UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE CENTRO DE CIÊNCIAS BIOLÓGICAS E DA SAÚDE
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DISTÚRBIOS DO DESENVOLVIMENTO
PAULA NASCIMENTO FRADE
FORMAÇÃO DO PROFESSOR PARA INCLUSÃO ESCOLAR DE ALUNOS COM TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA E SEUS EFEITOS NA PRÁTICA
DOCENTE
São Paulo
2018
UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE CENTRO DE CIÊNCIAS BIOLÓGICAS E DA SAÚDE
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DISTÚRBIOS DO DESENVOLVIMENTO
PAULA NASCIMENTO FRADE
FORMAÇÃO DO PROFESSOR PARA INCLUSÃO ESCOLAR DE ALUNOS COM TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA E SEUS EFEITOS NA PRÁTICA
DOCENTE
Dissertação apresentada ao programa de Pós- Graduação em Distúrbios do Desenvolvimento da Universidade Presbiteriana Mackenzie para obtenção do título de Mestre em Distúrbios do Desenvolvimento.
Linha de pesquisa: Estudos do desenvolvimento e seus transtornos nas áreas clínica, cognitiva, comportamental e epidemiológica: implicações individuais e sociais.
Orientador: Prof. Dr. Luiz Renato Rodrigues Carreiro
São Paulo
2018
Esta dissertação foi realizada com apoio da
CAPES-PROSUC e Mackpesquisa
À memória de minha avó, Maria Alice, por ter
sido minha inspiração de fé e amor ao
próximo, pessoa que mais admirei e amei na
vida.
AGRADECIMENTOS
A Deus, que, em sua infinita bondade, permitiu que eu chegasse até aqui. O Senhor cumpriu todas as promessas e mostrou que, quando pensei ser o fim, na verdade era apenas o começo. Ele reservou o melhor para mim.
Ao meu orientador, Prof. Dr. Luiz Renato Rodrigues Carreiro, que, com muita calma, sabedoria, paciência e excelência profissional, me fez ir além do que eu imaginava e me deu a honra de trabalhar ao seu lado. Minha eterna gratidão por tudo que me proporcionou nesses dois anos de trabalho e por me encantar pelo seu profissionalismo e seriedade que tem pela pesquisa, além do lado humano, aceitando minhas falhas e fraquezas durante o período.
À CAPES (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior), por ter concedido a bolsa de estudos e me permitido levar este projeto adiante, tornando meu sonho realidade.
À Universidade Presbiteriana Mackenzie, que proporcionou a mim os melhores anos durante a graduação em Pedagogia e o stricto sensu, contribuindo para que eu crescesse profissionalmente.
Aos professores do Programa de Pós-Graduação em Distúrbios do Desenvolvimento por toda partilha de conhecimento, sabedoria e incentivo à pesquisa. Sou grata por ter tido a oportunidade de trabalhar neste projeto com pessoas tão engajadas e competentes.
À Profa. Dra. Edna Martins e ao Prof. Dr. Marcos Vinícius de Araújo que gentilmente aceitaram fazer parte da minha banca de Mestrado, trazendo contribuições valiosas e pontuações pertinentes com muito respeito e parceira.
Aos amigos que fiz durante o mestrado, no Programa de Pós-Graduação em Distúrbios do Desenvolvimento, pelos ensinamentos, conversas e conhecimento adquirido durante este período, em especial a Izabella Trinta Paes, por ter me ensinado a ser uma pessoa resiliente durante os momentos de provação.
À escola municipal que, gentilmente, aceitou que eu coletasse os dados para minha pesquisa e repensasse com a docente a prática pedagógica sobre inclusão do TEA.
À família do aluno em condição de inclusão e à professora participante que proporcionaram a mim uma coleta de dados emocionante e gratificante.
À minha mãe, Arlete Nascimento, que sempre será a minha estrela-guia, a luz da
minha vida. A conclusão deste trabalho, para nós, sem dúvida é a prova de que Deus cuida de
todos os detalhes e somos muito amadas. Há doze anos, no fim da graduação, não sabíamos o
que estaria por vir com aquele diagnóstico que havia recebido. Hoje, está curada e partilha comigo mais uma vitória.
Ao meu pai, Paulo Diniz, que sempre torceu por mim e me amou incondicionalmente. Sempre me incentivou a buscar o melhor e fazer a diferença. Sua mensagem dizendo “você é o meu orgulho, filha” é o combustível para minha vida.
Aos meus avós, Aristides (in memoriam), Alice (in memoriam) e Octávio (in memoriam), que sempre me amaram de um modo que jamais saberei explicar. As lições de vida passada por vocês fizeram que eu chegasse até aqui.
