PRINCIPAIS ASPECTOS QUE
PODEM IMPACTAR
O ALINHAMENTO
DE INTERESSES ENTRE
ADMINISTRADORES
Na edição no 189 da Revista RI, iniciamos nossas considerações
sobre o alinhamento entre administradores, indicando,
na oportunidade, algumas de suas mais possíveis causas.
por
CIDA HESS
e
MÔNICA BRANDÃO
PRINCIPAIS ASPECTOS QUE IMPACTAM O ALINHAMENTO ENTRE ADMINISTRADORES ABRANGÊNCIA ALGUNS EXEMPLOS DE CONFLITOS ENTRE ADMINISTRADORES
AGENDA E ZELO DOS ADMINISTRADORES
• Agenda de administradores, que podem ter interesses que não se alinham entre si
• Postura dos administradores quanto a defender os interesses da organização
1) Conselho de Administração X Conselho de Administração - Divergência de pontos de vista entre conselheiros
2) Conselho de Administração X Diretoria Executiva - Divergência de pontos de vista entre conselheiros e diretores
3) Conselho Fiscal x Conselho de Administração - Divergência de pontos de vista entre conselheiros
ASSIMETRIA INFORMACIONAL ENTRE OS CONSELHOS DE
ADMINISTRAÇÃO, FISCAL E A DIRETORIA EXECUTIVA
• Informações de maior domínio do Conselho de Administração (ou de partes do mesmo)
• Informações de maior domínio do Conselho Fiscal
• Informações de maior domínio da Diretoria Executiva (ou de partes da mesma)
• Lacunas entre os conjuntos de informações supracitados
4) Conselho de Administração x Conselho de Administração - Assimetria informacional entre conselheiros
5) Conselho Fiscal x Conselho de
Administração - Assimetria informacional entre conselheiros
6) Conselho de Administração x Diretoria Executiva - Assimetria informacional entre conselheiros
e diretores
7) Diretoria Executiva x Diretoria Executiva - Assimetria informacional entre diretores
VISÃO DO CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO SOBRE DECISÕES DA DIRETORIA
EXECUTIVA
• Decisões da Diretoria
• Visões do Conselho de Administração • Divergência entre as decisões e visões
supracitadas
8) Conselho de Administração x Diretoria Executiva - Crítica à decisão de cindir um projeto
9) Conselho de Administração x Diretoria Executiva - Crítica à disseminação de interesse sobre empreendimento 10) Conselho de Administração x Diretoria
Executiva - Crítica à forma de conduzir a comunicação durante
uma crise
LACUNA ENTRE EXPECTATIVA E REAL ENTREGA DE
RESULTADOS
• Expectativas do Conselho de Administração
• Expectativas da Diretoria Executiva • Entrega real de resultados
11) Conselho de Administração x Diretoria - Divergências de entendimento em relação aos impactos da crise nos resultados da empresa
12) Diretoria x Diretoria - Divergências de entendimento em relação à distribuição de resultados abaixo do esperado
Enfatizamos que os exemplos anteriormente relacionados, não exaustivos, hipotéticos e meramente didáticos, não se referem a situações específicas do mercado nacional ou in-ternacional, sendo qualquer semelhança mera coincidência. Assim sendo, qualificamos melhor, a seguir, os casos sub
ju-dice, para maior compreensão, por meio de um conjunto de
situações-exemplo hipotéticas, associadas a cada caso:
SITUAÇÕES HIPOTÉTICAS
AGENDA E ZELO DOS ADMINISTRADORES
1. Conselho de Administração x Conselho de Administração - Divergência de pontos de vista entre conselheiros
O Conselho de Administração de um Grupo Empresarial ava-lia um projeto proposto pela Diretoria Executiva, que se mos-tra rentável, e cuja implantação pode acarretar benefícios para uma comunidade impactada pelas operações empre-sariais, melhorando condições ambientais locais e criando, inclusive, alguns empregos na região. Os conselheiros se di-videm em relação ao projeto: alguns se mostram convencidos pelo retorno econômico projetado, enquanto outros questio-nam os riscos socioambientais, entendendo que esses não fo-ram devidamente clarificados e quantificados. As discussões terminam com a aprovação do projeto por meio de votação e parte dos conselheiros deixa a reunião insatisfeita.
