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20º Congresso Brasileiro de Sociologia. 12 a 17 de julho de Universidade Federal do Pará Belém, PA

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20º Congresso Brasileiro de Sociologia 12 a 17 de julho de 2021

Universidade Federal do Pará – Belém, PA

Grupos de Trabalho - GT 04 - Ética, Imagem e Sociedade

“Os documentários e o ensino de sociologia.” Armando Manoel Neto

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RESUMO

Esta comunicação busca discutir algumas especificidades do uso de filmes documentários nas no ensino de sociologia. Propomos uma sistematização das expectativas em relação aos filmes deste gênero - e seus subgêneros de acordo com as classificações propostas por Bill Nichols e Arlindo Machado em relação aos filmes ficcionais. Para tanto, sugerimos uma reflexão em torno da especificidade da questão documental em produtos audiovisuais, traçando um panorama dos tipos de documentários para a exibição em salas de aula e outros espaços educativos, bem como analisar alguns casos recorrentes nas práticas dos docentes da área. A reflexão crítica sobre as práticas de exibição, análise e, em certos casos, até da criação de documentários por parte dos professores, professoras e estudantes da área carrega o sentido de discutir como o documentário em si não é um relato neutro das realidades abordadas, mas uma representação, que carrega muitos pormenores simbólicos e discursivos, que às vezes são necessários para um agenciamento efetivo dessas imagens em contextos educacionais. O texto encerra-se como uma reflexão sobre a educação cultural, científica e política das pessoas, sugerindo uma educação pelas e para as imagens e a construção da memória individual e coletiva de determinados grupos sociais.

PALAVRAS CHAVE: Documentários, educação, sociologia, ensino de sociologia, material didático.

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É possível imaginar que, desde algum tempo, os docentes da área de sociologia (bem como praticamente todas as áreas de ciências humanas, e quiçá de outras) fazem uso constante e sistemático de produtos audiovisuais. Certamente um número significativo de documentários passa, ou ao menos poderia passar por estes processos de ser utilizado em exibições em salas de aula ou on-line. As possibilidades temáticas, como nós professoras e professores sabemos, são infinitas. Temos em conta ainda que o uso pedagógico do audiovisual foi expandido em contextos recentes de ensino remoto, forçado pela pandemia de Covid-19 ao redor do mundo. Nesse sentido propomos aqui uma organização de algumas perspectivas teórico-metodológicas que poderão nos ajudar a pensar essa integração do documentário aos processos de educação escolar, mais especificamente em disciplinas de sociologia para o ensino médio brasileiro.

Se coloca então a possibilidade de questionar qual a especificidade do documentário para o ensino de sociologia. Porque o documentário, ou não? Há aqui uma curiosidade em entender o tratamento dado a certos filmes em contexto escolar. Não se trata de cultivar uma resposta que justifique uma predileção estéril por um gênero ou outro, ou por uma escolha a esmo devida, ilusoriamente ao refino do gosto estético do professor ou professora (mesmo que isso acabe sendo também importante para o docente). Nesta comunicação em específico, trataremos de dois pontos fundamentais para o desenvolvimento desta pesquisa: 1) O que apontaremos como algumas opções teóricas e metodológicas para a abordagem aos documentários. 2) Da listagem sistematizada de documentários nos materiais sugeridos pelo Programa Nacional do Livro Didático (PNLD) 2018.

1. Opções teóricas e metodológicas para a abordagem aos documentários

Dentre algumas das linhas de pesquisa, apontamos uma perspectiva histórica que vêem os filmes em suas ocorrência sócio temporais como se assistissem a um filme, nos quais os dilemas, problemas e construções subjetivas e objetificadas sobre o cinema, e suas variações estéticas internas, vão sendo

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construídos e superados com o avançar da narrativa histórica. O documentário em seus princípios segue um rastro, entre autores, formas e estratégias estéticas, que o situam como forma de representação específica: muito se estuda a tradição Flaherty-Grierson-Rouch, e as inspirações do cinema verdade de Dziga Vertov (Novaes, 2004, Gonçalves, 2008, junto às ciências sociais.Os entendimentos destas linhas nos oferecem algumas observações sobre as definições do que é, ou pode ser, um documentário.