À minha avó, Hilda Diniz, que, com seu jeito doce e amável, compreendeu minha ausência durante o mestrado e me incentivava a buscar meus sonhos.
Ao meu tio, Aristides Filho (in memoriam): apesar de não ter lembranças dele, todos ressaltam até hoje o amor que tinha pela sobrinha e ansiedade em vê-la crescer.
Ao meu marido, Elizio Frade, o grande amor da minha vida, que sempre esteve ao meu lado e foi o maior incentivador para eu chegar até aqui. Como sempre me disse, “somos privilegiados e devemos aproveitar as oportunidades.” A você sou grata pelo amor, parceria, cumplicidade e resiliência.
Aos meus sogros, Carmem Frade e Elizio Frade, os meus incentivadores incansáveis que sabiam que a caminhada seria longa, mas que, com dedicação, meu sonho seria realizado.
Aos meus familiares, que aceitaram minha ausência durante este trabalho, fazendo com que os poucos momentos juntos fossem inesquecíveis.
Às minhas grandes amigas Cinthia Novoa, Eriana Valquer e Juliane Sperandio, que
sempre estiveram ao meu lado em todos os momentos e, principalmente, por aceitarem minha
ausência no período da pesquisa e se fazerem presentes mesmo longe.
“If you can dream it, you can do it”
(Walt Disney)
RESUMO
Nos últimos anos, a educação inclusiva ganhou um papel de destaque na formação de professores, porém ainda falta ampliar a oferta de cursos para atender às especificidades da inclusão escolar. Dessa maneira, podemos notar que a atual formação dos professores para atender às demandas de inclusão precisa ser revista. A presente pesquisa teve como objetivo geral avaliar o impacto de um programa de ação de formação sobre práticas pedagógicas em inclusão relacionadas ao transtorno do espectro autista (TEA) para uma professora do Ensino Fundamental I. A pesquisa de campo foi realizada, com base no estudo de caso, em uma escola municipal, na cidade de São Paulo, em uma classe de 5º ano que possuía um aluno diagnosticado com TEA. O trabalho ocorreu em quatro fases. Na fase 1, foi utilizado um questionário de identificação. Já na 2ª fase, um roteiro de questões orientadoras para a entrevista semiestruturada com a professora e observação das aulas para analisar a prática docente com o aluno em condição de inclusão. A 3ª fase incluiu um programa de ação de formação para a professora sobre inclusão de TEA. Já a 4ª fase incluiu entrevista e observação das aulas pós-formação. Os dados foram analisados de maneira qualitativa com base nas quatro fases do estudo. As análises consistiram em compreender através de entrevista com a professora o que ela entendia sobre inclusão dos TEA. Também foram analisadas as observações das aulas pré e pós-programa de ação de formação e entrevista pós-programa de formação com a docente com o objetivo de saber se houve mudanças quanto ao seu entendimento e prática pedagógica sobre inclusão dos TEA. Os resultados da pesquisa mostram que, de acordo com as observações realizadas anteriormente ao programa de formação, tanto a prática pedagógica da professora quanto a interação do aluno com os colegas não eram compatíveis com suas necessidades e não havia atividades adaptadas para ele. Durante o programa, a professora pôde repensar sua prática e conseguiu ressignificar suas aulas, elaborando propostas que incluíssem o aluno academicamente e socialmente. Conclui- se que o programa de formação ofertado à professora se mostrou viável (executável) e eficaz em relação à inclusão escolar do aluno com TEA.
Palavras-chave: Educação inclusiva. Formação de professores. Prática pedagógica. Transtorno
do Espectro Autista (TEA). Autismo.
ABSTRACT
In recent years, Inclusive Education has gained a prominent role in teacher education, but there is still a need to expand professional qualification to meet the specificities of school inclusion. Thus, it is possible to notice that the current teacher training, to meet the demands of inclusion, needs to be reviewed. The present research aimed to evaluate the impact of a training action program, on pedagogical practices in inclusion, related to autism spectrum disorder (ASD) for a primary school teacher. The research was carried out, based on a case study, in a municipal school, in São Paulo, in a 5th grade class, that had a student diagnosed with ASD. The work was carried out in four phases. In fase one, an identification questionnaire was used. In fase two, a guidance script for the semi-structured interview with the teacher took place, together with a free observation of the classes, to analyze the teaching practice with the student in inclusion condition. The third phase included a training action program for the teacher, about ASD inclusion. The fourth and last phase included an interview and observation of the post-training classes. The data were qualitatively analyzed, based on the four phases of the study. The analyzes consisted of an interview with the teacher, to get a deeper understanding about her knowledge of the inclusion of ASD students. We also analyzed the classes observations of the pre and post-action training program, post-training interview with the teacher in order to know if there were changes regarding their understanding and pedagogical practice regarding the inclusion of ASDs. The results showed that, according to the observations, made prior to the training program, neither the pedagogical practice of the teacher, nor the interaction of the student with the colleagues was compatible with his needs and there were no activities adapted for him. During the training program, the teacher could rethink her practice and was able to resignify her classes, making proposals that included the student academically and socially. In conclusion, the training program offered to the teacher, proved to be viable (executable) and effective, regarding to the school inclusion of the student with ASD.