2.Conselho de Administração x Diretoria Executiva - Divergência de pontos de vista entre conselheiros e diretores
Os Comitês de Finanças e de RH do Conselho de Administra-ção de um Grupo Empresarial avaliam, conjuntamente, uma proposta da Diretoria Executiva, a qual prevê aumento real na folha de pagamento da ordem de 1%. A Diretoria argumenta que os ganhos de produtividade alcançados em anos recentes tornam possível a elevação proposta, visando evitar a evasão de talentos do Grupo. A Diretoria argumenta, ainda, que os aumentos não serão dados indistintamente, mas apenas para um restrito conjunto de profissionais altamente qualificados, os quais podem deixar a Empresa se não tiverem uma me-lhoria significativa em seus proventos. Os membros dos dois Comitês não concordam com a proposta apresentada pelos diretores e os orientam a reduzirem para 0,33% o percentual de aumento pleiteado, determinando, ainda, que esses retor-nem aos Comitês com uma análise detalhada justificando os aumentos caso a caso, ou seja, empregado por empregado. Os diretores retornam às suas atividades preocupados com a evasão de talentos a curto prazo e desconfortáveis com o “excesso de detalhes exigidos” dos Comitês.
3. Conselho Fiscal x Conselho de Administração - Divergência de pontos de vista entre conselheiros
O Conselho de Administração de um Grupo Empresarial ava-lia a adoção de determinado tratamento contábil para algu-mas despesas da Companhia, haja vista que, em sua visão, ou-tro tratamento poderia piorar alguns indicadores importan-tes, acompanhados, inclusive, pelo Agente Regulador ao qual a Empresa se submete. Os conselheiros entendem que a piora nos indicadores não refletiria pior gestão, mas critérios contá-beis vigentes. Entretanto, o Conselho Fiscal manifesta-se for-malmente pela inadequação da medida, orientando os admi-nistradores a considerarem a visão técnica e contabilmente mais adequada, segundo o seu ponto de vista. Os membros do Conselho de Administração discutem a recomendação, à luz dos desdobramentos regulatórios e não há consenso sobre o assunto, que poderá ser decidido por votação.
ASSIMETRIA INFORMACIONAL
ENTRE ADMINISTRADORES
4. Conselho de Administração x Conselho de Administração - Assimetria informacional entre conselheiros
Um Grupo Empresarial tem um Conselho de Administração no qual todos os acionistas estão devidamente representa-dos. Um dos acionistas, com participação acionária mais re-levante no capital da Empresa, solicita informações à Dire-toria Executiva, no que é atendido com presteza; entretanto, as informações não são disseminadas entre todos os demais membros do Conselho, o que termina por causar mal estar.
Desalinhamentos podem
ocorrer não apenas entre duas
instâncias distintas, como o
Conselho de Administração
e Diretoria Executiva, mas
dentro de uma dada instância
de governança, conforme
ilustram exemplos aqui
apresentados.
vos financeiros de um Grupo Empresarial, o Conselho Fiscal de outro Grupo da mesma indústria passa a encaminhar, ao Conselho de Administração, sucessivas solicitações de dados, determinando, a cada nova solicitação, um maior nível de de-talhamento. Essas solicitações adicionais inusitadas provocam certa tensão no Conselho de Administração; assim, seu presi-dente agenda uma reunião entre alguns conselheiros adminis-trativos e os membros do Conselho Fiscal, visando entender a mudança comportamental e verificar como os dois Conselhos podem melhorar sua intercooperação e eliminar a tensão.