Desde 1922, o Nanook of the North, de Robert Flaherty já propunha questões que seriam para sempre colocadas aos documentários: O que é um documentário? Encenações para a câmera são permitidas? O que é real? Devemos ou não ter compromisso com a verdade? Compromisso de que natureza, e qual verdade? Nanook of the North é considerado o primeiro documentário de longa-metragem a ser realizado, o filme é considerado um marco do gênero, e vem sendo estudado sucessivamente devido sua importância. As declarações do diretor revelando os “truques” para filmagens, as formas de resolver os problemas narrativos e discursivos, sempre demonstraram que as coisas nunca são exatamente o que parecem. Ou, melhor, nunca são o que querem parecer.

Nesse sentido, é importante pensar no documentário sempre inserido num mundo social, assim, os documentários são o produto das relações entre as pessoas, mas também entre as empresas e instituições que fazem esses filmes. Mesmo que o gênero documentário jamais tenha contado com a força estabilizadora da indústria para impor convenções estilísticas e padrões narrativos relativamente homogêneos, sempre existiram parâmetros sócio culturais delimitadores e impositivos no sentido estético.

Mesmo assim, o documentário ainda nos faz refletir mais sobre a maneira como o espectador vê o filme, do que propriamente sua constituição enquanto objeto material. Uma noção de recepção perdura mais para se entender porque aceitamos um filme como documentário ou não. Em tese, todo filme é um documento, e em princípio, tudo pode ou não ser documentário, dependendo do ponto de vista do espectador. O filme de Flaherty não é apenas o registro do esquimó. É uma história construída. Ele não descreve, mas constrói seu trabalho

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com o valor, não da imagem, mas da sequência narrativa. Documentário ou não, os filmes são sempre construções. E construções eminentemente discursivas porque potentes para gerar mais e mais discursos a partir de si. O simples registro visual (tão comum hoje em dia com o uso dos smartphones) é ainda um material incompleto de certa forma porque as imagens se justapõem sem nenhuma necessidade interna. Num filme, documentário ou ficção, a realidade que interessa é aquela construída pela imaginação autoral, uma imaginação que se manifesta tanto no momento da filmagem como no processo posterior de montagem. Temos de estar sempre atentos à camada retórica que se sobrepõe ao material bruto, que se inicia a partir desse momento da filmagem, mas que avança como esse modo de “contar” o material, e depois ainda na divulgação e entendimento deste pelo público.

Para trabalhar os filmes na área de sociologia, é preciso ao menos imaginar também as escolhas que levam à construção de uma perspectiva do próprio modo documentário. Normalmente partimos de um tema: trabalho, meio ambiente, cultura, etc. Mas temos que pensar que os documentários não são consequências de um tema, mas uma forma de se relacionar com aquele tema (Salles, 2005). Assim, o sentido de se propor um entendimento documentário sobre um filme não reside na “coisa” sobre a qual ele discursa. O que interessa mais talvez é o “como” o filme a abordar. Assim, esta obra nos convida a pensar que os documentários não são exatamente sobre os outros, mas sobre como documentaristas mostram os outros. A representação de qualquer coisa é a criação de outra coisa. Segundo Salles (2005), uma reflexão possível que podemos construir é de que: a natureza do documentário não é estética, nem epistemológica: e ética. Será um documentário todo filme em que o diretor tenha uma responsabilidade ética para com seu personagem, grupos social ou mesmo tema com o qual trabalha.

Além desta perspectiva histórica, podemos ainda buscar alguns entendimentos sobre os documentários num campo mais interno a este objeto. Este campo este que parece pretender organizar os debates sobre os documentários em termos de sua especificidade, enquanto linguagem e representação, que portanto é construída e organizada historicamente como

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apontamos, também passa a oferecer leituras e sistematizações relacionais inerentes ao seu próprio e específico formato. Mesmo que isso na prática corresponda muito pouco aos próprios documentários que de fato existem. Assim , que fique claro que estas propostas ecoam um entendimento Weberiano de pensar uma classificação dos formatos dos documentários mais no sentido de tipos ideais do que exemplos práticos (Menezes, 2017). As tentativas de enumeração e classificação entre os diferentes documentários - tanto de Nichols (2009) quanto de Salles (2005) - aqui debatidas, nos parecem características dos modos do debate das formas do documentário enquanto campo.

