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Manual de Neuropsicologia

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MANUAL DE NEUROPSICOLOGIA

Helena Espírito Santo

PRIMEIRA EDIÇÃO

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1. Definição

2. Fundamentos

3. Perspetivas

4. Métodos

INTRODUÇÃO

A cabeça simbólica. De “How to Read Charater: A New Illustrated Hand-Book of Phrenology and Physiognomy, for Students and Examiners; with a Descriptive Chart” por S. Wells (New York, Fowler eWells Co., Pubs., 1891), Fig. 22.

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TÓPICOS

1. Definição

2. Fundamentos

3. Perspetivas

4. Métodos e técnicas

DEFINIÇÃO

A Neuropsicologia é a ciência aplicada que estuda as componentes das funções psicoló-gicas complexas e das operações cerebrais responsáveis por essas funções e a expressão comportamental da disfunção cerebral. As funções psicológicas complexas ou funções mentais superiores, incluem a memória, a linguagem, a atenção e a perceção. A expres-são comportamental da disfunção cerebral consiste em alterações cognitivas e emocio-nais, da personalidade e do comportamento motor.

Assim definida, a Neuropsicologia segue de perto os objetivos de Luria (1970) para a neuropsicologia clínica.

FUNDAMENTOS

Da neuropsicologia experimental derivou a ideia de que as funções cognitivas se relacio-nam com a organização espacial do cérebro e com a organização temporal da atividade neuronal. A neuropsicologia foi influenciada por duas hipóteses tradicionais das investi-gações e teorizações sobre a função cerebral. A hipótese cerebral postula que a organi-zação espacial do cérebro é a fonte do comportamento. A hipótese neuronal levanta a ideia de que o neurónio é a unidade estrutural da estrutura e função cerebrais.

A hipótese cerebral corresponde a uma longa linha histórica onde vários nomes pon-tuam.

Esta hipótese inicia-se com o problema mente-corpo decorrente do dualismo cartesia-no. Segundo Descartes (1664/1909), os seres humanos são conscientes e racionais por-que têm uma mente. A por-questão por-que se levanta a partir daí é como é por-que a mente (parte imaterial) produz movimentos (parte material)? O dualismo não consegue explicar esta questão. O materialismo veio responder, explicando o comportamento com recurso ao funcionamento do sistema nervoso e sem necessidade de incluir a ideia de uma mente imaterial.

O localizacionismo desenvolveu a ideia de que diferentes partes do cérebro estavam relacionadas com funções diferentes. Os casos de pessoas que, depois de sofrerem le-sões cerebrais, ficaram destituídos de alguns comportamentos intrigaram alguns médi-cos do século dezanove. O grande representante do localizacionismo, em particular da frenologia, foi Franz Gall que acreditava que havia uma correlação entre as deforma-ções do crânio (saliências e depressões) e o comportamento. Pierre Flourens desacredi-tou a frenologia ao estabelecer experiências laboratoriais (removeu partes do cérebro

NEUROPSICOLOGIA

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de animais e estudou as alterações do comportamento). Flourens percebeu que o cére-bro funciona como um todo e que a recuperação é possível porque o córtex restante pode fazer as mesmas coisas que a parte cerebral perdida. Korsakoff, por seu turno, mostrou a base neuropatológica da amnésia, ao estudar casos de doentes amnésicos devido às consequências do alcoolismo (deficiência de tiamina). De modo semelhante, Jean B. Bouillaud e Mark Dax referiram casos clínicos que mostravam que as perturba-ções da linguagem estavam associadas ao hemisfério esquerdo. Broca e Wernicke, fica-ram com os seus nomes para a história ao descreverem duas afasias relacionadas com duas zonas cerebrais do hemisfério esquerdo. Wernicke forneceu o primeiro modelo de como a linguagem é organizada: ouvido (sons), lobo temporal (sensação), área de Werni-cke (imagens de sons), fascículo arqueado (envio), área de Broca (representação dos movimentos da fala), músculos da fala. Wernicke predisse também a existência de uma patologia nova que nunca chegou a observar: a afasia de condução e que resultaria da lesão do fascículo arqueado. Os sons e os movimentos da fala seriam mantidos, assim como a sua compreensão, mas haveria problema porque uma pessoa com este problema não teria noção das palavras que ouvisse. Deste modo, Wernicke foi um dos primeiros a estabelecer a importância das conexões entre as diferentes partes do cérebro na organi-zação de atividades complexas. Rejeitou também a doutrina da equipotencialidade do cérebro e a perspetiva frenologista que entendeu o cérebro como um mosaico de cen-tros distintos. Wernicke afirmou que as atividades complexas eram aprendidas através de conexões entre um número pequeno de regiões funcionais que lidavam com as ativi-dades primárias motoras e sensoriais. Não é por acaso que Wernicke é considerado o pai da neuropsicologia (Darby e Walsh, 2005).

Na continuação desta linha histórica, Roberts Bartholow efetuou as primeiras estimula-ções elétricas do córtex humano. Friedrich Goltz tinha mostrado que a remoção de gran-des pedaços do neocórtex em cães não eliminava funções. A sua gran-descoberta tornou-se um argumento forte contra o localizacionismo. Hughlings-Jackson propôs a ideia de que o funcionamento cerebral era organizado hierarquicamente. Ele pensou que o sistema nervoso estava organizado num conjunto de camadas dispostas hierarquicamente. Cada camada superior sucessiva controlaria aspetos mais complexos do comportamento, mas fá-lo-ia através dos níveis inferiores. Hughlings-Jackson via o sistema nervoso constituí-do por três níveis: medula espinhal, tronco cerebral e neocórtex. Sugeriu que a constituí-doença que afetasse os níveis superiores produziriam dissolução: os comportamentos seriam mais simples e mais típicos da espécie. Isto resolveu a contradição aparente do localiza-cionismo.

A hipótese neuronal que postula que o neurónio é a unidade estrutural da estrutura e da função cerebral tem como fundamento várias investigações.

Com Hebb (1949), percebe-se que quando os neurónios são ativados ao mesmo tempo, estabelecem-se sinapses entre eles ou fortalecem-se as existentes, tornando-se uma

unidade funcional. As novas conexões ou o fortalecimento de conexões será a base da memória.

As publicações médicas na área da neurocirurgia mostram as correlações entre lesões focais e alterações do comportamento, fornecendo suporte adicional a esta hipótese. Os estudos de neuroimagem têm aberto janelas para o processamento cerebral normal e em doentes com lesões cerebrais, tornando-se o fundamento recente mais forte.

PERSPETIVAS

Muita da investigação atual em neuropsicologia é guiada pela doutrina localizacionista, em que a descrição e localização da função é o objetivo principal da avaliação neuropsi-cológica. Esta ideia encontrou um novo formato na nova divisão da neuropsicologia: a neurociência cognitiva. A neurociência cognitiva usa as técnicas de neuroimagem (MRI, PET, etc.) para detetar mudanças no fluxo sanguíneo de áreas relativamente circunscri-tas do córtex cerebral. Cada vez mais estudos identificam mudanças do fluxo sanguíneo associadas a medidas da cognição cada vez mais específicas. O objetivo da maior parte desta investigação é criar mapas detalhados da localização cognitiva no cérebro. A for-ma de localizacionismo for-mais saliente surgiu com o trabalho de Fodor (1983) que introdu-ziu o conceito de modularidade. O conceito de modularidade refere-se à ideia de que a localização é uma consequência necessária dos requisitos distintos de processamento dos sistemas sensoriais e de funções cognitivas superiores. Fodor defendeu que os requi-sitos físicos do processamento de informação nas diferentes modalidades sensoriais exi-giam mecanismos neuronais distintos adaptados e localizados. Ele propôs que a lingua-gem, que exige regras específicas e automaticamente acessíveis, exige também meca-nismos neuronais específicos e localizados.

