ele o define como um conjunto de sistemas e aponta que o campesinato (assim como estes pequenos proprietários), compreendido como um sistema próprio é em grande parte subalterno ao agronegócio. (FERNANDES, 2008:45)

Estes pequenos proprietários que sempre abasteceram os engenhos e as usinas mantinham uma pro-dução diversificada e parte de suas terras continua abastecendo o agronegócio sucroalcooleiro. São eles os mais prejudicados, inseridos em um mercado capitalista, onde o preço de todas as rela-ções é ditado pela lei da oferta e da procura. Trabalham hoje, em suas próprias terras, como se fos-sem escravos e a renda da venda da cana-de-açúcar numa propriedade de 16 alqueires à usina não permite sobrevier em um ano. Como se sustentam hoje os pequenos proprietários que sempre pro-duziram e abasteceram as usinas, fornecendo-as matéria-prima? Deduz-se o quão contraditório é a política pública ditada pelo atual governo onde a produção do etanol deve vir da cana-de-açúcar cultivada pelos pequenos proprietários e não dos grandes latifundiários, como saída para um dos problemas do campo brasileiro que se mecanizou, expulsando assim milhares de pequenos proprie-tários que não conseguiram mecanizarem suas propriedades, restando a eles a venda ou arrenda-mento de suas terras.

A saída encontrada hoje por estes pequenos proprietários em estudo é o arrendamento de suas terras (se os 16 alqueires fossem mesmo desta família). Mas ainda conseguem uma renda através da “in-subordinação” que se caracteriza através da venda de parte de sua plantação aos garapeiros. Tive-ram também a oportunidade de investir em imóveis quando eTive-ram dignamente pagos pela sua produ-ção, para hoje tirarem uma parte de suas rendas dos aluguéis que estes imóveis lhes rendem.

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Seu modo de viver nunca foi tão subordinado ao sistema capitalista. Onde está a produção rural? Onde está a produção familiar? Como podem resistir tendo que se subordinarem ao capital industri-al e comerciindustri-al, restando-lhes somente a usina como “consumidora”, pois só desta forma consegui-rão vender a cana-de-açúcar cultivada em suas terras para ela? Não podem nem ao menos plantar outras coisas que acabam sendo atacados pelo veneno “2,4D”, um herbicida que atinge as plantas do tipo dicotiledôneas como feijão, algodão, e quase todas as outras plantas, e, beneficia as plantas do tipo monocotiledôneas, como a cana-de-açúcar, o milho, entre outras, que é arremessado pelos aviões das usinas. Não lhes resta nenhuma alternativa a não ser plantar a cana-de-açúcar.

Resistem da mesma maneira como os colonos do vinho de Tavares dos Santos ou como os assenta-dos do bairro rural Reforma Agrária de Bombardi, assim como outros tantos casos que outros tantos pesquisadores tem estudado. Porém, mesmo tendo identificado esta resistência, esta família tem resistido não da maneira como gostariam que fosse. Ou seja, não da maneira como produziam, ven-diam, e viviam há algum tempo atrás. Resistem subordinando-se ao capital industrial e comercial inserindo-se, desta forma, no modo capitalista de produção da agricultura que redefiniu toda a estru-tura socioeconômica e política do pequeno proprietário brasileiro. Do pequeno proprietário barba-rense.

METODOLOGIA

Para contextualizar o município de Santa Bárbara d’Oeste e sua inserção na produção sucroalcoolei-ra, bem como o surgimento da agroindústria e sua consolidação no setor sucroalcooleiro foi preciso ampliar a bibliografia já consultada para a realização do trabalho de conclusão de curso. Contribuiu também, para o desenvolvimento da pesquisa, uma coleta de dados junto ao Sindicato dos Fornece-dores do Município, ao Centro de Memória e da Secretaria de Agronegócio do Município, que con-tribuirá para desvendar a relação entre os pequenos proprietários e a usina.

Em relação à pesquisa de compreender qual o processo ocorrido em comum que ocasionou a desa-tivação gradativa das usinas do município foi necessário a consulta de jornais da região da época em que ocorreram os principais acontecimentos relacionados a desativação de cada uma das usinas, junto ao Centro de Memória Municipal, buscando também as famílias que viviam nas colônias des-tas usinas para realização de entrevisdes-tas, além de um levantamento de dados junto a prefeitura mu-nicipal.

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O trabalho de campo no bairro rural Olhos d’Água para entrevistar as famílias que mantém suas pequenas propriedades em meio a essa inserção do modo capitalista de produção da agricultura, que se encontra em sua fase monopolista, foi de fundamental importância, pois somente como contato proporcionado pelas visitas a campo será possível responder às questões acerca destes camponeses. Mesmo porque o trabalho de campo em Geografia permite o reconhecimento e o contato para com o local de estudo.Esse passo possibilitará ao pesquisador analisar o território, que por sua vez, com-preenderá as relações sociais que ocorrem (e ocorreram) no espaço em questão ao longo do tempo. Depois de realizar os recursos de pesquisa acima descritos, foram elaborados mapas temáticos e reprodução de imagens dos lugares a serem pesquisados, para permitir aos leitores uma maior com-preensão dos processos que ocorrem no local da pesquisa.

BIBLIOGRAFIA

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Referências

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