Bill Nichols (2009) estabelece o modus operandi classificatório dos muitos filmes que foram chamados de documentários, conceito não de reprodução, mas de representação de algum aspecto do mundo histórico-social que compartilhamos. Ele traz em suas mãos a primeira listagem das formas do documentário com a qual trabalharemos. Documentários são sempre um argumento sobre o mundo que pressupõe uma perspectiva, e um ponto de vista, portanto nunca são neutros politicamente falando Nichols 2009). A classificação de Nichols divide o gênero documentário em seis subgêneros. Cada um deles opera com base em convenções que lhe são específicas:

1) Modo expositivo; marcado pelos documentários clássicos, preenchidos por argumentos e narrados muitas vezes em voz off ou em letreiros; Exemplos: Ilha das Flores de Jorge Furtado. Brasil, 1989; Radio Bikini de Robert Stone. EUA, 1988; A revolução dos cocos, de Dom Rotheroe, Reino Unido, 1999.

2) Modo observacional no qual o espectador é tido como observador ideal. Pressupõe a não intervenção, a invisibilidade da equipe, planos sequências naturalistas e muitas vezes som sincrônico, sem música. Justiça de Maria Augusta Ramos. Brasil, 2004; Entreatos de João Moreira Salles, 2004. A Chuva de Joris Ivens, Holanda, 1929.

3) O modo participativo é marcado pelo chamado “cinema-verdade francês”, o qual defende a ideia de que os filmes se mostrem como “realidades fílmicas”, e não retratos objetivos da realidade. Exemplos: Eu, um negro. Jean Rouch.

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França, 1958; Edifício Master. Eduardo Coutinho. Brasil, 2002 (praticamente todos os filmes de Eduardo Coutinho se encaixam neste modo)

4) Modo reflexivo, que surge historicamente como resposta ao ceticismo frente a possibilidade de uma reprodução objetiva do mundo, valoriza a estratégia de distanciamento crítico do espectador (ironia, satira, paródia, etc). Exemplos: Fraternidade. Jorge Furtado. Brasil, 2004; O Sanduíche. Jorge Furtado. Brasil, 2000,

5) Modo performático caracteriza-se por uma abordagem essencialmente subjetiva, trazendo o próprio documentarista para o centro do filme. Exemplos: Diário de uma busca. Flávia Castro. Brasil, 2010; Silverlake Life: The View from Here, 1993 de Peter Friedman e Tom Joslin; Fahrenheit 9/11 - Michael Moore, EUA, 2004 (em geral toda produção de MIchael Moore se encaixa neste modo) 6) Modo poético que envolve muito da vídeo arte, nos quais imagens costumam ser usadas de modo bem expressivo, prevalecendo sobre o discurso verbal . São exemplos: Olhos de ressaca. Petra Costa. Brasil, 2009; Nunca é Noite no Mapa -Ernesto de Carvalho, 2016; Janela da alma. João Jardim e Walter Carvalho. Brasil, 2004,

Em meados dos ano 2000 o pesquisador Arlindo Machado (2011) - sobre os debates em torno de uma expansão que em alguns casos configura até mesmo a superação do conceito de documentário - sugere alguns formatos , ou“desvios”, no sentido de um hibridismo ou de indefinição categórica, das formas apontadas por Nichols (2009). Muito pelas contaminações que sofreu este gênero de estéticas técnicas e éticas até então entendidas como ficção. Entendemos essas novas classificações da mesma forma, como tipos ideais, eficazes para pensarmos algumas obras, e não como categorias absolutas que classificam o real. Machado (2011) define assim alguns novo subgêneros (ou sub-subgêneros): o documentário híbrido (que questiona justamente a pureza de cada uma das categorias definida anteriormente), o falso documentário (que tem a "cara" do documentário, mas é ficção, muitas vezes em tom de zombaria como o termo em inglês sugere mockumentary ), o meta documentário (que denuncia à ilusão documental e testa os limites do gênero - num sentido muito ético), à animação

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documental e o documentário machinima (muito relacionados às formas de produção gráficas, virtuais e digitais de novas tecnologias).