Em oposição ao localizacionismo, o holismo representa a perceptiva que defende que estruturas cerebrais múltiplas trabalham em conjunto. Pierre-Marie Flourens (1824), Huhlings Jackson (1894), Kurt Goldstein (1939) e Aleksandr Luria (1966) defenderam que a localização ou correlação de sintomas ou comportamentos com lesões não prova que a função de determinado comportamento se localize numa estrutura cerebral observada. Ainda que todos estes médicos reconhecessem que as lesões podiam ter efeitos que dife-riam consoante a localização, acreditavam que a função cerebral envolvia estruturas cerebrais múltiplas que trabalhariam em conjunto. Finalmente, Kurt Goldstein propôs o termo holismo. A metáfora seguinte ilustra o princípio central do holismo: ainda que um parafuso solto possa ser responsável pela disfunção que impede um carro de andar, se-ria errado localizar a função de locomoção no parafuso. Um sintoma pode surgir porque um componente importante de uma rede alargada de função é perturbado ou porque a

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“função” mais complicada ou mais fraca de muitas funções servidas pela mesma área é perturbada. Dos seus estudos de ablações focais em ratinhos e a verificação de efeitos moderados e temporários na recuperação da aprendizagem de labirintos, Lashley conclu-iu que o cérebro seguia o princípio de ação de massa e que diferentes estruturas cere-brais tinham o potencial de assumir a mesma função — equipotencialidade. A sua conclu-são constitui a influência principal para Ward Halstead criar a primeira bateria de testes neuropsicológicos e serve de base para a construção de vários instrumentos de avalia-ção. A bateria de Halstead-Reitan baseia-se amplamente nas suposições não-localizacio-nistas.

Outra perspetiva importante na história da neuropsicologia é o empirismo. A maior par-te das técnicas de avaliação neuropsicológicas derivam da tradição empírica/funcionalis-ta (ideia de que o conhecimento deriva da experiência direempírica/funcionalis-ta). Os testes têm sido cons-truídos com a ideia de que a previsão do desempenho é primária e de que o conteúdo do teste e o significado psicológico é secundário. A abordagem empírica é mais identifi-cada com a abordagem não-localizacionista.

O cognitivismo vem abordar a forma como a organização cerebral deve ser conceptuali-zada. Os testes da tradição cognitiva são construídos para medir principalmente funções psicológicas específicas (habitualmente intelectual ou percetiva); a previsão clínica é um objetivo secundário. Muitos testes neuropsicológicos foram construídos deste modo. Por exemplo, o Boston Diagnostic Aphasia Exam (BDAE; Goodglass e Kaplan, 1978) e o California Verbal Learning Test (CVLT; Delis, Kramer, Kaplan e Ober, 1978) foram criados usando as teorias prevalecentes, respetivamente, da linguagem e da memória. Em am-bos os casos, foram criados para medir aspectos específicos da função conhecida por ser afetada por lesão cerebral.

MÉTODOS E TÉCNICAS

Entre os métodos e técnicas estruturais contam-se os raios X, a angiografia, a tomogra-fia axial computadorizada e a ressonância magnética. Os métodos e técnicas dinâmicos incluem o eletroencefalograma, a ressonância magnética funcional e a tomografia de emissão de positrões.

Raios X. Wilhelm Conrad Röntgen descobriu e batizou os raios X em 1895. Ganhou o pré-mio Nobel da física pela sua descoberta. Röntgen estudava o fenómeno da luminescência produzida pelos raios catódicos num tubo de Crookes. O tubo de Crookes cria eletrões por ionização de ar residual num tubo através de voltagem alta. Röntgen tinha envolveu o tubo numa caixa de papelão negro e estava a trabalhar com ele numa câmara escura que estava próxima de um pedaço de papel coberto de platinocianeto de bário (papel

fotográ-fico). Ao ministrar uma corrente elétrica, o investigador verificou que o tubo emitia uma radiação que alterava o papel fotográfico. Espantando com esta descoberta, experi-mentou interpor corpos opacos entre o dispositivo e o pa-pel fotográfico (Figura 1) e descobriu que os vários objetos opacos à luz diminuíam a emissão da irradiação induzida pelo raio de luz invisível e misterioso. Isto mostrava que a energia atravessava facilmente os objetos e se comportava como a luz visível. Röntgen fez várias experiências com objetos, até que pediu à sua mulher que colocasse a mão entre o tubo de Crookes e o papel fotográfico. A foto mos-trou a estrutura óssea da mão (ver foto). Essa foi a primei-ra chapa de primei-raios X. Em 1896, Röntgen descobriu que, sem proteção, a radiação provocava queimaduras na pele. Angiografia. A técnica foi desenvolvida em 1927 por Egas Moniz para diagnóstico de várias doenças mentais e neu-rológicas. Esta técnica consiste na introdução intravascular de produto de contraste na corrente sanguínea. O resultado final é uma imagem

radio-lógica (Figura 2) que permite a visualização de vasos e eventuais alterações no calibre ou no percurso.

Tomografia axial computadorizada (TAC). Os tecidos ner-vosos têm densidades diferentes, absorvendo os raios X de forma diferente. A TAC usa essas diferenças de densidade para construir a imagem (Figura 3). As zonas de mai-or densidade cmai-orrespon- correspon-dem às áreas mais claras. As zonas menos densas correspondem às áreas mais escuras. A TAC consis-te em séries imagens de raios X obtidas num plano que depois são processadas

digital e geometricamente, sendo combinadas num no. Depois são obtidas mais imagens raios X noutros pla-nos que depois são também processadas digital e geome-tricamente. Todas as imagens dos vários planos são com-binadas, criando-se uma imagem em três dimensões. A TAC permite diferenciar objetos a uma distância superi-or a 5 mm.

Figura 1. Primeiro raio X

realizado por Röntgen em 1895.

Figura 2. Imagem

angiográ-fica do polígono de Willis.

Figura 3. Imagem cerebral

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Eletroencefalograma (EEG). O EEG regista a atividade sináptica provocada por potenci-ais pós-sinápticos dos neurónios corticpotenci-ais. As correntes iónicas envolvidas na criação de potenciais de ação podem não contribuir grandemente para os potenciais de campo mé-dios que representam o EEG (Nunez e Srinivasan, 1981). Pensa-se que os potenciais elé-tricos do escalpe que produzem o EEG são causados pelas correntes iónicas extra-celula-res causadas pela atividade elétrica dendrítica, enquanto que os campos que produzem sinais magnético eletroencefalográficos estarão associados a correntes iónicas intracelu-lares (Buzsaki, 2006). Os potenciais elétricos criados por cada neurónio são demasiado pequenos para serem detetados pelo EEG (Nunez e Srinivasan, 1981). A atividade do EEG representa a soma da atividade sincronizada de milhares ou milhões de neurónios que têm orientação espacial semelhante, radial ao escalpe — principalmente neurónios pira-midais das camadas cinco e seis do córtex. As correntes que são tangenciais ao escalpe não são detetadas pelo EEG. O EEG beneficia do arranjo paralelo e radial das dendrites apicais do córtex. A atividade cerebral profunda é mais difícil de detetar do que a ativi-dade junto ao crânio. A medição resulta da comparação entre o potencial elétrico de vários pontos do escalpe — elétrodos ativos — e o potencial elétrico de um local eletrica-mente estável (lobo da orelha ou narina) — elétrodo indiferente — ou a média de todos os locais medidos, no caso do eletroencefalograma de rede densa. Os EEGs mostram variações numa variedade de frequências. Muitas destas variações têm frequências e distribuições espaciais características e estão associadas com estados de funcionamento cerebral diferentes. Estas variações representam atividade sincronizada de uma rede de neurónios. O EEG regista a atividade cerebral através de uma série de elétrodos. Em 1947 foi desenvolvido o International Eletrode Placement System ou sistema 10–20 (Figu-ra 4) pa(Figu-ra realizar testes consistentes da atividade elétrica cereb(Figu-ral. O sistema baseia-se na relação entre a localização do elétrodo e a área do córtex cerebral subjacente. Tem em consideração os vários tamanhos de cabeça, medindo a distância lateral entre as orelhas e a distância longitudinal entre a ponte do nariz e a parte posterior da cabe-ça. Os elétrodos são colocados a 10 e 20% dos valores dessas distâncias. Cada local do escalpe é identificado por uma letra, que representa um lobo, e por um número ou ou-tra leou-tra para identificar a localização do hemisfério. Os elétrodos colocados sobre os lobos frontal (F), temporal (T), parietal (P) e occipital (O) e polo frontal (Fp) são representados pelas letras correspondentes. Os números ímpares (1, 3, 5, 7) e pares (2, 4, 6, 8) referem-se aos hemisférios esquerdo e direi-to, respetivamente. Quanto mais próxima é a posição da linha média, mais pequeno é o número. A letra 'z' refere-se

a um elétrodo colocado na linha média. Adicionalmente, os elétrodos faríngeos desi-gnam-se por Pg1 e Pg2. Através do EEG de rede densa (64, 128 e 256 elétrodos) obtém-se a reconstrução matemática da localização profunda dos neurónios responsáveis por variações de potencial medidas no escalpe com margens de erro entre os 5 e os 8 mm. A sobreposição de um EEG com um MRi permite a obtenção de imagens de áreas eletrica-mente ativas com uma resolução temporal de milissegundos.