6. Conselho de Administração x Diretoria Executiva - Assimetria informacional entre conselheiros e diretores
O Conselho de Administração de um Grupo Empresarial avalia um projeto, com base nas informações prestadas pela Diretoria Executiva. O projeto é descrito por meio de um rela-tório-apresentação, distribuído previamente e explicado em reunião. Sucinto, o documento não detalha todos os riscos do projeto para o Conselho, cuja deliberação é tomada com base no material recebido. Tempos depois, o projeto começa a ter problemas não identificados previamente no documento encaminhado para análise e aprovação do Conselho.
7. Diretoria Executiva x Diretoria Executiva - Assimetria informacional entre diretores
A Diretoria Executiva avalia um projeto de investimento de interesse de uma de suas Diretorias. O fórum de aprovação da proposta é o da Diretoria Executiva, em função do montante a ser investido (conforme o montante, o projeto seria levado para apreciação do Conselho de Administração). Foram feitas simula-ções econômico-financeiras para o projeto, com a participação da Diretoria de Finanças, mas esse necessita de informações adicionais em questões da órbita das Diretorias de Recursos Hu-manos e Comercial, por envolver alterações em processos de RH e de comercialização. Mesmo sem a participação dos titulares dessas Diretorias, em viagem a trabalho, o Projeto é aprovado.
VISÃO DO CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO
SOBRE DECISÕES DA DIRETORIA EXECUTIVA
8. Conselho de Administração x Diretoria Executiva - Crítica à decisão de cindir um projeto
A Diretoria Executiva de um Grupo Empresarial decide cin-dir um projeto de investimento em dois projetos menores, desenvolvidos em momentos distintos e sequenciais, de ma-neira a evitar sua apreciação pelo Conselho de
Administra-sua interveniência para o entendimento da questão.
9. Conselho de Administração x Diretoria Executiva - Crítica à disseminação de interesse sobre empreendimento
A Diretoria Executiva de um Grupo Empresarial, antes mes-mo de estar concluída a análise de viabilidade de um em-preendimento e de o mesmo ter sido discutido no âmbito do Conselho de Administração, adianta ao público investidor o grande interesse da Companhia em implantar o referido empreendimento. O Conselho de Administração repreende a Diretoria pela iniciativa.
10. Conselho de Administração x Diretoria Executiva - Crítica à forma de conduzir a comunicação durante uma crise
Um grave acidente, com falecimento de pessoas e destruição de patrimônio próprio e de terceiros, impacta, em várias fren-tes, as operações de uma das mais importantes empresas de um Grupo Empresarial. A comunicação da Diretoria Executi-va com as famílias afetadas e a sociedade, de maneira geral, é sofrível, sendo fortemente criticada pela mídia e pela socie-dade com grande prejuízo de imagem à Organização. O Con-selho de Administração repreende com ênfase o presidente da Diretoria Executiva e exige a apresentação ao Conselho de um plano específico para gerir eventuais crises congêneres.
LACUNA ENTRE EXPECTATIVA E
REAL ENTREGA DE RESULTADOS
11. Conselho de Administração x Diretoria Executiva - Divergências de entendimento em relação aos
impactos da crise nos resultados da empresa
De acordo com os ritos de governança corporativa, os de-monstrativos financeiros foram submetidos ao Conselho de Administração para apreciação e aprovação. O resultado apresentado estava significativamente abaixo do planeja-mento orçamentário, cuja variação negativa foi explicada em função dos efeitos da crise do mercado internacional, que se agravaram e não foram capturados durante a elaboração do planejamento orçamentário da Companhia. O Conselho de Administração não aceitou as explicações dadas e ponderou que a Diretoria Executiva deveria ter tomado as providências necessárias para garantir a geração dos resultados esperados e que detinha instrumentos necessários e autonomia para tal. O Diretor Financeiro foi demitido e parte da Diretoria Execu-tiva responsabilizada pelo resultado insatisfatório.
12. Conselho de Administração x Diretoria Executiva – Divergências de entendimento em relação à
distribuição de resultados abaixo do esperado.