É pensando nessas tipologias específicas e nestas características e questões imanentes dos documentários que acreditamos ser possível um desenvolvimento de uma educação cultural, científica e política das pessoas, pelas e para as imagens e para além disso em função da construção da memória individual e coletiva de determinados grupos sociais. Os documentários e os alunos e alunas que se colocam como espectadores desses filmes têm que passar por um processo de desenvolvimento da percepção de mundo por meio da subjetividade, tanto que os conforma, como à que conformou o produto audiovisual que eles consomem. À subjetividade aqui é entendida como o espaço íntimo do indivíduo, ou seja como ele 'instala' a sua opinião ao que é dito (mundo interno) com o qual ele se relaciona com o mundo social (mundo externo), resultando tanto em marcas singulares na formação do indivíduo quanto na construção de crenças e valores compartilhados na dimensão cultural que vão constituir a experiência histórica e coletiva de sua educação. É justamente aí que reside a potência dos documentários, mesmo que para isso se revelem alguns truques ou atalhos para os estudantes, ou seja, que se esclareçam os processos de representação em algum momento do processo educacional. O que exige de nós professoras e professores um aprofundamento mínimo nesse formato documentário aqui apresentado.

2. Breve entendimento quantitativo da indicação de documentários em manuais de ensino de sociologia para o ensino médio.

Nesta seção apresento um breve experimento quantitativo, de contagem simples do material listado nos livros indicados pelo Programa Nacional do Livro Didático (PNLD), 2018. Este exercício busca identificar a quantidade dos filmes de gêneros documentário e ficção sugeridos para os usos nas aulas de sociologia para o ensino médio. A ideia é construir um debate acerca da utilização de

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documentários nos manuais de ensino de sociologia do ensino médio brasileiro nesta amostra específica1.

Foram analisadas 5 obras indicadas pelo PNLD 2018. Pensamos testar a hipótese de que o formato documentário seria de alguma forma privilegiado como objeto de ensino da disciplina sociologia no ensino médio, como uma primeira impressão poderia sugerir. Neste observamos que em todas as obras analisadas o número de documentários é sempre menor (às vezes muito menor) do que o de filmes ficcionais indicados para serem trabalhados de forma pedagógica dentro da disciplina. Uma outra conclusão central foi o entendimento de um maior uso dos documentários nacionais em detrimento de obras estrangeiras.Os pormenores qualitativos e os indicadores chave para pensarmos essas questões serão apresentados nas sub-seções dedicadas a cada obra.

Uma característica comum em todas as obras analisadas é o estabelecimento de um lugar específico dedicado aos filmes ou ao cinema. Visual e graficamente falando é sempre uma caixa, ou uma subseção que define este campo de trabalho pedagógico. Indicarei os nomes de cada um quando olhar para as obras. Em nenhum deles há uma separação entre filmes de ficção e documentários. Também não há uma proporcionalidade esclarecida. Há capítulos com indicações proporcionais, outros às vezes indicam mais, menos ou apenas filmes ficcionais, ou vice-versa em relação aos documentários. O número de filmes indicados também varia consideravelmente entre as obras.

As sinopses textuais que apresentam os filmes diferenciam em muitos casos os documentários das ficções nas cinco obras analisadas. O documentário na maioria das vezes é precedido de uma enunciação de formatos. Ou seja, estes manuais didáticos, ao indicarem este tipo de atividade e objeto pedagógico, sempre informam que se trata do gênero em particular. O mesmo não acontece com as obras ficcionais, e, em raros casos, quando aparece um drama-biográfico. Nestes casos a narrativa aparece nas sinopses de forma natural. O ficcional não precisa ser apresentado, o documentário, na maioria das vezes, sim. Estas obras

1Digo isso porque estamos na iminência da construção e elaboração de uma nova rodada do PNLD 2021. Os

próximos livros publicados a serem selecionados pelo programa já deverão ser organizados num novo formato, o de ciências humanas e sociais aplicadas, e não mais divididos entre disciplinas. Ver o site do PNLD 2021.