E

LETROENCEFALOGRAMA

• Deteta processamento coberto

• Elucidação de estádios de processamento • Pessoas que incapazes de respostas motoras

• Deteção, distinção, localização e monitorização de epilepsia • Monitorização de grau de anestesia

• Distinção de patologia orgânica de síndromes psiquiátricos

Magnetoencefalografia (MEG). Este método permite examinar a atividade cerebral atra-vés da medição dos campos magnéticos no escalpe (Figura 5). Estes campos magnéticos são criados através da atividade elétrica cerebral sincronizada. O campo magnético cor-tical deriva das correntes iónicas nas dendrites durante a transmissão sináptica. Uma corrente elétrica produz um campo magnético orientado ortogonalmente que é deteta-do pelo MEG. Para geral um sinal são precisos cerca de 50 000 neurónios ativos (Okada, 1983). Os sensores usados são extremamente sensíveis e designam-se por superconduc-ting quantum interference devices (SQUIDs). A necessidade de sensores especiais deriva do fraco sinal do campo magnético cortical (que ronda os 10 femteslas; a atividade alfa é de cerca de 103 fT) comparado com o campo magnético do ambiente urbano que

ron-da os 108 fT. O MEG tem uma resolução temporal muito alta quando se compara com

outros métodos, permitindo a medição da atividade cerebral de milissegundos a milisse-gundos.

Atividade antes do

movimento Atividade no início do movimento

Atividade logo depois do início do

movimen-to

Tempo (ms)

Figura 5. Imagem

ce-rebral obtida através de MEG. T4 F8 T6 O2 Fp2

Figura 4. Sistema 10-20 de colocação dos elétrodos

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Potenciais evocados. Os potenciais evocados (event related potentials — ERP) são po-tenciais desencadeados por acontecimentos específicos (p.e., ver uma cara enraivecida) e registados através de EEG (Figura 6). Para se fazer um registo, o acontecimento tem de ser repetido cerca de cem vezes para que se isole o barulho de fundo. Depois é feita a média das cem ondas associadas ao acontecimento. Alguns componentes do ERP são designados por acrónimos (p.e., ELAN = early left anterior negativity), outros por letras que indicam a polaridade seguida da latência típica em milissegundos (p.e., N400 = de-flexão da voltagem negativa ocorrida 400 ms. depois do estímulo; P600 = dede-flexão da voltagem positiva ocorrida 600 ms depois do estímulo) (Luck, 2005).

Nota-das Não-notadas C1 N1 Parietal N1 Frontal N1-Occipital P1 contra-lateral P1 ipsilateral

Figura 6. Experiência de ERP medindo

a atenção. Os sujeitos focam os olhos num ponto central e prestam aten-ção, quer ao campo visual esquerdo, quer ao direito. Os estímulos são apresentado à esquerda ou à direita de forma aleatória e é pedido ao su-jeito que responda a alvos misturados com distratores no campo atencional. São mostradas ondas ERP de locais do escalpe com indicação dos componen-tes C1, P1 e N1. Como se pode ver, os componentes P1 e N1 são maiores para localizações notadas em compa-ração com as localizações não nota-das e o C1 não é afetado pela aten-ção (Figura adaptada de Nature

Re-views Neuroscience, 2000, 1,

91-100).


Ressonância magnética (RMN). A RMN cria imagens tridimensionais dos tecidos moles. Cada tecido corporal contém água e gordura em quantidades diferentes; ambos contêm protões (núcleos de hidrogénio). Cada protão de hidrogénio tem um movimento de rota-ção (spin) com um determinado eixo de rotarota-ção. Os eixos dos vários protões de hidrogé-nio têm uma orientação aleatória. Um gerador de um poderoso campo eletromagnético (mais forte do que o da Terra) faz com que os campos magnéticos dos protões de hidro-génio (os mais usuais) se alinhem com o campo eletromagnético. Uns ficam com o spin paralelo ao campo (spin up) e outros com o spin antiparalelo ao campo (spin down). Os protões não se alinham totalmente com o campo eletromagnético e por isso precessam (rodam como um giroscópio). Depois usam-se campos de radiofrequência para alterar sistematicamente o alinhamento daquela magnetização. Um impulso de uma determina-da radiofrequência perturba a distribuição dos estados de spin up e de spin down, ali-nhando a fase dos spins. Depois deste estado de excitação decorrem duas formas de relaxamento. O relaxamento mais rápido é o desfasamento dos spin que se designa por relaxamento T2 ou relaxamento transverso. A segunda forma de relaxamento, mais len-ta, envolve o retorno ao equilíbrio dos estados de spin up e de spin down, corresponde

ao relaxamento T1 ou longitudinal. Ambos ocorrem ao mesmo tempo, mas o T1 é muito mais lento do que o T2 em sólidos e somente um pouco mais lento em líquidos. As renças entre os tecidos implicam taxas de relaxamento diferentes que acarretam dife-renças na intensidade de sinal. As difedife-renças de sinal são vistas em escalas de cinzento na imagem final. Alterando os parâmetros da radio-frequência, é possível forçar a ima-gem em T1 ou T2. A resolução da RMN é inferior a 1mm3. Tecidos doentes, como

tumo-res, podem ser detetados porque os protões dos diferentes tecidos voltam aos seus esta-dos de equilíbrio em taxas diferentes. É uma técnica não-invasiva, não usa a radiação inonizada e é um procedimento bastante seguro.

Ressonância magnética funcional (RMf). A RMf mede mudanças de sinal no cérebro que se devem a atividade neuronal. O cérebro é digitalizado numa resolução baixa, mas numa taxa rápida (de 2-3 em 2-3). Os aumentos na

ativi-dade neuronal provocam mudanças no sinal de RMN atra-vés de alterações do T2 — este mecanismo designa-se por efeito dependente do nível de oxigénio sanguíneo (BOLD = Blood Oxygenation Level Dependent). As ima-gens de RMf são também designadas por imaima-gens de contraste BOLD. Antes da ativação de um grupo de neu-rónios, os níveis de hemoglobina desoxigenada e de he-moglobina oxigenada são iguais. Um aumento na ativi-dade neuronal aumenta a exigência de oxigénio e o sis-tema vascular compensa excessivamente esta necessida-de, aumentando a quantidade de hemoglobina oxigena-da em relação à hemoglobina desoxigenaoxigena-da. A hemoglo-bina desoxigenada atenua o sinal de RMN, pelo que a resposta vascular conduz a um aumento de sinal relacio-nado com a atividade neuronal. As imagens funcionais são sobrepostas a imagens estruturais, permitindo locali-zar as áreas cerebrais ativas (Figura 7). O efeito BOLD permite também criar mapas dos vasos sanguíneos em imagens 3D de grande resolução. A resolução de uma RMf ronda 1 mm3.

Figura 7. O doente da figura foi submetido a uma RMf para localizar a linguagem antes de uma operação cirúrgica.

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BIBLIOGRAFIA

Buzsaki, G. (2006). Rhythms of the brain. Oxford University Press.

Darby, D. e Walsh, K. (2005). Walsh's Neuropsychology: A Clinical Approach (5ª Ed.). Nova Iorque: Elsevier

Descartes, R. (1664/1909). Traité de l’homme. Paris: Léopold Cerf.

Luck, S. J. (2005). An Introduction to the Event-Related Potential Technique. Cambridge: The MIT Press.

Nunez, P. L. e Srinivasan, R. (1981). Eletric fields of the brain: The neurophysics of EEG. Oxford University Press.

Okada, Y. (1983). Neurogenesis of evoked magnetic fields. In S. H. Williamson, G. L. Romani, L. Kaufman, I. Modena (Ed.). Biomagnetism: an Interdisciplinary Approach (pp. 399-408). New York: Plenum Press.

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Perspetiva geral sobre os conceitos e métodos

básicos da avaliação neuropsicológica de

adul-tos.

Avaliação e determinação dos perfis que os

doen-tes neurológicos e psiquiátricos apresentam na

avaliação de funções corticais superiores.