Com o encerramento ofi cial do exercício e a defi nição dos bônus para a alta administração, a Diretoria Comercial dis-cordou do cálculo apresentado pelas Diretorias de RH e Fi-nanceira, visto que superou as metas e, portanto, o bônus deveria ser integral. A Diretoria Financeira esclareceu que o volume de vendas foi superado, mas a margem de contribui-ção gerada estava abaixo do planejamento orçamentário, e que o cálculo previa a ponderação entre os dois. A Diretoria Comercial discordou veementemente o que gerou uma crise interna na Alta Administração da Companhia.
Organizados sob o formato anterior, os 12 cases didáticos aqui exibidos, a exemplo de vários outros apresentados em artigos anteriores para ilustrar os desalinhamentos que podem ocorrer em vários níveis, prejudicando as organiza-ções, não permitem perceber o potencial de tensão que cada situação pode criar entre as partes e os custos correlatos. Ainda sobre esses exemplos, que poderiam ensejar, indivi-dualmente ou em conjunto, diversos estudos, observamos: • Quando tratamos, em artigos anteriores, do
desalinha-mento entre sócios ou, alternativamente, entre sócios e administradores, referimo-nos a tensões entre públicos externos e internos, considerando que parte dos sócios - especialmente os pequenos acionistas pulverizados pelo mercado de ações - pode não estar inserida de forma direta na administração corporativa. Neste ponto do nosso traba-lho, estamos tratando exclusivamente de desalinhamentos de
governança internos, ou seja, dentro da organização.
• Desalinhamentos podem ocorrer não apenas entre duas instâncias distintas, como o Conselho de Administração e Diretoria Executiva, mas dentro de uma dada instância de governança, conforme ilustram exemplos aqui apre-sentados.
• Uma vez mais - o que não surpreende -, o confl ito de agência e a assimetria informacional se fazem presentes. No primei-ro caso, alguma decisão foi ou está sendo implementada em nome de alguém, estando sujeita a críticas, em maior ou menor medida; no segundo caso, as informações não têm circulado de maneira equânime entre aqueles que deveriam recebê-las e analisá-las.
• Os exemplos anteriores são meramente didáticos, sen-do que um mesmo exemplo pode ser enquadrasen-do em mais de um aspecto.
O desalinhamento entre administradores e seus custos cor-relatos podem ser mitigados? A resposta é sim, isso é possí-vel. Trataremos desse tópico no último artigo desta prome-tida sequência de três, mas, para o momento, apresentamos quatro considerações sobre diretores, muito importantes para o próximo passo. São elas:
• A Diretoria Executiva está na linha limítrofe entre os ambientes de governança corporativa e gestão corpora-tiva. Diretores são, a um só tempo, governantes, quando interagem dentro do ambiente de governança, e gestores, quando atuam, no dia-a-dia, na coordenação de seus res-pectivos processos de trabalho.
• Sob a orientação mais abrangente do Conselho de Ad-ministração, a Diretoria dirige as estratégias, táticas e operações empresariais. Eventuais divergências com o Conselho devem ser tratadas e resolvidas, a fi m de que o alinhamento entre essas instâncias seja máximo. • O Conselho Fiscal é parte crucial do governo
organizacio-nal e precisa ser bem acolhido nesse sistema de governo. • O presidente da Diretoria Executiva constitui o elo, a ponte, entre os demais diretores e o Conselho de Administração. Entretanto, elos informais podem existir no ambiente so-cial mais amplo e esse aspecto não deve ser esquecido na construção de sistemas de governança robustos.
Retomaremos essas refl exões anteriores ao fi nal desta trilogia para apresentar a essência da Orquestra Societária. RI
MÔNICA BRANDÃO
é executiva e profi ssional de fi nanças e estratégia, professora e conselheira da Apimec-MG.
mbran@terra.com.br CIDA HESS
é gerente executiva da PwC, economista e contadora, especialista em fi nanças e estratégia.
cida.hess@br.pwc.com