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apresentam e entendimento da necessidade de alertar, avisar, ou direcionar a fruição da obra quando se trata de um documentário e não conservar esse procedimento quando são indicados obras ficcionais. Mesmo que os textos sejam diferentes, a enunciação acontece com frequência. Observe os exemplos.

“Estamira (Brasil, 2004). Direção: Marcos Prado. Documentário sobre uma mulher de 63 anos de idade que trabalha há mais de vinte anos no aterro sanitário de Jardim Gramacho, no Rio de Janeiro. Ela conta como a pobreza afeta a mente das pessoas que precisam encarar diariamente a batalha pela sobrevivência em condições sub-humanas. (Machado, Amorim e Barros, 2017)

“Estamira, 2006, duração 115 min. Direção de Marcos Prado.

O documentário é sobre Estamira Gomes de Sousa, uma mulher de 63 anos que mora e trabalha em um aterro sanitário, situado em Jardim Gramacho, no Rio de Janeiro. (Bomeny, et al. 2013)

“A Corporação, 2003. Estados Unidos, direção de Mark Achbar e

Jennifer Abbott.

Documentário, com roteiro do jurista Joel Bakan, tece críticas a origem e a dinâmica das empresas transnacionais, comparando-o com as pessoas. (Araújo, et al 2016)

“The Corporation, Canadá, 2003. Direção: Mark Achbar e Jennifer Abbott. Duração: 145 min.

O documentário une vídeos institucionais, imagens documentais e entrevistas de personalidades como NOam Chomsky, Milton Friedman e Sir Marky Mooody-Stuarty (Ex-dirigente mundial da Shell), além de artistas, jornalistas e executivos, para investigar a atuação das grandes corporações transnacionais no mundo contemporâneo. Por meio de uma abordagem psicológica, com análise dos crimes praticados por algumas empresas, o filme procura mostrar como o “comportamento” dessas

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pessoas jurídicas pode ser associado ao que se entende como psicopatologia, devido à sua busca incessante por lucro e “realização” pessoal, sem nenhuma preocupação com possíveis danos causados à terceiros. (Silva et al. 2016)

Além da perspectiva dessa enunciação textual, que apareceu nos espaços exploratórios concedidos pelo nossos estudo, é importante frisar também algumas escolha metodológicas que contribuíram para os resultados apresentados ao final deste texto. Centralmente, é importante delimitar as categorias de definição dos documentários indicados pela nacionalidade. A maioria dos filmes indica o país de produção, em alguns casos de produção dividida entre dois países, e sempre que este país foi o Brasil, classificamos o filme como nacional. Estatisticamente falando esse parâmetro desloca sempre os filmes mais para um lado ou para outro na análise. Porém, em se falando das conclusões, as percepções gerais não sofrem alterações significativas.

3. Tempos Modernos, Tempos de sociologia: volume único/ Helena Bomeny… [et al.] (coordenação). - 2. ed. São Paulo: Editora do Brasil 2013.

De todos os manuais didáticos para sociologia analisados neste estudo, talvez o “Tempos modernos, tempos de sociologia” seja o único que se utiliza do cinema como ferramenta pedagógica para além da indicação de filmes como atividade complementar e/ou ilustrativa da seção ou capítulo na qual está inserida. Mesmo que ainda utilize essa estratégia como os outros. Nesta obra há uma variante construída na “Parte II A sociologia vai ao cinema” que propõe uma linha pedagógica de atividades que se organizam em torno do filme Tempos Modernos (1936) de Charles Chaplin para “exercitar a imaginação sociológica convidando alguns cientistas sociais famosos para assistir a um filme genial.” (Bomeny et. al 2013)

Sem adentrarmos na estratégia propriamente dita, é notório o entendimento que este livro insinua por meio destes usos do cinema em em práticas pedagógicas que podem (e deveriam talvez) extrapolar a exibição de filmes apenas como material de apoio, que na maioria das vezes é sugerido como