AVALIAÇÃO DE

ALTE-RAÇÕES DE FUNÇÕES

PSICOLÓGICAS

SUPE-RIORES

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1. Introdução

2. Funções mentais

3. Testes

3.1.Atenção e concentração

3.2.Percepção sensorial

3.3.Aprendizagem e memória

3.4.Linguagem

3.5.Aptidões visoespaciais e visoconstrutivas

3.6.Formação de conceitos

3.7.Funções executivas

3.8.Resposta motora

4. Baterias

INTRODUÇÃO

A avaliação neuropsicológica é o estudo do cérebro através dos seus produtos comporta-mentais, entrevistas e testes e questionários padronizados. Os objetivos são os seguintes: 1.Formulação de um diagnóstico:

1.a. para identificar e descrever alterações no funcionamento psicológico e descrever os estados neuropsicológicos em termos de forças e fraquezas cognitivas e  com-portamentais;

1.b. identificação precoce de défices (os testes são sensíveis a alterações subtis); 1.c. para localização de lesões (menos importante, pela existência de exames

imagio-lógicos);

1.d. para diagnóstico diferencial entre transtornos neurológicos  e mentais;

1.e. para avaliar mudanças ao longo do tempo e fazer prognóstico do curso possível da doença;

1.f. para oferecer orientações para a reabilitação, planeamento vocacional ou educa-cional

1.g. para fins de perícia (diagnóstico forense), avaliando responsabilidade civil ou ne-cessidade de interdição.

2. Acompanhamento e documentação do estado neuropsicológico (reabilitação ou demên-cia)

3. Pesquisa científica (conhecer a nossa realidade; padronizações).

A avaliação neuropsicológica inclui técnicas menos invasivas e menos custosas que as téc-nicas médicas (tomografia axial computorizada, ressonância magnética nuclear, etc.), permite uma deteção precoce do dano, pois identificam alterações comportamentais pre-sentes nas etapas de desenvolvimento, sem que tenha de haver necessariamente grandes danos cerebrais. Consiste em técnicas imprescindíveis em programas de reabilitação neu-ropsicológica, pois permitem detetar de forma sensível as alterações – às vezes pequenas — que se vão produzindo.

A avaliação neuropsicológica é inseparável da avaliação neurológica e da avaliação geral e uma deve esclarecer a outra. Por isso começamos com o exame neurológico breve que inclui as provas dedo-nariz e calcanhar-joelho, o teste de Romberg, o teste do Reflexo rotular, o teste do reflexo plantar e o teste dos três passos básicos.

AVALIAÇÃO DE

ALTERA-ÇÕES DE FUNALTERA-ÇÕES

PSICO-LÓGICAS SUPERIORES

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PROVAS DEDO-NARIZ E CALCANHAR-JOELHO

Levar alternadamente o dedo ao nariz e ao dedo do examinador; o examinador move o dedo para posições diferentes. Levar o calcanhar ao joelho oposto e alternar de perna. Avalia a fun-ção cerebelosa, notando a coordenafun-ção dos movimentos. Notar se há dismetria: Perturbafun-ção da amplitude dos movimentos, visível sobretudo nos atos sob comando executados rapidamente. Esta perturbação encontra-se nas lesões das vias e centros cerebelosos. Ou notar se há

hiperme-tria: Perturbação da coordenação dos movimentos que ultrapassam o ponto fixado. É um sinal

de afeção do cerebelo (síndrome cerebelosa).

TESTE DE ROMBERG

Ficar em pé, calcanhares juntos e olhos fechados durante 5-10 segundos sem apoio. Avalia a propriocepção e função cerebelosa. Sinal de Romberg: incapacidade para se manter na posição de pé (ataxia estática), com os calcanhares juntos e os olhos fechados, que se traduz por oscila-ções que podem chegar à queda. Este sinal traduz uma afeção das vias da sensibilidade profun-da (p.e., tabes); pode tornar-se mais sensível em diversas provas (p.e., manter-se num só pé, colocar um pé em frente do outro).

TESTE DO REFLEXO ROTULAR

Sentar ou deitar com o joelho fletido. Bater no tendão patelar, logo abaixo da patela ou rótula. Avalia o arco reflexo espinhal. Notar se há contração do quadricípite e extensão do joelho. Quan-do há lesão nos centros superiores (neurónios motores superiores), o arco reflexo espinhal fica desinibido e os reflexos tendinosos profundos ficam hiperativos.

TESTE DO REFLEXO PLANTAR

Percorrer o bordo externo da planta do pé com um objeto pontiagudo (p.e., chave). Avalia o arco reflexo espinhal. Notar movimento dos dedos, normalmente flexão dos dedos do pé (reflexo

plan-tar). Ou notar se há sinal de Babinski: Extensão lenta do dedo grande do pé, associada por vezes à

extensão dos outros dedos (sinal de leque), provocada pela excitação do bordo externo da planta do pé. O sinal de Babinski só é patológico depois dos 18 meses de idade, e está relacionado com uma lesão do feixe piramidal.

TRÊS PASSOS BÁSICOS

Andar em linha reta, dando três passos. Avalia a integração dos sistemas nervosos periférico e central Reparar na taxa, ritmo e tipo de movimentos. Se o doente levantar o joelho exagerada-mente, pender os pés (andar como um cavalo, marcha parética com steppage) é sinal de lesão superior. A marcha parética espástica (membros inferiores em extensão forçada, arrastando o pé) e marcha hemiplégica (perna espástica, com movimentos de circundação do pé) são própri-as dprópri-as lesões cerebrais. Marcha atáxica tabética (levantar o pé em demprópri-asia, descoordenação do movimento e oscilação do tronco) — lesões medulares. Marcha atáxica cerebelosa (marcha de ébrio) — lesão cerebelosa. Marcha vestibular (desvio para um lado e quedas frequentes) — le-sões cerebelosas, IV ventrículo, esclerose em placas. Marcha Parkinsónica (andar vagaroso e arrastado) — Parkinsonismo. Marcha de pequenos passos (vagaroso, passos pequenos, pareces parecem travadas) — ateroesclerose.

A anamnese consiste na colheita da história da doença (natureza do défice conhecido e suposto, data de início e curso progressivo ou estável), do funcionamento pré-mórbido (escolaridade, hábitos leitura, hábitos cálculo, lateralidade e eventuais défices senso-riais/motores), do nível de consciente do défice e motivação e das queixa genéricas relati-vas à atenção e orientação, funções receptirelati-vas, memória, pensamento, funções expressi-vas, funções executivas e funções motoras.

FUNÇÕES MENTAIS

As diferentes funções mentais que podem ser medidas são descritas segundo a adaptação ao modelo de relações cérebro-comportamento proposto por Bennet (1988) (Figura 8), que estabelece a ordem em que o cérebro analisa a informação recebida com a finalidade de dar uma resposta motora. Segundo este modelo, a avaliação neuropsicológica implica, a avaliação da atenção e concentração, a avaliação da perceção sensorial, da aprendizagem e memória, da linguagem, das capacidades de manipulação do espaço e praxias, da formação de conceitos e raciocínio, das funções executivas e, por último, da saída motora. Isto não quer dizer que seja imprescindível avaliar todas estas funções, dependerá do objetivo da avaliação. Se o objetivo é fazer um perfil neuropsicológico de um doente, o mais adequado é escolher uma bateria neuropsicológica que inclua testes para avaliar todas as funções.

Alerta. A primeira função importante a considerar é o nível de alerta ou ativação que o

doente apresenta. O estado de alerta é determinado pelo sistema reticular ativador ascen-dente, responsável pelos estados de coma ou pelas alterações da consciência. Para a sua avaliação, examinam-se as respostas emitidas pelo sujeito ante diferentes estímulos.

Atenção e concentração. Nesta dimensão avalia-se a capacidade do sujeito para selecionar

um estímulo inibindo uma série de distratores. Consiste na capacidade de se concentrar, pelo menos durante 30 segundos. O défice nesta variável invalida o resto das funções a

(13)

avaliar. A exploração da atenção pode executar-se através de testes diferentes: observar a concentração ou distração do doente, teste de dígitos diretos (repetir séries de números não correlacionados de dificuldade crescente), teste do A (ler ao doente letras diferentes, pedindo-lhe que bata na mesa cada vez que escute a letra A) e teste das linhas (cruzar to-das as linhas apresentato-das numa folha).

Percepção sensorial. A avaliação das gnosias é necessária para poder avaliar os processos

superiores de perceção e cognição. A agnosia é uma alteração da capacidade de perceber o significado dos dados sensoriais; podem ser visuais, auditivas ou táteis. Algumas baterias neuropsicológicas incluem, por exemplo, provas de localização de dedos.

Aprendizagem e memória. Estas funções consistem em processos muito relacionados e

difí-ceis de isolar, pois a aprendizagem implica memória e muitas provas de memória

associam-se a uma curva de aprendizagem. A sua associam-separação teria pouca utilidade clínica. A avaliação neuropsicológica pode incidir em dimensões diferentes da memória: curto ou longo prazo, verbal/pictórica e com com/sem curva de aprendizagem, estando cada uma delas associa-das a zonas cerebrais distintas. Dentro desta categoria também se pode incluir um aspeto avaliado por muitos testes neuropsicológicos: a orientação (nome, cidade onde vive, o dia em que estamos, etc.).