Key-words: Inclusive education. Teacher training. Pedagogical practice. ASD. Autism.
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ... 12
2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA ... 16
2.1 PRINCIPAIS MARCOS LEGAIS: A EDUCAÇÃO INCLUSIVA NO BRASIL ... 16
2.2 O QUE É INCLUSÃO ESCOLAR? ... 19
2.2.1 A inclusão escolar dos TEA no Brasil ... 20
2.3 A FORMAÇÃO DE PROFESSORES PARA INCLUSÃO ESCOLAR ... 23
2.4 DEFINIÇÃO E PREVALÊNCIA DO TEA ... 29
2.4.1 Critérios diagnósticos e níveis de gravidade para TEA ... 31
3 OBJETIVOS ... 34
3.1 OBJETIVO GERAL ... 34
3.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS ... 34
4 MÉTODO ... 35
4.1 ESTUDO DE CASO ... 35
4.2 CONTEXTO PESQUISADO ... 36
4.3 PARTICIPANTES ... 36
4.4 CARACTERIZAÇÃO DO ALUNO ... 37
4.4.1 O aluno pelo olhar da mãe ... 38
4.4.2 O aluno pelo olhar da professora ... 40
4.4 INSTRUMENTOS ... 42
4.4.1 Questionário de identificação ... 42
4.4.2 Roteiro de questões orientadoras para as entrevistas ... 43
4.4.3 Roteiro para observação das aulas... 43
4.4.4 Diário de campo ... 44
4.4.5 Livro Manejo comportamental de crianças com transtorno do espectro autista ... 44
4.4.6 Roteiro com temas abordados no programa de ação de formação ... 45
4.5 PROCEDIMENTOS ... 45
4.6 ANÁLISE DOS DADOS ... 48
5 RESULTADOS E DISCUSSÕES ... 49
5.1 ENTREVISTA COM A PROFESSORA ... 49
5.2 OBSERVAÇÕES ANTERIORES AO PROGRAMA DE AÇÃO DE FORMAÇÃO ... 56
5.2.1 Observação nas aulas de Matemática ... 56
5.2.2 Observação nas aulas de Língua Portuguesa ... 58
5.2.3 Discussão das observações nas aulas de Língua Portuguesa e Matemática ... 61
5.3 O PROGRAMA DE AÇÃO DE FORMAÇÃO ... 66
5.3.1 Primeiro encontro: expectativas do processo de inclusão ... 66
5.3.2 Segundo encontro: principais condições clínicas do TEA ... 68
5.3.3 Terceiro encontro: manejo comportamental de crianças com TEA ... 69
5.3.4 Quarto encontro: propostas pedagógicas para TEA ... 69
5.3.5 Discussão sobre o programa de ação de formação ... 70
5.4 ENTREVISTA COM A PROFESSORA PÓS-PROGRAMA DE AÇÃO DE FORMAÇÃO .. 75
5.5 OBSERVAÇÕES POSTERIORES AO PROGRAMA DE AÇÃO DE FORMAÇÃO ... 78
5.5.1 Observação nas aulas de Matemática ... 78
5.5.2 Observação nas aulas de Língua Portuguesa ... 81
5.5.3 Discussão das observações das aulas de Língua Portuguesa e Matemática ... 83
6 CONCLUSÃO ... 86
7. LIMITAÇÕES DO ESTUDO ... 88
REFERÊNCIAS ... 89
ANEXOS... 100
1 INTRODUÇÃO
As discussões envolvendo o tema inclusão escolar ganharam papel de destaque no final do século XX, sendo objetos de estudo de diversos pesquisadores por se tratar de um dos grandes desafios da educação nos dias de hoje (MAZZOTTA, 1996; MANTOAN, 1998;
MITTLER, 1999; MARQUES, 2000; LAJONQUIÈRE, 2001; DÉROULÈDE, 2002;
PLETSCH, 2014; SCHMIDT, 2016; BRITO, 2017; SILVA NETO et al., 2018). A educação especial ofertada as pessoas com deficiência entre os séculos XVIII e XIX era de cunho especial. Todos os educandos ali presentes possuíam alguma deficiência e eram segregados da sociedade e, consequentemente, da escola comum, uma vez que não podiam conviver com outros tipos de pessoas.