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forma de ilustrar um tema, e não como objetos de uma sociologia em si. De forma que toda a Parte II indicada é formatada por capítulos que se organizam em função das cenas da obra prima de Chaplin, para, a partir das sequências de imagens indicadas no início dos capítulos compreendidos pela seção, propor as abordagens temáticas da disciplina sociologia no ensino médio. Orientar toda uma seção temática, e diversos capítulos por meio de uma obra cinematográfica, inverte a questão da ilustração, colocando à imagem como problema da ordem dos pensamentos, potente para indicar percepções e sensibilidades fundamentais para o ensino de sociologia como ponto de partida, e não apenas como ilustração de uma representação maior de ideias. A orientação para os professores, em módulo próprio fornecido pela editora indica:

Mas, voltando para a fórmula geral, a de indicar uma série de filmes, ao final dos capítulos, como obras suplementares aos temas tratados “Tempos Modernos, tempos de sociologia” indica no total 52 filmes, sendo 31 deles ficções e 21 documentários. E, dentre os 21 documentários indicados, 19 são nacionais, apenas um é uma produção estadunidense, e apenas um também se configura como produção estrangeira de outros países que não os EUA.

4. Sociologia em movimento. - 2. ed. - São Paulo: Moderna 2016. Vários autores. (Silva et. al 2016)

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“Sociologia em movimento” apresenta os filmes, documentários, livros e endereços eletrônicos na seção lateral da página em “indicações”, que perpassam a obra, em todos os capítulos. Particularmente, este manual agrupa todos esses elementos e materiais de apoio que dialogam com o tema proposto. 42 filmes aparecem em indicações, sendo 25 ficções e 17 documentários. Deste último gênero 14 são nacionais, outros 2 produções estadunidenses, e uma apenas se configura como produção estrangeira de outros países que não os EUA.

5. Sociologia : Volume único: ensino médio/ Silvia Maria de Araújo, Maria Aparecida Bridi, Benilde Lenzi Motim - 2ª ed. São Paulo: Scipione. 2016.

Nesta obra os filmes estão indicados na subseção “As ciências sociais e o cinema”, que por sua vez estão concentrados na seção “Descubra mais” que aparece sempre ao final dos capítulos, e contempla mais duas seções “Ciências sociais na biblioteca” e “Ciências sociais na rede”. As indicações, em referência a obra apresentada anteriormente, por exemplo, estão assim separadas entre os formatos audiovisual, textual e escrito e, também, eletrônico digital. Há várias intersecções entre obras deste tipo. Em “As ciências sociais e o cinema”, são sugeridos 55 filmes,

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sendo 39 ficções e 16 documentários. Dentre os documentários, mais uma vez predominam as produções nacionais, 8 obras sobre as estadunidenses com 5 obras e estrangeiras de outros países com 3 obras. Essa talvez seja a amostra de documentários mais equilibrada nas séries.

6. Sociologia para jovens do século XXI - 3ª Edição. Luis Fernandes de Oliveira & Ricardo Rocha Cesar da Costa.

Nesta obra os filmes estão alocados na sub-seção “Pesquisando e refletindo”, que aparece no final dos vinte e dois capítulos, e que por sua vez indica sempre cinco tópicos nesta ordem : 1) Livros; 2) Filmes; 3) Conectados na internet e nas redes sociais; 4) Músicas; e 5) Filme destaque. Obviamente nos interessa nesta obra os tópicos 2) Filmes e 5) Filme destaque. Além disso, incluímos dois filmes que são citados nas partes correntes dos capítulos, mas não são indicados como obras relacionadas nestas seções2.

2Uma observação em relação a esta condição de citação, mas não de indicação, me parece muito relacionada

à temática dos filmes e dos possíveis conflitos ideológicos e eventuais censuras que o material poderia receber. Um dos filmes é “Lula filho do Brasil” (2009) dos diretores Fábio Barreto e Marcelo Santiago, impossível não relacioná-lo à campanha de perseguição e difamação midiática que se perpetrou ao PT nos anos subsequentes a 2016, que, obviamente, seria refletida em obras deste tipo. Importante ressaltar que filmes deste tipo, marcadamente ligados à figuras políticas, que poderiam gerar uma espécie de censura por parte dos avaliadores do PNLD, nem mesmo aparecem em outros livros. Situação que tende a se agravar no programa em 2021.