Linguagem. A linguagem é uma função muito importante em qualquer avaliação

neuropsicoló-gica. A avaliação da afasia implica diferentes dimensões: fala espontânea, repetição de ora-ções e frases, compreensão da linguagem escrita, localização de palavras, leitura, escrita e cópia, e cálculo.

Aptidões espaçoconstrutivas. Estas habilidades combinam a atividade percetiva com a

resposta motora, tendo em conta componentes espaciais, pelo que na sua execução estão implicados diversos fatores: percetivo, atencional, espacial, motivacional e praxias. A apraxia é uma alteração das habilidades motoras aprendidas (praxias) em pacientes com boa compreensão da linguagem. Entre as tarefas que avaliam estas habilidades encon-tram-se o desenho e a construção de um puzzle.

Funções executivas. Lekak, Howieson e Loring (2004) indicam quatro componentes do

funcio-namento executivo: (1) volição, (2) planeamento, (3) ação finalizada e (4) desempenho efi-caz. As funções executivas são sistemas neurocomportamentais supraordenados que motivam o comportamento auto-iniciado e governam a eficiência e adequação do desempenho de uma tarefa.

Resposta motora. Esta função diz respeito à velocidade e precisão de manipulação dos

movimentos.

TESTES

Alerta

Escala de coma Glasgow. Instrumento que permite avaliar o nível de alerta e que tem em

conta a resposta de abertura de olhos, a resposta motora e a resposta verbal do doente ante estímulos distintos. A pontuação obtida encontra-se entre 3 e 15 (< 8 = coma severo; 9-12 = coma moderado; 13-15 = coma leve) (Quadro 1).

Atenção

Barragem de Toulouse Piéron. Este teste tem como finalidade averiguar a atenção

volun-tária sustentada (concentração) e a resistência à fadiga (Piéron, 1955; Toulouse e Piéron, Figura 8. Ordem pela qual o cérebro analisa a informação recebida.

Perce- ção

sensorial

Atenção e concentração

Aprendizagem e memória

Linguagem ciais e visoconstruti-Aptidões visoespa-vas

Funções executivas

Resposta motora Formação de conceitos

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1904), e também a rapidez da reação e a exa-tidão ao executar uma tarefa simples de natu-reza percetiva, sem recorrer às funções inte-lectuais (medir a atenção auditiva e visual não é equivalente). Os autores originais base-aram-se no teste de Bourdon, de 1895 que consistia em cortar as letras “a”, “e” e “r” num texto previamente preparado. O teste consiste numa tarefa de rotina que Zazzo adaptou do original: cortar quadradinhos iguais ao modelo de três quadrados durante 10 minutos (um quadrado com o o traço hori-zontal para a esquerda, outro com o traço inclinado para a direita e para cima, e outro com o traço para baixo). A prova consiste numa folha A4, mancha de impressão de 19 x 19 cm; quarenta linhas com 40 quadradinhos de 1,25 mm com um tracinho de 1,25 mm segundo uma das 8 direções da Rosa dos Ven-tos. Cada linha tem 5 quadradinhos com os modelos. A prova pode ser aplicada individual-mente e também coletivaindividual-mente e toma cer-ca de 10 minutos. Existe uma aferição portu-guesa de Amaral (1967).

Na aplicação da prova questiona-se o examinado se vê bem e se a sala tem boa luz; dá-se 2 lápis ou uma caneta e explica-se que que o teste consiste em cortar com o lápis todos os quadrados que sejam iguais aos que se encontram no alto da folha, ou seja, que te-nham o traço horizontal para a esquerda, o traço inclinado para a direita e para cima, e o traço para baixo. Indica-se que não é necessário que os quadrados estejam juntos e que, no caso de se enganarem, façam um círculo à volta desse sinal e continuem, não perden-do tempo. Indica-se ainda que a prova deve ser executada o mais rápiperden-do possível e que, durante a execução, o examinado deverá manter-se em silêncio e colocar as dúvidas no início. Antes de iniciar a prova, o examinador dá as duas últimas linhas da prova para trei-no. A prova inicia-se começando a traçar os quadrados da esquerda para a direita, e de cima para baixo, como se se tratasse de uma leitura. De minuto a minuto, diz-se “cruz”, que o examinado deverá fazer no intervalo dos quadrados, no mesmo lugar onde estão a traçar os quadrados. Depois de marcar a cruz, deve continuar a traçar os quadrados. De-pois do examinador dizer a última cruz, deixa passar 5 segundos e então dá-se por termi-nada a prova ao fim dos 10 minutos.

Na análise quantitativa dos resultados, tem-se em consideração o poder de realização, a concentração e a resistência à fadiga. Para tal conta-se o número de acertos, erros e

omis-sões e regista-se na respetiva folha. O poder de realização é calculado através do número de quadrados bem assinalados, considerando-se muito lento pontuações abaixo de 80 acertos; lento entre 81 e 100 acertos; normal entre 101 e 140 acertos; bom entre 141 e 200 acertos e muito bom acima de 200 acertos. Depois para a capacidade de concentra-ção tem-se em conta a seguinte equaconcentra-ção: (Emissões + Omissões)/Acertos x 100. Entre 0% a 5% considera-se muito concentrado, 5-10% concentrado; 10-15% disperso e 15-20% muito

disperso. O número de erros não deve ultrapassar os dois quintos das omissões, caso

con-trário, deverá analisar-se o caso qualitativamente. A resistência à fadiga é avaliada atra-vés da curva de trabalho realizado em cada minuto: curva crescente, decrescente, e

cur-va contínua. Para construir o gráfico, colocam-se nas abcissas os intercur-valos relativos ao

tempo — 10 intervalos de 1 minuto. Nas ordenadas, colocam-se os resultados obtidos, dis-tribuídos desde o valor mínimo até ao valor máximo. Esta pontuação obtém-se subtraindo ao número dos acertos, as omissões e erros em cada minuto.

Finalmente, para a análise qualitativa tem-se em conta as seguintes normas: O número baixo de acertos (menos de 80), denuncia geralmente inibição psíquica; se houver mais erros que omissões ou se as omissões excederem 20% do número de quadrados bem marca-dos, então coloca-se a hipótese de inteligência baixa, ou mesmo debilidade mental; se o sujeito é inteligente e mostra pouca concentração, considera-se que a desatenção é devi-da a um problema afetivo ou problemas passageiros (distração). Se o sujeito mostra pro-blema de atenção (dispersão), então poderá denotar algum prejuízo ao nível da inteligên-cia. Note-se que o prejuízo intelectual implica dispersão, mas que a dispersão não implica problemas de inteligência.

O teste pode ser usado também como treino de atenção, utilizando-se somente metade da folha. Em cada sessão, calcula-se a relação entre acertos, erros e tempo, de modo a verificar a evolução.

Teste de Stroop. O Stroop test (Stroop, 1935; Jensen e Rohwer, 1966) avalia o controlo

inibitório (função executiva) e a atenção seletiva (Lezak et al.,

2004; Strauss et al., 2006). O teste baseia-se na descoberta de que demora mais tempo a dizer os nomes de cores do que ler palavras e ainda mais tempo a ler nomes impressos de cores do que o nome da palavra (Dyer, 1973; Jensen e Rohwer, 1966) (Figu-ra 9). A tarefa proposta pelo teste consiste em pedir ao sujeito que nomeie as cores e não as palavras, ou seja, deve dizer quais são as cores das palavras. Assim, a inibição é exigida quan-do os indivíduos são instruíquan-dos a dizer a cor que é incongruente com a palavra que está impressa, e não o outro aspeto mais sali-ente que é a palavra inscrita, por conseguinte, há que inibir a tendência para dar uma resposta saliente. A diminuição da velo-cidade na nomeação da cor designa-se por efeito de interferência cor-palavra (Strauss et al., 2006, p. 477).

Figura 9. Teste Stroop (di-gam-se as cores e não as palavras).