Na realidade, o que havia nessas instituições era muito mais um atendimento assistencialista, sendo visado o cuidado e a proteção da pessoa com deficiência, do que educacional. No final do século XXI, a perspectiva de educação especial foi banida e deu lugar à educação inclusiva, de modo que pudesse extinguir as desigualdades sociais a partir do ensino-aprendizagem ofertado de maneira igualitária, porém com as adaptações necessárias de acordo com a condição da pessoa em condição de inclusão, acarretando em mudanças em termos de currículo e exigindo formação por parte do professor para que consiga desenvolver um trabalho satisfatório com seu aluno, sabendo de suas limitações e potencialidades, conseguindo reconduzir sua prática docente quando necessária.
A partir da década de 1980, diversos encontros e congressos internacionais surgiram com o objetivo de discutir políticas públicas a favor da inclusão social dessas pessoas. No Brasil, observamos que esse movimento teve início a partir da Constituição Federal, no artigo 205, sinalizando a educação como direito de todos, garantindo o pleno desenvolvimento da pessoa, sem preconceito de origem, raça, cor, sexo, idade ou quaisquer outras formas de discriminação (BRASIL, 1988).
Observando essas questões, o interesse em desenvolver esta dissertação de mestrado se inicia em experiências, vivências e desafios que tive durante a minha graduação em Pedagogia e se complementa com a realidade que encontrei ao trabalhar em diferentes escolas depois que me formei.
A primeira experiência ocorreu em 2005, quando fui contratada para trabalhar no
terceiro ano de uma escola particular, no Ensino Fundamental I, tendo como função ser tutora
de um aluno com síndrome de Down. Ele dizia que seu maior sonho era trabalhar. Eu não
tinha apoio de nenhum outro profissional do colégio, e as informações que tinha sobre inclusão eram de uma disciplina que havia feito na universidade e pesquisas realizadas por meu próprio interesse, mas nada que desse segurança para atuar.
Vivi momentos angustiantes, pois o aluno, às vezes, era extremamente agressivo, enquanto em outras situações tocava as partes íntimas de seu corpo enquanto a professora explicava a tarefa. A professora dizia que agradecia por eu estar ali, pois eu resolveria o problema e ela poderia dar atenção aos demais alunos. O aluno passava muitas horas do período escolar na sala da coordenação carimbando e mexendo no telefone. Lembro que a coordenadora dizia para eu não me angustiar, porque, pelo menos enquanto fazia aquilo, ele não era agressivo. Porém, eu sentia que o papel da escola estava se perdendo, uma vez que o aluno não participava das atividades da classe.
Naquele momento, iniciou-se uma reflexão sobre a qualidade da educação inclusiva discutindo, por exemplo, questões sobre até que ponto os profissionais inseridos estavam preparados para propiciar uma prática pedagógica mais significativa para essas crianças.
Após a conclusão do curso de Pedagogia, em junho de 2007, trabalhei em diferentes escolas particulares, ao longo dos anos, para conhecer como era realizada a inclusão escolar do ponto de vista acadêmico. Fiz parte da equipe pedagógica de várias escolas particulares renomadas de São Paulo e notava que muitas delas cumpriam a LDB (Lei de Diretrizes e Bases) 9394/96, art. 58, que diz: “entende-se por educação especial, para os efeitos desta Lei, a modalidade de educação escolar, oferecida preferencialmente na rede regular de ensino, para educandos portadores
1de necessidades especiais”. Porém, não havia momento de reflexão dos professores com a equipe gestora sobre a temática e a minha percepção era de que a obrigação estava somente nas mãos do professor em fazer um bom trabalho com os alunos em condição de inclusão, algo que me incomodava.
O que vivenciei nessas escolas era um jogo de empurra-empurra em que de um lado os professores lamentavam quando sabiam que iriam ter em suas classes alunos em condição de inclusão e do outro a equipe gestora que, na maioria das vezes, dizia que o professor precisava se especializar, porque aquela era uma realidade e que a lei deveria ser cumprida para inserir o aluno em condição de inclusão. Nesse momento, observava o quanto, muitas vezes, o professor se sentia sozinho nesse percurso e era rotineiro ouvir do docente que ele não estava preparado ou que não tinha formação específica para esse atendimento.
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