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Levando tais fatores em consideração, contabilizamos a sugestão de 91 filmes para serem trabalhados pelos professores e estudantes. Dentre estes, 24 são documentários. Cerca de 26% (ou um quarto) do total dos filmes sugeridos de modo geral são documentários. Se pensarmos apenas no tópico “Filme destaque”, dos 22 indicados (um por capítulo do livro), apenas 5 são documentários - cerca de 22% (próximo de um quinto) do total. O gráfico apresentado a seguir, pensando que este livro didático é o único que separa a indicação de filmes em dois tópicos diferentes, ilustra uma tendência que foi observada em todas as outras obras aqui analisadas: a predominância da indicação de filmes de ficção sobre os documentários, e por sua vez, a predominância das produções nacionais sobre as estrangeiras dentro do gênero documentário nos manuais didáticos da disciplina sociologia no ensino médio indicados pelo PNLD 2018.

Gráfico 1: Quantidade de filmes, ficções e documentários na obra Sociologia para jovens do século XXI - 3ª Edição. Luis Fernandes de Oliveira & Ricardo Rocha Cesar da Costa. por tópicos da subseção “Pesquisando e refletindo”.

Além disso, observamos as indicações do manual do professor do livro “Sociologia para jovens do século XXI” - 3ª Edição. (Pág. 19) ilustrada abaixo. Estas orientações, que acompanham a obra que será fornecida aos alunos, atribui aos professores e professoras uma função deveras trabalhosa, considerando os 91 filmes indicados: a de assistir todos os filmes, pensar sobre eles, e além disso fazer uma resenha para cada obra. Considera-se que alguns destes filmes, em geral, podem já ter sido assistidos pelo profissional em outros contextos. Mas,

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para o uso em sala proposto, dificilmente o domínio sugerido se dará satisfatoriamente - ao ponto da produção de resenhas, esse é o papel do crítico de cinema, não dos educadores e educadoras. Neste sentido, a obra se afasta da realidade do profissional da educação básica de qualquer área, afinal este momento de pré assistir - veja bem, porque o professor ou professora tem de assistir e resenhar os filmes antes dos alunos - parece muito distante de ser alcançado em momentos de planejamento de aula por exemplo. Além disso, esse domínio sugerido para a utilização das obras carece de um fundamento pedagógico mais explícito. Por que ter tanto domínio e controle de um filme, sendo que a própria noção de fruição artística das obras audiovisuais já supõe a possibilidade de diferentes leituras e entendimentos? Pensando nas perguntas feitas nesta mesma orientação, poderíamos pensar se de fato os filmes têm um só tema - conforme orientado - ou se os temas vêm da própria experiências dos estudantes, e assim, cada filme poderia suscitar diferentes visões, de acordo também com as subjetividades daqueles que o assistem. Essa proposta, inserida na discussão da imaginação sociológica que se propõe, parece, de novo, colocar o filme como mera ilustração conteudística, e não como abertura para discussões orientadas pela percepção e sensibilidades dos estudantes.

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7. Breves conclusões

Algumas características comuns entre as obras é o campo específico dedicado aos filmes ou ao cinema. Assim, observamos que cada uma das obras dedica uma seção exclusiva para filmes em seus capítulos temáticos. Essa sub-seção aparece sempre no final dos trabalhos com cada tema, indicando os filmes (sejam eles ficcionais ou documentários) como uma espécie de material complementar àquele até então apresentado no modo escrito. Esta seção -ou subseção dentro de uma maior que organiza o material- ou seja, ela ocasionalmente acompanha outras que também fazem indicações nesse sentido complementar, como livros, sites, músicas, entre outros. Entendemos assim que de maneira geral, os filmes indicados não são trabalhados centralmente como um potencial objeto de análise, como uma única exceção do livro “Tempos modernos, tempos de sociologia”, que em sua Seção II, apresenta a proposta “A sociologia vai ao cinema”, única talvez que coloque o cinema e os filmes em outro lugar que não este de material complementar, que pode ou não ser utilizado, de maneira mais ou menos igual: serem assistidos em sala, ou em em casa, antes ou depois das aulas.