Resposta Pontuação

Olhos abertos Nunca

À dor

Aos estímulos verbais Espontaneamente

1 2 3 4 Melhor resposta verbal

Sem resposta Sons incompreensíveis Palavras inadequadas Desorientado e conversa Orientado e conversa 1 2 3 4 Melhor resposta motora

Sem resposta

Extensão - descerebração Flexão anormal

(descorticação)

Flexão - remoção da dor Localiza a dor Obedece a ordens 1 2 3 4 Total 15

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A memória de trabalho contribui para a interferência Stroop (Kane e Engle, 2003), sendo também importantes a velocidade de processamento (p.e., Anstey et al., 2002; MacLeod e Prior, 1996), a inteligência fluida (Anstey et al., 2002) e o sistema semântico (Bondi et al., 2002). Alguns atribuem a lentificação a um conflito na resposta, outros a falha na inibi-ção da resposta e outros a falha na ateninibi-ção seletiva (ver Dyer, 1973; Zajano e Gorman, 1986).

O teste de Stroop existe em vários formatos (Lezak et al., 2004; Strauss et al., 2006): (1) o

número de ensaios pode ir de 2 a 4; (2) o número de itens pode variar entre 17, 20 ou até

100, 112 e 176; (3) o número de cores pode ser três, quatro ou cinco; uns incluem palavras em preto; outros incluem também círculos coloridos para a mera nomeação de cores; (4) a apresentação dos estímulos varia entre a apresentação vertical ou em filas e colunas orde-nadas; entre apresentação em computador, projetor ou papel; (5) a pontuação pode incluir tempo, erros, ambos ou número de itens lidos em 45 segundos. O formato de Dodrill (1978) — que consiste em dois ensaios, inclui 176 itens e 4 cores — apresenta vantagens. Uma das vantagens é a de ser o teste mais barato e as folhas de pontuação poderem ser copiadas. Outra das vantagens é a das normas estarem disponíveis (D’Elia, Boone e Mitrushina, 1995). Outra delas é a de os dois ensaios serem suficientes para desencadear o fenómeno de Stro-op de lentificação no ensaio de interferência palavra-cor. Outra é ser o formato com mais itens, o que o tornará mais sensível: muitos doentes com problemas de atenção conseguem suster a atenção e ignorar as distrações no começo do 2º ensaio, mas começam a lentificar à medida que prosseguem, piorando na última metade ou no último quarto do teste (Lezak et al., 2004). O teste é cansativo e se o doente tiver graves problemas de concentração não deve ser executado, pelo sofrimento que envolve. Lezak (2000) indica parar o teste quando o doente chega aos 5 minutos e ainda não acabou.

O formato Dodrill consiste numa só folha com 176 palavras coloridas (11 por linha; 16 li-nhas) e inclui quatro cores (vermelho, laranja, verde e azul) impressas em cores aleatóri-as. Na Parte I, o sujeito lê o nome da palavra. Na parte II, o sujeito diz a cor em que cada palavra está escrita. É registado o tempo que se demora ao chegar a metade do ensaio e ao fim. Ainda na folha de registo, relativamente à Parte I estão apontados os nomes corre-tos das palavras; no outro lado da folha estão impressos os nomes das cores pela ordem correta para a Parte II. Dodrill avalia o desempenho com base no tempo total da Parte I e a diferença do tempo total da Parte II e I (Parte II menos Parte I). O tempo que o sujeito demora até metade de cada parte, quando comparado com o tempo total, indica se hou-ve familiaridade e prática ou dificuldade em manter a atenção. Um modo mais preciso é de fazer uma marca depois da palavra ao fim de cada minuto. Valores padronizados (Do-drill, 1978): Grupo normal, Parte I = 84,76±20,60 seg.; Parte II = 123,04 ± 35,77 seg.. Gru-po de doentes epilépticos: Parte I = 115,12 ± 43,91 seg.; Parte II = 194,68 ± 86,44 seg.. Existe uma versão portuguesa (Castro, Cunha e Martins, 2000) que usa o formato de Tre-nerry e equipa (1995): 112 itens e quatro cores (rosa, cinza, verde e azul). Para controlar as diferenças individuais na nomeação da cor, Castro e equipa (2003) indicam que se divi-da o número de respostas corretas na tarefa pelo tempo despendido. Esta pontuação

pon-derada é usada como medida da atenção (Cohen, Dunbar e McClelland, 1990). No estudo português, os autores obtiveram uma média de 50 (DP não indicado) para um grupo de pessoas com idades entre os 50 e os 87 anos. Segundo estes autores, a educação (anos de escolaridade) está significativamente relacionada com o tempo na tarefa de leitura [F (1,67) = 11,2, p = 0,0013]. Já no que respeita à tarefa de nomeação da cor, a precisão da nomeação encontra-se correlacionada negativamente com a idade (r = -0,77) e positiva-mente com os anos de escolaridade (r = 0,72), p < 0,001).

Independemente do formato, o teste permite avaliar a presença de compromissos pré-fron-tais que se revelam sempre que o indivíduo apresente uma dificuldade para inibir respostas previamente aprendidas. Vários estudos descrevem lentificação em doentes com lesão do lobo frontal esquerdo (Holst e Vilki, 1988; Perret (1974). Há um estudo que mostra que os doentes com lesão no hemisfério esquerdo demoram mais nos dois ensaios, mas o efeito de interferência não é diferente quando se compara com doentes com lesão à direita. O teste é muito sensível a traumatismos cranianos fechados, mesmo depois de 5 meses de recupera-ção (Stusset al., 1985). É também muito sensível a défices atencionais subtis dos doentes com traumatismos cranianos moderados (Bohnen et al., 1992). Doentes demenciados apre-sentam também lentificação (Fisher et al., 1990; Kosset al., 1984). Um estudo (Dustmanet al., 1984) mostrou que o exercício aeróbico durante quatro meses em pessoas sedentárias com idades entre os 55 e os 70 anos resultou numa melhoria significativa nas pontuações do Stroop.

Teste das trilhas. O Trail Making Test (Army Individual Test, 1944; Reitan e Wolfson, 1993)

mede a atenção, a velocidade de processamento, o rastreio visual e a flexibilidade cogniti-va — função executicogniti-va — (Lezak et al., 2004; Groth-Marnat, 2002). É um teste fácil de administrar e que só requer que o sujeito desenhe linhas a ligar círculos numerados conse-cutivamente (Parte A; Figura 10) e que depois desenhe linhas a ligar círculos numerados alternados com círculos alfabetizados (Parte B; Figura 10). As pontuações baseiam-se no tempo total demorado a completar a parte A e no tempo total da parte B. Faz parte da bateria Halstead-Reitan e de outras baterias compreensivas ou de rastreio. Foi desenvolvi-da originalmente por psicólogos do exército dos EUA e faz agora parte do domínio público (pode ser reproduzida sem autorização). Foram desenvolvidas formas alternativas para situações de reteste em que se pretende diminuir o efeito da prática (Trilhas C e D; McCracken e Franzen, 1992). No entanto, envolvem um conjunto de habilidades relaciona-das com a atenção, tais como a sondagem visual, coordenação, localização visomotora, velocidade do processamento de informação e motivação (Gaudino, Geisler e Squires, 1995). Para completar o teste, o sujeito deve compreender a importância simbólica dos números e letras, sondar a página com eficácia, identificar com precisão o estímulo se-guinte e fazer isto tudo de modo rápido. As atividades do hemisfério esquerdo são mais exigidas para compreender e sequenciar os números e letras e o direito para sondar visual-mente a página. A precisão e a velocidade serão indicativas da integração das atividades dos 2 hemisférios. Há alguma evidência de que os doentes com lesões frontais dorsolate-rais (mas não outras áreas frontais) têm desempenhos mais lentos e mais erros nas Trilhas

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B (Stuss et al., 2001). Apesar desta descoberta, deve ser salientado que as Trilhas B não devem ser usadas como medida de perturbação geral do lobo frontal. É sensível ao declí-nio na demência (Greenlief et al., 1985; Storandt et al., 1984); à atrofia do caudado nos doentes de Huntington; ao traumatismo craniano (Leinster et al., 1990; Stuss, Stethem, Hugenholtz, e Richard, 1989) e à depressão (King et al., 1993). Os doentes com traumatis-mo craniano, para além de mais lentos, dão mais erros de impulsividade e de persevera-ção.