De maneira geral a percepção dos documentários é sempre aquela relegada às imagens, ou material de apoio nesses manuais de ensino. O que,

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pensando em termos de imagem aprofundam um sentimento de utilização destas obras como uma espécie de ilustração de um tema maior. Importante pensar que mesmo sendo pensados e apontados como gêneros diferentes - caso demonstrável pela “enunciação” textual dos documentários que não ocorre com obras ficcionais - ambos, documentário e ficção são apresentados sempre sobre o mesmo entendimento ou seção temática. Em nenhuma obra há uma seção de documentários e outra de filmes ficcionais separadas.

Se observarmos o gráfico a seguir, observaremos que as obras da área de sociologia do PNLD 2018 sugerem sempre mais filmes de ficção do que documentários, independente do número de obras e das formas que estas estão organizadas.

Gráfico 2: Quantidade total de filmes indicados, e proporções de ficções e documentários nas obras indicadas para a área de sociologia para o PNLD.

Por outro lado, dentre os filmes indicados no gênero documentário predominam as produções nacionais em todas as obras analisadas, independente das formas que elas estão apresentadas e organizadas. O documentário indicado, é o documentário nacional.

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Gráfico 3: Quantidade total de documentários, e proporções filmes nacionais, estadunidenses e estrangeiros de outro país que não os EUA nas obras indicadas para a área de sociologia para o PNLD.

Assim, entendemos que o documentário não deve ser confundido como o formato predominante nos filmes indicados pelos manuais de sociologia para o ensino médio. Pelo menos não em relação aos filmes ficcionais. Afinal, a ficção predomina como escolha didático pedagógica oferecida pelos manuais didáticos da disciplina sociologia. Porém, há uma tendência clara que nos indica qual documentário é esse que vai para os manuais de ensino: o documentário nacional.

Os próximos passos desta pesquisa se direcionam então para o entendimento desta opção específica de formato e conteúdo: documentários nacionais. A ideia é propor um aprofundamento para entender os filmes que se repetem, ou que possam indicar alguns entendimentos dentro destas possibilidades audiovisuais. Além disso, certamente faremos uso de abordagens mais qualitativas, que deem conta dos entendimentos em torno da produção neste gênero nos últimos anos no Brasil. Uma outra possibilidade é investigar qual o real uso destes filmes indicados pelos professores das redes públicas e particulares do estado de São Paulo, por exemplo. As expectativas giram também

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em torno das possibilidade de se pensar nos próximos materiais didáticos que serão elaborados segundo a BNCC, que não separa mais as disciplinas do jeito até então estabelecido. No caso, poderíamos pensar nas contribuições para à área de ciências humanas nesse aspecto.

Referências:

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MENEZES, Paulo. Representificação: as relações (im)possíveis entre cinema documental e conhecimento. Revista Brasileira de Ciências Sociais (Impresso), São Paulo, v. 18, n.51, p. 87-97, 2003.

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NICHOLS, Bill. Introdução ao documentário. Papirus Editora. Campinas- SP. 2009.

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SALLES, João Moreira. “A dificuldade do documentário”. In Martins, Eckert & Caiuby Novaes (orgs.). O imaginário e o poético nas Ciências Sociais. Bauru, Edusc, 2005. (57-72)

SILVIA, Maria de Araújo; BRIDI, Maria Aparecida; MOTIM, Benilde Lenzi; Motim Sociologia : Volume único: ensino médio/ 2ª ed. São Paulo: Scipione. 2016.

SORLIN, Pierre.Sociologia del cine: La apertura para la historia de mañana. Fondo de Cultura Econômica. México D.F. México. 1985

XAVIER, Ismail. O discurso cinematográfico: a opacidade e a transparência. São Paulo. Editora: Paz e Terra, 2005.

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