Símbolos da Weschler Inteligente Scale. Este subteste da WAIS (Wehsler, 1944, 1955,

1981) mede a atenção e a velocidade de processamento, consiste em quatro linhas com 100 quadrados brancos no total, cada um emparelhado com um número. Acima destas linhas está impressa uma chave em que cada número corresponde a um símbolo sem significado, depois de um ensaio de treino nos dez primeiros (WAIS) ou sete primeiros (WAIS-R), o sujei-to tem de preencher os quadrados com os símbolos devidos em 90 segundos. A pontuação corresponde ao número de quadrados preenchidos corretamente. Na literatura há várias formas alternativas (Lezak et al., 2004). Este é um teste psicomotor, relativamente indepen-dente da inteligência, memória ou aprendizagem. O teste avalia a atenção mantida, veloci-dade de resposta e coordenação visomotora (Groth-Marnat et al., 2000; Lezak et al., 2004). O teste é sensível ao envelhecimento e ao género (as mulheres são melhores). É bastante sensível à lesão cerebral, independentemente do local; à demência, declinando rapidamen-te com a progressão da demência. Os doenrapidamen-tes com Huntington têm um desempenho pior antes de a doença se manifestar (Strauss e Brandt, 1986). Doentes com tumores de cresci-mento rápido têm piores resultados do que doentes com tumores de crescicresci-mento lento

(Hom e Reitan, 1984). Relaciona-se também com a duração do coma em doentes com trau-matismo craniano (Correll et al., 1993, Wilson, Vizor, e Bryant, 1991); com o alcoolismo crónico (Miller e Saucedo, 1983) e depressão no idoso As pontuações melhoram em doentes hipertensivos tratados farmacologicamente (Miller et al., 1984) e em idosos que deixaram de ser sedentários (3h/s durante 4 meses; Dustman, et al., 1984).

Perceção

Exame sensoriopercetivo Reitan-Klove. Mede as aptidões sensoriopercetivas. Os sujeitos

têm de identificar formas sem estímulo visual, identificar a localização de estímulos sen-soriais unilaterais e bilaterais e demonstrar a sua acuidade visual e auditiva. As modalida-des auditivas, cinestésicas e visuais são testadas de modo independente (Lezak et al., 2004). A função relativa de cada hemisfério pode ser avaliada através de comparações do desempenho de cada lado do corpo (Horton, 1997). Os sujeitos com lesões lateralizadas podem, habitualmente, identificar estimulação limitada a um dos lados do corpo e não conseguir reconhecer estimulação que ocorra simultaneamente em ambos os lados (Reitan e Wolfson, 1992).

Teste percetivo dos sons da fala. É um dos testes da bateria de Halstead-Reitan. Consiste

numa gravação de 60 sílabas faladas sem sentido, com a intensidade do som ajustada a cada sujeito. Cada palavra começa e termina com consoantes diferentes e baseiam-se no som “i”. O sujeito tem de selecionar as palavras que pensa ter ouvido de seis seções (séri-es de A a F) de dez itens com quatro palavras alternativas impr(séri-essas. Este t(séri-este é sensível à lesão cerebral em geral e à lesão cerebral esquerda em particular. Doentes com lesões no lobo temporal esquerdo cometem mais erros do que os que tem lesão à direita ou do que normais (Long e Brown, 1979). Segundo Boll (1981), este teste também é sensível aos défices atencionais.

Teste dos ritmos Seashore. Este teste é um dos mais usados para a perceção auditiva

não-verbal desde que Halstead (1947) o incorporou na sua bateria. É um subteste do

Sea-shore Test of Musical Talent (SeaSea-shore et al., 1960). Consiste na discriminação de pares

de batidas musicais semelhantes e dissemelhantes. A prova é composta por 15 pares de ritmos que são apresentados através de uma gravação. O sujeito tem de indicar para cada elemento, se os padrões são iguais ou diferentes entre si. A pontuação da prova correspon-de ao número correspon-de erros cometidos durante a administração. Contrariamente ao que origi-nalmente se pretendia, a maioria dos estudos não mostra uma maior sensibilidade do tes-te às lesões do lado direito: os resultados mostram que não há diferença entre as lesões do lado direito e esquerdo (Boone e Rausch, 1989; Hom e Reitan, 1990; Reitan e Wolfson, 1989; Steindler, 1984). O teste é mais útil como medida de atenção e concentração, pelo que os doentes com lesões bilaterais e difusas cometem mais erros do que os lateraliza-dos (Reitan e Wolfson, 1989). O número de erros correlaciona-se positivamente com a medida de gravidade de traumatismo craniano.

Memória

③ ①

③ Ⓐ

① ④

Ⓒ ⑧

Ⓕ Ⓖ

Ⓔ ②

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A avaliação da memória é complexa. Existe um sistema de memória funcional para cada um dos sentidos. Habitualmente, os exames neuropsicológicos medem somente a memó-ria a nível visual e auditivo. Lezak e equipa acreditam que um exame de memómemó-ria deve incluir, no mínimo, (1) span da retenção imediata, (2) aprendizagem em termos de memó-ria recente e (3) recuperação de informação aprendida recente e de longo prazo.

Span Digital da WAIS. O teste de span digital da Wais mede o span da memória verbal

imediata. Qualquer um dos subtipos (ordem direta e inversa) consiste em sete pares de sequências de números que o examinador lê em voz alta a uma taxa de um por segundo. Quando uma sequência é repetida corretamente, passa-se para a sequência seguinte; caso contrário faz-se a do mesmo par. Ambos envolvem atenção auditiva, mas cada um dos subtipos deste teste mede atividades mentais diferentes (Lezaket et al., 2004) e são afetados de modo diferente pela lesão cerebral (Kaplan et al., 1991). O span digital por ordem direta tem uma média que ronda os 6±1, a partir de 4 já é limite e 3 já correspon-de a défice. A idacorrespon-de afeta muito pouco (> 65 anos). Este subteste mecorrespon-de mais a eficiência da atenção do que a memória. A ansiedade afeta este teste. É mais vulnerável a envolvi-mento do hemisfério esquerdo. Nos primeiros meses depois de traumatismo craniano, os valores descem abaixo do limite normal. Os erros em que se repete dígitos corretos, com ordem baralhada, associam-se a lesão difusa (e.g., traumatismo craniano leve, esclerose múltipla). Erros em que se substituem pedaços de sequências e se adicionam números (e.g., 3-5-6-7 em vez de 3-5-9) ocorrem mais em traumatismos cranianos frontais graves. Em lesões cerebrais graves, o span tende a descer. Os doentes demenciados tendem a repetir não mais do que o seu limite (e.g., 4-8-2-9 em vez de 4-8-2-9-5). No span digital por ordem inversa pede-se ao sujeito para repetir o número ouvido por ordem inversa. A média que ronda os 4-5, a partir de 3 já é limite ou já corresponde a défice conforme a escolaridade. Doentes com pensamento concreto têm dificuldade em compreender as ins-truções. A idade afeta (descida de um ponto > 70 anos). Este subteste mede a eficiência do rastreamento mental e também a memória (ao contrário do anterior) e, provavelmen-te, a sondagem visual interna. É um teste sensível a vários tipos de lesão cerebral: com-prometimento do hemisfério esquerdo, e defeitos dos campos visuais. Doentes lobotomiza-dos temporalmente, não mostraram diferenças. Quanto mais grave é a lesão, menos dígi-tos são lembrados. É um teste sensível às lesões cerebrais difusas devidas a solventes e a muitos processos demenciais.

Teste de retenção visual de Benton (Versão revista). O Benton Visual Retention

Test-revi-sed (Benton, 1974; Sivan, 1992) mede a memória visual imediata, mas avalia também a

perceção visoespacial, conceptualização visual e verbal espacial e resposta visomotora. O teste apresenta três formas relativamente equivalentes (C, D e E) com graus de dificulda-de diferentes (há estudos que mostram não haver dificuldadificulda-de; outros revelam que a for-ma C é for-mais fácil e outros que a forfor-ma D é a for-mais difícil. As suas norfor-mas incluem a idade e a estimativa da habilidade mental. O teste consiste em 10 pranchas com um, dois ou três desenhos (Figura 11).

A administração inclui quatro modalidades diferentes. Administração A. Depois de 10 segundos de exposição de cada lâmina, o sujeito deve reproduzir imediatamen-te o desenho. Administração B. Depois de 5 segundos de exposição de cada lâmina o sujeito reproduz o dese-nho de forma imediata. Administração C. O sujeito deve copiar os desenhos tendo o modelo à sua frente. Administração D. Expõem-se as lâminas durante 10 se-gundos e depois de passados 15 sese-gundos deve reprodu-zir o desenho.

A pontuação final oscila entre 0 e 10 em função do nú-mero de reproduções corretas e do núnú-mero de erros (ver Lezak et al., 2004, p. 463). Os possíveis erros na reprodução de desenhos são classificado em categori-as diferentes: omissões e adições, distorções, perseve-rações, rotações, deslocamentos e erros de tamanho. O teste é sensível a negligência es-pacial unilateral, a desatenção visual, a problemas de memória e problemas de organiza-ção espacial. É também sensível, quer a lesão cerebral esquerda (pela conceptualizaorganiza-ção verbal), quer direita (pelos aspetos visoespaciais e visuais). Doentes com traumatismo craniano cometem mais erros. O teste é ainda sensível ao declínio cognitivo das fases ini-cias da doença de Alzheimer. O índice número correto de respostas discrimina a demência de controlos saudáveis, mas não de deprimidos. Os erros de omissão discriminam a demên-cia da depressão. Os desenhos podem ser conceptualizados verbalmente. Por exemplo, na Figura 11 (parte de cima), pode verbalizar-se como “círculo pequeno, triângulo e letra W em quadrado”.

Tabuleiro de Corsi. O Corsi-block Tapping Test avalia a memória visual de curto prazo e a

aprendizagem visoespacial implícita (Figura 12). É aplicável a partir dos 6 anos de idade em diante. Demora 10 minutos a implementar. É o equivalente visual do subteste Memória de Digitos da WMS-III. Os testes que avaliam o span de memória, focam principalmente na memória de curto-prazo que dispõe somente de uma capacidade limitada. A memória de curto prazo inclui um subsistema verbal e um subsistema visoespacial. Estes subsistemas podem ser perturbados separadamente por traumas cranianos, o que demonstra a sua independência quase completa. O teste dos blocos (Block-Tapping-Test) regista o span imediato de blocos, medindo a capacidade do subsistema visoespacial da memória de cur-to-prazo. O contexto teórico deriva do conceito de Baddeley de memória de curcur-to-prazo. O teste dos Blocos regista ainda o span de supra-blocos, indo além da avaliação da memó-ria de curto-prazo: usam-se sequências que excedem o span de memómemó-ria visual do sujeito e exige-se, desse modo, que seja adquirido um processo específico de aprendizagem. Im-plicam que se aprenda uma sequência repetida com frequência e que está inserida num conjunto de sequências de tamanho igual. O sujeito não sabe que uma sequência é repeti-da nos itens que lhe são apresentados: está em jogo uma forma de aprendizagem implíci-ta. O teste regista o número de repetições até que uma sequência relevante seja imitada Figura 11. Imagem do teste de

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corretamente. Este teste foi elaborado no contexto das experiências neuropsicológicas do lobo temporal direito. Administração: O écran apresenta 9 dados colocados irregularmen-te (Figura 12). Um ponirregularmen-teiro move-se de um dado para outro numa sequência que aumenta com cada grupo novo de itens. O sujeito deve reproduzir a ordem em que os dados foram selecionados. Depois de responder a 3 itens (com três sequências cada), apresenta-se mais um dado no item seguinte. O teste é cancelado

quando o avaliado responde erradamente a três sequên-cias seguidas. Para avaliar a aprendizagem espacial visual implícita (ı supra-bloco), regista-se primeiro o

span de blocos imediato. Depois apresentam-se

sequên-cias com um ou mais blocos (dados). O teste inclui 24 sequências. Três sequências constituem um item, e três itens (ou quatro, incluindo respostas incorretas) perten-cem sempre a um grupo de itens com o mesmo número de dados. O teste termina automaticamente depois da reprodução das 24 sequências. Formatos do teste: S1:

span de blocos imediato, para adultos; S2: span de blocos imediato, para crianças e

doen-tes; S3: span de blocos imediato e de supra-blocos, para adultos; S4: span de blocos imedi-ato e de supra-blocos, para crianças e doentes. Os formimedi-atos para crianças apresentam sequências de 2 a 8 dados, enquanto que para os adultos as sequências incluem 3 a 8 da-dos. Pontuação: A variável ”span de blocos imediato“ operacionaliza o span de memória viso-espacial. Corresponde à sequência mais longa que foi reproduzida corretamente pelo menos uma vez. A variável ” span supra-blocos“ operacionaliza a aprendizagem espacial visual implícita que corresponde ao número de tentativas até que o avaliado reproduza a sequência corretamente. Fidedignidade e validade: O Block-Tapping-Test é mencionado na literatura como um modo frequente para avaliar o span de memória viso-espacial, e tem sido aplicado várias vezes no contexto clínico. Experiências com doentes com lesões cere-brais mostram que é avaliada a função visual-espacial da memória a curto-prazo que é independente do subsistema verbal. Normas/Amostras comparativas: São apresentados pontos de corte em vez das padronizações habituais. No caso do doente ter um span de blocos imediato abaixo do ponto de corte, é inserida uma nota na folha de pontuações. Um primeiro estudo português já fez a adaptação deste teste a um grupo de idosos (Cons-tâncio, 2008).

Escala de Memória de Wechsler — 3ª Edição (WMS-III, 2008). objetivo, descrição, idades de aplicação, administração e respetivo tempo, interpretação de índices principais. Sub-testes Memória Lógica, Pares de Palavras, Lista de Palavras, Sequências de Letras e Núme-ros, Localização Espacial e Memória de Dígitos. Vantagens e inconvenientes desta escala (Franzen e Iverson, 2000).

Linguagem

Os testes de fluência verbal (Lezak et al., 2004) correspondem a tarefas cognitivas com-plexas que avaliam a capacidade de produção de palavras específicas num período de tem-po limitado. Estes testes existem no formato fonémico e semântico. A fluência verbal é uma função cognitiva complexa que abrange processos cognitivos (velocidade de processa-mento), linguísticos (a habilidade de recuperação semântica/ortográfica da memória de-clarativa verbal, o conhecimento de palavras disponível do sistema semântico/lexical e o tamanho do vocabulário), mnésicos (memória verbal a longo prazo, memória de trabalho) e executivos (coordenação, atenção, memória de trabalho e inibição de palavras irrelevan-tes) que, de maneira direta ou indireta, deriva do bom funcionamento do lobo frontal e das regiões subcorticais a ele associadas (Azuma, 2004; Butman, 2000; Crowe, 1998; Henry e Crawford, 2004; Mitrushina, Boone e D’Elia, 1999; Lezak, 1995; Ruff, Light, Parker e Levin, 1997; Santos, 2006; Sergeant, Geurts e Oosterlaan, 2002; Simões, 2003). As tarefas de avaliação da fluência verbal fonémica consistem na produção de palavras começadas por algumas letras e a fluência verbal semântica consistem na produção de palavras que correspondam a categoria (p.e., animais, nomes de pessoas ou artigos de comer, frutas, ações, cidades, veículos) (Azuma, Cruz, Bayles, Tomoeda e Montgomery, 2003; Lezak, 2004).

Em cada teste de fluência verbal podem ser calculadas três pontuações: 1) o número de pala-vras, excluindo erros e repetições; 2) o tamanho médio do agrupamento e 3) o número de

alternâncias. O agrupamento fonémico consiste no grupo de palavras sucessivas que começam

com as primeiras duas letras (p.e., meia, melão, mexer), ou que rimam (mão, corrimão, mexi-lhão), ou que diferem somente numa vogal (mata, meta, mota), ou que são palavras homóni-mas e que o sujeito indica como tal (paço, passo; ruço, russo); relativamente ao agrupamento semântico, considera-se o grupo de palavras geradas sucessivamente que pertencem à mesma categoria semântica, como por exemplo animais domésticos, animais de estimação, animais australianos, categorias zoológicas (e.g., aves, insetos, primatas). As alternâncias dizem res-peito ao número de transições entre agrupamentos, incluindo palavras isoladas para a fluên-cia fonémica e semântica (Troyer, Moscovitch e Winocur, 1997).

Os testes de fluência verbal são frequentemente usados na avaliação e investigação neuro-lógica, pois consistem em tarefas de rápida e fácil aplicação, não necessitando de materi-ais específicos e podem ser usados com pacientes não avaliáveis por outros meios (p.e., analfabetos, défices sensoriais como a cegueira) ou relativos a qualquer grupo cultural e sociodemográfico (Lezak, 1995; Simões, 2003). Vários estudos indicam que o desempenho no teste de fluência verbal fonémica tende a ser comparativamente resistente aos efeitos do envelhecimento (Ivnik, Malec, Smith, Tangalos e Petersen,1996; Harrison, Buxton, Hu-sain e Wise, 2000; Mathuranath, George, Cherian, Alexander, Sarma e Sarma, 2003). No entanto, o desempenho na fluência semântica decai com a idade (Auriacombe et al., 2001; Benito-Cuadrado, Esteba-Castillo, Bohin, Cejundo-Bolivar e Pena-Casanova, 2002; Harrison et al., 2000; Kosmids, Vlahou, Panagiotaki e Kiosseoglau, 2004; Mathuranath et Figura 12. Imagem do Tabuleiro

Referências

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